Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
285/16.0T8ESP.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANA LUCINDA CABRAL
Descritores: PROPRIEDADE HORIZONTAL
ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
PROVIDÊNCIA CAUTELAR
SUSPENSÃO DAS DELIBERAÇÕES DA ASSEMBLEIA DE CONDOMÍNIO
ACÇÃO DE ANULAÇÃO
CADUCIDADE
Nº do Documento: RP20180911285/16.0T8ESP.P1
Data do Acordão: 09/11/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Indicações Eventuais: 2ªSECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º843, FLS.18-28)
Área Temática: .
Sumário: I - Coloca-se agora a questão de determinar se, proposta a providência cautelar de suspensão de deliberação, haverá ainda que, antes dela ser julgada, propor a acção de anulação, para se não deixar esgotar o prazo de 60 dias ou se, pelo contrário, o autor tem a possibilidade de, nos termos do artigo. 389º, nº. 1, al. a), do CPC, propor a acção de anulação nos 30 dias posteriores à notificação do deferimento da providência cautelar.
II - A tese maioritária entende que os prazos dos artigos. 389º, nº. 1, al. a) do CPC, e do nº 4 do artigo 1433º do C. Civil são diferentes e possuem natureza distinta, pois o previsto na 1ª. norma é processual, enquanto o outro é substantivo.
III - Portanto, o pedido cautelar preliminar não deve ser considerado idóneo para impedir a caducidade.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. nº 285/16.0T8ESP.P1
Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro
Juízo de Competência Genérica de Espinho - Juiz 1
Acordam no Tribunal da relação do Porto
I. Relatório
B… intentou a presente acção declarativa contra os condóminos representados pela administradora de Condomínio, a firma C… UNIPESSOAL, LDA, que comercialmente usa “D…”, com filial/escritórios na Rua …, n.º …, …, …. – … ESPINHO, pedindo que se (1) declare a nulidade, anulabilidade e ineficácia da Assembleia e das deliberações constantes da acta de vinte e três de Janeiro de 2016, já suspensas na sua execução; (2) que se declare a nulidade, anulabilidade e ineficácia da Assembleia e das deliberações constantes da acta de sete de Novembro de 2015, e ainda que (3) se declare que seja reconhecida a autonomia das entradas e garagem em relação ao condomínio geral para a eleição da sua administração própria interna e divisão de despesas próprias comuns, seguindo-se os ulteriores termos do processo até final.

Regularmente citado o réu apresentou contestação, invocando além do mais, a caducidade de acção e da providência cautelar, a ilegitimidade passiva da ré, tendo ainda impugnado os factos alegados pelo autor.

Por requerimento apresentado a 24.10.2016, e no exercício do contraditório quanto às excepções aduzidas pelo réu, veio o autor requer que se julguem improcedentes as excepções deduzidas e ainda que se “declare a legitimidade activa do A., bem como a nulidade, anulabilidade e ineficácia das Assembleias e das deliberações constantes da actas de 20 de Outubro de 2015, 7 de Novembro de 2015 e 23 de Janeiro de 2016, requerendo-se ainda tudo o demais como inicialmente, seguindo-se os ulteriores termos do processo até final”.

Devidamente notificado, quanto a este novo pedido, o réu, declarou manter tudo o por si alegado em sede de contestação.

Foi proferida sentença em sede de saneador, como seguinte dispositivo: “Pelo exposto, em conformidade com as citadas disposições legais, julga-se:
- procedente a exceção dilatória de nulidade de todo o processo, por ineptidão da petição inicial, por falta ou ininteligibilidade da causa de pedir do segundo pedido formulado pelo autor B… e, em consequência absolvem-se os réus Condóminos que aprovaram as actas representados pela Administradora de Condomínio, a firma C… UNIPESSOAL, L.DA, que comercialmente usa “D… da instância quanto ao pedido de “reconhecimento da autonomia das entradas e garagem em relação ao condomínio geral para a eleição da sua administração própria interna e divisão de despesas próprias comuns”;
- procedente, por provada, a exceção perentória de caducidade do direito de impugnar as deliberações das actas de 23.01.2016, 7.11.2015 e 20.10.2015 deduzida pelos réus Condóminos representados pela Administradora de Condomínio, a firma C… UNIPESSOAL, L.DA, que comercialmente usa “D…”, em consequência, absolvo-os do pedido que contra si foi deduzido pelo autor B….”

O autor B… interpôs recurso, concluindo:
a) Defende o Tribunal a quo que, procede “excepção dilatória de nulidade de todo o processo, por ineptidão da petição inicial, por falta ou ininteligibilidade da causa de pedir do segundo pedido formulado pelo autor”… e em consequência absolvem-se os Réus da instância quanto ao pedido de “reconhecimento da autonomia das entradas e garagem em relação ao condomínio geral para a eleição da sua administração própria interna e divisão de despesas próprias comuns”;
b) Considera ainda o Tribunal a quo que, procede, por provada a excepção peremptória de caducidade do direito de impugnar as deliberações das actas de 23/01/2016, 7/11/2015 e 20/10/2015, deduzida pelos Réus absolvendo-os dos pedidos formulados pelo Autor;
c) O R não se conforma com ambas as decisões as quais são o corolário dos fundamentos invocados para cada uma delas e pelas razões anteriormente aduzidas e descritas que fundamentam o presente recurso, conforme a seguir se sintetizam.
d) Do despacho prévio á sentença que manda desentranhar o requerimento oferecido para esclarecer o segundo pedido, por se entender um aperfeiçoamento que não foi ordenado.
e) O Autor refere a descrição dos factos e do direito que sustentam o seu pedido e causa de pedir a partir do artigo 103 até ao 118 da sua PI;
f) Entende que a decisão sobre a administração da entrada ser a mesma do condomínio geral ou das garagens, é uma decisão que compete em primeira linha aos condóminos dessa entrada, com zonas comuns e despesas próprias;
g) Ao aprovar um só orçamento e uma só administração para todo o edifício, como se fez nas actas colocadas em crise, impôs-se uma administração, a todas as entradas.
h) Tal configura uma deliberação ilegítima, ineficaz e inexistente i) O Réu/Recorrido, detectou, compreendeu, alcançou, pronunciou-se, considerou e respondeu ao pedido e á causa de pedir designados por “segundo pedido”. O que fez em três momentos diferentes da sua contestação.
j) Na base deste problema está o facto de os condóminos da entrada, e em concreto, o Autor, não querer(em) a administração do condomínio geral a administrar as coisas próprias da entrada que habitam.
k) Vontade que é condicionada e restringida pelas deliberações do condomínio geral contrárias ao interesse da entrada. De qualquer entrada.
l) Se não se percebe o pedido e a causa de pedir deve convidar-se ao aperfeiçoamento, como meio de o esclarecer. O que pode ser sempre realizado.
m) Mas já não se percebe que se rejeite o requerimento onde se tenta esclarecer um pedido (já respondido pelos R). com o desentranhamento desse requerimento. E isto num quadro de colaboração entre os intervenientes processuais com vista á composição de um litigio. Que existe e precisa de ser composto.
n) Não deve o dito requerimento ser desentranhado, embora possa ser esclarecido ou aperfeiçoado. E o Réu convidado a pronunciar-se sobre o seu teor.
o) Deverá o despacho ser substituído por outro que convide o requerente a suprir as insuficiências na exposição, concretizando os factos em que baseia a sua pretensão.
p) Do pedido de impugnação das deliberações da Assembleia de 24/10/2015.
q) Esta acta é trazida aos autos pelos Réus, na sua contestação. Antes desse momento não foi referida pelo Autor.
r) Para justificar e sustentar a origem fundadora do seu direito de convocar a reunião de 7/11/2015.
s) Notificado a pronunciar-se sobre as excepções aduzidas pelo R., na sua contestação, o A. pronunciou-se, (entre vários outros assuntos), pela nulidade da acta de 24/10/2015, apresentada aos autos como facto novo constitutivo de um direito.
t) Vícios apontados na PI, e já descritos sinteticamente neste articulado como nulidades, para onde se julga dever remeter, em vez de se inserirem aqui;
u) Vícios apontados em todas as assembleias, (quer na de 24/10/2015, quer na de 7/11/2015 e na de 23/01/2016).
v) Este é um facto novo, trazido à discussão pelos R. na sua contestação.
(Facto que diz ser fundador do seu direito). Não é, uma ampliação do pedido inicial. É matéria controvertida, e, como tal, objecto de resposta pelo A.
w) E, mais uma vez, deve que ser objecto de análise e composição judicial.
x) Da alegada ineptidão da petição inicial, quanto ao segundo pedido.
y) Consideremos o que já se referiu no início destas conclusões sobre este tema do reconhecimento da “…autonomia das entradas e garagem em relação ao condomínio geral para a eleição da sua administração própria interna e divisão de despesas próprias comuns, …”
z) Causa de pedir, facto concreto que fundamente o pedido do A. radica nas deliberações tomadas e actas em crise.
aa) E na oposição destas com a vontade do A de ter um condomínio próprio da entrada, com a realidade física do edifício, com a prática dos trinta anos anteriores e com a descrição das zonas comuns da Propriedade horizontal do prédio.
bb) Deliberações e actas que ditam um administrador e um orçamento para todos, excluindo o interesse legalmente tutelado do A em ter um condomínio para a sua entrada separado;
cc) Separado do das outras sete entradas. Separado do da garagem. Separado do condomínio geral.
dd) Com as deliberações e actas é afastada e excluída a autonomia interna da entrada em relação às outras zonas do prédio;
ee) Sem que essas zonas, sejam convidadas a pronunciar-se e decidir, o que apenas acontecerá na assembleia da entrada e não numa assembleia do condomínio geral, como aconteceu, onde vota todo o prédio e não só a entrada.
ff) Também é causa de pedir, a reunião ter sido convocada por quem não o podia fazer validamente (administrador da garagem). A par dos outros já descritos este é um facto real que traduz uma nulidade…
gg) Não terá isto efeitos, ou mesmo sustentar o pedido e ser a causa de pedir do A?
hh) Como refere Sandra Passinhas in “A Assembleia de condóminos e o administrador na propriedade horizontal” (2ª edição, Almedina, pág. 241 e seg.s): “Nestes casos, o direito de voto cabe somente aos condóminos que residem nessa parte do edifício. A opinião contrária geraria uma intromissão injustificada em assuntos alheios, que a proximidade física ou a ligação funcional não justificam.”
ii) Acrescentando “…quando a deliberação respeita à gestão ou à aprovação de despesas para a conservação das partes necessárias e úteis só a alguns imóveis e, por isso, respeitantes só a determinados condóminos, na assembleia tomam parte só os condóminos interessados, contando-se a maioria com referência ao valor das fracções autónomas a que respeitam as
deliberações”. in Sandra Passinhas, obra referida.
jj) Ou a Jurisprudência do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto “Ainda que se trate de um só edifício é admissível a organização de vários condomínios para um mesmo prédio, a par do condomínio que pode e deve existir para o edifício como unidade predial, sempre que a respectiva configuração arquitectónica deste possibilite a autonomização de distintas estruturas de partes desse prédio, apresentando-se as mesmas devidamente delimitadas e definidas fisicamente, com entradas próprias, com zonas comuns próprias…”
kk) Mais uma vez se nota que os RR. nenhuma dúvida tiveram em relação á causa de pedir, perceberam a causa de pedir, dissertando sobre ela …
ll) O que serve para introduzir o tema da suposta alteração da Propriedade Horizontal. É um equívoco;
mm) Só se falou na Propriedade Horizontal para pedir o cumprimento e respeito do Titulo Constitutivo da Propriedade Horizontal e do teor da certidão da conservatória do registo predial do edifício.
nn) Não se alcança, o conteúdo da sentença recorrida quanto a este assunto da suposta alteração da Titulo Constitutivo da Propriedade Horizontal e do teor da certidão da conservatória do registo predial do edifício, que repita-se, nunca se requereu…
oo) Em concreto diz a certidão da conservatória do registo predial do edifício, que se transcreve que: “São comuns às fracções AC, AD, AE, AZ, BA, BB, BU, BV, BX, CS, CT, CU, DN e DO a entrada pelo nº …, da Rua …, escadas e patamares de acesso aos andares, ascensores e a respectiva casa das máquinas;”
pp) São pelo menos cinco as zonas comuns (descritas) a este conjunto de fracções que constituem uma das oito entradas que são tratadas igualmente.
qq) Alterar a Propriedade Horizontal para quê? Se já se tem a possibilidade de uma entrada do prédio, (autónoma de acordo com o Titulo Constitutivo da propriedade horizontal) eleger, por si, e para si, se o entender, a sua administração de forma autónoma e independente do condomínio geral.
rr) O que está em crise são as deliberações tomadas pelo condomínio geral e impugnadas. Por irem contra a possibilidade de qualquer entrada, e em concreto, a do A., gerir as suas despesas próprias comuns de forma autónoma e independente das outras entradas e do condomínio geral.
ss) São regras imperativas da Lei da propriedade horizontal que se encontram violadas e em crise por força das deliberações tomadas por um condomínio geral ilegítimo.
tt) Se dúvidas havia quanto ao pedido, (que de resto nunca ocuparam o espírito dos R.) deveria haver um convite ao aperfeiçoamento da pretensão do A. Que não foi feito.
uu) Nestes termos, considera-se que o segundo pedido realizado pela A., colocado em crise, deve ser admitido e analisado, uma vez que a alegada excepção dilatória de nulidade de todo o processo, por ineptidão da petição inicial, por falta ou ininteligibilidade da causa de pedir do segundo pedido formulado pelo Autor não se verifica, nos termos sustentados na sentença objecto de recurso.
vv) Requerendo-se que seja declarada e “reconhecida a autonomia das entradas e garagem em relação ao condomínio geral para a eleição da sua administração própria interna e divisão de despesas próprias comuns” por tal estar de acordo com a Lei e com o Titulo Constitutivo da Propriedade Horizontal.
ww) Da Caducidade do direito quanto aos primeiros pedidos - Entende o Tribunal recorrido que os prazos para a impugnação das deliberações decorreu, sem que o A nada tivesse feito para o interromper ou suspender, pelo que o seu direito caducou.
xx) Não se subscreve o mesmo entendimento, como veremos. Mas sempre se dirá que não seria possível interromper o prazo com o instituto da inversão do contencioso por não existirem os requisitos cumulativos de aplicação nem se mostrava viável a convocação de uma assembleia para revogar deliberações.
yy) Entende-se antes que tal prazo foi interrompido no momento de entrada do procedimento cautelar de suspensão de deliberações do condomínio, uma vez que o mesmo é preliminar da acção principal futura;
zz) Acresce que existe identidade quanto às partes, quanto ao pedido e quanto á causa de pedir. Os Réus foram citados para os autos do procedimento cautelar. Dúvidas não existem que se pretendeu atacar e atacou a validade das deliberações, como se veio a fazer com a acção principal. O que tanto pode ser feito por via de uma acção principal, como com um procedimento cautelar com o mesmo fim.
aaa) Mandando o bom senso jurídico que se aguarde pela decisão do procedimento cautelar para avaliar os termos da acção principal, que se seguirá. Em vez de realizar a duplicação de processos com identidade de pedidos, causas de pedir e partes. Tanto mais que os R. já tinham sido citados e contestado.
bbb) E assim se considera interrompido, o prazo de caducidade do artigo 1433º n.º 4, com a entrada do procedimento cautelar visando as invalidades da deliberação. Ainda que assim não se entenda.
ccc) Dispõem o artigo 1433 n.º 1 que “As deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado.”
E o número 2, permite a convocação de uma assembleia “…para revogação das deliberações inválidas ou ineficazes.”
ddd) Se tivermos em linha de conta o conceito de “invalidade”, enquanto contraposto ao de “inexistência”, aquela, abrange quer a nulidade quer a anulabilidade, teremos que, a lei actual admite e permite três categorias de vícios das deliberações de uma assembleia de condóminos. Deliberações nulas, anuláveis e ineficazes.
eee) Serão nulas, as deliberações tomadas pela assembleia de condóminos que infrinjam normas de natureza imperativa, por visarem a prossecução de interesses indisponíveis e de ordem pública;
fff) Abílio Neto, indica como NULAS, entre outras:
“…as deliberações tomadas em assembleia geral não convocada, salvo se todos os condóminos tiverem estado presentes ou representados;” …
“… a que autorize a realização de obras novas que prejudiquem a segurança,
a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício (art1422,nº 2, a);” …
“… a que retire a qualquer condómino, no todo ou em parte, o direito de voto que lhe é reconhecido pelo n.º 2 do artigo1430;” …
“… a que proíba ou restrinja a representação dos condóminos por procurador, n.º 3 do artigo1431;”.
ggg) Abílio Neto, indica como INEFICAZES: “aquelas que têm por objecto assuntos que exorbitam da esfera de competência da assembleia de condóminos, seja porque dizem respeito á propriedade exclusiva de cada condómino, seja porque representam uma ingerência no domínio ou administração exclusiva que qualquer proprietário tem sobre a sua própria fracção.
hhh) Onde subsumimos o “segundo pedido” realizado e colocado em crise pela douta sentença. Porque as zonas próprias de um conjunto de condóminos e fracções do prédio (entrada) são retiradas da disponibilidade dos seus proprietários comuns para passarem a fazer parte apenas de um condomínio geral. Que não lhes reconhece essa autonomia, que é limitada é certo, mas existe e quer ser exercida.
iii) Se a deliberação é nula, entendida esta expressão em sentido técnico, é-lhe aplicável o regime geral das nulidades, as quais operam “ipso iure”, isto é são de conhecimento oficioso, invocáveis por qualquer interessado e a todo o tempo (artigo 286 do CC), sendo ainda insanáveis mediante confirmação (artigo 288 do CC);
jjj) O regime do artigo 1433, nos prazos e termos ali fixados, aplica-se apenas ás deliberações anuláveis e nunca ás consideradas nulas e as ineficazes.
kkk) Não se quis afastar o regime geral das invalidades e criar um regime especialíssimo para a propriedade horizontal. E a doutrina já deu resposta como referem Abílio Neto, Sandra Passinhas e ainda Lobo Xavier;
lll) Abílio Neto (in “Manual da Propriedade Horizontal”- 3ª edição, Ediforum, pag.s 347e 348 e seg.s), considera que o referido regime do artigo 1433, se aplica exclusivamente ás deliberações anuláveis, regendo-se as demais pelo regime geral, pois essa é a única solução “que se harmoniza com a interpretação intrasistemática do questionando normativo”. Considerando, ainda, que “nas deliberações nulas” … “qualquer condómino pode, a todo o tempo, recorrer à via judicial a fim de obter a declaração de nulidade da deliberação”.
mmm) Sandra Passinhas, diz deste artigo1433 que: “A lei não se refere às deliberações nulas nem ás ineficazes, que seguem o regime geral.”
Continua, dizendo que “Temos assim, em matéria de deliberações da assembleia de condóminos, de distinguir os vícios que enfermam as deliberações de nulidade daqueles que as enfermam de anulabilidade: estas últimas são sanáveis com deliberações sucessivas e a invalidade deve ser feita valer no prazo do art. 1433 ”. Acrescenta que: “Quando a assembleia infrinja normas de interesse e ordem pública, as deliberações tomadas devem considerar-se nulas e, como tal, impugnáveis a todo o tempo e por qualquer interessado nos termos do artigo 286” - Sandra Passinhas in “A Assembleia de condóminos e o administrador na propriedade horizontal” (2ª edição, Almedina, pag. 251);
nnn) Todos concluem, chamando á atenção para o perigo de tratar todos os vícios da mesma forma e de os sujeitar ao mesmo regime do artigo 1433, pois tal permitiria ultrapassar qualquer determinação legal apenas pelo decurso do prazo do art. 1433 n.º 4.
ooo) E a jurisprudência também reconhece e valida este entendimento:
Como o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 02.05.2013 proferido no Proc.2917/09.8TBMTJ.L2-6, de onde se extraiu o sumário:
“1. O art. 1433º, nº 1, do Código Civil, segundo o qual são anuláveis as deliberações da assembleia contrárias a regulamentos anteriormente aprovados, a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado, é inaplicável às deliberações que violem preceitos de natureza imperativa e às deliberações que tenham por objecto assuntos que exorbitam da esfera de competência da assembleia dos condóminos.
2. Estas deliberações, estão sujeitas ao regime da nulidade e podem ser impugnadas a todo o tempo, nos termos do art. 286º do Código Civil”
ppp) Estão descritas e tipificadas como nulidades (nos articulados), pelo menos, quatro situações em cada uma das actas em crise. Para além da referida inexistência referida.
qqq) Os vícios descritos são graves e não devemos ignorá-los, esquecendo isto e validando-os como pretende a posição expressa e sustentada na decisão recorrida. Devemos reconhecer as nulidades, como tal, e aplicar o regime geral para as nulidades e a inexistência, reconhecendo que apenas as anulabilidades caem na subsunção do artigo 1433, n.º 4. Se uma deliberação é nula devemos declará-lo. E tratá-lo como tal.
rrr) Nos termos expostos, devemos declarar não verificada a alegada excepção peremptória de caducidade do direito de impugnar as deliberações das actas.
sss) Como bem refere o Professor Miguel Mesquita a propósito de outro tema, é esta a solução que permite um exercício mais ágil do direito de acção, pois que os “pressupostos processuais não devem servir para complicar, desnecessariamente, o conhecimento do pedido e a resolução dos litígios.
Termos em que, e com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve a decisão da primeira instância ser revogada e, em consequência:
Determinar-se o não desentranhamento do requerimento, dando-se conta do mesmo ao R. para pronuncia;
Determinar-se que é improcedente por não se verificar a excepção dilatória de nulidade de todo o processo, por ineptidão da petição inicial, por falta ou ininteligibilidade da causa de pedir do segundo pedido formulado pelo autor;

C… UNIPESSOAL, L.DA, que comercialmente usa “D…” apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.

III- Do mérito do recurso
A. Ineptidão da petição inicial
Diz-se na sentença que quanto ao pedido de reconhecimento da autonomia das entradas e garagem para efeitos da eleição de uma administração própria em relação ao condomínio geral não foram alegados factos que o fundamentem. Em consequência, declarou-se verificada a excepção da ineptidão da petição inicial, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 186.º do CPC, cuja sanção é a nulidade de todo o processo.
Vejamos.
A Jurisprudência e a doutrina vêm entendendo que a ineptidão da petição inicial, sendo um vício que afecta todo o processo, não é susceptível de suprimento, salvo no caso previsto no n.º 3 do artigo 186.º do Código de Processo Civil.
Uma das situações que não é susceptível de suprimento é a da ausência da causa de pedir, que, constituindo uma nulidade absoluta que afecta todo o processo, é simultaneamente uma excepção dilatória típica [artigo 577º, alínea b)], emergindo da falta de um pressuposto processual formado pela necessidade de conformação do objecto do processo, que é dever do autor.
Assim, o despacho de aperfeiçoamento não se aplica às situações mais graves em que o vício da petição inicial corresponda a uma verdadeira ineptidão motivada pela ausência da causa de pedir, pela sua ininteligibilidade ou pela contradição entre causas de pedir ou entre a causa de pedir e o pedido.
Como ensinava o Alberto dos Reis, em Comentário, 2º, 364 e 371,há que ter presente que:
«Se o autor exprimiu o seu pensamento em termos inadequados, serviu-se de linguagem tecnicamente defeituosa, mas deu a conhecer suficientemente qual o efeito jurídico que pretendia obter, a petição será uma peça desajeitada e infeliz, mas não pode qualificar-se de inepta.
Importa não confundir petição inepta com petição simplesmente deficiente quando, sendo clara quanto ao pedido e à causa de pedir, omite facto ou circunstâncias necessárias para o reconhecimento do direito do autor, não pode taxar-se de inepta: o que então sucede é que a acção naufraga» -
Importa, assim, frisar que só haverá falta de indicação da causa de pedir determinante da ineptidão quando, de todo em todo, falte a indicação dos factos invocados para sustentar a pretensão submetida a juízo, ou seja, quando se não puder determinar, em face do articulado do autor, qual o pedido e a causa de pedir por falta absoluta da respectiva indicação ou por ela estar feita em termos inaproveitáveis por insanáveis ou contraditórios.
Verteu-se na petição inicial o seguinte:
“O administrador da garagem apenas convocará reuniões para essa zona. Nunca para o condomínio geral, para o que nunca ninguém lhe atribuiu competência.
Este (ou outro) administrador da garagem não tem competência para convocar uma reunião do condomínio geral. Pois nunca nem ninguém lhe atribuiu tal competência.
A convocação de uma assembleia para o condomínio geral só pode ter lugar pela forma estabelecida na lei, concretamente nos termos do artigo 1431º n.º 2. E tal não acontece aqui. Visivelmente.
Acresce ainda outra ilegalidade:
Como já se referiu, existem oito entradas habitacionais no edifício, de acordo com o título constitutivo da propriedade horizontal.
104. Cada uma dessas entradas é constituída por fracções que entre si, têm zonas comuns próprias. Apenas entre si e com exclusão das demais fracções do prédio. Conforme Titulo Constitutivo da propriedade Horizontal, que se junta como documento nº 2, e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os efeitos legais, esclarecendo-se que o mesmo possui apenas valor informativo, e que poderá ser substituído por documento autentico ou certidão predial se para tal se for notificado.
105. Como se sabe, essas zonas comuns a um conjunto de fracções podem ter despesas que serão divididas nos termos legais (art. 1424 e seg.s) pelo conjunto de proprietários que delas possa beneficiar.
106. Todo o sistema da propriedade horizontal gira em torno da divisão de um conjunto de despesas comuns por um conjunto de fracções autónomas. Quer as despesas quer as fracções dessa zona são geridas pelo administrador e pela assembleia de condóminos, (art.s1424 n.º 3 e 1430).
107. Esses condomínios de zonas comuns particulares, ou “sub - condomínios”, nunca deixam de estar sujeitos ao condomínio geral (o de todas as fracções do prédio) o condomínio propriamente dito de geral (art. 1438-A).
108. Este terá sempre poderes de decisão em tudo o que toca a zonas comuns a todas as fracções. E ainda em tudo o que os condomínios de zonas comuns particulares partilhem com o condomínio geral. Através do seu administrador geral e através da assembleia geral.
109. Já no que toca a zonas comuns particulares, internas ou “sub - condomínios” tal direito da assembleia e administrador geral não existe. Quem tem essas atribuições é a assembleia e administrador da zona comum particular em questão.
110. Na gestão de uma zona comum particular, como são exemplo neste prédio cada uma das oito entradas de habitação ou a garagem é o administrador e a assembleia dessa zona quem rege.(vide documento 2)
111. Cada um dos condóminos do prédio participará, com o seu voto na gestão da sua entrada realizada pelo administrador e assembleia dessa zona.
112. Cada um dos condóminos proprietário de lugar de garagem no prédio participará, com o seu voto na gestão da sua garagem, realizada pelo administrador e assembleia da garagem.
113. Todos os condóminos proprietários de uma fracção no prédio participarão, com o seu voto na gestão do seu prédio, realizada pelo administrador e assembleia geral do prédio.
114. Se um conjunto de condóminos de uma determinada zona, por exemplo uma entrada entender gerir as suas zonas comuns próprias, em separado das demais entradas, deve faze-lo. Tal como se o entender fazer em separado do condomínio geral.
115. Não é assim válida a escolha de uma administração e do orçamento geral que inclua também as despesas das zonas comuns apenas a algumas das fracções, sem que essas zonas ou no caso concreto, entradas, sejam convidadas a pronunciar-se e conhecer o que apenas acontecerá na assembleia da entrada e não na assembleia geral.
116. Tal decisão, tomada na assembleia geral de todo o prédio, por todos os condóminos é ilegítima, é ineficaz e é inexistente em relação a cada uma das zonas com despesas comuns próprias que se queira manter autónoma nessas despesas (e sem prejuízo de participar nas despesas gerais comuns a todo o prédio). E ainda nula por alterar a forma de divisão de despesas comuns estabelecida no título constitutivo.
Assim requerer-se, junto de V. Exa., se digne declarar a nulidade, anulabilidade e ineficácia da Assembleia e das deliberações constantes da acta de vinte e três de Janeiro de 2016, já suspensas na sua execução, conforme inicialmente requerido e doutamente decidido;
Declarar a nulidade, anulabilidade e ineficácia da Assembleia e das deliberações constantes da acta de sete de Novembro de 2015, e ainda Declarar que seja reconhecida a autonomia das entradas e garagem em relação ao condomínio geral para a eleição da sua administração própria interna e divisão de despesas próprias comuns, seguindo-se os ulteriores termos do processo até final.”
O autor pretende que lhe seja reconhecido o direito à constituição de um condomínio autónomo porque há autonomia das entradas e garagem em relação ao condomínio geral.
Para o efeito pretendido (o pedido) o autor alega que existem oito entradas habitacionais no edifício, de acordo com o título constitutivo da propriedade horizontal.
Cada uma dessas entradas é constituída por fracções que, entre si, têm zonas comuns próprias. Apenas entre si e com exclusão das demais fracções do prédio. Junta o Titulo Constitutivo da propriedade Horizontal.
Quer dizer, a factualidade que suporta o pedido é a existência de oito entradas habitacionais no edifício, cada delas constituída por fracções que, entre si e apenas entre si, têm zonas comuns próprias, com exclusão das demais fracções do prédio e que essa situação fáctica está documentada no Titulo Constitutivo da propriedade Horizontal.
E a ré compreendeu perfeitamente este pedido e causa de pedir pois diz, na contestação, nomeadamente que:”223º - Não se trata de um prédio constituído por blocos ou torres distintas entre si, ligados, apenas por uma zona comum de jardim ou logradouro. 224º -Trata-se, antes sim, de um prédio que, não pode de forma alguma ser dividido ou separado, sem que, para o efeito, seja alterado o título constitutivo da propriedade horizontal, nos termos do artigo 1419º do Código Civil.”
Esta é uma questão jurídica que tem sido debatida na jurisprudência e na doutrina.
Parece, no entanto, dominar a tese que admite a organização de vários condomínios para um mesmo prédio, desde que se trate de partes desse prédio que estão devidamente delimitadas e definidas fisicamente, com entradas próprias, com zonas comuns próprias, sejam “torres”, “blocos” ou “conjuntos de fracções” (v.g. acórdão do STJ de 16/10/2008, proc. nº 08B3011 e o acórdão desta Relação de 16-10-2012, proc. nº1859/11.1YYPRT-B.P1, ambos em www.dgsi.pt.).
Com efeito, antes da alteração do regime da propriedade horizontal, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 267/94, de 25 de Outubro, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1995, ao direito de propriedade horizontal derivado do título constitutivo relativo à unidade de edifício correspondia unidade de regime.
Este diploma introduziu no Código Civil o artigo1438.º-A, segundo o qual o regime da propriedade horizontal “pode ser aplicado, com as necessárias adaptações, a conjuntos de edifícios contíguos funcionalmente ligados entre si pela existência de partes comuns afectadas ao uso de todas ou algumas unidades ou fracções que os compõem”.
O preâmbulo explicava: “decidiu-se estender o âmbito de incidência do instituto, por forma a ser possível submeter ao respectivo regime conjuntos de edifícios. Salvaguardou-se, porém, a interdependência das fracções ou edifícios e a dependência funcional das partes comuns, como características essenciais do condomínio”.
Assim, a finalidade desta alteração foi a integração no regime da propriedade horizontal do conjunto de edifícios em quadro de interdependência das fracções ou edifícios e da sua dependência funcional das partes comuns, estas por envolverem as essenciais características do condomínio.
É a ligação funcional entre as fracções decorrentes da existência de partes comuns que permite que edifícios autónomos entre si se constituam em propriedade horizontal.
Temos, pois, uma dualidade de regimes da propriedade horizontal: um relativo ao conjunto de edifícios com as referidas características e outro concernente a edifícios não integrados em conjuntos, ou seja, os ditos fraccionados.
No primeiro caso, deve o respectivo título constitutivo especificar os edifícios integrantes do conjunto, em termos de expressão das fracções autónomas componentes de cada um deles. No segundo, não impõe a lei, nem o impõe a natureza das coisas, por exemplo quando o edifício é composto por blocos, que o título constitutivo inclua a mencionada especificação.
O objecto do processo é constituído por dois elementos, sobre os quais as partes possuem completa disponibilidade: o pedido e a causa de pedir.
Pode definir-se a causa de pedir como sendo o acto ou facto jurídico de que deriva o direito que se invoca ou no qual assenta o direito invocado pelo autor (art. 581, nº 4, do Cód. Proc. Civil). É a fatispécie normativa produtora do efeito pretendido pelo autor.
A doutrina não utiliza o conceito de facto essencial sempre no mesmo sentido pois para uns autores (vide por todos Lebre de Freitas) facto essencial, ou principal, é todo o facto que, integrando a fatispécie normativa produtora do efeito pretendido (pelo autor, ao deduzir o pedido; pelo réu, ao deduzir uma excepção), é indispensável à produção desse efeito; enquanto para outros (vide por todos Miguel Teixeira de Sousa) é apenas, entre os factos integradores duma fatispécie, aquele que permite a sua individualização.
Como quer que seja, temos, no caso em apreço, a alegação de factos concretos susceptíveis de integrar uma fatispécie normativa produtora do efeito pretendido que é o pedido.
Existe uma situação jurídica de direito material, concretamente definida, a requerer tutela jurisdicional. Mais precisamente, há que indagar, no processo, da existência dos factos alegados com vista à sua subsunção na normatividade acima definida, se outro motivo não obstar ao prosseguimento deste objecto processual.
Deste modo, não pode manter-se a decisão que considerou inepta a petição inicial, não existindo, por isso, nulidade do processo relativamente esta causa de pedir e a este pedido.
B. Caducidade do direito à tutela jurisdicional.
O autor pretende que se declare a nulidade, anulabilidade e ineficácia da Assembleia e das deliberações constantes da acta de vinte e três de Janeiro de 2016, já suspensas na sua execução; e que se declare a nulidade, anulabilidade e ineficácia da Assembleia e das deliberações constantes da acta de sete de Novembro de 2015.
Ponderemos.
Cumpre, em primeiro lugar, referir que o negócio nulo não produz, desde o início, por força da falta ou vício de um elemento interno ou informativo, os efeitos a que tendia.
O negócio anulável, não obstante a falta ou vício de um elemento interno ou formativo, produz os seus efeitos e é tratado como válido, enquanto não for julgada procedente uma acção de anulação. Exercido, mediante esta acção, o direito potestativo de anular pertencente a uma das partes, os efeitos do negócio são retroactivamente destruídos.
O regime e os efeitos mais severos da nulidade encontram o seu fundamento teleológico em motivos de interesse público predominante. As anulabilidades fundam-se na infracção de requisitos dirigidos à tutela de interesses predominantemente particulares.
Mas por vezes a lei estabelece invalidades de carácter misto mais adequadas aos interesses que constituem a matéria da respectiva regulamentação.
As nulidades operam “ipso iure” ou “ipsa vi legis”, são invocáveis por qualquer pessoa interessada, são insanáveis pelo decurso do tempo e são insanáveis mediante confirmação (cfr. artigos 286º e 288º, a contrario, do Código Civil).
As anulabilidades têm de ser invocadas pela pessoa dotada de legitimidade, só podem ser invocadas por determinadas pessoas e não por quaisquer interessados, são sanáveis pelo decurso do tempo e mediante confirmação (cfr. artigo 288º do Código Civil).
No Código Civil consagrou-se um critério geral (artigo 294º): são nulos os negócios jurídicos em que exista violação de norma de carácter imperativo; nos demais casos existe uma situação de anulabilidade. Só assim não é quando a lei estabelecer regime especial, como acontece nas chamadas invalidades mistas.
A configuração do tipo de invalidade resulta de uma indagação por esta ordem de precedência: averigua-se se para o vício existe disposição cominando o valor negativo correspondente. Se não existe há que perceber qual a natureza da norma que prevê o requisito de validade em causa: sendo ela de carácter imperativo, o negócio é nulo; se o não for, é apenas anulável. (vide Carvalho Fernandes, in Teoria Geral do Direito Civil, II, 3ª edição, págs. 460 e ss.).
Entende-se que o regime traçado no artigo 1433º tem âmbito de aplicação restrito às deliberações anuláveis, aquelas que são afectadas por vícios menores do processo deliberativo, que violam normas legais, ou infringem regulamentos anteriormente aprovados.
Dispõe este artigo 1433.º do CC:
1. As deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado”.
2. No prazo de 10 dias contado da deliberação para os condóminos presentes, ou contado da sua comunicação, para os condóminos ausentes, pode ser exigida ao administrador a convocação de uma assembleia extraordinária, a ter lugar no prazo de 20 dias, para a revogação das deliberações inválidas ou ineficazes.
3. No prazo de 30 dias contado nos termos do número anterior, pode qualquer condómino sujeitar a deliberação a um centro de arbitragem.
4. O direito de propor a ação de anulação caduca no prazo de 20 dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária ou, caso esta não tenha sido solicitada, no prazo de 60 dias sobre a data da deliberação.
(…)”.
As deliberações em causa têm o seguinte conteúdo:
Acta de 23 de Janeiro de 2016:
- a 1.º convocatória não funcionou com o quórum necessário;
- a 2.º convocatória é ilegal, ferida do mesmo vício primordial;
- alteração da ordem de trabalhos;
- apresentação de um projecto de regulamento;
- consulta de várias empresas para fazer levantamentos de patologias do edifício e respectivo caderno de encargos;
- constituição de um fundo de obras;
- contratualização de seguro para as partes comuns.
Acta de 7 de Novembro de 2015:
- não identificação do sentido de voto dos condóminos;
- representação por procurador e inexistência de quórum deliberativo;
- eleição da administração geral do edifício
A regra quanto a deliberações da assembleia dos condóminos contrárias à lei e regulamentos aprovados é a da sua anulabilidade e apenas se estará perante um caso de nulidade quando estiver em causa a violação de normas de interesse e ordem pública.
Como se diz na sentença as deliberações em causa são “… tudo deliberações que se prendem com interesses particulares do próprio condómino, ou que se prendem com a violação do quórum deliberativo, mas que em nada contendem com normas de interesse e ordem públicas, e normas gerais imperativas nem estabelecem a tutela autónoma de terceiros, pelo que não são nulas nem ineficazes, motivo pelo qual, sendo apenas anuláveis, estão sujeitas ao prazo de caducidade previsto no artigo 1433.º, n.º 4 do CC.”
Coloca-se agora a questão de determinar se, proposta a providência cautelar de suspensão de deliberação, haverá ainda que, antes dela ser julgada, propor a acção de anulação, para se não deixar esgotar o prazo de 60 dias ou se, pelo contrário, o autor tem a possibilidade de, nos termos do artigo. 389º, nº. 1, al. a), do CPC, propor a acção de anulação nos 30 dias posteriores à notificação do deferimento da providência cautelar.
A tese maioritária entende que os prazos dos artigos. 389º, nº. 1, al. a) do CPC, e do nº 4 do artigo 1433º do C. Civil são diferentes e possuem natureza distinta, pois o previsto na 1ª. norma é processual, enquanto o outro é substantivo.
Salienta A. dos Reis, in CPC Anotado, I vol., pág. 636., que “Já se pretendeu atribuir à primeira parte do nº. 1, do artº. 387 (actual 389) alcance diverso do que ele tem na realidade. O disposto neste artigo nada tem que ver com as regras e direito substantivo que fixam, sob pena de caducidade, o prazo para a proposição de determinadas acções; o que aqui se estabelece é o regime de caducidade das providências cautelares; este regime é absolutamente independente do regime de caducidade da acção principal”.
Portanto, o pedido cautelar preliminar não deve ser considerado idóneo para impedir a caducidade.
Efectivamente, de acordo com o disposto no artigo 298º, nº 2, do Código Civil, quando por força da lei um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade (a menos que a lei refira expressamente a prescrição), caducidade essa que não se suspende nem interrompe senão nos casos em que a lei o determine (artigo 328º do CC), pelo que só com a propositura da acção se impede a caducidade da acção de anulação de deliberação. – (v.g. Meneses Cordeiro, em Manual do Direito das Sociedades, I, 2ª Ed., págs. 751 e 752 e Ac. do STJ, de 13.5.2004, Proc.04A1519, em www.dgsi.pt).
Na situação relevam as seguintes ocorrências:
- 23.02.2016: data da deliberação cuja invalidade se pretende;
- 09.03.2016: data da entrada da providência cautelar;
- 13.05.2016: data da decisão da providência cautelar;
- 20.06.2016: data da propositura da acção.
Verifica-se, pois, que quando a acção foi proposta já havia decorrido o prazo de 60 dias contado desde a data da deliberação.
Confirma-se, assim, o que foi decidido: “Consequentemente, se o direito de impugnar as deliberações está caduco relativamente às da assembleia de 23.01.2016, por maioria de razão também o estará relativamente às demais assembleias de 7.11.2015 e 20.10.2015”.
Pelo exposto, delibera-se julgar parcialmente procedente a apelação, ou seja, procedente quanto à excepção dilatória da ineptidão da petição inicial quanto ao pedido de reconhecimento da autonomia das entradas e garagem em relação ao condomínio geral, decisão que se revoga e improcedente quanto à decisão sobre a impugnação da validade das deliberações da assembleia de condóminos, decisão que se confirma.
Custas por recorrente e recorrida na proporção de metade.

Porto, 11 de Setembro de 2018
Ana Lucinda Cabral
Maria do Carmo Domingues
Maria Cecília Agante