Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1009/19.6T8PFR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOÃO DIOGO RODRIGUES
Descritores: CONTRATO DE SEGURO
DENÚNCIA DO CONTRATO
FORMA ESCRITA
COBERTURA DO SEGURO
CLÁUSULA DE EXCLUSÃO DE RESPONSABILIDADE
DEVER DE COMUNICAÇÃO
Nº do Documento: RP202407101009/19.6T8PFR.P1
Data do Acordão: 07/10/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Sendo obrigatória a observância da forma escrita para a denúncia do contrato de seguro, a prova dessa denúncia carece de ser feita por esse meio ou, subsidiariamente, por confissão expressa da parte a quem tal denúncia é dirigida.
II - Não tendo sido produzida essa prova, a denúncia não pode julgar-se demonstrada.
III - Presentemente, função do decidido no Tribunal de Justiça da União Europeia, no seu Acórdão de 20/04/2023, proferido no Processo C‑263/22, deve considerar-se que a não comunicação de uma cláusula limitativa da cobertura do risco segurado pelo tomador de um seguro de grupo, a quem incumbia proceder a essa comunicação, pode ser oposta à seguradora no sentido de considerar tal cláusula excluída do contrato de seguro.
IV - Provando-se, entre o mais, que, não obstante a apurada patologia do carcinoma da mama e respetivas sequelas, a autora mantém capacidade para o exercício de outras atividades profissionais (com a exceção de cabeleireira, costureira e similares), desde que não impliquem mobilização do membro superior direito acima do nível dos ombros ou em esforço prolongado no tempo, não se pode considerar, no contexto do específico contrato de seguro em análise e perante o quadro de vida apurado, que aquela esteja afetada por uma invalidez absoluta e definitiva.
V - Já, porém, com referência a um outro contrato de seguro no qual, para além dessa invalidez absoluta e definitiva, também se previu a cobertura do risco de invalidez total e permanente, deve considerar-se por via interpretativa deste conceito no contexto desse contrato e com referência aos concretos factos provados, que a autora está afetada por tal incapacidade.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 1009/19.6T8PFR.P1

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SUMÁRIO:

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Relator: João Diogo Rodrigues;

Adjuntos: Rodrigues Pires;

Ramos Lopes.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I - Relatório

1- AA, instaurou a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra A..., SA, pedindo a condenação desta seguradora a:

a) Pagar ao Banco 1..., SA, “as quantias de empréstimo em dívida em Março de 2016 que se fixava no valor de 43.574,48€, ou outro valor que se venha apurar como valor em divida àquela data, devendo a ré assumir a posição de devedor nos empréstimos celebrados com o Banco 1..., SA”;

b) Pagar-lhe “as prestações do empréstimo que esta continuou a pagar ao Banco 1..., SA desde Março de 2016 até ao trânsito em julgado da sentença que vier a ser proferida nos presentes autos, acrescido dos juros de mora, à taxa legal, até efectivo pagamento”.

Baseia estes pedidos, essencialmente, na circunstância da Ré se recusar a pagar as referidas prestações, apesar de a tal estar obrigada pelo contrato de seguro (ramo vida/saúde) consigo celebrado e de estarem preenchidos os pressupostos para o referido pagamento, designadamente, por estar afetada com uma incapacidade permanente para o trabalho de 80% e não poder exercer a sua profissão habitual ou qualquer outra.

Pediu ainda a intervenção principal provocada do Banco 1..., SA, que sucedeu na posição contratual do Banco 2..., SA., com quem celebrou o contrato de mútuo associado ao dito contrato de seguro.

2- Contestou a Ré, refutando os aludidos pedidos porquanto, para além do mais, a A. não se encontra na situação clínica prevista para o acionamento das garantias das apólices (dos seguros de grupo a que aquela aderiu), pois que as sequelas de que é portadora não lhe conferem uma incapacidade permanente de 66% e encontra-se capaz para o desempenho da sua profissão habitual de cabeleireira, bem como capaz de exercer outras profissões, e não necessita de apoio de terceira pessoa.

Além disso, o contrato de seguro, celebrado no dia 03/03/2000, titulado pela apólice n.º ...62, foi por si denunciado em 12/12/2017, com efeitos a partir do último dia desse mês e ano.

Pugna, assim, pela improcedência desta ação.

3- Em resposta, a A., alega, resumidamente, que não foram consigo contratadas, nem lhe foram explicadas as cláusulas em que a Ré ancora a sua defesa, defendendo, por isso, que essas cláusulas são nulas.

4- Na sequência de convite posterior, a A. esclareceu qual o valor em dívida ao Banco 1..., SA, e ainda que pretende a intervenção deste como seu associado

Corrigiu também o seu pedido, de modo a que a Ré seja condenada a pagar ao Banco 1..., SA, “as quantias de empréstimo em dívida em Março de 2016 que se fixava no valor de 41.543,47€, ou outro valor que se venha apurar como valor em dívida àquela data, devendo a ré assumir a posição de devedor nos empréstimos celebrados com o Banco 1..., SA, acrescido de juros”; bem como ainda condenada a pagar-lhe “as prestações do empréstimo que esta pagou ao Banco 1..., SA a partir de Março de 2016 no valor de 537,67 € e as que porventura venha a liquidar até ao trânsito em julgado da sentença que vier a ser proferida nos presentes autos, acrescido dos juros de mora, à taxa legal, até efectivo pagamento”.

5- Admitida a intervenção principal do Banco 1..., S.A., veio o mesmo, depois de citado, alegar, para além do mais, que, por referência à data de 01/09/2020 (com o esclarecimento que os juros não consideram taxa de mora), a A. apresenta as seguintes responsabilidades, vencidas:

1. Contrato de Mútuo HP (1ª Habit) – ...96:

a. Capital: 37.094,37 Eur;

b. Juros: 6.219,30 Eur ;

2. Contrato de Mutuo HP (1ª Habit) – ...96:

a. Capital: 6.329,14 Eur;

b. Juros: 1.041,81 Eur (*);

c. Imp. Selo: 41,67 Eur.

6- Perante este articulado, a A. retificou o seu pedido no sentido de a Ré ser condenada a pagar os montantes em dívida anteriormente discriminados, sendo o valor total de 50.726,29€, sem prejuízo dos juros vincendos.

7- A Ré impugnou a alegação do Banco 1..., SA.

8- Ulteriormente, foi admitida a última retificação do pedido efetuada pela A. e, em consequência, remetidos os autos, por força da declaração de incompetência, ao Juízo Central que se considerou competente.

9- Já em sede de audiência prévia a A. exerceu o contraditório relativamente à contestação da Ré seguradora e a A., por sua vez, o contraditório quanto à alegada falta de comunicação e explicação das cláusulas contratuais gerais.

10- Proferido despacho saneador, prosseguiram depois os autos os seus termos, vindo a ser realizada a audiência final, após a qual foi proferida sentença na qual se decidiu:

“a) condenar a ré a pagar ao Banco 1..., SA, a quantia de €6.329,14 (seis mil trezentos e vinte e nove euros e catorze cêntimos), correspondente ao capital em dívida, à data de 15/09/2020, do contrato de mútuo HP -...96, celebrado em 22/08/2008, ou a quantia que, no momento do pagamento, esteja em dívida de capital, caso entretanto aquele valor tenha diminuído na sequência de pagamentos feitos entretanto;

b) condenar a ré a pagar à autora uma quantia correspondente à diferença entre o capital, respeitante ao empréstimo referido na alínea anterior, que estiver em dívida na data do cumprimento da obrigação referida na alínea a) e aquele capital que estava em dívida à data da verificação da invalidez total e permanente, ou seja, 6/08/2018, a liquidar em incidente de liquidação da sentença;

c) absolver a ré do demais peticionado”.

11- Inconformada com esta sentença, dela recorre a A. terminando a sua motivação com as seguintes conclusões:

“1. A douta sentença recorrida absolveu a Ré seguradora do pedido de pagamento do capital em divida referente ao empréstimo nº ...96 celebrado em 03/03/2000 associado ao contrato de seguro com a apólice ...62 e garantido pelo certificado individual de seguro nº ...99.

2. Antes do mais, apela-se a este Venerando tribunal que altere, em face da prova produzida, a decisão sobre a matéria de facto, competência que lhe é atribuída.

3. Factos incorretamente julgados

Alínea 60. No dia 31/12/2017, a ré denunciou o contrato de seguro de grupo titulado pela apólice n.º ...62 e respectiva adesão da autora ao mesmo. Alínea 61. Para o efeito e nessa data, a Ré remeteu à Autora uma carta, na qual lhe comunicou que “a apólice cessará os seus efeitos no próximo dia 31 de Dezembro, terminando nesta data a sua adesão ao mesmo”.

4. Meios probatórios que impunham decisão sobre os factos impugnados Diversa da recorrida - Confissão da ré plasmada no artigo 31 da contestação.

- Perícia médica realizada no dia 20 abril de 2023 (referencia citius 8745395) - Declarações prestadas pela autora no dia 25/10/2023 - minuto 5:33

- Proposta de adesão junta como documento 2 da contestação.

5. Resposta que se pretende seja dada: As alíneas 60 e 61 dos factos provados devem ser dados como não provados.

6. Deve ainda ser dado como provado, mediante a inclusão de três novas alíneas à matéria dada como provada, a seguinte factualidade:

Aliena 85:

A autora acionou o certificado individual de seguro nº ...99 e titulado pela apólice ...62 e referente ao empréstimo celebrado em 03/03/2000, pelo menos, em data anterior a 12/12/2017.

Aliena 86: A autora necessita da ajuda de 3º pessoa para a realização de algumas tarefas do quotidiano e numa necessidade de 2 horas diárias.

Alínea 87 Era pretensão da autora celebrar um seguro que que cobrisse o risco de uma incapacidade definitiva e permanente para a sua atividade de cabeleira e de acordo aliás com o que lhe transmitiram aquando da adesão à apólice.

7. Deve ser dado como assente que a autora participou o evento/doença à ré seguradora, pelo menos, em data anterior a 12/12/2017, conforme resulta da confissão da ré plasmada no teor do artigo 31 da contestação.

8. Nos termos do disposto no artigo 358, mº 1 do CC a confissão escrita tem força probatória plena.

9. Deve dar-se como não provado que a ré tivesse denunciado os efeitos da apólice ...62 (certificado individual de seguro nº ...99) a partir de 31 dezembro de 2017.

10. Tal factualidade foi impugnada pela autora, sendo que a ré não junta aos autos a comunicação escrita da alegada denúncia.

11. A prova de tal denúncia efetuada implicaria necessariamente da existência de uma comunicação escrita e prova, por parte da ré, da receção de tal comunicação pela autora.

12. O contrato de seguro é um contrato sujeito a forma ad probationem (Artigos 32º, nº 2, da Lei do Contrato de Seguro e Artigo 364º, nº2, do Código Civil), a denúncia do mesmo não pode ser feita com recurso a prova testemunhal (artigo 221º, nº2, do Código Civil;

13. A cessação do contrato não iliba a seguradora da obrigação de realizar a prestação decorrente da cobertura do risco, conquanto o sinistro seja anterior ou concomitante com a cessação, nem prejudica os direitos adquiridos por terceiros durante a vigência do contrato.

14. Seria em todo o caso, um claro abuso de direito, nos termos do artigo 334 do CC, e por exceder os limites impostos pela boa-fé, o que também se invoca.

15. Deve dar-se como provado que era pretensão da autora celebrar um seguro que cobrisse o risco de uma incapacidade definitiva e permanente para a sua atividade de cabeleira e de acordo aliás com o que lhe transmitiram aquando da adesão à apólice. (depoimento da autora gravado no dia 25/10/2023 ao minuto 5:33).

16. Resultada proposta de seguro (certificado individual de seguro nº ...99 e titulado pela apólice ...62) apenas os seguintes dizeres:

Beneficiário

Pelo valor em divida à data do sinistro e até à concorrência do capital seguro, no caso de morte e invalidez

O Banco 2...

17.A não comunicação das cláusulas contratuais gerais, designadamente quanto ao conceito de invalidez absoluta e definitiva resulta do facto de a ré seguradora nenhuma prova ter feito nesse sentido.

18.A questão que ora se coloca prende-se com a qualificação da situação da autora como invalidez absoluta e definitiva que, da proposta de subscrição, se qualifica o estado de doença ou acidente que incapacite total e definitivamente a pessoa segura para o exercício de

qualquer profissão e que implique a indispensabilidade da assistência constante de uma terceira pessoa.

19. A jurisprudência dominante tem reconhecido que as cláusulas de um contrato de seguro deste tipo, negociadas entre a Seguradora e o Banco tomador do seguro, ao qual o segurado se limita a aderir, estão sujeitas ao Regime das Cláusulas Contratuais Gerais (RCCG) – DL 446/85, de 25 de Outubro – nomeadamente às regras relativas ao cumprimento dos deveres de informação e de comunicação (art. 5.º e 6.º), e às que proíbem a inserção de cláusulas contratuais gerais contrárias ao princípio da boa-fé (arts. 15.º e 16.º), devendo ser ponderados os valores fundamentais do direito relevantes na situação considerada, assim como a confiança suscitada pelo sentido global das cláusulas, e o objetivo visado pelas partes e outros elementos atendíveis.

20. É imposto pelo Banco ao mutuário como condição de concessão do empréstimo hipotecário necessário à aquisição de habitação – como foi o caso dos autos que obrigou a autora - a celebração de um seguro de vida garantindo os riscos de morte e de invalidez.

21. Como mero consumidor que pretende alcançar um fim social legítimo – a aquisição de habitação – deve procurar-se a eliminação das situações de desequilíbrio contratual proporcionadas pelo confronto entre partes com peso negocial diverso, e interpretar-se o contrato de modo a salvaguardar a proteção do aderente, à luz dos princípios da boa-fé e do fim social e económico do direito.

22. Deste modo, tem sido entendido que a Seguradora não pode opor ao aderente do contrato de seguro de grupo do ramo vida as cláusulas que não foram informadas, para se eximir do pagamento do capital seguro, como ainda que a cláusula contratual que faz depender a verificação do risco de invalidez absoluta e definitiva e da necessidade permanente de recurso à assistência de terceira pessoa para efetuar os atos ordinários da vida corrente, é atentatória do princípio da boa-fé.

23. Na verdade, uma exigência destas, relativa à vida quotidiana, é alheia ao risco principal que se pretende segurar, ligada à perda de rendimentos derivada da impossibilidade de exercício da respetiva atividade profissional.

24. A imposição de uma cláusula desta natureza, provoca um significativo desequilíbrio contratual entre as partes, na medida em que o consumidor/aderente do contrato de seguro deixa de poder prevenir uma situação de impossibilidade de obtenção de rendimentos do trabalho e consequente incumprimento do contrato de mútuo.

25. Não tendo a Seguradora logrado provar que comunicou à Autora a definição de invalidez absoluta e definitiva (Alínea 12 dos factos Não Provados) nomeadamente, na parte em que exige a incapacidade para o exercício, não só da sua profissão, mas ainda de qualquer profissão – deverá tal cláusula ser considerada excluída (art. 8.º do RCCG) e recorrer-se ao sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, poderia deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não poder razoavelmente contar com ele (art. 236.º, n.º 1, do Código Civil).

26. Uma invalidez absoluta e definitiva será para um declaratário normal um estado da pessoa que o deixa totalmente (completamente, sem restrição) incapaz, para o resto da vida, de exercer a sua atividade, designadamente laboral, em termos de obtenção de meios de subsistência.

27. Como resulta dos autos, a autora encontra-se numa situação de incapacidade permanente e definitiva de exercer a sua atividade habitual de cabeleira e outras similares.

28. No que se refere à questão da ajuda de terceira pessoa entendida pela seguradora que se verifica quando implique a indispensabilidade da assistência constante de uma terceira pessoa e que a ré também não logrou provar que tivesse comunicado ou explicado.

29. O certo, porém, é que a autora necessita da ajuda de 3º pessoa de forma constante, permanente e diária, designadamente para a realização de algumas tarefas do quotidiano e numa necessidade de 2 horas diárias.

30. Tendo em conta que a pretensão da autora, ao celebrar o contrato de seguro, foi ter coberto o risco de uma incapacidade definitiva e permanente para a sua atividade habitual de cabeleireira, atendendo designadamente à factualidade provada em 45, 50, 51, 53, 58 e 59 dos Factos Provados, deverá entender-se que a situação dos autos integra o conceito de invalidez absoluta e definitiva que um declaratário normal e razoável retiraria do contrato de seguro.

31. De acordo com a aliena 79 dos factos provados, o valor em divida ao banco, à data de 15/09/2020, referente ao mútuo nº ...96 celebrado em 03/03/2000 associado ao contrato de seguro com a apólice ...62 e garantido com pelo certificado individual de seguro nº ...99, ascendia à quantia de 37.094,37 €, cujo valor a ré deve ser condenada.

32. Devendo ainda a ré ser condenada a pagar à autora uma quantia correspondente à diferença entre o capital, respeitante ao empréstimo referido na alínea anterior, que estiver em dívida na data do cumprimento da obrigação referida na alínea a) e aquele capital que estava em dívida à data da verificação da invalidez total e permanente, ou seja, 6/08/2018, a liquidar em incidente de liquidação da sentença.

33. A decisão “à quo” violou por erro de interpretação o disposto nos artigos 236, 334, 358 do CC, artigos 5,6, 15 e 16 do DL 446/85”.

Termina pedindo que se revogue a sentença recorrida e se julgue a presente ação totalmente provada e procedente, e que, além da manutenção da condenação verificada na decisão recorrida, se condene ainda a Ré:

a) A pagar ao Banco 1..., SA a quantia de 37.094,37€, correspondente ao valor em divida ao banco, à data de 15/09/2020, referente ao mútuo nº ...96 celebrado em 03/03/2000 associado ao contrato de seguro com a apólice ...62 e garantido com pelo certificado individual de seguro nº ...99,

b) A pagar-lhe uma quantia correspondente à diferença entre o capital, respeitante ao empréstimo referido na alínea anterior, que estiver em dívida na data do cumprimento da obrigação referida na alínea a) e aquele capital que estava em dívida à data da verificação da invalidez total e permanente, ou seja, 6/08/2018, a liquidar em incidente de liquidação da sentença.

12- A Ré respondeu, sintetizando a sua motivação nestes termos:

I- Os factos que a Autora pretende ver aditados à matéria de facto assente ou são irrelevantes para a decisão da causa (artigo 85.º e 87º), ou são essenciais e nucleares ao reconhecimento do direito que invoca, pelo que não podem ser atendidos, nos termos do disposto no artigo 5.º n.º 2 do CPC

II- Em qualquer caso, esses factos não foram objeto de contraditório pela Ré, pelo que nunca poderiam ser considerados, o que impõe a improcedência, nessa parte, do recurso

III- Nas suas alegações a recorrente não indica, de forma concreta, os elementos de prova que, relativamente a cada facto, impõem decisão diversa da proferida quanto aos factos que impugna, o que implica a rejeição do recurso nessa parte

IV- Nenhum elemento de prova impugna decisão diversa da proferida quanto aos factos cuja decisão é impugnada pela Autora, a qual se deve manter

V- Na douta sentença sob censura o Tribunal, no que toca ao contrato de seguro correspondente à adesão ...99 à apólice ...62, limitou-se a concluir que a alegada situação de invalidez absoluta e Definitiva alegada pela Autor era posterior à cessação daquela apólice, pelo que nunca poderia estar coberta pelas respetivas garantias.

VI- No que toca a essa questão, por se concordar, inteiramente, com o que foi doutamente decidido, a Ré louva-se na fundamentação da douta sentença.

VII- Na douta sentença sob censura o Tribunal não se debruçou sobre as demais questões que se colocam relativamente a esse contrato de seguro, nomeadamente sobre as consequências do eventual incumprimento do dever de informação quanto às cláusulas desse contrato de seguro, sobre a verificação ou não de uma situação de Invalidez Absoluta e Definitiva, a luz desse contrato de seguro, ou com base na respetiva integração e sobre as prestações devidas, caso se conclua pela ocorrência de um sinistro.

VIII- Assim, se for revogada a douta sentença, impõe-se que este Tribunal conheça daquelas outras questões, nos termos do disposto no artigo 665.º n.º 2 do CPC.

IX- O contrato de seguro correspondente à adesão ...99 ao seguro de grupo ...62 não se trata de uma apólice que tenha sido diretamente celebrada entre a Ré e a Autora, tendo-se esta limitado a aderir a esse seguro de grupo que já vigorava e do qual era tomador o Banco 2...

X- A Ré não estabeleceu com o tomador do indicado seguro de grupo que seria sua (da seguradora) a obrigação de prestar aos aderentes as informações pré-contratuais necessárias, como se vê da leitura do clausulado da apólice.

XI- Assim, no caso concreto e nos termos do disposto no DL 176/95, de 26 de julho (artigo 4º), era sobre o tomador do seguro – o Banco 2..., agora integrado no Banco 1... - que recaía a obrigação de prestar aos aderentes a esse seguro de grupo, no caso a A e seu marido, as informações pré-contratuais que fossem necessárias (nomeadamente quanto às coberturas e exclusões do contrato) e não à seguradora.

XII- Consequentemente, a eventual omissão desse dever de informação, nomeadamente quanto ao conteúdo do contrato, suas coberturas ou exclusões, nunca teria como consequência a possibilidade de serem afastadas quaisquer cláusulas da apólice.

XIII- E, caso se mostre necessário avaliar se a situação clínica da Autora corresponde ou não a uma situação de Invalidez Absoluta e Definitiva, será com base nas estipulações desse contrato de seguro que tal integração deve ser apreciada.

XIV- Nos termos do contrato de seguro, a situação de Invalidez Absoluta e Definitiva depende da verificação das seguintes situações

 A ocorrência de doença ou acidente

 que incapacite total e definitivamente a Pessoa Segura para o exercício de qualquer profissão e que

 implique a indispensabilidade da assistência constante de uma terceira pessoa.

XV- Como acima se disse, tal clausula não poderá ser excluída do contrato de seguro, ainda que se conclua que ocorreu um incumprimento, pelo Banco, do dever de informação.

XVI- Em face da factualidade dada como provada na douta sentença, a Autora, fruto de doença, estará incapaz para o desempenho da sua profissão habitual.

XVII- Porém, a incapacidade para a profissão habitual, sendo absoluta para esse trabalho, é meramente parcial para muitos outros.

XVIII- No essencial, a Autora é portadora de sequelas que a impedem de realizar movimentos repetitivos próprios da profissão de cabeleireira, costureira e similares, por períodos prolongados (cfr factos dos pontos 65 e 66 da matéria provada)

XIX- Porém, dos factos dados como provados não se retira, de forma alguma, que a Autora não possa exercer outras profissões que não exijam esses mesmos esforços físicos.

XX- Num cenário, como o dos autos, em que a Autora não está incapaz para toda e qualquer profissão, podendo exercer outras profissões e obter rendimentos de trabalho, não se verifica a situação de invalidez absoluta e definitiva.

XXI- Sendo de referir, também, que não se provou que careça de apoio permanente de terceira pessoa, aqui entendido como total e não parcial.

XXII- O que tudo impõe a improcedência do recurso no que toca à apólice ...62 (única, aliás, em discussão), confirmando-se, nessa parte, a douta sentença.

XXIII- Ainda que se viesse a considerar que o incumprimento pelo Banco (enquanto tomador) do dever de informação quanto ao conteúdo da apólice ...62, tem como consequência a exclusão de cláusulas desse contrato de seguro, nem assim poderia ser atendida a pretensão da Autora.

XXIV- A exclusão dessa cláusula eliminaria do contrato a definição de Invalidez Absoluta e Definitiva, competindo ao julgador, com base nas regras acima mencionadas, integrar a lacuna deixada pela exclusão da referida cláusula.

XXV- Ora, na realidade, esse exercício reconduziria o interprete a uma definição de Invalidez Absoluta e Definitiva em tudo semelhante à que já consta daquela cláusula excluída, ainda que sem a exigência de necessidade de verificação de dependência de terceiros, ou de reconhecimento da invalidez por médico da seguradora.

XXVI- Será definitivo tudo aquilo que não é temporário ou passageiro e é absoluto aquilo que não é parcial, limitado ou comportando alguma reserva.

XXVII- Sendo que, aplicando-se esses conceitos à capacidade laboral, percebe-se que está em causa a impossibilidade total de exercer qualquer profissão.

XXVIII- Essa definição de Invalidez Absoluta e Definitiva é, também, a que melhor se compatibiliza com o objetivo do contrato de seguro, o qual se destina a assegurar que as pessoas seguras sejam substituídas pela seguradora no pagamento ao Banco do capital mutuado num crédito à habitação, quando, em consequência de acidente ou doença, se vejam impossibilitadas de cumprir tal obrigação

XXIX- Assim, ainda que seja totalmente eliminada do contrato de seguro a cláusula que define a invalidez para efeitos de acionamento da apólice, na integração desse conceito o julgador não pode deixar de considerar que é de exigir uma situação de total incapacidade para todo e qualquer trabalho e, não apenas, de incapacidade para o trabalho habitual, situação essa na qual a Autora não se encontra

XXX- Ora neste contexto, ainda que por recurso às regras de interpretação e integração do contrato de seguro, teria de se considerar que se mantém, como exigência para a integração do conceito de Invalidez Absoluta e Definitiva, que do acidente ou doença resulte uma incapacidade Total e Definitiva da Pessoa Segura para o exercício de qualquer profissão.

XXXI- E, face factualidade dada como provada, é patente que a Autora não se encontra nessa situação, já que apenas está afetado por limitações que a incapacitam para a sua profissão habitual, mas não para toda e qualquer profissão.

XXXII- Logo, a Autora não está em situação de Invalidez Absoluta e Definitiva, pelo que se impunha a decisão proferida no que toca às coberturas da adesão da Autora à apólice ...62, a qual se deve manter.

XXXIII- Na douta sentença sob censura o Tribunal, no que toca ao contrato de seguro correspondente à adesão ...99 à apólice ...62, limitou-se a concluir que a alegada situação de invalidez absoluta e Definitiva alegada pela Autor era posterior à cessação daquela apólice, pelo que nunca poderia estar coberta pelas respetivas garantias.

XXXIV- Quanto às demais questões que serviam de fundamento à pretensão da Autora e à defesa da Ré, o Tribunal não se pronunciou, uma vez que considerou prejudicado o seu conhecimento, em face da solução jurídica a que chegou.

XXXV- Porém, na douta sentença sob censura o Tribunal pronunciou-se sobre a questão das consequências do incumprimento pelo Banco do dever de informação relativamente à apólice ...04, também ela correspondente a um seguro de grupo e também em causa na ação.

XXXVI- E, para a hipótese de se entender que na douta sentença sob censura o Tribunal conheceu, pelo menos, da questão das consequências do incumprimento do dever de informação relativamente à apólice ...62 (aqui por similitude com o que foi decidido quanto à apólice ...04), então a Ré terá ficado vencida quanto a essa questão.

XXXVII- Logo, se se entender que essa questão foi decidida e que tem aplicação ao contrato ...62, a Ré terá, no que toca a esse concreto fundamento da sua defesa, decaído

XXXVIII- Assim, prevenindo a hipótese de procedência do recurso e porque não pode concordar com tal entendimento, a Ré requer que tal questão seja apreciada, em sede de ampliação do âmbito do recurso.

XXXIX- A Ré dá aqui por reproduzido e integrado, para efeitos de ampliação do objeto do recurso, o que alegou nos pontos 3.1 e 3.2 das suas alegações e conclusões IX a XXXII

XL- Como aí se defendeu, o contrato de seguro correspondente à adesão ...99 ao seguro de grupo ...62 não se trata de uma apólice que tenha sido diretamente celebrada entre a Ré e a Autora, tendo-se esta limitado a aderir a esse seguro de grupo que já vigorava e do qual era tomador o Banco 2....

XLI- Assim, no caso concreto e nos termos do disposto no DL 176/95, de 26 de julho (artigo 4º), era sobre o tomador do seguro – o Banco 2..., agora integrado no Banco 1... - que recaía a obrigação de prestar aos aderentes a esse seguro de grupo, no caso a A e seu marido, as informações pré-contratuais que fossem necessárias (nomeadamente quanto às coberturas e exclusões do contrato) e não à seguradora.

XLII- Consequentemente, a eventual omissão desse dever de informação, nomeadamente quanto ao conteúdo do contrato, suas coberturas ou exclusões, nunca teria como consequência a possibilidade de serem afastadas quaisquer cláusulas da apólice.

XLIII- Em face da factualidade dada como provada na douta sentença, a Autora, fruto de doença, estará incapaz para o desempenho da sua profissão habitual, nem em situação de Invalidez Absoluta e Definitiva, tal qual prevista na apólice

XLIV- Ainda que se viesse a considerar que o incumprimento pelo Banco (enquanto tomador) do dever de informação quanto ao conteúdo da apólice ...62, tem como consequência a exclusão de cláusulas desse contrato de seguro, nem assim poderia ser atendida a pretensão da Autora.

XLV- Assim, ainda que seja totalmente eliminada do contrato de seguro a cláusula que define a invalidez para efeitos de acionamento da apólice, na integração desse conceito o julgador não pode deixar de considerar que é de exigir uma situação de total incapacidade para todo e qualquer trabalho e, não apenas, de incapacidade para o trabalho habitual, situação essa na qual a Autora não se encontra

XLVI- E, face factualidade dada como provada, é patente que a Autora não se encontra nessa situação, já que apenas está afetado por limitações que a incapacitam para a sua profissão habitual, mas não para toda e qualquer profissão.

XLVII- Logo, a Autora não está em situação de Invalidez Absoluta e Definitiva, pelo que se impunha a decisão proferida no que toca às coberturas da adesão da Autora à apólice ...62, a qual se deve manter”.

Termina pedindo que seja negado provimento ao recurso da A., confirmando-se, na parte impugnada, a sentença recorrida e conhecendo-se, se necessário, das questões cuja apreciação foi considerada prejudicada na sentença recorrida.

13- A Ré também recorreu subordinadamente finalizando a sua motivação de recurso com as seguintes conclusões:

I- O contrato de seguro correspondente à adesão ...49 ao seguro de grupo 14/1794 não se trata de uma apólice que tenha sido diretamente celebrada entre a Ré e a Autora, tendo-se esta limitado a aderir a esse seguro de grupo que já vigorava e do qual era tomador o Banco 2...

II- A Ré não estabeleceu com o tomador do indicado seguro de grupo que seria sua (da seguradora) a obrigação de prestar aos aderentes as informações pré-contratuais necessárias, como se vê da leitura do clausulado da apólice.

III- Assim, no caso concreto e nos termos do disposto no DL 176/95, de 26 de julho (artigo 4º), era sobre o tomador do seguro – o Banco 2..., agora integrado no Banco 1... - que recaía a obrigação de prestar aos aderentes a esse seguro de grupo, no caso a A e seu marido, as informações pré-contratuais que fossem necessárias (nomeadamente quanto às coberturas e exclusões do contrato) e não à seguradora.

IV- Consequentemente, a eventual omissão desse dever de informação, nomeadamente quanto ao conteúdo do contrato, suas coberturas ou exclusões, nunca teria como consequência a possibilidade de serem afastadas quaisquer cláusulas da apólice.

V- E, caso se mostre necessário avaliar se a situação clínica da Autora corresponde ou não a uma situação de Invalidez Total e Permanente, será com base nas estipulações desse contrato de seguro que tal integração deve ser apreciada.

VI- Nos termos do contrato de seguro, a situação de Invalidez Total e Permanente depende da verificação das seguintes situações

- A ocorrência de doença ou acidente

- que incapacite total e definitivamente a Pessoa Segura para o exercício de qualquer profissão compatível com os seus conhecimentos e experiência e que

- acarrete uma desvalorização não inferior a 66%, de acordo com a TNI

VII- Como acima se disse, tal clausula não poderá ser excluída do contrato de seguro, ainda que se conclua que ocorreu um incumprimento, pelo Banco, do dever de informação.

VIII- Em face da factualidade dada como provada na douta sentença, a Autora, fruto de doença, estará incapaz para o desempenho da sua profissão habitual.

IX- Porém, a incapacidade para a profissão habitual, sendo absoluta para esse trabalho, é meramente parcial para muitos outros.

X- No essencial, a Autora é portadora de sequelas que a impedem de realizar movimentos repetitivos próprios da profissão de cabeleireira, costureira e similares, por períodos prolongados (cfr factos dos pontos 65 e 66 da matéria provada)

XI- Porém, dos factos dados como provados não se retira, de forma alguma, que a Autora não possa exercer outras profissões que não exijam esses mesmos esforços físicos.

XII- Num cenário, como o dos autos, em que a Autora não está incapaz para toda e qualquer profissão, podendo exercer outras profissões e obter rendimentos de trabalho, não se verifica a situação de invalidez Total e Permanente.

XIII- O que tudo impõe a procedência do presente recurso no que toca às prestações atribuídas com base na apólice ...04, revogando-se, nessa parte, a douta sentença condenatória e absolvendo-se a Ré dos pedidos.

XIV-    Ainda que se viesse a considerar que o incumprimento pelo Banco (enquanto tomador) do dever de informação quanto ao conteúdo da apólice ...04, tem como consequência a exclusão de cláusulas desse contrato de seguro, nem assim poderia ser atendida a pretensão da Autora.

XV- A exclusão dessa cláusula eliminaria do contrato a definição de Invalidez Total e Permanente, competindo ao julgador, com base nas regras acima mencionadas, integrar a lacuna deixada pela exclusão da referida cláusula.

XVI- Ora, na realidade, esse exercício reconduziria o interprete a uma definição de Invalidez Total e Permanente em tudo semelhante à que já consta daquela cláusula excluída, ainda que sem a exigência de necessidade de verificação de dependência de terceiros, ou de reconhecimento da invalidez por médico da seguradora.

XVII- Será Permanente tudo aquilo que não é temporário ou passageiro e é Total aquilo que não é parcial, limitado ou comportando alguma reserva.

XVIII- Sendo que, aplicando-se esses conceitos à capacidade laboral, percebe-se que está em causa a impossibilidade total de exercer qualquer profissão compatível com os conhecimentos do segurado.

XIX- Essa definição de Invalidez Total e Permanente é, também, a que melhor se compatibiliza com o objetivo do contrato de seguro, o qual se destina a assegurar que as pessoas seguras sejam substituídas pela seguradora no pagamento ao Banco do capital mutuado num crédito à habitação, quando, em consequência de acidente ou doença, se vejam impossibilitadas de cumprir tal obrigação

XX- Assim, ainda que seja totalmente eliminada do contrato de seguro a cláusula que define a Invalidez Total e Permanente para efeitos de acionamento da apólice, na integração desse conceito o julgador não pode deixar de considerar que é de exigir uma situação de total incapacidade para todo e qualquer trabalho compatível com os conhecimentos do segurado e, não apenas, de incapacidade para o trabalho habitual, situação essa na qual a Autora não se encontra, ou na qual não provou encontrar-se

XXI- E, face factualidade dada como provada, é patente que a Autora não se encontra nessa situação, já que apenas está afetado por limitações que a incapacitam para a sua profissão habitual, mas não para toda e qualquer profissão.

XXII- Logo, a Autora não está em situação de Invalidez Absoluta e Definitiva, pelo que se impunha deve ser revogada a douta sentença condenatória, absolvendo-se a Ré de todos os pedidos”.

Termina pedindo que se conceda provimento ao seu recurso, revogando-se a sentença recorrida e absolvendo-se a Ré de todos os pedidos.

14- A A. respondeu a este recurso, pugnando pela sua improcedência, com base nas seguintes conclusões:

“1. Está em causa neste recurso subordinado a adesão ao seguro de grupo ...04 (adesão ...49).

2. A ré não impugna a matéria de facto e as conclusões de recurso delimitam o objeto do recurso.

3. A ré coloca, em sumula, duas questões:

- A não comunicação das clausulas contratuais, sendo obrigação do tomador (banco) não afetam a sua validade e/ou exclusão.

- Da verificação da situação de invalidez total e permanente.

4. A jurisprudência lavrada por este douto Tribunal tem reconhecido que as cláusulas de um contrato de seguro deste tipo, negociadas entre a Seguradora e o Banco tomador do seguro, ao qual o segurado se limita a aderir, estão sujeitas ao Regime das Cláusulas Contratuais Gerais (RCCG) – DL 446/85, de 25 de Outubro – nomeadamente às regras relativas ao cumprimento dos deveres de informação e de comunicação (arts. 5.º e 6.º), e às que proíbem a inserção de cláusulas contratuais gerais contrárias ao princípio da boa-fé (arts. 15.º e 16.º), devendo ser ponderados os valores fundamentais do direito relevantes na situação considerada, assim como a confiança suscitada pelo sentido global das cláusulas, e o objetivo visado pelas partes e outros elementos atendíveis.

5. A jurisprudência dominante tem reconhecido que as cláusulas de um contrato de seguro deste tipo, negociadas entre a Seguradora e o Banco tomador do seguro, ao qual o segurado se limita a aderir, estão sujeitas ao Regime das Cláusulas Contratuais Gerais (RCCG) – DL 446/85, de 25 de Outubro – nomeadamente às regras relativas ao cumprimento dos deveres de informação e de comunicação (art. 5.º e 6.º), e às que proíbem a inserção de cláusulas contratuais gerais contrárias ao princípio da boa-fé (arts. 15.º e 16.º), devendo ser ponderados os valores fundamentais do direito relevantes na situação considerada, assim como a confiança suscitada pelo sentido global das cláusulas, e o objetivo visado pelas partes e outros elementos atendíveis.

6. É imposto pelo Banco ao mutuário como condição de concessão do empréstimo hipotecário necessário à aquisição de habitação – como foi o caso dos autos que obrigou a autora - a celebração de um seguro de vida garantindo os riscos de morte e de invalidez.

7. Como mero consumidor que pretende alcançar um fim social legítimo – a aquisição de habitação – deve procurar-se a eliminação das situações de desequilíbrio contratual proporcionadas pelo confronto entre partes com peso negocial diverso, e interpretar-se o contrato de modo a salvaguardar a proteção do aderente, à luz dos princípios da boa-fé e do fim social e económico do direito.

8. Deste modo, tem sido entendido que a Seguradora não pode opor ao aderente do contrato de seguro de grupo do ramo vida as cláusulas que não foram informadas, para se eximir do pagamento do capital seguro, como ainda que a cláusula contratual que faz depender a verificação do risco de invalidez absoluta e definitiva e da necessidade permanente de recurso à assistência de terceira pessoa para efetuar os atos ordinários da vida corrente, é atentatória do princípio da boa-fé.

9. Na verdade, uma exigência destas, relativa à vida quotidiana, é alheia ao risco principal que se pretende segurar, ligada à perda de rendimentos derivada da impossibilidade de exercício da respetiva atividade profissional.

10. A imposição de uma cláusula desta natureza, provoca um significativo desequilíbrio contratual entre as partes, na medida em que o consumidor/aderente do contrato de seguro deixa de poder prevenir uma situação de impossibilidade de obtenção de rendimentos do trabalho e consequente incumprimento do contrato de mútuo.

11. Pretender imputar-se as consequências do incumprimento por parte do tomador de seguro do dever de informação sobre o teor e sentido das cláusulas contratuais, é uma pretensão que ultrapassa claramente os limites da boa fé negocial.

12. Como resulta dos autos, a autora encontra-se numa situação de incapacidade permanente e definitiva de exercer a sua atividade habitual de cabeleira e até costureira e outras similares.

13. Consta das condições da apólice como incapacidade total e permanente a Incapacidade para o exercício da sua profissão ou de qualquer outra atividade remunerada compatível com as suas capacidades, conhecimentos e aptidões e ser portador de uma IPP não inferior a 66%.

14. Não está assim, desde logo, correto o teor da conclusão VI do recurso interposto pela ré seguradora, já que a cláusula prevê incapacidade para a profissão habitual.

15. Como bem refere a douta sentença recorrida, nesta parte, invalidez deve entender-se como estado de incapacidade para a sua profissão habitual, na medida em que priva o segurado da possibilidade de obter rendimentos que lhe permitam cumprir com o mútuo.

16. Está provado que a autora se encontra incapaz para a sua profissão de cabeleireira, sendo esta a área da sua formação e até para a atividade de costureira e similares, sendo irrelevante que possa exercer outras atividade profissionais, tendo em conta, além do mais, a sua idade e formação referida.

17. Aliás é de referir que a autora, como refere no seu depoimento, era sua pretensão celebrar um seguro que tivesse o risco de uma incapacidade para a sua atividade habitual de cabeleireira e foi isso que lhe foi transmitido aquando da celebração do contrato de seguro.

18. Como resulta dos autos, a autora encontra-se numa situação de incapacidade permanente e definitiva de exercer a sua atividade habitual de cabeleira e até de cabeleireira e outras similares.

19. A incapacidade da autora enquadra-se no risco coberto pela apólice.

20. Tendo em conta que a pretensão da autora, ao celebrar o contrato de seguro, foi ter coberto o risco de uma incapacidade para a sua atividade habitual de cabeleireira, de modo permanente, deverá entender-se que a situação dos integra o conceito de invalidez absoluta e definitiva que um declaratório normal e razoável retiraria do contrato de seguro”.

15- Recebidos os recursos e preparada a deliberação, importa tomá-la.


*

II- Mérito dos recursos

A- Definição do seu objecto

O objeto dos recursos, em regra e ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões das alegações dos recorrentes [artigos 608º nº 2, “in fine”, 635º, nº 4 e 639º nº1 do Código de Processo Civil (CPC)].

Assim, observando este critério no caso presente, o objeto dos recursos em apreço reconduz-se, essencialmente, a saber se:

a) Deve haver lugar à modificação da matéria de facto, requerida pela A;

b) O contrato de seguro titulado pela apólice n.º ...62, cessou, ou não, por denúncia da Ré;

c) Houve incumprimento do dever de informação quanto às cláusulas dos contratos de seguro em apreço e, nesse caso, quais as consequências, sobre quem devem elas recair e em que dimensão.


*

B- Fundamentação

B.1- Na sentença recorrida julgaram-se os seguintes factos:

1. Por escritura pública datada de 3 de Março de 2000, com a epígrafe “Mútuo com hipoteca e Fiança”, e para construção do prédio urbano, composto por parcela destinada à construção, sito no lugar ..., freguesia ..., concelho ..., inscrito na matriz sob o artigo ...60, descrito na Conservatória Predial sob o nº .../19841113, o banco Banco 2... declarou emprestar AA, que declarou tomar de empréstimo, a quantia de 12.500.000 escudos, tudo nos moldes e condições vertidas no documento n.º 1 junto com a petição inicial (escritura celebrada no Cartório Notarial de Paços de Ferreira e documento complementar), que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (alínea A) dos factos assentes).

2. A autora aderiu, através dos documentos nºs. 2 a 4 da contestação da ré seguradora, que aqui se são por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais, a dois acordos de seguro de grupo previamente existentes (apólices ...62 e ...04), os quais tinham sido celebrados entre a B..., S.A., e o Banco 2..., nos moldes e condições vertidas no documento n.º 1 e 3, respectivamente, juntos com a contestação da ré A..., que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais (alínea B) dos factos assentes com rectificação em conformidade com os documentos que lhe dizem respeito).

3. Relativamente à adesão ao seguro de grupo ...62, o capital inicialmente estabelecido na apólice era o de 12.500.000$00, tendo passado mais tarde a corresponder ao capital que estivesse em dívida nos contratos de mútuos celebrados pela autora, até àquele limite (alínea C) dos factos assentes).

4. Essas apólices garantiam o pagamento do capital que estivesse em dívida ao banco na data da verificação de algum dos riscos nelas previstos (alínea D) dos factos assentes).

5. B..., S.A., foi incorporada/fundida na C..., S.A., que, por sua vez, alterou a sua designação social para A..., S.A. (alínea E) dos factos assentes).

6. O Banco de Portugal alienou ao Banco 1..., SA, os direitos e obrigações, que constituem ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão, do Banco 2..., S.A. (alínea F) dos factos assentes).

7. O Tomador e beneficiário daqueles seguros de grupo era o Banco 2..., SA, agora Banco 1..., S.A, tendo a qualidade de beneficiário, pelo capital em dívida à data da invalidez, no limite do capital seguro (alínea G) dos factos assentes).

8. A Adesão da autora ao seguro de grupo ...62 teve início em 03/03/2000 e a adesão ao seguro de grupo 14/1.704 teve início em 22/08/2008 (alínea H) dos factos assentes).

9. A apólice ...49 corresponde ao número de certificado de adesão da autora à apólice de grupo ...04 (alínea I) dos factos assentes).

10. No dia 06/04/2017, a Autora fez uma participação à Ré, solicitado o acionamento da apólice ...49, com a indicação de que à Autora fora diagnosticado um carcinoma invasor de grau 3, a fim de esta pagar o capital em dívida ao Banco 1..., S.A., sendo que a Ré, no dia 14/05/2019, recusou o pagamento de qualquer prestação segura por entender que não se verifica a situação clínica que permite o despolemento das garantias da apólice, o que comunicou à Autora (alínea J) dos factos assentes).

11. Juntamente com essa participação foram remetidos alguns documentos clínicos, todos eles datados do ano de 2016 (alínea K) dos factos assentes).

12. No dia 01/01/1997, a Companhia de Seguros B..., SA, celebrou com Banco 2..., SA, um contrato de seguro de Grupo, titulado pela apólice n.º ...62, nos moldes vertidos no supra referido documento 1 junto com a contestação da ré seguradora, designadamente: Cobertura Principal: morte do segurado/pessoa segura por doença ou acidente; Cobertura Complementar: invalidez absoluta e definitiva do segurado/pessoa segura (alínea L) dos factos assentes).

13. Consta das Condições Gerais dessa Apólice o seguinte: “1. Definições

Tomador do seguro: a entidade que celebra o contrato de seguro com a seguradora e que é responsável pelo pagamento dos prémios.

Pessoa Segura: a pessoa sobre quem impende a eventual materialização dos riscos seguros

Beneficiário: a entidade a favor da qual é celebrado o contrato.

Grupo: o conjunto das pessoas ligadas entre si e ao Tomador do Seguro por um vínculo ou interesse comum que não seja o da efectivação do seguro.

Classifica-se em Seguro de grupo contributivo: Tipo de Seguro em que as Pessoas Seguras contribuem, no todo ou em parte, para o pagamento do prémio

Seguro de Grupo Não contributivo: Tipo de Seguro em que o Tomador do Seguro contribui na totalidade para o pagamento do prémio (…).

Boletim de Adesão: documento preenchido pelo candidato a pessoa segura onde expressa a vontade de ser integrado no seguro de grupo e que contem os respectivos dados de identificação e outros necessários à análise do risco a segurar.

Certificado Individual: certificado emitido pela Seguradora onde constam os elementos de identificação da respectiva Pessoa Segura e a designação dos Beneficiários;

Seguro Principal: garantia ou conjunto de garantias, tituladas por uma Condição Especial, que podem subsistir como única modalidade de seguro contratada.

Seguro Complementar: garantia ou conjunto de garantias, tituladas por uma Condição Especial, que só podem ser contratadas conjuntamente com o Seguro Principal”.

2. Objeto e Âmbito do Contrato

Para além destas Condições Gerais este contrato é constituído pelas Condições Especiais e Particulares, bem como pelas declarações prestadas pelo Tomador do Seguro e/ou Pessoas Seguras, que servem de base à aceitação do contrato, as quais se consideram como partes integrantes do mesmo.

Fazem também parte do contrato os Certificados Individuais e as Actas Adicionais emitidas durante a sua vigência.

O contrato de Seguro de Grupo poderá abranger, conforme o estabelecido nas Condições Especiais e Particulares da Apólice, os riscos de Morte e ou de vida e, de forma complementar, o risco de Invalidez ou qualquer outro que possa afetar a esperança de vida da pessoa segura. (…).

4. Início e Duração do Contrato e das Adesões

4.1 O contrato tem início às zero horas da data estipulada nas Condições Particulares e termina nos termos estabelecidos nas Condições Especiais e Particulares.

4.2. Para cada Pessoa Segura as garantias contratuais só produzem os seus efeitos a partir das zero horas do dia da aceitação da adesão por parte da Seguradora e indicada no respectivo.

Certificado Individual. A data termo de Cada Adesão está de acordo com o estipulado nas Condições Especiais de cada garantia, salvo se outra não for indicada no respetivo Certificado Individual.

(…)

6. Condições de Elegibilidade

6.1 O candidato a pessoa segura preencherá e assinará conjuntamente com o Tomador do Seguro o Boletim de Adesão fornecido pela Seguradora, respondendo com verdade e exactidão às questões nele formuladas.

6.2 Com vista à correcta avaliação do candidato a pessoa segura a seguradora poderá exigir, para além da Declaração de Saúde, que lhe faculte informações ou elementos complementares e se submeta a exames médicos que lhe sejam solicitados.

6.3 Considera-se candidato a Pessoa Segura aquele que satisfaça os seguintes requisitos:

• Pertença ao grupo segurável definido nas condições particulares do contrato;

• Não se encontre em situação de baixa por doença na data da sua adesão;

• Tenha idade inferior a 70 anos.

6.3 A seguradora reserva expressamente o direito de recusar a admissão ao seguro de qualquer candidato a pessoa segura cujo estado de saúde não seja considerado satisfatório.

7. Certificado de Seguro

Após a aceitação pela Seguradora da adesão ao seguro de grupo cada pessoa segura receberá um certificado individual o qual é válido apenas enquanto a pessoa segura pertencer ao grupo seguro definido nas Condições particulares da apólice e enquanto esta se mantiver em vigor.

8. Beneficiário

O tomador do seguro e/ou as pessoas seguras podem alterar, de acordo com o disposto nas condições particulares, o Beneficiário mas tal alteração só será válida desde que a Seguradora tenha recebido a correspondente comunicação escrita. Este direito cessa no momento em que o Beneficiário adquire o direito ao pagamento das importâncias seguras.

A designação beneficiária será considerada irrevogável sempre que tenha havido aceitação do benefício por parte do beneficiário e renúncia expressa do Tomador do Seguro e/ou Pessoas Seguras em a alterar. Esta renúncia, assim como a aceitação do Beneficiário, deverão constar de documento escrito, cuja validade depende da efetiva comunicação à Seguradora.

Sendo a designação do Beneficiário irrevogável, será necessário o seu prévio acordo para qualquer modificação das condições contratuais e que tenham incidência sobre os seus direitos, nomeadamente a falta do pagamento de prémios. Nestas circunstâncias o Beneficiário poderá substituir-se ao tomador do Seguro ou à Pessoa Segura no pagamento dos prémios e manutenção do contrato em vigor não lhe assistindo, no entanto, quaisquer outros direitos contratuais que não os previstos pelas Condições Gerais, Especiais ou particulares do contrato.

(…)

12. Pagamento das Importâncias Seguras

12.1. O pagamento das importâncias seguras será efectuado após apresentação do Certificado Individual da pessoa Segura e da seguinte documentação:

a) Em qualquer modalidade

• Prova da data de nascimento da pessoa segura (certidão de Nascimento ou Bilhete de Identidade);

• Documentos comprovativos da qualidade de beneficiário.

Se a importância segura for pagável sob a forma de Renda Vitalícia, de duração dependente da vida do beneficiário, também em relação a este é necessária a apresentação da respectiva prova de data de nascimento.

b) Nas modalidades em que o pagamento das importâncias seguras dependa da Morte da pessoa segura:

• Atestado do médico que a assistiu indicando as causas e evoluções da doença ou lesão corporal que causou o falecimento;

• Certificado de óbito.

c) Nas modalidades em que o pagamento das importâncias seguras dependa da Invalidez da Pessoa segura:

• Atestado detalhado passado por médicos que tratam e/ou trataram a pessoa segura indicando as circunstâncias, causas, início, natureza e provável duração do estado de invalidez;

• Relatório circunstanciado sobre a atividade profissional exercida pela Pessoa segura na data da ocorrência da invalidez.

d) nas modalidades em que o pagamento das importâncias seguras dependa da sobrevivência da pessoa segura: • Prova de vida

12.2. Nas modalidades em que o pagamento das importâncias seguras dependa da de um acidente não só deve ser feita a sua prova (auto de ocorrência emitido pelas autoridades competentes) como também a sua relação causal directa com o sinistro.

12.3. A seguradora reserva-se o direito de solicitar outros elementos ou de proceder às averiguações que entender convenientes para melhor conhecimento da natureza e extensão das suas responsabilidades. Para este efeito a Pessoa Segura deve prestar e/ou autorizar a prestação de todas as informações que sejam solicitadas, quer ao seu médico quer a estabelecimentos hospitalares, incluído autorização para facultarem fotocópias de certificados médicos, de fichas clínicas e de outros elementos afins. (…)

12.5. As importâncias seguras serão pagas ao Beneficiário designado. Não existindo Beneficiário designado, ou no caso de este ter já falecido, as importâncias seguras serão pagas aos herdeiros legais da pessoa segura. (…)

12.9. Sem prejuízo do disposto nos números 12.3 e 12.4. deste ponto a Seguradora compromete-se a liquidar as importâncias seguras antes de decorrido um prazo de 30 dias após a recepção dos respectivos documentos”.

14. Disposições Diversas

As pessoas seguras devem ser informadas pelo Tomador do Seguro sobre as garantias contratadas, as obrigações e diretos em caso de pagamento das importâncias seguras e as alterações posteriores que ocorram neste âmbito.

- O tomador do Seguro e/ou as Pessoas Seguras, durante a vigência do contrato, deverão comunicar por escrito à Seguradora, nos oito dias subsequentes ao doconhecimento, todos os factos e/ou circunstâncias suscetíveis de determinarem um agravamento do risco, nomeadamente os factos relacionados com a alteração da profissão, o local do seu exercício e o início da prática de qualquer actividade que possa provocar uma alteração do risco. Se estes factos e/ou circunstâncias comunicadas determinarem o respetivo agravamento ao risco, a seguradora apresentará novas condições de aceitação num prazo máximo de quinze dias.

Para os efeitos deste contrato serão considerados domicílio do Tomador do Seguro e das Pessoas Seguras os indicados, respetivamente, nas Condições Particulares e nos Boletins de Adesão ou, em caso de mudança, quaisquer outros que, por escrito, tenham sido comunicados à Seguradora” (alínea M) dos factos assentes).

14. Consta das condições especiais o seguinte: “ 1. Objeto do Contrato:

• A Companhia de Seguros B..., SA obriga-se a pagar um capital de valor indicado nas condições particulares em caso de Invalidez Absoluta e Definitiva das pessoas seguras ocorrida durante o período de validade do Certificado Individual de que era titular;

• Os prémios devidos por este Seguro Complementar são pagos conjuntamente com os prémios do seguro principal.

2. Definição

Entende-se por Invalidez Absoluta e Definitiva o estado resultante de doença ou acidente que incapacite total e definitivamente a Pessoa Segura para o exercício de qualquer profissão e que implique a indispensabilidade da assistência constante de uma terceira pessoa.

§ único- O reconhecimento da invalidez Absoluta e definitiva necessita ser clínica e objetivamente comprovada por um médico da Seguradora

3. Riscos Excluídos

3.1. Para além das exclusões referidas no ponto 3 das Condições Gerais da Apólice, o Capital garantido por este Seguro Complementar deixa de ser devido se a Invalidez da Pessoa Segura for resultante de:

a) Actos intencionais a Pessoa Segura, salvo os actos de salvação de pessoas e bens ou de legítima defesa própria ou alheia;

b) Alcoolismo, consumo excessivo de álcool (entendendo-se como tal a verificação duma taxa de alcoolémia no sangue superior à legalmente permitida para a condução de veículos automóveis) e uso de estupefacientes fora da prescrição médica.

c) Cataclismo da natureza, perturbações de ordem pública, distúrbios laborais, actos de terrorismo e sabotagem, greves, revoluções, guerra civil ou com países estrangeiros (declarada ou não).

3.2. A cobertura garantida por este Seguro Complementar pode ser extensiva ao caso previsto na alínea c) do número anterior mediante convenção especial e pagamento de sobreprémio que a seguradora porventura venha a estabelecer.

3.3. Quando a invalidez da pessoa Segura for causada por qualquer dos factos previstos em 3.1., sem extensão prévia da garantia admitida em 3.2, este seguro complementar resolve-se sem que o Tomador do Seguro tenha direito a qualquer restituição de prémios.

4. Cessação da Garantia

A garantia complementar cessa automaticamente para cada Pessoa Segura, sem haver lugar a pagamento de qualquer indemnização ou estorno de prémio, quando se verificar uma das seguintes situações:

a) Resolução, redução ou liquidação do Seguro Principal;

b) Falta de pagamento do prémio dentro do prazo e no condicionalismo previsto nas Condições Gerais e Particulares da Apólice;

c) No caso da Pessoa Segura provocar ou agravar o seu estado de invalidez; d) No termo da anuidade em que a pessoa segura completa os 70 anos de idade.

5. Disposições complementares

Consideram-se inerentes a este Seguro complementar de Invalidez Absoluta e Definitiva, na parte aplicável, todas as disposições que contam nas Condições Gerais e Especiais do Seguro Principal (alínea N) dos factos assentes).

15. No dia 22/12/1999, a Autora entregou, por escrito, ao tomador do seguro – Banco 2... - um boletim de adesão ao aludido seguro de grupo, o qual foi, posteriormente, remetido à Ré, nos moldes vertidos no doc. 2 junto com a contestação da ré seguradora e supra referido (alínea O) dos factos assentes).

16. Por se verificarem os pressupostos da admissão da Autora às coberturas do mencionado contrato de seguro de grupo com a apólice ...62 (cfr cláusula 6ª das Condições Gerais da Apólice, que aqui se dá por reproduzida e integrada), foi essa integração admitida e emitido um certificado individual, com o número de adesão ...99, identificando a demandante como pessoa segura (alínea P) dos factos assentes).

17. Com efeitos a partir de 03/03/2000, a Autora passou a figurar como segurada do aludido contrato de seguro de grupo, com a cobertura principal de Morte e complementar de Invalidez Absoluta e Definitiva (alínea Q) dos factos assentes).

18. O capital estabelecido para as coberturas do contrato de seguro de grupo com a apólice ...62 ao qual aderiu a demandante, referente às duas coberturas (morte e invalidez absoluta e definitiva) era, inicialmente, o de 12.500.000$00 (doze milhões e quinhentos mil escudos), ou 62.349,74 € (sessenta e dois mil trezentos e quarenta e nove euros e setenta e quatro cêntimos) (alínea R) dos factos assentes).

19. No âmbito dessa apólice foi indicado como beneficiário do capital seguro em caso de morte ou Invalidez Absoluta e Definitiva da autora, até ao limite do capital em dívida nos contratos de mútuo celebrados pela demandante e que serviram de base à celebração da apólice e até à concorrência do capital seguro, o Banco 2..., SA. (alínea S) dos factos assentes).

20. A posição de tomador e beneficiário das prestações estabelecidas no contrato de seguro de grupo com a apólice ...62 e na respetiva adesão ao mesmo pela Autora (bem como a posição de mutuante no crédito hipotecário celebrado com a Autora) foi transferida para o Banco 1..., entidade bancária que adquiriu os ativos e passivos do Banco 2... (alínea T) dos factos assentes).

21. No dia 01/12/2006 a Ré, então denominada Companhia de Seguros B..., SA, celebrou com o Banco 2..., SA (Banco 2...), entretanto integrado no Banco 1..., SA, um contrato de seguro de grupo, do ramo Vida, denominado “Crédito à Habitação Banco 2...”, titulado pela apólice ...04, o qual se destinava a clientes desse banco que tivessem recorrido ao crédito à habitação e ao mesmo pretendessem aderir, nos moldes do documento n.º 3 junto com a contestação da ré seguradora e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (alínea U) dos factos assentes).

22. Aí se refere que tal contrato do seguro de grupo, bem como as adesões ao mesmo efetuadas, ficavam subordinados às Condições Gerais e Especiais constantes do referido documento n.º 3, bem como às estipulações constantes dos certificados individuais de cada aderente (alínea V) dos factos assentes).

23. O tomador do contrato de seguro de grupo 14/1.704 era o Banco 2..., SA, agora integrado no Banco 1..., SA (alínea W) dos factos assentes).

24. As coberturas previstas nesse documento e passíveis de serem subscritas pelos futuros aderentes ao mesmo eram a principal de morte e as complementares e alternativas entre si de Invalidez Absoluta e Definitiva (IAD) por acidente ou doença, ocorridos na vigência da apólice, ou Invalidez Total e Permanente (ITP) por acidente ou doença, ocorridos na vigência da apólice (alínea X) dos factos assentes).

25. Consta das referidas Condições Gerais da Apólice de seguro de grupo 14/1.704 o seguinte:

6.4 “… I – DEFINIÇÕES

Para efeitos das Condições Contratuais, considera-se:

Seguradora - Companhia de Seguros B..., S.A. adiante designada por B....

Tomador do Seguro - Banco 2... S.A., adiante designado por Banco 2....

Pessoa Segura - O mutuário do contrato de mútuo relativo a uma operação de crédito a habitação concedido pelo Banco 2... e que é a pessoa sobre quem impende a eventual materialização dos riscos seguros. Beneficiário - A entidade a favor da qual é celebrado o contrato.

Apólice - Documentos que titulam o contrato celebrado entre o Tomador do Seguro e a Seguradora, que englobam as respectivas Condições Gerais, Especiais e Particulares acordadas, bem como as eventuais Actas Adicionais que alterem estas últimas.

Boletim de Adesão - Documento preenchido pelo candidato a Pessoa Segura onde expressa a vontade de ser integrado no seguro de grupo e que contêm os respectivos dados de identificação e outros necessários à análise do risco a segurar.

Certificado Individual - Certificado emitido pela Seguradora onde constam os elementos de identificação da respectiva Pessoa Segura, coberturas e capitais contratados e a designação dos Beneficiários.

Seguro Principal - Garantia ou conjunto de garantias, tituladas por uma Condição Especial, que podem subsistir como única modalidade de seguro contratada.

Seguro Complementar - Garantia ou conjunto de garantias, tituladas por uma Condição Especial, que só podem ser contratadas conjuntamente com o Seguro Principal.

Contrato de Mútuo - O contrato celebrado entre o Tomador do Seguro e o mutuário, alheio ao contrato de seguro, através do qual este se constitui devedor com a Tomador do Seguro e onde se estabelecem, entre outras, as condições de pagamento da dívida contratualmente assumida.

Prazo de Financiamento - o período estabelecido no contrato de mútuo, que decorre da data início da cobertura até a data termo do Contrato Financeiro.

Data Termo do Contrato de Mútuo - A data de vencimento da última prestação pecuniária estabelecida no contrato de mútuo, seja ela constituída só por juros ou só por capital ou por ambos, ou a data em que seja efectuada a liquidação total, por antecipação, do valor em dívida no âmbito do mesmo. Sempre que a interpretação do texto o permita o masculino englobará o feminino, o singular o plural e vice-versa.

II- PESSOA SEGURA E CONDICOES DE ELEGIBILIDADE

1. É Pessoa Segura o primeiro mutuário do contrato de mútuo que adira ao contrato de seguro titulado pela apólice acima referida, sujeito aos riscos que forem aceites pela Seguradora e que são objecto do contrato mencionado e que reúna à data início da adesão, cumulativamente, as seguintes condições: a) Subscrever o contrato de mútuo e este ser aceite pelo Tomador do Seguro e iniciar os seus efeitos;

b) Não ter uma idade inferior a 18 anos nem superior a 69 anos, no que respeita ao seguro principal;

c) Ser aceite pela Seguradora.

2. Pode aderir ao contrato de seguro, como Pessoa Segura, o segundo mutuário do contrato de mútuo, devendo reunir, para este efeito, à data de início da adesão, as condições mencionadas no número anterior.

III- OBJECTO E ÂMBITO DAS GARANTIAS

1. O contrato de seguro garante, como seguro principal, o risco de morte da Pessoa Segura, por acidente ou doença, ocorrida durante a vigência da apólice.

2. Como seguro complementar garante-se em alternativa:

a) A invalidez absoluta e definitiva (IAD) da Pessoa Segura, por acidente ou doença, ocorrida durante a vigência da apólice, ou

b) A invalidez total e permanente (ITP) da Pessoa Segura, por acidente ou doençaa, ocorrida durante a vigência da apólice.

3. A contratação das coberturas referidas no n.° anterior é sempre alternativa, não podendo ser contratadas ambas em simultâneo. …

5. Verificada a ocorrência de um sinistro coberto pela apólice, a Seguradora pagará ao Tomador do Seguro o capital em dívida à data do sinistro, até ao limite do capital Seguro.

Quando este seja superior àquele, o eventual excedente será pago aos Beneficiários para o efeito designados pela Pessoa Segura, desde que hajam sido comunicados por escrito à Seguradora e essa comunicação haja sido recepcionada por esta, em momento anterior à ocorrência do sinistro.

6. A Pessoa Segura será considerada em estado de Invalidez Absoluta e Definitiva quando, em consequência de doença ou acidente, ficar total e definitivamente impossibilitada para o exercício de qualquer actividade remunerada e necessitando da assistência constante de uma terceira pessoa para os actos essenciais da vida corrente. O estado de invalidez deverá ser clínica e objectivamente constatado por um médico da Seguradora.

7. A Pessoa Segura será considerada em estado de Invalidez Total e Permanente quando ficar total e permanentemente incapacitada para o exercício da sua profissão ou de qualquer outra actividade remunerada compatível com as suas capacidades, conhecimentos e aptidões.

O reconhecimento da Invalidez Total e Permanente pressupõe:

a) Ser clínica e objectivamente comprovada por um médico da Seguradora;

b) Ser precedida de uma incapacidade total para o trabalho com uma duração mínima de 180 dias. Esse periodo será alargado para dois anos nos casos de alienação mental ou de perturbações psíquicas.

§ único - A Seguradora reconhece a Pessoa Segura em estado de Invalidez Total e Permanente se, para além dos requisitos acima referidos, esta apresentar um grau de desvalorização não inferior a 66%, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades.

Para a fixação do grau de desvalorização a atribuir no âmbito deste seguro complementar, não concorrerá o grau de Invalidez Permanente correspondente aos defeitos físicos de que a Pessoa Segura já era portadora à data de inclusão na Apólice.

8. O contrato de seguro apenas confere o direito ao pagamento de um único capital:

a) O pagamento da indemnização, seja ao abrigo do seguro principal, seja do complementar determina a resolução do contrato, sem que haja lugar a qualquer estorno de prémio;

b) De igual modo, ainda que se verifique a morte ou invalidez simultânea nas Pessoas Seguras que subscrevem uma adesão conjunta, a Seguradora só garante o pagamento de um único capital seguro, resolvendo-se o contrato e sem que haja lugar a qualquer estorno de prémio.

9. Relativamente ao seguro principal, o risco de morte não se encontra coberto quando devido a:

10. Relativamente ao seguro complementar, e para além das exclusões referidas no n.° anterior, o risco de invalidez não se encontra coberto quando devido a:

a) Actos intencionais da Pessoa Segura, salvo os actos de salvaguarda de pessoas e bens ou de legítima defesa própria ou alheia;

b) Alcoolismo, consumo excessivo de alcool (entendo-se como tal a verificação duma taxa de alcoolemia no sangue superior à legalmente permitida para a condução de veículos automóveis) e uso de estupefacientes fora da prescrição médica;

c) Cataclismos da natureza, perturbações de ordem pública, distúrbios laborais, actos de terrorismo e sabotagem, greves, revoluções, guerra civil ou com países estrangeiros (declarada ou não).

11. A Seguradora e o contrato de seguro são alheios ao contrato de mútuo, pelo que não respondem por quaisquer encargos relativos a este, nomeadamente os decorrentes de juros por atraso no pagamento das indemnizações devidas ao abrigo do contrato de seguro.

IV - DECLARAÇÃO DO RISCO E EXAMES DE SELECCÃO MÉDICA 1. As declarações prestadas pela Pessoa Segura nos documentos necessários à apreciação do risco proposto à Seguradora, servem de base à aceitação da respectiva adesão.

2. As omissões e as declarações incompletas, com reserva, reticentes, inexactas ou falsas que possam induzir a Seguradora em erro ou influir sobre a existência ou condições do seguro, anulam a adesão, extinguindo as obrigações decorrentes do contrato, seja qual for o momento em que a Seguradora delas tome conhecimento.

3. Para efeitos de avaliação do risco, será aplicável a Grelha de Seleção Médica (GSM), cujos exames clínicos a realizar dependem da Idade da Pessoa Segura e do respectivo capital seguro.

4. A Seguradora, através do prestador contratado para o efeito, contactará a Pessoa Segura a fim de proceder à marcação dos exames, agendando o local e a hora onde os mesmos deverão ser realizados. Os resultados destes exames serão enviados directamente à Seguradora pelo prestador.

5. A Seguradora poderá solicitar a realização de exames médicos/ meios de diagnóstico complementares, aos quais é aplicável o disposto no n.° anterior. 6. Sendo os exames referidos nos pontos anteriores efectuados em clínica/prestador médico indicado pela Seguradora, o custo dos mesmos será liquidado pela Seguradora directamente à entidade que os realizou.

7. A Seguradora reserva-se ainda o direito de solicitar os relatórios médicos e elementos clínicos que entender necessários à correcta avaliacão do risco cabendo à Pessoa Segura providenciar pela sua obtenção e enviá-los à Seguradora nos moldes que forem indicados na comunicação que lhe for dirigida para o efeito.

8. A recusa das Pessoas Seguras em efectuar os exames ou apresentar os relatórios e elementos clínicos referidos nos pontos anteriores determinará a recusa de aceitação do risco,

V- ENTRADA EM VIGOR DAS GARANTIAS

1. Para cada pessoa segura as garantias contratuais só produzem os seus efeitos após aceitação do Seguro por parte da seguradora, tendo início às zero horas do dia em que tenha sido realizada a escritura pública de aquisição do imóvel para o qual o crédito for concedido, desde que o empréstimo tenha sido aceite e efectuado pelo tomador do Seguro.

2. O Seguro é contratado na modalidade de temporário anual renovável, e a apólice terá por data aniversária o dia 1 de Janeiro.

3. É emitido o certificado individual do Seguro, a enviar à pessoa segura.

VI- TERMO DAS GARANTIAS

1. As garantias relativas a cada Pessoa Segura cessam em qualquer das seguintes situações:

a) Na data termo do contrato de mútuo respectivo;

b) No termo da anuidade contratual em que a Pessoa Segura atinja os 80 anos de idade, independentemente da data termo do contrato de mútuo;

c) Na data de falecimento de qualquer Pessoa Segura, durante o período de vigência da respectiva adesão;

d) Na data de aceitação pela Seguradora de um sinistro por invalidez de qualquer Pessoa Segura, que se encontre coberto pelo contrato de seguro;

d) Na data indicada no pedido escrito da Pessoa Segura, dirigido à Seguradora, em que aquela solicite a sua exclusão do Contrato e desde que seja aceite pelo Tomador do Seguro;

f) Na data em que verifique qualquer causa de resolução, nulidade ou anulabilidade do contrato ou da adesão, prevista na lei ou nas Condições Contratuais da apólice.

2. Quando contratada a garantia de Invalidez Absoluta e Definitiva cessa a sua vigência no termo da anuidade em que a Pessoa Segura atinja os 70 anos de idade.

3. Quando contratada a garantia de Invalidez Total e Permanente cessa a sua vigência no termo da anuidade em que a Pessoa Segura atinja os 65 anos de idade.

4. A exclusão de qualquer Pessoa Segura aderente aos contratos de seguro como 1° Titular do respectivo contrato de mútuo, por qualquer dos motivos previstos no n° 1, determina, obrigatoriamente, a exclusão da Pessoa Segura que a ele se encontre ligada como 2° titular do mesmo contrato e vice-versa.

VII- PRÉMIO E CAPITAL SEGURO

1. Os Prémios são devidos adiantadamente, por débito na conta bancária informada no respectivo boletim de adesão, sendo o seu pagamento fraccionado mensalmente.

2. Entende-se por capital seguro o valor indicado no boletim de adesão ou no formulário remetido, pelo Tomador do Seguro à Seguradora, informando da concretização da escritura, quando inferior. Em caso de adesão conjunta o capital seguro é único para ambas as Pessoas Seguras.

3. O Tomador do Seguro poderá, sem necessidade de autorização da Pessoa Segura, proceder à actualização (redução) anual do capital seguro, com efeitos à data aniversária da apólice de grupo, de acordo com o valor em dívida no contrato de mútuo a essa mesma data. Caso não o faça, o capital seguro manter-se-á inalterado.

§ único — A proposta de aumento de capital carece sempre de aceitação expressa por parte da Seguradora, que poderá solicitar os elementos que entender necessários para a apreciação do risco.

VIII- BENEFICIÁRIO DO SEGURO

O tomador do Seguro constitui-se beneficiário aceitante e irrevogável das garantias contratuais pelo capital e dívida à data do sinistro, emergente do contrato de mútuo. Em caso de sinistro coberto, e após liquidação do capital em dívida ao Tomador do Seguro, o remanescente, se existir, será pago aos beneficiários designados pela pessoa segura

IX - LIQUIDAÇÃO DAS IMPORTÂNCIAS SEGURAS E OBRIGAÇÕES DA PESSOA SEGURA E DO BENEFICIÁRIO EM CASO DE SINISTRO

1. Sem prejuízo do que adicionalmente for estabelecido nos números seguintes, em caso de Sinistro ocorrido no âmbito do Contrato, a liquidação das importâncias seguras, sempre que a ela houver direito, efectuar-se-á após o envio da seguinte documentação:

a) Participação do Sinistro;

b) Cópia do Bilhete de Identidade ou da certidão de nascimento da Pessoa Segura;

c) Cópia de documentação comprovativo da identificação fiscal da Pessoa Segura;

d) Certificado de óbito da Pessoa Segura, em caso de falecimento;

e) Comprovação da identidade dos beneficiários pelo eventual remanescente de capital seguro após liquidação do capital em dívida ao Tornador do Seguro;

f) Documento médico no qual se especifique a causa e circunstâncias em que a morte ocorreu, em caso de falecimento da Pessoa Segura por Doença, bem como a evolução desta (conforme formulário a facultar pela Seguradora);

g) Auto de ocorrência passado pelas autoridades competentes, em caso de acidente;

h) No caso de invalidez, atestado detalhado passado por médicos que tratam e/ou trataram a Pessoa Segura indicando as circunstâncias, causas, início, natureza, evolução e provável duração do estado de invalidez (conforme formulário a facultar pela Seguradora) e relatório circunstanciado sobre a actividade profissional exercida pela pessoa segura na data da ocorrência do estado de invalidez.

2. A Seguradora reserva-se o direito de solicitar os elementos que entender necessários à apreciação do sinistro, bem como de proceder às averiguações que entender necessárias, nomeadamente para a verificação do estado de invalidez da Pessoa Segura, podendo submetê-la a exame por médico ou médicos que designar. Nestas circunstâncias são de conta da seguradora todas as despesas em que incorrer.

3. É da responsabilidade da pessoa segura e/ou do Beneficiário a prova dos factos sobre os quais sustenta a existência e reclamação do sinistro.

X - DIREITOS DA PESSOA SEGURA Constituem direitos da Pessoa Segura:

a) Dar o seu consentimento à respectiva adesão ao contrato, expresso na assinatura do boletim de adesão.

b) Ser informada pela Seguradora de tudo o que for necessário à efectiva compreensão do Contrato.

XI - OBRIGAÇÕES DA PESSOA SEGURA Constituem obrigações da Pessoa Segura:

a) Informar a Seguradora, com verdade e de boa fé, de todos os factos, que sendo do seu conhecimento, possam influir na apreciação e aceitação da respectiva proposta de adesão e estabelecimento das condições em que pode ser aceite, bem como no cumprimento do contrato e na sua manutenção em vigor;

b) Cumprir todas as formalidades que, nos termos contratuais, lhe são exigíveis pela Seguradora, nomeadamente para aceitacão da respectiva adesão e para regularização de quaiquer sinistro, no âmbito do Contrato.



XIII - DISPOSIÇÕES DIVERSAS

1. O contrato não confere direito de resgate, redução ou participação nos resultados.

2. O contrato de seguro encontra-se sujeito ao regime fiscal em vigor para as apólices de seguro de vida.

3. O Tomador do Seguro e/ou Pessoas Seguras, durante a vigência do contrato, deverão comunicar por escrito à Seguradora, nos oito dias subsequentes ao do conhecimento, todos os factos e/ou circunstâncias susceptíveis de determinarem um agravamento do risco, nomeadamente os factos relacionados com a alteração da profissão, o local do seu exercício e o início da prática de qualquer actividade que possa provocar uma alteração do risco. Se estes factos e/ou circunstâncias comunicadas determinarem o respectivo agravamento no risco, a Seguradora apresentará novas condições de aceitação num prazo máximo de quinze dias.

4. Os montantes pagos aos Beneficiários designados não estão sujeitos a Imposto Municipal sobre Transmissões.

5. A lei aplicável ao contrato é a lei portuguesa (alínea Y) dos factos assentes).

26. No dia 16/07/2008, a autora entregou, por escrito, ao tomador do contrato de seguro de grupo titulado pela apólice ...04 (o Banco 2..., SA) um boletim de adesão a esse seguro de grupo, consistente este boletim no documento 4 junto com a contestação da ré seguradora, que se dá aqui por reproduzido (alínea Z) dos factos assentes).

27. Nesse boletim de adesão consta como declaração imputada à autora “pretender aderir ao seguro de grupo 14/1.704 e nele subscrever as coberturas de morte e a de Invalidez Total e Permanente (alínea AA) dos factos assentes).

28. Subscrito o referido Boletim de Adesão, o mesmo foi remetido à Ré para análise (alínea BB) dos factos assentes).

29. Uma vez que, face às declarações constantes desse boletim de adesão, se verificavam os pressupostos da admissão da autora às coberturas do contrato de seguro de grupo 14/1.704 e não foi referido pelos proponentes qualquer facto ou circunstância que impedisse a sua aceitação como pessoa segura nesse seguro de grupo, foi essa integração aceite pela companhia de seguros B... e emitido por esta um certificado de seguro, com o número ...49, tendo como pessoa segura a demandante (alínea CC) dos factos assentes).

30. Mediante o certificado nº ...49, a A passou, com efeitos a partir de 22/08/2008, a ser segurada pela apólice de seguro de grupo 14/1.704, a qual se passou a reger pela proposta de seguro ou boletim de adesão apresentado, condições particulares constantes do certificado individual e pelas Condições Gerais e Especiais juntas como documento n.º 3 com a contestação da ré seguradora, que aqui se dá por reproduzido (alínea DD) dos factos assentes com a rectificação quanto ao número do documento).

31. As coberturas referidas nessas condições foram as de morte e Invalidez Total e Permanente de alguma das pessoas seguras (alínea EE) dos factos assentes).

32. E foi indicado como beneficiário das prestações seguras em caso de morte ou Invalidez Total e Permanente das pessoas seguras o Banco 2..., SA, posteriormente integrado no Banco 1..., SA, até ao limite do capital em dívida nos contratos de mútuo (alínea FF) dos factos assentes).

33. O capital estabelecido para as coberturas do contrato de seguro de grupo ao qual aderiu a demandante, referente às duas coberturas (morte e invalidez Total e permanente) era, inicialmente, o de 27.000,00€ (alínea GG) dos factos assentes), valor correspondente ao capital que, em 22/08/2008, o Banco 2... declarou emprestar à autora, nos moldes e condições vertidas no documento junto pelo Banco 1... a 25/10/2023, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

34. A partir de 01/12/2009, o capital das coberturas de Morte e Invalidez Total e Permanente da apólice passou a corresponder, a cada momento, ao capital em dívida ao Banco ao abrigo dos contratos de crédito à habitação celebrados pela Autora e que serviram de base à subscrição do seguro (alínea HH) dos factos assentes).

35. As condições gerais e especiais inerentes aos referidos acordos de seguro e adesões foram pré-elaboradas pela B... (alínea II) dos factos assentes).

36. A adesão da autora aos acordos de seguros referidos supra foi condição para a celebração dos mútuos respectivos aí também referidos, tendo as propostas de adesão supra mencionadas sido entregues pela autora no balcão do Banco 2... em ..., tendo aquela sido atendida pelos funcionários daquele banco, e nessa subscrição só intervieram a autora e o Banco 2... através daqueles funcionários, tendo a companhia de seguros B... se limitado a receber aquelas propostas de adesão, a analisá-las e a emitir os correspondentes certificados de seguro, tendo por base a informação constante daquelas propostas de adesão.

37. No dia 7 março de 2016, a autora foi observada no IPO do Porto por um carcinoma da mama direita, triplo negativo, compatível com metástase ganglionar da neoplastia.

38. Naquela unidade hospitalar, a autora foi submetida a internamentos e submetida a tratamentos e consultas.

39. Efetuou quimioterapia neo-adjuvante.

40. Posteriormente, em 30/08/2016, foi submetida a mastectomia radical modificada direita e efetuou radioterapia adjuvante.

41. Foi submetida a reconstrução mamária e a reconstrução do mamilo e exérese de quisto epidermoide da região escapular direita.

42. Em consequência do evento descrito, a autora apresenta limitação das amplitudes do ombro direito (flexão e abdução do ombro direito limitadas a 130º), conseguindo levar a mão à nuca, ao ombro contrário e à região interescapular.

43. Em consequência do evento descrito e tratamentos subsequentes, a autora foi orientada para realização de tratamento de reabilitação na área de residência

44. Os tratamentos efectuados à autora, em virtude do tumor maligno da mama direita que lhe foi diagnosticado, tendo em conta a sobrevida e a ausência de recidiva de doença oncológica, tiveram sucesso, sendo de considerar a autora, actualmente, como portadora de um status sequelar de neoplasia da mama – doença oncológica crónica (tumor maligno com estabilização clínica).

45. À data do diagnóstico - Março 2016 -, a Autora exercia a profissão de cabeleireira.

46. O exercício desta profissão exige o movimento frequente de ambos os braços e por tempos prolongados.

47. Para o exercido desta profissão, os braços constituem um imprescindível instrumento de trabalho.

48. A boa mobilidade dos braços é imprescindível para a execução das tarefas de cabeleireira, máxime, para o corte de cabelo, lavagens e penteados.

49. A profissão de cabeleireira exige esforço físico, designadamente ao nível da movimentação repetitiva e esforço dos braços, postura de pé por períodos longos.

50. A doença de que padece a autora acrescida do quadro sequelar de que ficou a padecer de forma definitiva é incompatível com o exercício daquela sua actividade profissional de cabeleireira, de costureira e similares.

51. A formação profissional da autora sempre foi feita na área de cabeleireiro.

52. A autora está impedida de efetuar os supra referidos esforços com o membro superior direito, incluindo realizar movimentos repetitivos próprios da profissão de cabeleireiro, costureira e similares, por períodos prolongados, com aquele membro, com o risco de desenvolver linfedema.

53. E impedida está, e pelo mesmo motivo, de pegar em pesos excessivos com aquele membro.

54. Estas condicionantes ou limitações têm caracter definitivo.

55. A autora nasceu a ... (certidão de nascimento junta pela autora com o requerimento de 3/02/2023, referência n.º 37929898 – prova plena).

56. Em consequência desta maleita, em 13/06/2016, a A. foi submetida a uma Junta Médica realizada pela Administração Regional de Saúde do Norte, IP, tendo-lhe sido atribuída uma Incapacidade Permanente Global de 80% de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades – anexo I (4.4), aprovada pelo DL 352/2007 de 23.10, susceptível de avaliação futura, devendo ser reavaliado em 2023, e emitido um certificado denominado de “Atestado Médico de Incapacidade Multiuso”, nos moldes vertidos no documento14 junto com a petição inicial e que aqui se dá por integralmente reproduzido.

57. Em consequência da doença de que padece, a Autora requereu junto do Centro Nacional de Pensões a sua reforma por invalidez, tendo-lhe sido concedida pensão por invalidez relativa, tendo início em 6/08/2018, por incapacidade permanente para o seu trabalho de cabeleireira.

58. Pelo menos desde 6/08/2018 que a autora sofre de uma IPG (incapacidade permanente geral) entre 60 e 63%, em consequência de artrite psoriática, de que padece desde 2013, e do referido carcinoma da mama direita e respectivo quadro sequelar.

59. No quadro desta IPG, as sequelas provocadas pelo carcinoma da mama direita, pelo menos desde 6/08/2018, são incompatíveis de forma permanente com o exercício daquela sua actividade profissional de cabeleireira, de costureira e similares, enquanto para a incapacidade permanente geral pesa mais o quadro sequelar relacionado com artrite psoriática.

60. No dia 31/12/2017, a Ré denunciou o contrato de seguro de grupo titulado pela apólice n.º ...62 e respectiva adesão da autora ao mesmo.

61. Para o efeito e nessa data, a Ré remeteu à Autora uma carta, na qual lhe comunicou que “a apólice cessará os seus efeitos no próximo dia 31 de Dezembro, terminando nesta data a sua adesão ao mesmo”.

62. Posteriormente, no dia 20 de Dezembro de 2017, tendo detectado um lapso na carta enviada a 12/12/2017, a Ré remeteu nova carta à autora, informando-os de que a referência feita a um prémio mensal total de 126,24€ deveria ser entendida como “prémio anual total”.

63. Aquando da participação pela autora referida nos factos assentes, a ré solicitou um parecer médico, entendendo-se necessário obter documentação clínica atualizada.

64. E, porque na documentação clínica se aludia à existência de patologias de natureza reumatoide e pulmonar, sem menção da data do seu diagnóstico, foi considerado indispensável obter relatórios dessas especialidades.

65. No seguimento desse parecer, a Ré, no dia 3 de Maio de 2017, solicitou à autora o envio de “relatório médico com as datas de diagnóstico, terapêutica efetuada e evolução clínica da artrite reumatoide e tuberculose pulmonar e relatório de oncologia que descreva de forma inequívoca a fase de tratamento e a situação clínica atual”.

66. O que reiterou em 24 de Maio de 2017.

67. Recebida a documentação solicitada, a Ré solicitou um novo parecer médico.

68. Tendo a ré concluído que a autora não se encontrava na situação clínica necessária ao acionamento das garantias das apólices.

69. De acordo com a documentação clínica remetida à Ré, a autora foi admitida no IPO do Porto em 2016 para orientação terapêutica de um carcinoma da mama direita.

70. Foi submetida, primeiro, a quimioterapia e, em Agosto de 2016, a mastectomia radical modificada à direita, com radioterapia coadjuvante.

71. Em Novembro de 2017, foi realizada reconstrução mamária com TRAM e em Março de 2018 a reconstrução do mamilo.

72. Observada em Abril de 2018, a autora não apresentava linfedema do membro superior direito.

73. Aquando do diagnóstico da doença oncológica, a autora exercia a atividade profissional de cabeleireira.

74. A ré entendeu e entende que, à data da participação e atualmente, a autora não é portadora de sequelas que lhe confiram uma incapacidade permanente de 66%, tendo por base um parecer médico que lhe foi transmitido à Ré.

76. Não obstante a apurada patologia do carcinoma da mama e respetivas sequelas, a autora mantém capacidade para o exercício de outras atividades profissionais (com a exceção de cabeleireira, costureira e similares), desde que não impliquem mobilização do membro superior direito acima do nível dos ombros ou em esforço prolongado no tempo.

77. A autora não necessita de apoio de terceira pessoa de forma constante. 78. As condições gerais e especiais inerentes aos acordos de seguro e adesões

referidas nos factos assentes foram pré-elaboradas e não sujeitas a negociação.

79. Em 15/09/2020, a Autora apresenta junto do banco chamado as seguintes responsabilidades, vencidas:

1. Contrato de Mútuo HP (1ª Habit) – ...96, associado ao mencionado contrato de seguro de grupo com a apólice ...62 e à mencionada adesão da autora com o certificado individual n.º ...99:

a. Capital: 37.094,37 Eur;

b. Juros: 6.219,30 Eur;

2. Contrato de Mútuo HP (1ª Habit) – ...96 associado ao mencionado contrato de seguro de grupo com a apólice ...04 e à adesão da autora com o certificado individual n.º ...49:

a. Capital: 6.329,14 Eur;

b. Juros: 1.041,81 Eur;

c. Imp.Selo: 41,67 Eur.

80. No quadro daquilo que as condições gerais e especiais permitiam, as condições particulares das adesões realizadas pela autora e supra referidas tiveram por base as opções que esta indicou.

81. Nunca, desde os inícios dos contratos até à participação do alegado sinistro, a autora contatou a ré seguradora para obter desta qualquer esclarecimento, informação ou documento relacionados com os contratos de seguro de grupo aos quais aderiu (confissão judicial realizada pela autora em depoimento de parte – prova plena).

82. O escrito, pré escrito nas propostas de seguro supra referidas (documento 2 e documento 4 junto com a contestação ré), de seguinte teor “Tomei conhecimento das condições gerais, especiais e particulares do contrato de seguro a que vou aderir, as quais me foram explicadas e com as quais estou de acordo”, não foi lido ou explicado à autora nem esta o leu.

83. As condições gerais e especiais dos supra identificados seguros não foram negociadas entre as partes, neste caso, entre a autora e a ré.

84. As apuradas adesões da autora aos contratos de seguro de grupo identificados supra foram efetuadas no cumprimento e como condição para a celebração dos contratos de mútuo identificados supra (confissão judicial realizada pela autora em depoimento


*

B.2- Na mesma sentença não se julgaram provados os factos seguintes:

1. O apurado tumor diagnosticado à autora ainda se mantenha ativo, tendo havido insucesso terapêutico e tendo a autora uma curta esperança de vida.

2. A apurada doença de que a autora padece e as apuradas sequelas com ela relacionadas tivessem determinado uma incapacidade total para o exercício de qualquer outra atividade profissional diferente de cabeleireira, costureira ou similares.

3. Em Março de 2016, em Junho de 2016 ou à data da apurada participação do sinistro à ré, a Autora sofresse, de forma permanente, de um grau de desvalorização de 80% ou de qualquer outro.

4. Atualmente, a autora sofre, de forma permanente, de um grau de desvalorização de 80%.

5. A autora, não obstante as sequelas da doença que alega, encontra-se capaz para o desempenho da sua profissão habitual de cabeleireira.

6. As condições particulares inerentes aos acordos de seguro e adesões referidas nos factos assentes foram pré-elaboradas e não sujeitas a negociação.

7. Todos os deveres de informação pré-contratual tivessem sido cumpridos.

8. Antes de a autora aderir aos contratos de seguro de grupo ...62 e ...04, lhe tivessem sido lidas, comunicadas e explicadas, por quem recebeu a respetivas propostas, todas as cláusulas contratuais (gerais e especiais) desses seguros, quer no que toca às cobertura, capitais seguros e beneficiários das prestações seguras, quer quanto às suas exclusões.

9. O texto das condições gerais e especiais desses contratos tivessem sido foram fornecido à autora antes de esta subscrever e entregar as propostas de seguro e delas tivesse ficado com uma cópia após a sua apresentação.

10. A autora tivesse compreendido o exato sentido e alcance das cláusulas dos contratos de seguro aos quais aderiu, e as aplicáveis às suas própria adesões, das quais foi então informada de forma clara, adequada e efetiva por quem recebeu tais propostas.

11. A autora tivesse, ainda, informada por quem recebeu tais propostas, do sentido, teor e alcance dessas cláusulas contratuais, condições de funcionamento das coberturas, capitais seguros e beneficiários das prestações seguras.

12. Em particular, quanto ao seguro de grupo ...62 tivesse sido lida e explicada à autora a cláusula do contrato que definia a situação de Invalidez Absoluta e Definitiva, tendo-lhe sido comunicado e explicado que assim seria considerada se, por motivo de doença ou acidente ocorridos na vigência da apólice, ficasse total e definitivamente incapaz para o exercício de qualquer profissão em situação que implicasse a indispensabilidade da assistência constante de uma terceira pessoa.

13. Quanto à apólice ...04 tivesse sido lida e explicada à Autora a cláusula do contrato que definia a situação de Invalidez Total e Permanente, tendo-lhe sido comunicado e explicado que assim seria considerada se, por motivo de doença ou acidente ocorridos na vigência da apólice, ficasse total e permanentemente incapaz para o exercício de sua profissão ou de qualquer outra atividade remunerada compatível com as suas capacidades, conhecimentos e aptidões, pressupondo o seguinte: a) Ser clínica e objetivamente comprovada por um médico da Seguradora; b) Ser precedida de uma incapacidade total para o trabalho com uma duração mínima de 180 dias e que esse período seja alargado para dois anos nos casos de alienação mental ou de perturbações psíquicas. Sendo que a Seguradora reconheceria a Pessoa Segura em estado de Invalidez Total e Permanente se, para além dos requisitos acima referidos, apresentasse um grau de desvalorização não inferior a 66%, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades. Para a fixação do grau de desvalorização a atribuir no âmbito deste seguro complementar, não concorrerá o grau de Invalidez Permanente correspondente aos defeitos físicos de que a Pessoa Segura já era portadora à data de inclusão na Apólice.

14. A autora tivesse solicitado esclarecimentos.

15. À autora tivessem sido ainda entregues as condições particulares (certificados individuais de adesão) das apólices de seguro de grupo.

16. A Autora não tivesse ficado com cópia das propostas. 17.O Banco 2... e a B... fossem empresas do mesmo grupo.

18. A ré não tivesse convencionado com o Banco 2... a obrigação de prestar aos aderentes as obrigações pré-contratuais necessárias.


*

B.3- Análise dos fundamentos dos recursos

A primeira problemática a analisar, por uma questão de precedência lógica, é a de saber se deve haver lugar à modificação da matéria de facto, requerida pela A.

Pretende esta, com efeito, que se julguem não provados os factos constantes dos pontos 60 e 61, do capítulo dos Factos Provados, ou seja, que “[n]o dia 31/12/2017, a Ré denunciou o contrato de seguro de grupo titulado pela apólice n.º ...62 e respectiva adesão da autora ao mesmo” (60) e que “[p]ara o efeito e nessa data, a Ré remeteu à Autora uma carta, na qual lhe comunicou que “a apólice cessará os seus efeitos no próximo dia 31 de Dezembro, terminando nesta data a sua adesão ao mesmo”” (61). Por outro lado, pretende ainda que se aditem três novas afirmações a esse capítulo, com esta redação: “Alínea 85: A autora acionou o certificado individual de seguro nº ...99 e titulado pela apólice ...62 e referente ao empréstimo celebrado em 03/03/2000, pelo menos, em data anterior a 12/12/2017”; “Alínea 86: A autora necessita da ajuda de 3º pessoa para a realização de algumas tarefas do quotidiano e numa necessidade de 2 horas diárias”; e, “Alínea 87: Era pretensão da autora celebrar um seguro que que cobrisse o risco de uma incapacidade definitiva e permanente para a sua atividade de cabeleira e de acordo aliás com o que lhe transmitiram aquando da adesão à apólice”.

A Ré insurge-se contra estas pretensões, pelas razões seguintes:

“I- Os factos que a Autora pretende ver aditados à matéria de facto assente ou são irrelevantes para a decisão da causa (artigo 85.º e 87º), ou são essenciais e nucleares ao reconhecimento do direito que invoca, pelo que não podem ser atendidos, nos termos do disposto no artigo 5.º n.º 2 do CPC

II- Em qualquer caso, esses factos não foram objeto de contraditório pela Ré, pelo que nunca poderiam ser considerados, o que impõe a improcedência, nessa parte, do recurso

III- Nas suas alegações a recorrente não indica, de forma concreta, os elementos de prova que, relativamente a cada facto, impõem decisão diversa da proferida quanto aos factos que impugna, o que implica a rejeição do recurso nessa parte

IV- Nenhum elemento de prova impunha[1] decisão diversa da proferida quanto aos factos cuja decisão é impugnada pela Autora, a qual se deve manter”.

Vejamos, então, como solucionar estas divergências:

 Em primeiro lugar, é importante deixar claro que, sem prejuízo de se reconhecer que a A. não foi totalmente rigorosa no cumprimento dos ónus legalmente prescritos para a impugnação da matéria de facto, designadamente, na associação direta dos concretos elementos de prova em que baseia a sua pretensão a cada um dos factos impugnados (artigo 640.º, n.º 1, al. b), do CPC), cremos, ainda assim, que não é essa circunstância que nos inibe de avaliar as suas razões para a citada modificação. Percebe-se, da leitura de todo o texto a elas relativo, quais são os motivos e meios de prova que, no modo de ver da A., a devem determinar e, assim, dando prevalência à substância sobre a forma, em nome dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, bem como em consonância com os princípios constitucionais da garantia da tutela jurídica efetiva e do direito ao acesso a um processo judicial equitativo e justo, conforme é hoje jurisprudência dominante[2], apreciar-se-á a referida pretensão.

E, nela, aquilo que primeiramente está em causa, como vimos, é a questão de saber se estão incorretamente julgados os factos constantes dos já transcritos pontos 60 e 61, do capítulo dos Factos Provados. Isto é, em suma, se a Ré, ao contrário do que decidiu na sentença recorrida, não provou ter observado na denúncia do contrato de seguro titulado pela apólice n.º ...62, a forma escrita e a receção da correspondente comunicação pela A.. Isto porque esta última alega que “[s]endo o contrato de seguro um contrato sujeito a forma ad probationem (Artigos 32º, nº 2, da Lei do Contrato de Seguro e Artigo 364º, nº2, do Código Civil), a denúncia do mesmo não pode ser feita com recurso a prova testemunhal (artigo 221º, nº2, do Código Civil”.

E, de facto, assim é: a prova da aludida denúncia não pode ser feita por via testemunhal e também não se mostra junta aos autos a documentação comprovativa do cumprimento quer da formalidade legalmente prescrita, quer da contratualmente convencionada.

Quanto a este último aspeto, com efeito, ficou convencionado no contrato de seguro em apreço (titulado pela apólice n.º ...62) que o mesmo, sendo renovável, o tomador do seguro ou a seguradora poderiam não o renovar “ou fazer proposta de renovação sob condições diferentes das contratadas inicialmente, por meio de carta registada com antecedência mínima de trinta dias relativamente à data da resolução ou da não renovação” (cláusula 7 das Condições Especiais, consideradas reproduzidas no ponto 2 dos Factos Provados). O que, quer à época em que foi celebrado o contrato de grupo com o Banco 2... (01/01/1997), quer à data em que a A. lhe aderiu (03/03/2020), tinha inteiro apoio legal, pois, no mínimo, como se previa no artigo 18.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 176/95, de 16 de abril, esse tipo de vicissitudes contratuais, ou mais propriamente, a “resolução do contrato de seguro, a sua não renovação ou a proposta de renovação em condições diferentes das contratadas” estavam sujeitas à forma escrita.

Forma mínima que ainda hoje continua a ser exigida para a prova da declaração de denúncia nos contratos de seguro em geral, como prescreve o artigo 115.º, n.º 1, do Regime Jurídico do Contrato de Seguro (RJCS), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 72/2008, de 16 de abril[3]. Isto, se não for convencionada uma outra mais favorável ao tomador do seguro, ao segurado ou ao beneficiário da prestação do seguro – artigo 13.º, n.º 1, do RJCS – o que, no caso, como vimos, sucedeu.

Acontece que a Ré não demonstrou, por via documental, ter procedido à denúncia do contrato de seguro em análise pela forma convencionada. Nem sequer por forma escrita.

Alegou, efetivamente, ter procedido a essa denúncia no dia 12/12/2017, já depois de lhe ter sido participado o alegado sinistro, remetendo, para o efeito, à A. “uma carta na qual lhe comunicou que “a apólice cessará os seus efeitos no próximo dia 31 de Dezembro, terminando nesta data a sua adesão ao mesmo” (artigos 31.º e 32.º da contestação), como, de resto, consta também nos questionados pontos 60 e 61 dos Factos Provados, mas não juntou essa carta aos autos. Aliás, na sua resposta a este recurso, também não o sustenta. Nem a sentença recorrida o refere. O que refere, diversamente, em termos genéricos, na motivação de facto é que “[n]o tocante às circunstâncias dada como provadas, respeitantes aos seguros em causa nos autos, o tribunal valorou a prova documental junta pela ré seguradora, algumas das admissões efectuadas pela autora em sede de depoimento de parte e os depoimentos das testemunhas BB, funcionária da ré e gestora de sinistros, e CC, funcionário da ré que analisou os documentos respeitantes ao historial das apólices em causa, sendo que ambas revelaram conhecimento dos factos que a este respeito foram dados como provados e que, em parte, são corroborados por aquele acervo documental, tendo depoimentos isentos e credíveis”.

Acontece que A., no seu depoimento (que ouvimos na íntegra), não aludiu a semelhante problemática [a da denúncia do aludido contrato de seguro]. E a prova testemunhal citada (ou outra) é, para estes efeitos, irrelevante.

Como vimos, a denúncia, por parte da seguradora, tinha de ser feita, no mínimo, por carta registada e, assim, a prova dessa declaração negocial estava sujeita à apresentação dessa carta e, naturalmente, ao seu subsequente envio à A.. A menos que esta última expressamente confessasse o seu recebimento.

O artigo 364.º do Código Civil, é claro a este propósito:

“1. Quando a lei exigir, como forma da declaração negocial, documento autêntico, autenticado ou particular, não pode este ser substituído por outro meio de prova ou por outro documento que não seja de força probatória superior.

2. Se, porém, resultar claramente da lei que o documento é exigido apenas para prova da declaração, pode ser substituído por confissão expressa, judicial ou extrajudicial, contanto que, neste último caso, a confissão conste de documento de igual ou superior valor probatório”.

Ou seja, quando, como é o caso, o documento é exigido para prova da declaração negocial, esse meio de prova só pode ser substituído por confissão expressa, judicial ou extrajudicial, nos termos antes transcritos.

Não basta, por isso, como sucedeu na situação em análise, a alusão à dita denúncia por parte de alguma testemunha (no caso, por exemplo, a testemunha, CC) ou mesmo o acordo tácito obtido nos articulados, derivado da falta de impugnação pela A. dos artigos da contestação onde essa matéria é alegada (artigos 30.º e 31.º - cfr. resposta da A. dada na audiência prévia).

Em relação a tal acordo, na verdade, o mesmo resulta de uma admissão tácita ou confissão ficta (tácita ou presumida), que não se confunde com a confissão expressa já referenciada e exigida, como vimos, para a prova da aludida declaração negocial[4].

São, com efeito, duas realidades distintas. A confissão expressa consiste numa “declaração de ciência de sentido positivo (de reconhecimento da realidade de um facto), enquanto a admissão consiste num acto de vontade no sentido neutro no plano da realidade”[5].

Por isso mesmo, essa diferença projeta-se a vários níveis. A confissão ficta, por exemplo, não exige, ao contrário da confissão expressa (artigo 352.º, do Código Civil), que o facto admitido seja desfavorável a quem o admite; não  produz efeitos, como dissemos, em relação a factos  cuja   prova esteja dependente de   documento escrito (artigo 364.º, n.º 2, do Código Civil)[6]; nos casos de coligação e litisconsórcio necessário, não vale para o réu que não conteste quando outro assuma a posição contrária (artigo 568.º. al. a), do CPC); não é impugnável nos mesmos termos da confissão (artigo 359.º, do Código Civil); e também não pode ser retirada enquanto a parte contrária não tiver aceite, ao contrário do que sucede com a confissão expressa de factos feitos nos articulados (artigo 465º, n.º 2, do Código Civil).

De modo que, tratando-se de realidades diversas e exigindo a lei, como vimos, a confissão expressa como meio de prova substitutivo da declaração negocial sujeita a forma escrita, não tendo ela existido no caso presente, nem tendo a Ré apresentado oportunamente em juízo a carta de denúncia do contrato de seguro em análise (titulado pela apólice n.º ...62), o envio dessa carta à A. e o seu conteúdo (assim como, naturalmente, a consequente denúncia), só podem ser julgados não provados.

Daí que se eliminem os factos descritos nos pontos 60 e 61, do capítulo onde se encontram (Factos Provados) e, nessa sequência, se elimine também o advérbio temporal (“posteriormente”) inserto no ponto seguinte (62), que deixa de fazer qualquer sentido, neste contexto. Tal ponto, pois, passará a ficar assim redigido: “No dia 20 de Dezembro de 2017, tendo detectado um lapso na carta enviada a 12/12/2017, a Ré remeteu nova carta à autora, informando-os de que a referência feita a um prémio mensal total de 126,24€ deveria ser entendida como “prémio anual total””.

Esclarecida esta questão, vejamos a seguinte.

Traduz-se ela em saber se devem ser aditadas aos Factos Provados as afirmações já referenciadas; ou seja, em primeiro lugar, se deve ser julgado demonstrado que “[a] autora acionou o certificado individual de seguro nº ...99 e titulado pela apólice ...62 e referente ao empréstimo celebrado em 03/03/2000, pelo menos, em data anterior a 12/12/2017”.

Ora, como alega a Ré, nem esta é exatamente a confissão que a A. lhe atribui [posto que não coincide com o que é afirmado no artigo 50.º da contestação (e não no artigo 31.º, como certamente por lapso a mesma refere, uma vez que este trata de uma temática diversa), nem com o documento aí indicado, que não refere qualquer certificado individual de seguro], nem esta é temática relevante para a solução deste conflito. O que nele se discute, com efeito, é se estão ou não reunidos os pressupostos para o direito às prestações decorrentes dos contratos de seguro a que a A. aderiu (entre eles, o titulado pela apólice ...62) e não propriamente quando é que este último foi acionado. De resto, segundo cremos, essa problemática só é trazida à colação pela A. em razão do decidido na sentença recorrida quanto à denúncia já aflorada, o que, como veremos, em resultado do já decidido quanto a esse aspeto, não pode manter-se. Daí que não se adite a referida afirmação aos factos provados.

Pretende, depois, a A. que também se julgue demonstrado que, ela própria, “necessita da ajuda de 3º pessoa para a realização de algumas tarefas do quotidiano e numa necessidade de 2 horas diárias”. Isto, bem se percebe, em ordem ao preenchimento do pressuposto previsto nas condições especiais (cláusula 14, ponto 2) do contrato titulado pela apólice n.º ...62, na qual se refere que se entende “por Invalidez Absoluta e Definitiva o estado resultante de doença ou acidente que incapacite total e definitivamente a Pessoa Segura para o exercício de qualquer profissão e que implique a indispensabilidade da assistência constante de uma terceira pessoa”.

Além disso, defende igualmente que se deve julgar, agora, demonstrado que era sua pretensão “celebrar um seguro que cobrisse o risco de uma incapacidade definitiva e permanente para a sua atividade de cabeleira e de acordo aliás com o que lhe transmitiram aquando da adesão à apólice”. Isto, como alega, com vista a integrar “o conceito de invalidez absoluta e definitiva que um declaratário normal e razoável retiraria do contrato de seguro”.

Acontece que, tendo em conta o disposto no artigo 5.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, em nenhum dos casos e com os referidos intuitos, estamos perante de factos complementares, concretizadores ou instrumentais de outros anteriormente alegados [sendo também manifesto que não são notórios], mas antes perante factos essenciais ao preenchimento do direito de que a A. se arroga titular nesta ação.

Os factos essenciais, porém, para serem levados em consideração pelo tribunal carecem de ser oportunamente alegados. Alegados nos articulados e, particularmente, na petição inicial. Nesta peça, com efeito, o autor, como decorre do disposto no artigo 552.º, n.º 1, al. d), do CPC, tem o ónus de alegar “os factos essenciais que constituem a causa de pedir”; ou seja, aqueles factos que, face às normas de direito substantivo, são suscetíveis de desencadear os efeitos jurídicos pretendidos. Neste domínio, como é sabido, as partes são soberanas. A elas, e só a elas, “cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções invocadas” (artigo 5.º, n.º 1, do CPC). É uma das manifestações do princípio do dispositivo na formação da matéria de facto. De acordo com ele, para serem jurisdicionalmente considerados na resolução de qualquer litígio, este tipo de factos tem, obrigatoriamente, de ser objeto de oportuna alegação pelas partes. Se o não forem, já não podem ser tidos em conta depois.

De modo que, sem necessidade de maiores desenvolvimentos e levando em linha de conta o já dito, só se pode considerar que a requerida ampliação da matéria de facto é, também nestes aspetos, de julgar improcedente.

Solucionadas estas questões, passemos, agora, à análise das seguintes.

E, em relação a elas, o primeiro aspeto que importa realçar, na sequência do já decidido, é que, ao contrário do que se considerou na sentença recorrida, o contrato de seguro titulado pela apólice n.º ...62, não se pode julgar cessado, por denúncia da Ré. Não se provou, como vimos, que esta tivesse enviado à A. a carta que alega ter-lhe remetido para esse efeito e também não se provou que essa denúncia tivesse sido exercida mesmo em relação ao tomador do seguro. Logo, mostra-se prejudicada a análise de toda a argumentação desenvolvida pelas partes em torno dessa temática.

Por outro lado, verifica-se igualmente que nenhuma das partes põe em causa a factualidade julgada não provada relativa à ausência de comunicação e explicação à A. das cláusulas insertas nos contratos de seguro em apreço, designadamente, no que toca às coberturas e exclusões. Por conseguinte, tendo em conta a natureza desses contratos, que, como é pacífico, se reconduzem a seguros de grupo (ramo vida) aos quais a A. aderiu sem qualquer intervenção na modulação do seu conteúdo (pontos 35, 78 e 83, dos Factos Provados), que é formado por cláusulas contratuais gerais, impõe-se retirar a conclusão, na decorrência do disposto no artigo 5.º, n.º 3, do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais (RJCCG)[7] , que tais deveres não foram cumpridos.

A questão que a Ré coloca é de saber se esse incumprimento lhe é oponível pela A.. Isto porque, no seu modo de ver, era sobre o tomador do seguro, e não sobre si, que incumbiam os referidos deveres. Designadamente, em função do prescrito no artigo 4.º, do Decreto-Lei n.º 176/95, de 26 de Julho[8], e artigo 78.º, n.ºs 1 e 3, do Regime Jurídico do Contrato de Seguro (RJCS)[9].

Ora, sem prejuízo de se reconhecer a profunda divergência jurisprudencial que se estabeleceu sobre esta matéria [defendendo uns que “[o]s deveres de comunicação e esclarecimento, na íntegra, do conteúdo negocial estão previstos nos arts. 5.º e 6.º do DL 446/85 e resultam directamente do princípio da boa fé contratual consagrado no art. 227.º do Código Civil, estendendo-se a todas as partes dos contratos que tenham poder de impor cláusulas negociais ao consumidor” e, assim, “[o] facto de o legislador ter fixado, no art. 4.º, n.º 1 do DL n.º 176/95, de 26 de Julho, deveres de informação a cargo do tomador de seguro, não significa que tenha querido onerar exclusivamente o banco com estes deveres e exonerar a seguradora, perante o aderente, dos deveres que já decorriam dos arts 5.º e 6.º do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro”[10], e outros, ao invés, que “[n]o tipo de contrato de seguro de grupo contributivo, na modalidade de seguro de vida de crédito à habitação, nos termos do art. 4.º do DL n.º 176/95, de 27-07, recai sobre o tomador de seguro, o banco mutuante, o ónus de informar e esclarecer os segurados aderentes sobre as cláusulas de cobertura e de exclusão do risco assim garantido” e, desse modo, “[o] incumprimento desse dever leal de informação e esclarecimento não se comunica à seguradora, salvo convenção em contrário, porquanto, no referido tipo de contrato de seguro de adesão, não se configura que o tomador do seguro intervenha como intermediário, auxiliar ou comissário da seguradora, não se encontrando, por isso, fundamento normativo para imputar a esta, as consequências da atuação irregular do tomador na comercialização do produto financeiro em causa. Nessa conformidade, não está vedado à seguradora invocar a seu favor contra os segurados aderentes as cláusulas gerais e particulares sobre o âmbito e exclusões do risco assumido no contrato de seguro, sem que a estes seja lícito contrapor o incumprimento do dever de informação e esclarecimento por parte do tomador do seguro”[11]], a verdade é que essa divergência se mostra hoje, nalguma medida, ultrapassada, porquanto, como se refere no recente Ac. do STJ de 29/02/2024, em função do decidido no Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), no seu Acórdão de 20/04/2023, proferido no Processo C‑263/22 ([12]), deve considerar-se que “a não comunicação de uma cláusula limitativa da cobertura do risco segurado pelo tomador de um seguro de grupo, a quem incumbia proceder a essa comunicação, pode ser oposta à seguradora no sentido de se considerar tal cláusula excluída do contrato de seguro”[13]. Isto porque, como se concluiu no citado Acórdão do TJUE, por um lado, “[o] artigo 4.º, n.º 2, e o artigo 5.º da Diretiva 93/13/CEE do Conselho, de 5 de abril de 1993, relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores, lidos à luz do vigésimo considerando desta diretiva, devem ser interpretados no sentido de que: um consumidor deve ter sempre a possibilidade de tomar conhecimento, antes da celebração de um contrato, de todas as cláusulas que este contém”; e, por outro lado, porque “[o] artigo 3.º, n.º 1, e os artigos 4.º a 6.º da Diretiva 93/13 devem ser interpretados no sentido de que: quando uma cláusula de um contrato de seguro relativa à exclusão ou à limitação da cobertura do risco segurado, da qual o consumidor em causa não pôde tomar conhecimento antes da celebração desse contrato, é qualificada de abusiva pelo juiz nacional, este tem de afastar a aplicação dessa cláusula a fim de que não produza efeitos vinculativos relativamente a esse consumidor”. Interpretação que é vinculativa para todos os Estados Membros e todos os tribunais nacionais desses Estados, em virtude do disposto no artigo 91.º do Regulamento do Processo do Tribunal de Justiça e do primado do direito da União Europeia, que a Constituição da República Portuguesa também acolhe (artigo 8.º, n.º 4).

Ora, no caso, não há dúvidas de que a inserção nos contratos de seguro em apreço das cláusulas controvertidas nestes autos [designadamente, a cláusula 2 das Condições Especiais do contrato de seguro titulado pela apólice n.º ...62, e a cláusula 7 do título III (Objeto de âmbito das Garantias), do contrato de seguro titulado pela apólice n.º ...04] foi feita sem as mesmas terem, previamente, sido comunicadas e explicadas à A. (ou pelo menos, sem se ter provado, como vimos, o cumprimento desses deveres). Nessa medida, tratando-se de cláusulas limitativas da cobertura do risco segurado, não pode deixar de se considerar essa prática como abusiva e como tal deve ser sancionada com a consequência prevista na lei. Isto é, com a exclusão de tais cláusulas dos referidos contratos, nos termos do artigo 8.º, al. a), do RJCCG. Nem, se compreenderia que fosse de outro modo. Efetivamente, tratando-se de contratos no conteúdo dos quais a A., como dissemos, não teve qualquer intervenção, dificilmente se compreenderia, à luz das mais elementares das regras da boa-fé (artigo 227.º, n.º 1, do Código Civil), que as referidas cláusulas lhe pudessem ser impostas sem estar demonstrado que a mesma a elas, expressa e esclarecidamente, aderiu. Para mais, tratando-se de cláusulas que lhe são manifestamente desfavoráveis.  Como se refere no citado Aresto do TJUE, “se o caráter não transparente de uma cláusula contratual, devido à sua falta de clareza ou de compreensibilidade, pode constituir um elemento a ter em conta no âmbito da avaliação do caráter abusivo dessa cláusula, a falta de transparência, devido à impossibilidade de o consumidor tomar conhecimento da referida cláusula antes da celebração do contrato em causa, pode, por maioria de razão, constituir um elemento dessa natureza”.

Daí que, em suma, se considerem tais cláusulas como excluídas dos já referenciados contratos de seguro e a Ré também vinculada pelas consequências desta decisão.

Note-se que, como se sublinhou no Ac. STJ de 25/05/2023 ([14]), “[o] carácter abusivo da cláusula não pode ser desconsiderado em virtude de o direito nacional prever que o tomador do seguro que não tenha cumprido o dever de comunicação/informação que lhe está cometido pelo art. 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 176/95, de 26 de Julho, poder ser responsabilizado, seja pelo pagamento da parte do prémio correspondente ao segurado (cfr. art. 4.º, n.º 3, do mesmo diploma legal), seja, eventualmente, nos termos gerais da responsabilidade civil (cfr. o art. 79.º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 72/2008, de 16 de Abril), sem garantir, porém, o restabelecimento integral da situação em que o aderente estaria se tivesse beneficiado da cobertura do seguro”.

De acordo com a orientação do Acórdão do TJUE já indicado, “a interpretação do direito nacional em conformidade com a Diretiva 93/13/CEE não permite que a existência de um ou mais regimes de responsabilização pelo incumprimento do dever de comunicação/informação das cláusulas possa afectar a inoponibilidade ao aderente consumidor de cláusulas contratuais qualificadas como abusivas.

Assim sendo, afigura-se que o direito nacional (art. 8.º, alínea a), do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro), ao determinar simplesmente que as cláusulas não comunicadas sejam excluídas do contrato (isto é, sem sujeitar o afastamento de tais cláusulas ao controlo do respectivo conteúdo a realizar em razão dos parâmetros constantes dos pontos 45 e seguintes da fundamentação do Acórdão do TJUE), se encontra em plena consonância com a Diretiva 93/13/CEE. Nas palavras de Joaquim Sousa Ribeiro («O princípio da transparência no Direito Europeu dos Contrato, in Estudos de direito do consumidor, n.º 4, Publicação do Centro de Direito do Consumo, Coimbra, 2002, pág. 150), «a violação da transparência é, neste domínio, uma causa autónoma e suficiente de ineficácia»”.

Daí a conclusão a que chegámos.

Resta, portanto, determinar as consequências dessa exclusão.

Por regra, a exclusão de cláusulas neste tipo de contratos não conduz à nulidade dos mesmos, mas sim ao seu aproveitamento, na medida do possível. O artigo 9.º, n.ºs 1 e 2, do RJCCG, é bem claro a este propósito, quando dispõe que, havendo exclusão de cláusulas, “os contratos singulares mantêm-se, vigorando na parte afectada as normas supletivas aplicáveis, com recurso, se necessário, às regras de integração dos negócios jurídicos”. Só assim não será se, não obstante a utilização desses elementos, “ocorra uma indeterminação insuprível de aspectos essenciais ou um desequilíbrio nas prestações gravemente atentatório da boa fé”.

O que, adiante-se, desde já, não ocorre no caso presente.

Efetivamente, é possível integrar as lacunas negociais deixadas pelas referidas exclusões, recorrendo como dispõe o artigo 10.º do RJCCG, às regras relativas à interpretação e integração dos negócios jurídicos, embora sempre dentro do contexto de cada contrato singular.

Ora, utilizando essas regras, verificamos, antes de mais, que os contratos de seguro em apreço foram celebrados, ou melhor, a A. a eles aderiu, para garantir o pagamento do capital que estivesse em dívida à instituição de crédito mutuante, na data da verificação de algum dos riscos neles previstos.

Para o caso, interessam-nos a Invalidez Absoluta e Definitiva, prevista no contrato de seguro correspondente à apólice n.º ...62, e a Invalidez Total e Permanente, prevista no contrato de seguro titulado pela apólice n.º ...04.

Em ambos os casos, trata-se de invalidez, ou seja, incapacidade funcional permanente. Mas, como veremos, nesta situação concreta, nem lhes pode ser atribuído o mesmo significado, nem se pode considerar, face aos factos provados, que a A. esteja afetada por uma Invalidez Absoluta e Definitiva.

Mas, vamos por partes.

Sustenta a A., a propósito deste último tipo de incapacidade, o seguinte:

“Uma invalidez absoluta e definitiva será, para um declaratário normal, um estado da pessoa que o deixa totalmente (completamente, sem restrição) incapaz, para o resto da vida, de exercer a sua atividade, designadamente laboral, em termos de obtenção de meios de subsistência.

Como resulta dos autos, a autora encontra-se numa situação de incapacidade permanente e definitiva de exercer a sua atividade habitual de cabeleira e outras similares.

No que se refere à questão da ajuda de terceira pessoa entendida pela seguradora que se verifica quando implique a indispensabilidade da assistência constante de uma terceira pessoa e que a ré também não logrou provar que tivesse comunicado ou explicado,

O certo é que a autora necessita, aliás, dessa ajuda de 3º pessoa de forma constante, permanente e diária, designadamente para a realização de algumas tarefas do quotidiano e numa necessidade de 2 horas diárias.

Tendo em conta que a pretensão da autora, ao celebrar o contrato de seguro, foi ter coberto o risco de uma incapacidade para o trabalho, de modo permanente, deverá entender-se que a situação dos integra o conceito de invalidez absoluta e definitiva que um declaratário normal e razoável retiraria do contrato de seguro”.

Ora, como já adiantámos, não é este o nosso ponto de vista.

E não é este o nosso ponto de vista porque, desde logo, nem está demonstrado que a A., como alega, esteja “incapaz, para o resto da vida, de exercer a sua atividade, designadamente laboral, em termos de obtenção de meios de subsistência”, nem se provou que a mesma necessite da ajuda de terceira pessoa, nos termos que agora refere.

Quanto ao primeiro aspeto, o que se provou é que, sendo a A. cabeleireira à data em que lhe foi diagnosticado o carcinoma da mama direita, isto é, em 07/03/2016, ficou, depois dos tratamentos a que foi sujeita, incapaz de exercer essa profissão, a de costureira e de outras similares. Tal como ficou impedida de pegar em pesos excessivos com o membro superior direito.

De tal modo que, “[e]m consequência da doença de que padece, a Autora requereu junto do Centro Nacional de Pensões a sua reforma por invalidez, tendo-lhe sido concedida pensão por invalidez relativa, tendo início em 6/08/2018, por incapacidade permanente para o seu trabalho de cabeleireira”.

E, “[p]elo menos desde 6/08/2018 que a autora sofre de uma IPG (incapacidade permanente geral) entre 60 e 63%, em consequência de artrite psoriática, de que padece desde 2013, e do referido carcinoma da mama direita e respectivo quadro sequelar”.

Mas, não está incapaz para o resto da vida, como agora sustenta, de exercer qualquer outra atividade laboral, com vista à obtenção de meios de subsistência próprios.

Pelo contrário, provou-se que “[n]ão obstante a apurada patologia do carcinoma da mama e respetivas sequelas, a autora mantém capacidade para o exercício de outras atividades profissionais (com a exceção de cabeleireira, costureira e similares), desde que não impliquem mobilização do membro superior direito acima do nível dos ombros ou em esforço prolongado no tempo”.

E, quanto ao auxílio de terceira pessoa, também se apurou que dele não necessita de forma permanente.

Assim, pois, perante este quadro factual, não se pode concluir que, mesmo na sua tese, esteja afetada com uma Invalidez Absoluta e Definitiva.

Não ignoramos, com isto, que não são unânimes os critérios jurisprudenciais para a definição deste conceito.

E, assim, como se refere no Ac. RC de 10/01/2023([15]), é possível detetar na jurisprudência três correntes:

“Uma, segundo a qual a referida invalidez tem que ser um estado de uma pessoa que a incapacite, completa e definitivamente, de exercer a sua profissão, como actividade remunerada.

(…).

Outra, de sentido oposto, de acordo com a qual uma invalidez absoluta e definitiva será um estado da pessoa que o deixa totalmente incapaz, para o resto da vida, de exercer a sua actividade, designadamente laboral, em termos de obtenção de meios de subsistência. Isto é, não pode deixar de entender-se que a mesma se refere a todo e qualquer trabalho que não apenas ao trabalho habitual do segurado – neste sentido vão os Acds. do STJ de 29.3.2011, Proc. 313/07.0TBSJM, de 19.6.2018, Proc.2300/15.6T8PNF, e de 2.3.2021, Proc. 2615/18.1T8VRL, disponíveis no referido site.

Uma terceira, digamos intermédia, mais maleável e flexível, adaptável à casuística própria de cada concreta situação, em que se atenda, nomeadamente, ao tipo de doença em causa, as limitações dela decorrentes para a pessoa em concreto, as suas qualificações profissionais, a sua anterior profissão, as reais e efectivas possibilidades de reconversão, incluindo o seu salário prévio à patologia em causa e as reais e concretas possibilidade de atingir, por via da reconversão, se viável, um salário equiparado, próximo ou afastado, para se perceber se aquela doença, aquelas concretas limitações, face às suas concretas qualificações e capacidades remanescentes, provoca irremediavelmente uma perda sensível das suas reais capacidades de ganho e de gerar rendimento, para fazer face ao serviço da dívida que contraiu e que segurou – neste sentido vão os Acds. do STJ de 29.4.2010, Proc.5477/06.8TVLSB e de 27.2.2020, Proc.125/13.2TVPRT, disponíveis no mesmo site”.

Ora, no caso, mesmo adotando esta última corrente, que nos parece mais equilibrada em função da finalidade do contrato de seguro neste tipo de situações e do contexto de coligação imposta com os contratos de financiamento[16], a verdade é que a A. não alegou, nem, consequentemente, demonstrou, como era seu ónus (artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil)[17], factualidade bastante para se poder concluir que, no seu quadro de vida concreto e perante a incapacidade funcional que a afeta, esteja, absoluta e definitivamente, impossibilitada de solver as obrigações contraídas junto da entidade bancária que a financiou, através do contrato de mutuo ao qual foi associado o contrato de seguro titulado pela apólice n.º ...62.

Daí que improceda a sua pretensão, nessa parte.

Já quanto à Invalidez Total e Permanente, prevista no contrato de seguro titulado pela apólice n.º ...04, cremos ser de manter o decidido na sentença recorrida e, no fundo, reconhecer que aquele tipo de incapacidade se verifica.

Não, obviamente, nos termos exatos previstos nesse contrato de seguro, posto que a cláusula relativa aos termos em que se define tal incapacidade se deve ter, como vimos, por excluída. Nem por a A. estar afetada por uma Invalidez Absoluta e Definitiva, uma vez que, como também acabamos de ver, a mesma não se encontra nessa situação e, aliás, também não aderiu a essa cobertura, neste contrato. Mas sim porque, na economia de tal acordo e tendo em conta os interesses de qualquer das partes, a referida cláusula deve ser integrada com reporte à incapacidade de que a A. efetivamente padece; isto é, à total incapacidade para o exercício da sua profissão de cabeleireira.

Efetivamente, no referido contrato foram previstas coberturas de distintos riscos do segurado: Morte; Invalidez Absoluta e Definitiva; e Invalidez Total e Permanente.

A A., como se provou, só aderiu à primeira e terceira coberturas. Mas fê-lo, como também já vimos, sem que esteja demonstrado terem-lhe sido explicadas as cláusulas onde estão inseridos e discriminados os termos dessas coberturas, o que determinou a sua exclusão.

Por isso, sabendo nós, que a A. era cabeleireira e que a sua formação profissional foi sempre feita nessa área, a questão que se coloca é a de saber qual o significado daquela invalidez (total e permanente), para um declaratário normal colocado na posição da A. e sabendo nós que a mesma aderiu a este contrato apenas para garantir o pagamento do capital que estivesse em dívida ao banco na data da verificação de tal risco e porque essa adesão lhe foi exigida por esse banco.

Ora, tendo em conta os critérios interpretativos previstos nos artigos 236.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil, de acordo com os quais, sentido e alcance das declarações negociais valem de acordo com a vontade real do declarante sendo ela conhecida do declaratário, ou, na hipótese contrária, por regra, “com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante”, a menos que este último não possa razoavelmente contar com esse sentido[18], temos para nós como líquido que o único significado objetivo possível é aquele que já indicámos.

Não se acolhe, por isso, a tese da Ré (esgrimida no seu recurso subordinado) de que “ainda que seja totalmente eliminada do contrato de seguro a cláusula que define a Invalidez Total e Permanente para efeitos de acionamento da apólice, na integração desse conceito o julgador não pode deixar de considerar que é de exigir uma situação de total incapacidade para todo e qualquer trabalho compatível com os conhecimentos do segurado e, não apenas, de incapacidade para o trabalho habitual, situação essa na qual a Autora não se encontra, ou na qual não provou encontrar-se”.

Na verdade, para além de não ser esse, do nosso ponto de vista, o sentido que um declaratário normal, no contexto negocial citado, atribui à expressão indicada (invalidez total e permanente), nem a própria seguradora, nos termos da cláusula excluída, lhe atribuiu esse sentido. Como aí se refere (no § único), “[a] Seguradora reconhece a Pessoa Segura em estado de Invalidez Total e Permanente se, para além dos requisitos acima referidos (ou seja, a invalidez, “a) Ser clínica e objectivamente comprovada por um médico da Seguradora; b) Ser precedida de uma incapacidade total para o trabalho com uma duração mínima de 180 dias. Esse periodo será alargado para dois anos nos casos de alienação mental ou de perturbações psíquicas”), esta apresentar um grau de desvalorização não inferior a 66%, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades”. Sinal, portanto, a referida invalidez não tinha sempre de ser, para além de permanente, total, no sentido indicado pela Ré.

De modo que não se acolhe este argumento e, pelo contrário, como dissemos, é de reconhecer à A. a referida incapacidade total permanente, pelas razões já adiantadas.

Em resumo: nada há a alterar no decidido na sentença recorrida, ainda que a fundamentação não seja exatamente coincidente.


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III- Dispositivo

Pelas razões expostas, acorda-se em negar provimento a ambos os recursos e, consequentemente, confirma-se o decidido na sentença recorrida.


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          - Em função deste resultado, as custas de cada um dos recursos serão suportadas pelo respetivo recorrente – artigo 527.º, nºs 1 e 2, do CPC


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Porto, 10/7/2024
João Diogo Rodrigues;
Rodrigues Pires;
João Ramos Lopes.


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[1] No original, consta “impugna”, mas, por nos parecer haver lapso material, procedeu-se à respetiva correção.
[2] Neste sentido, por exemplo, o Ac. STJ de 31/01/2024, processo n.º 7341/19.1T8ALM.L1.S1, consultável em www.dgsi.pt.
[3] Neste sentido, por exemplo, Luís Poças, Revista Jurídica de Seguros, n.º 6 (maio 2017), pág. 233.
[4] Neste sentido, por exemplo, Ac. STJ de 11/11/2010, Processo n.º 1902/06.6TBVRL.P1.S1, consultável em www.dgsi.pt.
[5] Lebre de Freitas, A Confissão no Direito Probatório, Coimbra Ed., pág. 473, citado no Ac.RE de 12/06/2008, Processo n.º 797/08-1, consultável em www.dgsi.pt.
[6] Neste sentido, por exemplo, Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, Comentário ao Código Civil, Parte Geral, UCP, pág. 847.
[7] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, sucessivamente reformulado até ao Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17 de dezembro.
[8] “1- Nos seguros de grupo, o tomador do seguro deve obrigatoriamente informar os segurados sobre as coberturas e exclusões contratadas, as obrigações e direitos em caso de sinistro e as alterações posteriores que ocorram neste âmbito, em conformidade com um espécimen elaborado pela seguradora.
2- O ónus da prova de ter fornecido as informações referidas no número anterior compete ao tomador do seguro.
3- Nos seguros de grupo contributivos, o incumprimento do referido no n.º 1 implica para o tomador do seguro a obrigação de suportar de sua conta a parte do prémio correspondente ao segurado, sem perda de garantias por parte deste, até que se mostre cumprida a obrigação.
4- O contrato poderá prever que a obrigação de informar os segurados referida no n.º 1 seja assumida pela seguradora.
5- Nos seguros de grupo a seguradora deve facultar, a pedido dos segurados, todas as informações necessárias para a efectiva compreensão do contrato”.
[9] “1- Sem prejuízo do disposto nos artigos 18.º a 21.º, que são aplicáveis com as necessárias adaptações, o tomador do seguro deve informar os segurados sobre as coberturas contratadas e as suas exclusões, as obrigações e os direitos em caso de sinistro, bem como sobre as alterações ao contrato, em conformidade com um espécimen elaborado pelo segurador.
2- (…)
3- Compete ao tomador do seguro provar que forneceu as informações referidas nos números anteriores.
(…)”.
[10] Parte do sumário do Ac. do STJ de 14/04/2015, Processo n.º 294/2002.E1.S1. No mesmo sentido, entre outros, o Ac. STJ de 09/03/2021, Processo n.º 1197/16.3T8BRG.G1.S1, de 10/05/2018, Processo n.º 261/15.0T8VIS.C1.S2, de 02/12/2013, Processo n.º   306/10.0TCGMR.G1.S1, Ac. RP de 27/02/2014, Processo n.º 2334/10.7TBGDM.P1; Ac. RP de 25/10/2012, Processo n.º 24/10.0TBVNG.P1; Ac. RP de 11/09/2008, Processo n.º 0834361, Ac. RLx de 22/05/2014; Ac. RLX de 26/02/2013, Processo n.º 411/10.3TBTVD.L1-7; Ac. RLX de 05/03/2009, Processo n.º 1860/07.0TVLSB-8, Ac. RG de 15/09/2014, Processo n.º 17/13.5TCGMR.G1, todos consultáveis em www.dgsi.pt
[11] Parte do sumário do Ac. do STJ de 20/05/2015, Processo n.º 17/13.5TCGMR.G1.S1. No mesmo sentido, entre outros: Acs. STJ de 30/05/2019, Processo n.º 532/17.1T8VIS.C1.S1, de 15/04/2015, Processo n.º 385/12.6TBBRG.G1.S1; de 18/09/2014, Processo n.º 2334/10.7TBGDM.P1.S1, de 09/07/2014, Processo n.º 841/10.0TVPRT.L1.S1; de 21/02/2013, Processo n.º 267710.6TBBCL.Gl.S1; de 29/05/2012, Processo n.º 7615/06. 1TBVNG.P1.S1; de 13/01/2011, Processo n.º 1443/04. 6TBGDM.PI.S1; de 20/01/2010, Processo n.º 294/06. 8TBOAZ.P1; de 12/10/2010, Processo n.º 646/05. OTBAMR.GI.S1; de 22/1/09, Processo n.º 08B4049; Ac. RC de 27/05/2015, Processo n.º 36/12.9TBALD.C1; Ac. RC de 10/09/2013, Processo n.º 1136/11.8TBGRD.C1, Ac. RG de 26/11/2015, Processo n.º 30/14.5TBPVL.G1, Ac. RG de 22/10/2015, Processo n.º 3401/12.8TBVCT.G1; Ac. RG de 25/09/2014, Processo n.º 285/12.6TBBRG.G1, todos consultáveis em www.dgsi.pt.
[12] Proferido na sequência do reenvio prejudicial suscitado no âmbito do Processo n.º 2224/14.4TBSTS.P1.S1, cujos contornos e subsequente decisão constam do Ac. STJ de 25/05/2023, consultável em www.dgsi.pt.
[13] Ponto III do sumário.
[14] Processo n.º 2224/14.4TBSTS.P1.S1, já referenciado.
[15] Processo n.º 437/18.9T8CTB.C1, consultável em www.dgsi.pt.
[16] Cfr. o referido Ac. STJ de 27/02/2020.
[17] Neste sentido, por exemplo, Ac. STJ de 02/11/2023, Processo n.º 1132/20.4T8PDL.L1.S1, consultável em www.dgsi.pt.
[18] Cfr. neste sentido, Luís A. Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, II, Fontes, Conteúdo e Garantia da Relação jurídica, 5ª ed. revista e atualizada, UCP, pág. 448.