Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | FÁTIMA ANDRADE | ||
Descritores: | CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS CLÁUSULA PENAL ABUSO DO DIREITO CONTRATO DE PRESTAÇÕES FRACIONADAS | ||
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Nº do Documento: | RP20250512538/23.1T8MCN.P1 | ||
Data do Acordão: | 05/12/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - Tem vindo a ser pacificamente aceite que nas causas de nulidade da sentença, previstas de forma taxativa no artigo 615º do CPC não se inclui quer os erros de julgamento da matéria de facto ou omissão da mesma, a serem reapreciados nos termos do artigo 662º do CPC, quando procedentes e pertinentes; quer o erro de julgamento derivado de errada subsunção dos factos ao direito ou mesmo de errada aplicação do direito. II - No que ao vício da falta ou insuficiência da fundamentação previsto na al. b) do nº 1 do artigo 615º do CPC concerne, vem sendo entendido que é a total omissão dos fundamentos de facto ou de direito que gera a nulidade da decisão por falta de fundamentação, não abrangendo a mesma eventuais deficiências de fundamentação. Sem prejuízo de vir ainda a ser defendido que também a fundamentação que é de tal forma deficiente que não permite ao destinatário da decisão judicial entender as razões de facto e de direito que justificam a decisão, é fundamento dessa mesma nulidade da decisão. III - Incumbe àquele que pretende se socorrer da aplicação do regime das CCG previsto no DL 446/85 a alegação e prova (nos termos do artigo 342º nº 1 do CC) de que a cláusula que pretende ver excluída do contrato singular foi pré-elaborada pelo predisponente e apresentada sem possibilidade de o seu conteúdo poder ser negociado. IV - Estipulando as partes contratualmente uma indemnização pelo incumprimento imputável à R. do acordado num montante correspondente a 20% do valor do café promessa de venda e ainda não adquirido no momento da resolução do contrato, entende-se estarmos perante uma cláusula penal de liquidação prévia do dano. Evitando futuros litígios quanto ao valor da indemnização devida pelo dano resultante da atuação do incumpridor. V - De entre os comportamentos típicos abusivos que justificam nos termos legais um juízo de censura a uma atuação que de outro modo seria considerada legítima temos o venire contra factum proprium. Em causa a tutela de confiança, apoiada na boa-fé e que ocorre perante quatro proposições, não cumulativas desde que a intensidade assumida pelas restantes seja tão impressiva que compense a falha: “- 1º uma situação de confiança, conforme com o sistema e traduzida na boa-fé subjetiva e ética, própria da pessoa que, sem violar os deveres de cuidado que ao caso caibam, ignore lesar posições alheias; - 2º uma justificação para essa confiança, expressa na presença de elementos objetivos capazes de, em abstrato, provocarem essa crença plausível; - 3º um investimento de confiança, consistente em, da parte do sujeito, ter havido um assentar efetivo de atividades jurídicas sobre a crença consubstanciada; 4º a imputação da situação de confiança criada à pessoa que vai ser atingida pela proteção dada ao confiante; tal pessoa por ação ou omissão, terá dado lugar à entrega do confiante em causa ou ao fator objetivo que a tanto conduziu.” VI - Os créditos resultantes de uma relação contratual, habitualmente denominada como contrato de fornecimento de café, cujo prazo de execução foi dilatado no tempo até à aquisição de uma definida quantidade de café, não provêm de prestações estabelecidas com caráter periodicamente renovável, antes fracionado. Consequentemente sendo-lhe aplicável o prazo de prescrição ordinário de 20 anos e não, o prazo previsto na al. g) do artigo 310º do CC. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo nº 538/23.1T8MCN.P1
3ª Secção Cível Relatora – M. Fátima Andrade Adjunta - José Nuno Duarte Adjunta – Ana Olívia Loureiro Tribunal de Origem do Recurso - Tribunal Judicial da Comarca de Porto Este – Jz. Local Cível de Marco de Canavezes Apelantes/ AA e BB
Sumário (artigo 663º n.º 7 do CPC). ……………………………… ……………………………… ………………………………
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I- Relatório “A..., S.A.” instaurou (em 21/04/2023) a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra AA e BB, peticionando pela procedência da ação a condenação dos RR. nos seguintes termos: “a) Seja reconhecida a resolução do contrato, e consequentemente os Réus condenados a: b) Pagar o montante indemnizatório de [(2.000 – 380) x €18,40 x 20% = € 5.961,60; c) Proceder ao pagamento do valor em aberto em conta corrente, correspondente ao fornecimento de bens melhor descritos nas faturas com os números ..., de 16.09.2004, no valor de € 77,22; fatura número ..., de 12.10.2004, no valor de € 27,30 e fatura número ..., de 5.11.2004, no valor de € 184,46, no valor global de € 288,98, acrescido de juros comerciais apurados desde a data do seu vencimento até ao presente e que ascendem a € 380,69; d) No montante global de (€ 5.961,60 + (€ 288,98 + € 380,69) =) € 6.631,27, acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação até efetivo e integral pagamento.”
Para tanto alegou em suma ter celebrado no exercício da sua atividade comercial de venda por grosso de cafés, bebidas espirituosas e outros produtos, um contrato denominado de “Contrato de Comércio”, nos termos do qual a A. prometeu vender café aos iniciais outorgantes no contrato identificados, com destino ao seu estabelecimento comercial café, nas condições também ali definidas; bem como vendeu os equipamentos igualmente descritos no contrato aludido, nos termos igualmente descritos no contrato. A posição contratual dos iniciais outorgantes foi cedida aos ora RR. por contrato de cessão da posição contratual celebrado em 2003, os quais assumiram a posição contratual daqueles, mantendo-se as obrigações resultantes desse mesmo contrato para os ora RR. Desde 2005 os RR. não mais compraram café à ora autora, tendo entre setembro de 2001 e setembro de 2005 sido comprados 380 kilos de café dos 2.000 prometidos na compra. Por carta de 27/01/2006 a A. comunicou aos ora RR. a resolução contratual, mais solicitando a regularização das quantias ali reclamadas. Em 21/08/2006 mais tendo reclamado o pagamento dos valores então em aberto na conta corrente de cliente correspondente ao fornecimento de bens melhor descritos nas faturas com os números ..., de 16.09.2004, no valor de 77,22; fatura número ..., de 12.10.2004, no valor de € 27,30 e fatura número ..., de 5.11.2004, no valor de € 184,46, acrescido de juros comerciais apurados desde a data do seu vencimento até àquela data. O que os RR. não cumpriram. Termos em que terminou peticionando a condenação dos RR. nos termos acima indicados.
Citados os RR., contestaram, por impugnação e por exceção, tendo em suma invocado: - a nulidade do contrato inicial e do contrato de cessão, por violação dos deveres de comunicação e informação previstos nos artigos 5º e 6º do DL 446/85; - erro nos pressupostos e na formação da vontade dos RR. aquando da celebração do contrato de “cessão” em causa, com a sua consequente anulabilidade; - nulidade da cláusula penal prevista no contrato inicial (cláusula 9ª) e no contrato de cessão (cláusula 5ª), nos termos do artigo 19º al. c) do DL 446/85; - abuso de direito quanto à pretensão formulada pela autora decorrente de uma ilegítima resolução contratual, atento a aceitação da mesma durante anos do consumo de café inferior ao contratado, quer pelos iniciais outorgantes quer pelos RR. até ao encerramento do estabelecimento. Altura em que a A. procedeu ao levantamento dos equipamentos vendidos e a que se referem as cláusulas 4 do contrato inicial e 2 do contrato de cessão; - as cartas de resolução não foram rececionadas pelos RR. - prescrição dos montantes peticionados, nos termos da al. g) do artigo 310º do CC; No mais, tendo ainda os RR. impugnado o alegado de 1º a 13º da p.i. por não corresponder à verdade, bem como todos os documentos juntos na p.i. quanto ao alcance, conteúdo e efeitos e data que a A. lhes confere. Termos em que concluíram “deve a ação ser julgada improcedente, por não provada, e devem ser julgadas procedentes, por provadas, as exceções deduzidas em A) a D), supra; ser a Autora condenada a ver isso declarado e reconhecido, e, a final, os Réus absolvidos dos pedidos formulados.” Apresentou a A. resposta às exceções aduzidas pelos RR. na sua contestação, na sequência de convite para tanto. Impugnando o alegado, tendo em suma concluído pela sua total improcedência e no mais, como na p.i..
Agendada audiência prévia, foi neste proferido despacho saneador, relegando para final o conhecimento da exceção de prescrição. Bem como foi identificado o objeto do litígio e elencados os temas da prova. Agendado julgamento, procedeu-se oportunamente à sua realização. Após tendo sido proferida sentença e decidido: “a) Declaro resolvido o contrato intitulado “Cessão da Posição Contratual no Contrato de Comércio ...”, em que foi aposta a data de 20 de fevereiro de 2003; b) Condeno o Réus a pagar à Autora o montante indemnizatório de €5.336,28 (cinco mil, trezentos e trinta e seis euros e vinte e oito cêntimos), acrescido de juros de mora à taxa legal em vigor para transações comerciais, que nesta data perfazem a quantia de €461,41 (quatrocentos e sessenta e um euros e quarenta e um cêntimos), e dos que se vencerem, às taxas sucessivamente em vigor, sobre o capital de €5.336,28 (cinco mil, trezentos e trinta e seis euros e vinte e oito cêntimos), até integral pagamento; b) Condeno o Réus a pagar à Autora o valor em aberto em conta corrente, no valor global de €288,98 (duzentos e oitenta e oito euros e noventa e oito cêntimos), acrescido de juros de mora à taxa legal em vigor para transações comerciais, que nesta data perfazem a quantia de €129,93 (cento e vinte e nove euros e noventa e três cêntimos), e dos que se vencerem, às taxas sucessivamente em vigor, sobre o capital de €288,98 (duzentos e oitenta e oito euros e noventa e oito cêntimos), até integral pagamento.” *** Do assim decidido apelaram os RR., oferecendo alegações e formulando as seguintes conclusões (que em parte se resumem): “CONCLUSÕES (…) * Não se mostram apresentadas contra-alegações. *** O recurso foi admitido pelo tribunal a quo como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo. * Foram colhidos os vistos legais. *** II- Âmbito do recurso. Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC – resulta das formuladas pelos apelantes serem questões a apreciar: a) Nulidade da decisão recorrida – artigo 615º nº 1 al. b) do CPC; b) Erro na decisão de facto – em causa os pontos da matéria de facto 4º a 11º, 14º a 16º, 22º, 29º e 44º dos factos provados e al. jj) dos factos não provados. c) Erro na decisão de direito. * *** III- Fundamentação Foram julgados provados os seguintes factos: “1. Mostra-se assinado pela Autora A..., SA (designada PO) e CC e DD (designados SO), documento particular denominado “Contrato de Comércio com o número ...”, em que foi aposta a data de 3 de setembro de 2001 (Cfr. Documento 01 junto com a petição inicial que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos). 2. De tal documento constam, além de outras, as seguintes cláusulas: “01-1. Mostra-se assinado pela Autora A..., SA (designada PO) e CC e DD (designados SO), documento particular denominado “Contrato de Comércio com o número ...”, em que foi aposta a data de 3 de setembro de 2001 (Cfr. Documento 01 junto com a petição inicial que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos). 2. De tal documento constam, além de outras, as seguintes cláusulas: “01- A PO promete vender aos SO, com destino ao seu estabelecimento comercial identificado supra, dois mil (2.000) quilos de café ..., lote ..., em frações mínimas mensais de trinta (30) quilos, aos preços de tabela às datas das vendas efetivas, sendo o seu preço atual de três mil duzentos e cinquenta escudos (3.250$00) por quilo, “02 – E conceder-lhes um desconto / bonificação de um milhão trinta e dois mil oitocentos e setenta e seis escudos (1.032.876$00) quando, cumulativamente, a quantidade de café referida em um se mostrar integralmente adquirida e paga – a regularizar, porém, anualmente, em função direta e proporcionada dos quantitativos de café adquiridos e pagos em cada ano sempre sem prejuízo do estabelecido no número nove, a propósito de resolução/anulação do contrato; (…) “04 – A PO vende aos SO – no estado físico de novos, em perfeitas condições de funcionamento e sem vícios aparentes – os bens mencionados na fatura ..., de 03 de setembro de 2001, no valor global de um milhão trinta e dois mil oitocentos e setenta e seis escudos (1.032.876$00) – da qual se junta cópia e cujo teor aqui fica dado por integralmente reproduzido para todos os efeitos – reservando para si a propriedade dos mesmos até integral pagamento do preço; “05 – A obrigação de pagamento do preço será cumprida por via da compensação com as quantias que venham a ser anualmente liquidadas a favor dos SO a título de desconto/bonificação conforme se acordou no número dois; (…) “07 – Ocorrendo alienação ou cessão do estabelecimento comercial dos SO, onerosa ou gratuitamente, os quantitativos de café comprados e pagos pelo adquirente/cessionário, com destino a tal estabelecimento, em conformidade com o ora acordado – e que não derivem, por conseguinte, de contrato de café autónomo com este celebrado – ter-se-ão por adquiridos pelos mesmos SO para efeito de cumprimento do contrato, ficando estes bem cientes de que lhes serão sempre imputáveis, em tal caso, a falta de aquisição e pagamento de cafés nos termos cordados no número um; “08 – A validade da cessação contratual da posição dos SO neste contrato dependerão sempre do consentimento expresso da PO – a prestar necessariamente por escrito; “09 – Se os SO, seguida ou interpoladamente, não adquirirem café durante dois meses, ou não efetuarem, em dois trimestres, um mínimo trimestral de compras de noventa (90) quilos de café – ou não pagarem duas quaisquer faturas vencidas, no prazo máximo de oito dias, a contar dos seus vencimentos – e sendo-lhes tais factos imputáveis – poderá a PO resolver/anular este contrato e, consequentemente, reclamar-lhes indemnização em montante correspondente a vinte por cento (20%) do valor do café promessa de venda e ainda não adquirido; pagamento imediato dos bens e equipamentos vendidos, ou à sua restituição, conforme melhor aprouver à PO. Os SO poderão também resolver/anular o contrato em caso de incumprimento culposo do mesmo por parte do PO; “14 – Os SO prometem comprar os cafés identificados em um e compram os bens mencionados em quatro, tudo em rigorosa conformidade exarado em todas as cláusulas antecedentes.” 3. Mostra-se assinado por CC e DD (designados PO), pelos Réus AA e BB (designados SO) e por A..., SA (designada ...) documento particular denominado “Cessão da Posição Contratual no Contrato de Comércio ...”, em que foi aposta a data de 20 de fevereiro de 2003 (Cfr. Documento 02 junto com a petição inicial que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos). 4. De tal documento constam as seguintes cláusulas: “01 – Os PO transmitiram o seu estabelecimento comercial sito na Rua ... – ... – Marco de Canaveses, aos SO em __/__/__. “02 – Cedendo-lhes, por via disso, a sua posição contratual naquele contrato ..., de que se anexa cópia cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, celebrado com a ... a 03 de setembro de 2001, apenso a esta contrato, devendo os cessionários continuar a cumprir os deveres e obrigações, em tal estabelecimento, que a eles, cedentes, competiam, entre os quais se inclui o dever de pagamento dos bens referidos na cláusula 04 do Contrato Principal; “03 – Os SO aceitam, a presente cessão, nos termos exarados, declarando ter recebido dos PO cedentes os bens referidos na cláusula antecedente; “04 – Declaram os SO que os teores integrais desta cessão e do contrato principal, lhe foram comunicados com cerca de oito dias de antecedência em relação à data da celebração desta cessão, e explicado devidamente todo o seu clausulado, com tudo se conformando, por verificarem corresponder às suas manifestações de vontade, pelo que o ratificam e vão assinar sem reservas quaisquer; “05 – O ... consente na presente cessão, sob condição de a transmissão referida em 01 ter efetivamente ocorrido, sendo nula tal cessão em caso de ineficácia ou inexistência do título dessa transmissão;” 5. De setembro de 2001 a setembro de 2005, foram comprados 380 quilos de café. 6. No dia 27 de janeiro de 2006 foram enviadas cartas aos Réus das quais consta: 7. No dia 21 de agosto de 2006 foi enviada outra carta aos Réus da qual consta: 8. As cartas referidas em 7 e 8 não foram recebidas pelos Réus. 9. Dada a necessidade de reposição dos quantitativos contratualmente previstos foram os Réus alertados, por várias vezes, pelos comerciais da Autora que com frequência os visitavam. 10. Em setembro de 2005, o valor quilo, em tabela, do café prometido comprar pelos Réus ascendia, pelo menos, a €16,47. 11. O material vendido foi devolvido. 12. Tendo sido pela Autora levantados e levados para as suas instalações os bens de equipamento vendidos. 13. Os Réus foram citados para os termos da presente ação, em 05-07-2023 e 13-09-2023, respetivamente.”
Julgou ainda o tribunal a quo não provados os seguintes factos: “Factos Não Provados: 1. Os Réus desde, pelo menos, setembro de 2005, compraram café à ora Autora. 2. O conteúdo do “contrato principal” e do contrato “de cessão”, juntos pela Autora sob documentos 1 e 2 foram entregues aos contestantes previamente elaborados e com todo o seu clausulado. 3. Os Réus não foram informados dos seus clausulados nem eles lhes foram explicados, designadamente no que diz respeito à cláusula penal. 4. Aos Réus não foi facultada, em 20-02-2003, qualquer cópia do contrato de fornecimento celebrado entre a A. e o D… do “contrato principal” e do contrato “de cessão”, juntos pela Autora sob documentos 1 e 2. 5. Os Réus assinaram o acordo de “cessão”, sem o terem lido. 6. Outorgaram o aludido contrato, sob grande pressão do colaborador da empresa vendedora, que dizia sempre para não se preocuparem, que o contrato era uma mera formalidade, pois, a empresa queria era vender café. 7. Nunca os Réus tiveram conhecimento ou lhes foi entregue a tabela junta com a petição inicial. 8. Os Réus ficaram convencidos que apenas tinham de comprar café à Autora e esta como contrapartida emprestava-lhes o referido equipamento, que seria devolvido quando deixassem de comprar café. 9. Se os Réus tivessem tido conhecimento das cláusulas dos contratos, nunca os teriam assinado, sobretudo nas quantidades de café a adquirir e nas cláusulas indemnizatórias, bem como na assunção de tais responsabilidades no contrato de “cessão”. 10. Os Réus apenas tomaram conhecimento do teor das cláusulas indemnizatórias nas datas em que foram citados para os termos da presente ação, em 04-07-2023 e 11-09-2023, respetivamente. 11. O estabelecimento que era explorado pelos Réus encerrou. 12. A Autora sempre esteve ciente de que seria impossível para os primitivos contratantes e, depois, para os Réus, adquirirem o café nas quantidades acordadas, em face do estabelecimento se situar numa zona de Marco de Canaveses onde existiam e funcionavam vários estabelecimentos de café, snack bar e restaurantes, em ambiente de grande concorrência entre si, havendo pouco movimento de clientela para consumir o café contratado. 13. Os Réus deram conhecimento verbal à Autora, na pessoa do respetivo vendedor, que tinham interrompido a aquisição de café por terem sido obrigados a encerrar o seu estabelecimento comercial, por motivo de falta de clientes que lhes permitissem sustentar as simples despesas correntes do negócio. 14. Os representantes da Autora visitaram previamente os primitivos contraentes e acordaram as condições comerciais em que ambas as partes estavam dispostas a celebrar contrato. 15. Os primitivos contraentes puderam determinar os quantitativos mínimos mensais estipulados no contrato, atendendo ao seu volume de negócio e às expectativas comerciais que pretendia atingir. 16. O contrato referido em 3 e 4 dos factos provados foi cuidadosamente discutido com o Réu e apenas foi elaborado após a negociação dos seus termos. 17. Os representantes da Autora visitaram previamente a Ré e acordaram as condições comerciais em que ambas as partes estavam dispostas a celebrar contrato.” * *** Conhecendo. A) Cumpre em primeiro lugar, apreciar a invocada nulidade da sentença recorrida, por referência ao disposto no artigo 615º nº 1 al. b) do CPC. Tem vindo a ser pacificamente aceite que as causas de nulidade da sentença, previstas de forma taxativa no artigo 615º do CPC[1], respeitam a vícios formais decorrentes “de erro de atividade ou de procedimento (error in procedendo) respeitante à disciplina legal e que se mostrem obstativos de qualquer pronunciamento de mérito”[2], pelo que nas mesmas não se inclui quer os erros de julgamento da matéria de facto ou omissão da mesma, a serem reapreciados nos termos do artigo 662º do CPC, quando procedentes e pertinentes, quer o erro de julgamento derivado de errada subsunção dos factos ao direito ou mesmo de errada aplicação do direito[3]. No que ao vício da falta ou insuficiência da fundamentação previsto na al. b) do nº 1 do artigo 615º do CPC concerne, vem sendo entendido que é a total omissão dos fundamentos de facto ou de direito que gera a nulidade da decisão por falta de fundamentação, não abrangendo a mesma eventuais deficiências de fundamentação. Sem prejuízo de vir ainda a ser defendido que também a fundamentação que é de tal forma deficiente que não permite ao destinatário da decisão judicial entender as razões de facto e de direito que justificam a decisão, é fundamento dessa mesma nulidade da decisão[4]. Atento este conceito, no confronto com a decisão recorrida, resulta claro que a mesma não carece de qualquer falta de fundamentação, porquanto o tribunal a quo apreciou a prova produzida e justificou a formação da sua convicção de forma concreta, clara e fundamentada. Se o decidido merece censura, é questão que se prende com o mérito da decisão. Mas o invocado vício da falta de fundamentação previsto na al. b) do nº 1 do artigo 615º do CPC não se verifica.
B) Em segundo lugar, será apreciada se merece procedência a censura apontada pelos RR. à decisão de facto – seja por erro de julgamento, seja por omissão de factos que estes entendem dever ser aditados à decisão de facto.
Na reapreciação da decisão de facto e estando em causa a impugnação da matéria de facto, obrigatoriamente e sob pena de rejeição deve o recorrente especificar (vide artigo 640º n.º 1 do CPC): “a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”. No caso de prova gravada, incumbindo ainda ao recorrente [vide n.º 2 al. a) deste artigo 640º] “sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”. Sendo ainda ónus do recorrente apresentar a sua alegação e concluir de forma sintética pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – artigo 639º n.º 1 do CPC - na certeza de que as conclusões têm a função de delimitar o objeto do recurso conforme se extrai do n.º 3 do artigo 635º do CPC. Pelo que das conclusões é exigível que no mínimo das mesmas conste de forma clara quais os pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados, sob pena de rejeição do mesmo. Podendo os demais requisitos serem extraídos do corpo alegatório.
Por outro lado, e no que à concreta reapreciação da matéria de facto respeita – vide nº 1 do artigo 662º do CPC - a modificação da decisão de facto é um dever para a Relação, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou a junção de documento superveniente impuserem diversa decisão. Cabendo ao tribunal da Relação formar a sua própria convicção mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou que se mostrem acessíveis. Sem prejuízo de e quanto aos factos não objeto de impugnação, dever o tribunal de recurso sanar mesmo oficiosamente e quando para tal tenha todos os elementos, vícios de deficiência, obscuridade ou contradição da factualidade enunciada, tal como decorre do disposto no artigo 662º n.º 2 al. c) do CPC. Ressalvadas as situações de conhecimento oficioso que impõem ao tribunal da Relação, perante a violação de normas imperativas, proceder a modificações na matéria de facto, estão, portanto, estas dependentes da iniciativa da parte interessada, tal como resulta deste citado artigo 640º do CPC. Motivo por que e tal como refere António S. Geraldes in “Recursos no Novo Código do Processo Civil, 2ª ed. 2014, em anotação ao artigo 662º do CPC, p. 238 “à Relação não é exigido que, de motu próprio, se confronte com a generalidade dos meios de prova que estão sujeitos à livre apreciação e que, ao abrigo desse princípio, foram valorados pelo tribunal de 1ª instância, para deles extrair, como de se tratasse de um novo julgamento, uma decisão inteiramente nova. Pelo contrário, as modificações a operar devem respeitar em primeiro lugar o que o recorrente, no exercício do seu direito de impugnação da decisão de facto, indicou nas respetivas alegações que servem para circunscrever o objeto do recurso. Assim o determina o princípio do dispositivo (…)”. Nesta reapreciação tendo ainda presente que o princípio da livre apreciação das provas continua a ser a base, nomeadamente quando em causa estão documentos sem valor probatório pleno; relatórios periciais; depoimentos das testemunhas e declarações de parte [vide art.os 341º. a 396º. do Código Civil (C.C.) e 607.º, n.os 4 e 5 e ainda 466.º, n.º 3 (quanto às declarações de parte) do C.P.C.]. Cabendo ao tribunal da Relação formar a sua própria convicção mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou que se mostrem acessíveis, fazendo ainda[5]: - uso de presunções judiciais – “ilações que a lei ou julgador tira de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido” (vide artigo 349º do CC), sem prejuízo do disposto no artigo 351º do CC, enquanto mecanismo valorativo de outros meios de prova; - ou extraindo de factos apurados presunções legais impostas pelas regras da experiência em conformidade com o disposto no artigo 607º n.º 4 última parte (aqui sem que possa contrariar outros factos não objeto de impugnação e considerados como provados pela 1ª instância); - levando em consideração, sem dependência da iniciativa da parte, os factos admitidos por acordo, os provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito por força do disposto no artigo 607º n.º 4 do CPC (norma que define as regras de elaboração da sentença) ex vi artigo 663º do CPC (norma que define as regras de elaboração do Acórdão e que para o disposto nos artigos 607º a 612º do CPC remete, na parte aplicável). Por fim de realçar que embora não exigida na formação da convicção do julgador uma certeza absoluta, por via de regra não alcançável, quanto à ocorrência dos factos que aprecia, é necessário que da análise conjugada da prova produzida e da compatibilização da matéria de facto adquirida, extraindo dos factos apurados as presunções impostas por lei ou por regras da experiência (vide artigo 607º nº 4 do CPC) se forme no espírito do julgador a convicção de que com muito elevado grau de probabilidade os factos em análise ocorreram. * Analisadas as alegações e respetivas conclusões, verifica-se terem os recorrentes observado os ónus de impugnação e especificação sobre si incidentes e exigidos pelo legislador. Assim, identificaram os recorrentes os meios probatórios que impõem a seu ver decisão diversa para os pontos por si impugnados, nomeadamente as declarações de parte dos próprios RR. – sobre as quais observaram o ónus exigido pelo artigo 640º nº 2 al. a) do CPC; reconhecendo nenhuma valia terem tido os depoimentos das testemunhas oferecidas por si mesmos RR. e afirmando quanto ao depoimento da (única) testemunha da A. ouvida em audiência de julgamento, pouco ou nenhum relevo assumir, por à data dos factos não ser funcionário da autora. Depoimento sobre o qual nenhuma referência adicional fizeram. Afirmaram ainda os recorrentes que tais depoimentos conjugados com a demais prova produzida – documental (sem especificar qual) e pericial (que não existiu), deveria conduzir à alteração da decisão de facto, nos termos pelos mesmos pugnados. Entendem-se, nestes termos, observados os requisitos mínimos exigidos para a reapreciação da prova, pelo que cumpre proceder à mesma, sem prejuízo das reservas que infra se indicarão.
Consigna-se ter-se procedido à audição da prova gravada. * *** Expostos os pressupostos em que a reapreciação da decisão de facto tem de ser efetuada, relembramos a matéria que os recorrentes indicaram concretamente como alvo da crítica apontada à decisão de facto – em causa os pontos de facto vertidos nos artigos: “1º, 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º, 13º, 16º, 23º e 31º da contestação (vide nºs 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10 e 12 da Decisão proferida sobre a matéria de facto - factos não provados), e ainda não emitindo qualquer pronúncia quanto aos factos vertidos nos artigos 28.º, 29.º 30.º, 32.º, 33.º, 34.º, 35.º e 39.º, também da contestação” [vide conclusão 37ª, em repetição do já antes expresso de forma idêntica nas conclusões 9ª a 11ª, 25ª, 35ª e 36ª e reiterado na conclusão 38ª]. Na conclusão 37ª, indicando como conclusão da impugnação aduzida, qual a matéria que no seu entender deveria ser alterada/aditada ao elenco dos factos provados [seja por alteração de factos não provados para provados, seja por suprimento de omissão de factos que entendem ser de aditar], nos seguintes termos[6]: «i. o conteúdo do “contrato principal” e do contrato “de cessão”, juntos pela Autora sob documentos 1 e 2, não foram negociados entre Autora e Réus, tendo sido entregues aos contestantes previamente elaborados e com todo o seu clausulado (artigo 1º da contestação e facto não provado 2 da decisão recorrida); ii. os Réus não foram informados dos seus clausulados nem eles lhes foram explicados, designadamente no que diz respeito à cláusula penal” (artigo 2º da contestação e facto não provado 3 da decisão recorrida); iii. aos Réus não foi facultada, em 20-02-2003, qualquer cópia do contrato de fornecimento celebrado entre a A. e o D… do “contrato principal” e do contrato “de cessão”, juntos pela Autora sob documentos 1 e 2 (artigo 3º da contestação e facto não provado 4 da decisão recorrida); iv. os Réus assinaram o acordo de “cessão” referido, sem o terem lido, não lhes tendo sido informado que teriam que pagar as indemnizações previstas no mesmo, nem sequer se tendo apercebido da sua existência (artigo 4º da contestação e facto não provado 5 da decisão recorrida – apenas quanto ao 1º segmento até “sem o terem lido”); v. os Réus outorgaram o aludido contrato, sob grande pressão do colaborador da empresa vendedora, que dizia sempre para não se preocuparem,([7]) que o contrato era uma mera formalidade, pois a empresa queria era vender café (artigo 5º da contestação e facto não provado 6 da decisão recorrida); vi. nunca os Réus tiveram conhecimento ou lhes foi entregue a tabela junta com a petição inicial (artigo 6º da contestação e facto não provado 7 da decisão recorrida); vii. os réus ficaram convencidos que apenas tinham de comprar café à Autora e esta como contrapartida emprestava-lhes o referido equipamento, que seria devolvido quando os réus deixassem de comprar café (artigo 7º da contestação e facto não provado 8 da decisão recorrida); viii. jamais lhes foi dito, em circunstância alguma, que teriam de adquirir as quantidades de café referidas nas cláusulas 01 e 02 do contrato “inicial” e pagar as indemnizações previstas na cláusula 09 do mesmo contrato, e que o contrato de “cessão” remetia na cláusula 02 para tais obrigações (corresponde esta matéria ao alegado no artigo 8º da contestação o qual não foi indicado como fazendo parte do objeto de recurso, quer nas conclusões quer no corpo alegatório); ix. os Réus nem se aperceberam da sua existência [não tem este ponto factual correspondência ao alegado no articulado de contestação, constituindo como tal um facto novo]; x. as cláusulas dos contratos foram previamente elaboradas pela Autora e não foram negociadas pelas partes (corresponde esta matéria ao alegado no artigo 10º da contestação, o qual não foi indicado como fazendo parte do objeto do recurso quer nas conclusões quer no corpo alegatório, sem prejuízo da sua alegação corresponder ao alegado em 1º da contestação e indicado supra em i); xi. se os Réus tivessem tido conhecimento das acima identificadas cláusulas dos contratos, nunca os teriam assinado, sobretudo nas quantidades de café a adquirir e nas cláusulas indemnizatórias, bem como na assunção de tais responsabilidades no contrato de “cessão” (artigo 13º da contestação e facto não provado 9 da decisão recorrida), xii. sentindo-se os Réus enganados, pois confiaram no vendedor da Autora (artigo 13º da contestação, última parte sem correspondência nos factos provados); xiii. os Réus apenas tomaram conhecimento do teor das cláusulas indemnizatórias nas datas em que foram citados para os termos da presente ação, em 04-07-2023 e 11-09-2023, respetivamente (artigo 16º da contestação e facto não provado 10 da decisão recorrida); xiv. o material vendido foi devolvido e não foram fornecidos mais quilos de café (artigo 21º da contestação o qual não foi indicado como fazendo parte do objeto de recurso, quer nas conclusões quer no corpo alegatório); xv. o estabelecimento que era explorado pelos Réus foi trespassado, por motivos alheios aos mesmos, ligados à circunstância de não ter dado o lucro esperado (o alegado neste ponto factual corresponde ao artigo 23º da contestação, com alteração do então alegado “encerramento” do estabelecimento para “trespassado” e corresponde em parte ao facto não provado 11 da decisão recorrida); xvi. a Autora sempre esteve ciente de que seria impossível para aqueles e, depois, para os Réus, adquirirem o café nas quantidades acordadas, em face do estabelecimento se situar numa zona de Marco de Canaveses onde existiam e funcionavam vários estabelecimentos de café, snack bar e restaurantes, em ambiente de grande concorrência entre si, havendo pouco movimento de clientela para consumir o café contratado (artigo 31º da contestação e facto não provado 12 da decisão recorrida); xvii. se tivessem sido adquiridos os 90 kg por trimestre, então os 2.000 kg teriam sido atingidos ao fim de 5 anos e meio (artigo 32º da contestação que os recorrentes pretendem ver aditado à decisão de facto, como facto provado); durante pelo menos 4 anos (de setembro de 2001 a setembro de 2005) a Autora conformou-se com tal impossibilidade e continuava a oferecer o café estritamente consumido, em quantidades muito inferiores, da mesma qualidade (artigo 33º da contestação que os recorrentes pretendem ver aditado à decisão de facto, como facto provado); xviii. tal ocorreu porque a Autora o foi permitindo numa atitude de aceitação, transigindo totalmente com tal situação, não procedendo à resolução do contrato alegadamente violado, trimestralmente, durante mais de 48 meses (artigo 34º da contestação que os recorrentes pretendem ver aditado à decisão de facto, como facto provado); xix. durante todo o tempo por que perdurou a vigência do contrato, sempre os réus e CC e marido, DD, que os antecederam, com conhecimento da Autora, nunca lhe compraram as quantias mínimas previstas no contrato (artigo 35º da contestação que os recorrentes pretendem ver aditado à decisão de facto, como facto provado); xx. cerca do último trimestre do ano de 2005, os Réus deixaram de adquirir café, tendo interrompido a aquisição de café, por terem sido obrigados a trespassar o estabelecimento comercial onde revendiam o café fornecido pela autora, por motivo de falta de clientes que lhes permitissem sustentar as simples despesas correntes do negócio (artigo 36º da contestação – com alteração do encerrar para trespassar – que os recorrentes pretendem ver aditado à decisão de facto, como facto provado, em complemento do que vinha não provado em 11 dos factos não provados que também pugnaram fosse julgado provado); xxi. deram conhecimento verbal destes factos à Autora, na pessoa do respetivo vendedor, tendo sido pela Autora levantados e levados para as suas instalações os bens de equipamento vendidos, a que se refere a Cláusula 04 do “contrato principal” e a Cláusula 02 do contrato “de cessão” (artigo 37º da contestação que os recorrentes pretendem ver aditado à decisão de facto, como facto provado); xxii. não obstante, a Autora optou por remeter as cartas datas de 27-01-2006 e 21-08-2006, mais de 4 anos sobre a data em que o contrato teve início da sua vigência (artigo 38º da contestação o qual não foi indicado como fazendo parte do objeto de recurso, quer nas conclusões quer no corpo alegatório); xxiii. esta atitude da Autora que, desde o início do contrato, soube que os Réus e o casal que os antecedeu na exploração do estabelecimento nunca compraram a quantidade de café a que se obrigaram, criou razoavelmente nos Réus, o convencimento que a violação não era suficientemente grave para justificar a resolução do contrato, sedimentando neles uma expectativa legítima de que não seria resolvido o contrato (artigo 39º da contestação que os recorrentes pretendem ver aditado à decisão de facto, como facto provado)”. * Tendo presente a matéria que os recorrentes pretendem ver alterada e ou aditada – sem prejuízo do que acima se assinalou quanto a pontos da matéria de facto que são indicados, sem que correspondam diretamente a pontos factuais indicados como impugnados no objeto do recurso (caso dos pontos viii, x, xiv e xxii); bem como quanto a matéria de facto não alegada sequer no articulado, constituindo assim matéria de facto nova que como tal não pode ser considerada (caso do ponto ix); ou matéria de facto alegada, mas a que os recorrentes apontam uma nova redação, corrigindo a mesma (caso dos pontos xv e xx) – no confronto com a prova produzida [e sem aqui se fazer ainda uma análise quanto aos pontos assinalados que contêm juízos de direito ou são conclusivos, ou ainda para o mérito da decisão não relevam], analisemos a impugnação aduzida. Da prova produzida, como acima já deixámos mencionado, os próprios recorrentes reconheceram que as testemunhas pelos mesmos presentes a juízo nada sabiam sobre os termos dos contratos celebrados, sua celebração, execução e (in)cumprimento. O mesmo é dizer que para a apreciação do mérito da causa, nada contribuíram com os seus depoimentos, por nós ouvidos, confirmando esta mesma inutilidade. Motivo por que e no que concerne à prova produzida a ponderar, para além da prova documental oferecida aos autos, resta o depoimento da testemunha da autora EE e as declarações de parte dos RR.. A testemunha EE – inspetor de vendas - nenhuma intervenção direta teve nos factos em discussão nos autos, uma vez que à data ainda não era funcionário da autora. Tal como o declarou, começou esta testemunha a trabalhar para a autora em outubro de 2015 (quase há 9 anos contados à data em que prestou o depoimento), sendo que os factos em questão se reportam já aos anos de 2003 (data em que foi celebrado o contrato em causa nos autos de cessão da posição contratual de contrato inicialmente celebrado em 2001) até 2006 data em que aos RR., por alegadamente terem deixado de adquirir café, foram enviadas cartas de interpelação pela A. ao pagamento de valores em dívida por fornecimentos e valores indemnizatórios, na sequência da comunicação do “fim do contrato” – vide fp 6 e 7. A testemunha quanto a estes factos, depôs, pois, em função do que é a prática da empresa na celebração dos contratos, nomeadamente e na prospeção de mercado, abordando potenciais clientes a quem, em função das necessidades que previamente tentam analisar, apresentam propostas que entendam vantajosas tanto para a empresa como para o potencial cliente. Cliente que, mais afirmou, analisa essas mesmas propostas, depois decidindo se aceita ou não. Na negociação entrando como fatores a ponderar não só o café, como benefícios adicionais em face da expetativa de venda de café, sendo o preço do café e respetivas contrapartidas calculados pelo departamento comercial, de acordo com as expetativas do negócio a celebrar. O depoimento desta testemunha foi prestado de forma serena, coerente e justificativa, emprestando ao mesmo credibilidade. Das suas declarações resultou evidenciado conhecimento quanto ao normal modo de agir da empresa, desde logo por ser responsável comercial com a área geográfica do norte, coordenando uma equipa comercial, bem como evidenciado o seu conhecimento por consulta dos registos informáticos quanto à documentação atinente ao contrato em causa, consulta que lhe permitiu analisar os documentos relativos a este mesmo contrato - seja o contrato inicial, seja o contrato de cessão, seja ainda a tabela que corresponde ao doc. 3 e que explicou quanto aos consumos efetuados na sua vigência desde o início até 2005. Sobre este último esclarecendo que o nome da R. figura na tabela que constitui este doc. 3 e que se reporta ao período de 2001 a 2005, apesar da posição contratual da R. só ter sido assumida em 2003, precisamente por na sequência da cessão da posição contratual assumir a posição do anterior contraente também no que respeita ao consumo já efetuado. Para controle sendo aberta uma nova ficha com o nome do cessionário (a ora R.) onde são atribuídos todos os consumos anteriormente efetuados. Este depoimento permitiu, assim e como dito, perceber concretamente o teor de tal doc. 3. Do qual se extrai efetivamente como demonstrado que os anteriores e iniciais contraentes não cumpriram de forma regular os consumos mínimos estipulados contratualmente. Tal permite julgar provado o apontado em xix da conclusão 37ª, por referência ao alegado em 35º da contestação. Pelo que desde já e quanto a este ponto factual xix (35º da contestação), se julga procedente a reclamação apresentada. Sendo certo que o ponto xvii constitui uma mera conclusão decorrente de mero cálculo matemático, cuja introdução na decisão de facto é como tal destituída de fundamento ou interesse. Indo por tal indeferida No mais e prosseguindo a análise do depoimento desta testemunha, do mesmo resultou ainda explicada a normal atuação da autora perante os incumprimentos contratuais, sempre acompanhados pelos comerciais de forma periódica junto do cliente, insistindo pelos consumos, sem aplicação de penalização, salvo quando é verificado um período longo sem compras e sem respostas à equipa comercial. O depoimento assim prestado, ainda que sem conhecimento direto do circunstancialismo que rodeou a relação contratual estabelecida entre A. e RR., permitiu um enquadramento plausível da atuação da autora quanto ao motivo porque não procedeu mais cedo à interpelação do cliente face ao incumprimento que os consumos anotados na doc. 3 evidenciam ter ocorrido desde o início. Dito isto, é certo que no mais a testemunha declarou nada saber diretamente sobre o acordado com os RR. ou primitivos contraentes, motivo aliás por que o tribunal a quo justificou a resposta dos factos não provados 14 a 17. Analisado nestes termos o depoimento da única testemunha da autora, resta-nos as declarações dos RR. Ao contrário do que querem os RR. fazer crer, as suas declarações estiveram longe de merecer a credibilidade que agora vêm reclamar em sede de recurso. A R. mulher num discurso confuso e omisso, invocando estar agora muito esquecida por ter “muitos problemas”, confirmou ter assinado o contrato e ter recebido do vendedor da autora, já depois da celebração do contrato, “uma norma” do que tinha de vender por trimestre (ou seja da quantidade de café que tinha de vender). Simultaneamente reconhecendo que ia na ilusão de que ia vender muito e que por várias vezes foi interpelada pelo vendedor da autora para comprar mais café por que não estava a cumprir e que este ficava aborrecido por não conseguir vender mais café. Porém e concomitantemente, afirmou nem sequer ter visto/conhecido os anteriores donos do café com quem (diretamente ou através de algum representante/mandatário) necessariamente teria celebrado o contrato de trespasse. Contrato de que referiu já nada se lembrar, afirmando que já nem se lembrava se teria sido o marido a tratar, afirmando ter sido tudo tratado muito depressa e “passado de qualquer maneira”, sem para tanto ser apresentada explicação plausível. Mais afirmou não ter cópias do anterior contrato de café – o qual, sempre se diz, ficou cabalmente identificado no contrato de cessão com o respetivo número e neste figurando (necessariamente) os cedentes, trespassantes do estabelecimento comercial e que na qualidade de cedentes a final assinaram, também, o contrato de cessão. Acrescentou não ter lido o contrato (apesar do que em contrário neste se declara). Não obstante e quando este lhe foi apresentado pelo tribunal para reconhecer a sua assinatura (o que fez), previamente atentou no seu teor (tal qual a gravação o permitiu percecionar). O que se realça, para no mesmo sentido anotado pelo tribunal, afastar uma imagem de total impreparação/incapacidade da ré para atentar no que assina ou nas responsabilidades que assume. Ao contrário evidenciando precaução, não obstante o estado de saúde atual que relatou – dificuldades atuais com perdas de memória e recurso a psicólogo/psiquiatra, apresentados como justificativo para não se recordar/relatar com exatidão o que a antes celebrou/acordou/contratou. O assim referenciado visa tão só justificar o motivo por que o depoimento assim prestado pela R. mulher não mereceu credibilidade suficiente para afastar o que consta da prova documental e dos documentos assinados pelos RR. Por último de referir que o R. marido, em declarações, nada esclareceu de útil, já que afirmou que foi tratado tudo pela mulher e só ia ao estabelecimento à noite quando voltava do trabalho. Começando até por dizer que não assinaram nenhum contrato, para apenas e quando confrontado com o contrato, ter reconhecido a sua assinatura. Perante o exposto, entende-se que as declarações dos RR. convocadas em suma pelos mesmos como fundamento para alterar a decisão de facto nos termos por si pugnados, são insuficientes para assim decidir. Acresce ainda que da análise do contrato de cessão celebrado pelos RR. com a autora e os iniciais contraentes do contrato do contrato comercial de café, resulta ser o clausulado individualizado e direcionado a um concreto relacionamento contratual, subordinado a condições contratuais individuais, pelo que se não pode da sua mera leitura concluir que se trata de um clausulado previamente elaborado e não negociado. Em suma perante o exposto, resta-nos concluir que os RR. não lograram demonstrar a veracidade dos factos que lhes incumbia provar e nomeadamente a factualidade que pugnaram fosse aditada aos factos provados - seja aquela que efetivamente indicaram nas suas conclusões como alvo de recurso e enunciada na conclusão 37ª; seja aquela que introduziram de forma não fundamentada na conclusão 37ª; seja mesmo a factualidade nova que ali igualmente introduziram - sem prejuízo do que acima se apreciou quanto ao ponto xvii, e do deferimento do ponto xix a introduzir nos factos provados. Nos termos conjugados do disposto no artigo 640º nº 1 al. b) e artigo 662.º do CPC deve a Relação alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto quando “os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”. Tendo os recorrentes invocado como fundamento para a pretendida alteração [tal qual lhes incumbia por força do previsto no artigo 640º nº 1 al. b) acima citado] de forma pertinente as declarações dos RR., analisadas estas nos termos acima assinalados e conjugadas com a demais prova produzida que também realçamos, resulta não evidenciar a decisão recorrida erro de julgamento que imponha decisão diversa, com a salvaguarda do ponto xix acima assinalado e que assim será introduzido nos factos provados, com a seguinte redação e numeração: “14. durante todo o tempo por que perdurou a vigência do contrato, sempre os réus e os contratantes CC e marido, DD, que os antecederam, com conhecimento da Autora, nunca lhe compraram as quantias mínimas previstas no contrato”.
Termos em que se conclui pela parcial procedência da impugnação aduzida à decisão de facto, quanto à introdução do ponto xix acima assinalado, sob o número 14. Indo no mais julgada improcedente a impugnação apresentada. *** Do direito. Tal qual se depreende da impugnação aduzida pelos recorrentes à decisão recorrida, resulta claro que o imputado erro da subsunção jurídica aos factos provados dependia da alteração da decisão de facto. Ainda assim e de forma breve, tendo por referência as diversas questões suscitadas pelos recorrentes, cumpre-nos deixar aqui as seguintes observações.
Da invocada nulidade contratual do “contrato principal” e do “contrato de cessão” ao abrigo do regime previsto no DL 446/85 por referência ao previsto nos seus artigos 5º e 6º. Nulidade invocada em primeira linha de forma genérica e absoluta por referência aos contratos na sua totalidade e numa segunda linha por referência às cláusulas 9ª do “contrato inicial” e cláusula 2ª do “contrato de cessão” por referência ao previsto no artigo 19º al. c) do mesmo DL, por desproporcional a obrigação de indemnização nelas previstas em caso de incumprimento contratual.
A aplicação à relação contratual em análise dos normativos invocados, está dependente da verificação dos respetivos pressupostos. Para tanto importa previamente definir o âmbito de aplicação material do regime legal convocado pelos recorrentes e instituído pelo DL 446/85 de 25/10 [com as alterações introduzidas pelos DL´s 220/95 e 249/99 que visaram adaptar este diploma de 85 às orientações comunitárias da Diretiva n.º 93/13/CEE, do Conselho, de 5 de Abril, ampliando nomeadamente o seu âmbito material]. Este diploma tem como âmbito de aplicação material quer os contratos que incorporam cláusulas contratuais gerais, quer os contratos dirigidos a pessoa ou consumidor determinado, mas em cujo conteúdo determinado não pôde influir e visa a salvaguarda dos interesses da parte negocialmente mais fraca. Justificada esta salvaguarda por uma realidade social em que a negociação privada, assente no postulado da igualdade formal das partes, deixou de corresponder “muitas vezes, ou mesmo via de regra, ao concreto da vida.” – a dos denominados contratos de adesão [conforme consta do preâmbulo do citado DL]. Assim e nos termos do artigo 1º é definido o seu âmbito de aplicação nos seguintes termos: “1 - As cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respetivamente, a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma. 2 - O presente diploma aplica-se igualmente às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pode influenciar.” O contrato de adesão, contrato singular/individualmente celebrado pode caracterizar-se “como aquele cujo conteúdo clausular é unilateralmente definido por um dos contraentes que o apresenta à contraparte, não podendo esta discutir qualquer das suas cláusulas: ou aceita em bloco a proposta contratual que lhe é feita ou a rejeita e prescinde da celebração do contrato”[8]. E mesmo a precedência de um período de conversações não afasta necessariamente a integração de uma relação contratual neste conceito quando a não discussão no todo ou em grande parte do conteúdo clausular e a impossibilidade de influenciar esse mesmo clausulado permanecem uma realidade. Sendo aliás neste contexto que se entendem as previsões contidas quer nos artigos 5º e 6º que exigem cuidados acrescidos na comunicação e informação do conteúdo do clausulado, quer no artigo 21º quando nas als. a) e c) se reporta às obrigações assumidas na “contratação” fazendo antever um período prévio de conversações[9]. Nesta forma de contratar, consabidamente comum em sectores relevantes como o do setor bancário, seguros ou fornecimento de bens duradouros, as cláusulas são unilateralmente predispostas para um contrato específico. Caso um conjunto de cláusulas predispostas seja destinado a uma série de contratos, então estaremos perante a realidade comumente designada (sendo a nomenclatura também adotada pelo nosso legislador) por cláusulas contratuais gerais. Acresce ser frequente a inclusão num contrato de cláusulas predispostas não alvo de negociação a par de outras cláusulas ou condições contratuais previamente negociadas. Finalmente no nº 3, o legislador estabeleceu uma presunção de não negociação prévia das cláusulas contratuais. Motivo por que sobre o interessado em se prevalecer do seu conteúdo fez recair o ónus de prova de tal negociação, como forma de evitar a sujeição às regras estabelecidas neste regime. Assim dispõe o citado artigo e nº 3: “O ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo.” Interpretando este dispositivo legal, Ana Prata in ob cit. p. 175, refere poder ter a aplicação desta norma relativa ao ónus da prova da negociação resultados diferentes, consoante em causa estejam cláusulas contratuais gerais ou contratos de adesão individuais. E assim afirma, no primeiro “a padronização do conteúdo contratual constitui uma espécie de presunção de que a(s) cláusula(s) não foi(ram) negociadas; no segundo, sendo o contrato único, pode o tribunal duvidar da alegação do aderente de que não existiu negociação do contrato. Neste último caso das duas uma: ou é o aderente a invocar a invalidade da cláusula por força do regime deste diploma e terá de provar a falta de negociação que não é ostensiva; ou é o predisponente a invocar a cláusula e o aderente a contestá-la com fundamento neste Decreto-Lei e não há razão – apesar de não ser aparente que o contrato não foi negociado – para afastar esta norma sobre o ónus de prova” E conclui que o “nº 3 inverte o ónus de prova do carácter negociado (ou não) de um contrato para o contraente que invoque uma sua cláusula; que tratando-se de contrato concluído com base em cláusulas contratuais gerais constituirá em princípio facto notório (ou ao menos presunção ilidível) a sua não negociação; que nos contratos de adesão individuais, ao aderente só é exigível a prova da sua não negociação na medida em que invoque contra o outro contraente uma disposição deste Decreto-Lei, ao predisponente se aplicando este nº 3 sempre que ele pretenda prevalecer-se de direito atribuído por uma cláusula contratual” (mesma autora in ob. cit. p. 180).
Esta mesma questão tem sido abordada repetidamente pelo nosso tribunal superior, em suma e entre o mais concluindo incumbir àquele que pretende se socorrer da aplicação do regime das CCG previsto no DL 446/85 a alegação e prova (nos termos do artigo 342º nº 1 do CC) que a cláusula que pretende ver excluída do contrato singular foi pré-elaborada pelo predisponente e apresentada sem possibilidade de o seu conteúdo poder ser negociado[10]. Assim foi nomeadamente decidido pelo STJ nas seguintes decisões (todas in www.dgsi.pt, para além do Ac. do STJ 15/01/2013 citado na decisão recorrida): - No Ac. STJ de 31/10/2002, nº de processo 03B1384, analisando os deveres de comunicar e informar previstos nos artigos 5º e 6º da LCCG realçou-se “é indubitável que o ónus da prova do cumprimento desses deveres cabe ao contratante determinado que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais (…) Há, todavia, que não confundir o ónus da prova com o ónus da alegação. Na verdade, se ao contratante que apresenta as cláusulas contratuais gerais incumbe provar que cumpriu adequadamente os deveres de comunicação e de informação, certo é que só terá que o fazer se o outro contratante invocar, em sede alegatória, que tais deveres não foram cumpridos. De facto, independentemente da questão do ónus probatório, às partes cabe alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções (…)” e tais factos devem ser alegados nos respetivos articulados; - No Ac. do STJ de 10/05/2007, nº de processo 07B841 ficou expresso o entendimento de caber à parte que se quer fazer valer da aplicação deste regime legal e nomeadamente beneficiar da invalidade de cláusulas contratuais gerais, o ónus de provar que as cláusulas cuja validade questiona se enquadram em tal regime, afastando o entendimento de em causa estarem factos não carecidos de prova por notórios; - No Ac. STJ de 18/02/2014, nº de processo 1630/06.2YRCBR.C2.S1, após se realçar serem caraterísticas fundamentais das cláusulas contratuais gerais a sua pré-formulação, generalidade e imodificabilidade, afirmou-se a necessidade de a apreciação da validade de alegadas cláusulas contratuais gerais, à luz do regime jurídico da LCCG, carecer em sede probatória da demonstração a “cargo da parte que quer beneficiar da aplicação desse regime, de que se está perante cláusulas contratuais gerais.”. Para tanto e tal como se extrai da fundamentação deste Ac., incumbindo ao tribunal, no processo de formação da sua convicção em sede de análise da prova, refletir de acordo com o alegado e provado sobre o processo formativo dos negócios jurídicos, apurando se e como ocorreu a fase de negociação – na sua inexistência resultando estar-se na presença de um contrato unilateralmente conformado – contrato de adesão e como decorreu a fase decisória entre a emissão da proposta contratual e a sua aceitação. Sendo as cláusulas contratuais gerais caraterizadas, como já referido pela sua pré-formulação, generalidade e imodificabilidade, reduzem as mesmas o destinatário à posição de contratar aceitando em bloco ou recusar essa mesma contratação; - No Ac. STJ de 09/07/2015, nº de processo 36/14.4YRLSB.S1 de igual forma se afirmou cumprir “a quem considerar que uma cláusula constante de contrato individualizado se subordina ao regime das cláusulas contratuais gerais o ónus de provar (art. 342.º do CC e art. 1.º, n.º 2, do DL n.º 446/85, de 25-10) que o conteúdo dessa cláusula constante de contrato individualizado foi previamente elaborado.” - No Ac. STJ de 15/09/2016, nº de processo 3389/08.0TJCBR-A.C1.S1, após se relembrar que “entre o contrato consensual e o contrato de adesão não existe necessariamente uma dicotomia absoluta.” pois que entre um e outro é possível considerar “uma “figura contratual híbrida”, a qual, a par de cláusulas que se mantêm inalteráveis de contrato para contrato, suporta todavia a inserção de disposições específicas moldadas no interesse das partes e em particular do aderente; são “os contratos de adesão individualizados”, reconhecidos expressamente no artigo 1.º, n.º 2, do citado DL 446/85 (que aliás resulta do n.º 2 do artigo 3.º da Diretiva 93/13/CEE, ao estatuir que “O presente diploma aplica-se igualmente às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pode influenciar”), firmou-se o entendimento de que “A falta de comunicação ou informação de determinada cláusula para os efeitos da sua exclusão do contrato não é de conhecimento oficioso do Tribunal.” Incumbindo como tal ao destinatário das cláusulas que em tal tenha interesse alegar que desconhece o conteúdo dessas mesmas cláusulas, enquanto factos constitutivos do seu direito. No caso mais tendo sido entendido não ser suficiente para a consideração da observância de tal ónus a mera alegação genérica de que não foi explicado “qualquer aspeto relacionado com o mesmo contrato”, alegação esta que se afigura “inócua não tendo a potencialidade de suprir a falta de indicação do desconhecimento do conteúdo das cláusulas; ela centra-se no comportamento da oponida, esquecendo os recorrentes que previamente a isto teriam que haver cumprido o dever de alegarem atempadamente o desconhecimento a que acima se faz referência. Também não pode ignorar-se que isto não bastaria; tornar-se-ia necessário que os RR. fizessem a prova do carácter não negociado de todas e cada uma das cláusulas em relação às quais pretendiam utilizar em seu favor o regime do DL 446/85, prova que não lograram fazer”. - No Ac. STJ de 09/11/2017 nº de processo 26399/09.5T2SNT.L1.S1 foi de novo relembrado que o campo de aplicação do DL nº 446/85, de 25 de outubro, não se restringe “« às cláusulas contratuais gerais elaboradas de antemão, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respetivamente, a subscrever ou a aceitar», contempladas no seu art. 1º, nº 1 e nas quais se incluem os denominados contratos de adesão[4], abrangendo também, por força do nº 2 deste mesmo artigo, as « (…) cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pode influenciar”, abarcando os denominados contratos de adesão individualizados”, que no dizer do Acórdão do STJ, de 17.02.2011 (revista nº 1458/056.7TBVFR-A.P.S1), constituem uma “figura híbrida”, «onde a par de cláusulas que se mantêm inalteráveis de contrato para contrato, suportam todavia a inserção de disposições específicas moldadas no interesse das partes e em particular do aderente».” E demonstrado naqueles autos que o texto dos denominados “Contratos de Manutenção” integrava “um formulário que foi apresentado pela autora à ré para subscrição, caso o aceitasse nos seus precisos termos, e que não foi objeto de qualquer negociação prévia entre as partes” concluiu-se ter ocorrido a formação de tais contratos «pelo menos no que concerne às respetivas “condições gerais”, (…) pela adesão da ré a cláusulas contratuais gerais(…), prévia e unilateralmente fixadas pela autora (ou por terceiro) (…), encontrando-se, nessa medida, sujeitos à disciplina do DL n.º 446/85, de 25.10 (…) que (…) visa tutelar fundamentalmente a contraparte do utilizador, impedindo, através de uma intervenção fiscalizadora, o abuso de liberdade de conformação do contrato por parte do utilizador.» Bastando para tanto e como ali igualmente afirmado, a demonstração da impossibilidade de influenciar o conteúdo das ditas cláusulas para, nos termos do artigo 1º nº 2 do DL em menção, «se considerar preenchido o requisito da ausência de “prévia negociação individual” incluído no conteúdo legal de cláusulas contratuais gerais”». Finalmente neste Acórdão foi igualmente afirmado o entendimento de que a inadmissibilidade de se colocar questões novas perante o tribunal de recurso não se coloca em relação às questões de conhecimento oficioso ainda não decididas, como é o caso das eventuais nulidades de cláusulas de acordo com o previsto no DL 446/85. Assente que esteja a aplicabilidade do respetivo regime ao texto contratual e garantido o contraditório. * Da doutrina e jurisprudência vindos de citar podemos extrair os seguintes pressupostos relacionados com a aplicabilidade do regime legal previsto no DL 446/85: i- a aplicabilidade dos normativos constantes do DL 446/85 pressupõem a alegação e prova de que o clausulado questionado foi apresentado pré-formulado e sem possibilidade de modificação quer esteja inserido em texto destinado à celebração de uma série de contratos quer em contrato individualizado, mas cujo conteúdo parcial o aderente não pode influenciar. Reduzindo o destinatário, em ambos os casos, à decisão de contratar ou não contratar; ii- a apreciação da violação dos deveres de informação e comunicação a que respeitam os artigos 5º e 6ª do DL 446/85 está dependente da alegação por parte do interessado dos factos que fundamentam essa mesma violação. Sendo observada tal alegação, recaindo após sobre aquele que apresentou as cláusulas contratuais gerais questionadas o ónus de prova do regular cumprimento dos deveres questionados. Consequentemente não sendo do conhecimento oficioso a falta de comunicação ou informação de uma cláusula para efeitos de exclusão da mesma do contrato. Sobre o interessado recaindo – após o enquadramento referido em i - o ónus de alegar o desconhecimento do conteúdo dessa cláusula; iii- é de conhecimento oficioso a nulidade das cláusulas contratuais gerais proibidas por disposição do DL 446/85 e nos termos no mesmo previsto. Tal conhecimento pressupõe igualmente a alegação e demonstração de que o clausulado questionado se enquadra em tal regime, nos termos referido i. * Perante os pressupostos acima elencados e analisados os factos provados e não provados temos por afastada a aplicação do invocado regime do DL 446/85 à relação contratual sub judice. Alegaram e não provaram os RR. qualquer impossibilidade de negociação do clausulado e que assim o contrato lhes tenha sido apresentado já previamente elaborado pela autora, impondo unilateralmente todo o seu clausulado, para apenas assinar. Note-se que o contrato pelos mesmos celebrado foi de cessão de posição contratual, assumindo as anteriores obrigações do inicial contrato. Pelo que quanto a este contrato inicial em que viriam a assumir a posição contratual nada havia a negociar. Antes e apenas podendo e devendo na fase da negociação do contrato de cessão introduzir as alterações que para tanto entendessem como pertinentes à sua própria relação contratual que viria a ser estabelecida por via da cessão contratual. Tendo sido por referência a esta negociação e/ou impossibilidade de influenciar o teor do clausulado – fase que precede a apresentação da proposta e aceitação – que falhou o ónus de prova dos recorrentes, como já analisado. Implicando o afastamento da aplicação do regime legal das CCG ao contrato sub judice e por esta via a improcedência das arguidas nulidades por referência ao previsto quer nos artigos 5º e 6º quer no artigo 19º quanto a uma desproporcionalidade da cláusula penal, sem prejuízo da sua análise ao abrigo do disposto no artigo 812º do CC. A que também o tribunal a quo procedeu. Improcedente resulta também a argumentada anulabilidade do contrato por erro na formação da vontade ou nos pressupostos que levaram à celebração do contrato, porquanto sobre tais matérias nada provaram os recorrentes RR. ao contrário do que lhes incumbia (vide artigo 342º nº 1 do CC e factos não provados 2 a 9). Remetendo-nos no mais, nesta sede e por desnecessário, para a fundamentação apontada pelo tribunal a quo que subscrevemos.
Afastada a aplicação do regime legal das CCG e assim das questões ao seu abrigo invocadas, bem como afastada a anulabilidade do contrato por erro na formação da vontade ou nos pressupostos da sua celebração, cumpre acrescentar que nenhuma censura merece o apreciado, quer quanto à regularidade da cláusula penal constante do contrato ao abrigo da qual foi formulado o pedido indemnizatório, quer quanto a um putativo abuso de direito por parte da autora, sustentado numa alegada atuação contrária à que levara a cabo durante a execução contratual com os iniciais outorgantes.
Começando pela invocada desproporcionalidade entre a cláusula penal e o valor indemnizatório da mesma decorrente para os recorrentes, entendemos inexistir fundamento para a sua redução. A cláusula penal, tal como tem vindo a ser entendido quer pela doutrina quer pela jurisprudência: «pode revestir três modalidades: cláusula com função moratória ou compensatória, - dirigida, portanto, à reparação de danos mediante a fixação antecipada da indemnização em caso de não cumprimento definitivo ou de simples mora do devedor; cláusula penal em sentido estrito ou propriamente dita, em que a sua estipulação, como refere Gravato Morais (…)., substitui o cumprimento ou a indemnização, não acrescendo a nenhuma delas; e cláusula penal de natureza compulsória, em que há uma pena que acresce ao cumprimento ou que acresce à indemnização pelo incumprimento: a finalidade das partes, nesta última hipótese, é a de pressionar o devedor a cumprir, e já não a de substituir a indemnização. Na cláusula penal de tipo compulsório, afirma Almeida Costa, «as partes pretendem que a pena acresça à execução específica ou à indemnização calculada nos termos gerais» (…)”»[11]. Distinção, consonante com a apresentada por António Pinto Monteiro in Cláusula Penal e Indemnização, Almedina, 1990, págs. 282 e 604-605[12], entre cláusula penal “stricto sensu”, cláusula de liquidação prévia do dano ou de fixação antecipada da indemnização e cláusula penal puramente compulsória nos seguintes termos: “A primeira visa, fundamentalmente, compelir o devedor ao cumprimento, legitimando o credor, em caso de incumprimento, a exigir, a título sancionatório, uma outra prestação – a pena –, em alternativa à que era inicialmente devida e de maior vulto que esta. A segunda visa, (…), facilitar a reparação do dano, nos termos previamente fixados pelas partes, não possuindo, pois, especiais intuitos compulsórios, antes a finalidade de evitar dúvidas e litígios ulteriores a respeito do montante da indemnização. Todavia, poderá vir a ter, ainda que indiretamente ou a título meramente eventual, um efeito coercitivo, designadamente quando a soma acordada se revele, na circunstância concreta, superior ao montante indemnizatório a que o credor poderia aspirar, nos termos gerais (…). Finalmente, a cláusula penal puramente compulsória não tem qualquer influência sobre a indemnização. As partes acordam que a pena convencional, não cumprindo o devedor voluntariamente, acrescerá à execução específica da prestação ou à indemnização correspondente.” Estipulando as partes contratualmente uma indemnização, pelo incumprimento imputável à R. do acordado, num montante correspondente a 20% do valor do café promessa de venda e ainda não adquirido no momento da resolução do contrato, entende-se estarmos perante uma cláusula penal de liquidação prévia do dano. Evitando futuros litígios quanto ao valor da indemnização devida pelo dano resultante da atuação do incumpridor. A revelar-se tal montante acordado superior ao montante a que o credor poderia aspirar nos termos gerais, poderia esta mesma cláusula vir a ser considerada ainda que por via indireta também punitiva e nessa medida também de natureza compulsória. Assente este enquadramento quanto à natureza da cláusula que de todo não demonstra assumir valor superior ao que o credor poderia esperar (já que foi mesmo fixada por referência a tal valor em 20%), tão pouco vindo provada factualidade que permita formular juízo de que a percentagem estipulada se evidencia manifestamente excessiva ou desequilibrada quanto ao montante indemnizatório que pressupõe, entende-se ser de julgar improcedente a pretensão dos recorrentes nesta sede, por não provado que a cláusula em questão padeça de uma qualquer invalidade e/ou manifesta desproporção que justifique a sua redução equitativa por via jurisdicional. Termos em que também por esta via improcede a pretensão da recorrente. Analisemos agora a questão do invocado abuso de direito apontado à resolução contratual operada pela autora. Nos termos do art. 334º do Cód. Civil “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”. Entende-se assim que atua em abuso de direito aquele que exercita um direito de que é titular de forma manifestamente excessiva para lá dos limites impostos pela boa-fé, bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito. Atentando-se, para determinar os limites impostos pela boa-fé ou bons costumes, de modo especial as conceções ético-jurídicas dominantes na coletividade. E para consideração do fim social ou económico do direito, convocando-se de preferência juízos de valor positivamente consagrados na própria lei. Sem excluir os fatores subjetivos ou intenção na atuação do titular, na medida em que estes relevarão para apreciação quer da boa-fé bons costumes quer ao próprio fim do direito[13]. De entre os comportamentos típicos abusivos[14] que justificam nos termos legais um juízo de censura a uma atuação que de outro modo seria considerada legítima temos o venire contra factum proprium. Em causa a tutela de confiança, apoiada na boa-fé e que ocorre perante quatro proposições, não cumulativas desde que a intensidade assumida pelas restantes seja tão impressiva que compense a falha[15]: “- 1º uma situação de confiança, conforme com o sistema e traduzida na boa-fé subjetiva e ética, própria da pessoa que, sem violar os deveres de cuidado que ao caso caibam, ignore lesar posições alheias; - 2º uma justificação para essa confiança, expressa na presença de elementos objetivos capazes de, em abstrato, provocarem essa crença plausível; - 3º um investimento de confiança, consistente em, da parte do sujeito, ter havido um assentar efetivo de atividades jurídicas sobre a crença consubstanciada; 4º a imputação da situação de confiança criada à pessoa que vai ser atingida pela proteção dada ao confiante; tal pessoa por ação ou omissão, terá dado lugar à entrega do confiante em causa ou ao fator objetivo que a tanto conduziu.”
Neste tipo de atuação recai a censura sobre uma conduta do sujeito titular de um direito que é contrária a uma sua anterior atuação, a qual especialmente quando reiterada e prolongada no tempo, viola a confiança, entretanto sedimentada na contraparte de que não viria a ser atingida pela proteção que a lei confere àquele que por ação ou omissão deu lugar ao estabelecer de tal confiança. Foi esta confiança que os recorrentes invocaram ter sido violada, na medida em que os iniciais contraentes e cedentes da posição contratual nunca compraram as quantias mínimas previstas no contrato à A., sem quer ocorresse resolução contratual. E tal vem provado, na sequência da alteração da decisão de facto por nós supra decidida. Tal alteração, contudo, em nada altera o juízo formulado pelo tribunal a quo. Tal qual também resulta dos factos provados, a motivação da comunicação de fim do contrato em janeiro de 2006, entenda-se de resolução contratual, foi fundada na cessação de aquisição de café desde o 3º trimestre de 2005. Realça-se, cessação de aquisição de café (que os recorrentes reconhecem na conclusão 81º) e não aquisição em montantes inferiores aos mínimos estabelecidos. O mesmo é dizer que o circunstancialismo que fundamentou o alegado abuso de direito por alteração do comportamento contratual imputado à autora de prévia aceitação do não cumprimento da obrigação das quantidades mínimas estipuladas, não se verifica. Já que o fundamento da resolução contratual foi outro – como mencionado- a cessação de aquisição por período superior a 3 meses. A que acresce não terem os recorrentes provado o mais alegado quanto a este ponto em sede de recurso, quer quanto a uma inexistente reação negativa por parte da autora pela não aquisição de café nas quantias estipuladas (vide fp 9), quer quanto ao conhecimento por parte da A. da impossibilidade dos RR. em cumprirem as metas estabelecidas (vide fnp 12). Aos recorrentes cabia ter demonstrado a factualidade que lhes permitiria defender a sua posição. O que não lograram demonstrar. Tanto é quanto baste para se concluir que a imputada à A. atuação em abuso de direito não resulta demonstrada perante a factualidade apurada. A implicar a improcedência da arguida atuação em abuso de direito. Por último e quanto à alegada prescrição do direito reclamado pela autora e aplicação ao seu crédito do prazo de 5 anos previsto na al. g) do artigo 310º do CC. Decidiu o tribunal a quo, uma vez mais, de forma correta. Nos termos do disposto no artigo 310º al. g) do CC, prescrevem no prazo de cinco anos “g) Quaisquer outras prestações periodicamente renováveis.” Os créditos resultantes de uma relação contratual, habitualmente denominada como contrato de fornecimento de café, cujo prazo de execução foi dilatado no tempo até à aquisição de uma definida quantidade de café, não provêm de prestações estabelecidas com caráter periodicamente renovável, antes fracionado. Consequentemente sendo-lhe aplicável o prazo de prescrição ordinário de 20 anos e não, o prazo previsto na al. g) do artigo 310º do CC[16]. Diversa é a questão, no que respeita aos juros, por força do previsto na al. d) do mesmo artigo 310º do CC. Prescrição que o tribunal a quo de forma adequada analisou e declarou, em função da data da citação dos recorrentes para os termos da ação (sobre esta questão concreta nada tendo sido oposto pelos recorrentes). Em suma, também nesta sede se conclui pela improcedência deste argumento de recurso, nos termos corretamente analisados pelo tribunal a quo. Termos em que nos resta concluir pela total improcedência do recurso interposto e confirmação da decisão recorrida.
Pelo exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em julgar totalmente improcedente o recurso interposto pelos RR., consequentemente mantendo a decisão recorrida. Custas do recurso pelos recorrentes. * Fátima Andrade José Nuno Duarte Ana Olívia Loureiro ______________ [1] Preceitua o artigo 615º nº 1 do CPC “1 - É nula a sentença quando: a) Não contenha a assinatura do juiz; b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.” [2] Cfr. Ac. STJ de 23/03/2017, Relator Manuel Tomé Gomes, in www.dgsi.pt [3] Vide Ac. STJ de 30/05/2013, Relator Álvaro Rodrigues, in www.dgsi.pt sobre a distinção entre nulidade da sentença (no caso por oposição entre os fundamentos e decisão) versus erro de julgamento. [4] Quanto à absoluta falta de fundamentação, vide o decidido no Ac. STJ de 24/01/2024, nº de processo 2529/21.8T8MTS.P1.S1; Ac. STJ de 13/03/2025, nº de processo 946/20.0T8CSC.L1.S1; Ac. STJ de 09/12/2021, nº de processo 7129/18.7T8BRG.G1.S1; Ac. STJ de 03/03/2021, nº de processo 3157/17.8T8VFX.L1.S1. Sem deixarmos de dar nota do entendimento expresso por exemplo no Ac. TRP de 06/09/2021, nº de processo 4348/20.0T8VNG-A.P1 onde se defende que também ocorre esta nulidade quando em causa esteja uma deficiência de tal forma gravosa que não permite a perceção da decisão – todos estes Acs. publicados in www.dgsi.pt. [5] Vide António S. Geraldes in ob. cit., em anotação ao artigo 662º do CPC, págs. 229 e segs. que aqui seguimos como referência. [6] Na reprodução do alegado pelos recorrentes e indicado nesta conclusão 37ª, procederemos à numeração dos factos pelos mesmos enunciados, por facilidade de referência. Anotando ainda os artigos a que respeitam da contestação e/ou da decisão de facto (para confronto com o que também os recorrentes previamente elencaram). [7] Embora o seguinte segmento do alegado em 5º da contestação não conste das conclusões, entende-se tratar-se de manifesta gralha por o início desta frase constar da reprodução do artigo, motivo porque oficiosamente a acrescentámos. [8] Vide Ana Prata in Contrato de Adesão e Cláusulas Contratuais Gerais, edição Almedina 2010, p. 17. [9] Neste sentido Ana Prata in ob. cit. p. 99. [10] Posição já pela relatora assumida, enquanto 2ª adjunta, no Ac. TRP de 08/03/2021, nº de processo 680/14.0T8STS.P1 in www.dgsi.pt [11] Cfr. Ac. STJ de 27/09/2011, nº de processo 81/1998.C1.S1 in www.dgsi.pt [12] Citado no Ac. STJ de 03/10/2019, nº de processo 2020/16.4T8GMR.G1.S2 in www.dgsi.pt [13] Assim Antunes Varela in “Das Obrigações em Geral”, vol. I, ed. 6ª p. 515/516. [14] Doutrinalmente identificados como: Venire contra factum proprium; Inalegabilidade; Suppressio; Tu quoque e Desequilíbrio – vide António Menezes Cordeiro in “Do abuso do direito: estado das questões e perspetivas” in ROA, ano 2005/ano65 – vol. II- set. 2005/artigos doutrinais – consultado in https://portal.oa.pt/comunicaçao/publicaçoes [15] Menezes Cordeiro na mesma publicação. [16] Vide nesse sentido o recente Ac. do TRP de 10/02/2025, nº de processo 513/23.6T8ESP.P1 in www.dgsi.pt |