Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
5682/13.0YYPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANA LUÍSA LOUREIRO
Descritores: PROCESSO EXECUTIVO
EX-CÔNJUGE
DÍVIDAS COMUNS DO CASAL
HIPOTECA
BEM COMUM
INVENTÁRIO SUBSEQUENTE A DIVÓRCIO
ADJUDICAÇÃO
PRODUTO DA VENDA
Nº do Documento: RP202407105682/13.0YYPRT.P1
Data do Acordão: 07/10/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: Em execução instaurada contra ex-cônjuges, por dívida comum de ambos, contraída na pendência do casamento, garantida por hipoteca sobre bem comum penhorado na execução – com registo de aquisição, por compra, a favor dos executados, casados no regime de comunhão de comunhão de adquiridos, na competente Conservatória do Registo Predial –, a ulterior aquisição do referido bem penhorado, na pendência da execução mas antes da realização da venda, por um dos executados, por adjudicação no âmbito de processo de inventário subsequente a divórcio dos executados, comprovada por certidão judicial extraída do processo de inventário, releva e tem que ser considerada no processo de execução, designadamente para efeitos da determinação do titular do direito à restituição do produto sobrante da venda, ainda que tal aquisição não tenha sido objeto de inscrição no registo predial.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo – Apelação n.º 5682/13.0YYPRT.P1
Tribunal a quo – Juízo de Execução do Porto – J 2
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Sumário
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Acordam na 3ª Secção do Tribunal da Relação do Porto:

I – Relatório:

Identificação das partes e indicação do objeto do litígio

Em 03-10-2013 a exequente AA instaurou execução sumária n.º 5682/13.0YYPRT contra os executados BB e CC, para pagamento coercivo da quantia exequenda liquidada no requerimento executivo em € 62.178,93, correspondente à soma dos seguintes valores:
a) Capital de € 48.438,42 + juros vencidos de € 1.024,52, calculados à taxa de 13,544%, desde 01-08-2013 a 27-09-2013, dívida emergente da escritura de 14 de agosto de 1998 alterada pelo instrumento contratual de revisão de spread, pela qual a Banco 1..., S.A., concedeu aos executados um empréstimo no montante de 15.000.000$00, correspondente a € 74.819,68, juntos como título executivo;
b) Capital de € 12.477,38 + juros vencidos de € 238,62, calculados à taxa de 12,245%, desde 01-08-2013 a 27-09-2013, dívida emergente da escritura de 28 de julho de 2006, pela qual a Banco 1..., S.A., concedeu aos executados um empréstimo no montante de € 14.371,90, junta como título executivo.

Em 17-10-2019 a exequente apresentou reclamação de créditos, peticionando o pagamento do crédito que detém sobre a executada CC, no montante de € 98.842,71, acrescido de juros calculados à taxa de 4% desde 15-10-2019, até efetivo e integral pagamento, calculados sobre € 90.483,50, garantido por penhora sobre o direito de superfície da fração “B” correspondente a uma habitação sita na Rua ..., nº ..., r/c – D, Porto, descrita sob o nº ... – Freguesia ..., na Conservatória do Registo Predial do Porto (crédito em execução no processo Proc. n.º ...).
Em 13-07-2020 foi proferida, no referido apenso de reclamação de créditos, sentença que reconheceu os créditos reclamados pela exequente e os graduou com o crédito exequendo para serem pagos, pela forma seguinte:
1º - Quantia exequenda garantida por hipoteca.
2.º - Crédito reclamado.

Ulteriormente foi efetuada a venda do direito de superfície da fração “B”, penhorado na execução, pelo preço de € 325.494,69, tendo a exequente, em exercício de direito de remição, adquirido o bem vendido.

A Sr.ª Agente de Execução elaborou e, em 05-09-2023, notificou as partes da conta final da execução, nos seguintes termos:
Fica V.ª Exa., notificada (…), nos termos dos artigos 25º, 26º, e 31º do R.C.P, da conta final que já se encontra liquidada por pagamento coercivo – venda imóvel, e que dispõe do prazo de dez dias, para querendo, reclamar da mesma.
Valor da Venda do Imóvel (remição): 325.494,69 €
Divida exequenda + crédito reclamado + juros: 248.705,88 €
Valor depositado pela exequente (venda): 76.788,81 €
Crédito reclamado no Proc....: 34.959,02 €
Honorários e Despesas da A.E, em falta: 4.401,75 €
Saldo a favor dos executados: 37.428,04 € ou seja 18.714,02 € cada executado.
Mais notifico a V. Exa., decorrido o prazo e no havendo reclamação da conta final, dará cumprimento do artigo 81º do CPPT, para entregar a quantia remanescente aos executados.

Em 20-09-2023 (Ref. 36701755) a executada CC apresenta requerimento de reclamação da conta final, alegando que o valor da quantia exequenda, crédito reclamado pela exequente e juros ascende a € 196.310,08 e não aos € 248.705,88 apurados pela Agente de Execução e que, sendo o imóvel penhorado e vendido propriedade exclusiva da executada/reclamante, o produto da venda é exclusivamente seu, não podendo ser usado para o pagamento do crédito de € 34.959,02 em execução no processo n.º ..., o qual é da única responsabilidade do co-executado BB, face ao que conclui que seja ordenada a “retificação da conta final ordenando-se a restituição da quantia de € 124.782,86 (…), à reclamante”.
Em 21-09-2023 (Ref. 36716571) o executado BB apresenta requerimento de reclamação da conta final, requerendo se declare “que a divida exequenda, o crédito reclamado e respetivos juros ascendem ao montante global de € 248.705,88”; que o crédito emergente do Proc. n.º ..., no montante de € 34.959,02, não é devido, nem exigível nos presentes autos, pelo que não pode ser pago pelo produto do bem penhorado e vendido”; “que o produto sobrante da venda do bem penhorado deve ser entregue, em partes iguais, aos dois executados.”.
Em 12-10-2023 (Ref. 36934805) a Sr.ª Agente de Execução pronunciou-se sobre as reclamações, mantendo a posição constante da liquidação efetuada, indicando que seguiu “os cálculos de igual forma que a ilustre mandatária da exequente, conforme requerimento da mesma à AE de 07-02-2023 com a referência 44653183.”, e juntando cópia de tal requerimento da exequente, no qual foi efetuado o seguinte cálculo:
Execução:
1 – Capital: € 60.915,80
2 – Juros até 27/09/2013: € 1.263,13
3 – Juros de 28/09/2013 a 05/01/2021: € 58.856,96 (2656 dias x juro diário €22,16)
TOTAL em 05-01-2021 – € 121.035,89
Reclamação Créditos:
1 – Crédito em 17-10-2019: € 98.842,71
2 – Juros a 4% sobre € 90.483,50, desde 18-10-2019 a 05-01-2021: € 4.414,40 (445 dias x juro diário de € 9,92)
TOTAL em 05-01-2021 – € 103.257,11.
Juros da execução e da reclamação de créditos de 06-01-2021 a 07-02-2023: € 24.412,88 (761 dias x € 32,08 juro diário)
TOTAL: € 248.705,88.

Em 17-10-2023 (Ref. 452639438) foi proferido despacho que, transcrevendo a pronúncia efetuada pela Sr.ª AE, indeferiu as reclamações (notificado às partes por notificações eletrónicas de 17-10-2023).

Inconformada, a executada CC interpôs, em 06-11-2023 (Ref. 37181590) recurso de apelação, apresentando as seguintes conclusões:
A) A recorrente discorda da decisão do tribunal a quo, que considerou a sua reclamação da conta final totalmente improcedente, tendo decidido que a contagem dos juros está em conformidade, que a recorrente não tem registado o direito de propriedade favor o bem vendido, pelo que a quantia sobrante deverá ser dividida com o co-executado, e que, por estar pendente uma outra execução em que o co-executado é executado, a quantia sobrante deverá dar pagamento a esse processo, de forma integral.
B) No que à contagem dos juros diz respeito, as taxas em vigor estão previstas na Portaria 291/2003 de 8 de abril, ou seja, 4% anual, por remissão do artigo 559.º do Código Civil, atento o facto de as partes intervenientes nos títulos executivos não são comerciantes.
C) Assim, e realizando a simples operação aritmética, resulta o seguinte:
I – da quantia exequenda principal:
a) O requerimento executivo deu entrada no dia 3 de outubro de 2013, peticionando a quantia de € 62.178,93.
b) Os juros dessa quantia contabilizam-se até ao dia 8 de fevereiro de 2023, data do pagamento nos autos da quantia exequenda, pelo que à taxa legal de 4%, se liquidam em € 23.270,25.
c) a quantia exequenda referente à execução principal ascende a € 85.449,18.
II – da quantia da reclamação de créditos:
a) No dia 15 de outubro de 2019, a exequente vem reclamar créditos no valor de € 90.483,50.
b) Em 15 de outubro de 2019, já se encontravam vencidos juros no valor de € 8.359,21.
c) Os juros contabilizados, à taxa legal de 4%, sobre a quantia em dívida desde o dia 15/10/2019 até 08/02/2023 (dia do pagamento da quantia exequenda), liquidam-se em € 12.018,19.
d) A quantia exequenda relativa a este crédito reclamado ascendo ao valor de € 110.860,90.
III – Do valor total da quantia exequenda:
a) As quantias exequendas acrescidas de juros perfazem o valor total de € 196.310,08 (cento e noventa e seis mil, trezentos e dez euros e oito cêntimos).
D) A decisão a quo, ao ter decidido que o cálculo dos juros estava conforme, deveria ter fundamentado a decisão, tendo omitido totalmente o raciocínio ou até a legislação aplicada que a faz chegar a essa conclusão, pelo que a não especificação do fundamento de facto e de direito que justificou essa opção, é geradora de nulidade da decisão.
E) Essa omissão ostensiva torna também a decisão ininteligível.
F) O direito de propriedade de bens imóveis prova-se pela exibição do documento, contrato ou outro equiparado, observador da forma legal, da transmissão do direito.
G) O direito de propriedade de bens imóveis não se torna eficaz com o seu registo junto da Conservatória do Registo Predial.
H) O registo predial não tem, em regra (ressalva-se sobretudo a constituição da hipoteca), efeito constitutivo ou transmissivo, mas tão-somente, “meramente declarativo”, de tal ordem que “o registo (…) não é imprescindível à constituição, modificação ou extinção dos direitos inerentes às coisas (…) visando apenas assegurar a sua publicidade em face de terceiros” (cfr. Orlando de Carvalho, Ob. cit., p. 220).
I) A recorrente demonstrou ser a dona e legítima proprietária, em exclusivo, do bem penhorado e vendido nos autos, por aquisição/adjudicação, em sede de inventário subsequente a processo de divórcio e pode invocar o seu exclusivo direito à propriedade perante os presentes autos e seus intervenientes.
J) Nenhum interveniente processual goza da proteção prevista no artigo 5º do Código do Registo Predial, pois não assumem a qualidade de “terceiro”. Se o registo não é essencial para garantir a inoponibilidade da aquisição perante a aqui recorrente, será de concluir que o registo
predial teria apenas como efeito o de dar publicidade ao ato.
K) Em consequência, como o produto da venda angariado resulta da venda do seu próprio bem, a quantia sobrante tem de ser destinada apenas à recorrente.
L) O co-executado não tem qualquer direito à quantia sobrante, ou sequer obter o benefício de ser paga uma dívida em que é executado, à custa do património da recorrente.
M) A execução da decisão proferida pelo tribunal a quo tem por consequência que, o co-executado recebeu o preço pela venda do bem em sede do processo de inventário, e agora ainda lhe é restituído valores por conta da venda executiva desse bem, e ainda vê o produto da venda desse bem liquidar integralmente um outro processo executivo em que é executado, o que configura uma situação manifesta de enriquecimento sem causa do co-executado, à custa do empobrecimento da recorrente no valor de € 106.068,84.
N) A sentença em crise violou, entre outras as seguintes normas legais:
a) Do Código do Processo Civil, artigos 615.º, n.º 1 alínea b), c) e d); artigos 559.º 408.º, n.º 1, do Código Civil; Portaria 291/2003 de 08/04; artigos 1.º, 5º, e 7.º do Código do Registo Predial.
O) E face a tudo o supra exposto, a Recorrente entende que a sentença proferida pelo Tribunal a quo deverá ser revogada e substituída por acórdão em que se altere a decisão e assim julgando procedente a reclamação.

Em 17-11-2023 (Ref. 37308997) o executado/apelado BB apresentou resposta às alegações de recurso, defendendo que a liquidação da quantia exequenda efetuada no requerimento executivo e a liquidação do crédito reclamado não foram objeto de impugnação, tendo-se consolidado, respeitando a liquidação final às taxas de juros então indicadas, e que o direito de superfície foi penhorado a ambos os executados, como consta do registo predial, tendo sido vendido nesses termos, não havendo “evidência de propriedade exclusiva do direito penhorado”, sendo a invocada propriedade exclusiva da executada à data da venda contrariada pela presunção do art. 7.º do Cód. Reg. Predial.

Admitido o recurso pelo tribunal a quo, e remetido a este Tribunal da Relação, foi ordenada a baixa do processo à primeira instância para cumprimento do disposto no n.º 1 do art. 617.º do Cód. Proc. Civil, quanto às nulidades arguidas no recurso interposto.

Em 09-01-2024 (Ref. 455276684) o tribunal a quo, pronunciando-se sobre a nulidade arguida pela executada/apelante CC no “que respeita à apreciação da questão da contagem dos juros, por se limitar a referir de forma lacónica que a contagem se mostra conforme as regras legais”, julgou procedente a arguida nulidade e, procedendo ao cálculo dos juros da quantia exequenda e do crédito reclamado, fixou os mesmos nos seguintes termos:
Execução (peticionada no requerimento executivo apresentado em 03-10-2013): € 62.178,93
Juros a 4% contabilizados de 03-10-2013 até 08-02-2023 (data do pagamento), num total de 3416 dias: € 23.277,10
TOTAL: € 85.456,03 (€ 62.178,93 + € 23.277,10)
Reclamação de Créditos (crédito peticionado na reclamação de créditos em 15-10-2019): capital de € 90.483,50 + juros vencidos de € 8.359,21
Juros a 4% contabilizados de 15-10-2019 até 08-02-2023 (data do pagamento), num total de 1213 dias: € 12.038,10
TOTAL: € 110.870,81 (€ 90.483,50 + € 8.359,21 + € 12.038,10)

Em 09-01-2024 foi efetuada notificação eletrónica às partes deste despacho.
Em 11-01-2024 (Ref. 37797119) o executado apresentou requerimento de arguição de nulidade do despacho proferido em 09-01-2024, peticionando se declarasse nulo tal despacho, por manifesto erro jurídico e material no cálculo da responsabilidade dos executados, devendo ser substituído por outro que fixe o crédito exequendo em € 239.104,83, em 8 de fevereiro de 2023, data da venda do bem penhorado.
Em 15-02-2024 (Ref. 457000647) o tribunal a quo proferiu despacho que indeferiu o requerimento de arguição de nulidade (por, no caso, admitindo o despacho recurso ordinário, a nulidade apenas poder ser arguida no recurso a interpor da referida decisão).
Em 16-02-2024 foi efetuada a notificação eletrónica às partes deste despacho.

Inconformado, o executado/apelante BB apresentou, em 28-02-2024 (Ref. 38301148) requerimento de interposição de recurso do despacho proferido em 09-01-2024 (Ref. 455276684) e do despacho proferido em 15-02-2024 (Ref. 457000647), apresentando as seguintes conclusões:
A. O presente recurso é interposto dos seguintes doutos despachos do Tribunal a quo:
1. Do segmento decisório do despacho com a Referência 455276684;
2. Do despacho com a Referência 457000647
B. Nos autos principais foram dados à execução três créditos da exequente, a saber:
d) O crédito hipotecário que auxiliou os executados a comprarem o direito de superfície sobre a fração autónoma ajuizada;
e) O crédito hipotecário contraído pelos executados para realizar obras nessa fração;
f) O crédito reclamado pela exequente;
C. O objeto deste recurso prende-se com a determinação do montante de cada um desses créditos;
D. Isto porque, no douto despacho com a Referência 455276684 o Tribunal a quo calculou mal o valor desses créditos, designadamente porque o fez em violação dos instrumentos que o titulam e dados à execução, aplicando a taxa legal de juro supletiva de 4%;
E. Acontece que o direito penhorado foi vendido judicialmente em 8 de fevereiro de 2023;
F. Sendo que nessa data o crédito hipotecário ascendia ao montante de € 109.819,31, sendo € 48.438,32 de capital e € 61.380,99 de juros calculados à taxa de 13,544%, conforme o convencionado na escritura de mútuo com hipoteca;
G. Na referida data o crédito hipotecário para obras ascendia ao montante de € 26.773,41, sendo € 14.296,03 de capital e € 14.296,03 de juros calculados à taxa de 12,946%, conforme o convencionado na escritura de mútuo com hipoteca;
H. Ainda na referida data o crédito reclamado pela exequente ascendia a € 102.511,61, sendo € 90.489,50 de capital e € 12.028,11 de juros estes corretamente calculados à taxa de 4%;
I. Em face deste vício o recorrente veio arguir a nulidade do segmento decisório do despacho com a Referência 455276684 objeto deste recurso;
J. Visou-se com esta arguição que o Tribunal a quo corrigisse este vício, pondo em concordância os títulos dados à execução e o cálculo dos montantes deles decorrentes;
K. Acontece que o Tribunal a quo decidiu, pelo douto despacho com a Referência 457000647, que não podia conhecer desta nulidade;
L. Pelo que do mesmo devia ser interposto recurso (artigo 615 nº 1 al e) e nº 4 do Código de Processo Civil – ex-artigo 668 do C.P.C. 1961);
M. O que se faz através do presente recurso;
N. Nos despachos recorridos o Tribunal a quo calculou os créditos exequendos em violação dos títulos dados à execução, pelo que se impõe a respetiva revogação.

Termos em que se requer a V Exas se dignem conceder provimento ao presente recurso de apelação, revogando os despachos recorridos consubstanciados no segmento decisório do despacho com a Referência 455276684 e do despacho com a Referência 457000647, e fixando os créditos exequendos em 8 de fevereiro de 2023 no montante global de € 239.104,33, com as legais consequências.

Não foi apresentada qualquer resposta a estas alegações de recurso do executado.

Em 01-04-2024 (Ref. 458461178) o tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso interposto pelo executado, como “apelação, com efeito suspensivo, a subir imediatamente e nos próprios autos (artigos 644.º e ss, ex vi do artigo 852º e 853.º, n.º 1 do C.P.C.).”

Remetidos os autos a esta Relação, foi facultado às partes o exercício do contraditório quanto à rejeição/não conhecimento do recurso de apelação interposto em 28-02-2024 pelo executado/apelante BB, tendo a executada/apelada pronunciado-se no sentido da sua rejeição e o executado/apelante no sentido da sua admissão.

Após os vistos legais, cumpre decidir.

II – Objeto do recurso:

Questão prévia – admissibilidade do recurso interposto pelo executado/apelante

São pressupostos gerais da admissibilidade dos recursos o valor da causa e a sucumbência (art. 629.º, n.º 1, do CPC) – sem prejuízo das situações previstas no n.º 2 do art. 629.º do CPC e em outras disposições –, a legitimidade (art. 631.º do Cód. Proc. Civil) e a tempestividade (arts. 638.º do Cód. Proc. Civil).
Além das disposições do processo de declaração, estando-se aqui perante um processo de execução, há ainda que ter em consideração o disposto nos arts. 852.º e 853.º, ambos do Cód. Proc. Civil.

A executada/apelante CC interpôs recurso da decisão proferida pelo tribunal a quo em 17-10-2023, decisão esta que indeferiu a reclamação por si apresentada da conta/liquidação que a Sr.ª Agente de Execução elaborou, na qual (além de outras decisões) procedeu à liquidação da responsabilidade dos executados – sendo tal liquidação efetuada no âmbito da competência que é atribuída por lei à Sr.ª Agente de Execução, em cumprimento do disposto no arts. 716.º, n.º 2, 719.º, n.º 1, 847.º e 849.º, n.º 1, al. b), todos do Cód. Proc. Civil.

Na sequência do conhecimento, pelo tribunal a quo, da nulidade arguida no recurso interposto pela executada/apelante CC, foi proferida em 09-01-2024 decisão que julgou parcialmente procedente a reclamação apresentada pela referida executada/apelante, quanto à liquidação da responsabilidade dos executados, fixando a mesma em € 196.326,84 (quantia exequenda de € 85.456,03 + crédito reclamado de € 110.870,81).
Foi efetuada notificação eletrónica desta decisão às partes em 09-01-2024.
O executado apresentou, em 11-01-2024, requerimento a arguir a nulidade do despacho de 09-01-2024, por manifesto erro jurídico e material no cálculo da responsabilidade dos executados, requerendo a sua substituição por outro que fixe o crédito exequendo em € 239.104,83.
Tal requerimento de arguição de nulidade foi indeferido, por despacho de 15-02-2024, com o fundamento de que, cabendo recurso da decisão, a nulidade tinha que ser arguida no recurso.
Foi efetuada notificação eletrónica desta decisão às partes em 16-02-2024.
Em 28-02-2024 o executado apresentou requerimento de interposição de recurso do despacho proferido em 09-01-2024 e do despacho proferido em 15-02-2024.

Tal como sucedeu com o despacho proferido em 17-10-2023, também o despacho proferido em 09-01-2024 apreciou questões atinentes à liquidação da responsabilidade dos executados e à realização de pagamentos. Tais operações têm lugar antes da extinção da execução e são pressuposto desta (art. 849.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil).
Acresce ainda que, subjacente aos termos da conta final notificada, nomeadamente quanto à afetação dos valores provenientes do produto da venda a outros pagamentos e quanto à restituição do remanescente aos dois executados, estão outras questões jurídicas apreciadas e decididas na decisão proferida pelo tribunal a quo em 17-10-2023.
Assim, quanto a estas decisões (quer a proferida em 17-10-2023, quer a proferida em 09-01-2024) a impugnação diferida – após a extinção da execução – seria inútil, pelo que das mesmas cabe recurso de apelação, nos termos previstos na al. a) do n.º 2 do art. 853.º, por referência à al. h) do n.º 2 do art. 644.º, ambos do Cód. Proc. Civil.
O prazo para a interposição deste recurso previsto na al. h) do n.º 2 do art. 644.º do Cód. Proc. Civil é, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 638.º do mesmo diploma, de 15 dias.
Daqui resulta que, considerando-se o executado BB notificado da decisão proferida em 09-01-2024 no dia 12 de janeiro de 2024, tal prazo de 15 dias terminou no dia 27 de janeiro de 2024 (sábado) pelo que, nos termos do disposto no art. 138.º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil, o termo do referido prazo de 15 dias para a interposição do recurso transferiu-se para o primeiro dia útil subsequente, ou seja, dia 29 de janeiro de 2024.
O requerimento de interposição de recurso do executado/apelante, apresentado em 28-02-2024, é, assim, manifestamente extemporâneo no que concerne à impugnação da decisão de 09-01-2024.
Quanto ao despacho proferido em 15-02-2024, resulta das alegações e conclusões do recurso interposto que o que o executado/apelante pretende é a revogação da decisão proferida em 09-01-2024, e não a revogação da decisão que decidiu não conhecer do requerimento apresentado em 11-01-2024 (Ref. 37797119) por, cabendo recurso do despacho, a questão ter que ser suscitado mediante a interposição de recurso.
Tal resulta evidente da al. C) das conclusões do recurso, em que é o próprio executado/apelante que afirma que o objeto do recurso respeita à determinação do montante do crédito exequendo e do crédito reclamado (defendendo o mesmo que a liquidação da quantia exequenda e do crédito reclamado ascende a um total de € 239.104,33, e não valor de € 196 326,84 liquidado pelo tribunal recorrido no despacho de 09-01-2024).

Ainda que assim não fosse – ou seja, ainda que o recurso interposto pelo executado/apelante, quanto ao despacho proferido em 09-01-2024, fosse tempestivo, e ainda que tivesse por objeto o despacho proferido em 15-02-2024 –, sempre seria de concluir pela rejeição do recurso por falta de legitimidade do executado/apelante, uma vez que, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 631.º do Cód. Proc. Civil, os recursos só podem ser interpostos por quem, sendo parte principal na causa, tenha ficado vencido.
Ora, quanto à quantia exequenda, que a Sr.ª AE havia liquidado em € 137 899,65, a decisão recorrida considerou que tal liquidação ascende apenas a € 85 456,03. O executado é responsável, juntamente com a executada, pelo pagamento da quantia exequenda. A decisão recorrida pelo executado/apelante BB, na parte em que fixou a liquidação final da quantia exequenda em valor inferior ao da liquidação que a AE havia efetuado, é favorável ao executado/apelante, o qual é, juntamente com a executada, devedor da referida quantia à exequente.
Daqui resulta que o executado não é parte vencida nesta decisão, uma vez que a mesma, dando procedência parcial à reclamação apresentada pela executada/apelante, nomeadamente quanto à liquidação da responsabilidade dos executados efetuada pela Sr.ª Agente de Execução relativamente à quantia exequenda, (também) diminuiu o valor da liquidação da sua responsabilidade.
Quanto ao crédito reclamado e graduado para ser pago pelo produto da venda do bem penhorado, tal crédito tem como única devedora a executada.
O executado não é devedor da quantia reclamada pela exequente (credora reclamante) – que era objeto de execução noutro processo, no qual havia sido penhorado ½ do bem penhorado nesta execução –, tendo tal crédito (de que é única devedora a executada) sido graduado para ser pago – após o pagamento do crédito exequendo, garantido por hipoteca – pelo bem penhorada naquela execução, execução essa que foi sustada por haver anterior penhora sobre o referido bem nesta execução.
Daqui resulta que o executado não é parte principal na relação jurídica emergente da sentença de reclamação de créditos, não sendo a sua posição processual na execução afetada pela liquidação que for efetuada quanto ao crédito reclamado.
Não tendo o mesmo posição processual passível de ser afetada pela decisão que proceda à liquidação do crédito reclamado, não tem, naturalmente, legitimidade para recorrer de qualquer decisão que respeite ou se pronuncie sobre a liquidação do crédito reclamado.

Concluímos, deste modo, pela rejeição do recurso interposto pelo executado/apelante BB em 28-02-2024, quer por intempestivo, quer por falta de legitimidade do apelante – art. 652.º, n.º 1, al. b), do Cód. Proc. Civil.
Custas pelo executado/apelante.
Notifique.

Questões a decidir – recurso interposto pela executada/apelante

A executada/apelante CC interpôs recurso da decisão proferida pelo tribunal a quo em 17-03-2023, decisão essa que indeferiu a sua reclamação, apresentada em 20-09-2023, na qual a executada/reclamante suscitava 3 questões:
1) Que a liquidação da responsabilidade dos executados – nomeadamente, quanto à liquidação da quantia exequenda – é inferior ao valor liquidado pela Sr.ª AE (a executada/apelante defende que o total da responsabilidade dos executados relativamente à dívida exequenda ascende a € 85.449,18, enquanto a enquanto a Sr.ª AE havia liquidado tal responsabilidade em € 137 899,65); defende ainda que a liquidação do crédito reclamado ascende a € 110.860,90.
2) A inadmissibilidade de afetação do produto da venda do direito de superfície sobre a fração autónoma designada pela letra “B”, do qual é exclusiva proprietária (por lhe ter sido adjudicado no âmbito de processo de inventário n.º ... do Juízo de Família e Menores do Porto, J4, conforme certidão judicial que havia junto e que volta a juntar) ao pagamento do crédito reclamado pelo processo ..., no valor de € 34.959,02, da única responsabilidade do co-executado BB;
3) Discordância da decisão da Sr.ª AE quanto à entrega a cada um dos executados de metade do valor do saldo sobrante do produto da venda, após a realização dos pagamentos (remanescente do produto da venda do direito de superfície sobre a fração autónoma designada pela letra “B”), por tal remanescente dever ser entregue apenas à executada.

Na sequência do conhecimento, pelo tribunal a quo, da nulidade arguida no recurso interposto pela executada/apelante quanto à determinação/liquidação da quantia exequenda, foi proferida em 09-01-2024 decisão que julgou parcialmente procedente a reclamação da executada/apelante, fixando a liquidação da quantia exequenda e do crédito reclamado em € 196.326,84 (quantia exequenda de € 85.456,03 + crédito reclamado de € 110.870,81).

Quando a nulidade é suscitada no âmbito do recurso ordinário interposto da decisão, aplica-se o regime previsto nos n.os 1 a 5 do art. 617.º do Cód. Proc. Civil.
Assim, notificado da decisão que, conhecendo da nulidade, a deferiu, procedendo à alteração da decisão, pode o recorrente, no prazo de 10 dias contados da notificação da decisão, desistir do recurso interposto, alargar ou restringir o respetivo âmbito, em conformidade com a alteração sofrida pela decisão – n.º 3 do art. 617.º do Cód. Proc. Civil.
No caso em análise, não obstante o deferimento da nulidade e a alteração da decisão – nomeadamente com o deferimento quase total da reclamação apresentada pela executada quanto à liquidação da dívida exequenda e do crédito reclamado –, a executada/reclamante/ apelante nada disse, pelo que – não havendo lugar à aplicação do n.º 3 nem do n.º 4 do art. 617.º do Cód. Proc. Civil –, a decisão proferida em 09-01-2024, atento o disposto no n.º 2 do art. 617.º do Cód. Proc. Civil «(…) não assume autonomia, valendo como complemento e parte integrante da sentença recorrida, cujo recurso subirá em termos de incluir no seu objeto o que resultou da decisão do incidente (…)». – cfr. António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2018, p. 740. Assim, quando o juiz defere o pedido de declaração de nulidade, «(…) a nova decisão integra-se na sentença, que completa ou altera (n.º 2), ficando em função dela definido o objeto do recurso (…)» – cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2.º, 3.ª Edição, Almedina, pág. 745.
Daqui resulta, a nosso ver, que não tendo a executada/apelante, na sequência do despacho do tribunal a quo de 09-01-2024 (no qual, conhecendo da nulidade arguida no recurso interposto, foi emitida pronúncia sobre o cálculo da quantia exequenda e do crédito reclamado, fixando a liquidação, na data de 08-02-2023, da quantia exequenda em € 85.456,03 e do crédito reclamado em € 110.870,81), lançado mão de qualquer das hipóteses previstas no n.º 3 do art. 617.º do Cód. Proc. Civil, mantém-se como objeto do recurso a apreciação da reclamação da executada/apelante quanto à liquidação da quantia exequenda (e crédito reclamado), embora por referência à decisão alterada pelo despacho proferido em 09-01-2024.

Assim, são as seguintes as questões que cumpre a este tribunal apreciar:
1.º) – Liquidação da quantia exequenda à data de 08-02-2023: se ascende a € 85.456,03, de acordo com o cálculo efetuado pelo tribunal (Capital: € 62.178,93 e € 23.277,10 de juros de mora, calculados à taxa de juros a 4% de 03-10-2013 a 08-02-2023), ou ao montante de € 85.449,18 indicado pela apelante; liquidação do crédito reclamado à data de 08-02-2023: se ascende a € 110.870,81 de acordo com o cálculo efetuado pelo tribunal (Capital: € 90.483,50 e € 12.038,10 de juros de mora, calculados à taxa de juros a 4% de 15-10- 2019 a 08-02-2023), ou ao montante de € 110.860,90 indicado pela executada/apelante.
2.º) – (I)legalidade da afetação de valores emergentes da venda do direito de superfície sobre a fração autónoma designada pela letra “B” ao pagamento do crédito de € 34.959,02 que se encontra a ser executado no processo n.º ..., no qual é único executado o co-executado BB.
3.º) – Titularidade do saldo sobrante do produto da venda do direito de superfície sobre a fração autónoma designada pela letra “B”, designadamente, para efeitos de restituição.
4.º) – Acresce a responsabilidade pelas custas.

III – Fundamentação:

Factos processuais assentes

1. Execução sumária n.º 5682/13.0YYPRT
1. Em 03-10-2013 a exequente AA instaurou execução sumária n.º 5682/13.0YYPRT contra os executados BB e CC, para pagamento coercivo da quantia exequenda liquidada no requerimento executivo em € 62.178,93, nos seguintes termos:

No requerimento executivo, indicou os seguintes:
Factos:
1. Por escritura de 14 de agosto de 1998 alterada pelo instrumento contratual de revisão de spread, a Banco 1..., SA concedeu aos executados um empréstimo no montante de 15.000.000$00, correspondente a € 74.819,68 (Doc nºs 1 e 2);
2. Por escritura de 28 de julho de 2006 a Banco 1..., SA concedeu aos executados um empréstimo no montante de € 14.371,90 (Doc nº 3);
3. Estes créditos venciam juros à taxa, respetivamente de 9,544% e de 8,246%.
4. Estes créditos estão garantidos por hipotecas do direito de superfície da fração autónoma designada pela letra “B” de que são titulares os executados, correspondente a uma habitação tipo T dois em três níveis, garagem e logradouro, sita à Rua ... r/c Dtº e nº ..., que faz parte do prédio urbano, Bloco ..., sito em ..., Freguesia ..., concelho do Porto, descrita na 2ª Conservatória do Registo Predial do Porto, sob o nº ...... – Freguesia ... e inscrita na matriz sob o artº ....
5. Em consequência dos identificados empréstimos os executados, em 23 de julho de 2013, eram devedores de € 60.915,80, sendo € 48.438,42 relativos ao mútuo de 14 de agosto de 1998 e € 12.477,38 relativos ao mútuo de 28 de julho de 2006.
6. Por escritura de Cessão de Créditos de 23 de julho de 2013 a Banco 1..., SA cedeu, pelo valor nominal, à exequente, os identificados créditos sobre os executados (Doc nº 4).
7. Esta cessão foi total, abrangendo os créditos e as garantias hipotecárias que os caucionam (Doc nº 4).
8. As hipotecas e a cessão dos créditos foram objeto dos competentes registos prediais (Docs nºs 5 e 6).
9. Na sequência a exequente notificou os executados, nos termos e para os efeitos do artº 583 do Código Civil e da cláusula nona da escritura de cessão de créditos, das sobreditas transmissões (Docs nºs 7 e 8).
10. Notificação em que se solicitava o pagamento das prestações mensais vincendas de € 285,29 e € 43.67, até ao último dia de cada mês mediante transferência bancária (Docs nºs 7 e 8).
11. Acontece que se venceram as prestações relativa aos meses de julho e agosto de 2013, não tendo os executados procedido aos respetivos pagamentos.
12. Em face desta mora a exequente notificou os executados para liquidarem as prestações vencidas e não pagas, no prazo de dez dias, sob pena de sem outro aviso, considerar os contratos de empréstimo vencidos, exigindo o pagamento imediato de toda a dívida e promovendo a execução das hipotecas que os garantem (Docs nºs 9 e 10):
13. Tal como o estipulam os contratos ajuizados.
14. Mau grado isto, os executados não procederam ao pagamento das mencionadas prestações, pelo que a exequente considera os contratos incumpridos e os empréstimos vencidos.
15. Em face deste incumprimento a taxa de juro contratual é agravada com a sobretaxa de mora de 4%.
16. O crédito da exequente é certo, liquido e exigível e os títulos, por serem escrituras públicas, tem força executiva.

Juntou com o requerimento executivo os seguintes documentos:

1.1. Empréstimo de quinze milhões de escudos para aquisição de habitação própria permanente
a) Certidão de Escritura Pública de Compra e venda e Mútuo com Hipoteca outorgada em 14 de agosto de 1998, da qual consta, além do mais:
– Que o primeiro outorgante (A..., CRL, representada pelo procurado aí identificado), pela escritura e pelo preço de Esc. 21.357.000$00, que já recebeu, vende aos segundos outorgantes (os aqui executados BB e mulher CC), a fração autónoma designada pela letra B, correspondente a uma habitação com entrada pelo n.º ..., R/C-D e ... da Rua ..., que integra o prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., Freguesia ..., cidade do Porto, descrito na 2.ª CRPredial do Porto sob o n.º ... da Freguesia ..., encontrando-se o referido prédio registado a favor da Câmara Municipal ... pela inscrição G, Ap. ..., de 14/02/1991,e nele constituído o direito de superfície a favor da Cooperativa vendedora pela inscrição F, Ap. ... de 21/10/2996;
– Que pela referida escritura a Banco 1..., S.A., concede aos segundos outorgantes (parte devedora) um empréstimo da quantia de Esc. 15.000.000$00, importância de que aqueles se confessam devedores, regendo-se o empréstimo pelas cláusulas constantes da escritura e pelas cláusulas constantes do documento complementar arquivado como parte integrante da escritura;
– Que em garantia do capital emprestado, no referido montante de Esc. 15.000.000$00, dos respetivos juros até à taxa anual de 9,544%, acrescida, em caso de mora, de uma sobretaxa até 4% ao ano, a título de cláusula penal, e das despesas emergentes do contrato que, para efeitos de registo, se fixam em Esc. 600.000$00, os referidos segundos outorgantes BB e mulher CC constituem hipoteca sobre a fração autónoma atrás identificada.
b) Documento complementar elaborado nos termos do n.º 2 do art. 64.º do Cód. Notariado, do qual, além do mais que do mesmo consta, foi feito constar que o empréstimo se destinou à aquisição do imóvel hipotecado para a habitação própria permanente dos devedores BB e mulher CC, sendo, nos termos da cláusula 3.ª (Disposições legais aplicáveis), o empréstimo regulado pelo DL n.º 328-B/86, de 30 de setembro e demais disposições legais aplicáveis e tendo sido estipulado ainda, na cláusula 4.ª (Taxa de juro) que:
1 - O empréstimo vence juros à taxa aritmética simples das taxas Lisbor a seis meses, apurada com referência ao mês imediatamente anterior ao do início de cada período semestral de vigência do presente contrato (media essa designada por indexante), acrescido de um diferencial de 2,125 pontos percentuais, com arredondamento para o um dezasseis avos por cento a que corresponde a taxa efetiva de 6,565%.
2 – A caixa concede, no entanto, inicialmente à parte devedora uma dedução sobre aquela taxa (…) [por virtude da qual] a taxa de juro efetiva a cargo da parte devedora é, inicialmente de 6,432% ao ano.
3 – A taxa de juro determinada nos termos dos números anteriores manter-se-á durante cada período de seis meses.
Nos termos da cláusula 7.ª (Prazo de Amortização), o prazo para a amortização do empréstimo foi fixado em 30 anos, e nos termos do cláusula 8.ª (Prestações), ficou estipulado que o empréstimo será amortizado em prestações mensais constantes com bonificação decrescente, de capital e juros, vencendo-se a primeira no correspondente dia do mês seguinte ao da celebração do contrato e as restantes em igual dia dos meses seguintes, sendo o montante das prestações oportunamente comunicado pela credora.
Ficou ainda estipulado, na cláusula 13.ª (Direitos da credora), que à credora fica reconhecido o direito de (…) c) considerar o empréstimo vencido se (…) a parte devedora deixar de cumprir algumas das obrigações resultantes deste contrato.
c) Certidão de Alteração Contratual /Revisão de Spread, Escritura Pública de Compra e venda e Mútuo com Hipoteca, com carimbo de 08-11-2006, do qual resulta o acordo entre a Banco 1..., S.A:, e os devedores BB e mulher CC, na revisão do Spread de 2% para 0,5% (cláusula 1.ª), estipulando-se na cláusula 3.ª (Taxa de juros) que o empréstimo vence juros à taxa correspondente, para pagamentos mensais, à média aritmética simples das taxas EURIBOR a seis meses, apurada com referência ao mês imediatamente anterior ao início de cada período semestral de vigência do presente contrato (média essa designada por indexante), com arredondamento para o quarto por cento imediatamente superior e acrescida de um diferencial até # pontos percentuais e ainda, na cláusula 5.ª (Incumprimento/exigibilidade antecipada), que a Caixa poderá considerar antecipadamente vencida toda a dívida e exigir o seu imediato pagamento no caso de, designadamente: a) Incumprimento pela parte devedora (…) de qualquer obrigação decorrente deste contrato (…).

1.2. Empréstimo de € 14.371,90
d) Certidão de contrato de empréstimo no montante de € 14.371,91 outorgado no Notariado Privativo da Banco 1..., S.A., em 28 de julho de 2006, entre a Banco 1..., S.A., como primeiro outorgante, e BB e cônjuge CC, como segundos outorgantes, pelo qual a Banco 1..., S.A. concedeu aos segundos outorgantes um empréstimo no montante de € 14.371,91, de que aqueles se confessaram devedores, pelo prazo de 34 anos, vencendo juros à taxa de juro anual inicial de 3,5%, regendo-se pelas cláusulas do contrato e pela cláusulas constantes do documento complementar, destinado a financiar obras de beneficiação em habitação própria permanente, tendo os devedores, para garantia do capital emprestado, dos respetivos juros até à taxa anual de 8,246%, acrescida, em caso de mora, de uma sobretaxa até 4% ao ano, a título de cláusula penal, e das despesas emergentes do contrato que, para efeitos de registo, se fixam em € 564,88, declarado que constituem hipoteca sobre a fração autónoma designada pela letra B, de que são titulares em direito de superfície, sita à Rua ..., n.º ..., R/C D, e n.º ..., que faz parte do prédio urbano, Bloco ..., sito na Freguesia ... e descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º ..., constituído em propriedade horizontal pela inscrição F, Ap. ... de 15/07/1998 e inscrito no artigo ... da respetiva matriz predial urbana.
e) Documento complementar elaborado nos termos do n.º 2 do art. 64.º do Cód. Notariado, que constitui parte integrante do contrato de empréstimo referido na al. d), do qual, além de outras cláusulas dele constantes, que aqui se consideram reproduzidas, foi estipulado:
– nos termos da cláusula 5.ª, que o empréstimo vence juros à taxa correspondente à média aritmética simples das taxas EURIBOR a 3 meses, apurada com referência ao mês imediatamente anterior ao do início de cada período semestral de vigência do contrato (média essa designada por indexante), arredondada para o um quarto por cento imediatamente superior, e acrescida de um spread de 0,500%, o que se traduz atualmente na taxa de juro nominal, para pagamentos mensais, de 3,5% ao ano, a que corresponde a taxa efetiva de 3,557% ao ano;
– nos termos da cláusula 6.ª (Pagamento dos juros), que durante o prazo de utilização do empréstimo, os juros calculados dia a dia, serão liquidados e pagos no final de cada mês. Posteriormente serão incluídos nas prestações adiante referidas;
– nos termos da cláusula 10.ª (Amortização - Prestações), que o empréstimo será amortizado em prestações mensais constantes de capital e juros, vencendo-se a primeira no dia 28 do mês seguinte ao último mês do período de utilização e as restantes em igual dia dos meses seguintes;
– nos termos da cláusula 15.ª (Direitos da credora), que à credora fica reconhecido, além de outros direitos previstos nas restantes alíneas, nos termos da al. d), o direito de considerar o empréstimo vencido se o imóvel hipotecado for alienado sem o seu consentimento ou se a parte devedora deixar de cumprir algumas das obrigações resultantes do contrato;
– nos termos da cláusula 16.ª (Incumprimento/Exigibilidade Antecipada), que a Caixa poderá considerar antecipadamente vencida toda a dívida e exigir o seu imediato pagamento, designadamente, no caso de: a) Incumprimento pela parte devedora de qualquer obrigação decorrente deste contrato.

1.3. Contrato de cessão de créditos
f) Instrumento avulso nos termos do § 1.º do artigo 1.º do DL n.º 35982, de 23/11/1946 e al. a) do n.º 2 do art. 9.º do DL n.º 287/93, de 20 de agosto, outorgado em 23 de julho de 2013 no Notariado Privativo da Banco 1..., S.A., pelo qual a Banco 1..., S.A., como primeira outorgante, e a aqui exequente AA, como segunda outorgante, declararam que pelo referido instrumento a Banco 1..., S.A. cede à segunda outorgante os créditos, emergentes dos contratos de empréstimo supra referidos nas als. a) a e), que na data da outorga do contrato ascendem a € 60.915,80 (correspondendo € 48.438,42 ao empréstimo 1998 e € 12.477,38 ao empréstimo de 28 de julho de 2006), pelo preço de € 60.915,80, já recebido pela Banco 1..., S.A., de que esta dá quitação, importando a cessão a transmissão das garantias reais, e declarando a segunda outorgante aceitar a cessão de créditos.

1.4. Certidão do registo predial
g) Certidão permanente do Registo Predial, contendo a informação em vigor na data de 2013/07/29, referente ao imóvel descrito na CRPredial do Porto, Freguesia ..., sob o n.º ......, da qual constam os seguintes registos:
– Pela Ap. ... de 1998/07/24, registo de aquisição em direito de superfície por compra a favor de BB, casado com CC no regime de Comunhão de adquiridos (registo provisório por natureza, ulteriormente convertida em definitivo pela AP. ... de 1998/11/30).
– Pela Ap. ... de 1998/07/24, registo de hipoteca voluntária a favor da Banco 1..., S.A., para garantia do capital de 15.000.000,00 Escudos, com o montante máximo assegurado de 21.694.800,00 Escudos (registo provisório por natureza, ulteriormente convertida em definitivo pela AP. ... de 1998/11/30).
– Pela Ap. ... de 2006/07/24, registo de hipoteca voluntária a favor da Banco 1..., S.A., para garantia do capital de 14.371,91 Euros, com o montante máximo assegurado de 20.226,74 Euros, referente a empréstimo com o juro anual de 8,246%, acrescido de 4% na mora, a título de cláusula penal, Despesas EUR. 574,88 – Sobre o direito de superfície (registo provisório por natureza, ulteriormente convertida em definitivo pela AP. ... de 2006/11/30).
– Averbamento à Apresentação 6 de 1998/07/24 – Hipoteca Voluntária: Pela AP. ... de 2013/07/26 - Transmissão de Crédito a favor da exequente AA.
– Averbamento à Apresentação 55 de 2006/07/24 – Hipoteca Voluntária: Pela AP. ... de 2013/07/26 - Transmissão de Crédito a favor da exequente AA.

2. Em 10-12-2013 (Ref. 5395002) a Sr.ª AE juntou ao processo de execução, além do mais:
– Auto de Penhora do Direito de Superfície da fração autónoma designada pela letra B descrita na CRP do Porto, Freguesia ..., sob o n.º ......, com data de 24-10-2013;
– Certidão permanente do Registo Predial, contendo a informação em vigor na data de 2013/10/30 e válida até 29-01-2014, referente ao imóvel descrito na CRPredial do Porto, Freguesia ..., sob o n.º ......, da qual constam, além dos registos já acima referidos na al. g) do n.º 1., ainda o seguinte registo:


2. Embargos de executado n.º ...
3. Citados os executados, em 14-01-2014 (Ref. 5517307) a executada CC deduziu embargos de executado à execução, alegando como fundamento dos embargos que 1) a aquisição à Banco 1... do crédito por parte da Exequente (sua ex-sogra) visa a execução da garantia de modo a retirar do acervo hereditário dos bens do ex-casal (executados) o imóvel hipotecado, estando a dita fração avaliada em 300.000,00€; 2) não foi comunicada à Executada a cessão de créditos pois que só dela teve conhecimento através de uma missiva de 20.09.2013 (enviada posteriormente para outra morada e na qual se fazia referência à missiva onde foi comunicada a cessão); 3) não se verifica a resolução do contrato por não se ter verificado a falta de pagamento de três prestações como estatui o art. 7-B da Lei 59/2012 de 9 de Novembro.
4. Com a contestação da exequente, apresentada em 18-02-2014 (Ref. 5690619), foi junta cópia da sentença de 13 de junho de 2012 proferida no Processo de Divórcio sem consentimento n.º ... do 3.º Juízo de Família e Menores do Porto, que decretou o divórcio entre os executados BB e CC.
5. Em 05-02-2019 (Ref. 399673423) foi proferida sentença que julgou improcedentes os embargos deduzidos pela executada CC.
3. Processo de Inventário n.º ... (Juízo de Família e Menores do Porto – J 4)
6. Em 04-07-2017 (Ref. 15501267) foi junto ao apenso de embargos de executado n.º ..., pelo Juízo de Família e Menores do Porto – J 4, em resposta a solicitação do tribunal a quo, certidão extraída do Processo de Inventário para partilha de bens subsequente a divórcio, que aí correu termos sob o n.º ..., em que foi requerente o aqui executado BB e requerida a aqui executada CC, da qual resulta que a Verba 136 (Direito de superfície sobre a fração autónoma designada pela letra “B”, penhorado na execução, nos termos supra referidos em 2.) foi, na Ata de Conferência de Interessados realizada nesse processo de inventário em 25 de junho de 2015, licitada pela interessada CC.
7. Em 10-04-2018 (Ref. 18409606) foi junto ao apenso de embargos de executado nº ..., pelo Juízo de Família e Menores do Porto – J 4, em resposta a solicitação do tribunal a quo, nova certidão extraída do Processo de Inventário para partilha de bens subsequente a divórcio, que aí correu termos sob o n.º ..., da qual resulta, para além do mais, que foi adjudicado à aí interessada e aqui executada CC a Verba 136 (Direito de superfície sobre a fração autónoma designada pela letra “B”, penhorado na execução, nos termos supra referidos em 2.), conforme MAPA de PARTILHA de 10-03-2017, tendo nesse processo de inventário sido proferida, em 01-06-2017, sentença – transitada em julgado em 04-09-2017 – que homologou o mapa de partilha, adjudicando a cada um dos ex-cônjuges os quinhões que, no referido mapa de partilha, lhes foram atribuídos.

4. Apenso de reclamação de créditos n.º ...
8. Em 17-10-2019 (Ref. 23923471) a exequente AA apresentou, por apenso ao processo de execução, requerimento de reclamação de créditos, peticionando ao tribunal “se digne admitir a presente reclamação de créditos e verificar e reconhecer o crédito de € 98.842,71, acrescido de juros calculados à taxa de 4% desde 15-10-2019, até efetivo e integral pagamento, calculados sobre € 90.483,50, e bem assim graduar este crédito no lugar que lhe competir”.
Alegou como fundamentos da reclamação apesentada:
– No âmbito de processo de inventário judicial subsequente ao divórcio dos executados, para partilha dos bens comuns do dissolvido casal, que correu termos sob o n.º ... do Juízo de Família e Menores do Porto – J 4, o executado e interessado BB ficou credor de tornas, no montante de € 90.489,50 sobre a executada e interessada CC;
– O referido BB instaurou execução da sentença homologatória de partilhas para a cobrança de tal valor de € 90.489,50, tramitado com o n.º ...;
– Tendo o referido BB, subsequentemente, cedido à exequente tal crédito, a reclamante AA deduziu incidente de habilitação de cessionário, tendo sido habilitada na posição de exequente para prosseguir a referida execução;
– Nessa execução n.º ... foi penhorado o direito de superfície da fração “B” sita na Rua ..., nº ..., r/c – D, Porto, descrita sob o nº ... – Freguesia ..., na Conservatória do Registo Predial do Porto, tendo sido sustada a execução relativamente ao referido direito de superfície, em virtude da anterior penhora efetuada no processo de execução sumária n.º 5682/13.0YYPRT, reclamando a exequente o pagamento do seu crédito dado à execução naquele processo n.º ... pelo produto da venda do bem aí penhorado.
9. Com o requerimento de reclamação de créditos a credora reclamante AA juntou certidão judicial extraída do processo de Execução de Sentença nos próprios autos n.º ..., no qual é exequente a referida AA e executada CC, contendo cópias certificadas do requerimento executivo, e dos documentos juntos com este – relação de bens apresentada no processo de inventário n.º ..., MAPA de PARTILHA elaborado em 10-03-2017 e sentença homologatória do referido Mapa de Partilha, requerimento de reclamação de pagamento de tornas de € 90.483,50 da interessada CC, apresentado pelo referido BB, e sentença proferida em 19-03-2019, julgando a requerente AA habilitada no lugar de exequente, como cessionária do crédito de tornas que era credor o interessado e primitivo exequente BB, sentença de habilitação esta transitada em julgado em 10-04-2019.
10. Foi ainda junta Certidão Permanente do Registo Predial, contendo a informação em vigor na data de 2019/10/04, referente ao imóvel descrito na CRPredial do Porto, Freguesia ..., sob o n.º ......, da qual constam, além dos registos já acima referidos na al. g) do n.º 1. e do registo da penhora referido em 2., ainda o seguinte registo (ulteriormente convertido em definitivo pela AVERB – AP ... de 2019/09/24):


11. Em 13-07-2020 (Ref. 415902630) foi proferida sentença que reconheceu os créditos indicados pela reclamante AA e procedeu à sua graduação com o crédito do exequente pela forma seguinte:
1º - Quantia exequenda garantida por hipoteca.
2.º - Crédito reclamado.

5. Execução sumária n.º 5682/13.0YYPRT (continuação)
12. Em 04-03-2021 (Ref. 28291203) a Sr.ª AE notificou exequente e executados do teor da notificação para penhora de créditos datada de 01-03-2021, efetuada pelo processo de execução n.º ... do Juízo de Execução do Porto – J 1, notificando a AE de que «(…) nos termos do 773.º do Código de Processo Civil se consideram penhorados os créditos presentes e futuros que o executado BB (…) tenha a receber no âmbito do processo 5682/13.4YYPRT (…) em que o mesmo figura como executado, e no qual V. Exa desempenha funções de Agente de Execução, ficando o crédito à ordem da signatária, até ao montante de 32.518,45 (…)».
13. Em 21-04-2021 (Ref. 28674592) a executada CC, em resposta à comunicação efetuada pela Sr.ª AE da notificação para penhora de créditos efetuada pelo processo de execução n.º ..., informa que «(…) o executado BB não terá direito a qualquer remanescente por o prédio vendido ser da exclusiva propriedade da aqui executada, pelo que não existe qualquer crédito a penhorar. (…)», e solicita à AE que lhe seja remetida a resposta dada pela Sr.ª AE a tal notificação.
14. Conforme certidão de encerramento de leilão notificada pela Sr.ª AE ao exequente em 08-02-2023 (Ref. 34700100), em 07-02-2023 foi encerrado o leilão eletrónico de venda do direito de superfície do prédio urbano sito na Rua ... – r/c C-D e ..., Porto, tendo o mesmo sido licitado por € 325.494,69.
15. Face a requerimento enviado pela exequente à AE em 07-02-2023 (Ref. 34680778) pelo qual, invocando ser ascendente do executado, aquela se apresentou a exercer direito de remição relativamente ao referido bem vendido, a Sr.ª AE, em 08-02-2023 (Ref. 34700100) notificou a exequente/remidora para, além do mais, juntar o comprovativo do pagamento do depósito do preço para apreciação e aceitação do exercício do direito de remição.
16. Em 20-02-2023 (Ref. 34817493) a exequente remeteu à AE comprovativo do pagamento do remanescente do preço de € 76.788,81.
17. Em 21-03-2023 (Ref. 35133252) a Sr.ª AE profere decisão de aceitação do exercício pela exequente do direito de remição na venda do bem penhorado – direito de superfície da fração “B” correspondente a uma habitação sita na Rua ..., nº ..., r/c - D, Porto, descrita sob o nº ... - Freguesia ..., na Conservatória do Registo Predial do Porto – pelo preço de € 325.494,69, tendo ainda dispensado o depósito pela exequente da parte do preço de € 248.705,88, referente ao valor da quantia exequenda e crédito reclamado.

Subsunção dos factos ao direito

São as seguintes as questões de direito parcelares a abordar:
1. Liquidação da quantia exequenda e crédito reclamado, na data de 08-02-2023
2. Titularidade do bem vendido
2.1. Ilegalidade da afetação de valores emergentes da venda do bem penhorado ao pagamento de dívidas do executado
2.2. Restituição do saldo sobrante do produto da venda
3. Responsabilidade pelas custas

1. Liquidação da quantia exequenda e crédito reclamado, na data de 08-02-2023
A Sr.ª Agente de Execução liquidou a responsabilidade da aqui executada/apelante seguindo a liquidação que a exequente, em requerimento de 07/02/2023 (Ref. 44653183), lhe comunicou.
Assim, e quanto à liquidação da quantia exequenda, aplicou ao cálculo dos juros vincendos na pendência da execução o valor do juro diário que havia sido indicado no requerimento executivo – ou seja, as taxas de 13,54% (quanto ao empréstimo titulado pela escritura de 14-08-1998) e de 12,245% (quanto ao empréstimo titulado pela escritura de 28 de julho de 2006) – e que foram as taxas aplicadas pela exequente no cálculo dos juros vencidos liquidados no requerimento executivo (até 27/09/2013); a Sr.ª AE iniciou ainda o cálculo dos juros vincendos na data de 28-09-2013.
Quantia exequenda
Capital: € 60.915,80
Juros até 27-09-2013: € 1.263,13
Juros de 28/09/2013 a 07/02/2023: € 75.720,72
TOTAL: € 137.899,65
Quanto à liquidação do crédito reclamado, aplicou ao cálculo dos juros vincendos na pendência da execução um juro diário de € 9,92 calculados desde 18-10-2015 a 07-02-2023, num total de € 11 963,52 (1 206 dias x juro diário de € 9,92):
Crédito reclamado
Capital: € 90.483,50
Juros vencidos: € 8.359,21
Juros de 18/10/2019 a 07/02/2023: € 11.963,52
TOTAL: € 110.806,23

A executada/apelante CC, na reclamação apresentada contra tal liquidação, considerou sempre a aplicação da taxa de juros de mora de 4% ao cálculo dos juros vincendos, quer da dívida exequenda – e esta apenas a partir da data de 03-10-2013 (data da apresentação do requerimento executivo) e até 08-02-2023, calculando tais juros sobre o montante de € 62.178,93 –, quer do crédito reclamado – iniciando, quanto a esta, tal cálculo no dia 15-10-2019 e até 08-02-2023.
Assim, liquidou a quantia exequenda num total de € 85.449,18 (€ 62.178,93 + 23.270,25).
Quanto ao crédito reclamado, a executada, na reclamação apresentada, calculou os juros vincendos a partir de 15-10-2019, liquidando este crédito em € 110.860,90 (capital de € 90.483,50 + juros vencidos a 15-10-2019 no valor de € 8.359,21 e juros vincendos à taxa de 4% sobre a quantia em dívida desde 15-10-2019 e até 08-02-2023, num montante de € 12.018,19).

O tribunal a quo, na sequência do conhecimento da nulidade, deu razão parcial à executada/reclamante, liquidando a responsabilidade desta nos seguintes termos:
Quantia exequenda
Capital: € 62.178,93
Juros a 4% de 03-10-2013 a 08-02-20231: € 23.277,10
TOTAL: € 85.456,03

Há, por conseguinte, uma diferença de € 6,85.

Começaremos por dizer que a aplicação (acrítica) pela Sr.ª AE das taxas de juros que a exequente aplicou no cálculo dos juros vencidos na data da instauração da execução é desprovida de sentido, não tendo qualquer sustento legal nem no requerimento executivo (a exequente indicou tais taxas no cálculo que fez quanto aos juros vencidos – aceitando-se que, nessa parte, dada a falta de impugnação, essa liquidação dos juros vencidos se cristalizou –; não peticionou no requerimento executivo o pagamento de juros vincendos a tais taxas).
É ao Agente de Execução que incumbe efetuar a liquidação da quantia exequenda, nomeadamente, quanto aos juros vincendos, resultando claramente do disposto no art. 716.º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil, que “Quando a execução compreenda juros que continuem a vencer-se, a sua liquidação é feita a final, pelo agente de execução, em face do título executivo e dos documentos que o exequente ofereça em conformidade com ele ou, sendo caso disso, em função das taxas legais de juros de mora aplicáveis.
Assim, em cumprimento do determinado neste art. 716.º, n.º 2, e ainda nos arts. 719.º, n.º 1, e 847.º, todos do Cód. Proc. Civil, estava a Sr.ª Agente de Execução sujeita à aplicação da taxa legal prevista no art. 559.º do Cód. Civil, de 4% (Portaria n.º 291/2003, de 8 de abril, aplicável desde 01-05-2003), e não à aplicação das taxas de juros remuneratórias previstas nos contratos de créditos (estas visavam a remuneração dos empréstimos na vigência dos contratos, sendo que a exequentede acordo com o por si alegado no requerimento executivo –, dada a alegada falta de pagamento das prestações de reembolso de capital e pagamento dos juros remuneratórios, exigiu o reembolso antecipado dos valores mutuados em dívida, nos termos das cláusulas dos contratos transcritas no ponto 1. da fundamentação de facto, pelo que apenas pode exigir, na execução, o pagamento da indemnização moratória devida pelo atraso na restituição dos valores vencidos, e não o pagamento dos juros remuneratórios acordados nos contratos para a restituição do capital em prestações, pelos prazos acordados de duração dos contratos).
Sendo a taxa de juros de mora aplicável a referida taxa de 4%, e uma vez que, quer a executada/apelante, quer o tribunal, calcularam os juros de mora sobre o valor de € 62.178,93, não havendo dissídio nessa parte submetido, no recurso interposto, à apreciação deste tribunal ad quem, concluímos que o cálculo de juros de mora efetuado pela executada/apelante é o correto.
Tal como a executada, o valor que obtivemos em programa de cálculo de juros de mora à taxa de juros civis é o de € 23.270,25:

Quanto à liquidação do crédito reclamado, também fica por explicar a diferença entre o valor obtido pelo tribunal a quo quanto aos juros vincendos (€ 12.028,10) face ao valor liquidado pela executada/apelante (€ 12.018,19), uma vez que em ambos os cálculos consideraram o valor de capital de € 90.483,50, a taxa de 4% e o período de 15-10-2019 a 08-02-2023.
Tal como a executada, o valor que obtivemos em programa de cálculo de juros de mora à taxa de juros civis é o de € 12.018,19:



Concluímos, deste modo, que o cálculo de juros de mora efetuado pela executada/apelante é o correto, ascendendo a liquidação da responsabilidade da executada, na data de 08-02-2023, ao total de € 196 310,08, assim discriminado:
Quantia exequenda: € 85.449,18 (€ 62.178,93 + 23.270,25).
Crédito reclamado: € 110.860,90 (capital de € 90.483,50 + juros vencidos a 15-10-2019 no valor de € 8.359,21 e juros vincendos à taxa de 4% sobre a quantia em dívida desde 15-10-2019 e até 08-02-2023, num montante de € 12.018,19).

2. Titularidade do bem vendido
Na decisão recorrida, considerou o tribunal a quo o seguinte:
«Quanto à propriedade do direito de superfície sob o prédio urbano, sito na Rua ..., inscrito na matriz urbana sob o artigo ... Fração “B” da União das freguesias ..., ... e ..., e descrito na CRP do Porto sob o n.º ... fração “B”, a verdade é que o direito de propriedade mostra-se inscrito no registo a favor de ambos os executados, e até à venda não se verificou qualquer registo de aquisição que prove que o direito sob o bem imóvel é da propriedade exclusiva da executada, CC, razão pela qual a quantia sobrante da conta final deve ser entregue a ambos os executados em partes iguais.».
Nos termos do disposto no art. 1.º do Cód. do Registo Predial, o registo predial “destina-se essencialmente a dar publicidade à situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio jurídico imobiliário” e, por força do disposto no art. 7.º do mesmo diploma, que estabelece uma presunção iuris tantum – por conseguinte, ilidível (art. 350.º do Cód. Civil) –, “O registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define.”.
É, assim, incontroverso que – com a exceção da hipoteca (art. 687.º do Cód. Civil) – no regime jurídico nacional o registo predial não tem efeitos constitutivos.

Daqui resulta de forma absolutamente clara, face ao apurado nos pontos 6. e 7. e 14. a 17. da fundamentação de facto, que, na data em que, no processo de execução, se concretizou a alienação do direito de superfície da fração “B” sita na Rua ..., nº ..., r/c – D, Porto, descrita sob o nº ... – Freguesia ..., na Conservatória do Registo Predial do Porto (o leilão eletrónico encerrou em 07-02-2023, tendo sido proferida, em 21-02-2023, decisão da Sr.ª AE de aceitação exercício pela exequente do direito de remição na venda do bem penhorado), tal direito era propriedade exclusiva da executada/apelante, por a mesma o ter adquirido em consequência da partilha dos bens comuns do dissolvido casal, constituído por si e pelo executado, no âmbito do processo de inventário n.º ... do Juízo de Família e Menores do Porto, J4. A executada/apelante adquiriu o referido bem, sendo a sua exclusiva titular desde 01-06-2017, data da sentença que homologou o mapa de partilha, adjudicando a cada um dos ex-cônjuges os quinhões que, no referido mapa de partilha, lhes foram atribuídos (tendo o referido direito de superfície – verba 136 – sido adjudicado à executada/apelante) – como resulta de forma inequívoca do ponto 7. da fundamentação de facto.
Com efeito, emerge da fundamentação de facto – n.os 4., 6. e 7. – a prova da aquisição derivada (ato aquisitivo sucessivo ao primitivo ato de aquisição inscrito no registo) pela executada/apelante, do direito de superfície da fração “B” sita na Rua ..., nº ..., r/c – D, Porto, descrita sob o nº ... – Freguesia ..., na Conservatória do Registo Predial do Porto: a aquisição pela executada, em 01-06-2017, por partilha efetuada no processo de inventário n.º ... do Juízo de Família e Menores do Porto, J4, do referido direito de superfície – arts. 1788.º, 1789.º, n.º 1, 1790.º, do Cód. Civil, e arts. 1082.º, al. d), 1084.º, n.º 2 e 1133.º, todos do Cód. Proc. Civil –, que integrava o património comum do dissolvido casal, como emerge do registo de aquisição no registo predial, efetuado pela Ap. ... de 1998/07/24, da aquisição a favor de ambos os executados, casados na comunhão de adquiridos, por compra, do referido direito.
Assim, embora na data da penhora o direito de superfície da fração B integrasse o património comum do dissolvido casal, não subsistem dúvidas de que, por força da partilha operada em inventário subsequente a divórcio, tal bem passou ulteriormente a ser propriedade exclusiva da executada/apelante, por lhe ter sido adjudicado por sentença homologatória da partilha proferida em 01-06-2017.

2.1. Ilegalidade da afetação de valores emergentes da venda do bem penhorado ao pagamento de dívidas do executado
Resulta da fundamentação de facto que, no âmbito do processo de execução n.º ... do Juízo de Execução do Porto – J 1, em que é executado BB, foi efetuada notificação (datada de 01-03-2021) à Sr. Agente de Execução do processo aqui em recurso da penhora de «(…) créditos presentes e futuros que o executado BB (…) tenha a receber no âmbito do processo 5682/13.4YYPRT (…) em que o mesmo figura como executado, e no qual V. Exa desempenha funções de Agente de Execução, ficando o crédito à ordem da signatária, até ao montante de 32.518,45 (…)».
A sr. AE, na notificação da conta final da execução efetuada às partes em 05-09-2023, indicou que o montante de € 34.959,02 do produto da alienação do direito de superfície da fração autónoma designada pela letra B se destinava ao pagamento do “Crédito reclamado no Proc....”.
Tal é absolutamente desprovido de fundamento, sentido e base legal, designadamente porque o produto da venda constitui, como emerge do supra expedido em 2., bem – património – da titularidade exclusiva da executada/apelante, por mesma ter adquirido o referido bem penhorado nesta execução em data anterior à realização da venda.
Com efeito, a notificação referida no n.º 12. da fundamentação de facto constitui uma notificação efetuada à Sr.ª AE da penhora (ordenada no processo ... do Juízo Execução do Porto – J1, e até ao limite de € 32.518,45), de qualquer crédito que executado BB tenha ou possa vir a receber no referido processo de execução n.º 5682/13.0YYPRT.
O suposto credor BB, sendo executado nesta execução n.º 5682/13.0YYPRT, nela apenas poderá ter a posição de credor de valores que lhe devessem ser restituídos.
Ora, na data da notificação da penhora dos putativos (potenciais) direitos de crédito do executado – ou seja, em março de 2021 – o bem penhorado (direito de superfície) já havia sido adquirido pela executada/apelante CC, no âmbito da partilha em processo de inventário judicial (ver n.º 7. da fundamentação de facto).
Aliás, nessa data a Sr.ª Agente de Execução já sabia – ou deveria ter sabido – que o bem penhorado havia sido adquirido pela referida executada/apelante no âmbito do processo de inventário, dado que tal aquisição é expressamente alegada pela exequente/credora reclamante no requerimento de reclamação de créditos e consta provada pela documentação junta pela mesma com esse requerimento, sendo que o crédito reclamado pela exequente, e graduado por sentença proferida em 13-07-2020 no apenso de reclamação de créditos n.º ..., respeita precisamente ao direito do executado BB a tornas devidas pela executada CC por força da aludida partilha (crédito esse que o referido executado veio a ceder à exequente/credora reclamante) – vejam-se os n.os 8. a 11. da fundamentação de facto.
É, pois, manifesto que o produto da venda do bem penhorado apenas pode ser utilizado para efetuar o pagamento da quantia exequenda e do crédito reclamado e graduado no apenso n.º ... (crédito este de que é única devedora a aqui executada/apelante), não se confundido a notificação para penhora de créditos do executado BB, efetuada pelo Processo de Execução n.º ... do Juízo Execução do Porto – J1, com um crédito reclamado passível de ser pago, nos termos previstos no art. 796.º do Cód. Proc. Civil, pelo produto da venda do bem penhorado neste processo de execução n.º 5682/13.0YYPRT.
Acresce que o valor sobrante da venda – que não seja afeto ao pagamento da quantia exequenda nem do crédito reclamado nem das despesas e honorários do AE (atento o disposto no art. 541.º do Cód. Proc. Civil) –, sendo propriedade de terceiro distinto do executado BB, não é passível de ser penhorado para pagamento de dívidas deste, uma vez que, com exceção dos casos previstos no art. 818.º do Cód. Civil, apenas o património do devedor é responsável pelo cumprimento das respetivas obrigações (art. 817.º do Cód. Civil e art. 735.º do Cód. Proc. Civil).
Concluímos, deste modo, pela procedência do recurso nesta parte (uma vez que a decisão recorrida indeferiu a reclamação apresentada pela executada quanto à ‘decisão’ da Sr.ª AE de realização de pagamento, pelo produto da venda, do valor de € 34.959,02 referente ao – assim denominado pela mesma – “Crédito reclamado no Proc....”).

2.2. Restituição do saldo sobrante do produto da venda
De igual modo, e sem qualquer necessidade de mais considerações para além das acima expendidas, concluímos que, efetuado que seja o pagamento da quantia exequenda (de € 85.449,18), do crédito reclamado (110.860,90) e das despesas e honorários da AE em falta, indicados na conta final, e não impugnados (€ 4.401,75), o remanescente do produto da venda (remição) do direito de superfície da fração autónoma designada pela letra B (que ascendeu a € 325.494,69) deve ser integralmente restituído à executada/apelante, única titular do bem alienado.

3. Responsabilidade pelas custas
A decisão sobre custas da apelação, quando se mostrem previamente liquidadas as taxas de justiça que sejam devidas, tende a repercutir-se apenas na reclamação de custas de parte (art. 25.º do Reg. Cus. Proc.).
A responsabilidade pelas custas do recurso cabe ao executado/apelado, dado que o mesmo apresentou contra-alegações pugnando pela improcedência do recurso (art. 527.º do Cód. Proc. Civil), incidindo a decisão recorrida sobre uma decisão da Agente de Execução, não tendo a exequente apresentado resposta ao recurso.

IV – Dispositivo:

Pelo exposto, acordam os juízes que integram a 3.ª Secção deste Tribunal da Relação do Porto em julgar integralmente procedente o recurso de apelação interposto pela executada/apelante CC e, revogando-se a decisão recorrida, defere-se a reclamação apresentada pela executada/apelante, determinando-se a retificação da conta final em conformidade (afetação do valor € 325.494,69 ao pagamento da quantia exequenda de € 85.449,18, do crédito reclamado de € 110.860,90 e das despesas e honorários da AE em falta de 4.401,75, restituindo-se à executada/apelante o remanescente).

Custas deste recurso (interposto pela executada/apelante) a cargo do executado/apelado BB.
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Notifique.
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Porto, 10 de julho de 2024
Ana Luísa Loureiro
Isabel Ferreira
Carlos Portela