Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
17863/20.6T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANA OLÍVIA LOUREIRO
Descritores: RESPONSABILIDADE POR ACIDENTE DE VIAÇÃO
RELEVO DE FACTOS NÃO PROVADOS
CULPA DO LESADO
CONCORRÊNCIA DE CULPA E RISCO DE CIRCULAÇÃO DO VEÍCULO
Nº do Documento: RP2024061717863/20.6T8PRT.P1
Data do Acordão: 06/17/2024
Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Na sentença o juiz tomar posição sobre todos os factos alegados com relevo para a decisão, julgando-os como provados e não provados e motivando a sua convicção. Proferida essa decisão sobre a matéria de facto, todavia, apenas há que olhar para o elenco dos factos provados, aplicando-lhe o direito e concluindo pela decisão e, como tal, deve afastar-se qualquer consideração sobre factos que não se provaram e que, para todos os efeitos, portanto, inexistem.
II - É atualmente injustificado o afastamento geral e abstrato da possibilidade da concorrência de ato do lesado com o risco de circulação de veículos de circulação terrestre para o resultado danoso.
III - Todavia, e não obstante o reconhecimento da crescente perigosidade decorrente da circulação desses veículos, não pode imputar-se sempre ao risco dela decorrente um contributo para o resultado danoso de acidente de viação, devendo tal possibilidade de concorrência causal ser ponderada em concreto.
IV - É adequado, nessa ponderação concreta, ter por base um critério em que apenas se não afaste totalmente a responsabilidade pelo risco nos casos de culpa leve ou levíssima do lesado ou mesmo quando ao mesmo não possa ser dirigido um juízo de censura por ter agido involuntariamente.
V - É grave e exclusivamente causador do sinistro o comportamento do lesado que, conduzindo um motociclo, decide encetar manobra de ultrapassagem pela direita de veículo automóvel que seguia à sua frente e abrandava a sua marcha com vista a estacionar em área a tanto destinada e situada à sua direita, apenas porque o mesmo se convenceu que tal abrandamento do automóvel antecedia uma pretensão de mudança de direção à esquerda, onde entroncava outra via, muito embora não tenha sido efetuada qualquer sinalização luminosa indicativa de mudança de direção à esquerda e nem tal automóvel se tenha aproximado do eixo da via com vista a realizar tal manobra.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo número 17863/20.6T8PRT.P1 Juízo Central Cível do Porto, Juiz 2

Relatora: Ana Olívia Loureiro

Primeira adjunta: Ana Paula Amorim

Segundo adjunto: José Eusébio Almeida

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I – Relatório:

1 - AA propôs ação declarativa sob a forma de processo comum contra A... – Companhia de Seguros, S.A., pedindo a sua condenação no pagamento de indemnização no valor de 85.447,32 € e, ainda, de quantia a liquidar posteriormente com vista ao ressarcimento dos danos decorrente da perda de rendimento durante período em que esteve impossibilitado de trabalhar e das despesas que suportará em consequência da necessidade de acompanhamento regular por ortopedia. Alega que tais danos decorreram de acidente que sofreu e que diz ser de imputar ao comportamento do condutor de veículo seguro na Ré.

2 – Esta contestou apresentando diferente versão do acidente e imputando a ocorrência do mesmo a comportamento ilícito e culposo do Autor, bem como sustentou desconhecer e reputar de excessivos os danos descritos na petição inicial.

3 - Foi proferido despacho saneador com definição do objeto do litígio e dos temas da prova.

4 – Julgada a causa foi proferida sentença que fixou em 60% e 40% respetivamente a proporção do contributo do risco de circulação dos veículo seguro na Ré e do conduzido pelo Autor para os danos por este sofridos e, em consequência, condenou aquela ao pagamento de indemnização de 42.074,22 € e, ainda, de 60% do valor que se venha a apurar que o mesmo deixou de auferir no período de cinco meses em que esteve totalmente incapacitado para o trabalho, deduzido dos subsídios de incapacidade auferidos e em 60% das quantias também a liquidar que despenderá com acompanhamento médico e medicamentoso de que venha a necessitar e ainda das que deixará de auferir por motivo de intervenções médicas de que venha a necessitar.

II - O recurso:

É desta sentença que recorrem ambas as partes, pretendendo:

- a Ré que se julgue que houve culpa exclusiva do Autor na produção do acidente e que, assim não se entendendo, deve ser reduzida a indemnização fixada pelos danos patrimoniais sofridos pelo mesmo à quantia de 10 000 €;

- o Autor, que recorreu subordinadamente, sustentando a culpa exclusiva do condutor do veículo seguro na Ré pela produção do acidente.

Para tanto, alegaram o que sumariam da seguinte forma em sede de conclusões de recurso:
A) A Ré:

“1. A douta decisão recorrida não poderá manter-se uma vez que a decisão nela inserta consubstancia uma solução que viola os preceitos legais e os preceitos legais e os princípios jurídicos aplicáveis, afigurando-se, pois, como injusta.

2. Dos factos provados nos presentes autos resultou que o Recorrido, ao volante do motociclo, violou de forma grosseira as normas estradais (ultrapassagem pela direita de um veículo em zona de entroncamento sem que o condutor desse veículo tenha demonstrado intenção de fazer qualquer manobra de mudança de direcção à esquerda).

3. O condutor do MX (o Recorrido) decidiu proceder à ultrapassagem, pela direita, do JR, quando o condutor deste se aprestava para estacionar o mesmo no estacionamento que existe do lado direito da via, atento o sentido de marcha de ambos os veículos.

4. Assim, o que resultou como provado é que quando o condutor do veículo segurado na Recorrente se aprestava para fazer a manobra de saída da via para o estacionamento que se encontrava do lado direito da via o seu condutor é surpreendido pela manobra de ultrapassagem pela direita que o Recorrido enceta.

5. Quando o JR estava com a sua parte frontal a cerca de 1 metro da zona de estacionamento o Recorrido, ao volante do MX, embate no mesmo.

6. O embate dá-se na zona frontal direita do JR (zona da porta dianteira do lado direito e zona do guarda lamas frontal direito).

7. Ambos os veículos, despois do embate, acabam por se imobilizar no estacionamento

que se encontra do lado direito da via.

8. O Recorrido violou as mais elementares regras de condução estradal pois realizou uma manobra completamente proibida em face das concretas circunstâncias de trânsito (ultrapassagem do JR pela direita em zona de entroncamento) e seguia com completa desatenção ao trânsito que se desenvolvia à sua frente, provocando, com isso, o embate entre ambos os veículos.

9. Da matéria de facto dada como provada resulta que o Recorrido, no momento do embate, encontrava-se a efectuar a manobra de ultrapassagem do veículo segurado na Recorrente em pleno entroncamento.

0. O Recorrido, objectivamente, estava a cometer duas infracção às regras estradais pois estava a efectuar uma manobra de ultrapassagem pela direita e num local em que o Código da estrada, expressamente, prevê ser proibido fazê-lo.

11. A manobra que se encontrava a ser efectuada pelo condutor do veículo segurado na Recorrente não indica que tenha havido qualquer tipo de violação das regras estradais e, sobretudo, que o mesmo tenha realizado qualquer manobra que, de algum modo, tenha sido causal do acidente dos autos.

12. O Recorrido não logrou afastar a presunção de culpa que impendia sobre a sua conduta, nomeadamente, não comprovou que não se encontrava a efectuar uma manobra

de ultrapassagem pela direita em pleno entroncamento e que, por isso, o sinistro não se deveu a negligência sua.

13. Apesar de o Recorrido ter alegado que ficara com a convicção de que o condutor do veículo segurado na Recorrente iria fazer uma manobra de mudança de direcção à esquerda, resultou como provado que este não o pretendia fazer e que nenhuma atitude tomou que pudesse levar o Recorrido a ter tal perspectiva.

14. Relativamente ao condutor do veículo segurado na Recorrente, repete-se, nada foi apurado ou provado que indicie poder ter contribuído, com acção ou omissão censuráveis, para a génese do acidente.

15. Face ao exposto, a responsabilidade pela produção do acidente mostra-se imputável em exclusivo, a título de culpa, ao Autor, ao abrigo do disposto no art.º 483.º do Código Civil.

16. Termos em que a douta sentença violou por erro de interpretação, o disposto nos artsº 11.º, n.º 2, 24.º, 25.º, n.º 1, al. c), e h), 27.º, n.º 1, 36.º, n.º 1, 37.º, n.º 1 e 38.º todos do Código da Estrada e art.º 483.º do Código Civil.

17. A tarefa de determinação/fixação indemnizatória (rectius da compensação) devida por danos não patrimoniais, deverá sempre ser orientada segundo critérios de equidade.

18. Devido à sempre delicada e complicada tarefa de fixar quais os danos relevantes e qual a indemnização que lhes corresponderá, o legislador sentiu a necessidade de recorrer a um conjunto de normativos específicos que evidenciem, com objectividade, a transparência e justiça do modelo no seu conjunto e que sejam aptos a facilitar a tarefa de quem está obrigado a decidir.

19. É neste contexto que surge a Portaria n.º 377/2008, de 26 de Maio.

20. A mesma veio fixar os critérios e valores orientadores para efeitos de apresentação aos lesados por acidente automóvel, de proposta razoável para indemnização do dano corporal.

21. Constitui um instrumento legislativo de enorme utilidade para, juntamente com outros critérios, avaliar do quantum indemnizatório a ser atribuído em sede de indemnizações, quer por danos patrimoniais quer por danos não patrimoniais.

22. Para se proceder à determinação do montante da indemnização a estabelecer nos presentes autos, e por forma a uniformizar cada vez mais as decisões dos Tribunais nesta matéria, princípio que se retira do art.º 8.º, n.º 3 do Código Civil, parece à Recorrente que as tabelas constantes da Portaria 377/08, de 26 de Maio, entretanto alteradas pela Portaria 679/2009, de 25 de Junho – diplomas que fixam os “critérios e valores orientadores para efeitos de apresentação aos lesados por acidente automóvel, de proposta razoável para indemnização conforme o artigo 1º, n.º 1 – deverão ser utilizadas como ponto de referência para os nossos cálculos.

23. Estamos perante uma posição clara tomada pelo legislador no sentido de uniformizar

critérios, permitindo assim objectivar um pouco as margens onde deve intervir a equidade.

24. Tendo ainda em conta a necessidade de, em princípio, o Tribunal actualizar a quantia a fixar a título de indemnização pelos danos não patrimoniais tendo em conta a data da sentença, não deixa de ser relevante, como ponto de referência, as tabelas em causa.

25. A Portaria n.º 377/2008, de 26 de Maio, tem a grande virtualidade de indicar o sentido da fixação da indemnização uma vez que ali estão estabelecidas as regras de cálculo para efeitos de determinação da indemnização devida ao lesado, no caso de este ficar afectado de incapacidade permanente, com repercussão na sua vida laboral.

26. Aquilo que é estabelecido na Portaria n.º 377/2008, de 26 de Maio apresenta-se como justo e correctome daí a opção clara do legislador.

27. O Tribunal a quo não procedeu à utilização destas tabelas ou sequer, à utilização das mesmas como auxiliar relevante para apuramento de danos patrimoniais e não patrimoniais, afastando, liminarmente, a utilização das mesmas.

28. Na verdade, por forma a uniformizar cada vez mais as decisões dos Tribunais nesta matéria, princípio que se retira do art.º 8.º, n.º 3 do Código Civil, as tabelas constantes da Portaria n.º 377/08, de 26 de Maio, entretanto alteradas pela Portaria n.º 679/2009, de 25 de Junho – diplomas que fixam os “critérios e valores orientadores para efeitos de apresentação aos lesados por acidente automóvel, de proposta razoável para indemnização” conforme o art.º 1.º, n.º 1 – deverão ser utilizadas como ponto de referência para os cálculos a efectuar nos autos.

29. Estamos perante uma posição clara tomada pelo legislador no sentido de uniformizar critérios, permitindo assim objectivar um pouco as margens onde deve intervir a equidade.

30. Tendo ainda em conta a necessidade de, em princípio, o Tribunal actualizar a quantia a fixar a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais tendo em conta a data da sentença, não deixa de ser relevante, como ponto de referência, as tabelas em causa.

31. Para além destas tabelas são essenciais as decisões mais recentes tomadas pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ) por forma a se alcançar aquele objectivo de aproximação das decisões tomadas perante casos semelhantes.

32. Tem sido esse o entendimento da jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores.

33. Os valores indicados, sendo necessariamente objecto de discussão acerca da sua razoabilidade entre os lesados e a entidade que deverá pagar, servirão como uma referência, como um valor tendencial a ter em conta.

34. A proposta razoável é, a par da prontidão de resposta, um dos deveres da empresa de seguros, em geral.

35. No que diz respeito aos danos não patrimoniais o valor atribuído pelo Tribunal a quo – €20.000,00 – é totalmente desajustado aos danos sofridos pelo mesmo e que resultaram como provados nos presentes autos, como resulta, aliás, da análise da jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores.

36. As tabelas de compensação que constam da referida Portaria, devidas pela violação do direito à integridade física e psíquica sofrida pelos lesados por acidente automóvel, estabelecendo embora meros critérios e valores orientadores para efeitos de indemnização do dano corporal não prejudicam – antes pelo contrário – a possibilidade de os Tribunais delas se servirem como critério aferidor de carácter preferencial, face ao seu grau de racionalidade, razoabilidade e actualização.

37. O valor a atribuir ao Recorrido a título de danos patrimoniais nunca poderia exceder o montante de €10.000,00 e não a quantia exagerada de €20.000,00.

38. Tendo em consideração a idade do Autor à data do sinistro (33 anos de idade) e que o mesmo ficou a padecer de uma IPG de 7 pontos, nunca o quantum indemnizatório por dano biológico poderia ultrapassar os €20.000,00.

39. Termos em que a douta sentença do Juízo Central Cível de Vila Nova de Gaia, violou, por erro de interpretação e aplicação, o disposto nos art.ºs 494.º, 496.º, 563.º e 564.º do Código Civil.”
B) O Autor:

“A) Considerando não ter ficado provada a existência de comportamento negligente por qualquer dos intervenientes no acidente, recorreu (coerentemente) o M. º Juiz a quo, a critérios de responsabilidade pelo riso para definir a contribuição desses intervenientes na produção do acidente, que repartiu em 60% para o condutor do veículo seguro na Recorrida e 40% para o Recorrente.

B) Sucede que os autos permitem que se extraia conclusão sustentada e clara quanto à contribuição exclusiva do condutor do veículo seguro na Ré/recorrida, para o acidente, pelo que deveria o Mº. Juiz a quo ter-se mantido no campo da responsabilidade subjetiva, considerando o condutor do veículo automóvel, seguro na Ré, exclusivo culpado pela produção do acidente.

C) Tendo-se provado o dano sofrido pelo A. e a sua relação direta e necessária com o acidente, impunha-se apreciar o facto (comportamento) do lesante (condutor do veículo seguro na Ré), identificando aquele (facto/comportamento) sem o qual o acidente (evento danoso) não teria ocorrido e, identificado este, apreciar se o mesmo de facto resultou de um comportamento negligente (e por isso ilícito) e se, a par deste, existiu outro comportamento de terceiro (porventura o próprio lesado!) que, do mesmo modo, tivesse contribuído para o acidente, ou seja, outro comportamento sem o qual, tal como sucedera com aquele, o acidente não teria ocorrido (concorrência de culpas).

D) Ora, os factos provados permitem (e deveriam ter permitido) concluir que sem o comportamento culposo do condutor do automóvel ao guinar repentinamente para a sua direita e sem aviso à sua direita, quando o motociclo se encontrava a circular ao seu lado, o acidente não teria ocorrido, nada tendo podido o Recorrente condutor do motociclo, fazer para o evitar, sendo certo que nenhum comportamento lhe pode ser atribuído que tivesse contribuído para o acidente.

E) Se observamos a dinâmica do acidente resultante destes factos provados, concluiremos, necessariamente, que o condutor do veículo seguro na Ré contribuiu, decisivamente, para que o Recorrente se colocasse ao seu lado direito - ao reduzir a velocidade, na proximidade de um entroncamento à esquerda (atento o sentido de marcha de ambos os veículos), deixando um espaço livre (à sua direita), que permitia a circulação do motociclo sem risco de colisão do veículo -, provocando (ou seja, causando de forma exclusiva e sem concurso de qualquer outro comportamento) o acidente, ao guinar para a sua direita, negligenciando o facto de o motociclo – dotado de luzes em funcionamento – circular por essa parte da hemi-faixa e atravessando-se, de forma totalmente imprevista e imprevisível, na frente do motociclo, com o qual viria a colidir ainda dentro da hemi-faixa de rodagem.

F) Ao conduzir desta forma, profundamente negligente no próprio modo de condução e na inconsciência dos sinais que, com a condição adotada, dava aos condutores dos demais veículos que circulavam na zona, determinou que o Recorrente mantivesse a sua trajetória e formasse a convicção (legitima e comum a qualquer condutor normalmente prudente quando confrontado com aqueles sinais) de que o veículo automóvel iria virar à esquerda, pelo que deverá ser declarado exclusivamente responsável o condutor do veículo seguro na Recorrida, que, assim, deverá ser condenada a pagar ao Recorrente a totalidade do montante fixado adequadamente na douta sentença (e que por isso deve manter-se), e não apenas parte arbitrada, por recurso a critérios próprios de responsabilidade objetiva, pelo M. º Juiz a quo.

G) A douta decisão recorrida fez má aplicação do Direito aos factos provados, por errada interpretação do disposto no artigo 483º, nº 1 do Código Civil, devendo ser alterada.”.


*

Não foram apresentadas contra-alegações.

III – Questões a resolver:
Em face das conclusões dos Recorrentes nas suas alegações – que fixam o objeto do recurso nos termos do previsto nos artigos 635º, números 4 e 5 e 639º, números 1 e 2, do Código de Processo Civil -, são as seguintes as questões a resolver:
1 – se acidente ocorreu por culpa exclusiva do Autor ou do condutor do veículo seguro na Ré, ou, ainda, se ocorre concorrência da culpa de ambos; caso se conclua pela responsabilidade da Ré (total ou parcial),
2 – se deve ser diminuído o valor arbitrado para ressarcimento dos danos não patrimoniais sofridos pelo Autor.

IV – Fundamentação:

São os seguintes os factos provados a que cumpre atender:

1. No dia 12 de janeiro de 2019, cerca das 18.40 horas, na Rua ..., em ..., do concelho de Valongo, ocorreu um embate entre dois veículos,

2. O motociclo tripulado pelo autor, marca Kawasaki, Modelo ... e matrícula ..-..-MX, e o veículo automóvel ligeiro de matrícula ..-JR-.., marca Volkswagen, modelo ..., na ocasião conduzido por BB.

3. Antes do embate, os dois veículos circulavam no mesmo sentido de marcha e pela mesma via de trânsito, no sentido ...-..., seguindo o veículo automóvel à frente do motociclo.

4. No local em causa, a rua ... desenvolve-se como uma reta com cerca de 8,70 metros de largura reservada ao transito automóvel (designada faixa de rodagem),

5. Existindo, à direita da estrada, atento o sentido de marcha de ambos os veículos, uma zona de estacionamento de automóveis, delimitada no pavimento de forma oblíqua em relação à via (vulgarmente conhecida por “zona de estacionamento em espinha”), acessível para os veículos estacionarem sem necessidade de, circulando no sentido de marcha em que seguiam ambos os veículos, se aproximarem do eixo da via, para aí acederem.

6. À hora do embate, já não havia luz solar – era já noite – seguindo ambos os veículos com as luzes (médios) ligadas.

7. Na sequência do embate, o motociclo ficou caído já dentro da baía de estacionamento, cerca de 2 metros à frente do automóvel.

8. Ao local do acidente, foi chamada uma patrulha da GNR que lavrou o auto da ocorrência junto como documento 2 da petição inicial, com o teor que aqui se dá por reproduzido.

9. Após o embate e em face dos ferimentos apresentados, o Autor foi transportado ao Hospital.

10. Em consequência das lesões sofridas com o embate, o Autor manteve-se sem poder trabalhar até 12 de junho de 2019, tenho tido indicação para retomar a sua atividade profissional naquela data,

11. Apresentando, nessa oportunidade, uma incapacidade temporária de 50%,

12. A qual se reduziu para 30%, a partir de 30 de junho de 2019,

13. Vindo o Autor a ter alta clínica em 10 de setembro de 2019.

14. O Autor nasceu em ../../1986, conforme assento de nascimento junto como documento 17 da petição inicial.

15. O Autor, antes do embate, era muito saudável e fisicamente bem constituído.

16. A esperança média de vida dos homens, em Portugal, é, atualmente, de 78 anos.

17. Em consequência do embate, o motociclo sofreu estragos cujo valor de reparação ascende a 594,64 €.

18. A obrigação de indemnização decorrente de responsabilidade civil por acidentes de viação imputáveis ao veículo automóvel referido estava, à data do embate, transferida para a ré, por contrato de seguro do ramo automóvel titulado pela apólice nº ..., nos termos da apólice junta como documento 1 da contestação, que aqui se dá por reproduzida.

19. Os veículos seguiam a sua marcha, antes da manobra tendente ao embate, de forma que, entre o posicionamento do automóvel e a zona de estacionamento, havia espaço suficiente para passar o motociclo do Autor.

20. O condutor do automóvel não acionou o respetivo sinal indicador da mudança de direção à esquerda.

21. Antes de o automóvel virar à direita, para o estacionamento, o mesmo reduziu a velocidade,

22. Mantendo, nessa oportunidade, espaço da faixa de rodagem, à sua direita, que permitia pelo menos a passagem do motociclo do Autor,

23. E continuando o Autor a circular perto da berma da estrada.

24. Pelo menos a redução de velocidade do automóvel e a manutenção de espaço para o motociclo passar pela direita daquele, sem que o Autor se tenha apercebido que o automóvel tivesse acionado o “pisca” para a direita, fez o Autor acreditar que o automóvel iria virar à esquerda, entrando na referida rua ... (que entronca na via onde os veículos seguiam).

25. Nessa altura, o Autor aproximou-se do automóvel, pela direita deste,

26. Os veículos passaram, então, a seguir sensivelmente a par, embora o motociclo seguisse junto à porta traseira do automóvel.

27. Nessa altura, o condutor do automóvel guinou para a sua direita, atento o seu sentido de marcha,

28. com o propósito de vir a estacionar num dos lugares disponíveis existentes no lado direito da via,

29. Atravessando-se na frente do motociclo,

30. Sem visualizar o motociclo que seguia a par do mesmo, à sua direita, junto à porta traseira.

31. Em face da manobra do condutor do automóvel de viragem para a direita, o Autor não conseguiu travar quando o automóvel se atravessou à sua frente,

32. apesar de o Autor ainda ter tentado desviar para a sua direita,

33. Vindo o Autor a embater com o pulso esquerdo no espelho retrovisor do veículo automóvel, e, em consequência desse embate, caindo no chão,

34. sendo que o motociclo embateu ainda quase de raspão no automóvel.

35. A Ré, no quadro da averiguação/decisão extraprocessual de reparação dos danos, propôs fixar a contribuição em 50% do seu segurado para a produção do acidente.

36. Em consequência do acidente, o Autor sofreu fratura – luxação de Galleazi à esquerda, sem perda de conhecimento,

37. Tendo sido assistido no local pelos Serviços de Emergência Médica, que, após estabilização e imobilização do membro superior esquerdo, procederam ao seu transporte para o Serviço de urgência do Hospital ..., no Porto.

38. Após a entrada nos Serviços de Urgência, foi sujeito a avaliação clínica e de imagiologia, sendo-lhe feita redução a frio da fratura, tendo sido internado para ser submetido a tratamento cirúrgico.

39. No dia 14 de janeiro de 2019, o Autor viria a ser submetido a intervenção cirúrgica consistente em osteossíntese do radio e redução e fixação da radiocubital distal,

40. Tendo tido alta do internamento no dia 15 de janeiro de 2019, regressando a casa com o braço imobilizado, com gesso na zona da fratura.

41. O Autor continuou a ser seguido na consulta Externa do Serviço de Ortopedia do Hospital ..., vindo a retirar o gesso e ferro que lhe havia sido colocado no osso (denominado fio de kirschner) para estabilização da radiocubital distal em 15 de fevereiro de 2019,

42. dia em que nasceu, pelas 2 horas da manhã, o seu filho.

43. Após essa data, o Autor passou a ser observado pelos serviços clínicos convencionados da Ré no Hospital 1..., no Porto,

44. Tendo sido submetido a dolorosos tratamentos de fisioterapia, até meados de junho de 2019.

45. Entre a data do acidente e a data da alta (10 de setembro), o Autor esteve:

a. 4 dias com défice funcional temporário total, correspondente ao período de internamento hospitalar e

b. 238 dias com défice funcional temporário parcial,

i. Sendo 242 dias com afetação temporária na atividade profissional (152 dias de afetação total e 90 dias de afetação parcial).

46. O Autor padeceu de sofrimento físico e psíquico durante o período de incapacidade temporária fixável no grau 4, numa escala de 7 de gravidade crescente.

47. A partir da data do acidente - e por causa das lesões dele resultantes – o Autor esteve em situação de baixa médica, subsidiada pela Segurança Social, - interrompida por período de gozo de licença parental inicial -, mantendo-se esta situação até 12 de junho de 2019.

48. Ao tempo do acidente, o Autor exercia a atividade profissional de arquiteto (e comercial) ao serviço da B... – Sociedade Unipessoal, Lda.,

49. auferindo uma remuneração variável na ordem dos 1.250,00€/1.500,0€ mensais,

50. Resultante da soma de um vencimento base correspondente ao salário mínimo nacional e cerca de 750,00€ a 1.000,00€ de remuneração variável, como comissões ou ajudas de custas,

51. tendo deixado de receber quaisquer retribuições, durante 5 meses.

52. Durante aquele período, o Autor recebeu da segurança social diversas quantias a título de subsídio de incapacidade para o trabalho.

53. O Autor é canhoto.

54. Como sequelas definitivas resultantes do acidente, o Autor ficou a padecer de:

a. cicatriz de abordagem cirúrgica no rádio esquerdo com cerca de 20cm, localizada na face lateral do terço médio-distal do antebraço com rigidez na pronação 0% e supinação 30%;

b. dificuldade em escrever, o que obriga a recolocação do cotovelo e antebraço em posição que permita o apoio da mão;

c. existência de fenómenos dolorosos a nível do punho esquerdo;

d. dificuldade em pegar no seu filho ao colo, porquanto sente desconforto emocional e insegurança devido à falta de força e dor no punho esquerdo;

e. dificuldade na realização de algumas tarefas da vida diária, por limitação da mobilidade do punho esquerdo;

f. dificuldade na realização de tarefas a nível profissional que requerem destreza e integridade da mão ativa.

55. As lesões sofridas pelo Autor em consequência do acidente implicam um coeficiente de Défice Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 9 pontos.

56. As limitações sentidas pelo Autor não o inibem de exercer a sua atividade profissional de arquiteto, mas obrigam-no a desenvolver um esforço acrescido para assegurar o desempenho da sua profissão, com frequente recurso a meios informáticos.

57. O Autor, “hoje”, continua ao serviço da B... – Sociedade Unipessoal, Lda., auferindo uma remuneração variável na ordem dos 1.250,00€/1.500,00€ por mês,

58. tendo, no entanto, o seu salário sido alterado na sua composição, auferindo agora a quantia de cerca de 1.165,00 € a título de retribuição base, acrescido de componentes variáveis que lhe mantêm a média mensal de 1400,00€ /1500,00€.

59. A Ré pagou ao Autor metade do valor do arranjo do motociclo, ou seja, pagou 297,32€.

60. O Autor suportou custos com deslocações a consultas e tratamentos e nas próprias consultas, nos Hospitais ... e 1..., no Porto,

61. três delas nos montantes de 10,60 €, 7,00 € e 7,00 €.

62. No momento do acidente, o Autor sofreu violentas dores resultantes da fratura do pulso e rádio esquerdos, tendo sido submetido a dolorosa redução a frio da fratura a fim de ser sujeito a intervenção cirúrgica.

63. Teve, ainda, o Autor de submeter-se a diversas consultas e tratamentos dolorosos de fisioterapia.

64. O Autor sofreu um dano estético fixável no grau 2, numa escala de 7

65. e repercussão nas atividades desportivas e de lazer de grau 3, numa escala de 7.

66. Ainda hoje, o Autor tem, com frequência, dores no pulso esquerdo, tendo, por vezes, necessidade de tomar analgésicos para o alívio das dores, vendo-se

confrontado com limitações permanentes no seu dia-a-dia, quer laboral, quer em todas as atividades que executa fora do trabalho e nos seus tempos de lazer.

67. A fratura ainda não se encontra totalmente consolidada, o que obrigará a consultas de ortopedia e realização de meios complementares de diagnostico de controle, sendo necessário a extração do material de osteossíntese.

68. A fratura sofrida pelo Autor obrigará à realização de cirurgia mobilizadora do punho para ganho da mobilidade,

69. O que implicará período de inatividade profissional.

70. Os atos médico referidos terão custos próprios inerentes a tais atos.

71. O Autor deixou, ainda, de praticar cross-fit, desporto que praticava antes do acidente e que lhe dava prazer,

72. Sentindo, ainda, grandes limitações no dia e dia, nomeadamente para pegar no seu filho ao colo, uma vez que sente instabilidade e, por vezes, dor.

73. Sentindo limitação com atos como transportar as compras do supermercado, quando estas pesam um pouco mais.

74. O Autor, em virtude das sequelas de que ficou a padecer, tem de se submeter a acompanhamento médico regular da especialidade de ortopedia (pelo menos uma vez por ano) e ao uso esporádico de analgésicos, atentas as dores de que é acometido.

75. A Rua ..., na zona do sinistro dos autos, caracteriza-se por ser uma reta com cerca de 500 metros de comprimento e com 8,70 metros de largura (sendo que cada uma das hemi-faixas de rodagem mede 4,35 metros).

76. Na zona do sinistro, existem duas hemi-faixas de rodagem em cada um dos sentidos da Rua ... sendo que, do lado direito da via, atento o sentido de marcha prosseguido por ambos os veículos, existe uma zona de estacionamento “em espinha”, que mede 5,20 metros de largura.

77. Era noite e o tempo estava seco.

78. O pavimento da via era de asfalto e encontrava-se em razoável estado de conservação.

79. A Rua ... é ladeada por edificações do lado direito da via, atendo o sentido de marcha dos veículos intervenientes no sinistro.

80. O acidente dos autos verificou-se na parte da faixa de rodagem da Rua ... destinada ao trânsito que se processava no sentido .../....

81. O condutor do MX (o Autor) decidiu proceder à ultrapassagem, pela direita, do JR, quando o condutor deste se aprestava para estacionar o mesmo no estacionamento que existe do lado direito da via, atento o sentido de marcha de ambos os veículos.

82. Quando o JR se aprestava para fazer a manobra de saída da via para o estacionamento, o seu condutor é surpreendido pela circulação do motociclo do Autor à sua direita.

83. Quando o JR estava com a sua parte frontal a cerca de 1 metro da zona de estacionamento o MX embate no mesmo.

84. O embate dá-se na zona frontal direita do JR (zona da porta dianteira do lado direito e zona do guarda lamas frontal direito).

85. O MX acaba por embater no JR com a sua lateral esquerda, quando já tinha entrado em despiste.

86. Ambos os veículos, despois do embate, acabam por se imobilizar no já citado estacionamento que se encontra do lado direito da via.

87. A Ré, tendo em consideração aquela que é uma prática comum na gestão que faz dos sinistros dos quais possa, em face da existência de um contrato de seguro obrigatório de responsabilidade civil, ter responsabilidade, procurou fazer uma averiguação do sinistro.

88. Da averiguação realizada, resultou que as versões dos intervenientes eram divergentes.

89. Em conversações extrajudiciais encetadas com a congénere SEGURO DIRECTO (seguradora que pertence ao mesmo universo societário da ora Ré) ambas as seguradoras consideraram que uma divisão equitativa da responsabilidade seria a melhor solução para almejar uma tentativa de resolução consensual dos danos decorrentes do sinistro.

Foram julgados não provados os seguintes factos:

a) O automóvel circulava em velocidade não superior a 30 km/h;

b) a escassos 60 cm da berma do lado direito.

c) O motociclo seguia a velocidade de cerca de 30 Km/h.

d) Ao aproximar-se do entroncamento da Rua ... com a rua ... (que, com a via por onde seguiam os veículos e atento o sentido de marcha destes, entronca pela esquerda) o veículo automóvel passou a circular junto do eixo da via.

e) Criando, com essa manobra de aproximação ao eixo da via, a convicção no Autor de que iria virar à esquerda, entrando na referida rua ....

f) Manteve, entretanto, o Autor, a velocidade a que seguia, cerca de 30kmh,

g) passando o automóvel a circular junto ao eixo da via, deixando livre metade da hemi-faixa direita.

h) O Autor manteve-se a circular à mesma velocidade.

i) O condutor do automóvel não sinalizou a manobra de mudança de direção à direita com o sinal luminoso (pisca).

j) O défice funcional temporário absoluto sofrido pelo Autor foi de 5 dias.

k) Os custos suportados pelo Autor com deslocações a consultas e tratamentos e nas próprias consultas, nos Hospitais ... e 1..., no Porto, acenderam a € 150,00.

l) O Autor praticava ciclismo e deixou de praticar.

m) O JR seguia cerca de 200 metros à frente do MX,

n) sendo que o seu condutor imprimia ao mesmo uma velocidade de 40 km/h.

o) O condutor do JR diminuiu a velocidade que imprimia ao mesmo para cerca de 5 km/h,

p) acionou o sinal luminoso de mudança de direção à direita

q) e aproximou o carro do lado direito da via para poder estacionar o mesmo.

r) Estava, assim, a cerca de 1,50 metros da zona de intersecção entre a hemi-faixa pela qual seguia e o estacionamento que se encontra do lado direito da via quando inicia a manobra de saída da via para a direita.

s) O MX circulava a uma velocidade superior a 70 km/h.

t) O Autor seguia com completa desatenção ao trânsito que se desenvolvia à sua frente.


*

1 – Da responsabilidade pela produção do acidente.

A ação foi proposta com base na alegação da responsabilidade civil extracontratual do condutor do veículo automóvel ligeiro cujo contrato de seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel fora celebrado com a Ré.

Esta, por sua vez, defendeu-se imputando ao lesado a culpa exclusiva na produção do acidente.

A sentença recorrida, depois de enunciar os requisitos para a responsabilidade extracontratual que fora invocada como fundamento da ação, classificou como ilícito o comportamento do condutor do veículo seguro na Ré por “(…) ofensa, pelo menos, do direito de propriedade e da integridade física do autor, direitos constitucionalmente protegidos pelos arts. 25.º, n.º 1, e 62.º da CRP, o que permite configurar a prática de um ato ilícito por parte do condutor do automóvel segurado na Ré, uma vez que, objetivamente, ofendeu um direito subjetivo do Autor”.

Afirmou de seguida que: “(…) compulsando os factos provados, não é possível imputar a qualquer dos condutores envolvidos uma conduta culposa violadora de alguma norma estradal.”.

Mais concretamente, afastou a culpa do condutor do veículo seguro na Ré pela afirmação de que nada se provou quanto “(…) à alegação de que o veículo, antes de virar à direita para estacionar, se desviou para a esquerda ou que não acionou o sinal luminoso de mudança de direção (pisca) com a antecedência devida, não se vislumbra que a factualidade provada permita imputar a violação de alguma norma estradal ao condutor do automóvel, mesmo que os factos provados também não permitam afastar a possibilidade de tal infração ter ocorrido, pois também não se provou o contrário”.

E concluiu pela não verificação de culpa do Autor com a seguinte argumentação: “(…) não obstante se verificar que, antes do embate, o mesmo se encontrava a ultrapassar o automóvel pela direita deste (aparentemente, em violação do art. 36.º do CE), a verdade é que a imagem global do acidente que se provou não permite, sem mais, considerar também uma violação de norma estradal pela sua conduta, no sentido de se afastar o preenchimento da exceção à obrigação de ultrapassagem pela esquerda prevista no art. 37.º, n.º 1, do CE.

Na verdade, julgou-se pelo menos provado que o automóvel, no local em que se aproximava um entroncamento à esquerda e antes de virar à direita para estacionar, abrandou a sua marcha, mantendo espaço para o motociclo passar pela sua direita, provando-se ainda que o Autor ficou convencido que o automóvel iria virar naquele entroncamento à esquerda, decidindo, por isso, prosseguir a sua marcha, ultrapassando inevitavelmente o automóvel pela direita deste.

Ora, neste quadro de facto, conjugado ainda com a circunstância de não se ter provado que o automóvel tenha acionado o “pisca” da direita (antes de virar para estacionar), não é possível afastar o cumprimento, pelo Autor, da regra estradal que permite a ultrapassagem pela direita, nos termos do art. 37.º, n.º 1, do CE. E, se é certo que o automóvel não acionou o “pisca” para a esquerda, tal não é suficiente para se dissociar do abrandamento da marcha junto ao entroncamento e da pelo menos manutenção de espaço de ultrapassagem pela direita (com possível movimentação do automóvel para a esquerda, apesar de não se ter provado tal movimentação e nem o seu contrário), uma intenção de o condutor do automóvel virar efetivamente à esquerda no entroncamento, pelo menos de acordo com a expectativa legítima dos demais condutores, até no quadro do que é uma normal dinâmica da condução estradal”.

A Ré entende, pelo contrário, que o Autor violou duas normas do Código da Estrada ao ultrapassar em entroncamento e pela direita.

Cumpre apreciar o comportamento estradal provado de ambos os condutores – já que a Ré imputa ao lesado um comportamento ilícito e culposo causal do acidente -, para aferir, em primeiro lugar, se algum deles ou ambos praticou facto ilícito causador do acidente.

Ambos os condutores praticaram factos voluntários, um ao abrandar e encetar manobra de estacionamento, outro ao decidir ultrapassar pela direita o veículo à sua frente.

Está em causa aferir, em primeiro lugar, se foi violada alguma norma legal em cujo âmbito de proteção se encontrem os bens jurídicos violados.

A antijuridicidade do facto voluntário consiste fundamentalmente na contrariedade ao Direito. “Numa primeira aproximação, ilícito é aquilo que está em oposição à ordem jurídica”. Consiste “na reprovação das condutas do agente no plano geral e abstracto”[1].

Assim, a ilicitude pode revestir duas formas ou modalidades: violação do direito de outrem ou violação de qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios.

Há violação do direito de outrem quando ocorrem ofensas a direitos absolutos, de que constituem exemplo os direitos reais e os direitos de personalidade, como, no que aqui releva, a integridade física.

Haverá, por sua vez, violação de disposição legal destinada a proteger interesses alheios desde que a tal lesão corresponda a ofensa de uma norma legal e que esses interesses não sejam protegidos apenas reflexamente pela norma enquanto tutela interesses gerais indiscriminados.

É, assim, exigível que a lesão se efetive no próprio bem jurídico ou interesse privado que a lei tutela.[2]

Vejamos se assim é, então, no caso dos autos, olhando às normas do Código da Estrada que regulam a condução dos veículos em situações como a dos autos e que visam, com tais estipulações, evitar sinistros e os consequentes danos.

Decorre dos números 1 e 2 do artigo 13º do referido Diploma que a marcha dos veículos deve fazer-se pela direita da faixa de rodagem conservando das bermas a distância necessária a evitar acidentes e que pode usar-se a faixa da esquerda para se fazer ultrapassagem ou mudar de direção.

O artigo 21º, por sua vez, estipula que os condutores devem anteceder as manobras de ultrapassagem, estacionamento e mudança de direção (no que aqui releva) de sinalização luminosa antes e durante a manobra. O artigo 35º ordena, ainda, que as manobras de ultrapassagem e mudança de direção sejam feitas apenas quando da sua realização não resulte perigo ou embaraço.

O artigo 36º reitera que a manobra de ultrapassagem deve efetuar-se pela esquerda e sanciona com multa a violação dessa regra.

O artigo 37º, sob a epígrafe “Exceções” estipula que se faça “(…) pela direita a ultrapassagem de veículos ou animais cujo condutor, assinalando devidamente a sua intenção, pretenda mudar de direção para a esquerda ou, numa via de sentido único, parar ou estacionar à esquerda, desde que, em qualquer caso, tenha deixado livre a parte mais à direita da faixa de rodagem.”.

Importa finalmente convocar o disposto no artigo 41º, número 1 c) do Código da Estrada que proíbe a ultrapassagem “Imediatamente antes e nos cruzamentos e entroncamentos” e o seu artigo 44º que estipula que a mudança de direção para a esquerda deve ser antecedida da aproximação, com a antecedência necessária e o mais possível do limite esquerdo da faixa de rodagem.

Ora, dos factos provados resulta que o Autor conduzia o seu motociclo na mesma via e sentido de trânsito do automóvel de marca Volkswagen, modelo ..., atrás deste, sendo o local do embate uma reta com cerca de 8, 70 metros de largura.

Era noite e ambos os veículos seguiam na hemifaixa da direita, com as luzes ligadas.

À direita de ambos existia zona destinada a estacionamento, em espinha, que permita a quem seguisse naquele sentido estacionar sem ter de se aproximar, para a esquerda, do eixo da via e de efetuar a manobra descrevendo uma linha perpendicular ao estacionamento.

O automóvel ligeiro seguia a uma distância da referida zona de estacionamento à sua direita que permitia a passagem do motociclo naquele espaço e reduziu a velocidade sem ter acionado qualquer sinal luminoso de mudança de direção para a esquerda. Não obstante, o Autor convenceu-se de que o mesmo pretendia mudar de direção à esquerda, onde entroncava uma outra via. Por isso, encetou a ultrapassagem do automóvel pela sua direita e, quando estavam já a par, encontrando-se o motociclo alinhado com a porta traseira do veículo automóvel este virou para a sua direita com vista a estacionar.

São estes os factos apurados que devem presidir à decisão da questão em apreciação.

A consideração dos factos não provados foi indevidamente feita na sentença recorrida quando se apreciou a verificação dos requisitos da ilicitude e da culpa o que, salvo o devido respeito terá levado à afirmação, de que discordamos, de que o comportamento do Autor não pode ser tido como ilícito e culposo.

Estipula o artigo 607º número 3 do Código de Processo Civil que na fundamentação da sentença o juiz deve discriminar os factos que julga provados e “indicar interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes”. Como é manifesto o que não ficou provado irreleva para a fundamentação da decisão pois, na dúvida sobre a ocorrência de um facto, operam as regras da distribuição do ónus da prova. O se afirmou não bule com a obrigação de o Tribunal tomar posição sobre todos os factos alegados com relevo para a decisão, julgando-os como provados e não provados e motivando a sua convicção (número 4 do mesmo preceito). Proferida essa decisão sobre a matéria de facto, todavia, apenas há que olhar para o elenco dos factos provados, aplicando-lhe o direito e concluindo pela decisão e, como tal, deve afastar-se qualquer consideração sobre factos que não se provaram e que, para todos os efeitos, portanto, inexistem.

Donde, considerações como as feitas pelo Tribunal Recorrido sobre o relevo da convicção do Autor quando decidiu ultrapassar o automóvel que o antecedia pela direita não podem alicerçar-se na possibilidade de ter ocorrido o que não se provou, nomeadamente a movimentação do veículo automóvel para a esquerda ou a não sinalização luminosa da intenção de estacionar à direita. O Tribunal recorrido, afirmando desconhecer-se se tal ocorreu ou não, afastou a culpa do lesado por ter entendido justificada a convicção do mesmo de que o condutor que o antecedia pretendia mudar de direção à esquerda na medida em que, embora não se tendo provado tal alegação podia, de facto, ter ocorrido uma aproximação ao eixo da via e ter sido omitida a sinalização luminosa indicativa de viragem à direita. Discorda-se, com o devido respeito, desse raciocínio já que não está provado nem que não foi acionada a luz indicativa de mudança de direção à direita nem que o automóvel se tenha aproximado do eixo da via antes de virar à direita para estacionar. Deve, pois, apreciar-se a conduta do Autor no pressuposto de que nenhum desses factos aconteceu.

Há, assim, que olhar apenas para o comportamento de ambos os condutores que ficou provado.

Ora, o condutor do veículo seguro na Ré seguia, atento o seu sentido de trânsito, à direita da faixa de rodagem e abrandou a sua marcha por pretender estacionar em lugar a tanto destinado, que se situava à sua direita. É certo que conservava da berma uma distância que permitia a passagem de um motociclo. Daqui não pode concluir-se que o mesmo estivesse demasiado afastado da berma direita já que a via tinha cerca de 8, 70 metros de largura e cada uma das suas hemifaixas 4, 35 metros. Não pode, assim, concluir-se dos factos provados que o espaço livre à sua direta - que permitia a passagem de um motociclo como o do Autor -, fosse violador do disposto no número 1 do artigo 13º do Código da Estrada que obriga a que esse espaço seja o suficiente a que permita evitar acidentes.

Donde, no momento em que o Autor iniciou a sua ultrapassagem pela direita o condutor do veículo seguro não se encontrava em violação de qualquer norma do Código da Estrada. Encontrava-se a circular pela direita e acabara de abrandar a sua marcha sem que tenha manifestado qualquer intenção de mudar de direção à esquerda.

Tampouco resulta necessariamente do facto de ter vindo a embater no motociclo quando fez a manobra que não a tenha antecedido dos cuidados necessários, o que não se provou.

Não pode ser-lhe imputada a violação da obrigação de sinalizar tal manobra, pois tal não resulta dos factos provados.

Da forma como está provada a dinâmica do acidente não pode concluir-se que tal condutor descurou qualquer dever de cuidado, desde logo porque o motociclo iniciou a sua ultrapassagem pela direita quando o condutor à sua frente já preparava a manobra de estacionamento, pois o fez já depois de automóvel ter abrandado a sua marcha com vista a realizá-la e quando este se aprestava para fazer a manobra de saída da via para o estacionamento conforme ficou provado. Tal conclusão decorre da prova de que a viragem à direita se iniciou quando o motociclo já estava a par com a porta traseira do lado direito do automóvel ligeiro, ou seja, a ultrapassá-lo pela sua direita.

O referido condutor não tinha, pois, que esperar estar a ser ultrapassado pela direita, desde logo porque essa manobra é proibida.

O mesmo abrandou com vista a estacionar antes de se ter iniciado tal ultrapassagem o que revela um dos cuidados necessários à manobra que ia encetar e já estava com a parte frontal a cerca de um metro da zona de estacionamento quando foi embatido pelo motociclo.

Está, pois, corretamente afastada a violação de qualquer norma estradal pelo condutor do veículo seguro.

Pelas mesmas razões também não se vê na sua conduta provada a violação de qualquer dever geral de cuidado desde logo porque quem quer estacionar à direita, em lugar a tanto destinado e onde tinha espaço para o efeito, não tem que anteceder a manobra da verificação de que não está a ser ultrapassado por esse lado já que tal é proibido (pelo facto de essa manobra estar a ser feita pela direita e, no caso, também pelo facto de  existir entroncamento à esquerda). Conduzindo o seu automóvel pela faixa direita quando decidiu estacionar e tendo abrandado previamente a sua marcha não podia tal condutor legitimamente contar que o motociclo que momentos seguia atrás de si iria passar a circular ao seu lado direito no preciso momento em que o mesmo iniciou a viragem à direta.

Já o comportamento do Autor deve ter-se por ilícito e culposo.

Senão vejamos:

O mesmo convenceu-se que o abrandamento do automóvel à sua frente fazia antever uma mudança de direção à esquerda que, contudo, se provou que não foi sinalizada por qualquer forma. Tampouco se provou que o automóvel, a par com tal abrandamento, se tenha aproximado do eixo da via. Donde não havia qualquer fundamento para que o abrandamento do veículo automóvel fosse entendido como indiciador de uma pretensão de mudança de direção à esquerda.

Nem se percebe, em face do único facto provado (que o referido automóvel abrandou a sua marcha) porque haveria o Autor de presumir que o mesmo se dirigiria para esquerda para passar a circular na via que ali entroncava e não para a direita, onde havia lugares de estacionamento. Ou seja, em face dos factos provados terá sido completamente aleatória a convicção do Autor, já que o abrandamento do automóvel poderia estar justificado por uma série de razões e, nomeadamente em face dos factos provados, pela intenção de estacionar à direita.

Não tendo sido usada sinalização luminosa indicativa de intenção de mudança de direção à esquerda não podia o simples abrandamento ser entendido como uma manifestação de qualquer intenção do condutor do veículo automóvel de virar à esquerda, pelo que ao Autor restava abrandar também, mantendo do veículo que o antecedia a distância adequada a poder parar caso tal fosse necessário.

Não o fez, contudo, e iniciou a ultrapassagem do veículo seguro em entroncamento, pela direita, sem que estivesse verificada a estatuição do artigo 37º do Código da Estrada, isto é, sem que o veículo que o antecedia se encontrasse em manobra de mudança de direção para a esquerda.

A sua conduta é, assim, violadora do disposto no artigo 36º, número 1 do Código da Estrada e é grosseiramente negligente, uma vez que o mesmo decidiu encetar uma manobra de ultrapassagem com base numa convicção não estribada em qualquer sinal visível de que a mesma fosse correta ou, sequer, provável.

Tratando da distinção entre ilicitude e culpa, expende Antunes Varela[3] que abrangem aspetos diferentes, embora em certo sentido complementares, da conduta do autor do facto. A ilicitude considera esta conduta objetivamente, como negação dos valores tutelados pela ordem jurídica. A culpa olha o lado individual, subjetivo do facto ilícito.

A conduta é culposa quando merecer a reprovação ou censura do direito, ou dito de outro modo, quando “o lesante, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, podia e devia ter agido de outra maneira”[4] .

Ora, em face do abrandamento da marcha do veículo automóvel que seguia à sua frente o Autor podia e devia ter agido de outra maneira. Desconhecendo em absoluto que manobra o mesmo pretendia encetar ou até mesmo que tal abrandamento visasse anteceder uma qualquer manobra (podia, por exemplo, tal abrandamento decorrer da presença de um obstáculo na via) não podia o Autor ter gerado, sem qualquer suporte para tal, a convicção de que o condutor à sua frente iria virar à esquerda. Mais grave, todavia, é ter agido suportado numa tal convicção infundada, tendo encetado uma manobra em si mesma perigosa, como é uma ultrapassagem, e passado a circular à direita do automóvel, no espaço livre ali existente como se fosse certo que o mesmo ia virar à esquerda.

A culpa pode revestir duas modalidades: o dolo ou a negligência.

O facto será doloso se “o agente tem a representação do resultado danoso, sendo o acto praticado com a intenção de produzi-lo, ou apenas aceitando-se reflexamente esse efeito”. Será negligente se se deve “somente a falta de cuidado, imprevidência ou imperícia”[5].

O critério legalmente estabelecido no número 2 do artigo 487º do Código Civil é o de que a culpa do agente será apreciada segundo a diligência de um bom pai de família em face das concretas circunstâncias de cada caso. O padrão abstrato estriba-se assim na diligência do homem médio, prudente e sagaz a que alude a fórmula romana do “bonus pater familiae”. Este conceito abstrato deve, contudo, atender sempre às circunstâncias da situação concreta. Assim, a culpa não será apenas uma deficiência da vontade, mas uma verdadeira deficiência da conduta devendo considerar-se culposos quer os descuidos e faltas de atenção ou cuidado como também as condutas que revelem falta de destreza ou perícia.

Ora, o Autor foi imprevidente não só ao formar a convicção de que o automóvel que o antecedia iria mudar de direção à esquerda - pois não havia qualquer indício seguro dessa intenção do seu condutor -, como, ainda, não hesitou em encetar a manobra de ultrapassagem que antecedeu e deu causa imediata ao embate apenas com base nessa convicção, que não tinha alicerce seguro.

Agiu, assim, de forma imprudente e temerária, sendo o comportamento esperado de um homem médio, usando de cautela e cuidados medianos e colocado naquela situação, o de abrandar a sua marcha em conformidade com o veículo que o antecedia, esperando ter a certeza de que o mesmo ia efetuar alguma manobra, e qual, para, só depois, adotar o comportamento adequado.

Resta apurar se se verifica a existência de nexo de causalidade entre tal sua conduta ilícita e culposa e os danos que veio a sofrer.

É que, nesse caso, a indemnização dos danos que sofreu pode não ser devida na sua totalidade ou em parte (caso se venha a concluir, como se fez na sentença recorrida, que apesar de não ser de responsabilizar a Ré com base em qualquer comportamento ilícito e culposo do condutor do veículo seguro a mesma pode ser responsabilizada por se entender que os danos decorreram do risco inerente à circulação de tal veículo).

O artigo 566º prevê, de facto que outras disposições legais possam afastar a regra da indemnização ali fixada e que consagra a chamada “teoria da diferença” segundo a qual o lesado deve ser colocado na situação em que estaria se não tivesse sofrido os danos.

Uma das exceções legais previstas a esta regra é a concorrência de facto culposo do lesado – cfr. artigoº 570º do Código Civil. O que está em causa neste preceito não é a apreciação da culpa do lesado no sentido (de censura ético-jurídica) que acima se referiu, é o requisito do nexo causal entre o facto e o dano cuja verificação é obrigatória na responsabilidade civil extracontratual por via do artigo 563º do Código Civil. Assim, há que averiguar se o dano decorreu apenas da apurada conduta ilícita e culposa do Autor ou se, pelo contrário, se deve concluir que tal conduta concorreu para o resultado danoso em conjunto com o risco decorrente da circulação do veículo seguro na Ré que foi a base da responsabilização desta na sentença recorrida.

Tradicionalmente esta concorrência da culpa e do risco era afastada com base na interpretação dos artigos 505º, 506º, número 1 e 570º, números 1 e 2 do Código Civil.

Por um lado, era considerado que o artigo 505º do Código Civil afastava a responsabilização de quem detivesse a direção efetiva do veículo com base nos seus riscos próprios quando o acidente fosse de imputar ao lesado ou a terceiro, por outro, o 506º do Código Civil que consagra a responsabilidade objetiva no caso de colisão de veículos apenas prevê a ponderação da contribuição de cada um deles para o resultado danoso “se nenhum dos condutores tiver culpa no acidente”, e, finalmente, o artigo 570º refere a redução ou afastamento da indemnização quando ocorra culpa do lesado em função da apreciação da “gravidade da culpa de ambas as partes” e o seu número 2 estipula a regra de que se exclui o dever de indemnizar perante a culpa efetiva do lesado quando a culpa do lesante for “simples” culpa presumida. A propósito deste último preceito e com base num argumento de “maioria de razão” Pires de Lima e Antunes Varela defendiam que se a culpa efetiva exclui a presumida é indiscutível que também deve excluir o risco[6]

Com base nesses preceitos, mas sobretudo na estatuição do artigo 505º do Código Civil autores como Antunes Varela defendiam, assim, a aplicação da máxima de que “a culpa exclui o risco”[7].

Tal interpretação está hoje maioritariamente ultrapassada, para o que contribuiu decisivamente o avanço jurisprudencial que tem levado a uma leitura mais atualista do preceito e o imperativo de interpretação do direito interno de acordo com o comunitário.

De facto, é manifesto que as preocupações com o risco inerente à circulação automóvel que estiveram na base da redação dos artigos 503º a 508º do Código Civil encontram hoje razões de ser muito mais evidentes do que as então sentidas. A massificação do uso do automóvel e de outros veículos motorizados e não motorizados e as condições de circulação em vias rápidas que potenciam uma maior velocidade de trânsito são hoje de grau muito superior do que existia à data da consagração da solução legal vigente e que já então dava mostras da sentida necessidade de um regime especial para acautelar os danos decorrentes dessa circulação, como atividade que comporta riscos de grande monta.

Vários diplomas avulsos posteriores ao Código Civil vieram aumentar a proteção dos lesados vítimas de acidentes de viação demonstrando a consciência do legislador ordinário da gravidade dos riscos dessa atividade. Por via do DL 408/79 de 25 de setembro foi (finalmente) instituído o seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel que vinha sendo adiado desde o DL 165/75 de 28 de março (cuja vigência foi adiada sucessivamente), e o DL 522/85 de 31 de dezembro criou o Fundo de Garantia Automóvel. A conjugação destes dois diplomas trouxe à indemnização dos lesados em consequência de acidentes de viação uma proteção com cariz eminentemente previdencial e que se foi afastando do regime geral de responsabilidade delitual num sentido cada vez mais garantístico, de socialização do risco. Essa tendência, transnacional, está expressa também nas sucessivas diretivas comunitárias no domínio do seguro obrigatório automóvel que visam garantir “que as vítimas de acidentes causados por esses veículos beneficiem de tratamento comparável, seja qual for o local em que o acidente ocorra”.[8]

Nas conclusões do Acórdão do Tribunal de Justiça de 30 de junho de 2005 (Catja Candolin)[9] pode ler-se, à semelhança do que muitos outros arestos desse tribunal posteriormente afirmaram, o seguinte “Os Estados membros são, contudo, obrigados a exercer as suas competências no respeito do direito comunitário (…) as disposições nacionais que regula as indemnizações devidas por sinistros resultantes da circulação de veículos não podem, assim, privar as referidas disposições do seu efeito útil. Seria esse nomeadamente o caso se, apenas com fundamento na contribuição do passageiro para a produção do dano, uma legislação nacional, definida com base em critérios legais e abstratos, recusasse ao passageiro o direito a ser indemnizado ou limitasse esse direito de modo desproporcionado”.

Neste sentido evoluiu também a doutrina nacional, destacando-se entre as vozes mais ativas na defesa da possibilidade da concorrência da culpa e do risco para a produção do acidente, (além do já citado professor Vaz Serra como consta da nota 7), Calvão da Silva e Sinde Monteiro[10][11]. O primeiro, em anotação a Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01-03-2001 conclui que “Sem prejuízo do concurso da culpa do lesado, a responsabilidade objectiva do detentor do veículo só é excluída quando o acidente for devido unicamente ao próprio lesado ou a terceiro, ou quando resulte exclusivamente de causa de força maior estranha ao funcionamento do veículo”[12].

A tendência crescente para tal interpretação, que na falta de melhor nome chamaremos de atualista, tem sido grandemente impulsionada pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores, sendo de destacar os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 01-10-2007 (071710), de 20-01-2009 (08A3807), de 19-03-2019 (5173/15.5T8BRG.G1.S1) de 25-05-2021 (388/18.4T8FAR.E1.S1), de 31-05-2023 (521/16.3T8VFR.P1.S1), e do Tribunal da Relação do Porto de 14-07-2021 (23399/19.0T8PRT.P1), e desta mesma secção de 12-09-2022 (2223/20.7T8VLG.P1) entre muitos outros (todos disponíveis em www.dgsi.pt).

O risco decorrente da circulação automóvel, pela sua expressão estatística e pelos resultados muitas vezes gravíssimos dos acidentes de trânsito tem, justamente, merecido um tratamento crescentemente mais atento à massificação desse perigo e ao reconhecimento da concorrência do mesmo para a produção dos danos mesmo quando para eles contribuem também, em maior ou menor medida, ações humanas qualificáveis causais dos sinistros. Não tendo por ora sido ultrapassada a fixação de jurisprudência que foi introduzida pelo Assento 1/80 de 29 de janeiro (DR24/1980, Série I, de 29-01-1980), no sentido de que “O disposto no artigo 493.º, n.º 2, do Código Civil não tem aplicação em matéria de acidentes de circulação terrestre” há muito que têm sido levantadas dúvidas sobre se deve manter-se tal entendimento[13] numa manifestação, também do reconhecimento crescente do papel do perigo da atividade decorrente da circulação rodoviária para a produção dos danos consequentes a acidentes de viação.

Lopes do Rego acentua que “(…) as condições e a intensidade da circulação rodoviária evoluíram drasticamente em relação ao que se verificava nos anos sessenta do século passado, implicando sensível agravamento dos riscos e da sinistralidade a ela associados (envolvendo atualmente, particularmente em ambiente urbano, não apenas a convivência normalmente problemática entre veículos automóveis peões e velocipedistas, mas também entre estes meios tradicionais de deslocação e circulação e as novas formas de circulação – trotinetes, patins…-, geradoras de inovatórios e acrescidos riscos na produção de eventos danosos, potencialmente com consequências pessoais gravosas)”[14].

É no respeito e em total concordância com essa tendência interpretativa atualista que defendemos que pode ocorrer, em termos de causalidade, concorrência da culpa (não no sentido de censura ética, mas de imputação) do lesado e do risco inerente à circulação de veículos para a produção de certos danos, não se justificando atualmente o afastamento dessa possibilidade em termos gerais e abstratos, mas apenas quando no caso concreto se deva imputar unicamente à conduta do lesado a produção do resultado danoso.

Resta aferir se no caso concreto se justifica a ponderação dessa concorrência de culpa do lesado e do risco decorrente da circulação do veículo seguro na Ré.

A admissão de que possa ocorrer, no processo casual que conduz ao acidente e subsequentes danos, concurso de culpa do lesado e do risco inerente à circulação de veículo automóvel não deve levar a que se considere sempre que ocorreu contributo deste segundo fator. Sendo embora a circulação automóvel uma atividade que não pode deixar de se afirmar como perigosa no sentido de que comporta riscos imanentes à velocidade e à massa dos veículos - sobretudo perante a fragilidade do corpo humano -, não pode, daí retirar-se que há sempre a possibilidade de se imputar todo e qualquer dano ao risco.[15]

Como se pode ler no sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-02-2024: “(a) admissibilidade da concorrência não é automática só porque o interveniente no acidente tenha sido um veículo, exigindo-se um juízo de adequação sobre a imputação objectiva do acidente.”[16] . Se assim fosse, aliás, não haveria nunca um acidente que envolvesse um automóvel em que não devesse imputar-se ao risco de circulação alguma quota de comparticipação para o resultado danoso.

O Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão de 31-05-2023[17] emana a seguinte proposta de critério para aferir se a culpa do lesado deve ou não excluir, no caso concreto, a imputação objetiva da responsabilidade decorrente do risco de circulação:

O artigo 505º do CCiv. admite, nomeadamente em face da salvaguarda do prescrito no art. 570º do CCiv., o concurso da imputação do acidente ao lesado com o risco próprio do veículo, desde que: (i) o risco especial de circulação seja um risco agravado de funcionamento deficiente e/ou imprevidente da máquina ou das especificidades de perigo da circulação em concreto, que justifique e torne plausível, numa lógica equilibrada e racional do regime legal para tutela do lesado, especialmente quanto este apenas evidencia uma negligência de reduzida censurabilidade (culpa leve ou levíssima) e de diminuta relevância causal para a produção ou agravamento dos danos sofridos pelo próprio, uma comparticipação da parte lesante que responde independentemente de culpa; (ii) haja uma contribuição desse risco do veículo para a ocorrência do sinistro gerador dos danos, mobilizando-se um juízo de adequação e proporcionalidade atendendo à intensidade desses riscos próprios da circulação do veículo e à sua concreta relevância causal para o acidente.”.

Ora, no caso, a conduta do Autor que já acima concluímos ter sido ilícita e culposa, é em termos de adequação a única causa do acidente. Como se viu a sua culpa é grave, revestindo a forma de negligência grosseira já que passou a ocupar o espaço livre à direita de veículo que circulava à sua frente procurando assim ultrapassá-lo sem que tivesse qualquer indício seguro de que o mesmo iria mudar de direção à esquerda. Ora, não ocorrendo tal mudança de direção o Autor, com a sua atitude, criou uma situação de perigo de colisão que a norma (Artigo 13º do Código da Estrada) que estava a ser cumprida pelo condutor do veículo automóvel ligeiro visa evitar quando impõe a circulação pela direita, mas “conservando das bermas ou passeios uma distância suficiente que permita evitar acidentes”. Foi este espaço de segurança que o Autor ocupou e, como tal, não podemos deixar de afirmar que foi esta sua conduta a causa única da colisão que veio a ocorrer.

Caso o mesmo não tivesse avançado a par do veículo seguro na Ré, tentando a sua ultrapassagem pela direita e para tanto ocupando o espaço livre ali existente - quando não tinha qualquer indício de que o mesmo iria virar à esquerda -, o acidente não teria ocorrido, não obstante o risco inerente à circulação do automóvel ligeiro. De facto, ainda que o condutor deste não tivesse virado à sua direita para estacionar e se tivesse apenas mantido a circular, na sua mão de trânsito, a ocupação do espaço livre à sua direita pelo motociclo do Autor levaria com grande probabilidade a um embate entre os dois veículos, já que um mero encurtamento da distância entre o lado direito do automóvel e a berma (por força de um desvio da trajetória daquele ou de alargamento da berma) potenciaria em muito a colisão, como, aliás, é frequente acontecer em filas de trânsito em que motociclos vão avançando por entre automóveis em marcha lenta, ora pela sua direita ora pela sua esquerda, sendo sempre impossível nessas circunstâncias aos demais condutores antecipar atempadamente uma ultrapassagem pela direita e deixar um espaço livre que permita que essa manobra, proibida, seja feita em segurança. Tal cuidado não é exigível e nem corresponde ao risco normal de circulação de um veículo o de vir a embater com motociclo ou outro veículo de pequena dimensão que, em ultrapassagem pela direita, ocupe o espaço de segurança que é deixado entre a faixa de rodagem e a berma com vista a evitar acidentes.

Idênticas ponderações que levam ao afastamento total da responsabilidade pelo risco vêm sendo feitas pelo Supremo Tribunal de Justiça em acórdãos como sejam dois dos já acima citados: o proferido em 27-02-2024 em que se excluiu a concorrência do risco para a produção do acidente em que a lesada, por excesso de velocidade veio a embater em veículo parado na berma de uma autoestrada em situação de emergência devidamente sinalizada concluindo-se pela não censurabilidade da conduta do respetivo condutor; e o proferido em 04-04-2024 em que se afastou, também, a concorrência do risco com a culpa do lesado quando este se tratava de peão que caminhava pela faixa de rodagem, embora tal estrada tivesse uma berma de 1, 50 metros de largura, quando foi colhido por veículo automóvel que ali circulava apesar deste não o ter avistado atempadamente e de não ter logrado desviar-se ou parar ante de o atingir.

Lopes do Rego [18] reconhecendo a tendência jurisprudencial, a seu ver consolidada, de admissão da concorrência da responsabilidade pelo risco com a culpa do lesado propõe-se também a enunciar os fatores ou critérios que permitem realizar uma concordância prática entre aqueles dois parâmetros o que tenta fazer “valorando e graduando a gravidade da culpa imputável ao lesado e simultaneamente procurando distinguir e dissociar, no que respeita aos riscos de circulação do veículo automóvel, o risco genérico inelutavelmente associado à circulação nas vias públicas de qualquer viatura automóvel e certos riscos específicos e agravados que possam ter contribuído para o sinistro[19]. Cumpre o seu anunciado propósito de enunciação de um critério com a seguinte conclusão: “Na verdade, nestes casos, de ocorrência de comportamentos temerários e claramente injustificáveis, a gravidade do nexo de imputação do acidente e dos danos ao próprio lesado acaba por descaracterizar os riscos normais de circulação do veículo, enquanto elemento potencialmente concorrente para a eclosão de sinistros: nestas situações, de comportamentos temerários, nalguns casos quase suicidários do lesado, verifica-se que é a conduta censurável da vítima que vai, em última análise despoletar um risco atípico e agravado de sinistralidade, que manifestamente se sobrepõe ao risco genérico de circulação de um qualquer veículo, com o escrupuloso cumprimento de todas as regras estradais pelo respetivo condutor.”.[20] Pelo contrário, conclui ainda, que não deve ser automaticamente afastada a concorrência do risco com ato do lesado quando estes seja apenas censurável a título de “culpa leve ou levíssima, nalgumas situações no limiar da desculpabilidade, bem como factos em bom rigor involuntários (…) ou cometidos por sujeitos inimputáveis, por isso insuscetíveis do juízo de censura em que se consubstancia a cula, de reduzida gravidade objetiva, que se entenda não deverem, por si sós, descaraterizar a relevância dos riscos típicos de circulação do veículo interveniente no acidente”.

Ora, no caso estamos claramente perante um ato ilícito do lesado que violou normas do Código da Estrada destinadas a evitar exatamente os sinistros como o que ocorreu e uma culpa muito grave sendo o seu comportamento censurável, por temerário. Foi esse comportamento a causa única do acidente não se justificando no caso a ponderação do contributo de qualquer risco de circulação do veículo seguro na Ré para a produção dos danos. Desde logo e também porque maior risco normal de circulação se verificava para o lesado do motociclo pelo mesmo conduzido, já que o facto de o seu condutor não estar protegido por habitáculo aumenta exponencialmente o risco de lesão corporal grave.

Pelo exposto, concluindo-se que a causa única do acidente foi a culpa do lesado, Autor, não pode imputar-se à Ré/Recorrente a responsabilidade de ressarcir os danos por ele sofridos e, como tal, deve improceder totalmente a ação sendo a mesma absolvida de todos os pedidos.

Com o que fica prejudicado o conhecimento da segunda questão a resolver acima enunciada.

V – Decisão:

Nestes termos julga-se procedente a apelação da Ré e improcedente a apelação, subordinada, do Autor e, em consequência, revoga-se a sentença jugando-se a ação totalmente improcedente e absolvendo a ré dos pedidos.

Custas da ação e do recurso pelo Autor nos termos do previsto no artigo 527º, número 1 do Código de Processo Civil.


Porto, 17-06-2024
Ana Olívia Loureiro
José Eusébio Almeida
Ana Paula Amorim [Voto vencido:
Ponderando os factos provados e não provados considero que os dois condutores de forma ilícita e culposa contribuíam para a produção do acidente, verificando-se um nexo de causalidade entre as respetivas condutas e os danos sofridos pelo autor.
O condutor do veículo segurado, porque violou as normas dos art, 3º/2, 11º/2 e 21º/1/2 do Código da Estrada, já que a ré seguradora não logrou provar os factos que alegou na contestação e que afastariam tal ilicitude, sendo seu o ónus da prova, por constituir matéria de exceção (art.º 342º/2 CC). Agiu de forma culposa, porque circulava desatento ao trânsito que se processava na via, em particular, na sua retaguarda, quando além do mais era noite e o motociclo circulava com as luzes ligadas, sendo certo que estava em condições e era exigível que conduzisse o veículo com observância dos preceitos legais indicados.
Em relação ao autor a sua conduta revela-se ilícita porque conduzia em contraordenação ao art.º 36º do Código da Estrada, não logrando provar os factos que configuram a exceção a tal regra e previstos no art.º 37º do Código da Estrada. A sua conduta é culposa porque efetuou uma manobra imprevidente sendo exigível que adotasse uma conduta distinta, já que não podia nas concretas circunstâncias ultrapassar pela direita.
Confirmaria a sentença quanto à repartição da responsabilidade (mesmo fazendo um juízo de culpa) e montante indemnizatórios arbitrados, pelo facto dos valores apurados se mostrarem compreendidos dentro dos valores atualmente praticados na jurisprudência de acordo com um juízo de equidade e respeitarem o critério legal (art.º 562º a 566º CC).]
________________
[1] Rui de Alarcão, Direito das Obrigações (com base nas lições ao 3º ano jurídico), Coimbra, 1983, página 241.
[2] Almeida Costa, Direito das Obrigações, almedina 7º edição, páginas 488 e 489.
[3] Das Obrigações em Geral, vol. I, 7ª ed., p. 578 a 581).
[4] Pires de Lima e A. Varela, Código Civil Anotado, vol. I, 4ª ed., p. 474
[5] Almeida Costa, Direito das Obrigações, almedina 7ª edição, página 506
[6] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Coimbra Editora, 4ª edição, página 518.
[7] Op. cit., página 517 onde se critica a opinião expressa por Vaz Serra, de sentido contráriom a RLJ ano 99, página 364, nota 1. Afirmam aqueles Autores perentóriamente: “Não há caso omisso. O caso está resolvido claramente na lei”
[8] Moitinho de Almeida, Seguro obrigatório automóvel : o direito português face à jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, na biblioteca do Supremo Tribunal de Justiça disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2022/09/moitinhoalmeida_seguroobrigatorio.pdf, página 2.
[9] CJ [2005] I-5745, processo C-537/03, disponível em:
https://milberg.pt/wp-content/uploads/sites/7/2021/09/27.-Aco%CC%81rda%CC%83o-Candolin.pdf
[10] Estudos sobre a Responsabilidade Civil, Coimbra, 1983, p. 248. onde o mesmo faz concretas “propostas de alteração aos artigos 503º a 508 do Código Civil (…) em torno de um seguro de acidentes de trabalho e de trânsito.”
[11] Também Brandão Proença, Ana Prata, Pereira Coelho, Sá Carneiro entre outros exaustivamente citados no Ac. Do Supremo Tribunal de Justiça de 04-10-2007, 07B1710, disponível em www.dgsi.pt
[12] Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 137, número 3946, setembro/outubro de 2007.
[13] Por exemplo no Acórdão desta Relação de 08-02-2018, processo 1091/15.5T8PVZ.P1 disponível em: https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/-/31083A29B829F1D2802582390043EDE6 em que se levanta “a questão de saber se no âmbito daquela sinistralidade não será de ponderar o risco, porque sempre presente, com presunção ilidível da respetiva causalidade”.
[14] A problemática da concorrência da responsabilidade objetiva, decorrente dos riscos de circulação do veículo, com a culpa do lesado, Julgar, número 46, páginas 33 a 67
[15] Neste sentido o recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04-04-2024 (processo 894/20.3T8BGC.G1.P1, disponível em: www.dgsi.pt
[16] Processo 313/18.5T8GMR.G1.S1, disponível em: www.dgsi.pt
[17] Processo 521/16.3T8VFR.P1.S1 disponível em www.dgsi.pt
[18] Op cit., páginas 33 a 67
[19] Op. cit, página 33.
[20] Op cit página 52.