Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00002302
Parecer: P000802003
Nº do Documento: PPA15012004008000
Descritores: ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
SECRETÁRIO-GERAL
CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
INERÊNCIA
DESPESAS DE REPRESENTAÇÃO
SUPLEMENTO
ACUMULAÇÃO
SISTEMA RETRIBUTIVO
FUNÇÃO PÚBLICA
ESTATUTO REMUNERATÓRIO
CARGO POLÍTICO
DEPUTADO
ESTATUTO
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
INTERPRETAÇÃO DA LEI
LACUNA
Texto Integral:
Senhor Conselheiro
Procurador-Geral da República,

Excelência:


I

O actual Auditor Jurídico da Assembleia da República, chamado a pronunciar-se sobre se o representante dos funcionários parlamentares no Conselho de Administração da Assembleia da República teria direito a abono mensal para despesas de representação, no montante de 25% do respectivo vencimento, concluiu, no parecer nº 7/89[1], pela afirmativa, com fundamento na aplicação analógica do nº 2 do artigo 16º da Lei nº 102/88, de 25 de Agosto.

Entretanto, a Secretária-Geral da Assembleia da República, verificando ser o único membro do Conselho a não perceber o mencionado abono, requereu ao Senhor Presidente da Assembleia da República que se estudasse a legalidade da situação, designadamente na perspectiva da salvaguarda do princípio constitucional da igualdade (artigo 13º da Constituição) e à luz do parecer nº 7/89.


Na Nota nº 4/98, de 2 de Abril de 1998, concluiu o Auditor Jurídico que seria de aplicar à Secretária–Geral a doutrina sustentada no mencionado parecer.

Posteriormente, o Presidente da Assembleia da República solicitou ao Auditor Jurídico da Assembleia da República que se pronunciasse sobre o problema de saber se ao Secretário-Geral da Assembleia da República, por ser também membro do Conselho de Administração, seria aplicável a limitação quanto a remunerações constante do disposto no artigo 11º da Lei nº 2/92, de 9 de Março, segundo a qual elas não podem superar a remuneração base do Primeiro-Ministro.

No parecer, então elaborado, podem ler-se as seguintes conclusões:

“1ª - O abono mensal, no montante de 25% do respectivo vencimento, previsto no art. 16º-2 da L. Nº 45/85, de 9.4, diploma que versa sobre o estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, é restrito aos membros do Conselho de Administração da Assembleia da República que são deputados;

2ª - A não previsão de remuneração suplementar aos membros do CA que não são deputados não pode haver-se como situação de lacuna da lei, como o princípio da igualdade não pode fundamentar a atribuição aos mesmos daquele abono;

3ª - Por imposição do art. 41º, nº 6 do DL nº 184/89, de 2.6, aditado pelo art. 9º da L. Nº 30-C/92, de 28-12, as remunerações ilíquidas do titular do cargo de Secretário-Geral da Assembleia da República, mesmo enquanto membro do Conselho de Administração, não podem ser superiores à remuneração base do Primeiro-Ministro.”

Como esta doutrina contrariasse a defendida em anteriores pareceres e tendo em conta a complexidade da questão, o actual Auditor Jurídico da Assembleia da República sugeriu, ao abrigo do nº 2 do artigo 45º do Estatuto do Ministério Público, a audição do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, sobre as seguintes questões:

“- o abono a que se refere o art. 16º, nº 2, da Lei nº 4/85, de 9.4, na redacção da Lei nº 102/88, de 25.8, é extensível também aos membros do Conselho de Administração da Assembleia da República que não são deputados ?

-pode o titular do cargo de secretário-geral da Assembleia da República ser remunerado suplementarmente, na qualidade de membro do Conselho de Administração, por aquela via ou por outra? Na afirmativa, estaria a remuneração global sujeita ao limite constante do art. 41º-6 do DL nº 184/89, de 2.6 ?”

O auditor termina sugerindo, tendo em vista práticas de uniformidade pela Administração, que o âmbito do parecer abarque ainda “a situação do outro membro do CA que também não é titular de cargo político”.

Tendo Vossa Excelência acolhido a sugestão do Auditor Jurídico, cumpre, desta forma, emitir parecer .

II
São órgãos da Assembleia da República o respectivo presidente e o Conselho de Administração, nos termos do disposto no artigo 5º da Lei de Organização e Funcionamento dos Serviços da Assembleia da República (LOFSAR)[2].

“O Conselho de Administração é um órgão de consulta e gestão, constituído por um máximo de sete Deputados, ou os seus substitutos, em representação de cada um dos sete maiores grupos parlamentares, pelo Secretário-Geral da Assembleia da República e por um representante dos funcionários parlamentares, ou um seu substituto” (nº 1 do artigo 14º da LOFSAR).

Os representantes dos deputados e seus substitutos são indicados pelos grupos parlamentares e eleitos pelo plenário (nº 2 do artigo 14º da LOFSAR).

O representante dos funcionários parlamentares e o seu substituto são eleitos em plenário do pessoal do quadro da Assembleia da República (nº 6 do artigo 14º da LOFSAR).

O Conselho de Administração da Assembleia da República é, desta forma, composto por membros eleitos (representantes dos grupos parlamentares e dos trabalhadores) e um membro que exerce funções por inerência (o Secretário-Geral da Assembleia da República).

Os membros do Conselho de Administração que sejam deputados têm direito, segundo o nº 2 do artigo 16º da Lei nº 4/85[3], de 9 de Abril, a um abono mensal para despesas de representação, nos termos que se seguem:

“Artigo 16º[4]
Remunerações dos deputados

1 - Os deputados percebem mensalmente um vencimento correspondente a 50% do vencimento do Presidente da República.
2 - Os Vice-Presidentes da Assembleia da República e os membros do Conselho de Administração têm direito a um abono mensal para despesas de representação no montante de 25% do respectivo vencimento[5].
3 - Os presidentes dos grupos parlamentares e os secretários da Mesa têm direito a um abono mensal para despesas de representação no montante de 20% do respectivo vencimento.
4 - Os vice-presidentes dos grupos parlamentares que tenham um mínimo de vinte deputados têm direito a um abono para despesas de representação no montante de 15% do respectivo vencimento, havendo lugar à atribuição de idêntico abono por cada vice-presidente correspondente a mais de vinte deputados ou fracção superior a dez.
5 - Os presidentes das comissões parlamentares permanentes e os vice-secretários da Mesa têm direito a um abono mensal para despesas de representação no montante de 15% do respectivo vencimento.
6 - Os restantes deputados não referidos nos números anteriores têm direito a um abono mensal para despesas de representação no montante de 10% do respectivo vencimento, desde que desempenhem o respectivo mandato em regime de dedicação exclusiva.”

Não dispondo a LOFSAR de norma que confira esse mesmo direito aos membros não deputados, questiona-se, em primeiro lugar, em que medida podem os mesmos socorrer-se daquele dispositivo legal para receber igualmente despesas de representação.

Temos, desta forma, que a questão central deste parecer gira em torno do problema de saber em que medida o abono de despesas de representação, consagrado para os deputados membros do Conselho de Administração da Assembleia da República, no nº 2 do artigo 16º da Lei nº 4/85, é ou não extensível aos outros membros não deputados.
III

Comecemos por tentar captar o enquadramento conceitual dos suplementos, em especial das denominadas despesas de representação, no âmbito do sistema retributivo da função pública, bem como a sua razão de ser.


1. O quadro retributivo da função pública foi objecto de uma profunda reforma, operada pelo Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho[6].

Este diploma estabeleceu “os princípios gerais em matéria de emprego público, remunerações e gestão de pessoal da função pública” (artigo 1º), aplicáveis “aos serviços e organismos da Administração Pública, incluindo os institutos públicos nas modalidades de serviços personalizados do Estado e de fundos públicos”.

O diploma aplica-se ainda aos serviços e organismos que estejam na dependência orgânica e funcional da Presidência da República, da Assembleia da República e das instituições judiciárias (cfr. nº 2 do mesmo preceito).

Nos termos do disposto no artigo 15º, nº 1, o sistema retributivo da função pública é composto por:

“a) Remuneração base;
b) Prestações sociais e subsídio de refeição;
c) Suplementos.”

Segundo o nº 2 do mesmo preceito, “Não é permitida a atribuição de qualquer tipo de abono que não se enquadre nas componentes referidas no número anterior”.

Quanto aos suplementos, dispõe o artigo 19º:
“Artigo 19º
Suplementos

1 - Os suplementos são atribuídos em função de particularidades específicas da prestação de trabalho e só podem ser considerados os que se fundamentem em:

a) Trabalho extraordinário, nocturno, em dias de descanso semanal ou feriados, em disponibilidade permanente ou outros regimes especiais de prestação de trabalho;
b) Trabalho prestado em condições de risco, penosidade ou insalubridade;
c) Incentivos à fixação em zonas de periferia;
d) Trabalho em regime de turnos;
e) Falhas;
f) Participação em reuniões, comissões ou grupos de trabalho, não acumuláveis com a alínea a)[7].

2- Podem ser atribuídos suplementos por compensação de despesas feitas por motivo de serviço que se fundamentem, designadamente, em:

a) Trabalho efectuado fora do local normal de trabalho, que dê direito à atribuição de ajudas de custo, ou outros abonos devidos a deslocações em serviço;
b) Situações de representação;
c) Transferência para localidade diversa que confira direito a subsídio de residência ou outro.

3- A fixação das condições de atribuição dos suplementos é estabelecida mediante decreto-lei.”


O Decreto-Lei nº 353-A/89, de 16 de Outubro[8], veio desenvolver e regulamentar os princípios gerais contidos no Decreto-–Lei nº 184/89.

O novo sistema retributivo, que entrou em vigor em 1 de Outubro de 1989, passou a estruturar-se com base “em princípios de equidade interna e externa”[9] “e a ser apenas composto pelos seguintes elementos: remuneração base, suplementos, prestações sociais e subsídio de refeição” [10] [11].

No que se refere aos suplementos, destaca-se o artigo 11º, nº 1, com o seguinte conteúdo:

“1- Consideram-se suplementos os acréscimos remuneratórios atribuídos em função de particularidades específicas da prestação de trabalho, cujos fundamentos obedecem ao estabelecido nos nos 1 e 2 do artigo 19º do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, considerando-se extintos todos os que nele não se enquadrem.”

Em estreita conexão com o nº 3 do artigo 19º do Decreto-Lei nº 184/89, estatui o artigo 12º que “o regime e as condições de atribuição de cada suplemento são fixados mediante decreto-lei.”

Finalmente, importa ainda ter presente o artigo 37º, que tem como epígrafe “Regime transitório dos suplementos.”

O seu nº 1 estabelece:

“Os subsídios, suplementos, gratificações ou abonos anteriormente praticados, identificados em lei especial como subsídios, suplementos, gratificações ou abonos de risco, penosidade, insalubridade, participação em reuniões, comissões ou grupos de trabalho, deslocações em serviço, despesas de representação e subsídio de residência, mantêm-–se nos seus montantes actuais, sujeitos à actualização, nos termos em que vem sendo feita.”

Por sua vez, o nº 3 do mesmo preceito refere:

“O previsto no presente artigo vigora até à fixação do regime e condições de atribuição de cada suplemento em decreto-lei, nos termos do nº 3 do artigo 19º do Decreto-Lei nº 184/89, e do artigo 12º do mesmo diploma.”

2. Do exposto flui, em primeiro lugar, que os suplementos obedecem a um numerus clausus[12], de tal modo que os serviços e organismos administrativos somente podem proceder ao seu pagamento se ocorrer alguma das circunstâncias tipificadas no artigo 19º do Decreto-Lei nº 184/89.

Em segundo lugar, importa sublinhar que os suplementos constituem um acréscimo à remuneração base e destinam-se a remunerar particularidades específicas da prestação de trabalho ou a compensar despesas feitas por motivo de serviço.

Os primeiros encontram a razão da sua atribuição nas concretas particularidades da prestação de trabalho, enquanto os segundos se fundamentam na necessidade de ressarcir o funcionário ou agente das despesas efectuadas por causa do desempenho das suas funções[13].

O abono para despesas de representação inscreve-se nesta segunda categoria.

Existem outros suplementos que visam de igual modo compensar o titular pelas despesas feitas por motivo de serviço[14]. O que distingue as despesas de representação dos demais suplementos reside precisamente no facto de se destinarem “a compensar o acréscimo de despesas inerente à necessidade do funcionário ou agente representar de forma condigna a pessoa colectiva pública para que trabalha”[15].

As despesas de representação são uma forma de remuneração constituída por abonos conferidos a determinadas pessoas chamadas a ocupar altos cargos do Estado ou a desempenhar funções de relevo, por se entender que as mesmas não devem suportar encargos que se vêm obrigadas a satisfazer em razão do decoro e da dignidade necessariamente observados no desempenho desses cargos e funções.

Tendo presente a ratio específica subjacente à atribuição das despesas de representação, este suplemento é reservado aos funcionários ou agentes que ocupem uma determinada posição hierárquica no seio de dada pessoa colectiva pública, que legitima a atribuição de funções de representatividade da instituição que servem. Tal significa que o funcionário ou agente em causa passa a identificar-–se com a pessoa colectiva que representa em todos os actos externos em que participe.

Ora, é precisamente por força das funções de representatividade em que são investidos que se justifica a adopção de um conjunto de cuidados não exigíveis aos demais funcionários e agentes, com o consequente aumento natural de despesas tendentes a assegurar a dignidade e o prestígio da instituição representada[16] [17].

Reportando-se em concreto ao abono para despesas de representação, conferido por lei aos titulares de certos cargos dirigentes, o Supremo Tribunal Administrativo teve oportunidade de veicular precisamente a doutrina que vimos seguindo.

No Acórdão de 15 de Fevereiro de 2001[18], pode ler-se que “a atribuição desse suplemento (...) aos titulares de certos cargos dirigentes funda-se primacialmente no interesse público, estando em causa a salvaguarda da dignidade e prestígio das funções e especiais exigências de disponibilidade permanente do dirigente para o seu exercício e a compensá-los pela necessidade de suportar despesas acrescidas de carácter social que tal exercício geralmente implica.”

Também este corpo consultivo já teve oportunidade de se pronunciar, em várias ocasiões, sobre a natureza e razão de ser deste abono.

No Parecer nº 40/98[19], realçou o Conselho Consultivo que as despesas de representação configuram um “vencimento acessório destinado a compensar os encargos sociais extraordinários que resultem normal e correntemente do exercício do cargo – desde os actos de cortesia individual, passando pelas exigências de vestuário, os gastos, enfim, que a pessoa investida no cargo tem necessariamente de fazer por causa do seu desempenho – e que se não fosse isso poderia dispensar-se de efectuar, tendo por isso o carácter de um abono indemnizatório que, como tal, deve reverter a favor de quem, estando legalmente investido no desempenho do cargo, ficou sujeito às despesas determinadas pelo exercício da função para ocorrer às quais a lei o atribui.”

Para terminar esta breve incursão sobre o enquadramento conceitual dos suplementos, em especial do abono de despesas de representação, importa ter presente a doutrina deste corpo consultivo sobre a admissibilidade da sua acumulação.

Funcionando os suplementos remuneratórios, no fundo, como uma compensação pelos ónus específicos inerentes às peculiaridades próprias da prestação de trabalho, se tais particularidades deixarem de estar presentes, o pagamento dos suplementos em causa deixa de ter fundamento, vai neste sentido a orientação que se extrai de diversos pareceres.

Somente não será assim, acrescenta-se, se houver disposição legal em contrário.

Se assim não se entendesse verificar-se-ia, como ficou consignado no parecer nº 52/97, “uma anomalia de sistema: o recebimento de remuneração acessória sem contrapartida de trabalho ou particularidades de trabalho que a mesma remuneração visa retribuir”.

A doutrina exposta tem como consequência a não cumulabilidade de remunerações da mesma essencial natureza, teleologicamente orientadas como contrapartida retributiva de homólogas especificidades de prestação de trabalho[20].

IV

Tendo em vista a resposta à questão que vem posta, importa agora conhecer o estatuto remuneratório dos membros não deputados do Conselho de Administração da Assembleia da República, tendo por especial referência o caso do Secretário-Geral da Assembleia da República.

1. A Lei nº 32/77, de 25 de Maio[21], determinava no seu artigo 4º:

“1- O conselho administrativo é composto pelos vice-–presidentes da Assembleia da República, em representação dos respectivos grupos parlamentares, pelo secretário-geral da Assembleia da República e por dois representantes dos trabalhadores, eleitos, em plenário expressamente convocado para o efeito, por voto directo e secreto e pelo período da sessão legislativa.
2- São atribuições específicas e privativas do conselho administrativo a gestão financeira corrente da Assembleia da República e a elaboração do orçamento próprio e respectivo relatório e contas a serem submetidos à apreciação do Plenário da Assembleia da República.
3- O conselho administrativo será sempre ouvido em matéria de gestão financeira e de pessoal e o seu parecer favorável precederá as decisões do Presidente da Assembleia da República, nos termos da presente Lei.
4-(...)
5-(...).”

Com a Lei nº 77/88, de 1 de Julho, as funções do conselho administrativo passaram a ser desempenhadas por um Conselho de Administração, elevado à categoria de órgão da Assembleia da República, a par do Presidente da Assembleia da República.

As atribuições do Conselho de Administração foram substancialmente ampliadas cabendo-lhe, designadamente, pronunciar-se sobre a política geral de administração e os meios necessários à sua execução; elaborar planos de actividades, plurianuais e anuais, da Assembleia da República; elaborar propostas de orçamento; elaborar o relatório e conta; exercer a gestão financeira; pronunciar-se sobre os regulamentos internos que respeitem à gestão das diversas áreas funcionais; pronunciar-se, sob proposta do secretário-geral, relativamente à abertura de concurso de pessoal; etc.[22]

Quanto à composição deste órgão, também se deu alteração significativa.

Como vimos, segundo o artigo 12º da Lei nº 77/89, o Conselho passou a ser constituído por um máximo de sete deputados, em representação de cada um dos sete maiores grupos parlamentares, pelo secretário-geral da Assembleia da República e por um representante dos funcionários.

Composição que se mantém actualmente[23].

Cotejando os preceitos em causa, destaca-se a tríplice natureza do Conselho, constituída por representantes da classe política, da administração pública e dos trabalhadores (vertente social).

Na versão de 1977, a vertente política encontrava-se representada pelos vice-presidentes da Assembleia da República; a administração pública pelo secretário-geral; e a social, por dois representantes dos trabalhadores.

As alterações mais significativas deram-se ao nível das vertentes política e social.

Em relação à primeira, esta passou a estar representada não pelos vice-presidentes mas sim por deputados (até a um máximo de sete) que representam, em primeira via, os grupos parlamentares e, em segunda, o próprio órgão de soberania Assembleia da República.

Ressalta da alteração analisada que esta vertente passou a gozar de maior representatividade com a Lei nº 77/89, sendo hoje maioritário o número dos membros titulares de cargos políticos. Na vertente social, os trabalhadores passaram a estar representados somente por um trabalhador.

Tendo em conta a diversa proveniência dos membros do Conselho de Administração da Assembleia da República, não é de estranhar que seja igualmente diferente o seu estatuto, em especial o remuneratório.


2. Importa considerar em particular o estatuto do secretário-–geral.

O pessoal da Assembleia da República, que constitui o quadro dos funcionários parlamentares, tem regime especial de trabalho[24], decorrente da natureza e das condições de funcionamento próprias da Assembleia da República, nos termos do artigo 37º da LOFSAR, constituindo direito subsidiário para a integração de lacunas da presente lei e seus regulamentos a legislação aplicável à administração central do Estado (artigo 62º, nº 3, da LOFSAR).

A natureza e as condições de funcionamento próprias da Assembleia da República explica o regime especial de trabalho a que está sujeito o seu pessoal permanente (artigo 52º).

No que concerne ao estatuto do Secretário-Geral da Assembleia da República[25], que superintende em todos os serviços da Assembleia da República e os coordena, submetendo a despacho do Presidente da Assembleia da República os assuntos cuja decisão não esteja no âmbito da sua competência, estabelece, actualmente, o artigo 23º da LOFSAR:

“1- O Secretário-Geral da Assembleia da República é nomeado pelo Presidente da Assembleia da República, em comissão de serviço e pelo período da legislatura, obtido o parecer favorável do Conselho de Administração, e permanece em funções até à nomeação do novo Secretário-Geral.

2- O Secretário-Geral da Assembleia da República pode ser exonerado a todo o tempo pelo Presidente da Assembleia da República, obtido o parecer favorável do Conselho de Administração.

3- O Secretário-Geral da Assembleia da República não pode exercer actividades profissionais privadas nem desempenhar outras funções públicas, salvo as que resultem de inerência ou de actividades de reconhecido interesse público cujo exercício seja autorizado por despacho do Presidente da Assembleia da República.

4- O Secretário-Geral é substituído, nas suas faltas e impedimentos, pelo adjunto do Secretário-Geral que, sob sua proposta, for designado pelo Presidente da Assembleia da República

5- A remuneração do Secretário-Geral da Assembleia da República é igual ao vencimento base fixado para o cargo de director-geral, acrescido da diferença entre o vencimento deste e do subdirector-geral, sendo os demais abonos atribuídos ao cargo de director-geral, designadamente as despesas de representação.

6- As despesas de representação do Secretário-Geral não são acumuláveis com despesas de representação de qualquer outro cargo.

7- (...).”

A Lei Orgânica da Assembleia da República, aprovada pela Lei nº 32/77, de 25 de Maio, não dispunha de qualquer norma que atribuísse ao respectivo Secretário-Geral um abono para despesas de representação.

Somente com a Lei nº 77/88, que aprovou nova Lei Orgânica da Assembleia da República, o abono para despesas de representação do Secretário-Geral surge pela primeira vez referenciado[26].

O nº 6 do artigo 20º daquele diploma previa que ao Secretário-–Geral da Assembleia da República pudesse ser atribuído, “a título permanente ou eventual, um abono para despesas de representação, a fixar pelo Presidente da Assembleia da República, ouvido o Conselho de Administração”, que não podia exceder os limites estabelecidos para os secretários-gerais de outros órgãos de soberania.

Entretanto, com a LOFSAR, o Secretário-Geral passou a ter direito aos abonos atribuídos ao cargo de director-geral, designadamente a despesas de representação.

A previsão do abono de despesas de representação atrás mencionada refere-se, como é óbvio, ao exercício de funções de secretário-geral da Assembleia da República.

No entanto, como ficou dito, o Secretário-Geral da Assembleia da República é, ao mesmo tempo, por inerência, membro do Conselho de Administração da Assembleia da República.

A inerência consiste, segundo MARCELLO CAETANO, na “investidura obrigatória num cargo por disposição legal, em virtude do exercício de outro cargo”[27].

No fundo, trata-se de situações em que o exercício de funções não justifica a existência ou criação de um lugar ou cargo com provimento próprio, optando o legislador por considerar essas funções como uma obrigação proveniente do desempenho de outro cargo[28].

Em consequência, o Secretário-Geral é membro do Conselho de Administração enquanto tal, por força da lei e em decorrência do cargo que ocupa e não a título pessoal, de confiança, profissional ou política. Quem for Secretário-Geral integrará o Conselho de Administração, porque se trata de funções indissociáveis do conteúdo funcional do secretário-geral definido por lei.


2.1. Uma primeira questão que pode colocar-se é a de saber se o exercício de funções por inerência obsta ou não ao percebimento do abono por despesas de representação.

Em relação a este primeiro problema a resposta não pode deixar de ser negativa.

Se pelas funções a desempenhar pelos membros do Conselho de Administração couber, nos termos legais, despesas de representação, não vemos como fundamentar a recusa desse abono ao Secretário-Geral.

Como vimos, o abono de despesas de representação tem como missão compensar o acréscimo de despesas exigidas no desempenho de determinados cargos ou funções de relevo, atenta a necessidade de garantir a sua dignidade e prestígio.

Assim sendo, devem ser abonadas a todas as pessoas que suportem as mesmas particularidades específicas na prestação do trabalho, independentemente dos cargos de origem ou exercidos a título principal.

O simples facto de se tratar de uma inerência não constitui fundamento bastante para afastar as exigências decorrentes do princípio da igualdade, dado estarmos perante funções idênticas[29].

Neste sentido vai a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, realçando-se o Acórdão de 11 de Junho de 1997[30] onde, a propósito da situação dos directores clínicos que desempenham, por inerência, funções de membros do Conselho de Administração do respectivo hospital, se concluiu pelo direito dos mesmos ao abono de despesas de representação como membro do Conselho de Administração, por as mesmas se apresentarem como um “quid especial da actividade (...) dos conselhos de Administração, que nada têm a ver com outros suplementos atribuídos no seu anterior estatuto remuneratório (...)”.


2.2. Outro problema que pode suscitar-se é o da impossibilidade da acumulação do abono de despesas de representação pelo exercício das suas funções de secretário-geral da Assembleia da República, com as compensações eventualmente devidas pelo exercício, por inerência, de funções de membro do Conselho de Administração.

Com efeito, partilhando os suplementos em causa (despesas de representação), da mesma essencial natureza, teleologicamente orientada para a compensação de despesas homólogas[31], cairíamos numa situação de duplicação de remunerações.

O legislador sentiu precisamente necessidade de clarificar este aspecto, tendo acolhido a solução que se extrai da doutrina deste corpo consultivo.

Assim, encontra-se expressamente consignado no nº 6 do artigo 23º da Lei nº 77/88[32] que “As despesas de representação do Secretário-Geral não são acumuláveis com despesas de representação de qualquer outro cargo”.

Por conseguinte, ainda que viesse a concluir-se terem os membros não deputados do Conselho de Administração da Assembleia da República direito a despesas de representação, a sua aplicação ao secretário-geral teria de fazer-se com esta limitação[33], mesmo no período anterior à alteração legislativa introduzida pela Lei nº 28/2003.

V

As considerações até ao momento expendidas permitem afirmar que pelo lado das funções que os membros do Conselho de Administração são chamados a desempenhar, em princípio seria de atribuir a todos eles verbas de igual montante para despesas de representação. Com efeito, tratando-se de funções de conteúdo e natureza idênticos, a decorrência lógica imporia um tratamento igual das situações.

Adverte-se, porém, que assim seria se existisse norma a prever a atribuição do abono de despesas de representação em relação aos membros do Conselho de Administração e por causa do exercício de funções no mesmo.

Ora, como deixámos antever, o problema reside precisamente no facto de inexistir norma na LOFSAR[34] que contenha tal previsão.

Com efeito, o único dispositivo legal que existe sobre o mencionado abono consta do artigo 16º da Lei nº 4/85.

Este preceito, sob a epígrafe “Remunerações dos deputados”, dispõe no nº 2 do artigo 16º que “Os Vice-Presidentes da Assembleia da República e os membros do Conselho de Administração têm direito a um abono mensal para despesas de representação no montante de 25% do respectivo vencimento”.

A disposição acabada de transcrever insere-se no “estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos” e, na sua versão original não estavam incluídos os deputados membros do Conselho de Administração da Assembleia da República. Foi somente em 1988, com a alteração ao estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, introduzida pela Lei nº 102/88, que os mesmos passaram a ser remunerados através de abono mensal no montante de 25% do respectivo vencimento.

Como vimos, no âmbito da Auditoria Jurídica concluiu-se, primeiro em relação ao representante dos trabalhadores e, posteriormente, em relação ao secretário-geral, que os mesmos teriam direito a um abono mensal para despesas de representação no montante de 25% do respectivo vencimento, por aplicação analógica do nº 2 do artigo 16º da Lei nº 4/85.

A analogia pressupõe a existência de uma lacuna da lei, isto é, que determinada situação não esteja compreendida na letra nem no espírito da lei, distinguindo-se da interpretação extensiva em que a situação não está abrangida na letra, mas no espírito da lei.

Ora, em nosso entendimento não existe lacuna porque não existe caso omisso carecido de regulamentação, como passamos a demonstrar.

1. Constitui doutrina uniforme que as lacunas surgem na ordem jurídica como uma fatalidade[35].

Por mais esclarecido, diligente e hábil que seja, o legislador nunca consegue regular directamente todas as situações da vida social merecedoras de tutela jurídica. Por outro lado, as relações sociais encontram-se em permanente mudança, mercê de descobertas e invenções, com a consequente emergência de relações e conflitos novos em que o legislador do tempo não pensou nem podia ter pensado[36] [37].

Surgem, desta forma, inevitavelmente, na ordem jurídica, as lacunas.

As lacunas não se identificam, porém, com situações não reguladas normativamente.

Neste sentido é elucidativo o comentário de KARL ENGISCH, quando refere que “não podemos falar duma lacuna no Direito (positivo) logo que neste não exista uma regulamentação cuja existência nos representamos. Não nos é lícito presumir pura e simplesmente uma determinada regulamentação, antes, temos que sentir a sua falta, se queremos apresentar a sua não-existência como uma lacuna”[38] [39].

No mesmo sentido, KARL LARENZ adverte: “Poderia pensar-–se que existe uma lacuna onde a lei (...) não contém uma regra para determinado caso, onde a lei se ‘cala’. Simplesmente, também existe um ‘silêncio eloquente da lei’. (...). Por outro lado, também há casos em que uma regra é, com efeito, segundo a sua letra, aplicável, mas a que não se adequa segundo o seu sentido ou fim (averiguado por interpretação). No primeiro caso, a lei não tem lacunas, embora ‘guarde silêncio’ sobre os casos não referidos, no segundo ela não ‘guarda silêncio’, mas necessita possivelmente dum complemento restritivo, cuja falta pode dar a impressão duma lacuna”[40].

Mais adiante, o mesmo autor pondera:

“Posto tudo isto, podemos dizer que uma lacuna da lei (de lege lata) existe sempre e só quando a lei, a avaliar pela sua própria intenção e imanente teleologia, é incompleta e, portanto, carece de integração, e quando a sua integração não contradiz uma limitação (a determinados factos previstos) porventura querida pela lei. O mesmo se pode exprimir dizendo que se tem de tratar duma incompletude contrária ao plano do legislador”[41][42].

No mesmo sentido, tem este Conselho Consultivo sublinhado, seguindo a doutrina alemã, que “uma lacuna é uma incompletude insatisfatória no seio de um todo, na medida em que representa uma falta ou falha em algo que tende para a completude. Pode, assim, dizer-se que uma lacuna é ‘uma incompletude contrária a um plano’ e, tratando-se de um ‘lacuna jurídica’, que ela consiste numa ‘imperfeição contrária ao plano do direito vigente, determinada segundo critérios extraídos da ordem jurídica global’”[43].


1.1. Em última análise, determinar se a inexistência de norma explícita configura ou não uma lacuna de regulamentação pressupõe que se esgote uma actividade prévia: a interpretativa.

Sobre a temática da interpretação existe doutrina firme deste corpo consultivo, vazada entre outros, no Parecer nº 12/2003, de 27 de Fevereiro de 2003, que aqui reproduzimos.

Como este corpo consultivo tem realçado, apoiando-se na doutrina, na actividade interpretativa, a letra é o primeiro estádio da interpretação, funcionando simultaneamente como ponto de partida e limite de interpretação[44].

“No entanto, a lei é um ordenamento de relações que mira a satisfazer certas necessidades e deve interpretar-se no sentido que melhor responda a essa finalidade e portanto em toda a plenitude que assegure tal tutela.

“Por conseguinte, para determinar o alcance de uma lei, o intérprete não pode limitar-se ao ‘sentido aparente e imediato que resulta da conexão verbal; é indagar com profundeza o pensamento legislativo, descer da superfície verbal ao conceito íntimo que o texto encerra e desenvolvê-lo em todas as direcções possíveis (...). A missão do intérprete é justamente descobrir o conteúdo real da norma jurídica, determinar em toda a amplitude o seu valor, penetrar o mais que é possível (...) na alma do legislador, reconstituir o pensamento legislativo. Só assim a lei realiza a sua força de expansão e representa na vida social uma verdadeira força normativa’x).

“Para esse efeito, na tarefa de fixar o sentido e alcance com que deve valer uma norma jurídica, intervêm, para além do elemento gramatical (o texto, a letra da lei), elementos lógicos, que a doutrina subdivide em elementos de ordem sistemática, histórica e racional ou teleológica x1).

“O elemento teleológico consiste na razão de ser da lei (ratio legis), no fim visado pelo legislador ao elaborar a norma.

“Segundo BAPTISTA MACHADOx2), ‘o conhecimento desse fim, sobretudo quando acompanhado do conhecimento das circunstâncias (políticas, sociais, económicas, morais, etc.) em que a norma foi elaborada ou da conjuntura político-económico-social que motivou a “decisão” legislativa (occasio legis) constitui um subsídio da maior importância para determinar o sentido da norma. Basta lembrar que o esclarecimento da ratio legis nos revela a “valoração” ou ponderação dos diversos interesses que a norma regula e, portanto, o peso relativo desses interesses, a opção entre eles traduzida pela solução que a norma exprime. Sem esquecer ainda que, pela descoberta daquela “racionalidade” que (por vezes inconscientemente) inspirou o legislador na fixação de certo regime jurídico particular, o intérprete se apodera de um ponto de referência que ao mesmo tempo o habilita a definir o exacto alcance da norma e a discriminar outras situações típicas com o mesmo ou com diferente recorte.”

Toda a norma jurídica assenta, pois, em um certo fundamento, em uma certa razão de ser que é a finalidade a que se dirigex3), sendo a ratio legis reveladora da valoração ou ponderação dos diversos interesses que a norma jurídica disciplina.

O elemento sistemático “funda-se na circunstância de que um preceito jurídico não existe por si só, isoladamente, antes se encontrando ligado a vários outros de modo a constituírem todos eles, um sistema”x4).


1. 2. Por tudo o que vai exposto, uma correcta interpretação da norma do artigo 16º, nº 2, da Lei nº 4/85, exige que comecemos por questionar, reportando-nos ao seu teor literal, o sentido e alcance da previsão do direito a despesas de representação para os deputados “membros do Conselho de Administração”.

Será que o objectivo do legislador é compensar os deputados pelas despesas acrescidas decorrentes do exercício de funções como membros do Conselho de Administração da Assembleia da República? Ou antes estamos pura e simplesmente perante a previsão de despesas de representação atribuídas aos deputados enquanto titulares de cargos políticos e representantes do órgão de soberania que é o Parlamento?

Numa apreciação perfunctória, centrada exclusivamente na expressão literal do preceito, o intérprete poderia ser tentado a concluir no primeiro sentido.

No entanto, a inserção sistemática do preceito e a sua ratio apontam para conclusão diversa.

Começando pelo elemento sistemático, recorde-se que o preceito onde a norma em causa está contida tem por epígrafe “Remunerações dos deputados”, e encontra-se inserido no diploma que versa o “Estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos”.

Ora, os titulares de cargos políticos são exclusivamente os enumerados no artigo 1º da Lei nº 4/85, onde se incluem os deputados à Assembleia da República [(alínea c)].

Por outro lado, do estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos faz parte integrante o direito a abonos para despesas de representação (cfr. nº 1 do artigo 2º da Lei nº 4/85).

E bem se compreende que assim seja dada a forte componente representativa das funções que são chamados a desempenhar.

Em especial, os deputados, enquanto membros da Assembleia representativa de todos os cidadãos portugueses, têm como principal função participar na formação e expressão da vontade da mesma.

A participação dos deputados no exercício efectivo da parcela de soberania[45] atribuída à Assembleia da República, explica a fruição do estatuto especial de deputado: direitos, regalias[46], imunidades, incompatibilidades, dispensa de funções profissionais, etc., garantido, nos aspectos fundamentais, pela Constituição da República.

Segundo a Lei nº 4/85 todos os deputados, desde que desempenhem o respectivo mandato em regime de dedicação exclusiva, têm direito a despesas de representação, no montante de 10%.

Este montante é superior nos casos em que, na qualidade de deputados, são chamados a desempenhar funções de responsabilidade e representatividade acrescidas. Encontram-se nesta situação, os vice-presidentes, os membros do Conselho de Administração da Assembleia da República, os presidentes dos grupos parlamentares e agrupamentos parlamentares e os secretários da Mesa e os presidentes das comissões parlamentares[47].

Por conseguinte, quando o nº 2 do artigo 16º da Lei nº 4/85 prevê o abono de despesas de representação para os deputados membros do Conselho de Administração da Assembleia da República, tem em vista compensar as despesas acrescidas decorrentes da função de deputado e não propriamente as devidas na qualidade de membro do Conselho de Administração. Não podemos perder de vista que os deputados representam, no referido Conselho, o órgão político e soberano que é a Assembleia da República, sendo indicados, como vimos, pelos grupos parlamentares.

Se tais abonos constituíssem acréscimo remuneratório atribuído em função de particularidades específicas da actividade de membro do Conselho de Administração da Assembleia da República, é que teriam de ser atribuídos a todos os membros que suportassem as mesmas particularidades específicas na prestação do trabalho.

Não sendo assim, é substancialmente diferente a situação dos membros deputados e dos não deputados do Conselho de Administração da Assembleia da República.

Falta pois, no presente caso, “harmónica igualdade, proporção e paralelismo (paragone) entre relações semelhantes”, que são pressuposto da analogia.

“O procedimento por analogia radica no conceito de que os factos de igual natureza devem ter igual regulamentação, e se um de tais factos encontra já no sistema a sua disciplina, esta forma o tipo do qual se deve inferir a disciplina jurídica geral que há-de governar os casos afins”[48].

Por tudo o que vai exposto, propendemos a considerar que não existe indício normativo que permita concluir que o sistema jurídico requer a consideração e solução deste caso[49].

Afigura-se tratar-se de uma das situações em que a inexistência da regulamentação em causa corresponde a um plano do legislador ou da lei.

Com isto não se nega que possam existir razões até ponderáveis a justificar a atribuição de despesas de representação pelo exercício do cargo de membro do Conselho de Administração da Assembleia da República.

Sem curar de saber se procedem ou não, no caso, tais razões, sempre se adiantará que continuava a não existir lacuna.

Com efeito, nestas situações, poderia “quando muito, falar-se de uma «lacuna político-jurídica», «de uma lacuna crítica», de «uma lacuna imprópria», quer dizer, de uma lacuna do ponto de vista de um futuro direito mais perfeito (de lege ferenda); não, porém, de uma lacuna autêntica e própria, quer dizer, de uma lacuna no direito vigente («de lege lata»). Uma lacuna de lege ferenda apenas pode motivar o poder legislativo a uma reforma do direito, mas não o juiz a um preenchimento da dita lacuna”[50].

Como observa FRANCESCO FERRARA, “a analogia não é criação de direito novo mas descoberta de direito existente”[51].


VI

Na questão submetida à apreciação deste Conselho Consultivo suscitava-se também o problema da análise da situação dos membros do Conselho de Administração da Assembleia da República à luz das exigências do princípio da igualdade.

Acabámos por concluir que o legislador consagra para os membros deputados do Conselho de Administração da Assembleia da República o direito ao abono de despesa de representação, mas não assim para os membros não deputados, ou seja, para o Secretário-–Geral e o representante dos funcionários parlamentares.

Constituirá esta situação discriminação arbitrária, irrazoável ou materialmente infundada?

Reconhecendo o princípio geral da igualdade, o artigo 13º da Constituição estabelece:

“1 – Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2 – Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social.”

Trata-se de um princípio “estruturante” de todo o sistema jurídico, “multifacetado” e “complexo”[52], para cuja densificação têm contribuído, a doutrina e, em especial, a jurisprudência do Tribunal Constitucional.

Sobre o conteúdo jurídico-constitucional do princípio da igualdade existe abundante doutrina deste corpo consultivo condensada no recente Parecer nº 23/2003, que aqui se retoma.

“Referindo-se ao alargamento progressivo do conteúdo jurídico-
-constitucional do princípio da igualdade, GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA
x) sublinham as seguintes dimensões em face da ordem constitucional portuguesa: «(a) proibição do arbítrio, sendo inadmissíveis, quer diferenciações de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objectivos, constitucionalmente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais; (b) proibição de discriminação, não sendo legítimas quaisquer diferenciações de tratamento entre os cidadãos baseadas em categorias meramente subjectivas ou em razão dessas categorias (cfr. nº 2, onde se faz expressa menção de categorias subjectivas que historicamente fundamentaram discriminações); (c) obrigação de diferenciação, como forma de compensar a desigualdade de oportunidades (…)».

O princípio da igualdade, obrigando que se trate como igual o que for necessariamente igual e como diferente o que for essencialmente diferente, não impede a diferenciação de tratamento mas apenas a discriminação arbitrária, a irrazoabilidade. Ou seja, o que aquele princípio proíbe são as distinções de tratamento que não tenham justificação e fundamento material bastantex1).

Como se afirma no Parecer nº 4/90, de 22 de Março de 1990, a propósito dos critérios materiais da igualdade – desigualdade, «a ideia mais difundida nos autores como fundamento de tratamento das semelhanças ou das diferenças traduz-se na proibição do arbítrio, ou seja, na ausência de justificação razoável»x2).

Para GOMES CANOTILHO, da fórmula tendencialmente tautológica - tratar por igual situações de facto iguais e desigualmente situações de facto desiguais -, «conseguiu extrair-se como resultado satisfatório a proibição do arbítrio (-), judicialmente controlável. A argumentação de Estado de Direito chega até aqui: quando não houver motivo racional evidente, resultante da “natureza das coisas” para desigual regulação de situações de facto iguais ou igual regulação de situações de facto desiguais, pode considerar-se uma lei, que estabelece essa regulação, como arbitrária»x3).

A jurisprudência do Tribunal Constitucional tem-se movido, fundamentalmente, nos quadros de uma concepção do princípio da igualdade como proibição do arbítriox4), à qual equipara a ausência de justificação razoável ou racional, a falta de motivo pertinente, de fundamento material bastante ou suficiente e outras fórmulas de idêntico significadox5)

A proibição do arbítrio surge-nos, assim, como limite externo e objectivox6) da liberdade de conformação do legislador. Nesta perspectiva, segundo a lição de GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, «o princípio da igualdade exige positivamente um tratamento igual de situações de facto iguais e um tratamento diverso de situações de facto diferentes. Porém, a vinculação jurídico-material do legislador ao princípio da igualdade não elimina a liberdade de conformação legislativa, pois a ele pertence, dentro dos limites constitucionais, definir ou qualificar as situações de facto ou as relações de vida que hão-de funcionar como elementos de referência a tratar igual ou desigualmente. Só quando os limites externos da “discricionaridade legislativa” são violados, isto é, quando a medida legislativa não tem adequado suporte material, é que existe uma “infracção” do princípio da igualdade enquanto proibição do arbítrio»x7).

À luz das considerações acabadas de fazer, afigura-se insubsistente a alegada violação do princípio da igualdade.

Com efeito, consistindo a igualdade em tratar por igual o que é essencialmente igual e diferente o que essencialmente for diferente, não proíbe que se estabeleçam distinções, mas tão-só as que se afigurem materialmente infundadas, carecendo de qualquer esteio racional e valorativamente atendível[53].

Ora, no caso em apreço, a atribuição de despesas de representação aos deputados membros do Conselho de Administração da Assembleia da República, apresenta, como vimos no ponto V. 1.2, fundamento material razoável.

Por outro lado, atenta a diferente proveniência dos membros do Conselho de Administração em causa, também não se vislumbra subsistir qualquer diferenciação injustificada ou discriminação.

Aqui chegados, importa ainda acrescentar que a resposta negativa à primeira questão preclude a análise da segunda pergunta formulada no pedido de parecer no que concerne à eventual aplicabilidade ou não do limite constante do artigo 41º do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, à remuneração global auferida pelo Secretário-Geral da Assembleia da República.

VII

Termos em que se extraem as seguintes conclusões:

1ª. Os suplementos constituem acréscimos à remuneração base que se destinam a remunerar particularidades específicas da prestação de trabalho ou a compensar despesas feitas por motivo de serviço, não sendo cumuláveis quando apresentem a mesma essencial natureza;

2ª. O abono de despesas de representação tem como missão compensar o acréscimo de despesas exigidas no desempenho de determinados cargos ou funções de relevo, atenta a necessidade de garantir a sua dignidade e prestígio, devendo ser abonadas a todas as pessoas que suportem as mesmas particularidades específicas na prestação do trabalho, independentemente dos cargos de origem ou dos exercidos a título principal;

3ª. Por aplicação da doutrina mencionada nas conclusões anteriores, as despesas de representação auferidas pelo Secretário-Geral da Assembleia da República, na qualidade de secretário, não são cumuláveis com despesas de representação de qualquer outro cargo, mesmo no período anterior à consagração expressa desta proibição, introduzida no artigo 21º, nº 6, da Lei nº 77/88, de 1 de Julho, pela Lei nº 28/2003, de 30 de Julho;

4ª. O abono de despesas de representação conferido pelo nº 2 do artigo 16º da Lei n º 4/85, de 9 de Abril, aos deputados membros do Conselho de Administração da Assembleia da República, tem em vista compensá-los pelas despesas acrescidas exigidas pelas funções de representatividade enquanto deputado e não pela qualidade de membro do mencionado Conselho;

5ª. Na sequência do exposto na conclusão anterior, o nº 2 do artigo 16º da Lei nº 4/85 não é susceptível de ser interpretado por forma a constituir base legal para a atribuição de despesas de representação aos membros não deputados do Conselho de Administração da Assembleia da República.








[1]) De 31 de Março.
[2]) Lei nº 77/88, de 1 de Julho, alterada pela Lei nº 28/2003, de 30 de Julho. O artigo 1º deste último diploma introduziu alterações à Lei Orgânica da Assembleia da República, aprovada pela Lei nº 77/88, que passou a designar-se por Lei de Organização e Funcionamento dos Serviços da Assembleia da República (LOFSAR). De acordo com o estatuído no artigo 5º, encontra-se republicado em anexo àquele diploma o texto integral consolidado da Lei de Organização e Funcionamento dos Serviços da Assembleia da República.
[3]) Contém o Estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos e foi sucessivamente alterado e completado pelos seguintes diplomas: Decreto-Lei nº 334/85, de 20 de Agosto; Lei nº 16/87, de 1 de Junho; Lei nº 102/88, de 25 de Agosto; Lei nº 39-B/94, de 27 de Dezembro; Lei nº 26/95, de 18 de Agosto; e Lei nº 3/2001, de 23 de Fevereiro. A Lei nº 4/85 foi objecto de rectificação em Declaração da Assembleia da República, publicada no Diário da República, I Série, nº 146, de 28 de Junho de 1985.
[4]) Reproduzimos o preceito para melhor compreensão da questão.
[5]) Segundo a redacção dada ao preceito pela Lei nº 102/88.
[6]) Sobre esta temática existem já diversos pareceres. Seguiremos de perto a doutrina sufragada no Parecer nº 123/2001, de 17 de Janeiro de 2002, repetida no Parecer nº 97/2002, de 5 de Dezembro de 2002.
[7]) Cfr. nº 1 do artigo 19º.
[8]) Posteriormente alterado pelos Decretos-Lei nos 393/90, de 11 de Dezembro; 420/91, de 29 de Outubro; 137/92, de 16 de Julho e 109/96, de 1 de Agosto, sem reflexos na economia do presente parecer.
[9]) Cfr. o artigo 14º do Decreto-Lei nº 184/89.
[10]) Cfr. o artigo 15º do Decreto-Lei nº 184/89.
[11]) Para maiores desenvolvimentos, cfr. Paulo Veiga e Moura, Função Pública, 2ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2001, vol. 1º, p. 268. Sobre a caracterização conceitual dos suplementos no quadro da estrutura remuneratória da função pública [cfr., entre outros, os pareceres nos 109/90, de 25 de Janeiro de 1991(Diário da República, II Série, nº 241, de 19 de Outubro de 1991; 47/92, de 14 de Julho de 1993 (Diário da República II Série, nº 76, de 31 de Março de 1994); 123/96, de 20 de Junho de 1997 (Diário da República, II Série, nº 70, de 24 de Março de 1998, pp. 3778 ss.); 52/97, de 12 de Fevereiro de 1998 (Diário da República, II Série, nº 196, de 26 de Agosto de 1998); 93/98, de 14 de Maio de 1999; 328/2000, de 16 de Agosto de 2000; 123/2001 e 97/2002].
[12]) Cr. PAULO VEIGA E MOURA, ob. cit., p. 316. No direito italiano, além da remuneração específica da função (lo stipendio), os servidores têm direito a indemnização (indemnità) por despesas inerentes ao serviço, designadamente por viagens, transporte e representação (cfr. ALDO SANDULLI, Manuale di Diritto Amministrativo, 10ª ed., Casa Editrice, Nápoles, 1969, pp. 198 ss.). Também no direito francês, entre les indemnités représentatives de frais, incluem-se les indemnités dites de représentation (cfr. VICTOR SILVERA/SERGE SALON, La fonction Publique et ses Problemes Actuels, L’Actualité Juridique, Paris, 1976, p. 396 ss. Para maiores desenvolvimentos, cfr. o Parecer nº 23/93, de 10 de Fevereiro de 1994.
[13]) Note-se que, o legislador, ao enunciar os suplementos, adopta diferente técnica legislativa. Com efeito, no caso dos suplementos atribuídos em função de particularidades específicas da prestação de trabalho a enumeração é taxativa, encontrando-se o legislador impedido de criar outros que não se fundamentem nas circunstâncias elencadas no nº 1 do Decreto-Lei nº 184/89. Já no que concerne aos suplementos por compensação de despesas feitas por motivo de serviço, a enumeração das situações que podem justificar a sua outorga é meramente exemplificativa, em resultado da expressão “designadamente” utilizada pelo legislador no nº 2 do mesmo diploma. A diferença apontada tem repercussões de ordem prática muito importantes já que, nesta última situação, o legislador não está impedido de fixar as condições de atribuição de outros suplementos, desde que se fundamentem na compensação de despesas feitas por motivo de serviço e respeitada a reserva de decreto-lei na fixação do regime e condições de atribuição, por força do estatuído no nº 3 do Decreto-Lei nº 184/89 e artigo 12º do Decreto-Lei nº 353-A/89. A este propósito, cfr. o Parecer nº 46/2003, de 26 de Junho de 2003.
[14]) Entre os quais se destacam os destinados a compensar despesas motivadas por trabalho efectuado fora do local normal de trabalho, que dê direito à atribuição de ajudas de custo ou outros abonos devidos a deslocações em serviço e transferências para localidade diversa que confira direito a subsídio de residência ou outro (cfr. PAULO VEIGA E MOURA, ob. cit., p. 350).
[15]) Cfr. PAULO VEIGA E MOURA, ob. cit., p. 363.
[16]) Cfr. PAULO VEIGA E MOURA, ob. cit., p. 363.
[17]) Para MARCELLO CAETANO, “Algumas notas para a interpretação da Lei nº 2105”, O Direito, Revista de Ciências Jurídicas e de Administração Pública, Ano XCIII, 1961, p. 118, o abono de despesas de representação “destina-se a compensar os encargos sociais extraordinários que resultam normal e correntemente do exercício do cargo - desde os actos de cortesia individual, passando pelas exigências de vestuário familiar até às próprias solicitações para actos de caridade”.
[18]) Processo nº 37225-A.
[19]) De 24 de Setembro de 1998, homologado e publicado no Diário da República, II Série, nº 90, de 17 de Abril de 1999. Neste parecer procedeu-se, para melhor caracterização do suplemento de abono para despesas de representação, à análise da sua evolução legislativa. Sobre a natureza e razão de ser do mencionado suplemento, além dos já citados, cfr. o Parecer nº 6/72, publicado no Diário do Governo, II Série, de 4 de Abril de 1972 e no Boletim do Ministério da Justiça, nº 219, pp. 79 ss. e, bem assim, os pareceres nºs 49/80; 51/80; e 30/82, publicados no Boletim do Ministério da Justiça, nº 304, pp. 134 e 135, e nº 322, p. 202 e no Diário da República, II Série, nº 258, de 7 de Novembro de 1980, nº 18, de 22 de Janeiro de 1981, e nº 267, de 18 de Novembro de 1982, respectivamente. Mais recentemente, apontam-se os pareceres nºs 107/2001, de 23 de Outubro de 2003, e 46/2003.
[20]) Doutrina vazada, entre outros, nos seguintes pareceres: 47/92; 93/98; 328/2000; 47/2002; e 89/2003, de Setembro de 2003.
[21]) Alterada pelas Leis nºs 86/77, de 28 de Dezembro, e 27/79, de 5 de Setembro.
[22]) Trata-se de atribuições que se encontram reproduzidas de um modo geral no artigo 14º da LOFSAR.
[23]) Cfr. artigo 14º, nº 1, da LOFSAR.
[24]) Regime especial a fixar pelo Presidente da Assembleia da República, “mediante proposta do Conselho de Administração, podendo compreender, nomeadamente, horário especial de trabalho, regime extraordinário, prestação de serviços por turnos e remuneração suplementar, ficando sempre ressalvados os direitos fundamentais dos trabalhadores consignados na Constituição” (nº 2 do artigo 37º da LOFSAR). Sobre o regime especial de trabalho dos funcionários e agentes da Assembleia da República, cfr. o Parecer nº 30/89, de 24 de Maio de 1989, Diário da República, II Série, nº 201, de 1 de Setembro de 1989.
[25]) O artigo 24º da LOFSAR estabelece as competências específicas do Secretário-Geral, entre as quais se destaca a coordenação da elaboração de propostas referentes aos planos de actividade, ao orçamento, ao relatório e conta de gerência [alínea a) do artigo 24º].
[26]) Sobre o direito ao abono de despesas de representação do Secretário-Geral da Assembleia da República, antes da entrada em vigor da Lei nº 77/88, cfr. o Parecer nº 90/88, de 9 de Março de 1989. Neste parecer concluiu-se que o artigo 1º do Decreto-Lei nº 153/86, de 20 de Junho, segundo o qual o Secretário-Geral da Presidência do Conselho de Ministros tinha direito a receber uma quantia mensal para despesas de representação, não era susceptível de constituir base legal para a atribuição de despesas de representação ao Secretário-Geral da Assembleia da República.
[27]) Cfr. Manual de Direito Administrativo, 10 ed., Almedina, Coimbra, 1999, vol. II, p. 654.
[28]) Sobre o exercício de funções por inerência, cfr., entre outros, os pareceres nºs 157/80, de 15 de Janeiro de 1981 (Diário da República, II Série nº 15, de 19 de Janeiro de 1982) e Boletim do Ministério da Justiça, nº 310, p. 66; 45/87, de 28 de Janeiro de 1988 (Diário da República, II Série, nº 289, de 16 de Dezembro de 1988); 2/97, de 10 de Abril de 1997; e 24/2003, de 26 de Junho de 2003.
[29]) Na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo é possível realçar vários acórdãos no sentido da legalidade do percebimento das despesas de representação e de outros abonos em situações de inerência. Neste sentido, cfr., entre outros, os Acórdãos de 23 de Junho de 1994, Recurso nº 34279, Apêndice ao Diário da República de 31 de Dezembro de 1996, pp. 5154 ss.; e de 16 de Fevereiro de 1996, Recurso nº 33096, Apêndice ao Diário da República de 20 de Dezembro de 1996, pp. 1186 ss.
[30]) Processo nº 40384, Apêndice ao Diário da República de 23 de Março de 2001, pp. 4546 ss.
[31]) Cfr. o Parecer nº 46/2003.
[32]) Segundo alteração introduzida pela Lei nº 28/2003.
[33]) Isto sem prejuízo do direito de opção pelo regime mais favorável. A este propósito, cfr. o Parecer nº 107/2001.
[34]) Local apropriado para o fazer. Note-se, porém, que também não existe qualquer outra norma que preveja expressamente o mesmo abono.
[35]) Os autores falam em inevitabilidade ou fatalidade, cfr., entre outros, SANTOS JUSTO, Introdução ao Estudo do Direito, Coimbra Editora, Coimbra, 2001, pp. 341 ss. e MÁRIO BIGOTTE CHORÃO, “Integração de Lacunas”, Polis Enciclopédia Verbo da Sociedade e do Estado, 3, Verbo, p. 601.
[36]) Cfr. FRANCESCO FERRARA, Interpretação e aplicação das leis, tradução de MANUEL DE ANDRADE, 4ª ed., Arménio Amado, Coimbra, 1987, p. 156 e o Parecer nº 90/88.
[37]) Tendo em conta o momento em que surgem, as lacunas classificam-se de primárias ou originárias e supervenientes ou secundárias. “As primeiras surgem no ordenamento ab initio, isto é, no momento do aparecimento da fonte normativa, a qual não contempla uma situação que poderia desde logo ter regulado. As últimas produzem-se só ulteriormente” (cfr. MÁRIO BIGOTTE CHORÃO, Temas Fundamentais de Direito, Almedina, Coimbra, 1991, p. 230).
[38]) Cfr. Introdução ao Pensamento Jurídico, 5ª ed., tradução de BAPTISTA MACHADO, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1997, p. 227.
[39]) Para CHAIM PERELMAN, “Na maioria dos casos as lacunas são criadas pelos intérpretes que, por uma ou outra razão, pretendem que certa área deveria ser regida por uma disposição normativa, quando o não é expressamente, que afirmam a existência de uma lacuna axiológica, ou seja, de uma lacuna praeter legem” (cfr. Lógica Jurídica, Martins Fontes, São Paulo, 1999, p. 67).
[40]) Cfr. Metodologia da Ciência do Direito, Tradução de SOUSA E BRITO e ANTÓNIO VELOSO; Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1969, p. 428.
[41]) Cfr. ob. cit., pp. 436-37.
[42]) No mesmo sentido se pronuncia BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, Coimbra, 1994, pp. 194 ss. Ver também, entre outros, OLIVEIRA ASCENÇÃO, O Direito Introdução e Teoria Geral, 10ª ed., Almedina, Coimbra, 1997, pp. 434 ss.
[43]) Cfr. o Parecer nº 68/2002, de 5 de Dezembro de 2002. No mesmo sentido, cfr., os pareceres nºs 65/97, de 14 de Maio de 1998; e 142/2001, de 14 de Fevereiro de 2002
(Diário da República, II Série, de 10 de Agosto de 2001). Sobre o conceito de lacuna e integração analógica, cfr., ainda, os seguintes pareceres: nºs 4/82 (Diário da República, II Série, nº 288, de 15 de Dezembro de 1982); 93/88 ; e 73/91, de 9 de Janeiro de 1992.
[44]) Cfr. o Parecer nº 326/2000. Sobre a interpretação da lei, cfr., entre outros, os pareceres nºs 70/99, de 27 de Janeiro de 2000, Diário da República, nº 115, II Série, de 18 de Maio de 2000; e 61/91, de 14 de Maio de 1992 (Diário da República, II Série, nº 274, de 26 de Novembro de 1992).
x) FRANCISCO FERRARA, Interpretação e aplicação das leis, 4ª ed., Arménio Amado, Coimbra, 1989, traduzido por Manuel de Andrade, p. 128.
x1) Cfr. o Parecer nº 36/2002 e doutrina nele mencionado. Ver também o Parecer nº 328/2000, de 16 de Agosto.
x2) Cfr. Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, Coimbra, 1990, pp. 182/183.
x3) Cfr. JOSÉ DIAS MARQUES, Introdução ao Estudo do Direito, Lisboa, 1994, p. 141. Para KARL LARENZ, Metodologia da Ciência do Direito, 3ª ed., Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1997, traduzido por José Lamego, p. 475, a expressão ratio legis tem várias acepções, significando “tanto o escopo como o ‘fundamento racional’, o princípio de uma regulação.”
x4) JOSÉ DIAS MARQUES, ob.cit. p.147; A. SANTOS JUSTO, Introdução ao Estudo do Direito, Coimbra Editora, 2001, pp. 328 ss.; JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito – Introdução e Teoria Geral, 10.ª ed., Almedina, Coimbra, 1997, pp. 403 ss.; JOÃO DE CASTRO MENDES, Introdução ao Estudo do Direito, Edição revista por Miguel Teixeira de Sousa, Lisboa, 1994.
[45]) Os poderes funcionais dos deputados, na medida em que definem, por um lado a sua função e, por outro lado, a posição de cada deputado na Assembleia da República como veículo de manifestação de uma vontade que vai concorrer com outras para a formação da vontade colegial, constituem, nas palavras de JORGE MIRANDA, “situações jurídicas essenciais ou primárias cujo eficaz exercício equivale ao exercício da parcela de soberania atribuída à Assembleia” (cfr. “Deputado”, Dicionário Jurídico da Administração Pública, p.534.
[46]) De entre os direitos e regalias dos deputados, contam-se os “subsídios que a lei prescrever” [alínea d) do artigo 158º da CRP]. Segundo GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, a expressão “subsídios” é algo equívoca, pois não se refere a “subsídios eventuais, a título de reembolso de despesas ou de ajudas de custo, mas de remuneração verdadeira e própria pela actividade desenvolvida”. Ainda segundo os mesmos autores, isto tem a ver com “o estatuto e a concepção do deputado. Na concepção liberal originária, as funções de deputado eram gratuitas (....) na concepção actual, em que o parlamento se torna praticamente permanente, implicando a interrupção duradoura da actividade profissional (...) a remuneração permanente e de montante adequado funciona como garantia de que todos podem ser deputados e de que todos os deputados podem exercer o mandato a tempo inteiro” (cfr. Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1993, p. 642). Sobre o estatuto dos deputados, cfr. FERNANDO AMARAL, Estatuto dos Deputados, Assembleia da República, Lisboa, 1995, pp. 71 ss.
[47]) Cfr. o artigo 16º da Lei nº 4/85.
[48]) FRANCESCO FERRARA, ob. cit., p. 158.
[49]) Cfr. OLIVEIRA ASCENÇÃO, ob. cit., p. 434.
[50]) Cfr. o Parecer nº 94/88, de 12 de Julho de 1989 (Diário da República, II Série, nº 238, de 16 de Outubro, de 1989).
[51]) Ob. cit., p. 164.
[52]) Cfr. MARCELO REBELO DE SOUSA/JOSÉ DE MELO ALEXANDRINO, Constituição da República Portuguesa, Comentada, Edições Lex, Lisboa 2000, p. 90.
x) Ob. cit., pág. 127.
x1) Acórdão do Tribunal Constitucional nº 1007/96, in Diário da República, II Série, de 12 de Dezembro de 1996.
x2) Citando-se GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa, Anotada, 2ª edição, 1º volume, 1984, pág. 149. Cfr. o Parecer nº 58/85, de 16 de Janeiro de 1986, publicado no Diário da República, II Série, de 12 de Abril de 1986, aí citado, e o Parecer nº 50/92, de 27 de Novembro de 1992.
x3) Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador – Contributo para a Compreensão das Normas Constitucionais Programáticas, Coimbra Editora, Reimpressão, 1994, pág. 382.
x4) Como dá conta JOSÉ CASALTA NABAIS, “Os Direitos Fundamentais na Jurisprudência do Tribunal Constitucional”, in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Vol. LXV, 1989, pág. 104.
x5) Vide MARTIM DE ALBUQUERQUE, com a colaboração de EDUARDO VERA CRUZ, Da Igualdade – Introdução à Jurisprudência, Livraria Almedina, Coimbra 1993, pág. 335. Os Autores identificam um vasto conjunto de Pareceres da Comissão Constitucional e Acórdãos do Tribunal Constitucional onde estas e outras fórmulas equivalentes foram consideradas como traduzindo arbítrio legislativo ou distinção arbitrária, concluindo: «a cláusula jurídico-constitucional geral da igualdade vale como proibição de regulamentações infundamentadas, desrazoáveis ou arbitrárias».
x6) A noção de arbítrio não se entende em sentido subjectivo mas em sentido objectivo, como sublinha JOÃO MARTINS CLARO, “O Princípio da Igualdade”, in Nos Dez Anos da Constituição, organização de JORGE MIRANDA, Imprensa Nacional – Casa da Moeda, pág. 36. Não é, escreve aquele Autor, «o arbítrio subjectivo que conduz à constatação da inconstitucionalidade, mas a desproporção evidente e objectiva de uma disposição em relação à situação que pretende conformar» .
x7) Constituição da República Portuguesa, Anotada, 3ª edição revista, Coimbra Editora, 1993, pág. 127. Na jurisprudência do Tribunal Constitucional vide, entre outros, os Acórdãos nº 121/99, de 2 de Março de 1999 (processo nº 370/96 – 1ª Secção), nº 683/99, de 21 de Dezembro de 1999 (processo nº 42/98 – 2ª Secção), nº 37/2001, de 31 de Janeiro de 2001 (processo nº 539/2000 – 2ª Secção), nº 98/2001, de 13 de Janeiro de 2001 (processo nº 744/2000 – 3ª Secção), nº 455/2002, de 30 de Outubro de 2002 (processo nº 152/2002 – 3ª Secção), todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt.
[53]) Cfr. o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 77/2001, Diário da República, II Série, de 26 de Março de 2001.