Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1253/23.1T8LOU-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RUI MOREIRA
Descritores: PRESCRIÇÃO DE CRÉDITO
RECURSO
ATO INÚTIL
Nº do Documento: RP202407101253/23.1T8LOU-A.P1
Data do Acordão: 07/10/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: É inútil a decisão, em sede de recurso, sobre a verificação da prescrição de um crédito, que fora rejeitada na sentença recorrida, se a mesma sentença também declarou que a invocação da prescrição, mesmo que se verificasse, sempre constituiria abuso de direito e tal decisão não foi impugnada no mesmo recurso.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: PROC. Nº 1253/23.1T8LOU-A.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este
Juízo de Execução de Lousada - Juiz 2

REL. N.º 888
Juiz Desembargador Relator: Rui Moreira
1º Adjunto: Juiz Desembargador: Artur Dionísio do Vale dos Santos Oliveira
2º Adjunto: Juíza Desembargadora: Maria Eiró
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ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

1 – RELATÓRIO
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Por apenso à execução que, a si e a outros, lhes move Banco 1..., veio AA deduzir embargos de executado, invocando a prescrição da obrigação exequenda, a prescrição das livranças preenchidas e dadas à execução nestes autos, a falta de interpelação, o preenchimento abusivo das livranças e a ineptidão do requerimento executivo por não ser alegado o incumprimento dos contratos de mútuo invocados que habilitasse ao preenchimento das livranças.
Alegou ser avalista de contratos celebrados entre a exequente e a sociedade A..., S.A., mencionando que todos os contratos finalizaram e são datados de junho de 2013, e duas operações em agosto de 2015 e que pelo tempo já decorrido deverão ter-se por prescritas todas as obrigações, já que a presente execução foi instaurada em 2023.
A exequente contestou, sustentando a improcedência dos embargos e alegando que a A... entrou em processo de revitalização em 2016, com nomeação de administrador em 16/8/2016. O Plano então homologado foi incumprido, levando a que a Banco 1... interpelasse a A... para pagar os valores em dívida e em mora, por carta de 11/12/2020. Na mesma data remeteu carta idêntica ao embargante.
Continuado o incumprimento, alegou ter remetido novamente á A... e aos avalistas, entre os quais o embargante, cartas informando-os do vencimento de todas as obrigações e do preenchimento das livranças em conformidade.
Dada a pendência daquele processo e a homologação do Plano, conclui estar impedida de ter por vencidas as obrigações da A... e, consequentemente, estar impedida de preencher as livranças, o que só veio a fazer quando houve incumprimento do Plano de Recuperação homologado.
Em qualquer caso, segundo afirmou, a prescrição da obrigação cambiária só ocorreria no prazo de 3 anos após a data da livrança, segundo o art. 70º da LULL, pelo que jamais a obrigação exequenda pode ter-se por prescrita.
Impugnou os restantes fundamentos invocados e alegou que o embargante incorre em abuso de direito, por ser administrador da própria A... e ser ele que a representou, invocando, apesar disso, ser um mero terceiro e não estar sujeito às obrigações próprias do avalista.
Pronunciou-se, assim, pela improcedência dos embargos.
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O tribunal dispensou a realização de audiência prévia e proferiu despacho sanedor, fixou o objecto do litígio e elencou os temas de prova.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença que concluiu pela improcedência dos embargos.
Afirmou, quanto à prescrição: “Assim e quer porque não decorreram os cinco anos desde a data da insolvência quer porque a arguição da prescrição consubstanciaria um abuso de direito improceda a apontada prescrição da divida exequenda.”
Igualmente rejeitou a verificação da prescrição das próprias livranças, o respectivo preenchimento abusivo e que o requerimento executivo fosse inepto.
Por consequência, foram os embargos julgados improcedentes.
É desta decisão que vem interposto o presente recurso, que o executado/ embargante terminou formulando as seguintes conclusões:
I - A douta decisão de que se recorre decidiu que:
Nestes termos, julga-se totalmente improcedente a oposição à ex embargos deduzida pelo embargante/executado AA determinando-se, consequentemente, o normal prosseguimento da instância executiva.
II. - Contra essa posição o embargante recorre, não se conformando com a decisão de não concluir pela prescrição.
As questões jurídicas da apelação do recorrente:
- A violação da interpelação do fiador para preenchimento da livrança em br Ao caso, é aplicável o prazo de prescrição de cinco anos (art. 310.°, alíne g), do Cód. Civil).
- Decorreram mais de cinco anos desde a denúncia data da insolvência de 2016, vencendo-se todas as prestações conforme art. 17.°-A, art. 91.° do CIRE e art. 789º do Cód. Proc. Civil dos contratos de mútuo até à instauração da execução e citação do recorrente.
- Pelo que as quantias reclamadas de capital e juros se encontram prescritas em relação ao fiador / recorrente, art. 305.°e 306.° do Cód. Civil.
- O processo de insolvência e os eventuais pagamentos, ou mesmo o pagamento no âmbito da reclamação de créditos, não têm qualquer efeito interruptivo ou suspensivo.
- A existirem o recorrente não teve intervenção nos alegados pagamentos.
- Com efeito, conforme o disposto no art. 323. do Cód. Civil, a prescrição só se interrompe pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito.
Em virtude da contestação sua confissão a Embargada nos seus artigos 51° e artigo 57° nestes termos, devem ser aditados aos Factos Provados dois pontos com os seguintes dizeres: Ponto 22° Conforme confessa a Embargada Banco 1... no seu artigo 51°, houve incumprimento das obrigações a que a Devedora se obrigou no plano, o que sucedeu, tendo a Embargada, nessa sequência exercido os seus Direitos. Ponto 23° Conforme confessa a Embargada Banco 1... no seu artigo 57°, ocorrido o incumprimento a Embargada interpelou a A... e os garantes da dívida para regularização da situação.
ÐI. A sentença recorrida, julgou os embargos de executado improcedentes, baseado no entendimento de que, não decorreu o prazo de cinco anos, a prescrição não pode ainda ser declarada.
IV. Na verdade, o tempo repercute-se na relação jurídica, designadamente através da prescrição, cujo efeito permite ao devedor recusar o cumprimento da prestação ou de se opor ao exercicio do direito prescrito, depois do titular do direito o ter deixado de exercer durante certo período de tempo (art. 304.º, n.º 1, do Cód. Civil).
V- Na contagem do prazo, a regra é começar a partir do momento em que o direito pode ser exercido (art. 306.º, n.º 1, do Cód. Civil).
VI. A Banco 1.../embargada no seu Ponto 51° da sua contestação refere: incumprimento das obrigações a que a Devedora se obrigou no plano, o que sucedeu, Data de 2016.
VII. Com a insolvência da Devedora principal e a Reclamação de Créditos intentada pela Banco 1... venceram-se todas as obrigações decorrentes dos mútuos celebrados na data de 2016-Facto assente Ponto 10°.
VIII. Como consabido pelos artigos 91.° e 1 do CIRE e 789.° do Código Processo Civil (CPC) preveem o vencimento imediato das obrigações do insolvente.
IX. Portanto, nestas situações deixa de ter aplicação o disposto no artigo 782.º do Cód. Civil. A douta decisão não permite estender a perda do beneficio do prazo ao executado/embargante, devia ter em consideração a data da declaração de insolvência da mutuária A....
X. Nada ficou provado que houve algum pagamento de 2016 até à instauração da presente execução comum.
XI. Assim sendo, a haver mora é do próprio credor/exequente, nos termos do artigo 813.° Cód. Civil.
XII. Como ficou provado, a Banco 1... e a insolvente A... sociedade comercial, celebraram contratos de empréstimo bancário destinados ao apoio ao investimento, mediante o qual a primeira emprestou à segunda as importâncias dos mesmos "pelo prazo de dez anos e mais" a ser amortizada "em prestações anuais", sendo os juros pagos juntamente com cada uma das prestações.
XIII - Já referido o executado é terceiro em relação ao contrato quem é a devedora da obrigação de restituir a quantia mutuada é a insolvente A... (diga-se já foi executada ao reconhecer o crédito como garantido à Banco 1...) (art.°s 1142.º e 406. ï. 1 do Cód. Civil).
XIV. Pelo disposto no artigo 305. n.º 1 do Cód. Civil estabelece igualmente que: «1. - A prescrição é invocável pelos credores e por terceiros com legítimo interesse na sua declaração, ainda que o devedor a ela tenha remunciado».
XV. Pelo tempo já decorrido deverão, porém, considerar-se abrangidas pela prescrição todas as referidas prestações. Com efeito, de acordo com o disposto no artigo 323.° do A Cód. Civil, a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.
XVI. Não houve nem se prova nos autos qualquer efeito interruptivo para inutilizar a prescrição de todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 326.° do Cód. Civil.
XVIL O direito de crédito da Embargada resulta da obrigação de restituição da quantia mutuada através dos contratos celebrados nos Pontos 4º, 5º, 6º, a realizar mediante prestações mensais, com o acréscimo dos juros compensatórios.
XVIII. No caso vertente, decorre da matéria de facto provada nos seus Pontos 4º, 5º, 6º 7º a obrigação de restituição da quantia emprestada, resultante dos celebrados contratos de mútuo com fiança, foi fracionada em várias prestações mensais, que incluíam capital e juros remuneratórios, a pagar no prazo de anos, prestações pré-determinadas e sujeitas a revisão periódica (semestral) em função da taxa Euribor.
XIX. Por outro lado, em termos de interrupção da prescrição relativamente ao devedor difere da do fiador, existe agora a regra da autonomia entre a obrigação principal (do devedor) e a acessória (do fiador), como decorre do disposto no artigo 636.º, n.º 1, do Cód. Civil.
XX. Nada ficou provado nos autos essa materialidade que à recorrida / exequenda/Banco 1... lhe competia conforme ónus de prova artigo 342.° n.º 2 do Cód. Civil.
XXI. Independentemente da relação de proximidade que possa existir entre a devedora e o fiador, exige-se que o credor cumpra tal dever de informação, se pretende beneficiar também do mesmo efeito interruptivo em relação ao fiador, pois pode acontecer que este último ignore a prática de atos alheios, nomeadamente do devedor, e não ser razoável o sofrimento dos efeitos na sua esfera jurídica (PIRES DE LIMA c ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, Volume 1, 2.ª edição, 1979, pág. 577).
XXII. Dentro do contexto legal descrito, tendo em consideração que a execução foi proposta em 2023 e que o último pagamento foi efetuado antes do PER ou seja, antes de 2016 como refere a Banco 1... no seu artigo 51° e nada se prova da douta sentença que houvesse algum pagamento depois dessa data, tem de se concluir pelo decurso do prazo da prescrição de cinco anos.
XXIII. Mais a carta endereçada ao recorrente no Ponto 12º e 13° não tem a virtude de suspender nem interromper o prazo prescricional do avalista. E somente em 2023 o aqui recorrente / avalista receciona uma missiva da Banco 1... conforme Pontos 14° e 15° dando nota do incumprimento, valores em divida e preenchimento da livrança em branco.
XXIV. Com efeito da data do incumprimento referido na assentada como na contestação da Banco 1... deu-se no ano de 2016 e a missiva com a virtude de informar cabalmente o avalista da dívida e do incumprimento foi a 2023.
XXV. Apenas em 2023, como estava obrigado, para lograr estender aos fiadores o efeito interruptivo da prescrição decorrente do pagamento coercivo concretizado pelos devedores.
XXVI. Assim, tendo decorrido o prazo de cinco anos, sem qualquer interrupção, o direito de crédito exequendo encontra-se prescrito em relação ao fiador, ora recorrente, pelo que, este pode recusar o cumprimento da prestação e opor-se à exigência coerciva do direito do direito de crédito.”
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A recorrida ofereceu resposta ao recurso, pronunciando-se pela confirmação da decisão recorrida.
O recurso foi admitido como apelação, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo.
Cumpre apreciá-lo.
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2- FUNDAMENTAÇÃO
Não podendo este Tribunal conhecer de matérias não incluídas nas conclusões, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - arts. 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 3 do CPC - é nelas que deve identificar-se o objecto do recurso.
Das conclusões do recurso, resultam as seguintes questões: se a dívida pela qual é responsável a embargante, na qualidade de avalista se deve ter por vencida em 2016, aparentemente com o processo de revitalização respeitante à A... (conclusão VI), ou com a declaração de insolvência (conclusão VII) e se, atenta a qualidade de avalista do embargante, se não lhe são oponíveis factos interruptivos da prescrição dirigidos à A....
Para a sua solução, o apelante requer a adição, ao elenco dos factos provados, dos seguintes elementos:
Ponto 22° Conforme confessa a Embargada Banco 1... no seu artigo 51°, houve incumprimento das obrigações a que a Devedora se obrigou no plano, o que sucedeu, tendo a Embargada, nessa sequência exercido os seus Direitos.
Ponto 23° Conforme confessa a Embargada Banco 1... no seu artigo 57°, ocorrido o incumprimento a Embargada interpelou a A... e os garantes da dívida para regularização da situação.
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O tribunal recorrido fixou a seguinte factualidade como provada:

2.1. Factos provados
Discutida a causa, com relevo para a decisão a proferir, resultou provada a seguinte matéria de facto:
1. A Exequente Banco 1..., S.A. intentou, em 13.4.2023, a execução para pagamento da quantia de 664.842,28 contra o Executado, ora Embargante AA e ainda contra BB e CC.
2. Como título executivo a Exequente juntou as seguintes livranças:
a) A livrança identificada com n.º ..., com data de emissão de
2015-08-05 e de vencimento de 2023-01-13, no valor de 192.891,38€, subscrita pela sociedade “A... SA.” e avalizada, entre outros, pelo Embargante.
b) A livrança identificada com n.º ..., com data de emissão de 2003-06-24 e de vencimento de 2023-01-13, no valor de 294.782,89€, subscrita pela sociedade “A... SA.” e avalizada, entre outros, pelo Embargante.
c) A livrança identificada com n.º ..., com data de emissão de 2006-08-02 e de vencimento de 2023-01-13, no valor de 167.699,16€, subscrita pela sociedade “A... SA.” e avalizada, entre outros, pelo Embargante
3. As livranças dadas à execução foram subscritas e avalizadas pelo embargante e entregues ao Exequente, sem se encontrarem totalmente preenchidas, para garantia das obrigações emergentes de três contratos celebrados entre a Embargada e a A..., S.A., a saber:
a) • Contrato de mútuo com o n.º PT ...;
b) • Contrato de abertura de crédito com o n.º PT ...;
c) • Contrato de abertura de crédito em conta-corrente de utilização simples com o n.º PT ....” - cfr doc 1 a 12 juntos com o requerimento executivo e cujo teor aqui se dá por reproduzido;
4. A operação ... foi celebrada em 05 de agosto de 2015, tendo como prazo global 360 dias a contar da data da sua perfeição.
5. A operação ... foi celebrada em 2 de agosto de 2006 por 12 meses, automaticamente prorrogável por períodos iguais e sucessivos.
6. O último aditamento a este contrato ocorreu em 26 de junho de 2013 (conforme doc. 4 junto com o requerimento executivo).
7. A operação PT ... foi celebrada em 27 de junho de 2003, por 6 meses com início na data da perfeição do contrato, automaticamente renovada por períodos iguais e sucessivos, a menos que seja denunciada.
8. Por aditamento ocorrido 10 de janeiro de 2012 o prazo do contrato foi alterado para 12 meses, automaticamente prorrogado por períodos iguais e sucessivos, a menos que fosse denunciado.
9. A última alteração a este contrato (conforme Doc. 12 junto com o requerimento executivo) ocorreu em 05 de agosto de 2015.
10. A A... apresentou-se a Processo Especial de Revitalização, processo este que correu os seus termos com o n.º 1034/16.9T8AMT, do Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este, Juízo de Comércio de Amarante, sendo o despacho que nomeia o Administrador Judicial Provisório datado de 16/08/2016, cfr. anúncio que junta como Doc. 1 à contestação aos presentes embargos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
11. No âmbito destes autos foi o plano apresentado homologado por sentença transitada em julgado em 06/07/2017, cfr. Certidão junta como Doc. 2 à contestação aos presentes embargos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
12. Em face do incumprimento registado a Embargante remeteu comunicação registada com aviso de receção à A... datada de 11 de dezembro de 2020 peticionando o pagamento dos valores vencidos e em mora à data de 10 de dezembro de 2020, cfr. carta que se junta como Doc. 3 e aviso de receção junta como Doc. 4 à contestação aos presentes embargos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
13. Na mesma data remeteu missivas aos avalistas a dar conhecimento do teor da carta remetida à A..., cfr. cartas que se juntam como Docs. 5 a 7 e avisos de receção juntam como doc. 8 à contestação aos presentes embargos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
14. A carta remetida ao Embargante foi enviada para a Rua ..., ... Amarante, morada que consta do contrato, tendo aí sido recebida.
15. Com data de 13.1.2023 foi endereçada para a morada referida em 14) uma missiva dirigida ao embargante com o seguinte teor:



16. Nos termos das condições contratuais do contrato celebrado entre as partes figura a seguinte cláusula , “4.1- Para titular e assegurar o pagamento de todas as responsabilidades decorrentes do empréstimo, a CLIENTE e os AVALISTAS atrás identificados para o efeito entregam à Banco 1..., neste acto, uma livrança com montante e vencimento em branco, devidamente datada, subscrita pela primeira e avalizada pelos segundos, e autorizam desde já a Banco 1... a preencher a sobredita livrança, quando tal se mostre necessário, a juízo da própria Banco 1..., tendo em conta, nomeadamente, o seguinte:
a) A data de vencimento será fixada pela Banco 1... quando, em caso de incumprimento pela CLIENTE das obrigações assumidas, a Banco 1... decida preencher a livrança;
b) A importância da livrança corresponderá ao total das responsabilidades decorrentes do presente empréstimo, nomeadamente em capital, juros remuneratórios e moratórios, comissões, despesas e encargos fiscais, incluindo os da própria livrança;
c) A Banco 1... poderá inserir cláusula "sem protesto" e definir o local de pagamento. 24.2- A livrança não constitui novação do crédito, pelo que se mantêm as condições do empréstimo, incluindo as garantias. (…)” (negrito e sublinhado nossos).
17. O Embargante outorgou os contratos referidos em 3), na qualidade de avalista.


18. Consta do contrato celebrado em 24 de junho de 2003 e denominado “Contrato de abertura de Credito em conta corrente de utilização simples” - alterado a 26.07.2013 e do contratos de 25.3.2004 e 4 de janeiro de 2005 denominados “Alteração ao contrato de abertura de credito em conta corrente de utilização simples” , e respectivas alterações e entre o mais,

19. O embargante foi nomeado membro do Conselho de Administração pela AP. ..., mantendo-se ainda no cargo - conforme cópia da publicação junta como Doc. 15 com a contestação e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
20. Foi o Embargante que recebeu a carta de interpelação remetida à A... em 11 de dezembro de 2020 - conforme assinatura constante no Aviso de Receção, cfr. Doc. 4 junto com a contestação e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
21. A sociedade A..., S.A. foi declarada insolvente no âmbito do processo que corre termos sob o n.º 1884/21.4T8VRL do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real, Juízo de Comércio de Vila Real por decisão proferida a 12 de outubro de 2021 (cfr cota inserta no citius no dia de hoje).
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2.2. Factos não provados com relevo para a causa– não há.
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O apelante começa por pretender que se adite ao elenco dos factos provados, dois pontos com o seguinte teor:
Ponto 22° Conforme confessa a Embargada Banco 1... no seu artigo 51°, houve incumprimento das obrigações a que a Devedora se obrigou no plano, o que sucedeu, tendo a Embargada, nessa sequência exercido os seus Direitos.
Ponto 23° Conforme confessa a Embargada Banco 1... no seu artigo 57°, ocorrido o incumprimento a Embargada interpelou a A... e os garantes da dívida para regularização da situação.
Tal pretensão jamais poderá proceder, atenta a confusão que compreende entre meios de prova, conclusões e factos. Factos são realidades passíveis de demonstração por meios de prova. Confissão é um meio de prova. E a afirmação de que houve um incumprimento de obrigações, sendo na sequência disso que a Banco 1... veio exercer os seus direitos é um conclusão que, se for útil haverá de extrair-se em momento ulterior, havendo de resultar, isso sim, de quaisquer factos dados por provados.
Por outro lado, quanto ao teor do ponto 23º, mostra-se a factualidade correspondente incluída já nos pontos 12 e 13 dos factos provados, nada lhes sendo útil aditar.
Pelo exposto, nada cumpre alterar quanto à factualidade dada por provada.
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Defende o apelante que a sua obrigação, enquanto avalista das responsabilidades da A... resultantes dos contratos de mútuo com o n.º PT ...; de abertura de crédito com o n.º PT ... e de abertura de crédito em conta-corrente de utilização simples com o n.º PT ..., se deve ter por prescrita, por ter decorrido o prazo de cinco anos antes da sua citação para a execução.
No caso, não é controversa a natureza da responsabilidade do embargante, decorrente do aval que prestou às obrigações contraídas pela A..., no âmbito dos contratos de mútuo, de abertura de crédito com o n.º PT ... e de abertura de crédito em conta-corrente de utilização simples com o n.º PT ....
Foi em execução de tais contratos que a exequente, perante o incumprimento da A... quanto às obrigações que deles lhe advinham, veio preencher as livranças que, ao tempo da respectiva celebração, haviam sido subscritas e entregues em branco.
São essas as livranças dadas à execução.
Concluiu o tribunal recorrido que, sendo esses os títulos dados à execução, o prazo de prescrição passível de aproveitar ao embargante é o de três anos, previsto no § 1º do art. 70º da LULL, e que este não se completara ao tempo da execução.
Este segmento da sentença não se mostra impugnado por recurso, nada cumprindo acrescentar-lhe.
Todavia, alega o apelante que pode opor à exequente quaisquer excepções que ocorram na relação subjacente a tais letras. E, a esse propósito, alega que os créditos resultantes do aval às obrigações da A..., no âmbito dos contratos bancários referidos, prescreveram, por verificação do prazo de cinco anos, previsto no art. 310º, al. e) do Código Civil.
Não se discorda da tese do apelante, quanto à viabilidade da arguição da prescrição da sua responsabilidade, por referência à relação subjacente – no caso aos contratos referidos – uma vez que ele foi também interveniente nos próprios contratos (tal como nos respectivos aditamentos).
Por outro lado, tal como se escreveu no ac. do STJ de 12-12-2023, em termos que se subscrevem in totum (processo nº 3865/21.9T8VNF-A.G1.S1, em dgsi.pt) “Para além da literalidade do artigo 217.º do CIRE, decorre expressamente do artigo 17.º -E do CIRE que a prolação do despacho de nomeação do administrador judicial provisório determina a suspensão das execuções e das ações de cobrança e a impossibilidade de instauração de ações com idêntica finalidade tão só contra o devedor. Assim, partindo do pressuposto de que onde a lei não distingue, não cabe ao intérprete distinguir (cf. artigo 9.º do Código Civil), nada impede, nos termos da lei, que, em caso de aprovação de PER em relação ao devedor principal, prossigam as ações contra os condevedores ou terceiros garantes. A reclamação do crédito no PER, demonstrativa da intenção do exercício do direito por parte da credora, ora Recorrente, tendo como efeito necessário a interrupção do prazo de prescrição do crédito contra a sociedade mutuária, não tem qualquer repercussão no decurso do prazo de prescrição do direito de crédito a acionar contra os fiadores.”
Pareceria, assim, ser indiferente, para aferir da prescrição das obrigações do apelante, decorrentes dos contratos em questão, a sujeição da A... ao PER e, ulteriormente, a uma declaração de insolvência, pois que tais eventos não constituiriam impedimento ao exercício dos direitos de crédito contra o ora embargante/apelante.
Nessa medida, importaria identificar o momento a partir do qual se venceram os créditos cujo pagamento é pretendido na execução, para o que – convenhamos – a matéria apurada é parca, apesar de haver algum consenso quanto a um incumprimento total pelo menos a partir da entrada em juízo do PER relativo à A... e, nesse âmbito, como momento relevante, a data da nomeação do administrador provisório, ocorrida por despacho de 16/08/2016 (ponto nº 10, dos factos provados).
Com efeito, como se referiu no acórdão do TRC de 21/11/23 (proc. nº 877/22.9T8ACB-A.C1) “Encontrando-se o título cambiário no domínio das relações imediatas, a invocação da prescrição por parte do avalista é legitimada pelo caráter de instrumentalidade da relação cambiária perante a relação fundamental, como decorre do disposto nos art.ºs 32.º e 77.º da LULLiv. Tal prescrição ocasiona, para o respetivo beneficiário, a possibilidade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito, nos termos do art.º 304.º do CCiv.”
Certo é, todavia, que a sentença recorrida só concluiu ocorrer o vencimento das dívidas da A... em 12 de Outubro de 2021, com a insolvência decretada no proc. n.º 1884/21.4T8VRL do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real, Juízo de Comércio de Vila Real. E mais afirmou que apenas desde essa data as livranças se devem considerar vencidas, sendo a partir dela que se conta o prazo da prescrição, que é de três anos quanto à prescrição da livrança e de cinco anos quanto à prescrição da divida exequenda.
Acontece, porém, que no caso sub judice, a indagação sobre qual o momento do incumprimento e vencimento das dívidas, a partir do qual caberia á Banco 1... demandar o avalista, ora embargante, para o cumprimento da sua obrigação de garante, se revela totalmente inútil, perante a afirmação expressa na sentença recorrida segundo a qual o reconhecimento do direito à prescrição ao ora embargante sempre constituirá abuso de direito, na forma de venire contra factum proprium, proibido pelo artigo 334.º do Código Civil.
Afirmou a sentença a tal propósito: “Na verdade, do contexto factual dado como provado nos autos, a A... SA foi submetida em 2016 a um PER o qual se manteve em negociações durante vários anos.
Sabemos que a aprovação do PER tem como objetivo de que seja concedida à sociedade mutuária a possibilidade de solver a dívida que tinha para com os credores. Por outro lado, o embargante é o administrador da própria subscritora da livrança e como tal ter que ter acompanhado as tentativas de revitalização da empresa até esta ser declarada insolvente o que ocorreu a 12 de outubro de 2021.
Assim mostra-se-nos evidente que o embargante seria beneficiário directo do processo especial e do que aí fosse convencionado.
Assim entendemos que enquanto o PER estivesse em curso era legítimo ao credor formar a convicção e confiança de que o Embargante – avalista mas também administrador da empresa subscritora - não iriam depois deduzir defesa por exceção alegando a prescrição.
Perante o exposto, o comportamento do Embargante, em termos jurídicos, integra um venire contra factum proprium, proibido pelo artigo 334.º do Código Civil.
Assim e quer porque não decorreram os cinco anos desde a data da insolvência quer porque a arguição da prescrição consubstanciaria um abuso de direito improceda a apontada prescrição da divida exequenda.”
Analisando as razões da impugnação da sentença, expostas no presente recurso, logo se constata que em momento algum o apelante ataca essa qualificação da sua conduta, não formulando qualquer pedido tendente à reversão desse segmento da decisão.
Por conseguinte, ainda que se entendesse que o vencimento das obrigações do embargante, enquanto avalista nos contratos de mútuo e de conta-corrente subjacentes à emissão das livranças exequendas, ocorreu em 2016 ou em 2017, por efeito do PER da A..., jamais se lhe poderia reconhecer o direito à invocação da prescrição dessas obrigações, por se mostrar afirmado, sem que seja alvo de impugnação, ser em qualquer caso ilegítimo o exercício de tal direito à invocação da prescrição.
Seria, assim, a actividade deste tribunal de recurso absolutamente inútil e estéril, ao ter por destino necessário do reconhecimento de um eventual direito, mas de imediato seguido pela já incontornável afirmação de que o correspondente exercício sempre seria abusivo, pois que tal foi afirmado na sentença e não foi impugnado no recurso dela interposto.
De resto, quanto ao abuso de direito, solução idêntica foi decretada no Ac. do STJ acima citado (proc. nº 3865/21.9T8VNF-A.G1.S1).
Resta, em conclusão, afirmar a falta de provimento da presente apelação, na confirmação da decisão recorrida, por não poder ser afirmada, na situação dos autos, a prescrição das obrigações do apelante.
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Sumário:
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3 - DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes que constituem este Tribunal em negar provimento à presente apelação na confirmação da douta decisão recorrida.
Custas pelo apelante.
Registe e notifique.
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Porto, 10 de Julho de 2023
Rui Moreira
Artur Dionísio Oliveira
Maria Eiró