Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:021/22.2BEPRT-B
Data do Acordão:05/11/2023
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
PROVIDÊNCIA CAUTELAR
CASO JULGADO
Sumário:É de admitir revista, tendo em vista uma melhor aplicação do direito, e para dilucidar se foi efectuada uma correcta interpretação do regime do caso julgado em situações como a presente, até por poder contender com a apreciação dos requisitos previstos no art. 120º, nºs 1 e 2 do CPTA.
Nº Convencional:JSTA000P31002
Nº do Documento:SA120230511021/22
Data de Entrada:05/03/2023
Recorrente:AA
Recorrido 1:MINISTÉRIO DAS FINANÇAS E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo

1. Relatório
AA intentou no TAF do Porto providência cautelar, contra o Ministério das Finanças (MF), a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) e a Caixa Geral de Aposentações (CGA), peticionando, que: i) “sejam os Requeridos MF e AT condenados a dar início ao procedimento de realização de Junta Médica do Requerente pela Requerida CGA, comunicada ao abrigo dos artigos 11º e 13º do Decreto-Regulamentar nº 41/90, de 29 de Novembro, em conjugação com os artigos 33º e seguintes da Lei nº 35/2014, de 20 de junho, e a Junta Médica da ADSE de 12/10/2018; e (ii) sejam os Requeridos MF e AT condenados a manter o Requerente com o direito a ausência do trabalho por faltas por doença, em virtude das doenças incapacitantes, de acordo com a Junta Médica de 12/08, pelo menos até ao trânsito em julgado do processo principal a intentar, e tendo em conta a possibilidade conferida nos termos do Despacho Conjunto nº A-179/89/XI, de 12/09, devendo, para tal, considerar-se como justificadas as faltas entre 12/08 e a data que se realize a Junta Médica pela Requerida CGA”.

Por sentença de 08.11.2022 o TAF do Porto julgou procedente a excepção de caso julgado e absolveu os Requeridos da instância.

O Requerente interpôs recurso desta decisão e por acórdão de 10.03.2023 o TCA Norte negou provimento ao recurso, confirmando a sentença de 1ª instância.

O Requerente/Recorrente não se conforma com esta decisão, interpondo a presente revista, alegando que esta se justifica, quer pela relevância jurídica ou social, quer pela necessidade de uma melhor aplicação do direito.

O Recorrido MF contra-alegou defendendo a inadmissibilidade do recurso.

A Recorrida AT contra-alegou defendo igualmente a inadmissibilidade da revista.

2. Os Factos
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. O Direito
O art. 150º, nº 1 do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de uma importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Como resulta do próprio texto legal, e a jurisprudência deste STA tem repetidamente sublinhado, trata-se de um recurso excepcional, como, aliás, o legislador sublinhou na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando o preceito como uma “válvula de segurança do sistema”, que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

O Requerente no seu requerimento inicial formulou pedidos cautelares de intimação para adopção ou abstenção de conduta por parte da Administração, nos termos do art. 112º, nº 1 do CPTA, nos termos acima indicados, invocando os requisitos do art. 120º, nº 1 e 2 do CPTA.

As instâncias coincidiram no entendimento de que se verificava a excepção de caso julgado (sem apreciarem o mérito da providência requerida).

O Recorrente alega nesta revista que o acórdão recorrido fez incorrecta interpretação dos arts. 580º e 581º do CPC e do art. 364º, nº 4 do mesmo diploma e do art. 124º do CPTA.
Alega o Recorrente que o conceito de caso julgado é inaplicável em sede de providências cautelares, recorrendo o art. 362º, nº 4 do CPC a um conceito de repetição da providência cautelar semelhante ao do disposto no art. 581º, nº 1 do mesmo diploma.
Mais alega que na presente providência cautelar o pedido formulado não corresponde ao que constava do processo nº 433/21.9BEPRT, nem tem na sua base a mesma factualidade, não se podendo configurar uma situação de caso julgado. Desde logo porque no processo nº 433/21.9BEPRT, não é feita qualquer referência às sentenças proferidas no processo nº 313/19.8BEPRT e no processo nº 3205/18.4BEPRT, já transitadas em julgado, e que, segundo alega, não são cumpridas pelas Recorridas, tendo ocorrido factos novos posteriormente ao trânsito em julgado da decisão que julgou improcedente a anterior providência cautelar.
O decidido no acórdão recorrido quanto à apreciação que fez do caso julgado (como antes pela 1ª instância) não é isento de dúvidas, afigurando-se a situação fáctica como socialmente relevante, por ter implicações também na relação de emprego público do Recorrente [quanto ao limite de ausência do trabalho por faltas por doença nos termos dos arts. 36º e 37º da Lei nº 35/2014, de 20/6, e do Despacho Conjunto nº A/17989/XL, de 12/9, de acordo com a junta médica da ADSE de 12.10.2018, com prazo inicial de 18 meses acrescido da prorrogação por mais de 18 meses, conforme previsto no art. 25º da referida Lei nº 35/2014], sendo também juridicamente relevante no concreto domínio das providências cautelares.
Assim, há razões para admitir a revista, tendo em vista uma melhor aplicação do direito, e para dilucidar se foi efectuada uma correcta interpretação do regime do caso julgado em situações como a presente, até por poder contender com a apreciação dos requisitos previstos no art. 120º, nºs 1 e 2 do CPTA (a qual não foi realizada por ter ficado prejudicada pela procedência daquela excepção).

4. Decisão
Face ao exposto, acordam em admitir a revista.
Sem custas.

Lisboa, 11 de Maio de 2023. – Teresa de Sousa (relatora) – José Veloso - Fonseca da Paz.