Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00002609
Parecer: P000202005
Nº do Documento: PPA16062005002000
Descritores: MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E DO ENSINO SUPERIOR
ENSINO SUPERIOR
ENSINO SECUNDÁRIO
LEGALIDADE
DESPACHO
DESPACHO DE CONCORDÂNCIA
ESCOLA ESTRANGEIRA
CANDIDATURA
EQUIVALÊNCIA
MATRÍCULA
ERRO
SERVIÇO ADMINISTRATIVO
PUBLICIDADE
OMISSÃO
VALIDADE
ESTADO DE DIREITO
PRINCÍPIO DA CONFIANÇA
PRINCÍPIO DA BOA FÉ
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
Livro: 00
Numero Oficio: 969
Data Oficio: 02/18/2005
Pedido: 02/23/2005
Data de Distribuição: 03/03/2005
Relator: BARRETO NUNES
Sessões: 01
Data da Votação: 06/16/2005
Tipo de Votação: UNANIMIDADE
Sigla do Departamento 1: MCIES
Entidades do Departamento 1: MIN DA CIÊNCIA INOVAÇÃO E ENSINO SUPERIOR
Posição 1: HOMOLOGADO
Data da Posição 1: 08/19/2005
Privacidade: [01]
Data do Jornal Oficial: 13-10-2005
Nº do Jornal Oficial: 197
Nº da Página do Jornal Oficial: 14676
Indicação 2: ASSESSOR:TERESA BREIA
Área Temática:DIR CONST * DIR FUND / DIR CIV * TEORIA GERAL / DIR ENS
Ref. Pareceres:P000061988Parecer: P000061988
P000801989Parecer: P000801989
P000771993Parecer: P000771993
P000841993Parecer: P000841993
P000681998Parecer: P000681998
P001252000Parecer: P001252000
P003312000Parecer: P003312000
P001352001Parecer: P001352001
P000382002Parecer: P000382002
P000112003Parecer: P000112003
P000762003Parecer: P000762003
P000902003Parecer: P000902003
P000662004Parecer: P000662004
Legislação:CONST76 - ART2 ART13 ART76 N1 N2 ART119 N1 N2; DL 296-A/98 DE 1998/09/25 - ART2 ART3 ART4 ART6 N1 N2 A) B) ART7 A) B) ART8 ART16 N1 N2 ART17 A) B) C) D) ART18 ART19 ART20 N1 N2 ART20-A N1 A) B) C) N2 N3 N4 N5 N6 A) B) N7 A) B) N8 ART26 N1 A) B) C) N2 N3 N4 N5 N6 ART26-A A) B) C); L 46/86 DE 1986/10/14 - ART11 N1 ART12 N1 N2 A) B) C) D) G) N6 ART63 N3; DL 28-B/96 DE 1996/04/04; P 317-B/96 DE 1996/07/29; DL 26/2003 DE 2003/02/07 ; DL 219/97 DE 1997/08/20 - ART2 N1 ART3 N1 N2 N3 N4 ART5 N1 N2 N3 ART6 N2; P 606/2003 DE 2003/07/21 - ART4 ART5 A) B) ART29 N1 A) B) C) N2 N3 A) B); P 845/2004 DE 2004/07/16 - ART4 ART5 A) B) ART29 N1 A) B) C) N2 N3 A) B) ART53 N1; DESP 29-A/SEEI/96 DE 1996/07/08; DESP 14759/04 DE 2004/07/06; DESP 31/SEEI/96 DE 1996/06/12; DESP 38/SEEI/96 DE 1996/09/02; DL 393-A/99 DE 1999/10/02; DL 115/97 DE 1997/09/19 - ART1; DL 26/03 DE 2003/02/07; DL 286/89 DE 1989/08/29; L 74/98 DE 1998/11/11 - ART3 N3 D); L 2/05 DE 2005/01/24; CCIV66 - ART12 N1 N2; CPAD91 - ART6-A
Direito Comunitário:
Direito Internacional:
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:AC DO TC 70/92 DE 1992/02/24 IN BMJ 414
AC DO TC 287/90 DE 1990/10/30 IN BMJ 400
AC DO TC 556/03 DE 2003/11/12 IN DR DE 2004/01/07
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:
Conclusões: 1.ª – A equivalência oportunamente concedida pela entidade competente, para efeitos de classificação final nos exames finais do 12.º ano de escolaridade ministrado em estabelecimento de ensino estrangeiro sediado em Portugal, ao abrigo do Despacho n.º 31/SEEI/96, de 12 de Junho de 1996, que, nos termos da lei, é equivalente ao ensino secundário português, é um acto constitutivo de direitos para efeitos de concurso ao ensino superior público;
2.ª – Consequentemente, na candidatura ao ensino superior público, no ano lectivo seguinte, para além da necessidade da prova de capacidade para a frequência do ensino superior, é suficiente fazer prova da titularidade de curso do ensino secundário e respectiva equivalência da classificação final da candidatura e reconhecimento oficial no concurso do ano lectivo anterior;
3.ª – O Despacho do Secretário de Estado da Educação, de 7 de Dezembro de 2004, proferido em consonância com as conclusões antecedentes, não padece de quaisquer vícios, pelo que é um acto válido;
4.ª – Verifica-se erro dos serviços, nos termos do n.º 1 do artigo 53.º do Regulamento do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior Público para a Matrícula e Inscrição no Ano Lectivo de 2004-2005, aprovado pela Portaria n.º 845/2004, de 16 de Julho, se o Director do Departamento do Ensino Secundário emitiu, para prosseguimento de estudos, certidão de equivalência de classificação final de curso de ensino secundário estrangeiro [«(...) equivalência do “Baccalauréat Génèral” do Lycée Français Charles Lepierre, ao 12.º Ano do Curso Secundário (Decreto-Lei n.º 286/89, de 29 de Agosto), com a classificação final de QUINZE (15,0) VALORES»], em desconformidade com equivalência anteriormente atribuída;
5.ª – O serviço competente do agora denominado Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior deverá alterar a colocação de outros candidatos que já tenham sido colocados em idênticas circunstâncias, no âmbito do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior Público para a Matrícula e Inscrição relativo ao ano lectivo de 2004-2005, desde que os interessados tenham requerido nessa conformidade.

Texto Integral:
Senhor Ministro da Ciência, Tecnologia e
Ensino Superior,
Excelência:



I


Dignou-se a antecessora de Vossa Excelência solicitar a este corpo consultivo a emissão de parecer subordinado à questão da eventual «[r]ectificação da colocação de candidato(s) detentores de cursos não portugueses legalmente equivalentes ao ensino secundário português ao Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior Público para a Matrícula e Inscrição no Ano Lectivo de 2004/2005, em virtude do Despacho do Secretário de Estado da Educação, de 2004/12/07»[1].

Questiona-se, nomeadamente, a legalidade do referido despacho, o qual, fundamentado nos termos do n.º 1 do artigo 53.º (sob a epígrafe “erros dos serviços”) do Regulamento do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior Público para a Matrícula e Inscrição no Ano Lectivo de 2004-2005, determinou que fosse emitida uma nova certidão de nota de equivalência à estudante Maria Lobo Antunes, bem como, no caso de o Conselho Consultivo se pronunciar pela sua legalidade, se deverá o serviço competente do MCIES[2] alterar a colocação da referida estudante e de outros candidatos, já colocados no âmbito do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso 2004/2005, que concorreram em idênticas circunstâncias.

Por despacho de 17 de Março de 2005, foi atribuído ao parecer carácter urgente.

Cumpre emitir parecer.



II


1. O Despacho de concordância do Secretário de Estado da Educação, de 7 de Dezembro de 2004, cuja legalidade se questiona na presente consulta, teve a antecedê-lo a seguinte informação prestada pelos serviços:

«1. Quando a recorrente concorreu ao Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior em 2003 foi, pelo Ministério da Educação, emitido um documento no qual se afirma que a mesma concluiu o ensino secundário numa escola estrangeira com a classificação de 19 valores.
2. Acresce que, a recorrente foi, em Setembro de 2003, admitida no Curso de Biologia Celular e Molecular da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova, com base no reconhecimento que o Ministério da Educação efectuou à sua conclusão do ensino secundário.
3. As alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 26/2003, de 7 de Fevereiro ao Decreto-Lei n.º 296-A/98, de 25 de Setembro, em matéria de equivalências (cfr. a nova redacção dada ao n.º 3 do art.º 26.º, bem como o n.º 3 do art.º 3.º daquele Decreto- -Lei), não podem ser aplicadas aos alunos que já viram a conclusão dos seus estudos do ensino secundário reconhecidos pelo Ministério da Educação, como é o caso da recorrente.
4. Com efeito, a aplicação deste regime afecta uma situação em que a recorrente dispõe de um título que lhe atribui especial segurança, pretendendo eliminar os efeitos jurídicos produzidos, violando desta forma, o princípio da protecção de confiança a que se reportam o art.º 2.º da CRP e o art.º 6.º-A do Código do Procedimento Administrativo.
5. Face ao acima exposto, é nosso entendimento que o acto em questão deve ser revogado, com as devidas e legais consequências, designadamente quanto ao órgão competente para a emissão da certidão.»


2. A acompanhar o ofício que deu origem ao presente parecer, o Ministério da Ciência, Inovação e Ensino Superior juntou um enunciado, acompanhado de vários documentos, onde é exposta a questão que é objecto da consulta, com descrição minuciosa dos factos e seu enquadramento jurídico, onde se sustenta que a equivalência oportunamente atribuída para efeitos de classificação final nos exames do 12.º ano do ensino secundário ministrado em estabelecimento de ensino estrangeiro equivalente ao ensino secundário português, ao abrigo do Despacho n.º 31-SEEI/96, de 12 de Junho de 1996, é válida apenas para o ano do correspondente concurso, e não, também, para anos posteriores, caso, entretanto, seja alterada a respectiva legislação.

2.1. Através de novo ofício[3], o Ministério da Ciência, Inovação e Ensino Superior remeteu à Procuradoria-Geral da República diversos documentos «que fazem parte integrante do pedido de parecer formulado», e dos quais relevam os recursos hierárquicos, devidamente documentados, interpostos por Pedro Alexandre dos Santos Garrido e Maria Alexandra Lourenço Martins para o Director- -Geral do Ensino Superior, que conduziram à revogação dos actos administrativos impugnados.

2.2. Posteriormente, deu entrada na Procuradoria-Geral da República[4] uma exposição subscrita pela então Ministra da Educação, que também tinha como assunto «a atribuição da classificação do ensino secundário para efeitos de acesso ao ensino superior ao abrigo do disposto no n.º 3 do art. 26.º do Decreto-Lei n.º 296-A/98 — MARIA LOBO ANTUNES», com descrição minuciosa dos factos e seu enquadramento jurídico, alicerçada em diversa documentação, onde se sustenta a posição constante do Despacho acabado de transcrever no n.º 1 deste mesmo ponto, ou seja, que a equivalência atribuída nas circunstâncias anteriormente referidas produz efeitos jurídicos merecedores da protecção de confiança, consagrada constitucionalmente.


3. Numa descrição, tão breve quanto possível, enunciaremos o circunstancialismo fáctico em que se desenvolveu a questão em apreço.

Assim:

a) No ano de 2003, a estudante Maria Lobo Antunes candidatou-se ao concurso nacional de acesso e ingresso no ensino superior público para a matrícula e inscrição no ano lectivo de 2003- -2004, tendo apresentado os seguintes documentos:

a1) Diploma francês de baccalauréat, emitido pelo Lycée Charles Lepierre, onde vêm discriminadas as notações finais das diversas disciplinas, bem como a classificação final do curso, que foi de 190 valores[5];

a2) Requerimento de candidatura ao abrigo do artigo 20.º--A do Decreto-Lei n.º 296-A/98, com discriminação das classificações obtidas no ano lectivo de 2002-2003, nos exames finais desse curso, e onde a candidata indica os estabelecimentos do ensino superior a que concorre e requer a substituição das provas de ingresso de Biologia Química e Matemática pelos exames de baccalauréat correspondentes, ou seja, Sciences de la Vie et de la Terre, Physique et Chimie, e Mathématiques, do qual consta ainda o seguinte despacho do Director-Geral do Ensino Superior: «Aceite com as restrições atrás referidas»[6];

a3) Certidão emitida pelo mesmo Liceu francês, com a classificação dos exames de Baccalauréat e do «relevé de notes», devidamente convertidas[7], chancelada pela Académie de Toulouse.

b) Num documento emitido pelo Ministério da Ciência e do Ensino Superior — Direcção-Geral do Ensino Superior, intitulado «1.ª Fase do Concurso Nacional de Acesso de 2003-CAE 011», a que foi aposto o carimbo da Direcção Regional de Educação de Lisboa (acesso ao ensino superior), vêm discriminados os exames nacionais realizados e as provas de ingresso, bem como as respectivas classificações, e depois, na parte respeitante às «Classificações Finais do Ensino Secundário, Curso dos 10.º/12.º anos: 940 Equivalências – Escolas estrangeiras em Portugal», o reconhecimento à aluna Maria Lobo Antunes da «classificação final: 19 (dezanove)», constando ainda do mesmo a seriação dos pares estabelecimento/curso concernente à respectiva candidatura.

c) Com base, além do mais, na classificação final de 19 valores, reconhecida pelo Ministério da Ciência e do Ensino Superior, conforme vem demonstrado no documento referido na alínea que antecede, a candidata foi admitida no ensino superior, no curso de Biologia Celular e Molecular da Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa.

d) Para instruir o processo de candidatura ao concurso nacional de acesso e ingresso no ensino superior público para a matrícula e inscrição no ano lectivo de 2004-2005, a mesma candidata juntou os seguintes documentos:

d1) Boletim de inscrição nos exames de Biologia e Química do 12.º ano do ensino secundário, relativamente ano escolar 2003/2004, indicando que «no presente ano lectivo não está matriculada em nenhuma escola, tendo efectuado a última matrícula no ano lectivo de 2002/03 na escola Lycée Charles Lepierre»;

d2) Certidão emitida pelo Director do Departamento do Ensino Secundário, organismo dependente do Ministério da Educação, datada de 31 de Agosto de 2004, com o seguinte teor:

«(...) certifico que foi concedida a MARIA LOBO ANTUNES – Proc.º 1882/04, a equivalência do “Baccalauréat Général” do Lycée Français Charles Lepierre ao 12.º Ano do Curso Secundário (Decreto- -Lei n.º 286/89, de 29 de Agosto), com a classificação final de QUINZE (15,0) VALORES, para efeitos de prosseguimento de estudos, de acordo com o Decreto--Lei n.º duzentos e dezanove/noventa e sete, de vinte de Agosto (...)».

e) Consta do processo um documento do Ministério da Ciência Inovação e Ensino Superior – Direcção-Geral do Ensino Superior, 1.ª fase do Concurso Nacional de Acesso de 2004 – CAE 011, do qual se salientam as seguintes passagens:
«4. Exames Nacionais do Ensino Secundário Realizados
(...) 102 Biologia 167
142 Química 181
(...)
6. Classificações Finais do Ensino Secundário
Curso dos 10.º/12.º anos: 940 Equivalências – Escolas estrangeiras em Portugal
Classificação final: 150.»
f) Despacho do Secretário de Estado da Educação, de 7 de Dezembro de 2004, após reclamação da candidata — afinal o despacho cuja legalidade se questiona na presente consulta, e que revoga o acto referido na alínea antecedente —, já reproduzido no ponto II-1, a confirmar informação dos serviços que lhe foi prestada.

g) Certidão passada pela Directora-Geral da Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular, em 28 de Dezembro de 2004, com o seguinte teor:

«(...) certifica que foi concedida a MARIA LOBO ANTUNES — Proc. 1882/04, a equivalência do “Baccalauréat” do Lycée Français Charles Lepierre ao 12.º Ano do Curso Secundário (Decreto-Lei n.º 286/89, de 29 de Agosto), com a classificação final de (19,0) valores, para efeitos de prosseguimento de estudos, de acordo com o Decreto-Lei número duzentos e dezanove/noventa e sete, de vinte de Agosto.
(...)».

h) Exposição dirigida pela candidata Maria Lobo Antunes ao Director-Geral do Ensino Superior, «nos termos e para os efeitos do art.º 53.º, n.º 1 do Regulamento do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior Público para a Matrícula no Ano Lectivo de 2004/2005», com o seguinte teor:

«1. Como a requerente informou que faria, na sua reclamação a essa Direcção-Geral, efectuada nos termos do art.º 41.º, n.º 6 do Regulamento do Concurso Nacional de Acesso e que deu lugar ao processo com a v/ref.ª 7318, a requerente veio a apresentar em Outubro de 2004 recurso hierárquico para a Ministra da Educação relativamente à decisão de equivalência do “Baccalauréat Général” do Lycée Français Charles Lepierre ao 12.º ano do Curso Secundário, emitida pelo Director cessante do Departamento do Ensino Secundário, Dr. Vasco Manuel Correia Alves, no âmbito do proc. n.º 1882/04, em 31 de Agosto de 2004, que lhe atribuía uma média de 150,00 pontos e com base na qual foi excluída da sua primeira opção par estabelecimento/curso (Medicina).
2. Sucede que, por despacho de 15 de Dezembro de 2004 do Secretário de Estado da Educação – p.º 22.4/2003.755 –, (...), foi confirmada a informação que reconhecia integral razão à requerente – designadamente quanto ao reconhecimento da sua média de 19 valores –, ordenando-se a revogação do acto recorrido e emissão de nova certidão de equivalência.
3. Certidão de equivalência esta que a requerente recebeu a 14 de Janeiro do corrente, através de ofício da Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular (...).
Em face do exposto, constata-se que ocorreu erro na colocação da requerente por erro não imputável à mesma, pelo que deverá ser recolocada no curso e estabelecimento a que teria sido colocada na ausência de erro, mesmo que para tanto haja de ser necessário criar vaga adicional, o que desde já requer ao abrigo do art.º 53.º, n.º 1 do Regulamento do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior Público para a matrícula no Ano Lectivo de 2004/2005».

i) Finalmente, constam do processo fotocópias de recursos hierárquicos, devidamente documentados, já anteriormente referidos, interpostos por Pedro Alexandre dos Santos Garrido e Maria Alexandra Lourenço Martins para o Director-Geral do Ensino Superior[8], que, identicamente ao que se passou com a candidata Maria Lobo Antunes, conduziram à revogação dos actos administrativos impugnados[9].


4. A questão circunscreve-se pois a apurar da validade da equivalência concedida à classificação final, nos termos da legislação então em vigor, a um candidato ao ensino superior que frequentou uma escola estrangeira sediada em Portugal, equiparada às escolas portuguesas, e que era válida para o concurso de determinado ano lectivo, para efeitos de futuros concursos, mesmo que a legislação sobre concessão de equivalências, em situações similares, tenha entretanto sido alterada.

Neste contexto, cumpre seguidamente abordar questões como as da ineficácia de actos de conteúdo externo não publicados, da aplicação das leis no tempo, princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança, bem como actos constitutivos de direitos ou direitos adquiridos e sua repercussão nas pretensões suscitadas.



III

1. O regime de acesso ao ensino superior, enquanto concretização do direito ao ensino, encontra-se consagrado na Constituição da República Portuguesa[10].

Na verdade, logo na sua Parte I, sob a epígrafe «Direitos e deveres fundamentais», Título III, direccionado aos «Direitos e deveres económicos, sociais e culturais», Capítulo III, dedicado aos «Direitos e deveres culturais», consagra às Universidades o seguinte normativo:

«Artigo 76.º
Universidade e acesso ao ensino superior
1. O regime de acesso à Universidade e às demais instituições do ensino superior garante a igualdade de oportunidades e a democratização do sistema de ensino, devendo ter em conta as necessidades em quadros qualificados e a elevação do nível educativo, cultural e científico do país.
2. As universidades gozam, nos termos da lei, de autonomia estatutária, científica, pedagógica, administrativa e financeira, sem prejuízo de adequada avaliação da qualidade do ensino.»

Segundo J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA[11], «O direito à Universidade (e ao ensino superior em geral) comporta duas dimensões: (a) direito de acesso aos lugares de estudo existentes; (b) pretensão a um alargamento da oferta de lugares disponíveis. No primeiro aspecto, rege o princípio da igualdade, qualificado pelo princípio da democratização (n.º 1), podendo a sua violação ser judicialmente impugnável; no segundo caso, o alargamento está sempre condicionado pelas necessidades em quadros e a elevação do nível educativo, cultural e científico (n.º 1, 1.ª parte), não fornecendo qualquer suporte processual para acções individuais perante os tribunais.»


2. O quadro geral do sistema educativo foi desenvolvido pela Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovada pela Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro[12].

Este diploma encontra-se dividido nos seguintes capítulos:

Capítulo I – Âmbito e princípios (artigos 1.º a 3.º);
Capítulo II – Organização do sistema educativo (artigos 4.º a 23.º);
Capítulo III – Apoios e complementos educativos (artigos 24.º a 29.º);
Capítulo IV – Recursos humanos (artigos 30.º a 36.º);
Capítulo V – Recursos materiais (artigos 37.º a 42.º);
Capítulo VI – Administração do sistema educativo» (artigos 43.º a 46.º);
Capítulo VII – Desenvolvimento e avaliação do sistema educativo (artigos 47.º a 53.º);
Capítulo VIII – Ensino particular e cooperativo (artigos 54.º a 58.º);
Capítulo IX – Disposições finais e transitórias (artigos 59.º a 64.º).

Desta Lei de Bases cumpre destacar diversos normativos mais directamente vocacionados para o ensino superior. Assim, no capítulo II, subsecção III, sob a epígrafe «Ensino superior», merecem destaque as seguintes disposições:
«Artigo 11.º
Âmbito e objectivos
1 – O ensino superior compreende o ensino universitário e o ensino politécnico.
(...)».

Segue-se o artigo 12.º[13], que regula o acesso ao ensino superior e onde vêm evidenciados os princípios constitucionais anteriormente evocados:
«Artigo 12.º
Acesso
1 – Têm acesso ao ensino superior os indivíduos habilitados com um curso secundário ou equivalente que façam prova de capacidade para a sua frequência.
2 – O Governo define, através de decreto-lei, os regimes de acesso e ingresso no ensino superior, em obediência aos seguintes princípios:
a) Democraticidade, equidade e igualdade de oportunidades;
b) Objectividade dos critérios utilizados para a selecção e seriação dos candidatos;
c) Universalidade de regras para cada um dos subsistemas de ensino superior;
d) Valorização do percurso educativo do candidato no ensino secundário, nas suas componentes de avaliação contínua e provas nacionais, traduzindo a relevância para o acesso ao ensino superior do sistema de certificação nacional do ensino secundário;
g) Carácter nacional do processo de candidatura à matrícula e inscrição nos estabelecimentos de ensino superior público, sem prejuízo da realização, em casos devidamente fundamentados, de concursos de natureza local;
e) (...).
(...).
6 – O Estado deve criar as condições que garantam aos cidadãos a possibilidade de frequentar o ensino superior de forma a impedir os efeitos discriminatórios decorrentes das desigualdades económicas e regionais ou de desvantagens sociais prévias.»

Por fim, merece destaque, no capítulo das «disposições finais», o n.º 3 do artigo 63.º segundo o qual «[o] Governo deve definir por decreto-lei o sistema de equivalência entre os estudos, graus e diplomas do sistema educativo português e os de outros países, bem como as condições em que os alunos do ensino superior podem frequentar em instituições congéneres estrangeiras parte dos seus cursos, assim como os critérios de determinação das unidades de crédito transferíveis.»


3. Na sequência da Lei de Bases do Sistema Educativo foram publicados o Regime de Acesso ao Ensino Superior e o Regulamento dos Regimes Especiais de Acesso ao Ensino Superior, aprovados, respectivamente, pelo Decreto-Lei n.º 28-B/96, de 4 de Abril, e pela Portaria n.º 317-B/96, de 29 de Julho, diplomas estes que posteriormente sofreram diversas alterações.

Presentemente, o regime de acesso e ingresso no ensino superior encontra-se regulado no Decreto-Lei n.º 296-A/98, de 25 de Setembro[14].

Este diploma encontra-se dividido nos seguintes capítulos:

Capítulo I – Disposições gerais (artigos 1.º a 8.º);
Capítulo II – Comissão Nacional de Acesso ao Ensino Superior (artigos 9.º a 15.º);
Capítulo III – Avaliação da capacidade para a frequência (artigos 16.º a 23.º);
Capítulo IV – Selecção e seriação (artigos 24.º a 26.º);
Capítulo V – Candidatura (artigos 27.º a 39.º);
Capítulo VI – Disposições finais e transitórias (artigos 40.º a 46.º);

Deste diploma importa trazer à colação diversas disposições.

Do capítulo I:
«Artigo 2.º
Âmbito e aplicação
Este regime aplica-se ao acesso e ingresso nos estabelecimentos de ensino superior público e particular e cooperativo para a frequência de cursos de bacharelato e de licenciatura.»

«Artigo 3.º
Limitações quantitativas
O ingresso em cada par estabelecimento/curso do ensino superior está sujeito a limitações quantitativas, decorrentes do número de vagas fixado anualmente nos termos do presente diploma.»

Seguem-se, com interesse, os artigos 4.º e 6.º destinados, respectivamente, à fixação das vagas para as instituições de ensino superior público e ao respectivo preenchimento, que é feito por concurso.

Vem depois a enumeração das condições exigidas para a candidatura ao ensino superior, e a consequente avaliação da capacidade para a respectiva frequência e selecção e seriação dos candidatos, a saber:
«Artigo 7.º
Condições de candidatura
Só pode candidatar-se à matrícula e inscrição no ensino superior o estudante que satisfaça cumulativamente as seguintes condições:
a) Ser titular de um curso de ensino secundário, ou de habilitação legalmente equivalente;
b) Fazer prova de capacidade para a frequência do ensino superior.»
«Artigo 8.º
Avaliação da capacidade para a frequência do ensino superior e selecção e seriação dos candidatos
Compete aos estabelecimentos de ensino superior, nos termos do presente diploma, a fixação da forma de realização da avaliação da capacidade para a frequência, bem como dos critérios de selecção e seriação dos candidatos.»

Releva, em seguida, o capítulo III, instrumentalizado para a avaliação dos candidatos, nomeadamente, através da realização de provas de ingresso e consequente seriação, merecendo destaque os seguintes dispositivos:

«Artigo 16.º
Avaliação da capacidade para a frequência
1 – A realização da avaliação da capacidade para a frequência é feita através de provas de ingresso.
2 – Quando as aptidões físicas, funcionais ou vocacionais assumam particular relevância para o ingresso num determinado curso, os estabelecimentos de ensino superior podem fixar pré-requisitos de acesso a esse curso para além das provas de ingresso.»

Ainda no mesmo capítulo, nos artigos 17.º a 23.º, surgem as provas de ingresso, cumprindo destacar os seguintes:
«Artigo 17.º
Provas de ingresso
As provas de ingresso:
a) Adoptam critérios objectivos de avaliação;
b) Revestem a forma mais adequada aos seus objectivos;
c) São eliminatórias;
d) São de realização anual.»
«Artigo 20.º[15]
Provas para ingresso em cada par estabelecimento/curso
1 – De entre o elenco a que se refere o artigo 18.º, cada estabelecimento de ensino superior fixa, através dos seus órgãos legal e estatutariamente competentes, as provas que exige para o ingresso em cada um dos seus cursos.
2 – Cada estabelecimento de ensino superior pode ainda, através dos seus órgãos legal e estatutariamente competentes, determinar que os estudantes titulares de determinados cursos não portugueses legalmente equivalentes ao ensino secundário português possam apresentar, em lugar das provas escolhidas nos termos do número anterior, os exames finais de determinadas disciplinas desses cursos.»

Particularmente impressivo é o artigo 20.º-A, aditado pelo Decreto-Lei n.º 26/2003, de 27 de Fevereiro, destinado aos estudantes titulares de cursos não portugueses legalmente equivalentes aos cursos do ensino secundário português:
«Artigo 20.º-A[16]/[17]
Substituição das provas
1 – Para os estudantes titulares de cursos não portugueses legalmente equivalentes ao ensino secundário português, as provas de ingresso fixadas nos termos do artigo 20.º podem ser substituídas por exames finais de disciplinas daqueles cursos que satisfaçam cumulativamente as seguintes condições:
a) Terem âmbito nacional;
b) Terem sido realizados no ano lectivo que antecede imediatamente o ano a que se refere a candidatura;
c) Referirem-se a disciplinas homólogas das provas de ingresso.
2 – Consideram-se homólogas as disciplinas que, ainda que com denominações diferentes, tenham nível e objectivos idênticos e conteúdos similares aos do programa da prova de ingresso que visam substituir.
3 – Cabe a cada estabelecimento de ensino superior decidir, através do seu órgão legal e estatutariamente competente, acerca da aplicação do previsto no n.º 1 a um ou mais dos seus cursos.
4 – A classificação dos exames a que se refere o n.º 1 na sua utilização como provas de ingresso é a atribuída nos termos das normas que os regulam convertida para a escala de 0 a 200.
5 – Os estudantes que pretendam beneficiar do disposto no presente artigo não podem recorrer às provas de ingresso a que se refere o artigo 19.º quando tenham realizado exames de disciplinas homólogas dessas provas que satisfaçam o disposto no n.º 1.
6 – Compete à CNAES:
a) Regulamentar a aplicação do disposto no presente artigo;
b) Homologar as decisões a que se refere o n.º 3.
7 – Compete ainda à CNAES, considerando o parecer do serviço competente do Ministério da Educação:
a) Decidir acerca da homologia a que se refere o n.º 2, designadamente aprovando tabelas de correspondência;
b) Fixar as regras para a conversão de classificações a que se refere o n.º 4.
8 – As decisões a que se referem os n.os 3, 6 e 7 são proferidas e divulgadas até 31 de Maio do ano que antecede o ano de realização da candidatura.”

Do capítulo IV (selecção e seriação) importa destacar o artigo que incide sobre a seriação:
«Artigo 26.º
Seriação
A seriação dos candidatos a cada curso em cada estabelecimento é realizada com base numa nota de candidatura, cuja fórmula é fixada pelo órgão legal e estatutariamente competente do estabelecimento de ensino superior, a qual integra exclusivamente:
a) A classificação final do ensino secundário, com um peso não inferior a 50%;
b) A classificação da ou das provas de ingresso, com um peso não inferior a 35%;
c) A classificação dos pré-requisitos de seriação, quando exigidos, com um peso não superior a 15%.»

Esta redacção inicial veio a ser alterada pelo Decreto-Lei n.º 26/2003, de 7 de Fevereiro, que lhe acrescentou os seguintes n.os 2 a 6, passando a ter a seguinte redacção, presentemente em vigor:
«Artigo 26.º
Seriação
1 – A seriação dos candidatos a cada curso em cada estabelecimento é realizada com base numa nota de candidatura, cuja fórmula é fixada pelo órgão legal e estatutariamente competente do estabelecimento de ensino superior, a qual integra exclusivamente:
a) A classificação final do ensino secundário, com um peso não inferior a 50%;
b) A classificação da ou das provas de ingresso, com um peso não inferior a 35%;
c) A classificação dos pré-requisitos de seriação, quando exigidos, com um peso não superior a 15%.»
2 – Para este fim, a classificação final do ensino secundário dos cursos portugueses é calculada nos termos das normas legais aplicáveis a cada caso, até às décimas, sem arredondamento, e convertida para a escala de 0 a 200.
3 – Para este fim, a classificação final do ensino secundário dos cursos não portugueses legalmente equivalentes ao ensino secundário português, bem como dos cursos a que se refere a parte final do artigo 41.º, é a atribuída nos termos das normas que as regulam, convertida para a escala de 0 a 200 nos termos de regras fixadas por despacho do Ministro da Educação.
4 – A classificação das provas de ingresso a que se refere a alínea a) do artigo 19.º é atribuída na escala de 0 a 200.
5 – A classificação dos exames nacionais do ensino secundário é atribuída na escala de 0 a 200.
6 – A classificação dos pré-requisitos de seriação é atribuída na escala de 0 a 200.»


4. Conforme anteriormente referimos, o n.º 3 do artigo 63.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovada pela Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro, determina que cabe ao Governo definir o modelo de equivalência entre os estudos, graus e diplomas do sistema educativo português e os de outros países e criar condições que facilitem aos jovens já regressados a Portugal, filhos de emigrantes a sua integração no sistema educativo português.

Tal objectivo foi alcançado com o Decreto-Lei n.º 219/97, de 20 de Agosto[18], o qual, segundo o respectivo preâmbulo, «pretende, (...) assumir-se como um contributo para a construção de uma nova filosofia em matéria de concessão de equivalência ou reconhecimento de habilitações, estudos e diplomas de sistemas educativos estrangeiros a habilitações, estudos e diplomas portugueses nos níveis de ensino básico e secundário que, por um lado, dê resposta aos imperativos decorrentes da Lei de Bases do Sistema Educativo, e, por outro, defina grandes critérios orientadores em tal domínio (...)».

Este diploma encontra-se dividido nos seguintes capítulos:

Capítulo I – Disposições gerais (artigos 1.º e 2.º);
Capítulo II – Da concessão das equivalências (artigos 3.º a 8.º);
Capítulo III – Reconhecimento de estudos e diplomas (artigos 9.º a 13.º);
Capítulo IV – Disposições finais (artigos 14.º a 20.º).

Nomeadamente, mostram-se pertinentes, os seguintes dispositivos:
«Artigo 2.º
Efeitos da equivalência
1 – A equivalência pode ser concedida para efeito de prosseguimento de estudos, para ingresso ou acesso nas carreiras da Administração Pública, para fins militares ou para outros fins em que o requerente demonstre interesse legítimo, que deve constar do despacho que deferiu o pedido.
2 – (...)».
«Artigo 3.º[19]
Princípios gerais
1 – A equivalência de habilitações não pressupõe integral semelhança de estruturas curriculares e conteúdos programáticos entre os correspondentes anos de escolaridade, mas apenas paralelismo na formação global obtida através da respectiva conclusão com aproveitamento.
2 – No ensino básico (...).
3 – No ensino secundário a equivalência é concedida com a atribuição de uma classificação que será calculada a partir da conversão da classificação final do curso realizado no estrangeiro, ou na falta desta, com base na média de qualquer dos anos intermédios.
4 – Não havendo possibilidade de obter os elementos referidos nos números anteriores, a classificação será de 10 valores, caso se trate de classificação final de curso, ou sem média, tratando-se de um ano intermédio.
(...)».
«Artigo 5.º
Tabelas de equivalências
1 – As equivalências constam de tabelas, organizadas por especificidades dos cursos de cada país, conforme consta do anexo II ao presente diploma e do qual faz parte integrante.
2 – As equivalências reportadas a habilitações não constantes das tabelas ou as adquiridas em país estrangeiro em relação ao qual o anexo II não integre a respectiva tabela são concedidas caso a caso.
3 – Por portaria conjunta dos Ministros dos Negócios Estrangeiros e da Educação podem ser definidas novas tabelas de equivalências.»

«Artigo 6.º
Competências
1 – (...).
2 – A concessão de equivalências destinadas ao prosseguimento de estudos nos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico ou no ensino secundário é da competência do presidente do conselho directivo, do director executivo ou do director pedagógico, conforme o caso, desde que o estudante pretenda ingressar num estabelecimento do ensino oficial ou num estabelecimento do ensino particular e cooperativo dotado de autonomia pedagógica.
(...)»[20].


5. Para o ano lectivo de 2003-2004, para além dos diplomas legais acabados de enunciar, foi publicado o Regulamento do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior Publico para a Matrícula e Inscrição no ano Lectivo de 2003-2004[21].

A referida Portaria é composta de sete capítulos, a saber:

Capítulo I – Disposições gerais (artigos 1.º a 5.º);
Capítulo II – Candidatura (artigos 6.º a 33.º);
Capítulo III – Seriação (artigos 34.º a 36.º);
Capítulo IV – Colocação (artigos 37.º a 41.º);
Capítulo V – 2.ª fase do concurso (artigos 42.º a 46.º);
Capítulo VI – 3.ª fase do concurso (artigos 47.º a 54.º);
Capítulo VII Matrícula e inscrição (artigos 55.º a 58.º);
Capítulo VIII – Disposições comuns (artigos 59.º a 64.º).

Logo no capítulo I mostram-se pertinentes os artigos 4.º e 5.º:
«Artigo 4.º
Validade do concurso
O concurso é válido apenas para o ano em que se realiza.»
«Artigo 5.º
Condições gerais de apresentação ao concurso
Pode apresentar-se ao concurso o estudante que satisfaça cumulativamente as seguintes condições:
a) Ser titular de um curso de ensino secundário ou de habilitação legalmente equivalente concluído até ao ano lectivo de 2002-2003, inclusive;
b) Fazer prova de capacidade para a frequência do ensino superior.»

Interessa, também, no capítulo II (candidatura), o artigo 29.º, que preceitua o seguinte:
«Artigo 29.º
Instrução do processo de candidatura – Candidatos que pretendam a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 296-A/98 (na sua redacção inicial)
1 – Os candidatos que, nos termos do n.º 2 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 296-A/98 (na sua redacção inicial), pretendam substituir as provas de ingresso por exames finais de cursos não portugueses legalmente equivalentes aos cursos de ensino secundário português, devem entregar:
a) Requerimento a formular em impresso de modelo fixado por despacho do director-geral do Ensino Superior, solicitando a aplicação do regime fixado pelo n.º 2 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 296-A/98 (na sua redacção inicial) e indicando quais os pares estabelecimento/curso e provas de ingresso a abranger tal aplicação;
b) Em substituição do documento a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 23.º[22], documento emitido pela entidade competente do país a que respeita a habilitação do ensino secundário não português, indicando:
b1) A classificação final do curso,
b2) As classificações obtidas, no ano lectivo de 2002-2003, nos exames finais desse curso que pretendem que substituam as provas de ingresso, de acordo com os n.os 3.º, 4.º e 5.º da deliberação n.º 180/2002 (2.ª série), de 28 de Fevereiro, e 1.º da deliberação n.º 769/2002 (2.ª série), de 2 de Maio, da Comissão Nacional de Acesso ao Ensino Superior;
c) Documento comprovativo da equivalência do curso referido na alínea b) ao curso de ensino secundário português, emitido pela entidade legalmente competente para atribuição da equivalência, incluindo a classificação final do curso na escala em uso no ensino secundário português.
2 – Estão dispensados da entrega do documento a que se refere a alínea c) do número anterior os titulares de curso cuja equivalência ao ensino secundário português e método de conversão da classificação tenha sido objecto de norma genérica publicada no Diário da República.
3 – Compete ao director-geral do Ensino Superior:
a) Decidir quanto ao requerimento referido na alínea a) do n.º 1;
b) Fixar a classificação a atribuir às provas de ingresso substituídas pelos exames finais do curso não português, convertendo a classificação original numa classificação na escala de 0 a 200, de acordo com tabelas de conversão que aprova.»


6. No ano lectivo seguinte foi publicado o respectivo Regulamento do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior Publico para a Matrícula e Inscrição no Ano Lectivo de 2004- -2005[23].

A referida Portaria é composta de sete capítulos, a saber:

Capítulo I – Disposições gerais (artigos 1.º a 5.º);
Capítulo II – Candidatura (artigos 6.º a 33.º);
Capítulo III – Seriação (artigos 34.º a 36.º);
Capítulo IV – Colocação (artigos 37.º a 41.º);
Capítulo V – 2.ª fase do concurso (artigos 42.º a 46.º);
Capítulo VI – Matrícula e inscrição (artigos 47.º a 51.º);
Capítulo VII – Disposições comuns (artigos 52.º a 57.º).

Logo no capítulo I mostram-se pertinentes os artigos 4.º e 5.º:
«Artigo 4.º
Validade do concurso
O concurso é válido apenas para o ano em que se realiza.»
«Artigo 5.º
Condições gerais de apresentação ao concurso
Pode apresentar-se ao concurso o estudante que satisfaça cumulativamente as seguintes condições:
a) Ser titular de um curso de ensino secundário ou de habilitação legalmente equivalente concluído até ao ano lectivo de 2003-2004, inclusive;
b) Fazer prova de capacidade para a frequência do ensino superior.»

Interessa, também, no capítulo II (candidatura), o artigo 29.º, que preceitua o seguinte:
«Artigo 29.º
Instrução do processo de candidatura – Candidatos que pretendam a aplicação do disposto no artigo 20.º-A do Decreto-Lei n.º 296-A/98
1 – Os candidatos que, nos termos do artigo 20.º-A do Decreto-Lei n.º 296-A/98, pretendam substituir as provas de ingresso por exames finais de cursos não portugueses legalmente equivalentes aos cursos de ensino secundário português, devem entregar:
a) Requerimento, a formular em impresso de modelo fixado por despacho do director-geral do Ensino Superior, solicitando a aplicação do regime fixado pelo artigo 20.º-A do Decreto-Lei n.º 296-A/98 e indicando quais os pares estabelecimento/curso e provas de ingresso a abranger com tal aplicação;
b) Em substituição do documento a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 23.º[24], documento emitido pela entidade competente do país a que respeita a habilitação do ensino secundário não português, indicando:
1) A classificação final do curso,
2) As classificações obtidas, no ano lectivo de 2003- -2004, nos exames finais desse curso que pretendem que substituam as provas de ingresso nos termos do artigo 7.º;
c) Documento comprovativo da equivalência do curso referido na alínea b) ao curso de ensino secundário português, emitido pela entidade legalmente competente para atribuição da equivalência, incluindo a classificação final do curso convertida para a escala de 0 a 200, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 296-A/98.
2 – Estão dispensados da entrega do documento a que se refere a alínea c) do número anterior os titulares de curso cuja equivalência ao ensino secundário português e método de conversão da classificação a que se refere o n.º 3 do artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 296-A/98 tenham sido objecto de norma genérica publicada no Diário da República.
3 – Compete ao director-geral do Ensino Superior:
a) Decidir quanto ao requerimento referido na alínea a) do n.º 1;
b) Proceder à aplicação das tabelas de correspondência e das regras de conversão das classificações aprovadas pela Comissão Nacional de Acesso ao Ensino Superior, nos termos do n.º 7 do artigo 20.º-A do Decreto-Lei n.º 296-A/98.»


6. Finalmente, importa reter os despachos ministeriais referidos anteriormente.

6.1. Em primeiro lugar, temos o Despacho do Ministro da Educação, de 5 de Julho de 2004, que não chegou a ser publicado no «jornal oficial», e mereceu a seguinte redacção:

«Tendo sido efectuados os necessários contactos com entidades representativas do sistema educativo francês, conforme previsto no ponto 2 do Despacho Conjunto n.º 281/2004, de 6 de Maio;
Considerando as competências cometidas à Direcção-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular em matéria de equivalências de habilitações estrangeiras de nível não superior pelo Decreto-Lei n.º 219/97, de 20 de Agosto;
Considerando a revogação dos Despachos n.os 29- -A/SEEI/96, de 31 de Maio, 31/SEEI/96, de 2 de Julho, e 38/SEEI/96, de 2 de Setembro[25];
Considerando que o regime anterior conduziu a injustiças a que urge por cobro;
A Direcção-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular, no âmbito das suas competências, desenvolverá, extraordinária e transitoriamente, no ano lectivo de 2003-2004, um procedimento de equivalências orientado de acordo com as seguintes regras:
1 — No processo de atribuição de equivalência a conceder aos cursos do sistema de ensino francês para efeitos de prosseguimento de estudos no ensino superior português, a classificação é a resultante da média aritmética simples da classificação obtida em cada disciplina.
2 — A classificação de cada disciplina:
a) Nas disciplinas em que não se realizar exame de baccalauréat, é a resultante da média aritmética simples das classificações internas anuais, adiante designada classificação interna final;
b) Nas disciplinas em que se realizar exame de baccalauréat, é a resultante da média aritmética ponderada da classificação interna final com a classificação do exame de baccalauréat, obtida de acordo com a seguinte fórmula:
CD=(7CIF+3BAC)/10
Sendo:
CD= Classificação da disciplina;
CIF= Classificação interna final;
BAC= Classificação do exame de baccalauréat.
3 — A classificação é expressa na escala de 0 a 200.»

6.2. Por sua vez, o Despacho n.º 14759/2004 (2.ª série), de 6 de Julho de 2004[26], também do Ministro da Educação, mereceu o seguinte teor:

« — Considerando o disposto no artigo 3.º, n.º 3, do Decreto- -Lei n.º 219/97, de 20 de Agosto, que regula a equivalência e o reconhecimento de habilitações estrangeiras de nível superior;
Considerando as alterações à orgânica do Ministério da Educação estabelecidas pelo Decreto-Lei n.º 208/2002, de 17 de Outubro;
Considerando a necessidade de clarificar a competência para a concessão de equivalências de habilitações obtidas em escolas estrangeiras sediadas em Portugal, determino o seguinte:
Para efeitos de prosseguimento de estudos no ensino superior, a concessão de equivalências de habilitações obtidas em escolas estrangeiras sediadas em Portugal é da competência do Director-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular.»


7. Da análise dos diversos diplomas legais acabados de recensear constata-se que o acesso e ingresso no ensino superior se alicerça num regime geral e suporta também regimes especiais, regulados no Decreto-Lei n.º 393-A/99, de 2 de Outubro, ressaltando, desde logo, do respectivo preâmbulo, que estes últimos se destinam «a estudantes que reúnem condições habilitacionais e pessoais específicas», os quais, porém, não relevam à economia do presente parecer.

Conforme anteriormente expendemos, o acesso ao ensino superior, segundo o regime geral ou regime-regra, obedece aos seguintes princípios: democraticidade, equidade e igualdade de oportunidades; objectividade dos critérios utilizados para a selecção e seriação dos candidatos; universalidade de regras para cada um dos subsistemas de ensino superior (artigo 12.º, n.os 1 e 2, alíneas a), b) e c) da Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro, na redacção dada pelo artigo 1.º da Lei n.º 115/97, de 19 de Setembro).

Presentemente, na concretização destes princípios, o ingresso no ensino superior só pode ser alcançado através da prestação de provas de ingresso, devidamente reguladas (artigos 16.º a 20.º do Decreto-Lei n.º 296-A/98, de 25 de Setembro, na redacção do Decreto-Lei n.º 26/2003, de 7 de Fevereiro) ou, em sua substituição, através de exames finais, também devidamente disciplinados (artigo 20.º-A, do mesmo diploma).

Adiante veremos se esses princípios, bem como outros, de natureza mais acentuadamente administrativa, foram observados in casu.


IV

1. No que concerne ao ano lectivo de 2003-2004, consolidou-se na ordem jurídica o ingresso da candidata Maria Lobo Antunes no ensino superior, mais concretamente no curso de Biologia Celular e Molecular da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, sua terceira opção, em função dos documentos que apresentou, nomeadamente, no que ora releva, o da classificação final de 19 valores obtida no ensino secundário, conforme certidão emitida pelo Lycée Français Charles Lepierre, depois reconhecida como equivalente ao ensino secundário português, por força do Despacho 31/SEEI/96, de 16 de Junho de 1996[27], bem como o das provas de ingresso, devidamente convertidas, que foram também, pelo menos, implicitamente reconhecidas pela Administração, ao emitir o documento já anteriormente referido no ponto II-3-b).

O diferendo restante e que agora nos ocupa surge em consequência da candidatura da mesma interessada ao concurso nacional de acesso e ingresso no ensino superior público para a matrícula e inscrição no ano lectivo de 2004-2005.

Designadamente, importa apurar se a candidata ao ensino superior público poderia concorrer com a classificação final de 19 valores, em termos idênticos aos do concurso do ano anterior, ou se teria de concorrer com a classificação final de 15 valores, conforme documento emitido ao abrigo do regime de equivalências de habilitações estrangeiras emergente do Decreto-Lei n.º 219/97, de 20 de Agosto, regulamentado pelo Despacho do Ministro da Educação de 5 de Julho de 2004.

Consequentemente, conforme vem expresso no pedido de parecer, importa apurar da legalidade do despacho de concordância do Secretário de Estado da Educação, de 7 de Dezembro de 2004, que incidiu sobre anterior informação e cujo teor não nos dispensamos de voltar a reproduzir:

«1. Quando a recorrente concorreu ao Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior em 2003 foi, pelo Ministério da Educação, emitido um documento no qual se afirma que a mesma concluiu o ensino secundário numa escola estrangeira com a classificação de 19 valores.
2. Acresce que, a recorrente foi, em Setembro de 2003, admitida no Curso de Biologia Celular e Molecular da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova, com base no reconhecimento que o Ministério da Educação efectuou à sua conclusão do ensino secundário.
3. As alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 26/2003, de 7 de Fevereiro ao Decreto-Lei n.º 296-A/98, de 25 de Setembro, em matéria de equivalências (cfr. a nova redacção dada ao n.º 3 do art.º 26.º, bem como o n.º 3 do art.º 3.º daquele Decreto-Lei), não podem ser aplicadas aos alunos que já viram a conclusão dos seus estudos do ensino secundário reconhecidos pelo Ministério da Educação, como é o caso da recorrente.
4. Com efeito, a aplicação deste regime afecta uma situação em que a recorrente dispõe de um título que lhe atribui especial segurança, pretendendo eliminar os efeitos jurídicos produzidos, violando desta forma, o princípio da protecção de confiança a que se reportam o art.º 2.º da CRP e o art.º 6.º-A do Código do Procedimento Administrativo.
5. Face ao acima exposto, é nosso entendimento que o acto em questão deve ser revogado, com as devidas e legais consequências, designadamente quanto ao órgão competente para a emissão da certidão.»

Cumpre ainda recordar que, em 28 de Dezembro de 2004, na sequência do despacho acabado de referir, a Direcção-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular emitiu uma certidão que atribuiu à estudante a classificação final do ensino secundário de 19,0 valores, remetendo-a, depois, através de ofício onde é referido ter sido emitida em substituição da anterior, solicitando a devolução desta, e que, fundada na nova certidão e na fundamentação para a emissão da mesma, a estudante Maria Lobo Antunes requereu, em 20 de Janeiro de 2005, a rectificação da sua colocação, com fundamento em erro dos serviços na emissão da primeira certidão, tendo em vista o disposto quanto a esta matéria no artigo 53.º do Regulamento do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior Público para a Matrícula e Inscrição no Ano Lectivo de 2004-2005.

O restante circunstancialismo fáctico e a legislação em que assentou a respectiva candidatura encontram-se devidamente dilucidados nos elementos oportunamente recenseados.


2. Relativamente ao concurso nacional de acesso e ingresso no ensino superior público para a matrícula e inscrição no ano lectivo de 2004-2005, no que concerne a estudantes titulares de cursos não portugueses legalmente equivalentes ao ensino secundário português, como é o caso da candidata em apreço, importa para já rever o percurso que a mesma seguiu.

Assim, nos termos da alínea a) do artigo 5.º do Regulamento do respectivo concurso, para fazer prova da titularidade de habilitação legalmente equivalente a um curso de ensino secundário português concluído até ao ano lectivo de 2003-2004, inclusive, a candidata muniu-se, primeiramente, de uma certidão emitida pelo director do Departamento do Ensino Secundário, organismo dependente do Ministério da Educação, datada de 31 de Agosto de 2004, onde lhe era atribuída a «equivalência do “Baccalauréat Général” do Lycée Français Charles Lepierre ao 12.º Ano do Curso Secundário (Decreto-Lei n.º 286/89, de 29 de Agosto), com a classificação final de QUINZE (15,0) VALORES, para efeitos de prosseguimento de estudos, de acordo com o Decreto-Lei n.º duzentos e dezanove/noventa e sete, de vinte de Agosto».

E nos termos da alínea b) do mesmo artigo 5.º, para fazer prova de capacidade para a frequência do ensino superior, a candidata, para além de ter informado que «no presente ano lectivo não está matriculada em nenhuma escola, tendo efectuado a última matrícula no ano lectivo de 2002/2003 no Liceu Francês Charles Lepierre», requereu e realizou exames do 12.º ano, de Biologia e Química.

Posteriormente, o Ministério da Ciência, Inovação e Ensino Superior – Direcção-Geral do Ensino Superior, «1.ª Fase do Concurso Nacional de Acesso de 2004 – CAE 011», com fundamento no Despacho do Ministro da Educação de 5 de Julho de 2004, considerando as classificações dos exames do ensino secundário realizados, ou seja, 167 em Biologia e 181 em Química, e as classificações finais do ensino secundário, ou seja, 940, de equivalências – escolas estrangeiras em Portugal, 150 de classificação final, relativas ao ano de cálculo de 2002/2003, atribuiu a classificação de 162 como nota de candidatura da interessada aos vários pares estabelecimento/curso.

Inconformada, a candidata reclamou hierarquicamente, e com êxito, conforme o despacho acabado de recordar, pelo qual o Secretário de Estado da Educação revogou o acto que lhe atribuiu a classificação final de 15 valores no ensino secundário, por considerar válida a classificação final de 190 valores com que já concorrera no ano transacto.


3. Como se acabou de evidenciar, a candidata Maria Lobo Antunes, que concluíra o ensino secundário com a classificação final de 190 valores, reconhecida oficialmente, e com a qual concorrera no ano lectivo de 2003-2004 ao ensino superior, viu, no ano seguinte, por acto unilateral da Administração, e sem que tivesse voltado a frequentar o ensino secundário (apenas realizou os exames necessários para fazer prova de capacidade para a frequência do ensino superior), alterada essa classificação final para 150 valores.

E conforme se explanou ao longo do parecer, os concursos nacionais de acesso e ingresso no ensino superior, pelo menos os relativos à matrícula e inscrição nos anos lectivos de 2003-2004 e 2004-2005, eram válidos apenas para o ano em que se realizaram (cfr. artigo 4.º dos respectivos regulamentos).

Para a apresentação ao concurso de 2004-2005 uma das condições a atender era a de o candidato ser titular de um curso de ensino secundário ou de habilitação legal equivalente concluído até ao ano lectivo de 2003-2004, inclusive [cfr. alínea a) do artigo 5.º do respectivo Regulamento].

Concretizando, não era necessário ter concluído o curso de ensino secundário ou equivalente no ano de 2003-2004, necessário era tê-lo concluído até 2003-2004, inclusive.

Realça-se esta questão devido à confusão que por vezes se estabelece com a alínea b2) do n.º 1 do artigo 29.º do mesmo Regulamento, a qual se refere às «classificações obtidas no ano lectivo de 2003-2004, nos exames finais desse curso que pretendem que substituam as provas de ingresso nos termos do artigo 7.º».

Ora, a candidata Maria Lobo Antunes já concluíra o curso de ensino secundário no ano lectivo de 2002-2003, no Lycée Français Charles Lepierre com a classificação final de 19 valores, chancelada pela Academia de Toulouse, e reconhecida oficialmente em Portugal por força do sistema de equivalências então vigente.

Foi com esse curso e essa classificação que concorreu ao ensino superior nos anos lectivos de 2003-2004 e 2004-2005, pois foi essa classificação que se consolidou na sua esfera jurídica, já que desnecessário se tornou concluir de novo o ensino secundário para concorrer ao ensino superior.

3.1. Questão diversa resulta do modo como essa classificação deve ser atendida, particularmente no que concerne à equivalência legal, atribuída pelo órgão administrativo competente.

Esse é um aspecto que, numa primeira análise, caberia na regulamentação do respectivo concurso, o qual, como se acabou de referir, é válido apenas para o ano em que se realiza, havendo que assegurar ano a ano aqueles princípios de democraticidade, equidade e igualdade de oportunidades, objectividade dos critérios utilizados para a selecção e seriação dos candidatos e universalidade de regras para cada um dos subsistemas de ensino superior, que a Lei de Bases do Sistema Educativo erige, no seguimento de comando constitucional anteriormente focado.

Ora, o critério de conversão e de equivalências seguido no ano anterior (o de 2003-2004) foi considerado válido e reconhecido oficialmente pelo órgão competente da Administração, o qual, em consequência atribuiu à referida candidata a classificação final de 19 (ou 19,0, ou 190, como por vezes vem referido) valores, com a qual concorreu ao ensino superior.

Já, porém, no que concerne ao concurso do ano lectivo de 2004-2005 foi alterado o critério de conversão da classificação final do ensino secundário dos cursos não portugueses legalmente equivalentes ao ensino secundário português, na sequência do Decreto-Lei n.º 219/97, de 20 de Agosto (artigo 3.º, n.º 3), e nos termos de regras fixadas por Despacho do Ministro da Educação, por força do n.º 3 do artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 296-A/98, de 25 de Setembro, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 26/2003, de 7 de Fevereiro[28].

Esse Despacho de 5 de Julho de 2004, já anteriormente recenseado no presente parecer[29], que teve, em parte, no seu cerne, as injustiças a que o regime anterior conduzira, segundo as considerações em que se alicerçou, foi seguido na atribuição de equivalência ao curso de ensino secundário concluído pela candidata Maria Lobo Antunes.

Procurando caracterizá-lo, é um despacho que, à partida, é endereçado aos serviços do Ministério da Educação, assumindo, em consequência, natureza e eficácia interna[30].

Verifica-se, porém, que estamos perante um despacho parcialmente inovador, já que, pelo menos no que concerne às tabelas de equivalências de cada disciplina e ao modo como é expressa a classificação, complementa e ultrapassa o diploma habilitante, pelo que a sua eficácia é também externa, assumindo, em consequência, uma natureza mista.

Sucede que, conforme também oportunamente referimos, esse despacho, que definiu as novas tabelas de equivalências, não foi publicado no jornal oficial.

Ora, a Constituição da República Portuguesa[31] estatui no artigo 119.º, n.º 1, que «[s]ão publicados no jornal oficial, Diário da República, (...) h) [o]s decretos regulamentares e os demais decretos e regulamentos do Governo (...).»

É o caso do despacho em apreço que, assumindo natureza normativa externa, carece de publicação[32] na parte B da 1.ª série do Diário da República, nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 3.º da Lei n.º 74/98, de 11 de Novembro, alterada pela Lei n.º 2/2005, de 24 de Janeiro.

Na verdade, a Constituição, como se vê do n.º 2 do já referido artigo 119.º, erige a publicação dos mais importantes diplomas, entre os quais os despachos normativos, no Diário da República, como requisito da respectiva eficácia jurídica.

E como este Conselho já se pronunciou, «[a] publicação destina-se a dar conhecimento, possibilitando-o, aos destinatários das normas, base da obrigatoriedade efectiva das normas jurídicas»[33].

3.2. Quais as consequências da falta de publicação de um acto (despacho, no caso) contrariamente ao que vem consagrado na Lei Fundamental?

A resposta vem no n.º 2 do artigo 119.º da Constituição:

«A falta de publicidade dos actos previstos no número anterior e de qualquer acto de conteúdo genérico dos órgãos de soberania, das regiões autónomas e do poder local, implica a sua ineficácia jurídica.».

Como reconhece pacificamente a doutrina, a falta de publicidade não afecta então a validade do acto, mas apenas a sua eficácia, tornando-o não obrigatório e inoponível em relação a terceiros[34].

Resumindo e concluindo, o Despacho do Ministro da Educação de 5 de Julho de 2004, ao não ter sido publicado no Diário da República, contrariamente ao que determina a Constituição, é ineficaz, embora válido, carecendo, em consequência, de obrigatoriedade e oponibilidade, nomeadamente em relação à candidata que esteve na origem do presente parecer e a outros interessados em situação similar.

3.3. Independentemente da ineficácia do despacho acabado de analisar, sobejaria sempre a questão da sua aplicação retroactiva face a hipotéticos direitos adquiridos ou expectativas dignas de tutela em relação à candidata em apreço.

Como afirma BAPTISTA MACHADO[35], e se discorreu em recente parecer deste Conselho, «a entrada em vigor de uma lei nova ou até de um sistema jurídico inteiramente novo não provoca um corte radical na continuidade da vida social. Há factos e situações que, tendo-se verificado antes da entrada em vigor da lei nova, tendem a continuar no futuro ou a projectar-se nele.

«Para resolver estas situações de transição quanto à lei aplicável e afastar a dúvida sobre se estão sujeitas ao domínio da lei antiga ou se, ao invés, já se encontram sob a autoridade da lei nova a própria lei pode estabelecer disposições transitórias, solucionando as hipóteses que surgem na delimitação de uma e outra lei»[36].

Na falta desse direito transitório, rege o artigo 12.º do Código Civil, que consagra um princípio geral válido no Direito público e no privado:
«Artigo 12.º
Aplicação das leis no tempo. Princípio geral
1. A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.
2. Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.»

Pertinentemente, AFONSO QUEIRÓ[37], em sede de Direito Administrativo, discorre acerca desta questão:

«As leis (e empregamos aqui a expressão no sentido lato de normas jurídicas) têm aplicação imediata, a partir do momento em que entram em vigor, por todo o período da sua eficácia temporal.
Mas a que factos e a que efeitos jurídicos se aplicam as normas administrativas, no período a que se estende a sua eficácia?
Em princípio, as normas de direito administrativas têm aplicação a todos e apenas aos factos ou situações e efeitos jurídicos ocorridos ou verificados no período que decorre da entrada em vigor dessas normas até à cessação da sua vigência. As leis administrativas conjugam-se no futuro e não têm aplicação nem a factos ou situações nem a efeitos verificados fora desse período – não têm, em suma, aplicação retroactiva (não se conjugam no pretérito) nem aplicação ultra-activa.
Este princípio é absoluto no que respeita a comportamentos da administração ou de terceiros, sendo mesmo nulas as normas que ordenem ou permitam uma acção ou uma abstenção no passado, em virtude de isso ser logicamente impossível. Já pelo que toca aos factos ou situações em sentido estrito, as coisas se não passam necessariamente assim. Não há obstáculos lógicos a que uma norma administrativa se aplique também a factos ou situações produzidas antes da sua entrada em vigor e pertençam definitivamente ao passado».

E mais à frente:

«(...) A lei administrativa nova aplica-se, em princípio, aos factos novos e efeitos deles decorrentes (isto é, aos factos novos e efeitos respectivamente verificados e produzidos depois da entrada em vigor dessa lei) e aos factos ou estados de facto de trato sucessivo cuja verificação ainda decorra ao entrar em vigor essa lei, sendo que, neste caso ela se aplica aos efeitos que a partir da entrada em vigor dessa lei se vão produzindo. Quer dizer: as situações de facto de trato sucessivo estão à mercê das leis sucessivas, presumidas mais justas e progressivas. Em casos destes, não é aceitável que a factos ou situações idênticas se aplique direito diferente, à medida que o direito se altere. Assim, em princípio, os sujeitos das relações jurídicas administrativas constituídas a partir de factos de trato sucessivo, iniciados no domínio de uma lei, gozam apenas de expectativas simples de fruírem dos efeitos decorrentes desses factos, com a consistência que tinham em face dessa lei. A lei sucessiva tem, neste campo, em princípio, imediata aplicação, no pressuposto de que a lei nova tutela melhor que a lei anterior o interesse público que à Administração compete prosseguir, e porque esse interesse público requer, sob pena de extrema confusão nas relações jurídicas, uma disciplina uniforme de todas as situações, sem atenção pelo momento em que surgiram. A lei nova não se aplica aos efeitos já consumados no domínio da lei anterior – mas aplica-se, sem se poder falar em retroactividade, aos efeitos que se vão produzindo no período da sua vigência (...)».

Mas alerta, pertinentemente, o autor:

«Este princípio sobre a resolução de conflitos verticais de normas administrativas tem que sofrer – e sofre efectivamente – uma atenuação, pois a lei nova não pode aplicar-se aos efeitos jurídicos ligados a situações de trato sucessivo quando tais efeitos não se podem produzir de acordo com a lei nova ou só se podem produzir, em termos de todo imprevisíveis, substancialmente diferentes, desfavoráveis ou onerosos. Quando as coisas se passam assim, os efeitos, tais como se produziram de acordo com a lei antiga, continuam, perduram ou prolongam-se, no domínio da lei nova, com a contextura e a substância que lhes pertencia de acordo com a lei anterior. Em casos destes, no conflito entre a lei anterior e a lei nova (conflito vertical de normas), a que se aplica é aquela e não esta. Diz-se então que tais efeitos se subjectivaram, se tornaram “direitos adquiridos” contra os quais a lei nova em princípio nada pode. Estes “direitos” situam-se no passado e a lei nova rege ou dispõe para o futuro. Também nestas hipóteses, “sans doute, la loi nouvelle est presumée meileure, mais la securité des situations juridiques anterieurs doit l’emporter» (R.HOUIN). Estas situações não cedem ante o interesse público, perante as exigências do progresso jurídico e em face das imposições das novas concepções sobre a justiça. Isto sob pena de retroactividade da lei nova, a qual, em princípio, é vedada (...)».

Por fim, relevantemente:

«(...) se a aplicação retroactiva de uma norma administrativa redundar numa ofensa, pela instituição de consequências jurídicas gravosas ou desfavoráveis, da confiança dos destinatários num statu quo legislativo que lhes era favorável, tem essa aplicação de se considerar oposta aos princípios do Estado de Direito ou da Legalidade.»

3.4. Acabamos de focar a questão emergente da eventual aplicação retroactiva de uma norma administrativa poder redundar numa ofensa, de consequências jurídicas gravosas ou desfavoráveis, da confiança dos destinatários num statu quo que lhes era favorável.

Nesse caso, mesmo perante as exigências do progresso jurídico e em face das imposições das novas concepções sobre a justiça, a aplicação retroactiva tem de se considerar oposta aos princípios do Estado de Direito ou da legalidade.

Retomando o caso que nos ocupa, deixamos antever, numa primeira análise, que o sistema e as tabelas de equivalência dos cursos do 12.º ano de escolaridade ministrados nas escolas estrangeiras sediadas em Portugal aos cursos nacionais, que estejam em vigor em determinado momento, devem ser aplicadas ao concurso do correspondente ano, o qual, por regra, segundo o respectivo regulamento, é válido apenas para o ano em que se realiza, desse modo se assegurando ano a ano aqueles princípios de democraticidade, equidade e igualdade de oportunidades, objectividade dos critérios utilizados para a selecção e seriação dos candidatos e universalidade de regras para cada um dos subsistemas de ensino superior, que a Lei de Bases do Sistema Educativo erige, no seguimento de comando constitucional anteriormente focado.

Porém, a questão não é assim tão líquida, atendendo a que pode colidir com princípios constitucionais como os que AFONSO QUEIRÓ evidencia, e que são os da segurança jurídica e da protecção da confiança, que numa primeira fase se complementam e depois se projectam na legislação ordinária, nomeadamente no Código do Procedimento Administrativo.

Ora tais princípios podem aparecer violados na situação que nos ocupa, com inerentes reflexos gravosos e desfavoráveis na esfera jurídica da candidata, bem como de outros interessados em situação similar.

Comecemos pela Constituição, que os consagra no comando seguinte:
«Artigo 2.º
Estado de direito democrático
A República Portuguesa é um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democráticas e no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais, que tem por objectivo a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa.»

O princípio constitucional da protecção da confiança projecta-se depois na legislação ordinária, como acabamos de referir, nomeadamente no artigo 6.º-A do Código do Procedimento Administrativo[38]:
«Artigo 6.º-A
Princípio da boa-fé
1 – No exercício da actividade administrativa e em todas as suas formas e fases, a Administração Pública e os particulares devem agir e relacionar-se segundo as regras da boa-fé.
2 – No cumprimento do disposto nos números anteriores, devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face das situações consideradas e, em especial:
a) A confiança suscitada na contraparte pela actuação em causa;
b) O objectivo a alcançar com a actuação empreendida.»

Retomando o aludido comando constitucional que abarca a segurança jurídica e a protecção da confiança, discorrem GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA[39]:

«Na sua vertente de Estado de direito, o princípio do Estado de direito democrático, mais do que constitutivo de preceitos jurídicos, é sobretudo conglobador e integrador de um amplo conjunto de regras e princípios dispersos pelo texto constitucional, que densificam a ideia da sujeição do poder a princípios e regras jurídicas, garantindo aos cidadãos liberdade, igualdade e segurança. Ele abrange, entre outros, (...), a protecção dos direitos, liberdade e garantias (arts. 24.º e segs.) e respectivo regime de protecção (art. 18.º), (...).
Tendo essencialmente uma função aglutinadora e sintetizadora, a regra do Estado de direito democrático, em princípio não produz normas de per si, ou seja, normas que não encontrem tradução em outras disposições constitucionais. Mas não está à partida excluída a possibilidade de colher dele normas que não tenham expressão directa em qualquer outro dispositivo constitucional, desde que elas se apresentem como consequência imediata e irrecusável daquilo que constitui o cerne do Estado de direito democrático, a saber, a protecção dos cidadãos contra a prepotência, o arbítrio e a injustiça (especialmente por parte do Estado). Aí caberão, entre outros: (...), a proibição de leis retroactivas lesivas de direitos ou interesses legítimos dos cidadãos (cfr. art. 18.º-3 e AcTC n.º 93/84 e 71/87), (...)».

GOMES CANOTILHO acrescenta que «[o] homem necessita de segurança para conduzir, planificar e conformar autónoma e responsavelmente a sua vida. Por isso, desde cedo, se consideram os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança como elementos constitutivos do Estado de direito»[40].

E prossegue:

«Estes dois princípios – segurança jurídica e protecção da confiança – andam estritamente associados, a ponto de alguns autores considerarem o princípio da protecção da confiança, como um subprincípio ou como uma dimensão específica da segurança jurídica. Em geral considera-se que a segurança jurídica está conexionada com elementos objectivos da ordem jurídica – garantia de estabilidade jurídica, segurança de orientação e realização do direito – enquanto a protecção da confiança se prende mais com as componentes subjectivas da segurança, designadamente a calculabilidade e previsibilidade dos indivíduos em relação aos efeitos jurídicos dos actos dos poderes públicos. A segurança e a protecção da confiança exigem, no fundo: (1) fiabilidade, clareza, racionalidade e transparência dos actos do poder; (2) de forma que em relação a eles o cidadão veja garantida a segurança nas suas disposições pessoais e nos efeitos jurídicos dos seus próprios actos. Deduz-se já que os postulados da segurança jurídica e da protecção da confiança são exigíveis perante qualquer acto de qualquer poder – legislativo, executivo e judicial».

E culmina:

«As refracções mais importantes do princípio da segurança jurídica são os seguintes: (1) relativamente aos actos normativos – proibição de normas retroactivas restritivas de direitos ou interesses juridicamente protegidos; (2) em relação a actos da administração – tendencial estabilidade dos casos decididos através de actos administrativos constitutivos de direitos».

A questão prende-se então com direitos ou interesses juridicamente protegidos e actos administrativos constitutivos de direitos, neles cabendo os direitos adquiridos, podendo mesmo abarcar, por vezes, expectativas dignas de tutela.

O Tribunal Constitucional[41] tem-se debruçado sobre a temática do princípio da protecção da confiança, em termos, por exemplo, como os que seguem:

«O princípio da protecção da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito democrático especificamente acolhido no artigo 2.º da Constituição, além de fundamentar o princípio da não retroactividade das leis penais e em geral das leis restritivas dos direitos, liberdades e garantias (artigos 29.º e 18.º, n.º 3 da Constituição), justifica a inconstitucionalidade de quaisquer normas retroactivas lesivas de direitos e expectativas dos cidadãos, ao menos quando a retroactividade se mostrar ostensivamente irrazoável.
Por força deste princípio, resulta constitucionalmente garantido um mínimo de certeza nos direitos das pessoas e nas suas expectativas juridicamente criadas e, consequentemente, garantida também a confiança dos cidadãos e da comunidade na tutela jurídica.
Sempre que as normas retroactivas violam de forma intolerável a segurança jurídica e a confiança que os cidadãos e a comunidade hão-de depositar na ordem normativa que os rege, confiança materialmente justificada no reconhecimento da situação jurídica ou das suas consequências, poderá então falar-se de retroactividade constitucionalmente ilegítima».

3.5. A temática dos direitos adquiridos e das expectativas dignas de tutela, com apelo ao princípio da confiança ínsita na ideia de Estado de Direito democrático expressa no artigo 2.º da Constituição, tem sido frequentemente objecto de análise deste corpo consultivo, através, por exemplo, da seguinte pronúncia[42]:

«O conceito de direitos adquiridos tem sido construído como instrumento de garantia da esfera jurídica dos destinatários dos ordenamentos jurídicos face à sucessão de normas no tempo ou à concorrência de normas no espaço (...).
Grosso modo, tem como subjacente a ideia de que tudo aquilo que se radicou na esfera jurídica com um certo grau de firmeza à sombra de certo ordenamento, deve ser respeitado por ordenamento diferente.
Tem sido, porém, acentuada a controvérsia na dogmática jurídica quanto à densificação do conceito, abundando a diversidade de critérios para o distinguir de outras realidades, nomeadamente no que se designa por simples expectativas jurídicas (...).
De todo o modo, construindo o conceito como instrumento de garantia nos casos de sucessão de regimes legais, para temperar, no plano subjectivo, os efeitos da retroactividade (autêntica ou imprópria) do regime legal posterior, o plano da confiança, ou da protecção da confiança constitui um elemento permanente de referência na concretização e integração do conceito (...).
Rigorosamente, na técnica jurídica, quando se fala em direito adquirido tem-se em vista o título aquisitivo desse direito e não o seu próprio conteúdo (...).
O conteúdo do direito desdobra-se em situações jurídicas objectivas ou poderes legais, criados imediatamente pela lei e que, consequentemente, acompanham todas as modificações da lei criadora sem que haja ofensa do princípio da não retroactividade.
Tratando-se, porém, do título aquisitivo do direito, poder-se-á dizer que se subjectivizou uma determinada situação jurídica (situação jurídica subjectiva) no uso dos poderes legais, dizendo-se, em consequência disso, adquirido um direito.
O que interessa para a subjectividade é o título aquisitivo e não o conteúdo do direito (...): são as situações jurídicas que se constituíram (definitivamente), e não as situações jurídicas objectivas não derivadas de actos de vontade ou poderes legais previstas e criadas imediatamente pela lei (...)».

De igual modo, «[o] Tribunal Constitucional tem considerado que só a afectação inadmissível, arbitrária ou demasiadamente onerosa de expectativas jurídicas é susceptível de ofender o princípio da confiança, pronunciando-se nos termos assim sintetizados em recente acórdão[43]/[44]»:

«O Tribunal Constitucional tem reiteradamente afirmado, em inúmeros acórdãos (...) que o princípio do Estado de direito democrático (consagrado no artigo 2.º da Constituição) postula “uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na actuação do Estado, o que implica um mínimo de certeza e de segurança no direito das pessoas e nas expectativas que a elas são juridicamente criadas” razão pela qual “a normação que, por sua natureza, obvie de forma intolerável, arbitrária ou demasiado opressiva àqueles mínimos de certeza e segurança que as pessoas, a comunidade e o direito têm de respeitar, como dimensões essenciais do Estado de direito democrático, terá de ser entendida como não consentida pela lei básica”.
E, no Acórdão n.º 287/90, o Tribunal Constitucional procurou concretizar quando ocorria uma afectação inadmissível, arbitrária ou demasiadamente onerosa, de expectativas jurídicas, apontando dois critérios:
“a) A afectação de expectativas, em sentido desfavorável, será inadmissível quando constitua uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas dele constantes não possam contar; e ainda
b) Quando não for ditada pela necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente protegidos que devam considerar-se prevalecentes (...).
Mais recentemente no Acórdão n.º 24/98 (Diário da República, II-Série, de 19 de Fevereiro de 1998) acrescentou-se ainda que “(...) aqueles dois critérios, atinentes à existência de uma afectação de expectativas constitucionalmente inadmissível, por ser arbitrária ou demasiadamente onerosa, assentam justamente num pressuposto: o pressuposto da consistência das expectativas sobre que incide a controvertida alteração legislativa. Sem expectativas consistentes desqualifica-se o problema da protecção da confiança. Então impõe-se a liberdade do legislador e a auto-revisibilidade que lhe vai ligada”.
Em suma: da anterior jurisprudência do Tribunal Constitucional decorre (...) que não é suficiente que se demonstre que um novo regime legal vem afectar expectativas dos seus destinatários para que, automaticamente, se conclua pela sua inconstitucionalidade por violação do referido princípio da confiança jurídica. Essencial é ainda que “essas expectativas sejam consistentes de modo a justificar a protecção da confiança e, por outro, que na ponderação dos interesses público e particular em confronto, aquele tenha de ceder perante o interesse individual sacrificado, o que acontecerá sempre que as alterações não forem motivadas por interesse público suficientemente relevante face à Constituição (cf. o artigo 18.º, n.os 2 e 3), caso em que deve considerar-se arbitrário o sacrifício excessivo da frustração de expectativas».


4. Depois deste extenso mas necessário excurso pela doutrina e pela jurisprudência é tempo de repensarmos a situação a que deu azo a admissão da candidata Maria Lobo Antunes ao concurso do ensino superior público no ano lectivo de 2004-2005.

Ao candidatar-se a esse concurso a interessada muniu-se de diploma francês de «baccalauréat», que concluíra no ano lectivo de 2002-2003, equivalente, nos termos legais, ao ensino secundário português, e do qual constava a respectiva classificação final.

A tal classificação foi atribuída idêntica equivalência pelo órgão então competente, que foi aceite e reconhecida para efeitos do concurso em referência, sendo, depois, em face dela, que a candidata foi colocada no ensino superior. Ou seja, o próprio Ministério da Ciência e do Ensino Superior, para efeitos de acesso ao ensino superior, reconheceu que a candidata em apreço obtivera a classificação final de 19 valores no ensino secundário, no ano lectivo de 2003-2004.

Ora, não será que ao reconhecer oficialmente esse direito também no concurso do ano lectivo de 2004-2005 o órgão competente ponderou que, de outro modo, a situação jurídica poderia «redundar numa ofensa, pela instituição de consequências jurídicas gravosas ou desfavoráveis, da confiança dos destinatários num statu quo legislativo que lhes era favorável», como alerta AFONSO QUEIRÓ?

E não será também de considerar que tal reconhecimento mais não é do que o título aquisitivo de um direito, subjectivando uma determinada situação jurídica, assim se concretizando, enfim, num direito adquirido?

É certo que poderão surgir situações aparentemente injustas, evidenciadas, inclusive, nos considerandos que antecedem o Despacho do Ministro da Educação de 5 de Julho de 2004, quando se confrontam casos como o da candidata em apreço com outros de eventuais candidatos que concluíram o ensino secundário em situação similar, mas em ano posterior, e pretendem aceder ao ensino superior, já sujeitos às novas tabelas de equivalências.

Porém, essas situações serão de injustiça meramente aparente e não de injustiça, como acabamos de acentuar, porque «não cedem ante o interesse público, perante as exigências do progresso jurídico e em face das imposições das novas concepções sobre a justiça»[45].

Anote-se, ainda, que em situações como aquela com que ora nos confrontamos, determinado interessado, ao concluir o ensino secundário com certa classificação, cuja equivalência para efeitos de acesso ao ensino superior público foi reconhecida pelo órgão competente, concluirá pela desnecessidade, a partir de então, da repetição de exames, uma vez que as inerentes consequências legais ficaram devidamente salvaguardadas, conforme decorre do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 219/97, de 20 de Agosto, que ao dispor sobre os efeitos da equivalência, prescreve que esta não é apenas concedida para efeito de prosseguimento de estudos mas, também, para ingresso ou acesso nas carreiras da Administração Pública, para fins militares ou para outros fins em que o requerente demonstre interesse legítimo.

Ora, como nos últimos casos referidos, em que não é sequer necessário requerer novamente o exame do 12.º ano, também em posterior concurso de acesso ao ensino superior não parece razoável que o interessado tenha que se munir de nova certidão sempre que tenha que a utilizar nessa conformidade, já que o primitivo acto o constituiu no correspondente direito.

Acresce, no que concerne às condições para a candidatura ao ensino superior, que o legislador se satisfazia com a titularidade de um curso de ensino secundário ou de habilitação legalmente equivalente concluído até determinado ano, inclusive, e não concluído no ano imediatamente anterior.

Condição, enfim, que sempre permitiria a atribuição do grau de equivalência no ano da conclusão do ensino secundário.

Sendo que, a atribuição, ano a ano, em função de alterações legislativas, de diverso grau de equivalência acarretaria para o candidato uma permanente insegurança expectante.

Pelo que se acabou de expor, a resposta às dúvidas anteriormente equacionadas não poderá deixar de ser afirmativa, num Estado de direito democrático, onde tem consagração constitucional a garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais.

Na verdade, mais do que uma expectativa consistente, deparamos com um verdadeiro direito adquirido através de um acto constitutivo de direitos, suficientemente merecedor de segurança jurídica e protecção da confiança.

Acresce que, na ponderação dos interesses público e particular em confronto, o primeiro, in casu, deve ceder perante o interesse individual sacrificável, já que as alterações legislativas em apreço não consubstanciam um interesse público suficientemente relevante face à Constituição, para produzir o sacrifício da frustração de expectativas, o qual se revelaria excessivo.

Em suma, resta concluir que a equivalência concedida pela entidade competente, para efeitos de classificação final nos exames finais do 12.º ano de escolaridade ministrados em estabelecimento de ensino estrangeiro sediado em Portugal, ao abrigo do Despacho n.º 31/SEEI/96, de 12 de Junho de 1996, que para os devidos efeitos legais é equivalente ao ensino secundário português, integra um acto constitutivo de direitos para efeitos de concurso ao ensino superior público.



V


1. É tempo de retomarmos a análise do despacho cuja legalidade se questiona.

Sabemos que o acto administrativo pode padecer de variados vícios, designadamente usurpação de poder, incompetência, vício de forma, violação de lei, ou desvio de poder, correspondendo os dois primeiros à ideia de ilegalidade orgânica, o terceiro à ideia de ilegalidade formal, e os dois últimos à de ilegalidade material[46].

Ora, com a análise do despacho em crise constata-se que ele acolheu exactamente a solução que vimos preconizando ao longo do parecer.

Consequentemente, o Despacho do Secretário de Estado da Educação, de 7 de Dezembro de 2004, que considera que determinada candidata ao ensino superior concluiu o ensino secundário numa escola estrangeira com a classificação e correspondente equivalência de 19 valores, já anteriormente reconhecida, não padece de qualquer vício, mostrando-se válido.

Sendo válido, conduz à revogação de anterior acto administrativo que atribuiu à mesma candidata a classificação final de 15 valores, o que permite à Administração, se assim o entender, com fundamento em «erros dos serviços», que o artigo 53.º do Regulamento do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior Público para a Matrícula e Inscrição no Ano Lectivo de 2004-2005 contempla, a colocação no curso e estabelecimento em que teria sido colocada na ausência do erro, mesmo que para esse fim seja necessário criar vaga adicional.


2. É também objecto da consulta a questão de saber se, no caso de este Conselho Consultivo se pronunciar, como se pronuncia, pela legalidade do Despacho do Secretário da Educação, de 7 de Dezembro de 2004, deverá o serviço competente do agora denominado Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior alterar a colocação de outros candidatos, já colocados no âmbito do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso, relativo ao ano lectivo de 2004-2005, que ocorreram em idênticas circunstâncias.

O princípio da igualdade, que o artigo 13.º da Constituição consagra, designadamente ao igualar os cidadãos perante a lei, e ao proibir o arbítrio, exige uma resposta que não poderá deixar de ser afirmativa, desde que, em casos similares, os interessados tenham requerido nessa conformidade.



VI


Em face do exposto formulam-se as seguintes conclusões:

1.ª – A equivalência oportunamente concedida pela entidade competente, para efeitos de classificação final nos exames finais do 12.º ano de escolaridade ministrado em estabelecimento de ensino estrangeiro sediado em Portugal, ao abrigo do Despacho n.º 31/SEEI/96, de 12 de Junho de 1996, que, nos termos da lei, é equivalente ao ensino secundário português, é um acto constitutivo de direitos para efeitos de concurso ao ensino superior público;

2.ª – Consequentemente, na candidatura ao ensino superior público, no ano lectivo seguinte, para além da necessidade da prova de capacidade para a frequência do ensino superior, é suficiente fazer prova da titularidade de curso do ensino secundário e respectiva equivalência da classificação final da candidatura e reconhecimento oficial no concurso do ano lectivo anterior;

3.ª – O Despacho do Secretário de Estado da Educação, de 7 de Dezembro de 2004, proferido em consonância com as conclusões antecedentes, não padece de quaisquer vícios, pelo que é um acto válido;

4.ª – Verifica-se erro dos serviços, nos termos do n.º 1 do artigo 53.º do Regulamento do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior Público para a Matrícula e Inscrição no Ano Lectivo de 2004-2005, aprovado pela Portaria n.º 845/2004, de 16 de Julho, se o Director do Departamento do Ensino Secundário emitiu, para prosseguimento de estudos, certidão de equivalência de classificação final de curso de ensino secundário estrangeiro [«(...) equivalência do “Baccalauréat Génèral” do Lycée Français Charles Lepierre, ao 12.º Ano do Curso Secundário (Decreto-Lei n.º 286/89, de 29 de Agosto), com a classificação final de QUINZE (15,0) VALORES»], em desconformidade com equivalência anteriormente atribuída;

5.ª – O serviço competente do agora denominado Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior deverá alterar a colocação de outros candidatos que já tenham sido colocados em idênticas circunstâncias, no âmbito do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior Público para a Matrícula e Inscrição relativo ao ano lectivo de 2004-2005, desde que os interessados tenham requerido nessa conformidade.







[1] Ofício datado 5 de Fevereiro de 2005, que deu entrada na Procuradoria-Geral da República no dia 23 seguinte, tendo sido distribuído no dia 3 de Março.
[2] Ministério da Ciência, Inovação e do Ensino Superior.
[3] Datado de 14 de Março de 2005, e subscrito pela Chefe de Gabinete da Ministra da Ciência, Inovação e Ensino Superior.
[4] Com carimbo de entrada datado de 14 de Março de 2004.
[5] Este diploma, proveniente do Ministère des Affaires Étrangères, Agence pour l’Enseignement Français à l’Étranger, Lycée Français Charles Lepierre, foi emitido em Lisboa, no dia 21 de Julho de 2003, na sequência da sessão do mês do antecedente mês de Junho, e dele constam, além do mais, os seguintes elementos relevantes:
«Relevé de points obtenus au Baccalauréat et Classification finale en vue de l’accès à l’enseignement supérieur Portugais»;
«Certification des points du Baccalauréat authentifiée par le service culturel de l’Ambassade de France».
[6] Tais restrições derivarão da seguinte informação dos serviços: «verifica o disposto na Deliberação da CNAES n.º 437/2003, nos números 3.º, 4.º e 5.º da Deliberação da CNAES n.º 180/2002, e na Deliberação da CNAES n.º 769/2002».
[7] Convertida nos termos da alínea b) do n.º 3 do artigo 29.º do Regulamento do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior Público para a Matrícula e Inscrição no Ano Lectivo de 2003-2004, aprovado pela Portaria n.º 606/2003, de 21 de Julho, alterada pelas portarias n.os 697/003, de 30 de Julho, e 35/2004, de 12 de Janeiro.
[8] Datados de 11 de Janeiro de 2005, e com o seguinte teor (com alterações de pormenor):
«(...), expõe (...) o seguinte:
1. Uma vez que frequentou o Colégio Alemão do Porto até ao (equivalente) 12.º ano de escolaridade, teve o exponente necessidade de obter junto da Direcção-Geral da Inovação e Desenvolvimento Curricular um certificado de equivalência para efeitos de prosseguimento de estudos e ingresso na Universidade.
2. A equivalência que lhe foi atribuída aos 16 de Agosto de 2004, foi, na opinião do exponente, erradamente calculada, pelo que não se conformando com ela, dela interpôs recurso, (...).
3. Entretanto, foi o exponente notificado, através do ofício (...) da Direcção-Geral da Inovação e Desenvolvimento Curricular, do provimento do recurso e da nova nota de classificação final do Ensino Secundário, que passou de (...) para dezoito vírgula sete (18,7) valores.
4. Assim, apenas agora tem os correctos documentos que lhe atribuem a nota para concorrer ao Ensino Superior.
5. Na sequência desta alteração, considera ter direito a ser colocado no curso (...)».
[9] No cerne dos despachos «Concordo com a informação prestada. À DGIDC para proceder em conformidade com a mesma» do Secretário de Estado da Educação, de 7 de Dezembro de 2004, estiveram informações onde, em síntese, se referem as alterações que sofreu o n.º 3 do artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 296-A/98, de 25 de Setembro, pelo Decreto-Lei n.º 26/2003, de 7 de Fevereiro cuja nova redacção é a seguinte: «a classificação final do ensino secundário dos cursos não portugueses legalmente equivalentes ao ensino secundário português (...), é a atribuída nos termos das normas que os regulam, convertida para a escala de 0 a 200 nos termos de regras fixadas por despacho do Ministro da Educação».
Nessas informações diz-se, seguidamente, que, em 21 de Julho de 2004, já quando os recorrentes haviam realizado os seus exames, foi publicado o Despacho n.º 14523/2004, que determina que a conversão da classificação final do ensino secundário alemão seja feita nos termos da tabela anexa, e que tal regra se aplica aos concursos de acesso e ingresso para matrícula e inscrição no ensino superior no ano lectivo de 2004-2005 e seguintes.
Com essa alteração os interessados não podiam razoavelmente contar. Já que, quando se encontravam nos 10.º e 11.º anos, as médias dos seus colegas eram calculadas como era habitual até então, sendo que as mesmas eram aceites pelos serviços do Ministério da Educação, pelo que determinaram o seu percurso escolar de acordo com as regras que conheciam e que até então estavam a ser aplicadas.
Em consequência, a aplicação do novo regime viola o princípio da protecção de confiança a que se reportam o art. 2.º da CRP e o art.º 6.º-A do Código do Procedimento Administrativo, o qual postula um mínimo de certeza nos direitos das pessoas e nas expectativas que lhe são juridicamente criadas, censurando as afectações excessivamente onerosas com as quais não se poderia razoavelmente contar.
E concluíam os interessados requerendo a revogação do acto administrativo impugnado.
[10] Cfr. a Lei Constitucional n.º 1/2004, de 24 de Julho de 2004, Diário da República, I Série--A, da mesma data, que decretou a sexta revisão constitucional.
[11] Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição revista, Coimbra Editora, 1993, página 373.
[12] Alterada pela Lei n.º 115/97, de 19 de Setembro.
[13] Na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 115/97, 19 de Setembro.
[14] Diploma sucessivamente alterado pelos Decretos-Leis n.os 99/99, de 30 de Março, 26/2003, de 7 de Fevereiro, que republicou o Decreto-Lei n.º 96-A/98, 76/2004, de 27 de Março, e 158/2004, de 30 de Junho.
[15] Na redacção inicial. Este artigo, embora mantendo a redacção inicial do n.º 1, viu alterada a redacção do n.º 2, e acrescentados os n.os 3, 4 e 5, embora sem reflexos na elaboração do parecer.
[16] Nos termos do n.º 3 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 26/2003, de 7 de Fevereiro, «A alteração introduzida pelo presente diploma no Decreto-Lei n.º 296-A/98 através do aditamento do artigo 20.º-A e da nova redacção do artigo 26.º produz efeitos a partir da candidatura à matrícula e inscrição no ensino superior no ano lectivo de 2004-2005.»
[17] Pela Deliberação n.º 1062/2003, de 29 de Abril de 2003, publicada no Diário da República, II série, n.º 168, de 23 de Julho de 2003, alterada pela Rectificação n.º 603/2004, de 24 de Fevereiro de 2004, Diário da República, II Série, n.º 71, de 24 de Março de 2004, foi «aprovado o regulamento da aplicação do disposto no artigo 20.º-A do Decreto-Lei n.º 296-A/98...», o qual, de harmonia com o n.º 1 do artigo 2.º «aplica-se para a candidatura à matrícula e inscrição a partir do ano lectivo de 2004-2005, inclusive, nas instituições de ensino superior que, através dos seus órgãos legal e estatutariamente competentes, tenham determinado a aplicação do disposto no n.º 1 do artigo 20.º-A do Decreto-Lei n.º 296-A/98 (...)».
[18] Rectificado pela declaração de Rectificação n.º 15-D/97, de 30 de Setembro, Diário da República, I série, n.º 191, de 20 de Agosto de 1997.
[19] Com incidência no n.º 3 deste artigo 3.º, o Ministro da Educação fez publicar o Despacho n.º 14759/2004 (2.ª série), de 6 de Julho de 2004, Diário da República, II Série, n.º 172, de 23 de Julho de 2004, que adiante reproduziremos, o qual atribuiu competência ao Director-Geral da Inovação e Desenvolvimento Curricular para a concessão de equivalências de habilitações obtidas em escolas estrangeiras sediadas em Portugal.
[20] A questão das competências só veio a ser alterada pelo Decreto-Lei n.º 208/2002, de 17 de Outubro, que aprovou a orgânica do Ministério da Educação, o qual, na alínea f) do n.º 5 do artigo 14.º, atribui competência à Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular (DGIDC, doravante), para «[c]ertificar habilitações e decidir os processos de equivalências dos alunos».
Porém, o artigo 35.º do mesmo diploma não atribui efeito retroactivo à referida transferência de competências, ao dispor:
«Artigo 35.º
Regulamentação
1 – Sem prejuízo do disposto no n.º 17 do artigo 17.º e no n.º 5 do artigo 31.º, a organização e competências dos serviços centrais e regionais, referidos nos artigos 5.º e 6.º, constam de decretos regulamentares, a aprovar no prazo de 120 dias após a entrada em vigor do presente diploma.
2 – Até à entrada em vigor dos diplomas regulamentares previstos no número anterior, os órgãos e serviços do ME continuam a reger-se pelas disposições normativas actualmente em vigor.
(...)».
Ora, apesar do prazo de 120 dias acabado de referir (cfr. o n.º 1 do artigo 35.º), o certo é que o diploma que aprovou a estrutura orgânica do DGIDC, ou seja, o Decreto Regulamentar n.º 17/2004, só veio a ser publicado em 28 de Abril de 2004, e, por conseguinte, só após a sua entrada em vigor é que passou a reger as respectivas competências.
[21] Aprovado pela Portaria n.º 606/2003, de 21 de Julho, Diário da República, I-B Série, n.º 166, de 21 de Julho de 2003, alterada pelas Portarias n.os 697/2003, de 30 de Julho, Diário da República, I-B Série, n.º 174, de 30 de Julho de 2003, e 35/2004, de 12 de Janeiro, Diário da República, I-B Série, n.º 9, de 12 de Janeiro de 2004.
[22] O artigo 23.º, n.º 1, alínea c) diz o seguinte:
«1 – O processo de candidatura deve ser instruído com:
(...);
c) Documento comprovativo da titularidade do curso de ensino secundário e da respectiva classificação e das classificações obtidas nos exames nacionais do ensino secundário correspondentes às provas de ingresso exigidas para ingresso nos pares estabelecimento/curso a que concorre.»
[23] Aprovado pela Portaria n.º 845/2004, de 16 de Julho, Diário da República, I-B Série, n.º 166, de 16 de Julho de 2004, alterada pela Portaria n.º 1198/2004, de 16 de Setembro, Diário da República, I-B Série, n.º 219 1S, de16 de Setembro de 2004.
[24] O artigo 23.º, sob a epígrafe “Instrução do processo de candidatura”, estabelece o seguinte na alínea c) do n.º 1:
«1 – O processo de candidatura deve ser instruído com:
(...);
c) Documento comprovativo da titularidade do curso de ensino secundário e da respectiva classificação e das classificações obtidas nos exames nacionais do ensino secundário correspondentes às provas de ingresso exigidas para ingresso nos pares estabelecimento/curso a que concorre.»
[25] Os Despachos n.os 29-A/SEEI/96 e 38/SEEI/96, publicados no Diário da República, II Série, n.os 156, de 8 de Julho, e 203, de 2 de Setembro, ambos de 1996, mostram-se impertinentes para a questão que nos ocupa.
Pelo contrário, o Despacho n.º 31/SEEI/96, de 12 de Junho de 1996, publicado no Diário da República, II Série, de 2 de Julho de 1996, reza o seguinte:
«Considerando a existência e a natureza dos protocolos estabelecidos entre o Ministério da Educação português e as escolas estrangeiras sediadas em Portugal a seguir discriminadas;
Considerando ainda que esses protocolos impõem a inserção nos currículos dessas escolas de matérias de língua portuguesa e cultura portuguesa;
Considerando que os currículos e programas dos respectivos cursos de 12 anos de escolaridade desenvolvem competências em tudo equivalentes às do ensino secundário português;
Considerando que esses currículos têm sido reconhecidos como equivalentes ao 12.º ano, via de ensino;
Considerando que a generalização do 12.º ano dos currículos criados pelo Dec.-Lei 286/89, de 29-8, impõe a revisão do plano de equivalências;
Considerando ainda que é desejável evitar procedimentos administrativos desnecessários, eliminando a obrigatoriedade de apresentação de requerimento de concessão de equivalência aos alunos diplomados por aqueles cursos:
Assim, ao abrigo do Dec.-Lei 286/89, de 29-8, e no uso das competências delegadas pelo Desp. 20-XIII/ME/95, de 20-11, determino:
Os diplomas de conclusão dos cursos de 12 anos de escolaridade ministrados nas escolas estrangeiras sediadas em Portugal constantes do quadro seguinte são, para todos os efeitos legais, equivalentes ao ensino secundário português (12.º ano):
(...) Baccalauréat (BAC)........ Lycée Français Charles Lepierre (Liceu Francês Charles Lepierre)».
[26] Publicado no Diário da República, II Série, n.º 172, de 23 de Julho de 2004.
[27] Reproduzido na nota 25.
[28] Referimos anteriormente o n.º 3 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 219/97, de 20 de Agosto, segundo o qual «[p]or portaria conjunta dos Ministros dos Negócios Estrangeiros e da Educação podem ser definidas novas tabelas de equivalências.»
[29] Cfr. ponto II-6.1.
[30] Acerca de actos internos podem consultar-se MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, tomo I, 10.ª edição (reimpressão), Almedina, Coimbra, p. 442, e tomo II, p.1332, MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, Direito Administrativo, Volume I, Almedina, Coimbra, pp. 413-414, e FREITAS DO AMARAL, Direito Administrativo, Vol. III, ed. polic., Lisboa, 1989, p. 152, ver, também, o parecer n.º 76/2003, de 10 de Julho de 2003.
[31] Cfr. Lei Constitucional n.º 1/2004, de 24 de Julho, que aprovou a sexta revisão constitucional.
[32] «Quando o regulamento dimana de um ministro em nome do seu ministério, e não em nome do Governo da República, estamos perante um despacho normativo», segundo a lição de FREITAS DO AMARAL, com a colaboração de LINO TORGAL, Curso de Direito Administrativo, Almedina, Coimbra, 2003, vol. II, p. 188.
Ainda sobre despachos normativos, podem consultar-se MARCELLO CAETANO, Manual, I vol., 10.ª edição (reimpressão), 1980. p. 107; AFONSO QUEIRÓ, Teoria dos Regulamentos, RDES (2.ª Série), n.º 1, Janeiro/Março de 1986, n.º 1, p. 19, e Direito Administrativo, 1976, p. 471; SÉRVULO CORREIA, Noções do Direito Administrativo, I, Editora Danúbio, Lisboa, 1982, p. 102; MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, ob. e vol. citados, Almedina, Coimbra, 1980, p. 131.
[33] Cfr. parecer n.º 80/89, de 15 de Fevereiro de 1990, Diário da República, II série, n.º 158, de 11 de Julho de 1990.
[34] Cfr., neste sentido, GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, ob. cit., pp. 551-552, e FREITAS DO AMARAL, ob. cit., pp. 195-196.
[35] Introdução ao Discurso Legitimador, 13.ª reimpressão, Almedina, Coimbra, 2001, pp. 219 e seguintes. Sobre a aplicação da lei no tempo, ver, também, MANUEL ANDRADE, «Fontes de Direito, Vigência e Interpretação e aplicação da Lei», Boletim do Ministério da Justiça, n.º 102 (Janeiro 1961), pp. 41 e seguintes; ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, «Da aplicação da lei no tempo e das disposições transitórias», Legislação, Cadernos de Ciência e Legislação, Instituto Nacional da Administração, n.º 7 (Abril/Junho de 1993), pp. 7 e seguintes; NUNES DE CARVALHO, Introdução ao Estudo do Direito, pp. 51 e seguintes; OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito, Introdução e Teoria Geral, Uma Perspectiva Luso-Brasileira, 10.ª edição revista, Almedina, Coimbra, 1997, pp. 537 e seguintes; A. RODRIGUES QUEIRÓ, Lições de Direito Administrativo, vol. I, Coimbra, 1976, pp. 516 e seguintes; MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, ob. e vol. citados, Almedina, Coimbra, 1984, pp. 169-170.
[36] Parecer n.º 66/2004, de 21 de Abril de 2005, que, quanto a este ponto, acompanhou o parecer n.º 11/2003, de 27 de Fevereiro de 2003, Diário da República, II Série, de 5 de Junho de 2003; cfr., também, os pareceres n.os 68/98, de 13 de Janeiro de 2000, 125/2000, de 15 de Fevereiro de 2001, 331/2000, de 17 de Maio de 2001, 135/2001, de 2 de Maio de 2002, e 38/2002, de 26 de Setembro de 2002, todos inéditos.
[37] Ob. e pp. citadas.
[38] Aditado pelo Decreto-Lei n.º 6/96, de 31 de Janeiro, com o objectivo «de consagrar, por forma expressa, a vigência do princípio da boa-fé também no âmbito da actividade administrativa, em todas as suas formas e fases», segundo referem SANTOS BOTELHO, PIRES ESTEVES e CÂNDIDO DE PINHO, Código do Procedimento Administrativo, anotado e comentado, 5.ª edição, Almedina, Coimbra, 2002, p. 112. Segundo o preâmbulo do respectivo diploma, que alterou o Código do Procedimento Administrativo, «[c]onsagra-se expressamente o princípio da boa-fé, implícito na redacção originária do Código, que se tem por indispensável ao enraizamento da confiança nas relações entre os particulares e a Administração».
[39] Ob. cit., p. 63.
[40] Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 6.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2002, pp. 257-258, e 263.
[41] Cfr. acórdão n.º 70/92, de 24 de Fevereiro de 1992, Boletim do Ministério da Justiça, n.º 414, pp. 130-147. No mesmo sentido, o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 287/90, de 30 de Outubro de 1990, Boletim do Ministério da Justiça, n.º 400, pp. 212-231.
[42] Cfr. parecer n.º 77/93, de 16 de Agosto de 1994, Diário da República, II Série, de 12 de Novembro 1994; no mesmo sentido, ver, também, os pareceres n.os 6/88, de 12 de Abril de 1989; 84/93, de 10 de Março de 1994, Boletim do Ministério da Justiça, n.º 434, pp. 6 e seguintes; 90/2003, de 16 de Dezembro de 2004. Na doutrina, entre outros, OLIVEIRA ASCENSÃO, ob. cit., p. 546; PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, Noções Fundamentais de Direito Civil, 6.ª edição, Coimbra Editora, 1965, pp. 200 e seguintes.
[43] Acompanhamos agora o já referido parecer n.º 90/2003, de 16 de Dezembro de 2004.
[44] Acórdão n.º 556/2003, de 12 de Novembro de 2003, Diário da República, II Série, de 7 de Janeiro de 2004.
[45] Cfr. AFONSO QUEIRÓ, ob. e pp. cits.
[46] Cfr., por todos, FREITAS DO AMARAL, ob. cit., vol. II, pp. 382-383.