Parecer do Conselho Consultivo da PGR |
Nº Convencional: | PGRP00003109 |
Parecer: | P000182010 |
Nº do Documento: | PPA01072010001800 |
Descritores: | TAXA DE JUSTIÇA FAZENDA NACIONAL REGULAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS ACÇÃO EXECUTIVA CONCURSO DE CREDORES RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS AGENTE DE EXECUÇÃO SOLICITADOR DE EXECUÇÃO INTERPRETAÇÃO DA LEI |
Área Temática: | DIR ADMIN; DIR CIVIL |
Legislação: | CRP ART13 N1, ART103 N1, ART165 N1 AL I); LGT ART3 N2, ART4 N1 N2, ART5 N1 N2; DL 398/98 DE 1998/12/17; DEC RECT 7-B/99 DE 1999/02/15; L 100/99 DE 1999/07/26; L 3-B/2000 DE 2000/04/04; L 30-G/2000 DE 2000/12/29; L 15/2001 DE 2001/06/05; L 16-A/2002 DE 2002/05/31; DL 229/2002 DE 2002/10/31; DL 320-A/2002 DE 2002/12/30; L 32-B/2002 DE 2002/12/30; DL 160/2003 DE 2003/07/19; L 107-B/2003 DE 2003/12/31; L 55-B/2004 DE 2004/12/30; L 50/2005 DE 2005/08/30; L 60-A/2005 DE 2005/12/30; DL 238/2006 DE 2006/12/20; L 53-A/2006 DE 2006/12/29; L 67-A/2007 DE 2007/12/31; L 19/2008 DE 2008/04/21; L 64-A/2008 DE 2008/12/31; L 94/2009 DE 2009/09/01; L 3-B/2010 DE 2010/04/28; L 53-E/2006 DE 2006/12/29; L 64-A/2008 DE 2008/12/31; L 117/2009 DE 2009/12/29; CPC ART447, ART446 N1 N2, 447-A N1, 447-C N1, 447-D N1 N2, ART455, ART808, ART809, ART864 N3 ALB) N4, ART865, ART867, ART868; DL 34/2008 DE 2008/02/26 ART13 N2; DEC REC 22/2008 DE 2008/04/24; L 43/2008 DE 2008/08/27; DL 181/2008 DE 2008/08/28; L 64-A/2008 DE 2008/12/31; L 3-B/2010 DE 2010/04/28; L 34/2004 DE 2004/07/29; L 47/2007 DE 2007/08/28; PORT 1085-A/2004 DE 2004/08/31; DEC RECT 91/2004 DE 2004/10/21; PORT 288/2005 DE 2005/03/21; L 47/2007 DE 2007/08/28; PORT 1085-B/2004 DE 2004/08/31; PORT 10/2008 DE 2008/01/03; PORT 210/2008 DE 2008/02/29; PORT 11/2008 DE 2008/01/03; DL 44329 DE 1962/05/08 ART9 N1 N2; DL 533/77 DE 1977/12/30; DL 387-D/87 DE 1987/12/29; DL212/89 DE 1989/06/30; DL 224-A/96 DE 1996/11/26 ART13, ART15 N1 AL L), ART17 N1 AL C), ART40 N4; DEC RECT 4-B/97 DE 1997/01/29; DL 91/97 DE 1997/04/22; L 59/98 DE 1998/08/25; DL 304/99 DE 1999/08/06; DL 320-B/2000 DE 2000/12/15; DL 323/2001 DE 2001/12/17; DL 38/2003 DE 2003/03/08; DEC RECT 5-C/2003 DE 2003/04/30; DL 324/2003 DE 2003/12/27; DEC RECT 26/2004 DE 2004/02/24; L 45/2004 DE 2004/08/19; L 60-A/2005 DE 2005/12/30; L 53-A/2006 DE 2006/12/29; DL 181/2008 DE 2008/08/28; DL 34/2008 DE 2008/02/26; DL 38/2003 DE 2003/03/08; PORT 946/2003 DE 2003/09/06; DL 343/99 DE 199/08/26; DL 175/2000 DE 2000/08/09; DL 96/2002 DE 2002/04/12; DL 169/2003 DE 2003/08/01; L 42/2005 DE 2005/08/29; DL 121/2008 DE 2008/07/11; PORT 708/2003 DE 2003/08/04 ART3, ART5 N2, ART8, ART10; PORT 436-A/2006 DE 2006/05/05; PORT 331-B/2009 DE 2009/03/30; DL 324/2003 DE 2003/12/27 ART14 N3, ART17, ART23 N2; L 45/2004 DE 2004/08/19; L 60-A/2005 DE 2005/12/30; L 53-A/2006 DE 2006/12/29; DL 181/2008 DE 2008/08/28; DL 34/2008 DE 2008/02/26; DL 34/2008 DE 2008/02/26 ART1 N2, ART3 N1, ART6 N1, ART13 N2, ART14 N1; L 3-B/2010 DE 2010/04/28 |
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Texto Integral: | Senhor Procurador-Geral da República, Excelência: Na sequência de sugestão do Vice-Procurador-Geral da República, exarada sobre a Informação n.º GI0901134 do Gabinete do Procurador-Geral da República ([1]), determinou Vossa Excelência que este Conselho se pronunciasse quanto ao montante da taxa de justiça a pagar pela Fazenda Nacional, no âmbito do Regulamento das Custas Processuais, nas reclamações de créditos a efectuar por apenso às acções executivas. Cumpre, pois, emitir tal parecer. 1 A factualidade que esteve na origem da sugestão apresentada pelo Vice-Procurador-Geral da República foi a seguinte: 1) Por ofício de 4 de Junho de 2009 ([2]), dirigido ao Chefe do Gabinete do Procurador-Geral da República, o Director-Geral dos Impostos comunicou que, face ao novo Regulamento das Custas Processuais, tinha vindo, por diversas direcções de finanças, a ser colocada a questão relativa ao pagamento da taxa de justiça nas reclamações de créditos, com indicação de critérios divergentes em diversos círculos judiciais, pelo que solicitou os bons ofícios no sentido de ser expendido entendimento uniforme no que concerne a tal matéria; 2) Em anexo a tal ofício remeteu cópia de duas comunicações da Direcção de Finanças de Faro, de onde resulta que, no tocante a reclamações de créditos até ao valor de 30.000,00 €, havia magistrados do Ministério Público que entendiam ser sempre de pagar a taxa de justiça de 204,00 € (reportando tal montante à tabela II anexa ao Regulamento das Custas Processuais, na rubrica «Execução/reclamação de créditos»), enquanto outros entendiam que, caso a penhora e a citação da Fazenda Nacional fosse feita por solicitador de execução, a taxa a pagar seria de apenas 25,50 € (reportando tal montante à rubrica «Quando as diligências de execução não forem realizadas por oficial de justiça»); 3) Por determinação do Vice-Procurador-Geral da República, foi remetida cópia da comunicação do Director-Geral dos Impostos às procuradorias-gerais distritais, para que se pronunciassem sobre os critérios que estavam a ser seguidos nos respectivos distritos judiciais; 4) As respostas obtidas podem condensar-se nesta síntese: – No Distrito Judicial de Lisboa, existe consenso no sentido de que a taxa de justiça a pagar nas reclamações de créditos varia conforme o agente de execução seja um solicitador de execução ou um oficial de justiça; assim, para reclamações de créditos até 30.000,00 €, a taxa seria, respectivamente, de 25,50 € e de 204,00 € ([3]); – No Distrito Judicial do Porto, as respostas obtidas apontam no sentido de um consenso análogo ao existente no distrito Judicial de Lisboa, com excepção do círculo judicial de Paredes, em que os respectivos magistrados entendem ser de aplicar sempre a mesma taxa de justiça (no caso, de 204,00 €), independentemente de as diligências executórias serem prosseguidas por solicitador de execução ou por oficial de justiça ([4]); – No Distrito Judicial de Coimbra, verifica-se existirem entendimentos diversos por parte dos magistrados dos diversos círculos, entendo uns que a taxa a cobrar, no caso, deve ser sempre de 204,00 €, e outros que a mesma deverá variar conforme as diligências executórias sejam ou não levadas a cabo por solicitador de execução; todavia, o magistrado que elaborou a informação no âmbito da Procuradoria-Geral Distrital de Coimbra pronunciou-se no sentido de a taxa a cobrar, no caso, dever ser sempre de 204,00 € ([5]); – No distrito Judicial de Évora existem circunscrições onde se entende que a taxa de justiça deverá variar conforme o agente de execução seja ou não um solicitador de execução (caso da comarca do Alentejo Litoral e dos círculos judiciais de Abrantes, Beja e Évora); noutras, entende-se que a taxa a pagar, no caso, será sempre de 204,00 €, independentemente de existir ou não solicitador de execução (caso dos círculos judiciais de Portimão e de Santarém); nos círculos de Setúbal e Loulé entende-se que a taxa de justiça a considerar é a referente a diligências de execução não realizadas por oficial de justiça (no caso, de 25,50 €); noutras circunscrições, as opiniões encontram-se divididas entre os dois primeiros critérios (caso do círculo de Faro); 5) Recebidas tais respostas, foi elaborada no Gabinete do Procurador- -Geral da República a Informação n.º GI090134, de 10 de Dezembro de 2009, em que se efectuou a análise das mesmas e se sustentou o entendimento de que a taxa de justiça a pagar nas reclamações de créditos deverá variar em função da qualidade profissional do agente de execução: se as diligências de execução forem efectuadas por solicitador de execução, a taxa será de 25,50 € em reclamações até 30.000,00 €, e de 51,00 € para reclamações de valor superior; se as diligências forem efectuadas por oficial de justiça, a taxa passará a ser, respectivamente, de 204,00 e de 408,00 €; 6) Na mesma informação, e não obstante a posição ali assumida, entendeu--se ser de toda a conveniência que, antes de ser ponderada a emissão de uma qualquer directiva, a questão fosse previamente analisada por este Conselho, sugestão esta que mereceu a concordância do Vice-Procurador-Geral da República, em despacho de 7 de Maio de 2010. 2 2.1. O sistema fiscal visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza [artigo 103.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, e artigo 5.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT) ([6])]. Os tributos compreendem os impostos, incluindo os aduaneiros e especiais, e outras espécies tributárias criadas por lei, designadamente as taxas e demais contribuições financeiras a favor de entidades públicas (artigo 3.º, n.º 2, da LGT). Contrariamente ao imposto, que se caracteriza pela sua natureza unilateral, assentando essencialmente na capacidade contributiva revelada, nos termos da lei, através do rendimento ou da sua utilização e do património (artigo 4.º, n.º 1, da LGT), as taxas assentam na prestação de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento de particulares (n.º 2 do mesmo artigo). A tributação respeita os princípios da generalidade, da igualdade, da legalidade e da justiça material (artigo 5.º, n.º 2, da LGT). É da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre o regime geral das taxas [artigo 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição]. Inexiste, porém, no nosso ordenamento jurídico qualquer diploma legal estabelecendo esse regime geral ([7]). 2.2. Uma das distinções que tradicionalmente se estabelecem no âmbito das taxas é a que permite separá-las em taxas judiciais, também designadas por custas judiciais, e taxas administrativas ([8]). Nas taxas judiciais, a concreta relação com o serviço público ocorre, diferentemente das taxas administrativas, com o tribunal. As custas judiciais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte [artigo 447.º do Código de Processo Civil (CPC)]. Em matéria de custas judiciais, estatui-se no nosso ordenamento jurídico- -processual a regra de que a decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos deverá imputá-las à parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, a quem do processo tirou proveito, entendendo-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for (artigo 446.º, n.os 1 e 2, do CPC). A taxa de justiça é paga pela parte que demande na qualidade de autor ou réu, exequente ou executado, requerente ou requerido, recorrente ou recorrido (artigo 447.º-A, nº 1, do CPC), sendo, em princípio, paga integralmente e de uma só vez por cada parte ou sujeito processual (artigo 13.º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais ([9])). Salvo o disposto na lei que regula o acesso ao direito ([10]), cada parte paga os encargos a que tenha dado origem e que se forem produzindo no processo (artigo 447.º-C, n.º 1, do CPC). As custas de parte do vencedor são, em regra, suportadas pelo vencido, na proporção do seu decaimento, e compreendem as taxas de justiça pagas, os encargos efectivamente suportados pela parte, as remunerações pagas ao agente de execução e as despesas por este efectuadas, bem como os honorários do mandatário e as despesas por este efectuadas (artigo 447.º-D, n.os 1 e 2, do CPC). As custas da execução, incluindo os honorários e despesas suportadas pelo agente de execução, apensos e respectiva acção declarativa, saem precípuas do produto dos bens penhorados (artigo 455.º do CPC). 2.3. O concurso de credores constitui um procedimento autónomo, de natureza declarativa, enxertado na acção executiva. No prazo de cinco dias a contar do acto da penhora, o agente de execução deverá citar: os credores que sejam titulares de direito real de garantia, registado ou conhecido; as entidades referidas nas leis fiscais, com vista à defesa dos possíveis direitos da Fazenda Pública; o Instituto da Segurança Social, I. P., e o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I. P., com vista à defesa dos direitos da segurança social [artigo 864.º, n.os 3, alínea b), e 4, do CPC]. Os credores que gozem de garantia real sobre os bens penhorados podem, por apenso ao processo de execução, reclamar o pagamento dos respectivos créditos pelo produto daqueles (artigo 865.º do CPC). Findo o prazo das reclamações, delas são notificados, pela secretaria do tribunal, o executado, o exequente e os credores reclamantes ([11]), os quais podem, na medida do respectivo interesse, impugnar, no prazo de 15 dias, os créditos reclamados (artigo 866.º do CPC). O credor cujo crédito haja sido impugnado mediante defesa por excepção pode responder à matéria desta no prazo de 10 dias a contar da respectiva notificação (artigo 867.º do CPC). Se nenhum dos créditos for impugnado ou a verificação dos impugnados não depender de prova a produzir, proferir-se-á logo sentença, a qual conhecerá da sua existência e efectuará a respectiva graduação conjuntamente com o crédito do exequente (artigo 868.º, n.º 2, do CPC). Se a verificação de algum dos créditos impugnados estiver dependente de produção de prova, seguir-se-ão os termos do processo sumário de declaração, posteriores aos articulados, declarando-se, todavia, reconhecidos no despacho saneador os créditos que o puderem ser, embora a graduação de todos fique para a sentença final (artigo 868.º, n.º 1, do CPC). 2.4. Tradicionalmente, no nosso ordenamento jurídico, a tributação da acção executiva tem assumido autonomia relativamente à dos procedimentos de natureza declarativa que no respectivo âmbito se suscitam. Assim, no Código das Custas Judiciais aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44329, de 8 de Maio de 1962, o valor tributário das acções executivas correspondia à soma dos créditos exequendos ou ao produto dos bens liquidados, caso fosse inferior (artigo 9.º, n.º 1). Quanto aos concursos de credores, objecto de tributação autónoma, o respectivo valor tributário, se as custas devessem ficar a cargo do executado ([12]), corresponderia à soma dos créditos neles deduzidos ou ao valor dos bens liquidados, caso fosse inferior e representasse a totalidade dos bens abrangidos pela execução (n.º 2 do mesmo artigo). Nas execuções por custas e nas que se fundassem em sentenças de condenação o imposto de justiça correspondia a metade do fixado para as acções de igual valor, sendo, nas execuções baseadas em outros títulos, igual a dois terços – artigo 22.º, n.º 1 do referido Código, na sua versão originária ([13]). Tal imposto seria reduzido a metade nas execuções que findassem antes de ordenadas as citações a que alude o artigo 864.º do Código de Processo Civil, e a dois terços nas execuções que se extinguissem depois de ordenadas tais citações mas antes de designado o modo de vender os bens, de cessarem os descontos ordenados ou de requerida a adjudicação de rendimentos [artigo 17.º, n.º 1, alíneas b) e c) ([14])]. Já nos concursos de credores, o imposto era igual a um terço do correspondente a uma acção de igual valor se o processo terminasse até ao termo do prazo para a resposta a que aludia o artigo 867.º do Código de Processo Civil, ou não fossem deduzidas impugnações; seria de dois terços se houvesse impugnações e ultrapassasse aquela fase (artigo 23.º do mesmo Código) ([15]). Correspondentemente, estabelecia-se no artigo 84.º, n.º 2, que a procuradoria liquidada nas execuções, a favor do exequente, era independente da que fosse devida no concurso de credores, sendo esta, no caso de graduação, rateada pelos credores na proporção dos respectivos créditos, ou nos termos determinados pelo juiz se houvesse créditos impugnados e não impugnados. 2.5. O Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de Novembro ([16]), aprovou um novo Código das Custas Judiciais, revogando o anterior. Nele se continuou a prever a tributação autónoma da acção executiva e do concurso de credores, estabelecendo-se critérios diferenciados para a determinação dos respectivos valores tributários ([17]) e de quantificação da taxa de justiça correspondente. Assim, as execuções estavam sujeitas ao pagamento de taxa de justiça em função dos montantes indicados na tabela anexa ao Código (artigo 13.º), sendo a mesma reduzida a um quarto nas execuções que findassem antes do despacho que ordenasse a citação ou a penhora [artigo 17.º, n.º 1, alínea c)], e a metade quando terminassem antes de ordenada a citação dos credores [artigo 17.º, n.º 2, alínea d)]. Relativamente ao concurso de credores, estabeleceu-se no artigo 15.º, n.º 1, alínea l), que a respectiva taxa de justiça seria reduzida a um quarto. Continuou, por outro lado, no artigo 40.º, n.º 4, a determinar-se que a procuradoria liquidada nas execuções a favor do exequente era independente da devida no concurso de credores. 2.6. O Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de Março, veio introduzir uma profunda reforma na tramitação da acção executiva, criando a figura do agente de execução, ao qual passou a caber a efectuação de todas as diligências do processo desde que não reservadas expressamente por lei ao juiz e aos oficiais de justiça (artigo 808.º do CPC). As funções de agente de execução foram atribuídas, em regra, ao solicitador de execução, apenas sendo conferidas a oficial de justiça ([18]) no caso de inexistir solicitador de execução inscrito no círculo, ou ocorrendo outra causa de impossibilidade, bem como nas execuções por custas (artigo 808.º, n.os 2 e 3, do CPC) ([19]). Pela Portaria n.º 708/2003, de 4 de Agosto ([20]) foi estabelecido o regime relativo à remuneração e ao reembolso das despesas do solicitador de execução. No Anexo n.º I a tal diploma, quantificam-se as tarifas a cobrar pelo mesmo no âmbito da acção executiva, tendo em consideração a natureza da execução (entrega de coisa certa, prestação de facto ou pagamento de quantia certa) e os actos a praticar (abertura da execução; notificação da remessa do processo para execução pendente; citações, notificações e outras comunicações; elaboração de auto de penhora; diligências relativas à venda – publicitação, notificação de preferentes, assistência à abertura de propostas e elaboração da respectiva acta, notificação do arrematante para depósito da parte restante do preço, arresto e execução de bens do preferente ou proponente em caso de falta de depósito, adjudicação e registo de bens e venda por negociação particular). Para além dos montantes definidos em tal anexo, estatuiu-se que, no termo do processo, seria devida ao solicitador de execução uma remuneração adicional, variável em função do valor recuperado ou garantido (nos termos definidos no Anexo II) e da fase processual em que o montante foi recuperado ou garantido (artigo 8.º). Acrescidamente, o solicitador ficou com o direito a ser reembolsado das despesas necessárias à realização das diligências efectuadas, desde que devidamente comprovadas (artigo 10.º). A título de provisão, o solicitador poderia exigir quantias por conta de honorários ou de despesas (artigo 3.º, n.º 1). A remuneração devida ao solicitador de execução e o reembolso das despesas por ele efectuadas, bem como os débitos a terceiros a que a venda executiva desse origem, passaram a ser suportados pelo exequente, integrando, todavia, as custas que o mesmo tivesse o direito a receber do executado (artigo 5.º, n.º 2). 2.7. A referida reforma da acção executiva, com a instituição da figura do agente de execução, em regra representada pelo solicitador de execução, determinou uma alteração significativa na tributação do processo respectivo. Embora já estivesse em preparação uma revisão do Código das Custas Judiciais, tornou-se necessário, através de um diploma avulso (Decreto-Lei n.º 204/2003, de 12 de Setembro), criar um regime tributário transitório para o novo figurino da referida acção. Pelo seu interesse, seguidamente se transcreve o preâmbulo do diploma em causa: «A reforma da acção executiva veio consagrar a figura do solicitador da execução, desjudicializando grande parte do processo executivo. Neste contexto, com excepção dos actos que requeiram efectiva intervenção jurisdicional, não se afigura razoável sujeitar as acções executivas em que haja intervenção do solicitador de execução ao pagamento do montante da taxa de justiça prevista no Código das Custas Judiciais. Não obstante estar em preparação uma profunda revisão do regime das custas judiciais, a entrada em vigor da reforma da acção executiva em data anterior justifica, desde já, a aprovação de um regime especial e transitório aplicável às custas das acções executivas, sob pena de se encarecer, desnecessária e injustificadamente, o acesso à justiça. Neste sentido, o presente diploma estabelece uma redução significativa da taxa de justiça devida nas execuções em que seja designado solicitador de execução, bem como uma enorme simplificação do respectivo processo de contagem. Nas situações em que, para além da intervenção do solicitador de execução, seja necessária ou seja suscitada a intervenção do juiz – designadamente nos recursos, nos apensos declarativos e nas questões incidentais – o montante das custas judiciais é determinado de acordo com as regras e critérios do Código das Custas Judiciais em vigor. O mesmo sucede nas execuções em que o agente de execução seja um oficial de justiça, nas quais apenas se estabelece uma redução da taxa de justiça inicial devida pelo exequente.» Correspondendo a tais propósitos, estabeleceu-se, no artigo 1.º, n.º 1, que para a promoção de execuções seria devido o pagamento prévio de uma taxa de justiça correspondente a 1/4 de unidade de conta ([21]), quando a execução tivesse valor igual ou inferior ao da alçada do tribunal da relação, ou a 1/2 de unidade de conta, quando a execução tivesse valor superior ao daquela alçada. Nas execuções em que o agente de execução fosse um solicitador de execução, apenas seria esta a taxa devida (artigo 3.º, n.º 1). Todavia, esse regime não seria aplicável aos recursos, aos apensos declarativos, aos incidentes e às demais questões incidentais, casos em que a taxa de justiça devida seria calculada e liquidada de acordo com o disposto no Código das Custas Judiciais (artigo 3.º, n.º 2). Também relativamente às execuções em que o agente de execução fosse um oficial de justiça, a taxa de justiça devida seria calculada de acordo com as regras gerais estabelecidas no Código das Custas Judiciais (artigo 4.º, n.º 1). 2.8. O regime instituído pelo Decreto-Lei n.º 204/2003 manteve-se, no essencial, na revisão do Código das Custas Judiciais operada pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro ([22]), cujo artigo 17.º passou a ter a redacção seguinte: «Artigo 17.º 1 – Nas execuções em que seja designado solicitador de execução, a taxa de justiça devida é apenas a prevista no n.º 2 do artigo 23.º, sendo a mesma autoliquidada pelo exequente. Taxa de justiça nas execuções em que seja designado solicitador de execução 2 – O disposto no número anterior não se aplica aos recursos, aos apensos declarativos, aos incidentes previstos no artigo 14.º e às demais situações do artigo 16.º, em que a taxa de justiça é determinada de acordo com o disposto nos artigos anteriores. 3 – Se, no decurso da acção, o solicitador da execução vier a ser substituído por oficial de justiça, a taxa de justiça é igualmente determinada de acordo com o disposto nos artigos anteriores, atendendo-se na conta ao valor das remunerações pagas ao solicitador de execução. 4 – O excesso eventualmente apurado é considerado a título de custas de parte, nos termos do artigo 33.º» Por força do disposto no artigo 23.º, n.º 2, do Código, para a promoção das execuções passou a ser devido o pagamento de uma taxa de justiça correspondente a 1/4 de UC ou 1/2 UC, consoante a execução tivesse valor igual ou inferior ao da alçada do tribunal da relação ou superior ao mesmo ([23]), aplicando-se, com as devidas adaptações, o regime da taxa de justiça inicial. Estabeleceu-se, entretanto, no artigo 14.º, n.º 3, do Código que, nas execuções interrompidas ou extintas após o termo das diligências que precedessem a penhora, sem que o exequente pagasse ou indicasse bens para a penhora e sem que tivesse havido qualquer intervenção do juiz de execução, nos termos do artigo 809.º do Código de Processo Civil, a taxa de justiça devida seria apenas a prevista no n.º 2 do artigo 23.º. Relativamente aos apensos declarativos (embargos, oposições à execução e à penhora e concurso de credores) e aos incidentes da acção executiva, haveria lugar ao pagamento prévio de taxa de justiça, nos termos gerais [artigo 29.º, n.º 3, alínea a)]. 2.9. Resulta, pois, da evolução legislativa acima exposta que, quando entrou em vigor o Regulamento das Custas Processuais aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, a taxa de justiça aplicável nas execuções variava conforme nelas fosse ou não designado solicitador de execução. Sendo designado solicitador de execução, a taxa de justiça devida corresponderia a ¼ de unidade de conta se a execução tivesse valor igual ou inferior ao da alçada do tribunal da relação, ou a ½ de unidade de conta se tal valor fosse superior à mesma alçada. Caso não fosse designado solicitador de execução, sendo as respectivas funções asseguradas por oficial de justiça, a taxa de justiça seria a prevista no anexo I, calculada sobre o valor da acção executiva (artigo 13.º, n.º 1), embora o exequente, para promover a execução, apenas tivesse que proceder ao pagamento da taxa prevista no artigo 23.º, n.º 2, do CCJ. Todavia, se a execução fosse interrompida ou se extinguisse após o termo das diligências que precedem a penhora, sem que houvesse lugar ao pagamento ou à indicação de bens à penhora e sem que tivesse havido qualquer intervenção do juiz de execução, a taxa de justiça devida seria apenas a prevista no artigo 23.º, n.º 2, do Código. No que respeita aos apensos declarativos (neles incluído o concurso de credores), aos recursos e aos incidentes, a taxa de justiça não sofria qualquer variação pelo facto de, na acção executiva, ter sido ou não designado solicitador de execução. No que ao concurso de credores respeita, a taxa de justiça era, em qualquer dos casos, reduzida a metade [artigo 14.º, n.º 1, alínea m)], sendo em função desse valor que seria exigido o pagamento da correspondente taxa de justiça inicial [artigos 22.º, 23.º, n.º 1, 24.º, n.º 1, alínea a), e 29.º, n.º 3, alínea a)]. 3 3.1. O Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, aprovou o Regulamento das Custas Processuais. Nele se manteve, como sucedia de pretérito, o princípio da tributação autónoma da acção executiva relativamente aos procedimentos de natureza declarativa, aos incidentes e aos recursos suscitados no respectivo âmbito (artigo 1.º, n.º 2). As custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte (artigo 3.º, n.º 1), correspondendo a taxa de justiça ao montante devido pelo impulso processual do interessado, de acordo com as tabelas I e II anexas ao Regulamento (artigo 6.º, n.º 1), e sendo paga, em regra, integralmente e de uma só vez, por cada parte ou sujeito processual (artigo 13.º, n.º 2), até ao momento da prática do acto a ela sujeito (artigo 14.º, n.º 1). O montante da taxa de justiça a pagar nas execuções e nos concursos de credores (reclamações de créditos) vem previsto na tabela II anexa ao Regulamento. Ali se previam, na redacção original do diploma, com interesse para o presente parecer, as rubricas seguintes: «Execução/reclamação de créditos: Até € 300 000 – 2 UC Igual ou superior a € 300 000,01 – 4 UC Quando as diligências de execução não forem realizadas por oficial de justiça: Até € 30 000 – 0,25 UC Igual ou superior a € 30 000 – 0,5 UC Oposição à execução ou à penhora/embargos de terceiro: Até € 300 000 – 3 UC Execuções de valor igual ou superior a € 300 000,01 – 6 UC Incidentes de especial complexidade – 7 a 14 UC» Com as alterações introduzidas na tabela pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, a redacção das mesmas rubricas passou a ser a seguinte: «Execução/reclamação de créditos: Até € 30 000 – 2 UC Igual ou superior a € 30 000,01 – 4 UC Quando as diligências de execução não forem realizadas por oficial de justiça: Até € 30 000 – 0,25 UC Igual ou superior a € 30 000 – 0,5 UC Oposição à execução ou à penhora/embargos de terceiro: Até € 30 000 – 3 UC Execuções de valor igual ou superior a € 30 000,01 – 6 UC Incidentes de especial complexidade – 7 a 14 UC» É na redacção desta tabela, não totalmente clara, que radica a divergência de interpretações que esteve na génese da necessidade de elaboração do presente parecer. Com efeito, para uma reclamação de créditos de valor até 30.000,00 €, verificam-se três distintas interpretações: a) Para uns, a taxa de justiça a aplicar será de 2 UC’s caso o agente de execução seja um oficial de justiça e de 0,25 UC’s se o agente de execução for um solicitador de execução; b) Para outros, a taxa de justiça deverá ser sempre equivalente a 0,25 UC’s; c) Para outros, finalmente, a taxa de justiça deverá ser sempre equivalente a 2 UC’s. 3.2. As divergências de interpretação referidas têm a sua razão de ser pelo facto de na tabela II anexa ao Regulamento, o legislador ter optado por reunir numa mesma rubrica a execução e a reclamação de créditos, seguida de três sub-rubricas, com as menções, respectivamente, de «Até € 300 000», «Igual ou superior a € 300 000,01» e «Quando as diligências de execução não forem realizadas por oficial de justiça». O facto de tais sub-rubricas terem, no âmbito da tabela, na sua redacção inicial, uma tabulação equivalente, poderia levar a pensar que todas elas seriam aplicáveis indistintamente às execuções e às reclamações de créditos. Este elemento de natureza formal não tem, contudo, qualquer relevo interpretativo, e deixou mesmo de existir na nova versão da tabela introduzida pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, em que a menção «Quando as diligências de execução não forem realizadas por oficial de justiça» deixou de ter tabulação igual às outras referidas sub-rubricas, passando a constituir uma rubrica autónoma. E conforme seguidamente se demonstrará, todos os elementos interpretativos disponíveis apontam, invariavelmente, para que a interpretação a perfilhar deva ser a referida na alínea c): nas reclamações de créditos de valor até 30.000,00 €, a taxa de justiça, independentemente de o agente de execução ser ou não solicitador de execução, corresponderá a duas unidades de conta. 3.3. Começando pela análise do elemento literal, e sem embargo de se admitir, pelas razões já expostas, que a redacção inicial da tabela era propícia a gerar confusões, sempre se dirá que a mesma não punha nem põe em causa, de forma alguma, a interpretação que se acaba de referenciar. Com efeito, a sub-rubrica integrada na tabela com a menção «Quando as diligências de execução não forem realizadas por oficial de justiça», reportando-se somente a diligências de execução, apenas tem pertinência em relação à tributação da própria execução, não podendo respeitar à tributação do concurso de credores (reclamação de créditos). Para que essa sub-rubrica fosse aplicável às reclamações de créditos, a redacção respectiva deveria ser deste género: «Quando as diligências de execução/concurso de credores não forem realizadas por oficial de justiça». Ora, não foi essa a redacção consignada na tabela, quer originariamente, quer após as alterações introduzidas pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril. E não o foi por uma razão óbvia: é que, conforme abaixo se acentuará, o solicitador de execução não exerce qualquer actividade no âmbito do concurso de credores, sendo a respectiva tramitação integralmente assegurada no tribunal pelo juiz e pelos oficiais de justiça. Assim sendo, o próprio elemento gramatical deveria levar, quanto à sub-rubrica em causa, a restringir a respectiva aplicação à tributação da execução, afastando-a relativamente às reclamações de créditos. 3.4. Se o elemento literal apontava no sentido da interpretação indicada, o elemento lógico, nas vertentes histórica, sistemática e teleológica, não deixa, também, de apontar no mesmo rumo. Analisando os antecedentes legislativos, verificamos que, quando entrou em vigor a reforma da acção executiva operada pelo Decreto-Lei n.º 38/2003, introduzindo a figura do agente de execução, foi publicado um diploma legal – o Decreto-Lei n.º 204/2003 – estabelecendo que nas execuções em que o agente de execução fosse um solicitador de execução, a taxa de justiça respectiva corresponderia a ¼ de unidade de conta se o valor da execução fosse igual ou inferior ao da alçada do tribunal da relação, ou a ½ unidade de conta, caso tal valor fosse superior (artigos 3.º, n.º 1, e 2.º, n.º 1). Tal regime de tributação da acção executiva não se estendeu, porém, aos recursos, a qualquer dos apensos declarativos, aos incidentes e às demais questões incidentais a que a acção executiva pudesse vir a dar causa, os quais continuaram a ser tributados de acordo com o disposto no Código das Custas Judiciais (artigo 3.º, n.º 2). Desta forma, a intervenção do solicitador de execução no âmbito da acção executiva, influindo embora na tributação da execução, não teve qualquer repercussão na tributação dos respectivos apensos declarativos (embargos, oposições à execução e à penhora e concurso de credores), relativamente aos quais se estabelecia a redução da taxa de justiça a um quarto [artigo 15.º, n.º 1, alíneas i) a l), do Código das Custas Judiciais aprovado pelo Decreto-Lei n.º 224-A/96]. Tal situação manteve-se, nos mesmos termos, no âmbito do Código das Custas Judiciais, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro [artigo 14.º, n.º 1, alíneas j) e m), 17.º, n.os 1 e 2, e 23.º, n.º 2]. Assim, anteriormente à vigência do Regulamento das Custas Processuais, apenas a tributação da execução passou a depender da qualidade do agente de execução (solicitador ou oficial de justiça). Os respectivos apensos declarativos, incluindo o concurso de credores, nunca dependeram, em matéria de tributação, da mencionada qualidade. Uma vez que, com a entrada em vigor do Regulamento das Custas Processuais, a actividade do agente de execução no âmbito da acção executiva, ainda que revestindo a qualidade de solicitador, não sofreu qualquer alteração, não faria sentido vir a operar-se uma modificação legislativa em ordem a passar a fazer depender daquela qualidade a tributação do apenso relativo ao concurso de credores. E mais estranho seria que o legislador viesse a efectuar uma tal modificação sem que, nos trabalhos preparatórios do diploma ou no respectivo preâmbulo, apresentasse qualquer indicação ou justificação para o facto. 3.5. Analisando, seguidamente, a tabela II anexa ao Regulamento, verificamos que nela se prevê a tributação relativamente à generalidade dos apensos declarativos que podem ter lugar no decurso da acção executiva – reclamação de créditos (concurso de credores), oposição à execução ou à penhora e embargos de terceiro. Não se consigna ali, relativamente à oposição à execução ou à penhora e aos embargos de terceiro, qualquer diferenciação de tributação em função da qualidade do agente de execução. Tratando-se de apensos de natureza declarativa que correm termos inteiramente em juízo, no âmbito dos quais, à semelhança do que sucede com o concurso de credores, o solicitador de execução não tem qualquer intervenção, a interpretação contextual apontaria no sentido de todos eles deverem ter, quanto à questão em análise, um tratamento unitário. Assim, nenhum desses apensos declarativos deveria ter a respectiva tributação dependente da natureza do agente de execução. 3.6. Importa, por outro lado, e sobretudo, atentar na ratio da distinção operada, em matéria tributária, relativamente às execuções em que o agente de execução é um solicitador de execução. Conforme o legislador claramente exprimiu no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 204/2003, de 12 de Setembro, acima transcrito, o que determinou a tributação mais favorável dessas acções executivas foi a circunstância de, com a intervenção do solicitador de execução, se haver procedido a uma desjudicialização de grande parte do processo executivo, deixando um significativo número de actos processuais de ser praticados pelo juiz e pelos oficiais de justiça para passarem a ser efectuados directamente por tal agente de execução. Uma vez que a remuneração da actividade do solicitador de execução e as despesas correspondentes são directamente suportadas pelo exequente ([24]), integrando embora as custas de parte que este tem direito a exigir do executado, não faria qualquer sentido manter a anterior tributação da acção executiva, pois tal equivaleria a onerar duplamente, através da taxa de justiça, a actividade processual daquele agente de execução já objecto de pagamento em separado. Daí que o legislador tenha consagrado, desde então, a solução de taxar mais benevolamente as acções executivas em que há lugar à intervenção de solicitador de execução, já que é no âmbito dessas acções que a actividade deste tem lugar. As razões que determinaram esse tratamento tributário mais favorável não se verificam, todavia, relativamente às ocorrências da acção executiva objecto de tributação autónoma e no decurso das quais o solicitador de execução não tem qualquer intervenção, uma vez que a respectiva tramitação se mantém integralmente judicializada. É o que sucede, designadamente, com os apensos declarativos, e nomeadamente com o concurso de credores, os quais, antes e depois da entrada em vigor do Decreto--Lei n.º 204/2003, sempre foram tramitados no tribunal, com intervenção apenas do juiz e dos oficiais de justiça. É verdade que é o solicitador de execução quem procede às citações previstas no artigo 864.º do Código de Processo Civil, que estão normalmente na origem das reclamações de créditos. Tais actos processuais não se enquadram, todavia, na instância relativa ao concurso de credores, estando integrados, ao invés, na normal tramitação da própria acção executiva, sendo tomados em consideração na remuneração que o exequente tem que pagar ao solicitador de execução (cfr. rubricas n.os 5.2.3 e 5.2.4 do Anexo I à Portaria n.º 708/2003, e rubrica n.º 4.5 do Anexo I à Portaria n.º 331-B/2009, de 30 de Março). Sucede, aliás, frequentemente que, após tais citações se verificarem, não há lugar a qualquer reclamação de créditos. No concurso de credores, a instância inicia-se com a reclamação de créditos (artigo 267.º do Código de Processo Civil) e extingue-se, em regra, com o trânsito em julgado da sentença final nele proferida [artigo 287.º, alínea a), do mesmo Código]. As reclamações de créditos são apresentadas directamente em tribunal, sendo autuadas por apenso à acção executiva (artigo 865.º, n.º 8, do CPC), correndo a instância concursal em juízo desde o início até final. Assim, quer o agente de execução seja um solicitador de execução quer seja um oficial de justiça, tal apenso declarativo é sempre tramitado em juízo de igual forma, com intervenção do juiz e dos oficiais de justiça respectivos. Faz todo o sentido, pois, que a sua tributação seja unitária e independente da natureza do agente de execução nomeado no processo executivo ([25]). 3.7. Outra solução conduziria, aliás, a uma violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, e que, na vertente tributária, logrou acrescido assento no artigo 5.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária. Uma das dimensões do princípio jurídico-constitucional da igualdade consiste na proibição do arbítrio, obstando a que o legislador consagre diferenciações de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com valores objectivos ([26]). Seria, com efeito, de todo arbitrária e destituída de fundamento material razoável uma solução legislativa que estabelecesse uma tributação processual cujo valor dependesse de um facto de todo alheio à instância processual, ao valor dos interesses nela discutidos, à natureza e à complexidade das diligências que nele têm lugar e à qualidade das pessoas que as levam a cabo. 4 Em face do exposto, extraem-se as seguintes conclusões: 1.ª – Com a entrada em vigor do Regulamento das Custas Processuais aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, a taxa de justiça a pagar nas reclamações de créditos, de acordo com a Tabela II ao mesmo anexa, correspondia a duas ou a quatro unidades de conta, conforme o valor da reclamação fosse igual ou inferior a 300.000,00 euros ou superior a este montante; 2.ª – Com a nova redacção introduzida em tal Tabela pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, a taxa de justiça a pagar nas reclamações de créditos passou a ser de duas ou de quatro unidades de conta, conforme o valor da reclamação seja igual ou inferior a 30.000,00 € ou superior a este montante; 3.ª – Em qualquer dos casos, a taxa de justiça a pagar nas reclamações de créditos e a tributação dos concursos de credores nunca foram objecto de qualquer diferenciação em função da qualidade do agente de execução nomeado no processo executivo (oficial de justiça ou solicitador de execução). ESTE PARECER FOI VOTADO NA SESSÃO DO CONSELHO CONSULTIVO DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA, DE 1 DE JULHO DE 2010. Fernando José Matos Pinto Monteiro - Fernando Bento (Relator) - António Leones Dantas - Maria Manuela Flores Ferreira - José David Pimentel Marcos - Alberto Esteves Remédio - Maria de Fátima da Graça Carvalho - Manuel Pereira Augusto de Matos - José Luís Paquim Pereira Coutinho. ([1]) Informação elaborada no âmbito do processo n.º 1128/2002 – L.º 115. ([2]) Ofício n.º 593, relativo ao processo n.º 2009/000 413. ([3]) Ofício n.º 295/2009-SEC, de 21 de Julho de 2009. ([4]) Ofício n.º 920912, de 18 de Novembro de 2009. ([5]) Ofício n.º 736, de 3 de Julho de 2009. ([6]) A Lei Geral Tributária foi aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, diploma este rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 7-B/99, de 15 de Fevereiro, e alterado pela Lei n.º 100/99, de 26 de Julho, pela Lei n.º 3-B/2000, de 4 de Abril, pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro (rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 8/2001, de 13 de Março), pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, pela Lei 16-A/2002, de 31 de Maio, pelo Decreto-Lei n.º 229/2002, de 31 de Outubro, pelo Decreto-Lei n.º 320-A/2002, de 30 de Dezembro, pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 160/2003, de 19 de Julho, pela Lei n.º 107-B/2003, de 31 de Dezembro, pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro, pela Lei n.º 50/2005, de 30 de Agosto, pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 238/2006, de 20 de Dezembro, pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro, pela Lei n.º 19/2008, de 21 de Abril, pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, pela Lei n.º 94/2009, de 1 de Setembro, e pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril. ([7]) Foi publicada, todavia, a Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro, que aprovou o regime geral das taxas das autarquias locais (diploma entretanto alterado pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, e pela Lei n.º 117/2009, de 29 de Dezembro). ([8]) Sobre tal distinção, vide ANTÓNIO L. DE SOUSA FRANCO, Finanças Públicas e Direito Financeiro, Volume II, 4.ª Edição, 6.ª Reimpressão, Almedina, Coimbra, 1998, pp. 63-65. ([9]) O Regulamento das Custas Processuais foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, diploma este rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 22/2008, de 24 de Abril, e alterado pela Lei n.º 43/2008, de 27 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28 de Agosto, pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, e pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril. ([10]) O regime de acesso ao direito e aos tribunais foi aprovado pela Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, sendo alterado pela Lei n.º 47/2007, de 28 de Agosto, que republicou o diploma. Tal regime foi, entretanto, complementado pela Portaria n.º 1085-A/2004, de 31 de Agosto (rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 91/2004, de 21 de Outubro, e alterada pela Portaria n.º 288/2005, de 21 de Março, e pela Lei n.º 47/2007, de 28 de Agosto), pela Portaria n.º 1085-B/2004, de 31 de Agosto, pela Portaria n.º 10/2008, de 3 de Janeiro (alterada pela Portaria n.º 210/2008, de 29 de Fevereiro), e pela Portaria n.º 11/2008, de 3 de Janeiro. ([11]) Também será notificado o cônjuge do executado, caso se tenha oposto à execução ou à penhora, nos termos do n.º 1 do artigo 864.º-A do CPC (artigo 866.º, n.º 1, do CPC). ([12]) Se as custas devessem ficar a cargo do reclamante, o valor tributário a ter em conta corresponderia ao do crédito reclamado – Cfr. JOSÉ GIL DE JESUS ROQUE / HUMBERTO JOSÉ DE MELO, Código das Custas Judiciais Comentado e Anotado, 2.ª Edição, Rei dos Livros, Lisboa, 1989, p. 49. ([13]) Este regime foi objecto de alterações posteriores. Assim, pelo Decreto-Lei n.º 533/77, de 30 de Dezembro, estabeleceu-se que nas execuções por custas e nas que se fundassem em sentenças de condenação o imposto seria igual a metade do fixado para as acções de igual valor; nas execuções baseadas em documentos exarados ou autenticados por notário ou em títulos a que, por disposição especial, fosse atribuída força executiva, o imposto seria igual a dois terços; nas execuções baseadas em letras, livranças, cheques, extractos de factura, vales, facturas conferidas e quaisquer outros escritos particulares, assinados pelo devedor, dos quais constasse a obrigação de pagamento de quantias determinadas ou de entrega de coisas fungíveis, o imposto seria igual a quatro quintos. Pelo Decreto-Lei n.º 387-D/87, de 29 de Dezembro, estabeleceu-se que nas execuções por custas e nas que se fundassem em sentenças de condenação a taxa de justiça seria igual a metade da fixada na tabela anexa e nas execuções baseadas em outros títulos seria igual à da tabela. ([14]) Pelo Decreto-Lei n.º 387-D/87, de 29 de Dezembro, consignou-se no artigo 18.º, n.º 1, alínea g), que a taxa de justiça seria reduzida a metade nas execuções que findassem antes de ordenadas as citações a que alude o artigo 864.º do Código de Processo Civil. Pelo Decreto-Lei n.º 212/89, de 30 de Junho, estabeleceu-se no artigo 17.º, alínea e), que a taxa de justiça seria reduzida a um quarto nas execuções que terminassem antes do despacho que ordenasse a citação ou a penhora. ([15]) Pelo Decreto-Lei n.º 387-D/87, de 29 de Dezembro, o preceito foi alterado, estabelecendo-se que nos concursos de credores a taxa de justiça era igual a metade da fixada na tabela anexa. Pelo Decreto-Lei n.º 212/89, de 30 de Junho, foi o preceito de novo alterado, estatuindo-se que nos concursos de credores, a taxa de justiça era igual a um quarto da fixada na tabela, com redução para um oitavo se o processo terminasse até ao termo do prazo para a resposta a que aludia o artigo 867.º do Código de Processo Civil ou não houvesse impugnações. ([16]) Este diploma foi rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 4-B/97, de 29 de Janeiro, e alterado pelo Decreto-Lei n.º 91/97, de 22 de Abril, pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 304/99, de 6 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 320-B/2000, de 15 Dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17 de Dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de Março (rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 5-C/2003, de 30 de Abril), pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro (rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 26/2004, de 24 de Fevereiro), pela Lei n.º 45/2004, de 19 de Agosto, pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro, pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, e pelo Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28 de Agosto, sendo revogado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro de 2008, com efeitos a partir de 20 de Abril de 2009. ([17]) Tal matéria vinha prevista no respectivo artigo 9.º, cuja redacção era a seguinte: «Artigo 9.º 1 – O valor das execuções é o da soma dos créditos exequendos ou o do produto dos bens liquidados, se for inferior. Valor da execução e do concurso de credores 2 - Nos concursos de credores cujas custas devam ficar a cargo do executado, o valor é o da soma dos créditos neles deduzidos, ou o dos bens liquidados, se for inferior e representar a totalidade dos bens abrangidos pela execução. 3 - Se os bens ainda não tiverem sido liquidados, o valor é o dos bens penhorados, se for inferior ao dos créditos deduzidos. 4 - Nos recursos relativos à verificação ou graduação de créditos, o valor é o do crédito cuja existência ou graduação se discute.» ([18]) Pela Portaria n.º 946/2003, de 6 de Setembro, estabeleceu-se que o agente de execução é o escrivão de direito, titular da secção onde corre termos o processo de execução, que poderá delegar a execução dos actos noutro oficial de justiça da mesma secção, sendo substituído, nas respectivas faltas e impedimentos, segundo o regime de substituição previsto no Estatuto dos Funcionários de Justiça (Estatuto este que foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 343/99, de 26 de Agosto, diploma entretanto alterado pelo Decreto-Lei n.º 175/2000, de 9 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 96/2002, de 12 de Abril, pelo Decreto-Lei n.º 169/2003, de 1 de Agosto, pela Lei n.º 42/2005, de 29 de Agosto, e pelo Decreto-Lei n.º 121/2008, de 11 de Julho). ([19]) Na sequência das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 226/2008, de 20 de Novembro, no artigo 808.º do CPC, não havendo agente de execução inscrito ou registado na comarca ou ocorrendo outra causa de impossibilidade, passou o exequente a poder requerer que as diligências de execução sejam realizadas por oficial de justiça, determinado segundo as regras da distribuição, tendo, nas execuções em que o Estado seja exequente, todas as diligências de execução passado a ser realizadas por oficial de justiça. ([20]) Este diploma foi alterado pela Portaria n.º 436-A/2006, de 5 de Maio, vindo a ser revogada pela Portaria n.º 331-B/2009, de 30 de Março. ([21]) Actualmente, por força do disposto no artigo 22.º do Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, a unidade de conta é fixada em um quarto do valor do indexante dos apoios sociais (IAS) vigente em Dezembro do ano anterior, arredondado à unidade Euro, sendo actualizada anualmente com base na taxa de actualização do referido indexante (sendo, presentemente, de 102,00 euros). ([22]) O Código das Custas Judiciais viria, ainda, a ser objecto de alterações através da Lei n.º 45/2004, de 19 de Agosto, da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro, da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, e do Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28 de Agosto, sendo revogado, com efeitos a partir de 20 de Abril de 2009, pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro. ([23]) Presentemente, e tendo em conta o disposto no artigo 24.º, n.º 1, da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, a alçada do tribunal da relação corresponde a 30.000,00 euros. Anteriormente correspondia a 14.963,94 euros. ([24]) Artigo 5.º, n.º 2, da Portaria n.º 708/2003, de 4 de Agosto, e artigo 13.º, n.º 2, da Portaria n.º 331-B/2009, de 30 de Março. ([25]) Vide, neste sentido, SALVADOR DA COSTA, Regulamento das Custas Processuais Anotado e Comentado, Almedina, Coimbra, 2009, p. 190. ([26]) Sobre a matéria, vide J. J. GOMES CANOTILHO / VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, Coimbra Editora, 2007, p. 339-340. |