Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2074/19.1T8PNF.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: EUGÉNIA CUNHA
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL POR ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANO BIOLÓGICO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RP202407102074/19.1T8PNF.P1
Data do Acordão: 07/10/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGAÇÃO PARCIAL
Indicações Eventuais: 5.ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A responsabilidade civil pressupõe, em regra, culpa do agente (dolo ou negligência), incidindo sobre o lesado o ónus de provar a culpa do lesante - cfr. nº1, do art. 483º, art. 487º e nº1, do art. 342º, todos do Código Civil -, tal como os restantes pressupostos daquela. E provados estes, incluindo a culpa da lesante, gerada se mostra, na medida daquela culpa, a obrigação da 1ª Ré Seguradora (para quem se encontrava transferida a obrigação de indemnizar danos decorrentes de acidentes causados pela circulação do veículo segurado) de indemnizar o Autor pelos danos sofridos.
II - Para efeitos de indemnização, autónoma, do dano biológico, na sua vertente patrimonial, só relevam as implicações de alcance económico (sendo as demais vertentes de tal dano, que traduzem sequelas e perda de qualidade de vida do lesado sem natureza económica, ponderadas em sede de danos não patrimoniais). Tal indemnização a arbitrar pelo dano biológico, consubstanciado em relevante limitação ou défice funcional sofrido pelo lesado, que traduz uma capitis deminutio na vertente geral, deverá compensá-lo, mesmo que não imediatamente refletida em perdas salariais ou na privação de uma específica capacidade profissional, quer da restrição às oportunidades profissionais à sua disposição quer da acrescida penosidade e esforço no exercício da sua atividade profissional corrente, de modo a compensar as deficiências funcionais que constituem sequela das lesões sofridas. Sendo inviável estabelecer o seu quantum indemnizatório com base em cálculo aritmético de rendimentos específicos, deve recorrer-se à equidade (art. 564º, nº2 e 566º nº3, ambos do Código Civil) dentro dos padrões delineados pela jurisprudência em função da gravidade das sequelas sofridas.
III - É adequada, necessária e proporcional a importância de 600.000,00 € para indemnizar o dano biológico sofrido por lesado que à data do acidente era estudante e contava 15 anos de idade, que nenhuma contribuição teve para a produção dos danos e que ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 59%, tendo o período de défice temporário total sido de 23 dias e o de défice temporário parcial de 1280 dias.
IV - A indemnização por danos não patrimoniais, a fixar por equidade, visa, além compensar o dano sofrido, reprovar a conduta culposa do autor da lesão. Tal compensação deve traduzir a ponderação da extensão e gravidade dos danos causados, do grau de culpa do lesante, da situação económica deste e a do lesado e das demais circunstâncias relevantes do caso, nomeadamente, a idade do lesado, as desvantagens que este tenha sofrido e os critérios e valores usuais na jurisprudência em casos similares, nos termos do nº4, do art. 496º e art. 494º, ambos do Código Civil. Os preceitos anteriormente referidos devem ser aplicados com prudência e bom senso, pois têm como efeito deixar sem indemnização parte dos danos reais, o que é suscetível de gerar injustiças absolutas e relativas para os lesados, devendo, para as evitar, seguir-se critérios que permitam obter um modelo indemnizatório que conduza a uma maior igualdade, certeza e segurança jurídica, sem se perder de vista as circunstâncias do caso;
V - É adequada, necessária e proporcional a importância de 200.000,00 € para compensar os danos não patrimoniais sofridos pelo referido jovem lesado que, em consequência do acidente, além do mais, sofreu “esfacelo grave da região clavicular direita com arrancamento da porção clavicular do ECM, com ausência da mobilidade da mão, do cotovelo e do ombro e, ainda com ausência de sensibilidade no território dos nervos radial, cubital e mediano; esfacelo supra-clavicular com constatação de arrancamento pré-ganglionar do plexo braquial; esfacelo do cotovelo direito e constatação de integridade do nervo cubital, feridas no hemitorax esquerdo, cotovelo direito e nos dois joelhos, fratura do terço externo da clavícula, abundantes potenciais de desnervação em repouso e ausência de potenciais de unidade motora na tentativa de contração dos músculos infraespinhoso, deltóide, bicipide flexor radial do carpo, extensor comum e 1º interósseo dorsal direitos, e ainda com sinais de desnervação no grande dentado direit; grave lesão axonal ganglionar ou infraganglionar a nível dos ramos primários anteriores de raízes C5, C6, C7 e C8 direitas ou coexistência de lesão a nível dos troncos primários superior, médio e inferior do plexo braquial com lesões a nível de raízes; alterações de sinal dos músculos da coifa dos rotadores e da própria goteira para-vertebral direita que pode traduzir edema neurogénico; alteração do sinal dos músculos escalenos direitos, associada a uma desorganização estrutural com perda da própria morfologia habitual e do sinal dos troncos, divisões e cordões que constituem o plexo braquial direito; fratura dos pratos da tíbia da perna esquerda, tendo sido submetido a quatro cirurgias, uma delas que, dada a complexidade, teve a duração de 12 horas e ficado com cicatrizes, a padecer de dores para toda a vida, depressão, necessidade de tomar medicação e do referido défice funcional permanente da integridade físico-psíquica e que teve um quantum doloris no grau 6/7, um dano estético permanente no grau 6/7, repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer no grau 6/7, repercussão permanente na atividade sexual no grau 4.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 2074/19.1T8PNF.P1
Processo da 5ª secção do Tribunal da Relação do Porto (3ª Secção cível)
Tribunal de origem do recurso: Juízo Central Cível de Penafiel - Juiz 1




Relatora: Des. Eugénia Cunha
1º Adjunto:  Des. Jorge Martins Ribeiro
2º Adjunto: Des. Manuel Fernandes

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto

Sumário (cfr nº 7, do art.º 663º, do CPC):

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I. RELATÓRIO

1º recurso: recurso independente

Recorrente: “A... – Companhia de Seguros S.A.”

Recorrido: AA

2º recurso: recurso subordinado

Recorrente: AA

Recorridas: - “A... – Companhia de Seguros S.A.”

                   - “B... S.A”     

AA propôs ação declarativa, com processo comum, contra “A... – Companhia de Seguros S.A” e “B... S.A” pedindo:

i) a condenação da 1ª Ré ,“A... – Companhia de Seguros S.A.”, a pagar e a indemnizar o Autor na quantia de 228.303,31 € (duzentos e vinte e oito mil trezentos e três euros e trinta e um cêntimos), por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos com o acidente, bem como, a assegurar e a suportar todos os custos e encargos do eventual dano futuro peticionado que porventura possa vir a existir e a proceder, bem como e ainda outra qualquer quantia ou dano que venha a ser mandado liquidar em execução de sentença, quantias acrescidas de juros, calculados à taxa legal, desde a data da citação até efetivo de integral pagamento;

ii) nos precisos e exatos termos alegados nos artigos 24º a 26º e 73º a 76º”, da petição inicial[1], a condenação da 2ª Ré, “B... S.A.”, a pagar e a indemnizar o Autor de todos os danos por este sofridos, que se encontram garantidos pelo contrato de seguro titulado pela Apólice que identifica, que tenha como tomador de seguro a Federação Portuguesa de Ciclismo e que tenha como segurado e beneficiário o Autor, acrescido de juros, calculados à taxa legal, sobre a quantia a que for condenada, desde a data da citação, até efetivo e integral pagamento.

Alega, para tanto, os danos patrimoniais e não patrimoniais por si sofridos na sequência de, no dia 22/7/2010, pelas 18h15, na Rua ..., freguesia ..., concelho ..., quando treinava, ter ocorrido um embate entre o velocípede sem motor (bicicleta), conduzido e pertencente ao Autor, e o veículo automóvel de matrícula “..-JZ-..”, pertencente a BB e conduzido por CC, seguro na 1ª Ré, circulando este a velocidade não inferior a 50 Km/h, no sentido da EN ...06 para ... e aquele, em sentido contrário, a velocidade não superior a 30 Km/h, pela sua hemi-faixa direita, sendo que a condutora do veículo “JZ” ao descrever a curva para a sua direita, desatenta, ocupou a hemi-faixa de rodagem do lado esquerdo, atento o seu sentido de marcha, embatendo com a parte da frente direita do veículo “JZ” no velocípede, a cerca de 0,5 metros do eixo da via, o que fez com que este embatesse no para-brisas daquele veículo, tendo sido projetado cerca de 2 metros, ficando caído na berma esquerda da estrada, atento o sentido do veículo “JZ”, com a cabeça junto da roda direita da frente deste veículo.

A 1ª Ré, na contestação, defende-se por impugnação, ao negar os factos alegados pelo Autor, referindo que a condutora do veículo “JZ” circulava a velocidade inferior a 50 Km/h e, ao aproximar-se de uma curva à sua direita, foi surpreendida pelo velocípede, conduzido pelo Autor, a circular em sentido oposto, pela hemi-faixa esquerda, atento o sentido de marcha do Autor, a desfazer a curva à esquerda, tendo a condutora do “JZ”, para evitar o embate frontal, guinado a direção para a sua esquerda, dando-se o embate entre o rodado da frente do velocípede e a frente direita do “JZ”, sendo o Autor projetado, embatendo no capot e pára-brisas e acabando por cair na via.

A 2ª Ré refere que, sendo o Autor beneficiário da referida apólice nº ...60 de acidentes pessoais, cujas condições particulares impõem capital de € 27.500,00 para os casos de invalidez permanente e de € 5.000,00 com despesas de tratamento, este último com uma franquia de € 90,00, a responsabilidade pelo acidente e suas consequências é de imputar à 1ª Ré, pelo que, respondendo aquela pelos danos causados pela condutora do veículo não se constitui na obrigação de indemnizar.

Na resposta que apresentou, o Autor mantém os factos por si alegados.

Requereu o Autor, nos termos do art. 265º, nº 2, do C.P.C., ampliação do pedido relativamente ao montante peticionado de dano biológico de € 155.000,00 para € 250.000,00 e a título de danos morais de € 70.000,00 para € 120.000,00, sendo tal ampliação deferida por despacho proferido em 7/2/2023.

Mais requereu o Autor, nos termos do art. 265º, nº 2, do C.P.C. nova ampliação do pedido relativamente ao montante anteriormente peticionado de dano biológico de € 250.000,00 para € 600.000,00, a título de dano patrimonial pelas despesas medicamentosas, tratamentos e transportes para os mesmos, quantia não inferior a 80.000 € e a título de danos morais ampliação de € 120.000,00 para 200.000,00, sendo a ampliação em causa deferida por despacho proferido em 28/3/2023.


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Procedeu-se à audiência final, com a observância das formalidades legais.

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Foi proferida sentença com a seguinte parte dispositiva:

“Pelo exposto decide-se julgar parcialmente procedente a presente ação e, em consequência:

a) condenar a 1ª Ré, “A... – Companhia de Seguros S.A.” a pagar ao Autor, AA, a quantia de € 291.803,31 (€ 450,00+€ 228,31+ 1.125,00+€ 290.000,00) pelos danos patrimoniais sofridos, acrescida dos juros legais contados desde a citação até integral pagamento.

b) condenar a 1ª Ré “A... – Companhia de Seguros S.A.” a pagar ao Autor a quantia de € 180.000,00, pelos danos não patrimoniais sofridos, acrescida dos juros legais, contados a partir da presente data.

c) relegar para liquidação de sentença o custo dos tratamentos e das despesas medicamentosas que o Autor suportou e venha a ter que receber futuramente, bem como o custo das eventuais intervenções cirúrgicas que venha a ter necessidade de ser submetido.

d) absolver a 1ª Ré dos restantes pedidos contra si deduzidos.

e) absolver a 2ª Ré “B... S.A.” de todos os pedidos contra si deduzidos.

f) Custas por Autor e 1ª Ré na proporção dos respetivos decaimentos.


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Apresentou a Ré A... recurso de apelação, pugnando por que seja revogada a sentença recorrida, formulando as seguintes

CONCLUSÕES:

(…)


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O Autor apresentou-se a responder e interpôs recurso subordinado (cfr. artigo 633.°, do CPC), pedindo que seja julgado improcedente o recurso da 1ª Ré e dado provimento ao seu recurso, formulando as seguintes

Conclusões:

(…)
A Ré A... pugnou por que seja negado provimento ao recurso subordinado.
A Ré B..., apresentou-se a responder defendendo a improcedência do recurso subordinado em relação a si, sustentando não assistir razão para a condenar a pagar 16.225,00 € ao Autor, pois se é certo que a responsabilidade civil da B... tem natureza contratual, não é menos verdade que essa responsabilidade é subsidiária em relação à responsabilidade civil por factos ilícitos, nos termos da qual foi condenada a Ré A..., sendo que o próprio demandante assim configurou os presentes autos, pedindo a condenação subsidiária da demandada B..., e, assim, apenas poderia ser condenada se improcedesse o pedido formulado contra a demandada A..., o que não se verificou. Radicando o seu pedido contra a demandada A... na responsabilidade civil por factos ilícitos, e tendo este pedido procedido parcialmente, fica afastada a responsabilidade da demandada B..., que tem natureza subsidiária, não sendo, pois, cumuláveis ambas as indemnizações.


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Após os vistos, cumpre apreciar e decidir o mérito do recurso interposto.

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            II. FUNDAMENTOS

- OBJETO DO RECURSO

Apontemos, por ordem lógica, as questões objeto do recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações do recorrente, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº3 e 4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil -, ressalvado o estatuído no artigo 665º, de tal diploma legal.

Assim, as questões a decidir, relativas ao recurso principal e ao recurso  subordinado,  são as seguintes:
- Da culpa exclusiva da condutora do veículo seguro pela 1ªRé ou se se verifica concorrência de culpas (da lesante e do lesado), da verificação dos restantes pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos (nº1, do art. 483º, do Código Civil) e da obrigação de indemnizar da 1ª Ré (em que termos e com que limites);
2ª - Do quantum pelos danos:
2.1 - patrimoniais relativos a bens destruídos no acidente e concretas despesas médicas e de transporte ou se a sua liquidação deve ser relegada para momento ulterior;
2.2 - biológico;
2.3 - não patrimoniais.
3ª - Da obrigação de indemnizar da 2ª Ré (seguradora dos acidentes pessoais).


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II.A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

            1. FACTOS PROVADOS

Foram os seguintes os factos considerados provados com relevância para a decisão pelo Tribunal de 1ª instância (transcrição):

1- No dia 22/7/2016, pelas 18h15, na Rua ..., freguesia ..., concelho ..., ocorreu um embate entre o velocípede sem motor (bicicleta), pertencente ao clube de ciclismo ... e conduzido pelo Autor e o veículo automóvel de matrícula “..-JZ-..”, pertencente a BB e conduzido por CC.

2 - O veículo “JZ” circulava a velocidade não superior a 50 Km/h, no sentido da EN ...06 para ....

3 - O velocípede conduzido pelo Autor circulava no sentido ... para a EN ...06, a velocidade não superior a 30 Km/h, pela sua hemi-faixa direita, tendo a faixa de rodagem uma inclinação descendente.

4 - A condutora do veículo “JZ”, por solicitação do seu filho, que circulava no banco de trás, foi buscar uns lenços que se encontravam no lugar do pendura e, ato contínuo, entregou-lhe os lenços, o que fez com que desviasse o seu olhar da estrada e retirasse o seu pé do acelerador.

5 - Os atos a que se aludem no ponto 4 fizeram com que a Autora, ao descrever a curva para a sua direita, progressivamente, diminuísse a sua velocidade de circulação e ocupasse a hemi faixa de rodagem do lado esquerdo, atento o seu sentido de marcha.

6 - Tendo embatido com a parte da frente direita do veículo “JZ” no velocípede conduzido pelo Autor, o que fez com que este embatesse no para-brisas daquele veículo, tendo sido projetado cerca de 2 metros, ficando caído na berma esquerda da estrada, atento o sentido do veículo “JZ”, com a cabeça junto da roda direita da frente deste veículo.

7 - O local do embate ocorreu na hemi faixa direita de rodagem, atento o sentido de circulação do Autor, a cerca de 0,5 metros do eixo da via.

8 - Após o embate, o veículo “JZ” ficou numa posição diagonal à faixa de rodagem, sendo que a parte da frente esquerda do “JZ” ficou a cerca de 1m a 1,5 m da berma do lado esquerdo, e parte traseira esquerda ficou a cerca de 2 metros da berma do lado esquerdo, atento o sentido em que o mesmo circulava, tendo o velocípede conduzido pelo Autor ficado imobilizado a 1 metro da frente do veículo “JZ”.

9 - Após o embate e antes da chegada da GNR, foi necessário fazer descair o veículo “JZ” para ser possível prestar o socorro ao Autor.

10 - Após a execução da referida manobra para prestação de socorro, a parte de trás esquerda do veículo “JZ” encontrava-se a 2,88 metros da berma do lado esquerdo, atento o sentido em que o mesmo seguia e a parte de trás direita do veículo “JZ” encontrava-se a 2,02 metros da berma do lado direito, atento o sentido que o mesmo seguia.

11 - No local do embate, a faixa de rodagem tem uma largura de 6,30 metros.

12 - À data e hora do embate era dia e não chovia.

13 - O piso da faixa de rodagem era em paralelepípedos, encontrava-se seco e em bom estado de conservação.

14 - À data do embate, o Autor era atleta do clube de ciclismo ... e estava inscrito e federado na União Velocipédica Portuguesa/Federação Portuguesa de Ciclismo, na categoria de cadetes.

15 - Quando ocorreu o embate o Autor e outro colega do cube de ciclismo ..., de nome DD, estavam a treinar.

16 - O Autor participava num dos treinos de bicicleta que fazia quase diariamente.

17 - Em consequência direta e necessária do embate, o velocípede sem motor – bicicleta, em que o Autor circulava, ficou totalmente destruído, o qual tinha o valor de 1.500,00 € (mil e quinhentos euros).

18 - Em consequência do embate, o equipamento que o Autor vestia e utilizava no treino foi comprado por si – camisola, calções, sapatos, capacete, polar e óculos – ficou totalmente destruído, o qual tinha um valor global não inferior a 450,00 € (quatrocentos e cinquenta euros).

19 - Por causa das lesões sofridas com o embate, o Autor deu entrada no Hospital 1..., em ... e, logo nesse mesmo dia foi transferido para o Hospital 2..., no Porto, onde foi de imediato submetido a intervenção cirúrgica ao ombro e à clavícula direita, tendo aí ficando internado nos cuidados intensivos desde o dia 22/07/2016 ao dia 25/07/2016.

20 - Nessa data passou para os cuidados intermédios, tendo alta para regressar a casa no dia 02/08/2016.

21 - Desde esse dia 02/08/2016 até 04/10/2016, o Autor passou a ter consultas e tratamentos no Hospital 2... no Porto, de dois em dois dias.

22 - No dia 04/10/2016, o Autor foi submetido no Hospital 2..., no Porto a nova intervenção cirúrgica para exploração e tentativa de ligação dos tendões do ombro direito, sendo que face à complexidade da cirurgia a mesma teve uma duração de 12 horas.

23 - Após essa cirurgia o Autor ficou novamente internado no referido Hospital 2... durante 10 dias, tendo depois recebido alta para regressar a casa, mas de dois em dois dias tinha que ir ao referido Hospital 2... para consultas e para receber tratamentos, o que aconteceu desde o dia da alta da cirurgia até ao dia 06/11/2016.

24 - Desde o dia 06/11/2016 até à presente data, o Autor continuou a receber as consultas e tratamentos no Hospital 2... no Porto, numa primeira fase, de semana em semana e depois de mês em mês.

25 - Nos dias 10/07/2017 e 07/01/2019, o Autor foi submetido a mais duas intervenções cirúrgicas a uma ferida no tórax.

26 - A partir do dia 06/11/2016, o Autor começou a receber vários tratamentos de fisioterapia.

27 - Em consequência do embate, o Autor sofreu as seguintes lesões:

a) Esfacelo grave da região clavicular direita com arrancamento da porção clavicular do ECM, com ausência da mobilidade da mão, do cotovelo e do ombro e, ainda com ausência de sensibilidade no território dos nervos radial, cubital e mediano.

b) Esfacelo supra-clavicular com constatação de arrancamento pré-ganglionar do plexo braquial.

c) Esfacelo do cotovelo direito e constatação de integridade do nervo cubital.

d) Feridas no hemitorax esquerdo, cotovelo direito e nos dois joelhos.

e) Fratura do terço externo da clavícula.

f) Abundantes potenciais de desnervação em repouso e ausência de potenciais de unidade motora na tentativa de contração dos músculos infraespinhoso, deltóide, bicipide flexor radial do carpo, extensor comum e 1º interósseo dorsal direitos, e ainda com sinais de desnervação no grande dentado direito.

g) Grave lesão axonal ganglionar ou infraganglionar a nível dos ramos primários anteriores de raízes C5, C6, C7 e C8 direitas ou coexistência de lesão a nível dos troncos primários superior, médio e inferior do plexo braquial com lesões a nível de raízes.

h) Alterações de sinal dos músculos da coifa dos rotadores e da própria goteira para-vertebral direita que pode traduzir edema neurogénico.

i) Alteração do sinal dos músculos escalenos direitos, associada a uma desorganização estrutural com perda da própria morfologia habitual e do sinal dos troncos, divisões e cordões que constituem o plexo braquial direito.

j) Fratura dos pratos da tíbia da perna esquerda.

28 - O Autor ficou com as seguintes limitações:

a) Ombro e o antebraço direito totalmente imobilizado.

b) Limitação no movimento de rotação do braço direito e mão direita.

c) O Autor perdeu a força no ombro, no braço e na mão direita.

d) Não tem sensibilidade no antebraço, no braço e na mão direita.

e) Não consegue dormir para o lado direito.

f) Não consegue agarrar, pegar e consequentemente levantar qualquer objeto por pouco pesado que seja.

g) Ficou impossibilitado de escrever e de assinar o seu nome com a mão direita, tendo recebido treinos/tratamentos para somente poder fazer a sua assinatura com a mão esquerda.

h) O Autor ficou com algumas limitações e perdeu autonomia e independência pessoal, nomeadamente entre outras atividades do quotidiano, para se vestir, calçar e comer sozinho.

29 - Desde a data do embate até à presente data, o Autor toma diariamente comprimidos para conseguir aguentar e/ou aliviar as dores, nomeadamente gabapentina (gabmox) e, ainda Ziphen quando as dores eram e/ou são mais agudas e intensas.

30 - Durante os vários períodos de tratamentos e de internamentos hospitalares a que foi submetido, o Autor sofreu dores.

31 - O Autor continua a ter e a sofrer fortes dores, principalmente com as mudanças de tempo, o que se prolongará até aos fins da sua vida.

32 - O Autor sente tristeza por não poder voltar a praticar ciclismo.

33 - Por causa das lesões sofridas, o Autor não consegue cortar um pão para fazer uma sandes ou cortar um mero bife, não consegue apertar os cordões dos sapatos, não consegue vestir uma camisa se não tiver a ajuda da sua própria boca, o que lhe provoca tristeza e crises de depressão.

34 - Até o mês de março de 2018, o Autor foi medicado com comprimidos ADT para tratar da depressão que sofreu em consequência do embate.

35 - Antes do embate, o Autor era uma pessoa alegre e divertida, sendo que despois do embate passou a ser uma pessoa triste e amargurada, não tendo a mesma alegria de viver e de conviver com os jovens da sua idade.

36 - Apesar de, à data do embate, o Autor ainda estar na categoria de cadetes, tinha a expectativa de progredir no ciclismo português, ficando impedido de concretizar esse sonho, o que lhe causou tristeza.

37- O Autor, à data do embate, estudava, pelo que em consequência dos internamentos e tratamentos médicos a que foi submetido, no ano letivo de 2017/2018, o Autor não teve aproveitamento escolar.

38 - O estado físico e mental em que o Autor ficou em consequência das lesões sofridas com o embate fez com que este se sentisse e sinta envergonhado, com complexos de conviver com os seus colegas de escola e professores, o que fez com que ele cada vez gostasse menos de frequentar a escola.

39 - O Autor terá que receber tratamentos e acompanhamento médicos até ao final da sua vida.

40- As despesas com transportes para se deslocar para as consultas e para os tratamentos sempre foram efetuados pelos pais do Autor, em veículo próprio daqueles, tendo efetuado desde a data do embate até à presente data 75 viagens de ida e volta desde a residência do Autor (sita em ... - ...) ao Hospital 2... (sito no Porto), tendo despendido em cada viagem de ida e volta com combustível e portagens a quantia de 15,00 € (quinze euros) e despendeu a quantia de € 228,31 com os custos dos medicamentos adquiridos por si e com despesas com os tratamentos médicos que não foram suportados pela Segurança Social.

41- O Défice Funcional Temporário Total fixou-se num período de 23 dias.

42- O Défice Funcional Temporário Parcial fixou-se num período 1280 dias.

43- Com Repercussão Temporária na Atividade Profissional (considerou-se a repercussão escolar) fixou-se um período total de 103 dias.

44- Repercussão Temporária na Atividade Profissional Parcial (considerou-se repercussão escolar), fixou-se um período total de 1200 dias.

45 - O quantum doloris fixa-se no grau 6 numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta as lesões resultantes, o período de recuperação funcional, o tipo de traumatismo, e de tratamentos efetuados, com múltiplas cirurgias, pensos por longos períodos por dificuldade na cicatrização de ferida torácica, fisioterapia com frequências de 5 e de 3 vezes por semana, e em face da idade do examinado e gravidade do quadro clínico com implicação no seu bem estar físico com dor e limitação motora, mental e social numa faixa etária na qual o contexto social representa um amplo espaço de realização e formação pessoal.

46 – O Défice Funcional Permanente de Integridade Físico-Psíquica fixável em 59 pontos, sendo de perspetivar a existência de Dano Futuro, o que pode obrigar a uma futura revisão do caso por artrose na articulação do joelho esquerdo.

47 - O Autor era estudante à data do embate, tendo ficado com o seu percurso escolar afetado, quer pelas limitações físicas, funcionais e quadro de dor, quer pelas consequências psíquicas, mais acentuadas no período inicial após o embate, assim como pelo absentismo escolar necessário para tratamentos cirúrgicos.

48 - A necessidade de realização frequente de pensos e de fisioterapia, implicou para o Autor, dispêndio de tempo, dores físicas e alterações do foro mental associadas.

49 - Sendo o Autor, à data, adolescente ainda sem projeto profissional mais orientado ou definido, as sequelas resultantes do embate são compatíveis com algumas profissões, embora com esforços suplementares (mesmo que não necessite do uso dos membros superiores, já que mesmo nesses casos, mantém quadro doloroso e queixas psíquicas que o afetam).

50 - O Autor estará impossibilitado de prosseguir uma profissão em que necessite de usar os dois membros superiores em simultâneo e estará impossibilitado ou pelo menos necessitará de esforços suplementares acentuados no exercício de profissões em que apenas necessite de usar um membro superior mas que exijam grande destreza/precisão desse membro (uma vez que era dextro, necessitando agora de fazer uso do membro que era passivo), podendo, ainda assim, beneficiar de treino específico para o uso do lado esquerdo.

51 - Dado que a sua dinâmica postural e equilíbrio também estão algo afetados, é de admitir dificuldade acrescida na realização de profissões que exijam elevadas capacidades de equilíbrio.

52 - Para o exercício da profissão de ator pretendida pelo Autor, o mesmo está impossibilitado na realização de vários papéis que impliquem o uso pleno do membro superior direito. Outros papéis existirão que poderá realizar com esforços suplementares.

53 - O Autor manifestou interesse na área de comunicação, sendo que a capacidade para profissões desta área de estudo depende da concreta profissão que venha a escolher, de qualquer forma, necessita sempre, pelo menos de esforços acrescidos pelas sequelas físicas e psíquicas que sofreu com o embate.

54 - Dano Estético Permanente é fixável no grau 6, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta os seguintes aspetos: as extensas cicatrizes de aspeto hipertrófico e com pigmentação no tronco, as restantes cicatrizes nos membros superiores esquerdo e direito e membros inferiores esquerdo e direito, a alteração dos normais movimentos e sincronia dos movimentos do corpo pela imobilidade do membro superior direito, a amiotrofia do membro superior direito, o flexo do cotovelo direito, a necessidade de usar tala de apoio (está documentado que iria realizar artrodese do punho ou seja, fixação cirúrgica do punho direito que poderá ter sido entretanto realizada mas que não impede que haja dano estético por punho em posição fixa).

55 - Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer é fixável no grau 6, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta a sua vida afetiva, social e familiar.

56 - Repercussão Permanente na Atividade Sexual é fixável no grau 4, pelas sequelas físicas e psíquicas e dificuldade em posicionamentos.

57 - Dependências Permanentes de Ajudas:

Ajudas medicamentosas: O Autor efetua medicação em SOS quando tem mais dores o que se admite (analgesia) e psicofármaco quando tem mais dificuldade em dormir. Poderá a vir ter indicação de medicação adicional conforme quadro doloroso a prescrever pelos médicos assistentes.

Tratamentos médicos regulares: O Autor mantém tratamentos de fisioterapia, tendo efetuado na Clínica ... tratamentos de fisioterapia desde 31/10/2016 até 10/2/2020, num total de 629 sessões.

O Autor deve manter consultas de ortopedia e de psiquiatria de vigilância, eventualmente maior frequência se necessário e de neurocirurgia e fisioterapia com frequência a determinar pelo médico assistente. Ainda realiza fisioterapia.

Ajudas técnicas: tala/apoio de punho (caso não tenha feito artrodese).

58 - Adaptação ao domicílio:

- O Autor beneficia de carro automático, adaptado a uso só do membro superior esquerdo; eventuais ajudas técnicas no computador tais como rato e apoio para diminuir dor no uso com a mão esquerda; eventuais utensílios de vida diária que possam permitir melhor uso da mão esquerda e mais autonomia (a determinar em avaliação de ajudas técnicas).

- tábua de preparação de alimentos para unimanual.

- faca de Nelson

- rebordo de prato

- Dispositivo de parede – dispensador de gel de banho e shampoo

- dispositivo anti-derrapante para abertura de embalagens, em silicone ou outro - rato de computador adaptado com botões e comandos laterais

59 - O Autor deverá realizar programa em terapia ocupacional para treino dos produtos de apoio, treino de AVD e AVDi.

60 - Ajuda de terceira pessoa:

- O Autor necessita de ajuda de terceira pessoa para tarefas de vida diárias que impliquem o uso dos dois membros superiores em simultâneo ou de maior esforço e força tais como limpezas profundas do domicílio para deslocar móveis, ou outras mais pesadas, ajuda para preparação dos alimentos (descascar e cortar por exemplo), ajuda para comer alguns alimentos que não consegue descascar ou cortar, lavar a roupa manualmente (tem que fazer uso da máquina de lavar roupa ou necessita de ajuda de terceira pessoa para lavagem de roupas manual), lavar louça (podendo fazer uso de máquina de lavar louça necessitando de ajuda de terceira pessoa para lavagem manual), atividades que o próprio apesar de não ter referido - o que pode ser explicado pela idade do mesmo e contexto de vivência familiar - se admite venha a percecionar quando iniciar vida autónoma/quando passar a morar sozinho.

- Ao nível da alimentação: O Autor tem dificuldade na preparação de alimentos mais duros, necessitando de apoio para a sua preparação.

- Dificuldade na abertura de frascos / recipientes.

- Higiene Pessoal: autonomia modificada, encontrou estratégias; atividade unimanual e demora mais tempo; precisa de ajuda a cortar as unhas das mãos; não usa escova de dentes elétrica, usa manual e tem estratégia para a pasta dos dentes.

Banho: Dificuldade no uso de embalagens

Vestir: Autonomia modificada – demora mais tempo.

Calçar: consegue calçar meias e restante calçado; tem dificuldade nos cordões – não terá aprendido a técnica de apertar unimanual.

Escrita: Tenta com a mão esquerda.

Tecnologias: Usa o computador e o telemóvel; comprou rato com mais opções de botões e comandos.

Condução: Com adaptação.

Lesão neurológica periférica grave, sem movimentos funcionais no membro superior direito.

61 - Por causa do embate, o Autor ficou com uma perturbação persistente do humor, com repercussão moderada na autonomia pessoal, social e profissional com repercussão moderada nas atividades da vida diária, incluindo as familiares, sociais, de lazer e desportivas, o qual, tendo em conta o diagnóstico é valorizado em 12 pontos.

62 - O Autor sofreu um prejuízo juvenil.

63 - O Autor nasceu em ../../2000.

64 - Atualmente concluiu o Curso Técnico Comercial, que permitiu equivalência ao 12º ano, tendo efetuado estágio profissional.

65 - Atualmente não tem acompanhamento psicológico nem psiquiátrico.

66 - A 1ª Ré “A... – Companhia de Seguros S.A.” que à data do acidente era denominada e designada por “C... – Companhia de Seguros S.A.” é a Seguradora para a qual, por contrato titulado pela Apólice nº ...88, vigente à data do acidente, havia sido transferida a responsabilidade civil por danos emergentes de acidente de viação causados pelo veiculo com a matricula ..-JZ-...

67 - O Autor pertencia à Federação Portuguesa de Ciclismo, sendo que esta Federação celebrou com a Companhia de Seguros, a aqui 2ª Ré “B... S.A.”, um contrato de seguro desportivo obrigatório, - a titulo de acidentes (pessoais) dos atletas federados, que veio a ser titulado pela apólice nº ...60.


*

            2. FACTOS NÃO PROVADOS

Não se provaram com relevância para a causa os restantes factos, nomeadamente que:

a) Logo após o embate o veículo “JZ” ficou na posição a que se alude no ponto 10.

b) Por causa do embate, o Autor ficou impossibilitado de entrar na universidade e ter acesso ao ensino superior.

c) Por causa do embate, o Autor apresenta um estado depressivo que o leva a não acreditar e a não ter expectativas de que com os tratamentos e fisioterapia conseguirá aumentar a sua autonomia.

d) O Autor deixou de ter expectativas de encontrar um emprego capaz de lhe garantir um salário médio de acordo com as expectativas de um jovem da sua idade.

e) Devido ao seu estado depressivo deixou de ter expectativas de prosseguir e aprofundar a sua formação e literacia.

f) Com o início do ano e o aproximar do julgamento deixou de acreditar definitivamente que se possa realizar enquanto desportista, mesmo como paraolímpico, na modalidade de ciclismo.

g) Devido ao seu atual estado psíquico e mental, deixou de acreditar e perdeu a vontade de prosseguiu os seus estudos com vista a poder ser ator ou de encontrar uma profissão que lhe permita uma realização pessoal e profissional.

h) Por causa das lesões sofrida, o Autor deixou de acreditar que podia encontrar uma companheira de acordo com os seus padrões ideais e de beleza.

i) Perdeu a vontade e auto estima para constituir família, ter filhos e netos.

j) O Autor sente-se cada vez mais deprimido para executar as suas tarefas/ funções básicas diárias.

l) Deixou de sentir a ativação da sua virilidade, o que afetou profundamente a sua auto estima sexual.

m) Estando numa depressão limite, tendo perdido o gosto pela vida, tendo tendências suicidas.

n) As dores físicas e psíquicas têm aumentado com os atos da sua vida diária e quotidiana.

o) Atualmente, o Autor sente revolta e loucura pela posição da Companhia de não lhe pagar qualquer quantia.

p) A condutora do veículo “JZ” circulava a velocidade inferior a 50 Km/h e, ao aproximar-se de uma curva à sua direita, foi surpreendida pelo velocípede, conduzido pelo Autor, a circular em sentido oposto, pela hemi-faixa esquerda, atento o sentido de marcha do Autor, a desfazer a curva à esquerda, tendo a condutora do “JZ”, para evitar o embate frontal, guinado a direção para a sua esquerda, ocorrendo o embate entre o rodado da frente do velocípede e a frente direita do “JZ”, sendo o Autor projetado, embatendo no capot e pára-brisas, acabando por cair na via.


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II.B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

1º- Da culpa exclusiva da segurada (ou concorrência da culpa do lesado) e da obrigação de indemnizar.

Julgou o Tribunal de 1ª instância verificados todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, por factos ilícitos, incluindo a culpa efetiva. E quanto ao ónus de prova dos factos integrantes do ilícito e da culpa no quadro da responsabilidade civil extracontratual (nº1, do art. 483º, do Código Civil, diploma a que doravante nos reportamos, na falta de outra referência), se não houver presunção legal de culpa, cabe o mesmo, efetivamente, a quem, com base neles, pretende fazer valer o seu direito (nº1, do art. 342º e nº1, do art. 487º).

Consagrando o nº1, do artigo 342º, que regula a questão do ónus da prova, que “Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado”, mostrando-se demonstrados factos constitutivos do direito invocado tem a ação de proceder nos termos decididos pelo Tribunal a quo, apenas cabendo determinar do quantum indemnizatório adequado aos danos sofridos pelo Autor.
Com efeito, sendo as regras sobre o ónus da prova regras de decisão, e atendendo a que “no nosso direito processual, ter o ónus da prova significa sobretudo determinar qual a parte que suporta a falta de prova de determinado facto”[2], tendo o Autor logrado ver provados os referidos factos, que integram os constitutivos do seu direito, tem a vantagem que lhe foi atribuída em 1ª instância. E provando o Autor o fundamento do seu direito tem a ação de proceder.
A primeira questão a analisar e decidir no recurso independente, balizado, como vimos, pelas conclusões da apelação, prende-se com a existência, ou não, de culpa do lesado, bem tendo o Tribunal decidido, face à matéria de facto que considerou provada, e cuja decisão se mantém, encontrar-se provada, a culpa, efetiva, da condutora do veículo seguro, nenhuma culpa podendo ser atribuída ao lesado, bem referindo:

 “A norma preceptiva do art. 13º, nº 1 C.E. prescreve: “O trânsito de veículos deve fazer-se pelo lado direito da faixa de rodagem e o mais próximo possível das bermas e passeios, conservando destes uma distância que permita evitar acidentes”. Em caso de manifesta necessidade, poderá, no entanto, “utilizar-se o lado esquerdo da faixa de rodagem para ultrapassar ou mudar de direção” - art. 13º, nº 2 C.E..

O condutor deve abster-se de praticar atos que impeçam ou embaracem o trânsito ou comprometam a segurança ou a comodidade dos utentes das vias ( art. 3º, nº 2 do Código da Estrada )

No que se reporta à conduta da condutora do veículo “JZ”, sempre se dirá que a mesma agiu de forma desatenta, já que ao descrever uma curva invadiu a hemi faixa de rodagem do lado esquerdo, atento o sentido em que seguia, tendo embatido, a 0,5 metro do eixo da via, com a parte da frente direita do “JZ” no velocípede conduzido pelo Autor, que se encontrava a circular pela sua hemi-faixa direita.

Assim, a referida condutora do veículo “JZ” executou a manobra em causa sem a diligência exigida ao homem médio, circulava com a mais completa falta de cuidado, de prudência, de consideração, de respeito, de diligência, de habilidade e de destreza, tendo a sua conduta despoletado o acidente, pelo que o acidente ficou a dever-se a culpa da Autora, por violação do disposto nos arts. 3º e 13º do Código da Estrada” (negrito nosso).

        Na verdade, bem resulta provada a causa do acidente e a culpa exclusiva da lesante, como se pode constatar da leitura dos factos provados – cfr designadamente f.p.s nº 4 a 6:

4 - A condutora do veículo “JZ”, por solicitação do seu filho, que circulava no banco de trás, foi buscar uns lenços que se encontravam no lugar do pendura e, ato contínuo, entregou-lhe os lenços, o que fez com que desviasse o seu olhar da estrada e retirasse o seu pé do acelerador.

5 - Os atos a que se aludem no ponto 4 fizeram com que a Autora, ao descrever a curva para a sua direita, progressivamente, diminuísse a sua velocidade de circulação e ocupasse a hemi faixa de rodagem do lado esquerdo, atento o seu sentido de marcha.

6 - Tendo embatido com a parte da frente direita do veículo “JZ” no velocípede conduzido pelo Autor,...”(negrito nosso).

Não resultou provado facto culposo do lesado a concorrer para a produção ou agravamento dos danos, em nada tendo a atuação do Autor, que seguia na sua faixa de rodagem, a direita, atento o seu sentido de marcha, onde foi colhido, como bem concluiu o Tribunal a quo, contribuído para a ocorrência do acidente, não lhe podendo ser atribuída responsabilidade na ocorrência do embate.

Não resultou que o lesado tenha contribuído, com atitude sua, para a produção do dano, antes tendo resultado provada a culpa exclusiva da lesante que, distraída, na realização de atos que se não prendiam com a condução, enquanto conduzia, invadiu a faixa da esquerda, atento o seu sentido de marcha, e foi embater no velocípede do Autor que por aí circulava, seguindo em sentido inverso ao seu.

Com efeito, foi a Autora que saiu da faixa de rodagem em que seguia (a direita, atento o seu sentido de marcha) e, inopinadamente, invadiu a faixa de rodagem contrária por onde o Autor seguia, a circular em sentido contrário, assim dando causa ao embate, praticando um facto ilícito culposo e tendo sido a referida atuação  a causa de todos os danos sofridos pelo Autor, que resultaram provados.

Irrelevante é, pois, se o Autor circulava um pouco mais junto à berma ou um pouco mais junto ao eixo da via, pois que, certo é, foi na faixa de rodagem por onde o mesmo circulava que o embate ocorreu, tendo-a a condutora do veículo seguro invadido, numa condução desatenta e imprudente.   

Considerando verificados todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos da condutora do veículo seguro na 1ª Ré, constituiu-se esta em obrigação de indemnizar, dado ter a mesma, pela apólice supra referida, assumido a obrigação de indemnizar os danos emergentes da circulação do veículo causador do acidente.

Verifica-se, na verdade, como bem entendeu o Tribunal a quo, que se encontram preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil previstos nos artigos 483.º, n.º 1 e 486.º e, como tal, a obrigação de indemnizar os danos sofridos pelo Autor.
Estando demonstrados os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, demostrada a culpa exclusiva da lesante, não cabe analisar questões, cujo conhecimento resulta prejudicado, de presunção de culpa ou de responsabilidade objetiva (pelo risco) que apenas seriam de apreciar a não se mostrar provada a culpa ou em situação de demonstração de ausência de culpa na produção do acidente.

*

Do quantum indemnizatório

Decidida a questão da responsabilidade da lesante, sendo a culpa da mesma exclusiva, passa-se à análise do direito à indemnização e do quantum a fixar pelos danos aludidos pela 1ª Ré e pelo Autor nas conclusões das apelações, sendo esses os objeto do recurso:

- os danos dos bens destruídos com o acidente e as concretas despesas médicas e de transportes referidas nas conclusões da apelação (recurso principal);

- o dano biológico;

- e os danos não patrimoniais.
Insurge-se a apelante 1ª Ré contra os montantes fixados pelo Tribunal a quo, pretendendo:
- se atribua ao Autor, a título de danos patrimoniais pela perda de capacidade de ganho quantia não superior a 140.000,00 euros em vez dos € 290.000,00 fixados pela 1.ª instância, pretendendo o Autor/apelante lhe sejam fixados € 600.000,00;
- se atribua ao Autor, a título de danos não patrimoniais quantia não superior a €  100.000,00, em vez dos € 180.000,00 fixados pela 1ª instância, pretendendo o Autor lhe sejam fixados 200.000,00 €;

   - se relegue para momento ulterior a liquidação do valor dos equipamentos danificados e das referidas despesas, por nenhuma prova ter sido feita quanto ao valor concreto dos equipamentos destruídos e despesas médicas e de transporte peticionadas ( de, respetivamente, € 450,00, € 228,31 e € 1.125,00).
Vejamos, antes de mais, a fundamentação da decisão recorrida quanto a cada uma das referidas parcelas indemnizatórias que integram a indemnização fixada para determinar o quantum a atribuir.

A sentença recorrida, apreciando a exata medida da obrigação de indemnizar, analisa ter sido pedida indemnização de:

- € 600.000,00, a título de dano biológico e fixa a indemnização por tal dano em 290.000, 00 €, considerando:

“o Autor ficou a padecer de um Défice Funcional Permanente de Integridade Físico-Psíquica fixável em 59 pontos (aqui se incluindo os 12 pontos atribuídos por perturbação persistente do humor, com repercussão moderada na autonomia pessoal, social e profissional com repercussão moderada nas atividades da vida diária, incluindo as familiares, sociais, de lazer e desportivas), sendo de perspetivar a existência de Dano Futuro, o que pode obrigar a uma futura revisão do caso por artrose na articulação do joelho esquerdo.

O Autor era estudante à data do embate, tendo ficado com o seu percurso escolar afetado, quer pelas limitações físicas, funcionais e quadro de dor, quer pelas consequências psíquicas, mais acentuadas no período inicial após o embate, assim como pelo absentismo escolar necessário para tratamentos cirúrgicos. A necessidade de realização frequente de pensos e de fisioterapia, implicou para o Autor, dispêndio de tempo, dores físicas e alterações do foro mental associadas. Sendo o Autor, à data, adolescente ainda sem projeto profissional mais orientado ou definido, as sequelas resultantes do embate são compatíveis com algumas profissões, embora com esforços suplementares (mesmo que não necessite do uso dos membros superiores, já que mesmo nesses casos, mantém quadro doloroso e queixas psíquicas que o afetam).

O Autor estará impossibilitado de prosseguir uma profissão em que necessite de usar os dois membros superiores em simultâneo e estará impossibilitado ou pelo menos necessitará de esforços suplementares acentuados no exercício de profissões em que apenas necessite de usar um membro superior mas que exijam grande destreza/precisão desse membro (uma vez que era dextro, necessitando agora de fazer uso do membro que era passivo), podendo ainda assim admitir-se que possa beneficiar de treino específico para o uso do lado esquerdo, o que só poderá ser avaliado caso-a-caso.

Dado que a sua dinâmica postural e equilíbrio também estão algo afetados, é de admitir dificuldade acrescida na realização de profissões que exijam elevadas capacidades de equilíbrio.

Para o exercício da profissão de ator pretendida pelo Autor é de admitir estar impossibilitado na realização de vários papéis que impliquem o uso pleno do membro superior direito ou em que a postura adotada o examinando possa não conseguir desempenhar. Outros papéis existirão que poderá realizar com esforços suplementares.

O Autor manifestou intenção de seguir a área de comunicação, sendo que a capacidade para profissões desta área de estudo depende da concreta profissão que venha a escolher, de qualquer forma, necessitando sempre pelo menos de esforços acrescidos pelas sequelas físicas e psíquicas que se consideraram resultantes do acidente em apreço. (cfr. factualidade constante dos pontos 46 a 53 e 61 a 62)

(…) sendo previsível, considerando um quadro normal de vida e saúde, que o Autor venha a exercer uma atividade profissional, pelo menos, até aos 70 anos, estando a esperança de vida dos homens fixada nos 78 anos de idade”.

- € 200.000,00, a título de danos não patrimoniais e fixa a indemnização por tal dano em 180.000, 00 €, entendendo:

“são indemnizáveis, pois têm elevada gravidade e merecem a tutela do direito, já que se consubstanciam numa lesão da sua integridade física e psicológica.

Valorizando-se os mencionados danos por referência ao momento atual, considerando que o Autor teve um Défice Funcional Temporário Total de 23 dias, um Défice Funcional Temporário Parcial de 1280 dias, com Repercussão Temporária na Atividade Profissional (considerou-se a repercussão escolar) num período total de 103 dias, repercussão Temporária na Atividade Profissional Parcial (considerou-se repercussão escolar), um período total de 1200 dias. O Quantum doloris no grau 6 numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta as lesões resultantes, o período de recuperação funcional, o tipo de traumatismo, e de tratamentos efetuados, com múltiplas cirurgias, pensos por longos períodos por dificuldade na cicatrização de ferida torácica, fisioterapia com frequências de 5 e de 3 vezes por semana, e em face da idade do examinado e gravidade do quadro clínico com implicação no seu bem estar físico com dor e limitação motora, mental e social numa faixa etária na qual o contexto social representa um amplo espaço de realização e formação pessoal. Dano Estético Permanente é fixável no grau 6, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta os seguintes aspetos: as extensas cicatrizes de aspeto hipertrófico e com pigmentação no tronco, as restantes cicatrizes nos membros superiores esquerdo e direito e membros inferiores esquerdo e direito, a alteração dos normais movimentos e sincronia dos movimentos do corpo pela imobilidade do membro superior direito, a amiotrofia do membro superior direito, o flexo do cotovelo direito, a necessidade de usar tala de apoio (está documentado que iria realizar artrodese do punho ou seja, fixação cirúrgica do punho direito que poderá ter sido entretanto realizada mas que não impede que haja dano estético por punho em posição fixa). Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer é fixável no grau 6, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta a sua vida afetiva, social e familiar. Repercussão Permanente na Atividade Sexual é fixável no grau 4, pelas sequelas físicas e psíquicas e dificuldade em posicionamentos, tendo as lesões sofridas lhe causado um prejuízo juvenil.

O Autor necessita de ajuda de terceira pessoa para tarefas de vida diárias que impliquem o uso dos dois membros superiores em simultâneo ou de maior esforço e força tais como limpezas profundas do domicílio para deslocar móveis, ou outras mais pesadas, ajuda para preparação dos alimentos (descascar e cortar por exemplo), ajuda para comer alguns alimentos que não consegue descascar ou cortar, lavar a roupa manualmente (tem que fazer uso da máquina de lavar roupa ou necessita de ajuda de terceira pessoa para lavagem de roupas manual), lavar louça (podendo fazer uso de máquina de lavar louça necessitando de ajuda de terceira pessoa para lavagem manual), atividades que o próprio apesar de não ter referido - o que pode ser explicado pela idade do mesmo e contexto de vivência familiar - se admite venha a percecionar quando iniciar vida autónoma/quando passar a morar sozinho.

Ao nível da alimentação: O Autor tem dificuldade na preparação de alimentos mais duros, necessitando de apoio para a sua preparação, dificuldade na abertura de frascos / recipientes, Higiene Pessoal: autonomia modificada, encontrou estratégias; atividade unimanual e demora mais tempo; precisa de ajuda a cortar as unhas das mãos; não usa escova de dentes elétrica, usa manual e tem estratégia para a pasta dos dentes. Banho: Dificuldade no uso de embalagens, Vestir: Autonomia modificada – demora mais tempo. Calçar: consegue calçar meias e restante calçado; tem dificuldade nos cordões – não terá aprendido a técnica de apertar unimanual. Escrita: Tenta com a mão esquerda. Tecnologias: Usa o computador e o telemóvel; comprou rato com mais opções de botões e comandos. Condução: Com adaptação”.

   - pelos equipamentos danificados, despesas médicas e de transportes foi fixado o valor de, respetivamente, € 450,00, € 228,31 e € 1.125,00 e conclui a 1ª Ré apelante dever ser relegado para momento ulterior a liquidação do seu valor por nenhuma prova ter sido feita quanto ao valor concreto dos equipamentos destruídos e referidas despesas médicas e de transporte.

         Vistas as conclusões das alegações, a parte dispositiva da sentença e a fundamentação para os concretos danos sofridos, posta em causa no recurso, cumpre analisar os critérios que hão de presidir à indemnização a fixar e decidir o quantum indemnizatório a atribuir ao Autor pelos referidos danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu, que resultam dos factos provados, sendo que a decisão da matéria de facto não foi objeto de impugnação.

2.1- Danos patrimoniais relativos a equipamentos danificados e despesas médicas e de transportes.

Começando por estes danos patrimoniais, relativos a equipamentos danificados e despesas, verifica-se que pediu o Autor a quantia de € 450,00, pela destruição do equipamento que vestia e utilizava no treino - camisola, calções, sapatos, capacete, polar e óculos -, a quantia de € 228,31 a título de custos dos medicamentos adquiridos e de despesas com os tratamentos médicos que não foram suportados pela Segurança Social e a quantia de € 1.125,00 por despesas com transportes para se deslocar a consultas e tratamentos, tendo efetuado, desde a data do acidente, 75 viagens de ida e volta, desde a residência do Autor (sita em ... – ...) ao Hospital 2... (sito no Porto), e despendido em cada viagem a quantia de € 15,00.

Ora, bem decidiu o tribunal a quo: “verifica-se que em consequência do embate, o equipamento que o Autor vestia e utilizava no treino foi comprado por si – camisola, calções, sapatos, capacete, polar e óculos - ficou totalmente destruído, o qual tinha um valor global não inferior a 450,00 € (quatrocentos e cinquenta euros), pelo que se condena a 1ª Ré no pagamento ao Autor da quantia de € 450,00”, “do ponto 40 resulta que o Autor despendeu a quantia de € 228,31 com os custos dos medicamentos adquiridos por si e com despesas com os tratamentos médicos que não foram suportados pela Segurança Social, pelo que se condena a 1ª Ré no pagamento ao Autor da quantia de € 228,31” e “que as despesas com transportes para se deslocar para as consultas e para os tratamentos sempre foram efetuados pelos pais do Autor, em veiculo próprio daqueles, tendo efetuado desde a data do embate até à presente data 75 viagens de ida e volta desde a residência do Autor (sita em ... - ...) ao Hospital 2... (sito no Porto), tendo despendido em cada viagem de ida e volta com combustível e portagens a quantia de 15,00 € (quinze euros), o que perfaz um total de € 1.125,00, pelo que se condena a 1ª Ré no pagamento ao Autor da quantia de € 1.125,00”.
E bem o efetuou na própria sentença, por provados se mostrarem, já, os valores de tais danos - cfr. pontos 18 e 40[3], dos factos provados, não tendo a decisão de facto sido impugnada - nada sendo, por isso, necessário liquidar ulteriormente, sendo tais danos líquidos e permitindo, por isso, a imediata decisão da questão.

2.2 – Dano biológico (danos patrimoniais futuros/perda de capacidade de ganho).

Quanto ao dano biológico, a ser indemnizável autonomamente, considerou o Tribunal a quo ter o Autor, à data do acidente, 15 anos de idade, ser estudante e ter ficado a padecer de um Défice Funcional Permanente de Integridade Físico-Psíquica fixável em 59 pontos.
Como tivemos já oportunidade de analisar em vários Acórdão, a responsabilidade da Ré traduz-se numa obrigação de reparar o dano causado, designada por obrigação de indemnizar, cujo princípio geral se encontra consagrado no artigo 562.º.
 No quadro da responsabilidade civil, a nossa lei não contempla uma definição de dano, mas refere-o como sendo um dos pressupostos da obrigação de indemnizar, quer da responsabilidade civil extracontratual quer da responsabilidade civil contratual (v. artigos 483.º, n.º 1, e 798.º), e fornece os parâmetros que permitem chegar a uma definição. Desde logo, o referido artigo 562.º, ao proclamar o princípio geral da obrigação de indemnizar, consigna que: “Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação” e o artigo 563.º, sob a epigrafe “Nexo de causalidade”, prescreve que: A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão (teoria da causalidade adequada).
Quais são, pois, os danos indemnizáveis?
Refere Joaquim José de Sousa Dinis “Fazendo um zoom sobre a realidade “dano”, como o fez o Ac. do STJ de 28/10/92 (CJ, Ano XVII, T.4, p. 28 e ss), podemos encontrar os seguintes aspectos:
1 - Danos emergentes, os quais incluem os prejuízos directos e as despesas directas, imediatas ou necessárias;
2 - Ganhos cessantes;
3 – Lucros cessantes;
4 – Custos de reconstituição ou reparação;
5 – Danos futuros;
6 – Prejuízos de ordem não patrimonial.
Os prejuízos directos traduzem-se na perda, destruição ou danificação de um bem, que tanto pode ser um objecto, como um animal ou uma parte do corpo do lesado ou o próprio direito à vida destes; as despesas necessárias ou imediatas correspondem ao custo de prestação dos serviços alheios necessários quer para prestar o auxílio ou assistência quer para eliminar aspectos colaterais decorrentes do acto ilícito, aspectos estes que abrangem realidades tão diversificadas como a limpeza do local, reboques de viaturas ou enterro de quem tenha falecido.
Os ganhos cessantes correspondem à perda da possibilidade de ganhos concretos do lesado, incluindo-se na categoria de lucros cessantes. Mas não deve ser confundida: a) com a perda de capacidade de trabalho que é nitidamente um dano direto, que se pode aferir em função da tabela nacional de incapacidades (…).
Os danos futuros compreendem os prejuízos que, em termos de causalidade adequada, resultarem para o lesado (ou resultarão de acordo com os dados previsíveis da experiência comum) em consequência do acto ilícito que foi obrigado a sofrer,… e ainda os que poderiam resultar da hipotética manutenção de uma situação produtora de ganhos durante um tempo mais ou menos prolongado, (e que poderá corresponder, nalguns casos ao tempo de vida laboral útil do lesado), e compreendem ainda determinadas despesas certas, mas que só se concretizarão em tempo incerto (ex. substituição de uma prótese ou futuras operações cirúrgicas).
Segundo certa classificação dos danos eles podem ser patrimoniais e não patrimoniais. Os primeiros incidem sobre interesses de natureza material ou económica, refletindo-se no património do lesado. Os segundos reportam-se a valores de ordem espiritual, ideal ou moral. Os danos morais ou prejuízos de ordem não patrimonial são prejuízos insuscetíveis de avaliação pecuniária porque atingem bens que não integram o património do lesado (a vida, a saúde, a liberdade, a beleza)”[4]
O “dano” ou “prejuízo” consagrado, desde logo, no referido art. 564º, surge sob vários aspetos. Na verdade, o dano compreende o prejuízo causado (dano emergente) e os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão (lucro cessante) – nº1 – e os danos futuros – nº2.
A responsabilidade civil no nosso direito tem como primordial a função compensatória, ou seja, a reparação do dano, condição essencial e limite da obrigação de indemnizar, ainda que dentro de tais limites se contenham finalidades acessórias preventivas e mesmo sancionatórias. Nessa linha é pertinente considerar que a obrigação de indemnizar tem como balizas, por um lado, o princípio da reparação integral do dano e, por outro, a proibição do enriquecimento sem causa do lesado à custa da indemnização.
O montante indemnizatório deve equivaler ao dano efetivo, à avaliação concreta do prejuízo sofrido (e não à abstrata), sendo certo que decore do nº1, do artigo 564º, que o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão. Assim, o dever de indemnizar abrange os prejuízos sofridos, a diminuição dos bens já existentes na esfera patrimonial do lesado - danos emergentes -, e os ganhos que se frustraram, os prejuízos que advieram ao lesado por não ter aumentado, em consequência da lesão, o seu património - lucros cessantes.
Nessa base, a doutrina tem definido o dano, embora sob formulações variadas, como sendo a lesão ou prejuízo real, sob a forma de destruição, subtração ou deterioração de um certo bem, lesão de bens juridicamente protegidos do lesado, patrimoniais ou não, ou simplesmente uma desvantagem de uma pessoa, que é juridicamente relevante, por ser tutelada pelo Direito.
Daí que o dano não traduza uma realidade puramente empírica nem uma mera categoria normativa. Assume-se, antes, como um conceito empírico-normativo, que convoca um dado naturalístico mas requer um referencial normativo.
Exige-se, pois, que traduza uma equação entre a situação económica real em que o lesado se encontra na data mais recente que possa ser atendida e a situação hipotética que existiria se não tivesse ocorrido o evento lesivo.
Ora, se aquela situação real é demonstrável diretamente pela realidade de facto, já a situação hipotética só é alcançável através de um juízo de probabilidade a formular dentro dos limites normativos estabelecidos.
Por isso, na definição de qualquer dano existe, em maior ou menor grau, uma dimensão desenhada com apelo a um juízo de probabilidade, e não a uma certeza de absoluta verificabilidade, o que se torna bem patente nos casos de lucros cessantes - enquanto benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão, ou seja, que obteria se não fosse essa lesão.
O dano, prejuízo, resultante de facto ilícito culposo, causado a alguém, é, na verdade, condição essencial à obrigação de indemnizar.
Se esse prejuízo se regista ou se reflete na situação patrimonial do lesado estamos perante um dano patrimonial. E este manifesta-se, como vimos, sob duas modalidades: o dano emergente, ou perda patrimonial, que abrange o prejuízo causado nos bens ou nos direitos já existentes na titularidade do lesado na ocasião da lesão, e o lucro cessante que contempla os benefícios que o lesado deixou de obter por causa do facto ilícito. O dever de indemnizar compreende um e outro, como flui do disposto no n.º 1 do art. 564º. Este preceito abrange não só os danos emergentes como os lucros cessantes, representando aqueles uma diminuição efectiva e actual do património e estes traduzindo não um aumento do património, mas a frustração de um ganho[5].
Mas, como evidencia PESSOA JORGE, que segue o entendimento de VAZ SERRA e de PEREIRA COELHO, o lucro cessante pressupõe que o lesado tinha, no momento da lesão, um direito ao ganho que se frustrou, ou melhor, a titularidade de uma situação jurídica que, mantendo-se, lhe daria direito a esse ganho (cfr. Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, Lisboa 1972, pág. 378 e nota (348).[6]
Conforme ensina Galvão Teles os danos emergentes traduzem-se numa desvalorização do património, os lucros cessantes numa sua não valorização. Se diminui o ativo ou aumenta o passivo, há um dano emergente (damnum emergens); se deixa de aumentar o ativo ou de diminuir o passivo, há um lucro cessante (lucrum cessans). Ali dá-se uma perda, aqui a frustração de um ganho[7].
Os lucros cessantes correspondem aos ganhos que o lesado deixou de ter por não ter aumentado, em consequência da lesão, o seu património[8]
Nos lucros cessantes pressupõe-se que o lesado tinha, no momento da lesão, um direito ao ganho que se frustrou, ou melhor, a titularidade de uma situação jurídica que, mantendo-se, lhe daria direito a esse ganho[9].
Pires de Lima e A. Varela fazem ressaltar que o lucro cessante, como compreende benefícios que o lesado não obteve, mas deveria ter obtido, tem de ser determinado segundo critérios de verosimilhança ou de probabilidade. São vantagens que, segundo o curso normal das coisas ou de harmonia com as circunstâncias especiais do caso, o lesado teria obtido, se não fora o acto lesivo [10].
O lucro cessante pressupõe que o lesado tinha, no momento da lesão, um direito ao ganho que se frustrou, ou melhor, a titularidade de uma situação jurídica que, mantendo-se, lhe daria direito a esse ganho – o que não se verifica nos casos em que existe uma simples expectativa, uma mera possibilidade de a vítima vir a ser titular dessa situação jurídica.[11]
Acresce que a lei, para além da ressarcibilidade dos danos patrimoniais, contempla a “compensação” pelos danos não patrimoniais, ou seja, aqueles que só indiretamente podem ser compensados – art. 494º, n.º2, integrando uns e outros a obrigação de indemnizar.
O art. 566º, consagra o princípio da reconstituição natural do dano, mandando o art. 562º reconstituir a situação hipotética que existiria se não fosse o facto gerador da responsabilidade e não sendo possível a reconstituição natural, não reparando a mesma integralmente os danos ou sendo excessivamente onerosa para o devedor, deve a indemnização ser fixada em dinheiro – nº1. do art. 566º.
E a indemnização pecuniária deve medir-se por uma diferença (id. quod interest como diziam os glosadores) – pela diferença entre a situação (real) em que o facto deixou o lesado e a situação (hipotética) em que ele se encontraria sem o dano sofrido[12].
Consagra a lei, em sede de indemnização em dinheiro, a teoria da diferença tomando como referencial “a data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que nessa data teria se não existissem danos” – art. 566º, nº2. Quer dizer que a diferença se estabelece entre a situação real atual e a situação hipotética correspondente ao mesmo momento[13].
Manda, ainda, como vimos, atender aos danos futuros (nº2, do art. 564º), desde que previsíveis e o nº3, do art. 566º, confere ao tribunal a faculdade de recorrer à equidade quando não seja possível, designadamente face à imprecisão dos elementos de cálculo, fixar o valor exato dos danos.
Na responsabilidade civil extracontratual, designadamente a emergente de acidente de viação, e no âmbito dos danos patrimoniais, previstos nos artigos 483.º, n.º 1, e 562.º a 564.º, encontram-se os danos resultantes das sequelas sofridas que impliquem perda de capacidade de ganho.
No âmbito destes, movemo-nos no chamado dano biológico, na sua vertente de dano patrimonial futuro, podendo, neste, distinguir-se entre a incapacidade fisiológica ou funcional (geral) e a incapacidade para o trabalho.
Na incapacidade fisiológica ou funcional, a repercussão negativa da respetiva incapacidade permanente centra-se na diminuição da condição física, da resistência e da capacidade de esforços do lesado, o que se traduzirá numa deficiente ou imperfeita capacidade de utilização do corpo no desenvolvimento das atividades pessoais em geral e numa consequente, previsível, maior penosidade, dispêndio e desgaste físico na execução das atividades diárias, incluindo, eventualmente, as suas tarefas profissionais. É esse agravamento da penosidade (de carácter fisiológico ou físico-psíquico) e consequente maior esforço, maior sacrifício/penosidade no desempenho das atividades profissionais e, ainda, uma menor qualidade/conforto de vida em geral, decorrente da afetação da saúde, que deve radicar-se o arbitramento da indemnização (autónoma) pelo dano biológico. Há, assim, lugar ao arbitramento de indemnização por danos patrimoniais, mesmo que se não haja feito prova de que o lesado, por força de uma incapacidade, venha a sofrer de qualquer diminuição dos seus proventos futuros ou, ainda, mesmo que não haja prova de uma estrita incapacidade para o desempenho da atividade profissional habitual, bastando a demonstração de que o desempenho profissional (e a consequente manutenção do mesmo nível de rendimentos) obriga a maiores esforços, a maior penosidade no desempenho de tais atividades, sendo indiscutível o ressarcimento deste dano. Indemniza-se, assim, basicamente o dano corporal sofrido, por si, quantificado por referência a um índice 100 (que corresponde à plena integridade psicossomática), e não qualquer perda efetiva de rendimento ou de concreta privação da capacidade de angariação de réditos, que pode, até, não existir. Este entendimento, que vem sendo perfilhado pela jurisprudência, designadamente do Supremo Tribunal de Justiça, tem na sua base a ideia de que a existência de uma incapacidade física, em consequência de lesões provocadas no corpo e na saúde do lesado, afeta, necessariamente, a sua capacidade funcional, pois que este verá afetadas as condições normais de saúde necessárias ao desenvolvimento adequado e normal daquela, sempre lhe exigindo um esforço ou transtorno acrescido, independentemente da sua repercussão negativa a nível salarial.[14]
Na reparação do dano corporal, a jurisprudência tem procurado, com vista a encontrar o quantum indemnizatório, determinar o capital que produza o rendimento de que o lesado foi privado e irá ser até final da sua vida, através do recurso a métodos matemáticos, sendo entendimento jurisprudencial uniforme que nenhum dos aludidos critérios é absoluto, devendo ser aplicados como meros índices ou parâmetros temperados com a aplicação e um juízo de equidade e, isto, porque na avaliação dos prejuízos o juiz tem de atender, sempre, à multiplicidade e à especificidade das circunstâncias que concorrem no caso e que o tornam único e diferente[15].
Na verdade, é uniforme o entendimento jurisprudencial no sentido de que o Tribunal não está confinado ao resultado de qualquer fórmula, nomeadamente daquelas em que se utilizam tabelas financeiras, e, sendo o recurso a fórmulas meramente indiciário, não pode o julgador desvincular-se dos critérios constantes do art. 566º do Código Civil, mormente do referido do nº3, que impõe que se o tribunal não puder averiguar o montante exato dos danos deve recorrer à equidade.
No cálculo da indemnização, com recurso à equidade, nos termos do disposto no art. 566º, n.º 3, do CC, iremos socorrer-nos, como critério objetivador, aferidor e orientador, com vista a evitar subjetivismos, das fórmulas matemáticas, designadamente da enunciada no Ac. STJ. de 04/12/2007, Proc. 07A3836, in base de dados da DGSI, da prevista nos estudos efetuados pelo Dr. Sousa Dinis, in CJ/STJ, 1997, t. II, págs. 11 e ss e das enunciadas na Lei dos Acidentes de Trabalho, sendo que o recurso a elas é meramente indicador e instrumental, já que o critério que vai presidir, até por imposição legal, à fixação desta concreta indemnização é a equidade.
Com efeito, as fórmulas usadas para calcular as indemnizações, sejam elas a do método do cálculo financeiro, da capitalização dos rendimentos, ou as usadas na legislação infortunística, não são, de modo algum, imperativas. Até se refere no Acórdão deste STJ, de 18.3.97, in CJ STJ, 1997, II, 24: “Os danos patrimoniais futuros não determináveis serão fixados com a segurança possível e a temperança própria da equidade, sem aderir a critérios ou tabelas puramente matemáticas”.
Na determinação do quantum indemnizatório correspondente ao citado dano biológico, na vertente de danos patrimoniais futuros, o tribunal está, apenas, sujeito aos critérios que emergem do Código Civil, em particular ao da equidade, sendo que os consagrados na Portaria n.º 377/2008, de 26.05 (ou na Portaria n.º 679/2009, de 25.06, que procedeu à sua alteração/atualização), não obstante possam ser atentados pelo julgador, não se sobrepõem aos que decorrem do sistema substantivo, primordialmente  do Código Civil.
         O DL nº 352/2007, de 23/10, que veio introduzir na Ordem Jurídica portuguesa a Tabela de Avaliação de Incapacidade Permanentes em Direito Civil e a Portaria nº 377/2008, de 26/5, complementando-o, estabeleceu os valores orientadores de proposta razoável para indemnização do dano corporal resultante de acidente automóvel. A Portaria nº 679/2009, de 25/6, veio atualizar os valores daquela de acordo com o índice de preços ao consumidor em 2008 e alargou o direito indemnizatório por esforços acrescidos.
Porém, tais “valores orientadores” são apenas uma reflecção.
Como é comummente entendido, os juízes não devem lançar mão destas tabelas, que quando muito servirão para comparar, para fazer simulações – cfr.  designadamente Joaquim José de Sousa Dinis, “Avaliação e reparação do dano patrimonial e não patrimonial (No domínio do direito Civil), sustenta serem estas tabelas apenas orientadoras e que “Se forem utilizadas, o juiz no seu prudente arbítrio tem o dever de “saltar” para fora dos valores máximos” não devendo delas ficar “escravo” , nunca podendo olvidar o art. 496º, do CC. “Caso contrário corre-se o risco de se implantar nas decisões judiciais uma “ditadura das seguradoras”[16].
Na verdade, é entendimento jurisprudencial uniforme que os critérios previstos nas citadas Portarias não substituem os critérios de fixação da indemnização consagrados no Código Civil, não vinculando os tribunais na administração da justiça nos casos concretos. Os mesmos visam, sobretudo, em sede de apresentação de proposta célere e razoável por parte das seguradoras ao lesado, a servir de critério orientador para esse confessado fim.[17] Até no próprio preâmbulo se refere, expressamente, que o objetivo da mesma não é a fixação definitiva de valores indemnizatórios, mas, nos termos do n.º 3 do artigo 39º do D.L. n.º 291/2007, de 21.08, o estabelecimento de um conjunto de regras e princípios que permita agilizar a apresentação de propostas razoáveis, possibilitando, ainda, que a autoridade de supervisão possa avaliar, com grande objetividade, a razoabilidade das propostas apresentadas.
Deste modo, e não obstante as referidas Portarias, os critérios a seguir na fixação das indemnizações continuam a ser os emergentes do Código Civil, mormente o da equidade, devendo, por razões de igualdade e desejável uniformidade jurisprudencial, com vista a uma maior certeza e segurança jurídicas, nos valores tendencialmente a fixar serem seguidos os aplicados pelo mais Alto Tribunal em casos idênticos.
Assim, as tabelas financeiras, tal como as tabelas constantes das Portarias nº 377/2008, de 26 de maio e nº 679/2009, de 25 de junho, servem, apenas de indicador[18], podendo é definir o patamar inferior da indemnização a arbitrar (porque ponderam já a disponibilidade imediata do capital).
Sendo grande a dificuldade de cálculo do dano futuro relativo à perda dos rendimentos do trabalho, sendo que o que se pretende não é a fixação de um montante puramente arbitrário, mas antes uma fixação equitativa feita mediante prudente arbítrio - arts. 564°, nº 2 e 566°, nº 3, do CC - parte da jurisprudência orienta-se no sentido de a indemnização dever representar um capital produtor de um rendimento que se extinga no previsível período de vida ativa da vítima e que seja suscetível de garantir, durante esta, as prestações correspondentes a essa perda de ganho - Ver, designadamente, os Acs. do STJ, de 09.01.1979, BMJ, n. 283, pág. 260, e de 06.07.2000, CJ, Ano VIII, Tomo 2, pág. 144.
Deve a estimativa desse dano fazer-se com recurso à equidade - art. 566°, n.º 3, e, como modo adequado de conformação dos valores legais às características do caso concreto, o julgamento da equidade não pode prescindir da ponderação da duração da vida, da flutuação do valor do dinheiro, das expectativas de aumentos salariais e de progressão na carreira, etc. (v. Ac. STJ de 06.07.2000, CJ, Ano VIII, Tomo II, pág. 145). Acresce que, uma vez que a previsão assenta sobre danos verificáveis no futuro, relevam os critérios de verosimilhança ou de probabilidade, de acordo com o que, no concreto, poderá vir a acontecer segundo o curso normal das coisas.
Como se referiu, são utilizadas fórmulas e tabelas matemáticas como auxiliares de cálculo, que servem como instrumento de trabalho e têm grande utilidade na medida em que nos serve de farol para, ponderando tudo, se alcançar a decisão mais justa.
A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (cfr. entre muitos o Ac. de 8/5/2012 – Processo 3492/07.3TBVFR.P1, in www.stj.pt) vem fazendo um esforço de clarificação, visando o estabelecimento de critérios de apreciação e de cálculo dos danos que reduzam ao mínimo a margem de arbítrio e de subjetivismo dos magistrados, de modo a que as decisões, convencendo as partes devido ao seu mérito intrínseco, contribuam para uma maior certeza na aplicação do direito e para a redução da litigiosidade a proporções mais razoáveis.
Os princípios fundamentais adotados pelo Supremo Tribunal de Justiça nesta matéria, resumidos na citação constante do Acórdão de 05 de julho de 2007, no processo n°07A1734, relatado pelo Senhor Juiz Conselheiro Nuno Cameira, são os seguintes:
A indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a vítima não auferirá e que se extingue no final do período provável de vida;
No cálculo desse capital interfere necessariamente, e de forma decisiva, a equidade, o que implica que deve conferir-se relevo às regras da experiência e àquilo que, segundo o curso normal "das coisas, é razoável”;
As tabelas financeiras por vezes utilizadas para apurar a indemnização têm um mero carácter auxiliar, indicativo, não substituindo de modo algum a ponderação judicial com base na equidade;
Deve ser proporcionalmente deduzida no cômputo da indemnização a importância que o próprio lesado gastaria consigo mesmo ao longo da vida (em média, para despesas de sobrevivência, um terço dos proventos auferidos), consideração esta que somente vale no caso de morte;
Deve ponderar-se o facto de a indemnização ser paga de uma só vez, o que permitirá ao seu beneficiário rentabilizá-la em termos financeiros; logo, haverá que considerar esses proveitos, introduzindo um desconto no valor achado, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia;
Deve ter-se preferencialmente em conta, mais do que a esperança média de vida ativa da vítima, a esperança média de vida, uma vez que, como é óbvio, as necessidades básicas do lesado não cessam no dia em que deixa de trabalhar por virtude da reforma (em Portugal, no momento presente, a esperança média de vida dos homens já é de sensivelmente 73 anos, e tem tendência para aumentar; e a das mulheres chegou aos oitenta)[19].
No caso dos autos, pese embora o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica que afeta o Autor, o facto disso poder não gerar perda de rendimentos laborais não implica que, pelo défice de que padece, não tenha de ser indemnizado, havendo a considerar, como vimos, como dano futuro o dano biológico já que a afetação da sua potencialidade física determina uma irreversível perda de faculdades físicas e intelectuais que a idade agravará.
No Ac. da Relação de Guimarães de 18/12/2017, proc. nº 2050/12.5TJVNF.G1, em que a ora relatora foi adjunta, refere-se que “O conceito de “dano biológico” surgiu em Itália e no ordenamento jurídico nacional não existe consenso quanto à forma de ressarcimento desse dano: a posição maioritária é que esse dano deve ser valorado na vertente patrimonial; outra corrente sufraga que esse dano carece de ser valorado na vertente patrimonial ou na não patrimonial, conforme a apreciação casuística do caso; uma terceira corrente entende que se está perante um tertium genus, não subsumível à categoria dos danos patrimoniais ou não patrimoniais, devendo ser indemnizado de per se.
O dano biológico, na medida em que constitui uma lesão de bens eminentemente pessoais do lesado (a saúde), determinando-lhe uma deficiente ou imperfeita capacidade de utilização do seu corpo no desenvolvimento de todas as suas atividades (sejam profissionais, lazer, familiar e demais dimensões da sua vida), carece de ser, sempre, indemnizado na vertente patrimonial, independentemente de ter ou não repercussões negativas a nível salarial ou na atividade profissional do lesado, mesmo que este último não desempenhe, à data do evento, atividade profissional remunerada e, ainda que se trate de pessoa já reformada.
O cálculo dessa indemnização (frustração da capacidade de ganho futura) é feito por recurso à equidade, devendo como critério objetivador, instrumental e orientador, ter-se presente as fórmulas matemáticas seguidas pela jurisprudência”.
Também no Ac. Relação de Guimarães, proc. 1315/14.6TJVNF.G1 em que a ora relatora foi, igualmente, adjunta se decidiu e vem sumariado “A indemnização a arbitrar pelo dano biológico, tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão e de futura mudança, desenvolvimento ou conversão de emprego do lesado, implicando flagrante perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afetar; quer a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua atividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem uma sequela irreversível das lesões sofridas.
Nesta perspetiva, deverá aditar-se ao lucro cessante, decorrente da previsível perda de remunerações, calculada estritamente em função do grau de incapacidade permanente fixado, uma quantia que constitua justa compensação do referido dano biológico, consubstanciado na privação de futuras oportunidades profissionais, precludidas irremediavelmente pela “capitis deminutio” de que passou a padecer (o lesado), bem como pelo esforço acrescido que o já relevante grau de incapacidade fixado irá envolver para o exercício de quaisquer tarefas da vida profissional ou pessoa. Esta outra vertente do dano biológico, enquanto privação de outras oportunidades pessoais ou profissionais decorrentes do défice físico-psíquico, não pode deixar de ser considerado no âmbito do ressarcimento a título de danos patrimoniais futuros, influenciando e majorando, portanto, no cálculo equitativo do seu” quantum”, mas não constituindo, um dano a valorar em uma outra quantia, autónoma ou separada do quantum indemnizatório a fixar em sede de danos patrimoniais futuros, sob pena de constituir uma duplicação indemnizatória, violadora da lei e dos princípios da equidade que presidem à fixação do montante indemnizatório em causa.
Sem prejuízo do relevo que sempre assumem as usuais tabelas de matemáticas de cálculo do aludido capital – enquanto instrumentos suscetíveis de introduzir uma base objetiva no valor indemnizatório a arbitrar, reduzindo, pois, “ligeirezas decisórias” ou “involuntários subjetivismos” –, o valor alcançado através de tais tabelas sempre terá de ser temperado através do recurso à equidade, que desempenha um papel corretor e de adequação do montante indemnizatório às circunstâncias específicas e à justiça do caso concreto”.
Como se refere no Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 13/7/2017, proc. 3214/11.4TBVIS.C1.S1, relator Senhor Juiz Conselheiro Manuel Tomé Soares Gomes, a “lesão corporal sofrida em consequência de um acidente de viação constitui em si um dano real ou dano-evento, que tem vindo a ser designado por dano biológico, na medida em que afeta a integridade físico-psíquica do lesado, traduzindo-se em ofensa do seu bem “saúde”. Trata-se de um “dano primário”, do qual, podem derivar, além de incidências negativas não suscetíveis de avaliação pecuniária, a perda ou diminuição da capacidade do lesado para o exercício de atividades económicas, como tal suscetíveis de avaliação pecuniária[1][20].
Como é sabido, os nossos tribunais, com particular destaque para a jurisprudência do STJ, têm vindo a reconhecer o dano biológico como dano patrimonial, na medida em que respeita a incapacidade funcional, ainda que esta não impeça o lesado de trabalhar e que dela não resulte perda de vencimento, uma vez que a força de trabalho humano sempre é fonte de rendimentos, sendo que tal incapacidade obriga a um maior esforço para manter o nível de rendimento anteriormente auferido. E que, em sede de rendimentos frustrados, a indemnização deverá ser arbitrada equitativamente, de modo a corresponder a um capital produtor do rendimento que o lesado não irá auferir, que se extinga no fim da sua vida provável e que é suscetível de garantir, durante essa vida, o rendimento frustrado[2] . (sublinhado e negrito nosso).
No desenvolvimento desse entendimento, o acórdão do STJ, de 10/ 10/2012, proferido no processo n.º 632/2001.G1.S1[3], considerou que:
“… a compensação do dano biológico tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão e de futura mudança, desenvolvimento ou conversão de -emprego pelo lesado, implicando flagrante perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar; quer a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua actividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas.
Na verdade, a perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediata e totalmente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades de exercício profissional e de escolha e evolução na profissão, eliminando ou restringindo seriamente a carreira profissional expectável – e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição -, erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuramente acrescidos lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais …”
E, no mesmo aresto, se acrescenta que:
“Nesta perspectiva, deverá aditar-se ao lucro cessante, decorrente da previsível perda de remunerações, calculada estritamente em função do grau de incapacidade permanente fixado, uma quantia que constitua justa compensação do referido dano biológico, consubstanciado na privação de futuras oportunidades profissionais, precludidas irremediavelmente pela capitis deminutio de que passou a padecer (o lesado), bem como pelo esforço acrescido que o já relevante grau de incapacidade fixado irá envolver para o exercício de quaisquer tarefas da vida profissional ou pessoal…”
Assim, a este propósito podem projetar-se em dois planos:
- a perda total ou parcial da capacidade do lesado para o exercício da sua atividade profissional habitual, durante o período previsível dessa atividade, e consequentemente dos rendimentos que dela poderia auferir;
- na perda ou diminuição de capacidades funcionais que, mesmo não importando perda ou redução da capacidade para o exercício profissional da atividade habitual do lesado, impliquem ainda assim um maior esforço no exercício dessa atividade e/ou a supressão ou restrição de outras oportunidades profissionais ou de índole pessoal, no decurso do tempo de vida expetável, mesmo fora do quadro da sua profissão habitual”[21].
Como se refere no citado Acórdão do STJ de 19/5/2009, o “dano biológico que implica que se atenda às repercussões que a lesão pode proporcionar à pessoa lesada; tal dano assume um cariz dinâmico compreendendo vários factores, sejam actividades laborais, recreativas, sexuais, sociais ou sentimentais.
“O dano biológico traduz-se na diminuição somático-psíquico do indivíduo, com natural repercussão na vida de quem o sofre”. - Acórdão deste Supremo Tribunal de 4.10.2005 – Processo nº 05A2167 – in www.dgsi.pt.
O dano biológico repercute-se na qualidade de vida da vítima afectando a sua actividade vital, é um dano patrimonial já que as lesões afectam o seu padrão de vida”.
A perda da capacidade de ganho constitui um dano presente, com repercussão no futuro, durante o período laboralmente activo do lesado, e durante todo o seu tempo de vida”.[22]
Ora, in casu, resulta provado que, em consequência do acidente de viação, ocorrido em 22 de julho de 2016, o Autor, que nasceu no dia 11 de agosto de 2020, sofreu graves lesões (cfr. f.p.nº 27), com um Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 59 pontos (cfr. f.p. nº 46).
A aptidão funcional do Autor está comprometida, havendo, para efeito de indemnizar o dano biológico, que ponderar não apenas o tempo de atividade em função do tempo de vida laboral, mas todo o tempo da sua vida.
 E como se refere no citado Acórdão do STJ de 19/5/2009 “A indemnização por danos patrimoniais futuros é devida mesmo que não se prove ter resultado da incapacidade física diminuição dos proventos da vítima.
É a chamada distinção operada por Sinde Monteiro – “Estudos sobre a Responsabilidade Civil”, página 248, entre o “dano biológico” e o “dano moral” – Acórdão de Tribunal da Relação do Porto, de 2 Maio 1995 – JTRP00014588 – in www.dgsi.pt.
“O dano biológico derivado de incapacidade geral permanente, de cariz patrimonial, é susceptível de justificar a indemnização por danos patrimoniais futuros independentemente de o mesmo se repercutir na vertente do respectivo rendimento salarial” – Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 4.10. 2007 – Proc. nº 07B2957 – in www.dgsi.pt.
A incapacidade parcial permanente afectando, ou não, a actividade laboral, representa, em si mesma, um dano patrimonial futuro, nunca podendo reduzir-se à categoria dos danos não patrimoniais.(…) O trabalho doméstico, no contexto da vivência familiar, tem um valor avaliável em dinheiro ainda que nenhuma remuneração haja; por outro lado, pese embora a idade da lesada à data do acidente, ela executava sem auxílio de ninguém as tarefas da casa, sinal que a sua capacidade laboral, ainda que para aquelas funções, existia e ficou afectada com o acidente.
A indemnização por lesões físicas não deve apenas atender à capacidade laboral, já que, em consequência das sequelas sofridas, e permanecendo elas, irreversivelmente, vão agravar, tornar mais penosa, a vida da pessoa afectada, sendo essa penosidade tanto maior quanto mais for avançando a idade.
Pelo que deixamos entrever o facto de o Autor não ter perdido rendimentos em consequência da lesão não invalida que seja ressarcido por causa da IPG que o afecta. Esse dano é indemnizável em si mesmo como dano patrimonial.(…) Também aqui haverá que, numa perspectiva de equidade, ponderar que esse auxílio perdurará pelo tempo de vida da Autora, devendo atender-se à expectativa de vida estatística, da longevidade como pessoa do sexo feminino, devendo ponderar-se, também, o custo da evolução salarial desse prestador de serviços, pelo que considerando a expectativa de vida da Autora, cerca de 24 anos, não se afigura violadora da equidade a indemnização que as instâncias atribuíram …”[23].
Como se refere no Ac. do STJ 10/11/2016, proc. 175/05.2TBPSR.E2.S1, relatado pelo Senhor Juiz Conselheiro Lopes do Rego, “ao avaliar e quantificar o dano patrimonial futuro, pode e deve o tribunal reflectir também na indemnização arbitrada a perda de oportunidades profissionais futuras que decorra do grau de incapacidade fixado ao lesado, ponderando e reflectindo por esta via na indemnização, não apenas as perdas salariais prováveis, mas também o dano patrimonial decorrente da inevitável perda de chance ou oportunidades profissionais por parte do lesado.
Sendo inquestionável que o dever de indemnizar que recai sobre o lesante compreende os danos futuros, desde que previsíveis, quer se traduzam em danos emergentes ou em lucros cessantes, nos termos do art. 564º do CC, está fundamentalmente em causa o método de cálculo que deve ser adoptado para o cômputo da respectiva indemnização (…).
Constitui entendimento jurisprudencial reiterado que a indemnização a arbitrar por tais danos patrimoniais futuros deve corresponder a um capital produtor do rendimento de que a vítima ficou privada e que se extinguirá no termo do período provável da sua vida, determinado com base na esperança média de vida (e não apenas em função da duração da vida profissional activa do lesado, até este atingir a idade normal da reforma …): adere-se inteiramente a este entendimento, já que as necessidades básicas do lesado não cessam obviamente no dia em que deixar de trabalhar por virtude da reforma, sendo manifesto que será nesse período temporal da sua vida que as suas limitações e situações de dependência, ligadas às sequelas permanentes das lesões sofridas, com toda a probabilidade mais se acentuarão; além de que, como é evidente, as limitações às capacidades laborais do lesado não deixarão de ter reflexos negativos na respectiva carreira contributiva para a segurança social, repercutindo-se no valor da pensão de reforma a que venha a ter direito.
Para evitar um total subjectivismo – que, em última análise, poderia afectar a segurança do direito e o princípio da igualdade – o montante indemnizatório deve começar por ser procurado com recurso a processos objectivos, através de fórmulas matemáticas, cálculos financeiros, aplicação de tabelas, com vista a calcular o referido capital produtor de um rendimento vitalício para o lesado, recebendo aplicação frequente a tabela descrita no Ac. de 4/12/07 (p.07A3836), assente numa taxa de juro de 3%.
Porém, e como vem sendo uniformemente reconhecido, o valor estático alcançado através da automática aplicação de tal tabela «objectiva» - e que apenas permitirá alcançar um «minus» indemnizatório - terá de ser temperado através do recurso à equidade – que naturalmente desempenha um papel corrector e de adequação do montante indemnizatório às circunstâncias específicas e à justiça do caso concreto, permitindo ainda a ponderação de variantes dinâmicas que escapam, em absoluto, ao referido cálculo objectivo: evolução provável na situação profissional do lesado, aumento previsível da produtividade e do rendimento disponível e melhoria expectável das condições de vida, inflação provável ao longo do extensíssimo período temporal a que se reporta o cômputo da indemnização (e que, ao menos em parte, poderão ser mitigadas ou compensadas pelo «benefício da antecipação», decorrente do imediato recebimento e disponibilidade de valores pecuniários que normalmente apenas seriam recebidos faseadamente ao longo de muitos anos, com a consequente possibilidade de rentabilização imediata em termos financeiros).
Finalmente – e no nosso entendimento – não poderá deixar de ter-se em consideração que tal «juízo de equidade» das instâncias, alicerçado, não na aplicação de um estrito critério normativo, mas na ponderação das particularidades e especificidades do caso concreto, não integra, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito», pelo que tal juízo prudencial e casuístico das instâncias deverá, em princípio, ser mantido, salvo se o julgador se não tiver contido dentro da margem de discricionariedade consentida pela norma que legitima o recurso à equidade – muito em particular, se o critério adoptado se afastar, de modo substancial, dos critérios ou padrões que generalizadamente se entende deverem ser adoptados, numa jurisprudência evolutiva e actualística, abalando, em consequência, a segurança na aplicação do direito, decorrente da adopção de critérios jurisprudenciais minimamente uniformizados, e, em última análise, o princípio da igualdade.
… Saliente-se, porém, que a aplicação, mesmo corrigida, das referidas tabelas financeiras não inclui, como é evidente, integral ponderação do dano biológico sofrido pelo lesado, perspectivado como diminuição somático-psíquica e funcional deste, com substancial e notória repercussão no leque de oportunidades profissionais de quem o sofre - e, portanto, enquanto reflectido na previsível carreira profissional da lesada, ressarcível ainda no perímetro dos danos patrimoniais futuros.
No caso dos autos, não oferece dúvida que a indemnização a arbitrar pelo dano biológico sofrido pelo lesado - consubstanciado em limitações funcionais particularmente relevantes - deverá compensá-lo – para além da presumida perda de rendimentos, associada àquele grau de incapacidade permanente - também da inerente perda de capacidades, mesmo que esta não esteja imediata e totalmente reflectida e contabilizada no nível de rendimento auferido ou auferível pelo lesado.
A compensação do dano biológico tem como base e fundamento a relevante e substancial restrição às possibilidades exercício de uma profissão e de futura mudança, desenvolvimento ou reconversão de emprego pelo lesado, implicando flagrante perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar: na verdade, a perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediata e totalmente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades exercício profissional e de escolha e evolução na profissão, eliminando ou restringindo seriamente a carreira profissional expectável - e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição, - erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuramente acrescidos lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais; e sendo naturalmente tais restrições e limitações particularmente relevantes em lesada com 18 anos de idade, ficando as perspectivas de evolução no campo profissional plausivelmente afectadas pelas irremediáveis sequelas, físicas das gravosas lesões corporais sofridas.
E, nesta perspectiva, deverá aditar-se ao lucro cessante, decorrente da previsível perda de remunerações, calculada estritamente em função do grau de incapacidade permanente fixado, uma quantia que constitua justa compensação do referido dano biológico, consubstanciado na privação de futuras oportunidades profissionais, precludidas irremediavelmente pela capitis deminutio de que passou a padecer a recorrente, bem como pelo esforço acrescido que o já relevante grau de incapacidade fixado irá envolver para o exercício de quaisquer tarefas da vida profissional – considerando-se, em termos de equidade, que representará compensação adequada desse dano biológico o valor de € 15.000, que acrescerá assim ao montante de €85.000 arbitrado pelo acórdão recorrido”[24].
Assim, constata-se, à luz das regras da experiência, que as referidas sequelas sofridas pelo Autor são de molde a afetar, para além das tarefas do seu quotidiano, o cabal desempenho da sua atividade laboral, representando, nessa medida, uma diminuição da sua capacidade económica, avaliável em termos do dito dano biológico (vertente patrimonial).
Cumpre, ainda, esclarecer, por forma a que não fique ideia errada de existência de duplicação da avaliação do mesmo dano, que na avaliação do dito dano biológico só relevam as implicações de alcance económico e não as respeitantes a outras incidências, mas sem um alcance dessa natureza (económica). Nessa linha, e como se decidiu no referido acórdão, não é de ter em conta aqui, por exemplo, as implicações na vida sexual do lesado, vertentes estas a ser ponderadas em sede de danos não patrimoniais.
E como aí se refere “não se apurando o valor exato da referida diminuição de rendimento económico … nem, dadas as suas características, se divisando tão pouco a viabilidade de um apuramento exato, não se mostra adequado, como se referiu na sentença da 1.ª instância, recorrer a um cálculo puramente aritmético, restando lançar mão do critério da equidade, ao abrigo do disposto no artigo 566.º, n.º 3, do CC, dentro dos padrões delineados pela jurisprudência em função do tipo de gravidade das sequelas existentes” (negrito e sublinhado nosso).
Assim, segundo um juízo de equidade, de acordo com as regras da prudência, do bom senso prático e da justa medida imposta pela ponderação das realidades da vida, tendo em conta o supra referido circunstancialismo, as consequência das lesões sofridas pelo Autor com o acidente, considerando a  sua idade à data do acidente e expetativa de vida de acordo com os dados do INE, tem-se por desajustada às circunstâncias do caso e às realidades da vida e fora dos padrões da jurisprudência[25] a valoração do dito dano biológico, na sua vertente patrimonial, na quantia fixada pelo Tribunal de 1.ª instância - de € 290.000,00 - para o valor da indemnização por danos futuros pela perda da capacidade de ganho do Autor, representando-se,  como compensação adequada  do dano biológico, o peticionado valor de € 310.000,00 a acrescer ao referido (assim se fixando o valor da indemnização pelo dano biológico a pagar pela 1ª Ré ao Autor em € 600.000,00).


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2.3 - Quanto à compensação pelos danos não patrimoniais
Estabelece o art. 496º, do Código Civil, sendo deste diploma todos os preceitos citados sem outra referência, que: 1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
E o nº 4, do referido artigo, que O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos número anterior.
Resulta, assim, do referido nº1 a admissibilidade genérica do ressarcimento dos danos não patrimoniais. Como dele decorre, os danos não patrimoniais são indemnizáveis, quando, pela sua gravidade, sejam merecedores da tutela do direito.
Antunes Varela define danos não patrimoniais como sendo “os prejuízos (como dores físicas, desgostos morais, vexames, perda de prestígio ou de reputação, complexos de ordem estética) que, sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a honra, o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização”[26].
Luís Manuel Teles Menezes Leitão define-os como “aqueles que correspondem à frustração de utilidades não suscetíveis de avaliação pecuniária, como o desgosto resultante da perda de um ente querido”[27].
Tais danos só são indemnizáveis quando, pela sua gravidade, merecerem a tutela do direito, sendo a aludida gravidade um conceito relativamente indeterminado, a apurar, objetivamente, caso a caso, de acordo com a realidade fáctica apurada. A gravidade mede-se por um critério objetivo, de normalidade e bom senso prático. A gravidade deve “medir-se por um padrão objectivo e não de acordo com factores subjectivos, ligados a uma sensibilidade particularmente aguçada ou especialmente fria ou embotada do lesado, sendo tais danos compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, e tratando-se mais de uma satisfação do que de uma indemnização, a ser calculada segundo critérios de equidade, atendendo-se ao grau de responsabilidade do lesante, à sua situação económica e à do lesado, às flutuações do valor da moeda, etc”[28] .
Enunciam-se alguns danos não patrimoniais que têm sido, recentemente, considerados pela jurisprudência merecerem a tutela do direito como: a perceção que o lesado, mesmo em estado de não (pelo menos completa) consciência, possa ter da situação em que se encontra, do grau de irreversibilidade das lesões, a destruição de um projeto de vida de casal, a impotência sexual de que fique a padecer o lesado bem como o consequente dano de seu cônjuge ou companheiro, o dano biológico, isto é a perda de qualidade de vida do sujeito[29].
No caso em apreço, não existem dúvidas que as consequências do sinistro relativamente ao autor revestem elevada gravidade, como bem foi decidido, sendo, por isso, justificativas do seu ressarcimento, a título de danos não patrimoniais. Por graves, tem o Autor direito a ser indemnizado por eles, como a própria recorrente reconhece, cabendo determinar qual o quantum a atribuir.
Ora, de harmonia com o princípio geral expresso no art. 562º, do C Civil, a obrigação de indemnizar implica a reconstituição da situação que existiria se não se tivesse verificado a lesão, repondo-se as coisas no lugar em que estariam se não se tivesse produzido o dano. Visa-se a eliminação deste, devendo a indemnização equivaler ao montante do dano imputado (v. nº2 do art. 566º).
Porém, estando em causa a lesão de interesses imateriais, a reconstituição natural da situação anterior ao sinistro é impossível e também o é a fixação de um montante pecuniário equivalente ao «mal» sofrido, apenas se podendo atenuar, minorar ou, de algum modo, compensar os danos sofridos pelo lesado.
E “se a indemnização por danos não patrimoniais não elimina o dano sofrido, pelo menos, permite atribuir ao lesado determinadas utilidades que lhe permitirão alguma compensação pela lesão sofrida sendo, em qualquer caso, melhor essa compensação do que nenhuma. A atribuição dessa compensação não representa qualquer imoralidade, uma vez que não resulta do comércio de bens não patrimoniais, representando, pelo contrário, uma sanção ao ofendido por ter privado o lesado das utilidades que aqueles bens lhe proporcionavam”[30].
Nos termos do nº4, do 496º, o montante da indemnização a atribuir será fixado equitativamente pelo Tribunal tendo em conta a extensão e gravidade dos danos causados, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso que se justifique ponderar. Este tipo de indemnização será fixado segundo o bom senso e o prudente arbítrio do julgador, temperado com os critérios objectivos a que se alude no art. 494º.
E daqui resulta que a indemnização por danos não patrimoniais “não se reveste de natureza exclusivamente ressarcitória, mas também cariz punitivo, assumindo-se como uma pena privada, estabelecida no interesse da vítima, por forma a desagravá-la do comportamento do lesante”[31].
Como se escreve no Acórdão da Relação do Porto, Processo 108/08.4TBMCN.P1, de 8/7/2010, “refere “inter alia”, o Ac. do STJ, de 30.10.96, in BMJ 460-444: “(...) No caso dos danos não patrimoniais, a indemnização reveste uma natureza acentuadamente mista, pois “visa reparar, de algum modo, mais que indemnizar os danos sofridos pela pessoa lesada”, não lhe sendo, porém, estranha a “ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente”. O quantitativo da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais terá de ser calculado, sempre, “segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização», «aos padrões da indemnização geralmente adoptados na jurisprudência, as flutuações de valor da moeda, etc”[32].
Estes preceitos devem ser aplicados com prudência, pois a sua aplicação tem como efeito deixar sem indemnização parte dos danos reais[33], como entende Galvão de Teles, Direito das Obrigações, 7ª Edição, Coimbra Editora, 2010, p.357, nota 1, o que pode, por isso, gerar injustiças para os lesados, a beliscar a certeza e segurança jurídicas, fins sempre tidos em vista na aplicação da justiça.
Como afirma Dário Martins de Almeida[34], “pretende-se encontrar somente aquilo que, no caso concreto, pode ser a solução mais justa; a equidade está assim limitada sempre pelos imperativos da justiça real (a justiça ajustada às circunstâncias), em oposição à justiça meramente formal. Por isso se entende que a equidade é sempre uma forma de justiça. …A equidade é, pois, a expressão da justiça num dado caso concreto”. Como é sabido, a satisfação dos danos não patrimoniais não é uma verdadeira indemnização, visto não ser um equivalente do dano, tratando-se antes de atribuir ao lesado uma satisfação ou compensação que não é suscetível de equivalente[35]. “É, assim, razoável que no seu cálculo, se tenham em atenção, além da natureza e intensidade do dano causado, as outras circunstâncias do caso concreto que a equidade aconselha sejam tomadas em consideração e, em especial, a situação patrimonial das partes e o grau de culpa do lesante”[36].
E a indemnização por danos não patrimoniais tem em vista compensar de alguma forma o lesado pelos sofrimentos e inibições que sofrera em consequência do evento danoso, compensação que só será alcançada se a indemnização for adequada e significativa do ponto de vista financeiro e não meramente simbólica.
Tal compensação deve “ser proporcionada à gravidade do dano, tomando-se em conta, na sua fixação, todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida”[37]. E para haver uma efetiva compensação têm de ser ponderados os danos suportados e a suportar, já que os mesmos, necessariamente, se irão prolongar no tempo.
A lei ao, através da remissão feita no art. 496°, n°4 “para as circunstâncias mencionadas no art. 494°, ter mandado atender, na fixação da indemnização, quer à culpa, quer à situação económica do lesante, revela que ela não aderiu, estritamente, à tese segundo a qual a indemnização se destinaria nestes casos a proporcionar ao lesado, de acordo com o seu teor de vida, os meios económicos necessários para satisfazer ou compensar com os prazeres da vida os desgostos, os sofrimentos ou as inibições que sofrera por virtude da lesão. Mas também a circunstância de se mandar atender à situação económica do lesado, ao lado da do lesante, mostra que a indemnização não reveste, aos olhos da lei, um puro carácter sancionatório"[38].
Como se refere no Ac. de 18/12/2017, proc. nº 397.12.5TBAMR.G1, da Relação de Guimarães, em que a ora relatora foi adjunta, “nestas hipóteses, e conforme é posição pacífica da doutrina e da jurisprudência, o que está em causa é a fixação de um benefício material/pecuniário (único possível) que se traduza, pelas utilidades, prazeres ou distrações que proporciona – porventura, de ordem espiritual –, numa compensação ou atenuação pelos bens imateriais antes referidos da pessoa humana (o lesado), atingidos pelo evento.
Nesta conformidade, a compensação dos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade mereçam a tutela do direito, não pode – por definição – ser feita através da teoria ou fórmula da diferença prevista no art. 566º, n.º 2, do C. Civil.
Ao invés, o montante da indemnização, nos termos do disposto no arts. 496º, n.º 4 e 494º do Cód. Civil, deverá ser fixado equitativamente pelo tribunal, que atenderá ao grau de culpa do lesante, à situação económica do lesante e do lesado, às demais circunstâncias do caso, nomeadamente, por assim o imporem os princípios da proporcionalidade e igualdade, aos critérios e valores usualmente acolhidos na jurisprudência em casos similares.[39]
Com efeito, como se refere no citado Ac. STJ de 18.06.2015,[40]não podendo apurar-se o valor exacto de tais danos, atenta a sua natureza, o respectivo montante deverá ser fixado pelo tribunal segundo critérios de equidade (…), fazendo apelo a todas as regras de prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida (…) e tendo em atenção a extensão e gravidade dos prejuízos, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e demais circunstâncias do caso (artigos 496º, n.º 3, 1ª parte e 494º do Código Civil).” (sublinhado nosso).
E, ainda, prossegue o referido douto aresto, “nos parâmetros gerais a ter em conta considerou o Acórdão deste Supremo Tribunal, de 19 de Abril de 2012 (proc. n.º 3046/09.0TBFIG.S1, acessível em www.dgsi.pt) serem ainda de destacar a nossa inserção no espaço político, jurídico, social e económico correspondente à União Europeia e o maior relevo que vem sendo dado aos direitos de natureza pessoal, tais como o direito à integridade física e à qualidade de vida, e, bem assim, que a jurisprudência deste mesmo Supremo Tribunal tem evoluído no sentido de considerar que a indemnização em causa deve constituir um lenitivo para os danos suportados e não ser orientada por critérios hoje considerados miserabilistas, por forma a, respondendo actualizadamente ao comando do artigo 496º, traduzir uma efectiva possibilidade compensatória para os danos suportados e a suportar.” (sublinhado nosso).
No entanto, como se adverte no Ac. STJ de 17.12.2015[41] (e nos variadíssimos arestos ali elencados), a utilização de critérios de equidade não deve impedir que se tenham em conta as exigências do princípio da igualdade, o que implica a procura de uniformização de critérios, naturalmente não incompatível com a devida atenção às circunstâncias de cada caso concreto.
Por outro lado, ainda, é de referir que, conforme se colhe da mesma jurisprudência do Supremo, o recurso à equidade não pode, nem deve conduzir à arbitrariedade, não devendo os tribunais “…contribuir de nenhuma forma para alimentar a ideia de que neste campo as coisas são mais ou menos aleatórias, vogando ao sabor do acaso ou do arbítrio judicial. Se a justiça, como cremos, tem implícita a ideia de proporção, de medida, de adequação, de relativa previsibilidade, é no âmbito do direito civil que a afirmação destes vectores se torna mais premente e necessária, já que eles conduzem em linha recta à efectiva concretização do princípio da igualdade consagrado no art. 13º da Constituição.[42]
Por último, é ainda de referir, nesta sede, que à obrigação indemnizatória, a título de danos não patrimoniais, se deve reconhecer, não só um papel de reparação ou compensação, mas também um papel de censura ou punitivo do agente do facto lesivo.
Com efeito, como se refere no Ac. STJ de 30.10.96, BMJ 460, pág. 444 (citado no Ac. STJ de 26.01.2016, relator Fonseca Ramos, já citado), “no caso dos danos não patrimoniais, a indemnização tem uma natureza acentuadamente mista, pois visa reparar, de algum modo, mais que indemnizar os danos sofridos pela pessoa lesada, não lhe sendo, porém, estranha a ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente.
Está-se, pois, aqui perante uma indemnização com natureza não estritamente reparadora, mas também sancionatória, devendo considerar-se o grau de culpa do agente uma vez que o sofrimento ou desgosto do lesado é o reflexo dele.
Como se refere no Acórdão do STJ de 19/5/2009, proc. 298/06.0TBSJM.S1“realçando a componente punitiva da compensação por danos não patrimoniais pronunciam-se, no seu ensino, os tratadistas.
Menezes Cordeiro “Direito das Obrigações”, 2° vol, p. 288 ensina que “a cominação de uma obrigação de indemnizar danos morais representa sempre um sofrimento para o obrigado; nessa medida, a indemnização por danos morais reveste uma certa função punitiva, à semelhança aliás de qualquer indemnização”.
Galvão Telles, “Direito das Obrigações”, 387, sustenta que “a indemnização por danos não patrimoniais é uma “pena privada, estabelecida no interesse da vítima – na medida em que se apresenta como um castigo em cuja fixação se atende ainda ao grau de culpabilidade e à situação económica do lesante e do lesado”.
Menezes Leitão realça a índole ressarcitória/punitiva, da reparação por danos morais quando escreve: “assumindo-se como uma pena privada, estabelecida no interesse da vítima, de forma a desagravá-la do comportamento do lesante” – “Direito das Obrigações”, vol. I, 299.
Pinto Monteiro, de igual modo, sustenta que, a obrigação de indemnizar é “uma sanção pelo dano provocado”, um “castigo”, uma “pena para o lesante” – cfr. “Sobre a Reparação dos Danos Morais”, RPDC, n°l, 1° ano, Setembro, 1992, p. 21”.
O quantitativo da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais terá de ser calculado, sempre, “segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização”, “aos padrões da indemnização geralmente adotados na jurisprudência, as flutuações de valor da moeda, etc.”.
Também no Acórdão do STJ de 13/7/2017, proc. 3214/11.4TBVIS.C1.S1, se refere “Como ensina o Sr. Prof. Antunes Varela, e como vem sendo seguido pela jurisprudência dos nossos tribunais, o juízo de equidade requer do julgador que tome «em conta todas as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida», sem esquecer que sobredita “indemnização” tem natureza mista, já que visa não só compensar o dano sofrido, mas também reprovar, de algum modo, a conduta lesiva[43].
Com efeito, ante a imaterialidade dos interesses em jogo, a indemnização dos danos não patrimoniais não pode ter por escopo a sua reparação económica. Visa sim, por um lado, compensar o lesado pelo dano sofrido, em termos de lhes proporcionar uma quantia pecuniária que permita satisfazer interesses que apaguem ou atenuem o sofrimento causado pela lesão; e, por outro lado, servir para sancionar a conduta do agente. Todavia, no critério a adotar, não se devem perder de vista os padrões indemnizatórios decorrentes da prática jurisprudencial, procurando - até por uma questão de justiça relativa - uma aplicação tendencialmente uniformizadora ainda que evolutiva do direito, como aliás impõe o n.º 3 do artigo 8.º do CC.
Para tal efeito, são relevantes, além do mais: a natureza, multiplicidade e diversidade das lesões sofridas; as intervenções cirúrgicas e tratamentos médicos e medicamentosos a que o lesado teve de se submeter; os dias de internamento e o período de doença; a natureza e extensão das sequelas consolidadas, o quantum doloris, o dano estético, se o houver"[44].
Analisando a prática dos tribunais, constatamos que os quantitativos indemnizatórios, que antes eram quase simbólicos, têm vindo progressivamente a subir nos últimos anos.
In casu, foi violada a integridade física do Autor, que viu o acidente causar-lhe danos corporais graves - que lhe deixaram sequelas permanentes - e, como tais, merecedores da tutela do direito.
Face aos factos que resultaram provados, vejamos qual a indemnização a atribuir pelos danos sofridos pelo Autor.
Visto o enquadramento jurídico da questão e subsumindo o direito aos factos verifica-se que o autor não teve qualquer culpa na ocorrência do acidente em causa. Antes o mesmo se deveu a culpa exclusiva da condutora do veículo interveniente no acidente.
Demonstrou-se, com relevância para a determinação do quantum da indemnização pelos danos não patrimoniais a atribuir ao Autor , designadamente, que:

- Por causa das lesões sofridas com o embate, o Autor deu entrada no Hospital 1..., em ... e, logo nesse mesmo dia foi transferido para o Hospital 2..., no Porto, onde foi de imediato submetido a intervenção cirúrgica ao ombro e à clavícula direita, tendo aí ficando internado nos cuidados intensivos desde o dia 22/07/2016 ao dia 25/07/2016, data em que passou para os cuidados intermédios, tendo alta para regressar a casa no dia 02/08/2016.

- Desde esse dia 02/08/2016 até 04/10/2016, o Autor passou a ter consultas e tratamentos no Hospital 2... no Porto, de dois em dois dias.

- No dia 04/10/2016, o Autor foi submetido no Hospital 2..., no Porto a nova intervenção cirúrgica para exploração e tentativa de ligação dos tendões do ombro direito, sendo que face à complexidade da cirurgia a mesma teve uma duração de 12 horas.

- Após essa cirurgia o Autor ficou novamente internado no referido Hospital 2... durante 10 dias, tendo depois recebido alta para regressar a casa, mas de dois em dois dias tinha que ir ao referido Hospital 2... para consultas e para receber tratamentos, o que aconteceu desde o dia da alta da cirurgia até ao dia 06/11/2016.

- Desde o dia 06/11/2016 até à presente data, o Autor continuou a receber as consultas e tratamentos no Hospital 2... no Porto, numa primeira fase, de semana em semana e depois de mês em mês.

- Nos dias 10/07/2017 e 07/01/2019, o Autor foi submetido a mais duas intervenções cirúrgicas a uma ferida no tórax.

- A partir do dia 06/11/2016, o Autor começou a receber vários tratamentos de fisioterapia.

- Em consequência do embate, o Autor sofreu as seguintes lesões:

a) Esfacelo grave da região clavicular direita com arrancamento da porção clavicular do ECM, com ausência da mobilidade da mão, do cotovelo e do ombro e, ainda com ausência de sensibilidade no território dos nervos radial, cubital e mediano.

b) Esfacelo supra-clavicular com constatação de arrancamento pré-ganglionar do plexo braquial.

c) Esfacelo do cotovelo direito e constatação de integridade do nervo cubital.

d) Feridas no hemitorax esquerdo, cotovelo direito e nos dois joelhos.

e) Fratura do terço externo da clavícula.

f) Abundantes potenciais de desnervação em repouso e ausência de potenciais de unidade motora na tentativa de contração dos músculos infraespinhoso, deltóide, bicipide flexor radial do carpo, extensor comum e 1º interósseo dorsal direitos, e ainda com sinais de desnervação no grande dentado direito.

g) Grave lesão axonal ganglionar ou infraganglionar a nível dos ramos primários anteriores de raízes C5, C6, C7 e C8 direitas ou coexistência de lesão a nível dos troncos primários superior, médio e inferior do plexo braquial com lesões a nível de raízes.

h) Alterações de sinal dos músculos da coifa dos rotadores e da própria goteira para-vertebral direita que pode traduzir edema neurogénico.

i) Alteração do sinal dos músculos escalenos direitos, associada a uma desorganização estrutural com perda da própria morfologia habitual e do sinal dos troncos, divisões e cordões que constituem o plexo braquial direito.

j) Fratura dos pratos da tíbia da perna esquerda.

- O Autor ficou com as seguintes limitações:

a) Ombro e o antebraço direito totalmente imobilizado.

b) Limitação no movimento de rotação do braço direito e mão direita.

c) O Autor perdeu a força no ombro, no braço e na mão direita.

d) Não tem sensibilidade no antebraço, no braço e na mão direita.

e) Não consegue dormir para o lado direito.

f) Não consegue agarrar, pegar e consequentemente levantar qualquer objeto por pouco pesado que seja.

g)Ficou impossibilitado de escrever e de assinar o seu nome com a mão direita, tendo recebido treinos/tratamentos para somente poder fazer a sua assinatura com a mão esquerda.

h) O Autor ficou com algumas limitações e perdeu autonomia e independência pessoal, nomeadamente entre outras atividades do quotidiano, para se vestir, calçar e comer sozinho.

- Desde a data do embate até à presente data, o Autor toma diariamente comprimidos para conseguir aguentar e/ou aliviar as dores, nomeadamente gabapentina (gabmox) e, ainda Ziphen quando as dores eram e/ou são mais agudas e intensas.

- Durante os vários períodos de tratamentos e de internamentos hospitalares a que foi submetido, o Autor sofreu dores.

- O Autor continua a ter e a sofrer fortes dores, principalmente com as mudanças de tempo, o que se prolongará até aos fins da sua vida.

- À data do embate, o Autor, que nasceu em ../../2000, era atleta do clube de ciclismo ... e estava inscrito e federado na União Velocipédica Portuguesa/Federação Portuguesa de Ciclismo, na categoria de cadetes e participava num dos treinos de bicicleta que fazia quase diariamente.

- O Autor sente tristeza por não poder voltar a praticar ciclismo.

- Por causa das lesões sofridas, o Autor não consegue cortar um pão para fazer uma sandes ou cortar um mero bife, não consegue apertar os cordões dos sapatos, não consegue vestir uma camisa se não tiver a ajuda da sua própria boca, o que lhe provoca tristeza e crises de depressão.

- Até o mês de março de 2018, o Autor foi medicado com comprimidos ADT para tratar da depressão que sofreu em consequência do embate.

- Antes do embate, o Autor era uma pessoa alegre e divertida, sendo que despois do embate passou a ser uma pessoa triste e amargurada, não tendo a mesma alegria de viver e de conviver com os jovens da sua idade.

- Apesar de, à data do embate, o Autor ainda estar na categoria de cadetes, tinha a expectativa de progredir no ciclismo português, ficando impedido de concretizar esse sonho, o que lhe causou tristeza.

- O Autor, à data do embate, estudava, pelo que em consequência dos internamentos e tratamentos médicos a que foi submetido, no ano letivo de 2017/2018, o Autor não teve aproveitamento escolar.

- O estado físico e mental em que o Autor ficou em consequência das lesões sofridas com o embate fez com que este se sentisse e sinta envergonhado, com complexos de conviver com os seus colegas de escola e professores, o que fez com que ele cada vez gostasse menos de frequentar a escola.

- O Autor terá que receber tratamentos e acompanhamento médicos até ao final da sua vida.

- O Défice Funcional Temporário Total fixou-se num período de 23 dias.

-  O Défice Funcional Temporário Parcial fixou-se num período 1280 dias.

- Com Repercussão Temporária na Atividade Profissional (considerou-se a repercussão escolar) fixou-se um período total de 103 dias.

- Repercussão Temporária na Atividade Profissional Parcial (considerou-se repercussão escolar), fixou-se um período total de 1200 dias.

- O Quantum doloris fixa-se no grau 6 numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta as lesões resultantes, o período de recuperação funcional, o tipo de traumatismo, e de tratamentos efetuados, com múltiplas cirurgias, pensos por longos períodos por dificuldade na cicatrização de ferida torácica, fisioterapia com frequências de 5 e de 3 vezes por semana, e em face da idade do examinado e gravidade do quadro clínico com implicação no seu bem estar físico com dor e limitação motora, mental e social numa faixa etária na qual o contexto social representa um amplo espaço de realização e formação pessoal.

- O Autor era estudante à data do embate, tendo ficado com o seu percurso escolar afetado, quer pelas limitações físicas, funcionais e quadro de dor, quer pelas consequências psíquicas, mais acentuadas no período inicial após o embate, assim como pelo absentismo escolar necessário para tratamentos cirúrgicos.

 - A necessidade de realização frequente de pensos e de fisioterapia, implicou para o Autor, dispêndio de tempo, dores físicas e alterações do foro mental associadas.

- Sendo o Autor, à data, adolescente ainda sem projeto profissional mais orientado ou definido, as sequelas resultantes do embate são compatíveis com algumas profissões, embora com esforços suplementares (mesmo que não necessite do uso dos membros superiores, já que mesmo nesses casos, mantém quadro doloroso e queixas psíquicas que o afetam).

- O Autor estará impossibilitado de prosseguir uma profissão em que necessite de usar os dois membros superiores em simultâneo e estará impossibilitado ou pelo menos necessitará de esforços suplementares acentuados no exercício de profissões em que apenas necessite de usar um membro superior mas que exijam grande destreza/precisão desse membro (uma vez que era dextro, necessitando agora de fazer uso do membro que era passivo), podendo, ainda assim, beneficiar de treino específico para o uso do lado esquerdo.

- Dado que a sua dinâmica postural e equilíbrio também estão algo afetados, é de admitir dificuldade acrescida na realização de profissões que exijam elevadas capacidades de equilíbrio.

- Para o exercício da profissão de ator pretendida pelo Autor, o mesmo está impossibilitado na realização de vários papéis que impliquem o uso pleno do membro superior direito. Outros papéis existirão que poderá realizar com esforços suplementares.

- O Autor manifestou interesse na área de comunicação, sendo que a capacidade para profissões desta área de estudo depende da concreta profissão que venha a escolher, de qualquer forma, necessita sempre, pelo menos de esforços acrescidos pelas sequelas físicas e psíquicas que sofreu com o embate.

- Dano Estético Permanente é fixável no grau 6, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta os seguintes aspetos: as extensas cicatrizes de aspeto hipertrófico e com pigmentação no tronco, as restantes cicatrizes nos membros superiores esquerdo e direito e membros inferiores esquerdo e direito, a alteração dos normais movimentos e sincronia dos movimentos do corpo pela imobilidade do membro superior direito, a amiotrofia do membro superior direito, o flexo do cotovelo direito, a necessidade de usar tala de apoio (está documentado que iria realizar artrodese do punho ou seja, fixação cirúrgica do punho direito que poderá ter sido entretanto realizada mas que não impede que haja dano estético por punho em posição fixa).

- Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer é fixável no grau 6, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta a sua vida afetiva, social e familiar.

- Repercussão Permanente na Atividade Sexual é fixável no grau 4, pelas sequelas físicas e psíquicas e dificuldade em posicionamentos.

- Dependências Permanentes de Ajudas:

Ajudas medicamentosas: O Autor efetua medicação em SOS quando tem mais dores o que se admite (analgesia) e psicofármaco quando tem mais dificuldade em dormir. Poderá a vir ter indicação de medicação adicional conforme quadro doloroso a prescrever pelos médicos assistentes.

Tratamentos médicos regulares: O Autor mantém tratamentos de fisioterapia, tendo efetuado na Clínica ... tratamentos de fisioterapia desde 31/10/2016 até 10/2/2020, num total de 629 sessões.

O Autor deve manter consultas de ortopedia e de psiquiatria de vigilância, eventualmente maior frequência se necessário e de neurocirurgia e fisioterapia com frequência a determinar pelo médico assistente. Ainda realiza fisioterapia.

Ajudas técnicas: tala/apoio de punho (caso não tenha feito artrodese), adaptação ao domicílio, beneficia de carro automático, adaptado a uso só do membro superior esquerdo; eventuais ajudas técnicas no computador tais como rato e apoio para diminuir dor no uso com a mão esquerda; eventuais utensílios de vida diária que possam permitir melhor uso da mão esquerda e mais autonomia (a determinar em avaliação de ajudas técnicas), tábua de preparação de alimentos para unimanual,  faca de Nelson, rebordo de prato, dispositivo de parede, dispensador de gel de banho e shampoo, dispositivo anti-derrapante para abertura de embalagens, em silicone ou outro, rato de computador adaptado com botões e comandos laterais;

- O Autor necessita de ajuda de terceira pessoa para tarefas de vida diárias que impliquem o uso dos dois membros superiores em simultâneo ou de maior esforço e força tais como limpezas profundas do domicílio para deslocar móveis, ou outras mais pesadas, ajuda para preparação dos alimentos (descascar e cortar por exemplo), ajuda para comer alguns alimentos que não consegue descascar ou cortar, lavar a roupa manualmente (tem que fazer uso da máquina de lavar roupa ou necessita de ajuda de terceira pessoa para lavagem de roupas manual), lavar louça (podendo fazer uso de máquina de lavar louça necessitando de ajuda de terceira pessoa para lavagem manual), atividades que o próprio apesar de não ter referido - o que pode ser explicado pela idade do mesmo e contexto de vivência familiar - se admite venha a percecionar quando iniciar vida autónoma/quando passar a morar sozinho.

- Ao nível da alimentação: O Autor tem dificuldade na preparação de alimentos mais duros, necessitando de apoio para a sua preparação.

- Dificuldade na abertura de frascos / recipientes.

- Higiene Pessoal: autonomia modificada, encontrou estratégias; atividade unimanual e demora mais tempo; precisa de ajuda a cortar as unhas das mãos; não usa escova de dentes elétrica, usa manual e tem estratégia para a pasta dos dentes.

Banho: Dificuldade no uso de embalagens

Vestir: Autonomia modificada – demora mais tempo.

Calçar: consegue calçar meias e restante calçado; tem dificuldade nos cordões – não terá aprendido a técnica de apertar unimanual.

Escrita: Tenta com a mão esquerda.

Tecnologias: Usa o computador e o telemóvel; comprou rato com mais opções de botões e comandos.

Condução: Com adaptação.

Lesão neurológica periférica grave, sem movimentos funcionais no membro superior direito.

- Por causa do embate, o Autor ficou com uma perturbação persistente do humor, com repercussão moderada na autonomia pessoal, social e profissional com repercussão moderada nas atividades da vida diária, incluindo as familiares, sociais, de lazer e desportivas, o qual, tendo em conta o diagnóstico é valorizado em 12 pontos.

              Ora, perante o referido circunstancialismo fáctico, a atender e tendo em conta, designadamente, a idade do autor à data do acidente, a experiência traumática e perturbadora que sofreu, a natureza, a gravidade e a extensão das lesões, o período de convalescença, as quatro cirurgias, uma delas de elevada complexidade e com a duração de 12 horas, a fisioterapia e os tratamentos a que teve de se submeter, o quantum doloris,  o dano estético e todas as sequelas de que ficou a padecer, inclusive a nível sexual, as dores, a circunstância de não ter tido qualquer culpa na eclosão do acidente, antes o mesmo se deveu a culpa grave e exclusiva da condutora do veículo segurado na ré, e ponderando os casos similares e os valores arbitrados pela nossa jurisprudência[45], afigura-se-nos equitativamente adequada e equilibrada, a indemnização de 200.000,00 €, para a reparação de todos os referidos danos não patrimoniais sofridos pelo autor, sendo, por isso, de fixar em mais 20.000,00€ o quantum indemnizatório pelos danos não patrimoniais.
Assim, fixada a indemnização por danos não patrimoniais com base na equidade, o Tribunal superior deve intervir para assegurar a igualdade, o que entendemos suceder no caso, de extrema gravidade, sendo o Autor à data do acidente um jovem, de 15 anos de idade, que viu, com tão tenra idade a sua vida, alegre, tornar-se num sofrimento que durou mais de três anos e deixou tão graves sequelas, físicas e psíquicas, inclusive a nível sexual. 


*


3 - Da obrigação de indemnizar da 2ª Ré.
 

Bem fundamenta o Tribunal a quo a absolvição da 2ª Ré ao referir:

 “Uma vez que resulta da factualidade provada que o dono do veículo de matrícula “..-JZ-..”, à data do embate, mantinha transferida a responsabilidade pelo risco de danos causados a terceiros com a circulação do mesmo para a 1ª Ré “A... – Companhia de Seguros S.A.”, que à data do acidente era denominada e designada por “C... – Companhia de Seguros S.A.”, por via de um contrato de seguro válido, titulado pela Apólice nº ...88 (ponto 50), esta deve ser responsabilizada pela totalidade dos danos sofridos pelo Autor.

O Autor pertencia à Federação Portuguesa de Ciclismo, sendo que esta Federação celebrou com a Companhia de Seguros, a aqui 2ª Ré “B... S.A.”, um contrato de seguro desportivo obrigatório, - a titulo de acidentes (pessoais) dos atletas federados, que veio a ser titulado pela Apólice nº: ...50 (cfr. ponto 51).

Uma vez que a 1ª Ré deve ser responsabilizada pela totalidade dos danos sofridos pelo Autor, absolve-se a 2ª Ré do pedido contra si deduzido”.

E, na verdade, respondendo a 1ª R é, A..., por todos os danos sofridos pelo Autor nunca poderia o pedido formulado contra a 2ª Ré proceder, tanto mais que este pedido foi formulado subsidiariamente (cfr. fls 3 e nota 3) -, foi formulado para a “eventualidade de a 1ª Rá não vir a ser condenada” - e, como resulta do supra referido, tal  Ré é condenada a ressarcir os danos sofridos pelo Autor.


*

Destarte, improcedem as conclusões da apelação da 1ª Ré e procedem, totalmente, as conclusões da apelação do Autor com relação à pretensão condenatória da 1ª Ré, fixando-se em mais € 310.000,00 a indemnização a atribuir ao Autor (pelo dano biológico) e em mais € 20.000,00 o quantum pelos danos não patrimoniais, o que acresce ao montante fixado em 1ª instância, improcedendo a apelação do Autor em relação à 2ª Ré.

*

As custas do recurso principal são da responsabilidade da 1ª Ré recorrente e as do recurso subordinado são da responsabilidade do Autor recorrente e da 1ª Ré Recorrida, na proporção dos respetivos decaimentos (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

*

            III. DECISÃO
Pelos fundamentos expostos, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto acordam em:
a) julgar a apelação da 1ª Ré improcedente;
b) julgar a apelação do Autor parcialmente procedente e, em consequência,: revogam, em parte, a decisão recorrida, fixando em mais 310.000,00 euros (trezentos e dez mil euros) o montante indemnizatório a atribuir ao Autor pelo dano biológico por ele sofrido, e em mais 20.000,00 euros (vinte mil euros) o montante indemnizatório pelos danos não patrimoniais que sofreu, o que acresce ao  fixado em 1ª instancia, mantendo-se, no restante, a sentença recorrida.
*

Custas do recurso independente pela 1ª Ré.

Custas do recurso subordinado por Autor e 1ª Ré, na proporção do decaimento.




Porto, 10 de julho de 2024

Assinado eletronicamente pelos Juízes Desembargadores

Eugénia Cunha

Jorge Martins Ribeiro

Manuel Domingos Fernandes


_______________________
[1] Tem os artigos 75º e 76º, da p.i., o seguinte teor:
75º- … a 2ª Ré “B..., SA.” Era a seguradora para a qual, por contrato titulado pela Apólice nº ...06, vigente à data do acidente, havia sido transferida a responsabilidade por danos e prejuízos que o Autor na qualidade de atleta (quer em prova quer em treinos) porventura pudesse vir a sofrer em consequência de acidente.
76º- Assim, na eventualidade da 1ª Ré não vir a ser condenada a indemnizar o A. nos precisos termos aqui peticionados nos presentes autos – o que só por mera hipótese de patrocínio se admite -, deverá a 2ª Ré ser condenada a indemnizar o A. por todas as quantias peticionadas na presente ação, ou então, e pelo menos nos termos e condições que porventura constam do contrato de seguro titulado pela apólice supra identificada” (negrito e sublinhado nosso).
[2] Rita Lynce de Faria, in anotação ao artigo 342º, Comentário ao Código Civil Parte Geral, Universidade Católica Portuguesa, Universidade Católica Editora, pág. 812
[3]18 - Em consequência do embate, o equipamento que o Autor vestia e utilizava no treino foi comprado por si – camisola, calções, sapatos, capacete, polar e óculos – ficou totalmente destruído, o qual tinha um valor global não inferior a 450,00 € (quatrocentos e cinquenta euros)”.
40 - As despesas com transportes para se deslocar para as consultas e para os tratamentos sempre foram efetuados pelos pais do Autor, em veículo próprio daqueles, tendo efetuado desde a data do embate até à presente data 75 viagens de ida e volta desde a residência do Autor (sita em ... - ...) ao Hospital 2... (sito no Porto), tendo despendido em cada viagem de ida e volta com combustível e portagens a quantia de 15,00 € (quinze euros) e despendeu a quantia de € 228,31 com os custos dos medicamentos adquiridos por si e com despesas com os tratamentos médicos que não foram suportados pela Segurança Social”.
[4] José de Sousa Dinis, Avaliação e reparação do dano patrimonial e não patrimonial (No domínio do direito Civil), Julgar, pag 29 e seg

[5] Acórdão do S.T.J. de 21/11/79, BMJ. nº 291, pág. 480.
[6] Acórdão do STJ de 18/12/2007 Processo 07B3715, in dgsi.net
[7] Galvão de Teles, Direito das Obrigações, 6ª ed., pág. 373.
[8] Acórdão do S.T.J. de 4/3/80, RLJ, 114º- 317.

[9] Acórdão do S.T.J de 23/5/78, BMJ nº 277; pág. 258
[10] Pires de Lima e A. Varela (Cód. Civil Anotado, I, pág. 580)
[11] Acórdão do STJ de 18/12/2007, Processo 07B3715, in dgsi.net
[12] Antunes Varela, Das Obrigações em geral, vol. I, 9ª ed., Almedina, pag 936.
[13] Idem, págs 936 e 937
[14] Cfr. Ac. STJ de 20.11.2014, proc. n.º 5572/05.0TVLSB.L1.S1, relatora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza; Ac. STJ de 04.06.2015, proc. n.º 1166/10.7TBVCD.P1.S1, relatora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza; Ac. STJ de 21.01.2016, proc. n.º 1021/11.3TBABT.E1.S1, relator Lopes do Rego; Ac. STJ de 26.01.2016, proc. n.º 2185/04.8TBOER.L1.S1, relator Fonseca Ramos; Ac. STJ de 07.04.2016, proc. n.º 237/13.2.G1.S1, relatora Maria da Graça Trigo; Ac. STJ de 02.06.2016, proc. n.º 2603/10.6TVLSB.L1.S1, relator Tomé Gomes; Ac. STJ de 16.06.2016, proc. n.º 1364/06.8TBBCL.G1.S2, relator Tomé Gomes; Ac STJ de 10.11.2016, proc. n.º 175/05.2TBPSR.E2.S1, relator Lopes do Rego; Ac. STJ de 14.12.2016, proc. n.º 37/13.0TBMTR.G1.S1, relatora Maria da Graça Trigo; Ac. STJ de 26.01.2017, proc. n.º 1862/13.7TBGDM.P1.S1, relator Oliveira Vasconcelos; Ac. STJ de 16.03.2017, proc. n.º 294/07.0TBPCV.C1.S1, relatora Maria da Graça Trigo; Ac. STJ de 25.05.2017, proc. n.º 2028/12.9TBVCT.G1.S1, relatora Maria da Graça Trigo, todos acessíveis em www.dgsi.pt.

[15] Cfr. Acs. STJ de 4/2/93, in AC STJ, I, 129; 5/5/94 in, AC STJ, II, 86; de 28/9/95, in AC STJ, III, 36; de 15/12/98, in AC STJ, 111, 155.
[16] Joaquim José de Sousa Dinis, “Avaliação e reparação do dano patrimonial e não patrimonial (No domínio do direito Civil), Julgar, pag 38 e seg
[17] Vide, neste sentido, Ac. STJ de 07.06.2011 e de 04.06.2015, ibidem, e Ac. STJ de 16.01.2014, proc. n.º 1269/06.2TBBCL.G1.S1; e Ac. STJ de 07.05.2014, proc. n.º 436/11.1TBRGR.L1.S1, todos disponíveis in www.dgsi.pt.
[18] Vide, neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de março de 2012, relatado por Sérgio Poças, no processo nº 184/04.9TBARC.P2.S1, acessível in dgsi.net.
[19] Acórdão do STJ de 05 de julho de 2007, no processo n°07A1734, relatado por Nuno Cameira

[20] [1] Vide, a este propósito, as doutas considerações do ac. do STJ, de 21-03-2013, relatado por Salazar Casanova, no processo n.º 565/10.9TBVL.S1, acessível na Internet - http://www. dgsi.pt/jstj.
[2] Entre muitos outros, vide, a título de exemplo, o ac. do STJ, de 7-6-2011, relatado por Granja da Fonseca, no âmbito do processo 160/2002.P1.S1, publicado na Internet, http://www.dgsi.pt/jstj.
[3] Relatado por Lopes do Rego, disponível na Internet – http://www.dgsi.pt/jstj.

[21] Acórdão do STJ de 13/7/2017, Processo 3214/11.4TBVIS.C1.S1, in dgsi.net

[22] Acórdão do STJ de  19/5/2009 Processo 298/06.0TBSJM.S1, in dgsi.net

[23] Acórdão do STJ de 19/5/2009, proc. 298/06.0TBSJM.S1, in dgsi.net
[24] Acórdão do STJ 10/11/2016, Processo 175/05.2TBPSR.E2.S1,in dgsi.net
[25] Cfr. Ac. da RP de 18/3/2024, proc. 1612/21.4T8PVZ.P1 (Relator: José Eusébio Almeida), acessível in dgsi, onde se segue a, recente, jurisprudência que se passa a citar:
“- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6.02.2024 [Processo n.º   2012/19. 1T8PNF. P1.S1, Relator, Conselheiro Pedro Lima Gonçalves, dgsi]: “I - O dano biológico integrado por défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 6 pontos, compatível com o exercício de atividade profissional, mas que implica esforços suplementares para o exercício da mesma, é indemnizável sob uma vertente patrimonial, como dano patrimonial futuro que tem em conta a expressão daquele défice. II - Tratando-se de calcular um quantitativo indemnizatório que traduza o capital de que o lesado se veja privado para o futuro em virtude do défice funcional sofrido, para tal há que ter em conta o período de tempo que, considerando a idade do lesado aquando da data da consolidação médico-legal das lesões (pois é a partir desta que fica definido o défice funcional), tem em conta a sua esperança média de vida, e a consideração do salário médio mensal nacional dos trabalhadores por conta de outrem por referência ao ano da consolidação médico-legal das lesões, isto no caso de o lesado ser estudante, pois neste caso não existe qualquer elemento que indicie que o mesmo se iria situar no patamar mais baixo de uma carreira profissional ou que iria conformar-se com o recebimento do salário que qualquer empresa é obrigada a pagar independentemente das habilitações ou da profissão exercida pelo trabalhador” .
“- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16.01.2024 [Processo n.º 3527/18.4T8PNF .P2.S1, Relator, Conselheiro Luís Correia de Mendonça, dgsi]: “IV- O julgador deve recorrer à equidade para fixar a indemnização devida pelo dano biológico, ainda que se sirva, num primeiro momento, do auxílio de tabelas financeiras ou de fórmulas matemáticas. V- Esta operação inicial consiste na utilização de um instrumento de carácter objetivo, a ajustar ulteriormente às situações ocorrentes na vida. VI- O ideal de justiça exige um tratamento dos casos concretos que tenha em conta o valor das pessoas concretas, na sua circunstância. VII- É adequado fixar uma indemnização de €180.000,00 (cento e oitenta mil euros) para ressarcir dano patrimonial futuro sofrido por um jovem de 27 anos, que, por virtude das sequelas de que ficou a padecer como consequência das lesões que lhe resultaram de uma colisão estradal, ficou impossibilitado de exercer a sua profissão habitual (carpinteiro de cofragem), na qual auferia retribuição anual global de €20.636,70, ainda que continuando a poder trabalhar, com menor remuneração, noutro ramo de atividade (motorista), com uma incapacidade funcional de 15 pontos” .
Também no Ac. da Relação do Porto de 3/6/2024, proferido no proc.  nº 9774/21.4T8PRT.P1, Relator: Manuel Fernandes, acessível in dgsi.pt), se refere: “De acordo com os enunciados fatores, considerando que o autor ficou afetado de um défice funcional permanente de integridade físico-psíquica fixável em 19 pontos, temos que a perda patrimonial anual corresponde a € 3.442,30  [(€ 1.294,10 x 14) x 19%], o que permitiria alcançar, ao fim de 54 anos de vida (considerando-se, neste ponto, que à data do acidente o autor contava 24 anos de idade e que a sua esperança média de vida se situa nos 78 anos de idade), o montante de € 185.884,20”.
No Ac. da RP de 8/5/2023, proc. 21244/17.0T8PRT.P1 (Relatora: Fátima Andrade) considerou-se: “Considerando que o A. à data do acidente com 23 anos de idade, estava desempregado, que o salário médio nacional em tal data era de € 925,00 e que o A. ficou afetado de uma incapacidade de 61 pontos impeditiva da atividade profissional habitual, permitindo apenas que esse lesado exerça outras profissões compatíveis com a área da sua preparação técnica desde que não exijam a execução de tarefas complexas, entende-se adequado e recorrendo a critérios de equidade fixar o valor indemnizatório a título de dano patrimonial futuro no montante de € 400.000,00 tal como peticionado pelo autor”.
[26] Antunes Varela, Das Obrigações em geral, 6ª ed., l°, pág .571.
[27] Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Vol. I, 14ª edição, Almedina, págs. 328.
[28] Antunes Varela, Idem, p. 600
[29] Ana Prata (Coord.), Código Civil Anotado, 1º vol., 2017, Almedina, pág 648
[30]Luís Menezes Leitão, Ibidem, pág. 330.
[31] Idem, pág 331
[32] Acórdão da Relação do Porto, Processo 108/08.4TBMCN.P1 de 8/7/2010, in www.dgsi.pt
[33] Ana Prata (Coord.), idem, pág 644
[34] Dário Martins de Almeida, Manual de Acidentes de Viação, 2ª ed., Almedina. pág 73/74.
[35] Em sentido contrário, Ana Prata (Coord.), idem, pág 647, Diversamente do que por vezes se lê, os danos não patrimoniais são suscetíveis de avaliação pecuniária, pois são objeto de indemnização e esta é em dinheiro na esmagadora maioria dos casos. Os interesses lesados, esses sim, é que são não patrimoniais.

[36] Vaz Serra, RLJ, Ano 113º, p. 104.

[37] P. Lima e A. Varela, Código Civil Anotado, Vol. 1, Coimbra,  p. 501
[38] Antunes Varela, ibidem p. 607 e segs.
[39] Vide, neste sentido, Ac. STJ de 04.06.2015, relatora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, já citado; e Ac. STJ de 26.01.2016, proc. n.º 2185/04.8TBOER.L1.S1, relator Fonseca Ramos; Ac. STJ de 28.01.2016, proc. n.º 7793/09.8T2SNT.L1.S1, relatora Maria da Graça Trigo; ou, ainda, Ac. STJ de 18.06.2015, proc. n.º 2567/09.9TBABF.E1.S1, relatora Fernanda Isabel Pereira, todos disponíveis in www.dgsi.pt.
[40] Proc. n.º 2567/09.9TBABF.E1.S1, relatora Fernanda Isabel Pereira, acessível em www.dgsi.pt.  
[41] Proc. n.º 3558/04.1TBSTB.E1.S1, relatora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, acessível em www.dgsi.pt

[42] Vide, ainda, neste sentido, Ac. STJ de 07.04.2016, proc. n.º 237/13.2TCGMR.G1.S1, relatora Maria da Graça Trigo; e Ac. STJ de 18.06.2015, já citado, e, ainda, Ac. STJ de 31.01.2012, proc.n.º 875/05.7TBILLH.C1.S1, relator Nuno Cameira, todos disponíveis in www.dgsi.pt.

[43] [4] Vide Prof. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. 1.º, 10.ª Edição, Almedina, pag. 605, nota 4.

[44] Acórdão do STJ de 13/7/2017, Processo 3214/11.4TBVIS.C1.S1, in dgsi.net.

[45] Cfr., in dgsi.net, entre outros:
- Ac. da RP de 8/5/2023, proc. 21244/17.0T8PRT.P1 (Relatora: Fátima Andrade) onde se considerou:   “Levando em consideração a total ausência de culpa do autor na produção do acidente que à data do acidente era um jovem de 23 anos de idade; a sua modesta condição económica; a imensa gravidade das lesões sofridas pelo autor que implicaram um défice funcional permanente de 61 pontos e a prolongadíssima recuperação – até à consolidação médico-legal das lesões decorreram sensivelmente dois anos e meio; o quantum doloris fixado no grau 6 de uma escala de 7 , a permanência para o resto da vida das dores físicas, incómodo e mal estar que as sequelas lhe provocam e que o acompanharão para o resto da vida, entende-se ser de arbitrar a título de danos não patrimoniais o valor de € 175.000,00”.
- Ac. RG de 18/1/2018, proc. nº 410/12.0TBVPA.G1, onde a ora Relatora entendeu-se num caso de um homem de 34 anos de idade ser  “adequada, necessária e proporcional a importância de 75.000,00 € para compensar os danos não patrimoniais sofridos pelo referido lesado, que perdeu o olho direito, ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 39%  e teve um quantum doloris no grau 5/7, um dano estético permanente no grau 3/7, repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer no grau 3/7, com períodos de repercussão na atividade profissional de 42 dias, para a total, e de 856 dias, para a parcial, e em que ocorre um contexto descrito de complicações e grande stress pós-traumático, com implicações designadamente a nível social e sexual”.