Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | JOAQUIM MOURA | ||
Descritores: | BANCO DE PORTUGAL CENTRAL DE RESPONSABILIDADE DE CRÉDITO COMUNICAÇÃO AO BANCO DE PORTUGAL RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DIREITO À HONRA E BOM NOME | ||
Nº do Documento: | RP202307124288/19.5T8GDM.P1 | ||
Data do Acordão: | 07/12/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
Sumário: | I - O cumprimento da obrigação legal que recai sobre instituições bancárias e financeiras de enviar ao Banco de Portugal a informação referente aos saldos, que se registaram no final de cada mês, das operações de crédito realizadas com particulares, empresas ou outras entidades, não desresponsabiliza essas instituições pelas comunicações efectuadas, pois «a comunicação de uma incorrecta informação à Central de Responsabilidades de Crédito ofende a honra e o bom nome da pessoa visada na comunicação.» II - Tendo a recorrente comunicado à Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal que a autora estava em situação de incumprimento de responsabilidades de crédito, mas não provando que essa informação era correcta, que realmente a autora fosse devedora dos montantes correspondentes aos saldos negativos das contas que menciona, é essa incorrecção que a faz cair nas malhas do ilícito civil; III - Os clientes de uma instituição bancária têm o direito de esperar que esta actue com zelo e diligência e que esteja devidamente apetrechada para evitar erros como o cometido pela recorrente. | ||
Reclamações: | |||
Decisão Texto Integral: | Processo n.º 4288/19.5T8GDM.P1 Comarca do Porto Juízo Local Cível de Gondomar (Juiz 2) Acordam na 5.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto I – Relatório[1] 1. Configuração da acção Em 19 de Dezembro de 2019, AA intentou no Juízo Local Cível de Gondomar acção declarativa sob a forma de processo comum (distribuída ao Juiz 2) contra “Banco 1..., S.A.”, alegando, em síntese, o seguinte: Em Dezembro de 2018, Banco 2..., S.A., do qual era cliente, recusou-lhe a atribuição de um livro de cheques com o fundamento de que que tinha uma comunicação na Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal (CRC) que a impedia de ser titular de cheques enquanto não regularizasse o incumprimento que aí constava. Consultado o Mapa de Responsabilidades de 31-12-2018, verificou que constavam duas comunicações da ré, onde se reportava: i) uma dívida de € 4.275,30, com incumprimento desde 23.12.2016; ii) uma dívida de € 10.000,00, sem data de incumprimento, com a referência “não aplicável”. Por consulta do Mapa de Responsabilidades da dita data de incumprimento (31.12.2016), verificou que tinha comunicada uma dívida por “descoberto em depósito à ordem” no valor de € 83,00. Em 18.01.2019, exigiu esclarecimentos à ré sobre essas comunicações, mas não obteve qualquer resposta. Acontece que não é e nunca foi cliente da ré e se, porventura, esta adquiriu, a qualquer título, direitos de crédito sobre si, nunca lhos comunicou nem interpelou para pagamento. Na realidade, não é devedora das responsabilidades que a Ré comunicou ao Banco de Portugal. Com essa conduta, a ré ofendeu, e continua a ofender, o seu bom nome, honra e consideração. Ao tomar conhecimento destes factos, ficou preocupada e angustiada, sentiu-se vexada, designadamente perante o Banco 2..., quando confrontada com a recusa de entrega de cheques, e ainda se sente limitada e envergonhada. Com estes fundamentos de facto, que, na sua perspectiva, consubstanciam responsabilidade civil extracontratual da ré, formula os seguintes pedidos: «i. Se reconheça a inexistência das dívidas que a Ré comunicou ao Banco de Portugal; ii. Se condene a Ré a comunicar ao Banco de Portugal a retificação da informação relativa à Autora constante da Central de Responsabilidades de Crédito, no sentido da inexistência das dívidas aí aludidas e por aquela previamente comunicadas; iii. Se condene a Ré a pagar à Autora a quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais causados por aquela em consequência da violação dos direitos desta ao bom nome, honra, consideração e saúde. iv. Se condene a Ré a pagar a quantia de € 500,00 por cada dia de atraso na comunicação ao Banco de Portugal da retificação da informação referente à Autora constante da Central de Responsabilidades de Crédito, após o trânsito em julgado da sentença que a isso a condene, a título de sanção pecuniária compulsória». 2. Oposição da ré Citada, a ré apresentou contestação, defendendo-se por impugnação, e deduziu reconvenção. Contestando, alega que, efectivamente, fez as comunicações à Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal denunciando os incumprimentos a que alude a autora. Não aceita que a autora tenha sofrido os danos que invoca e que por eles deva responder, pois não cometeu qualquer ilícito. Na realidade, em 27/01/1993, a autora e BB solicitaram, e obtiveram, junto do Banco 3..., S.A. a abertura de uma conta de depósitos à ordem, conta essa à qual foi atribuído o n.º ... (conta que, a partir de 1999, passou a ser titulada, apenas pela autora); por proposta contratual formulada pela autora, e aceite pelo “Banco 3...”, em 01/02/1999 foi celebrado entre si um contrato de conta de gestão de tesouraria e no âmbito dessa relação contratual, foi formalizado um contrato de abertura de crédito no valor de 2.000 contos (contravalor em euros de € 10.000,00). Como é do conhecimento público e foi divulgado junto dos clientes, por deliberação do Conselho de Administração do Banco de Portugal tomada em reunião extraordinária de 20 de Dezembro de 2015, foi decidido, além do mais, alienar ao Banco 1..., S.A., os direitos e obrigações, que constituíam activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco 3..., S.A. Foi assim que a referida conta de depósitos à ordem titulada pela autora, bem como a mencionada conta corrente, anteriormente abertas junto do Banco 3..., S.A., fazendo parte da actividade bancária desta instituição financeira, transitaram para a ré “Banco 1..., S.A.”. Daí a legitimidade da ré relativamente aos créditos que, actualmente, detém sobre a autora e que correspondem, precisamente, às responsabilidades reportadas à Central de Responsabilidades de Crédito (de ora em diante, CRC) Assim, por referência ao Mapa de Responsabilidades de 31.12.2018, a dívida então reportada pelo valor de € 4 275,30 corresponde, precisamente, ao saldo negativo existente na conta de depósitos à ordem n.º ... (que, no Banco R., foi renumerada para n.º ...) e que, à data de 31.01.2020, apresentava um saldo negativo de € 7 778,44. Por seu turno, a dívida reportada pelo valor de € 10.000,00 diz respeito ao crédito concedido ao abrigo do contrato de abertura de crédito, sob a forma de conta corrente caucionada, a qual assume, no Banco R., o n.º .... A transferência desses contratos para o Banco R. no seguimento das deliberações do Banco de Portugal foi acompanhada da migração informática das operações bancárias subjacentes, bem como da obrigação que, por lei, recai sobre os bancos de enviar ao Banco de Portugal a informação referente aos saldos, que se registaram no final de cada mês, das operações de crédito realizadas com particulares, empresas ou outras entidades, residentes ou não residentes em Portugal, desde que o valor de cada saldo seja igual ou superior a 50 euros. Assim, passou a ser feita pela ré a comunicação dessas responsabilidades. Por isso não corresponde à verdade que a A. não tenha conhecimento das dívidas que contraiu, nem do motivo pelo qual a informação está a ser reportada à CRC. Conclui que, no caso, se não verifica nenhum dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual aqui em causa. Em reconvenção, alega que, tendo-se tornado, nas relatadas circunstâncias, titular dos créditos relativos às referidas contas (saldo negativo na conta de depósitos à ordem n.º ... e crédito concedido ao abrigo da conta corrente n.º ...), pode exigir da autora/reconvinda, que, por si ou por procurador, movimentou tais contas, o seu pagamento. Remata pedindo a condenação da autora a pagar-lhe o montante global de € 17 778,44 e juros de mora. 3. Réplica A autora apresentou articulado de réplica em que, além de se pronunciar sobre os documentos oferecidos com a contestação (impugnando o seu conteúdo e as assinaturas), respondeu à matéria da reconvenção, alegando ser a primeira vez que a ré/reconvinte lhe vem exigir o pagamento da alegada dívida, sendo que uma das parcelas resultaria de um alegado contrato de crédito celebrado há 21 anos, que considera um absurdo e que desconhece completamente; no limite, o alegado crédito de € 10 000,00 teria sido utilizado em 1999 e já estaria prescrito o direito que a reconvinte se arroga. Concluiu pela improcedência da reconvenção. 4. Intervenção de terceiros A reconvenção foi admitida por despacho de 10.11.2020 e, convidada a aperfeiçoá-la, a reconvinte correspondeu ao convite. A autora respondeu e deu notícia de ter sido interpelada para pagamento da mesma dívida por “A..., S.A.”, em representação de “B..., S.A.”, que teria sido cessionária de “C..., S.A.”, em 30.12.2020, manifestando desconhecer quaisquer cessões mas manifestando dúvidas sobre quem é o verdadeiro titular da relação jurídica controvertida, considerando o pedido reconvencional apresentado pela R. Por requerimento de 30.03.2021, a A. deduziu incidente de intervenção provocada de “B..., S.A.”, assente naquela informação, acrescentando que no Mapa de Responsabilidades da CRC do Banco de Portugal passou a constar a B... como a titular dos créditos reclamados pela R.. Foi ordenada a junção de documentos requeridos pela A. respeitantes à cessão de créditos e determinado o cumprimento do disposto no art. 318/2 do CPC quanto ao incidente. Por requerimento de 11.06.2021, a R. apenas juntou contrato de cessão de créditos efetivada entre si e “C..., S.A.”, dizendo-se alheia às demais invocadas cessões. Por despacho de 31.01.2022, não foi admitida a intervenção provocada de “B..., S.A”. Também não foi admitida a intervenção principal espontâneo de BB, marido da A. (despacho de 19.04.2022). 4. Saneamento e condensação Realizou-se a audiência prévia, na qual se tentou a conciliação das partes, mas a tentativa frustrou-se; foi fixado o valor da causa (€ 21.870,28, indicado na PI); não foi fixado o objecto do processo nem foram enunciados os temas de prova, por se considerar que a simplicidade da causa não o justificava; foram admitidos os requerimentos probatórios e designou-se data para a audiência final. 5. Audiência final e sentença Em 22.03.2022, iniciou-se a audiência final, que se realizou em duas sessões, após o que, com data de 30.08.2022, foi proferida sentença[2], com o seguinte dispositivo: «Julga-se a presente ação totalmente procedente e nestes termos: - CONDENA-SE a R. a: i. reconhecer a inexistência das dívidas que comunicou ao Banco de Portugal; ii. a comunicar ao Banco de Portugal a retificação da informação relativa à A. constante da CENTRAL DE RESPONSABILIDADES DE CRÉDITO, no sentido da inexistência das dívidas aí aludidas e por aquela previamente comunicadas; iii. a pagar à A. a quantia de €5.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais causados por aquela em consequência da violação dos direitos desta ao bom nome, honra, consideração e saúde. iv. a pagar a quantia de €500,00 por cada dia de atraso na comunicação ao Banco de Portugal da retificação da informação referente à A. constante da CENTRAL DE RESPONSABILIDADES DE CRÉDITO, após o trânsito em julgado da sentença que a isso a condene, a título de sanção pecuniária compulsória. Julgando-se a reconvenção totalmente improcedente: - ABSOLVE-SE a A. do pedido reconvencional. Custas da Ação e da Reconvenção pela R.» 6. Impugnação da sentença Inconformada com a sentença, a ré dela interpôs recurso de apelação, com os fundamentos explanados na respectiva alegação, que “condensou” nas seguintes conclusões: «I. - Tem o presente recurso por objecto a sentença proferida pelo Tribunal a quo e que, julgando parcialmente procedente a acção, por provada, proferiu decisão a condenar o Banco Apelante a “i. reconhecer a inexistência das dívidas que comunicou ao Banco de Portugal; ii. a comunicar ao Banco de Portugal a retificação da informação relativa à A. constante da CENTRAL DE RESPONSABILIDADES DE CRÉDITO, no sentido da inexistência das dívidas aí aludidas e por aquela previamente comunicadas; iii. a pagar à A. a quantia de €5.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais causados por aquela em consequência da violação dos direitos desta ao bom nome, honra, consideração e saúde. iv. a pagar a quantia de €500,00 por cada dia de atraso na comunicação ao Banco de Portugal da retificação da informação referente à A. constante da CENTRAL DE RESPONSABILIDADES DE CRÉDITO, após o trânsito em julgado da sentença que a isso a condene, a título de sanção pecuniária compulsória. Julgando-se a reconvenção totalmente improcedente: ABSOLVE-SE a A. do pedido reconvencional” II. Ora, logo na contestação, o Banco Réu esclareceu que as dividas reportadas à Central das Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal correspondiam a responsabilidades transitadas do Banco 3..., S.A. no seguimento da medida de resolução que o BANCO DE PORTUGAL aplicou a essa instituição bancária, em concreto: - saldo negativo existente na conta de depósitos à ordem n.º ... (anterior conta ...) - € 7.778,44; e - crédito concedido ao abrigo da conta corrente n.º ... - € 10.000,00. III. Realizada a audiência de discussão e julgamento, veio a sentença em riste a concluir, depois da “análise conjunta e critica da prova documental junta aos autos, atendendo às declarações de parte da A., assim como aos depoimentos das testemunhas inquirida, tudo somado às regras da experiência, nos termos adiante explanados” que, relativamente ao pedido de i. reconhecer a inexistência das dívidas que comunicou ao Banco de Portugal, que o Banco, quanto ao saldo negativo existente na conta ..., tratando-se de um contrato de adesão, não logrou alegar, nem demonstrar, ter sido comunicado e menos ainda esclarecido à A. reconvinda, o clausulado, concluindo ainda o Tribunal não se estar perante uma típica situação de descoberto em conta uma vez que este configura uma concessão pontual, esporádica de créditos e, aqui, temos um avolumar da divida por conta de débitos que vão sendo levados a cabo pelo Banco. IV. Por outro lado, quanto à conta corrente n.º ..., entendeu o Tribunal que “não obstante se ter concluído um contrato de abertura de crédito na modalidade de conta corrente, ficou por demonstrar que a entidade bancária tivesse efetivamente disponibilizado o valor reportado à CRC e reclamado em sede de pedido reconvencional.” V. Não sendo provada a existência das dividas comunicadas, o Tribunal, relativamente ao pedido de ii. comunicar ao Banco de Portugal a retificação da informação relativa à A. constante da CENTRAL DE RESPONSABILIDADES DE CRÉDITO, no sentido da inexistência das dívidas aí aludidas e por aquela previamente comunicadas, veio a concluir que a mesma foi prestada de forma incorrecta, logo devendo ser rectificada, e, além do mais, “ofendeu a honra da A., fazendo-a passar por uma pessoa incumpridora das suas obrigações perante entidade bancária, reputando-a como uma pessoa com risco, o que não correspondia à verdade”. VI. Concluiu, assim, o Tribunal pela verificação cumulativa de todos os requisitos da responsabilidade civil – facto ilícito, culpa, dano e nexo entre o facto ilícito culposo e o dano – e, relativamente ao pedido iii. a pagar à A. a quantia de €5.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais causados por aquela em consequência da violação dos direitos desta ao bom nome, honra, consideração e saúde., condenou o Recorrente Banco 1..., S.A., após análise de alguns excertos jurisprudenciais, no pagamento à A. do valor pedido. VII. Por fim, relativamente ao pedido iv. a pagar a quantia de €500,00 por cada dia de atraso na comunicação ao Banco de Portugal da retificação da informação referente à A. constante da CENTRAL DE RESPONSABILIDADES DE CRÉDITO, após o trânsito em julgado da sentença que a isso a condene, a título de sanção pecuniária compulsória, o Tribunal condenou o Banco nos termos desse pedido. VIII. Ora, é com essa decisão proferida em primeira instância pelo Tribunal a quo que o Apelante não se conforma e não concorda pelos motivos que doravante se passam a expor, destinando-se, o presente recurso, a impugnar a sentença proferida pelo Tribunal de Primeira Instância e que, supra, se sintetizou, quer no que concerne à matéria factual dada como provada e não provada, quer quanto à aplicação de direito, pelo que o presente recurso terá por objecto, nos segmentos decisórios, a sentença in totum. IX. Está, pois, o Apelante convicto que Vossas Excelências, reapreciando a prova constante dos autos e subsumindo a mesma às normas legais aplicáveis, tudo no mais alto e ponderado critério, não deixarão de revogar a sentença recorrida. DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO X. Ora, resulta da sentença recorrida, da parte “Motivação” que a mesma resultou “(…) da análise conjunta e critica da prova documental junta aos autos, atendendo às declarações de parte da A., assim como aos depoimentos das testemunhas inquiridas, tudo somado às regras da experiência (…)”. XI. No entanto, atenta a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, conjugada com a documentação junta aos autos e as regras de distribuição do ónus da prova, entende o Apelante, sempre salvaguardado o devido respeito por opinião diversa, que não poderia o Tribunal a quo ter dado como provada a factualidade constante dos pontos 6, 7 e 13 de Factos provados, e como não provados os factos b), c) e d) de Factos não provados, devendo ainda ser aditado um outro facto à matéria. XII. De facto, no ponto 6. dos factos provados consta: “Até à data, a A. não recebeu quaisquer esclarecimentos da R. sobre a comunicação efetuada, e que se manteve, não obstante os pedidos efetuados no sentido de os obter” - Mas, da prova produzida não resulta que o Banco 1..., S.A. não tenha prestado qualquer esclarecimento, mas antes que, recebido o pedido da A., e uma vez que o mesmo estava feito em nome do seu marido, BB, o mesmo causou confusão nos serviços do Banco R. – cfr. depoimento da testemunha CC (depoimento gravado no programa Habilus Medio Studio com data de 22-03-2022 com inicio às 16:11:11 e fim 16:47:16), entre outras passagens transcritas nas alegações, a seguinte, ao minuto 5:35 “Fui verificar o que os clientes tinham reportado no banco de Portugal e porque é que precisavam de esclarecimentos ou tinham dúvidas. E, em relação ao cliente BB, eu não vi nenhum reporte em conjunto com a D.*ª AA, a não ser como fiador de um crédito habitação de terceiros.”. Assim, entende-se que relativamente ao ponto 6. apenas poderá ser dado como provado que “Até à data, a A. não recebeu quaisquer esclarecimentos da R. sobre a comunicação efectuada, e que se manteve, não obstante os pedidos efectuados no sentido de os obter, desde logo porquanto tais pedidos foram formulados também em nome do seu marido, BB ”. XIII. Mutatis mutandis, o mesmo se diga quanto ao facto provado n.º 7 que prevê que a “A A. não teve, nem antes nem depois da consulta por si efectuada, conhecimento de estar em situação de incumprimento por conta dos débitos comunicados ou qualquer outro.”, sendo que poderá ser dado como provado que “Até à data, a A. não recebeu quaisquer esclarecimentos da R. sobre a comunicação efectuada, e que se manteve, não obstante os pedidos efectuados no sentido de os obter, desde logo porquanto tais pedidos foram formulados em nome do seu marido, BB ”. XIV. Por seu turno, do facto provado sob n.º 13, resulta que “A R. sabe que ao comunicar tais informações à CRC, sem que as mesmas correspondam à realidade, põem em causa o seu bom nome, a sua honra e o seu bem estar da A.”, mas resulta do depoimento da testemunha CC (depoimento gravado no programa Habilus Medio Studio com data de 22-03-2022 com inicio às 16:11:11 e fim 16:47:16), os valores reportados foram já recebidos dos Banco 3..., não havendo qualquer evidencia de inexactidão na informação comunicada ao Banco de Portugal, pelo que o facto considerado provado sob n.º 13 deverá ser considerado como não provado dado que o R. nunca soube (nem tinha como saber) que as informações reportadas ao Banco de Portugal não estariam correctas, no que não se concede. XV. Por sua vez, na alínea b) Factos não provados consta como não provado que: “A R. tenha enviado à A. todos os extractos bancários com todas as informações”, mas, de facto, o Banco Apelante juntou aos autos todos os extractos bancários da conta, emitidos não apenas pelo Banco 3..., S.A., mas também por si, não havendo qualquer evidencia dos mesmos não terem chegado ao seu destino, pelo que tal factualidade se deverá ter como provada, pelo que deverá ser alterada a matéria no sentido de ser eliminado de b) Factos não Provados a factualidade em causa e ser dado como provado que a R. remeteu à A. todos os extractos bancários com todas as informações relativas aos saldos existentes (quer da Conta Corrente, quer da Conte de Depósitos à Ordem). XVI. Por sua vez, da alínea c) dos Factos não Provados, resulta que não foi provado que “As contas em causa tenham sido movimentadas pela sua titular, aqui A., e ou seu procurador e mediante autorização daquela, e na qual eram lançados, a crédito, todos os depósitos efectuados e, a débito, todos os pagamentos através dela processados”, mas, do depoimento da testemunha DD (depoimento gravado no programa Habilus Medio Studio com data de 22-03-2022 com inicio às 14:40:59 e fim 15:56:48), que se crê foi isento e imparcial e, bem assim, bastante claro, resulta o seguinte: ao minuto 21:25 e confrontado com Documento de fls. 38 refere, entre outras passagens, ao minuto 26h51 “a D.ª AA podia usar o crédito consoante as suas necessidades. Mas diga-me uma coisa isso encontra respaldo em algum documento, não é? É no extracto da conta de depósitos à ordem é no extracto da conta empréstimo? “O dinheiro passa sempre inevitavelmente pela conta de depósitos à ordem. Terá obrigatoriamente de passar pela conta depósitos à ordem. (…) 29h29 Todas as libertações e movimentações de dinheiro depois também tinham reflexo na conta à ordem. Com o seu depoimento, o qual revelou a sua grande experiencia e à vontade quanto ao produto em questão, veio, sim, a corroborar a prova documental que já se encontrava junta aos autos e, sobretudo, depois de lhe ser exibido o extracto bancário de 29/12/2006 fls. 132, ao minuto 41h25, confirmou “a linha de crédito estava concedida e estava em dívida eur 10.000,00 (…) no verso é visível a tal movimentação de eur 500,00 com data de 24/11 (data valor de 23/11) uma transferência para a conta corrente caucionada, Ccc, que é a conta de gestão de tesouraria”. XVII. E mesma testemunha falou ainda de outros extractos esclarecendo o Tribunal quanto à dinâmica do produto em questão – por exemplo, no extracto 30 de 2017 “, a dívida fica novamente em eur 10.000,00; ao minuto 46:58, a testemunha confirmou ao Tribunal que “Banco 3... transferiu um capital da Sra. D.ª AA de eur 10.000,00.”, isto quanto à conta corrente, e, ao minuto 54:09, quanto ao saldo devedor da conta à ordem, a testemunha esclareceu que “é la que cai tudo que tenha a ver com comissões, imposto de selo, comissão de gestão.” XVIII. Pergunta ainda Mma. Senhor Juiz, “Sabe o que é isso? Já percebi, não sabe!” assim desvalorizando o depoimento da testemunha em questão, não se percebendo o porque, mas logo, ao minuto 55:00, a testemunha DD esclareceu ainda que “todos os meses vão sendo debitadas comissão de gestão (15,80), penalizações, juros da conta, as comissões de gestão, os impostos. Respondi à Sra juiz “não sei” porque não sei o somatório desses montantes, mas está obrigatoriamente reflectido nos extractos.” – sublinhado nosso. XIX. Deverá, assim, passar a constar dos factos provados que as contas em causa foram movimentadas pela sua titular, aqui A., e ou seu procurador e mediante autorização daquela, e na qual eram lançados, a crédito, todos os depósitos efectuados e, a débito, todos os pagamentos através dela processados” XX. Por fim, no que diz ainda respeito ao factos não provados, da alínea d), resulta que não foi provado que “Por efeito de tais movimentações se tenha gerado: - na conta de depósito à ordem n.º ..., à data de 31.01.2020, um saldo devedor de € 7.778,44, correspondente ao crédito que o R./Reconvinte concedeu, assim, à A./Reconvinte e titular da conta; - conta corrente n.º ..., um saldo negativo de € 10.000,00”, mas, da prova documental junta aos autos, quer a que prova a formalização do contrato de abertura de conta e do contrato de conta corrente (nomeadamente documento 2 a 6 juntos com a contestação), quer os extractos bancários juntos com a contestação, mas também com o requerimento de 17/12/2020 (ref.ª 37498708), todos esses corroborados pelo depoimento das testemunhas CC e DD (nomeadamente nos excertos supra transcritos e que, aqui, se dão por integralmente reproduzidos), deveria o Tribunal a quo formar a sua convicção no sentido de se dar como provado que “Por efeito de tais movimentações se tenha gerado: - na conta de depósito à ordem n.º ..., à data de 31.01.2020, um saldo devedor de € 7.778,44, correspondente ao crédito que o R./Reconvinte concedeu, assim, à A./Reconvinte e titular da conta; - conta corrente n.º ..., um saldo negativo de € 10.000,00.” Já que, de facto, crê-se ter sido feita prova esclarecedora e segura do teor e do contexto dos documentos bancários oferecidos aos autos e de que, de facto, a A. é devedora das quantias comunicadas ao BANCO DE PORTUGAL. XXI.Sendo que o depoimento da testemunha EE, bancário no Banco 4... de ..., relativamente à tabela junta pelo Apelante em 17/12/2020, a fls. 123, (entradas e saídas de € 500,00), no sentido de poder haver situações em que trabalhadores do Banco de forma fraudulenta, usem as quantias e vão fazendo depósitos, para no fim do mês não entrar em crédito vencido, não passou de pura especulação, não havendo qualquer evidência de tal ter ocorrido neste caso concreto e, por seu turno, a testemunha DD esclareceu, com bastante rigor, como funcionavam estas contas correntes, tendo ainda exemplificado, nos extractos bancários, as afirmações que antes fizera. XXII. Por fim, considerando a documentação junta aos autos com o requerimento da A. de 2021-01-13 (com a ref.ª 37699948), em concreto a carta e correspondência da A..., em representação da sociedade B..., S.A. que comprou os créditos comunicado à CRC a “C..., S.A.” que, por sua vez, os havia adquirido ao Banco 1..., S.A., deverá ser aditada à matéria de facto dada como provada com relevância para a boa decisão da causa a seguinte factualidade: -Por contrato particular celebrado em 30/12/2020, a C..., S.A., que havia adquirido ao Banco 1..., S.A. as responsabilidades reportadas ao Banco de Portugal, cedeu-as à B..., S.A., sociedade esta representada por A.... XXIII. E, presente a informação da CRC do Banco de Portugal de Janeiro de 2021, junta pela A. aos autos em 30/03/2021 (requerimento de intervenção provocada com a ref.ª 38415938), de onde se extrai que a informação à CRC está a ser feita pela B..., S.A., deverá ser aditada à matéria de facto dada como provada com relevância para a boa decisão da causa a seguinte factualidade: - O reporte, junto da CRC do Banco de Portugal, das responsabilidades em causa nos presentes autos está ser feito pela B..., S.A XXIV. Assim, os concretos meios probatórios que, segundo o Recorrente, impõem decisão diversa da recorrida são os seguintes: - Teor documentos juntos: - com a contestação; - com o requerimento do R. de 17/12/2020; - com o requerimento da A. de 13/01/2021; e - com o requerimento de intervenção provocada feito pela A. de - Teor do depoimento da testemunha CC (depoimento gravado no programa Habilus Medio Studio com data de 22-03-2022 com inicio às 16:11:11 e fim 16:47:16); - Teor do depoimento da testemunha DD (depoimento gravado no programa Habilus Medio Studio com data de 22-03-2022 com inicio às 14:40:59 e fim 15:56:48); e - Regras de Repartição do ónus da prova XXV. Mais se concluindo que esses meios de prova mereceram credibilidade ao Tribunal e não foram ademais contrariados por qualquer outra prova que se produzisse, pelo que, decidindo de forma inversa da que vem expendida, ou seja, não considerando provada e não provada a matéria fáctica nos termos expostos, violou o Tribunal a quo o disposto nos artigos 414.º e 607.º, n.º 4, do C.P.C. e art. 342.º do Código Civil. DA APLICAÇÃO DO DIREITO XXVI. Alterada, como se espera, a matéria de facto dada como provada, como impõe a crítica ponderação da prova produzida nos autos, ou, mesmo que tal alteração não venha a ocorrer, crê o Apelante que outra decisão não poderá ser tomada que não seja a da total improcedência da ação, absolvendo-se o Réu Banco 1..., S.A. do pedido formulado pela A. e condenando-se esta no pedido reconvencional. XXVII. Ora, como resulta de V) Fundamentação de Direito, “Assim delimitado, temos, por um lado, que cabe à R. evidenciar o/s “facto/s jurídico/s” de onde emerge/s o/s seu/s poder/es de exigir o/s pagamento/s que efetiva e que a torna credora da A. e que suportarão (ou não) o seu pedido reconvencional, e se lhe impôs a comunicação da/s divida/s à CRC do Banco de Portugal, cabendo à A. alegar e provar os factos constitutivos dos seus pedidos de condenação.” XXVIII. Ora, concluiu a sentença recorrida que o Banco Apelante esclareceu que “esse saldo negativo resultava de juros, comissões ou outros encargos, e imposto de selo, cujo débito em com se encontrava autorizado pelo teor das condições gerais do contrato de abertura de conta junto aos autos – cfr. cláusula 7.ª do Doc. 2 e pelo preçário do Banco”, sem, todavia, alegar e provar que o clausulado contratual geral enunciado foi informado, comunicado e menos ainda esclarecido “pelo que não pode tal escrito regular contratualmente a relação jurídica em causa e menos ainda impor os seus efeitos à A.”, mas essa questão nunca foi suscitada nos autos, pelo que não podia o Tribunal decidir questão relativa ao cumprimento do dever de informação por parte do Banco Réu. XXIX. Não foi posta em causa pela A. que, sendo sua a letra e a assinatura, o Banco Apelante não tenha dado cumprimento a deveres de informação. XXX. Crê-se assim que, mal esteve a sentença recorrida, ao excluir do contrato a clausula 7.ª do Doc. 2 – que prevê o regime dos “DÉBITOS” na conta com fundamento na al. a) do art. 8.º da LCCG. XXXI. Pelo que vem exposto, crê o Recorrente que mal esteve o Tribunal a quo quando concluiu que não foi demonstrado o saldo negativo ou que não foi demonstrado o fundamento jurídico da sua existência. XXXII. Por outro lado, no que diz respeito ao contrato de abertura de crédito, concluiu a sentença recorrida que “não obstante se ter concluído um contrato de abertura de crédito na modalidade de conta corrente, ficou por demonstrar que a entidade bancária tivesse efetivamente disponibilizado o valor reportado à CRC e reclamado em sede de pedido reconvencional.” XXXIII. No entanto, a disponibilização do valor foi corroborada pelo depoimento do Funcionário Bancário DD (como se deixou vertido nas alegações relativas à matéria de facto). XXXIV. Pelo que vem exposto, crê o Recorrente que mal esteve o Tribunal a quo quando concluiu que não foi demonstrada a concessão do crédito previsto no contrato de abertura de crédito. XXXV. Por fim, quanto ao pedido i), lê-se na sentença “Aqui chegados temos que a R. não logrou demonstrar a factualidade constitutiva do direito que se arrogava, impondo-se a procedência do pedido de declaração de inexistência da divida pela mesma comunicada à CRC do BP e a improcedência total do pedido reconvencional” XXXVI. No entanto, crê o Apelante que, ainda que bastante clara e elucidativa, falha a sentença na aplicação do direito ao caso concreto. – DO PEDIDO DE RECONHECER A INEXISTENCIA DAS DIVIDAS QUE COMUNICOU AO BANCO DE PORTUGAL XXXVII. Entende o Banco Apelante ter feito prova que as dividas comunicadas ao BANCO DE PORTUGAL existem, pelo que deverá, assim, ser revogada a sentença recorrida na parte em que condenou o Réu Banco 1..., SA a reconhecer a inexistência das dividas que a R. comunicou ao Banco de Portugal e substituída por uma outra que reconheça as dividas e condene a A. no pedido reconvencional; - DA NÃO VERIFICAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS NECESSÁRIOS À VERIFICAÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL XXXVIII. Enquadrada a factualidade em causa nos presentes autos no instituto da responsabilidade civil extra-contratual, previsto nos artigos 483.º e seguintes do C.C., incumbindo à Apelada a prova de todos os pressupostos que geram a obrigação de indemnizar, em conformidade com o princípio geral do ónus da prova previsto no artº 342 nº 1 do C.P.C., desde já se adiante que se entende que, in casu, não há qualquer facto, nem por acção, nem por omissão, do R., que seja ilícito, o que, só por si, irremediavelmente, inviabiliza qualquer êxito na pretensão indemnizatória do Recorrido. XXXIX. Com efeito, crê o Apelante ter feito prova da existência das dividas reportadas ao BANCO DE PORTUGAL. XL. Mas, ainda que assim não se entenda, convirá também salientar que sempre terá que existir um nexo causal entre o facto e o dano, ou seja, um nexo de causalidade entre o facto praticado pelo R. e os danos sofrido pela A., de modo a poder afirmar-se, à luz do direito, que o dano é resultante da violação. XLI. De facto, os artigos 562.º a 572.º C.C. estabelecem o regime da obrigação de indemnizar seja qual for a fonte de onde ela proceda, sendo que, o artigo 562.º C.C. dispõe que a indemnização tem o objectivo de reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, acrescentando o artº 563.º do C.C., com a epígrafe “nexo de causalidade”, que a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão. XLII. Ora, in casu, não se pode afirmar que a conduta do R. foi ilícita e que os invocados danos não se teriam verificado caso o R. adoptasse um comportamento diferente, faltando, assim, vários requisitos da responsabilidade civil que permitia imputar ao Apelante a obrigação de indemnizar, nos termos do artº 483.º nº 1 do C.C.. XLIII. Ora, como resultou provado, factos n.º 18 e n.º 19.º “18.º A conta de depósitos à ordem titulada pela A., bem como a referida conta corrente, anteriormente abertas junto do Banco 3... transitaram, para a R. Banco 1..., S.A. na sequência da DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO BANCO DE PORTUGAL tomada em reunião extraordinária de 20/12/2015, clarificada pela DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO BANCO DE PORTUGAL de 04/01/2017. 19. A transferência desses contratos para o Banco R. no seguimento das DELIBERAÇÕES DO BANCO DE PORTUGAL foi acompanhada da migração informática das operações bancárias subjacentes, passando a R. a fazer as comunicações à CRC..” XLIV. Assim, crê que não se pode considerar que a conduta Apelante foi culposa ou, caso assim não se entenda, sempre a culpa é diminuta e deve ser mitigada porque a informação que passou a ser reportada transitou do Banco 3..., facto esse também corroborado pelo depoimento da testemunha CC XLV. Crendo-se, assim, que o Banco R. não praticou qualquer facto ilícito e/ou culposo, o que, desde logo, exclui a obrigação de indemnizar. XLVI. Mas, ainda que assim não se entenda, desde já se refira que os danos provados constituindo simples incómodos, não possuem dignidade, nem gravidade, para merecer tutela do direito, pelo que, nos termos do artigo 496.º a contrario, os mesmo não são indemnizáveis. - DO MONTANTE INDEMNIZATÓRIO XLVII. Não podendo, por fim, deixar de se referir que, em todo o caso, o valor de indemnização peticionado pela A. sempre se mostra manifestamente excessivo e desproporcionado, não se encontrando minimamente justificado e, XLVIII. considerando o grau de culpa do R. (diminuta porquanto o reporte, a ser inexacto, foi feito com as informações já recebidas do “Banco 3...”) e o bem violado/ilicitude, a compensação para os prejuízos causados a A., a encontrar nos termos dos artºs 483º e 484º, deverá ser de montante bem inferior ao arbitrado e nunca ser superior a € 1.000,00. XLIX. Deverá, assim, ser revogada a sentença recorrida na parte em que condenou o R. no pagamento de uma indemnização de € 5.000,00 para a A. e substituída por uma outra que reduza o valor em causa a quantia nunca superior a € 1.000,00. – DA SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA L. Por fim, o Tribunal a quo também julgou procedente o pedido formulado pela A. no sentido do Apelante ser condenado no pagamento, a titulo de sanção pecuniária compulsória, de €500,00 por cada dia de atraso na comunicação ao Banco de Portugal da retificação da informação referente à A. constante da CENTRAL DE RESPONSABILIDADES DE CRÉDITO, após o trânsito em julgado da sentença que a isso a condene. LI. Ora, presente o disposto no art. 829.º-A do C. Civil e uma vez que, como resulta dos autos, os créditos comunicados ao BANCO DE PORTUGAL foram cedidos – à C... – que, depois, os cedeu à B..., sendo que a cessão acarretou que também se tenha transferido para a cessionária do crédito a obrigação de fazer o reporte ao Banco de Portugal, pelo que as comunicações não estão a ser feitas pelo R. Banco 1..., S.A, nunca poderá ser aplicada ao Apelante tal sanção. LII. De facto, a Central de Responsabilidade de Crédito, segundo o consagrado no Decreto-Lei nº 204/2008, de 14 de Outubro, destina-se a reunir os elementos informativos respeitantes ao risco da concessão e aplicação de créditos, de que carecem as instituições de crédito e as sociedades financeiras, para avaliarem correctamente os riscos das suas operações. LIII. De acordo com o regime estabelecido no referido Diploma, a informação divulgada pelo Banco de Portugal, constante da Central de Responsabilidades de Crédito, é da responsabilidade das entidades que a tenham transmitido, cabendo exclusivamente a estas proceder à sua alteração ou rectificação (artº 3º nº 2 daquele DL 204/2008 de 14 de Outubro). LIV. Nessa senda, não está o Apelante em condições de cumprir com a sentença que ordena a rectificação da informação junto do Banco de Portugal porquanto, neste momento, não está a reportar qualquer responsabilidade imputada à A. AA e, nessa medida, deverá ser revogada a decisão. LV. A sentença recorrida violou, assim, o dispostos nos artigos 414.º, n.º 4, 614.º, ambos do CPC 486.º e 496.º do C.C., 829.º A do CC e o artº 3º nº 2 daquele DL 204/2008 de 14 de Outubro. LVI. Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., Meritíssimos Desembargadores, deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida, julgando improcedente a acção, absolvendo o Banco 1..., S.A. do pedido e condenando a A. no pedido reconvencional.» A autora não apresentou contra-alegações O recurso foi admitido (com subida nos próprios autos e efeito devolutivo) por despacho de 26.01.2023. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir. Objecto do recurso São as conclusões que o recorrente extrai da sua alegação, onde sintetiza os fundamentos do pedido, que recortam o thema decidendum (cfr. artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil) e, portanto, definem o âmbito objectivo do recurso, assim se fixando os limites do horizonte cognitivo do tribunal de recurso. Isto, naturalmente, sem prejuízo da apreciação de outras questões de conhecimento oficioso (uma vez cumprido o disposto no artigo 3.º, n.º 3 do mesmo compêndio normativo). Como bem se vê pelas conclusões, é a decisão sobre matéria de facto que a recorrente, primordialmente, visa na motivação do recurso, pois entende que o tribunal errou no julgamento efectuado dessa matéria. É no pressuposto de uma alteração da matéria de facto que pugna por uma solução jurídica oposta à que foi adoptada na sentença recorrida. São, assim, questões a apreciar e decidir: - se há erro de julgamento em matéria de facto; - impondo-se decisão diversa da recorrida, apreciar da repercussão de uma alteração factual na decisão de direito, concretamente: 1) se estão verificados todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual e, desde logo, saber se é possível imputar à ré a prática de um facto ilícito; 2) na afirmativa, se deve manter-se ou ser reduzido o montante fixado a título de indemnização por danos não patrimoniais; 3) se é sobre a ré que recai a obrigação de comunicar ao BP a rectificação de informações eventualmente incorrectas sobre responsabilidades de crédito da autora. II – Fundamentação 1. Fundamentos de facto Delimitado o thema decidendum, atentemos na factualidade que a primeira instância deu por assente, bem como a que considerou não provada. A) Factos provados 1. Em DEZ2018, a A., enquanto cliente do Banco 2..., S.A., viu-lhe recusada a atribuição de um livro de cheques pelo respetivo Balcão de .... 2. Como fundamento de recusa, foi-lhe transmitido que a A. tinha uma comunicação na CENTRAL DE RESPONSABILIDADES DE CRÉDITO DO BANCO DE PORTUGAL (CRC), o que impedia de a mesma ser titular de cheques enquanto não efetuasse a respetiva regularização. 3. Por consulta do seu MAPA DE RESPONSABILIDADES de 31-DEZ-2018, a A. verificou que constavam – entre outras em situação regular – duas comunicações da R./Banco 1..., S.A., onde se reportava: i) uma dívida de €4.275,30, com incumprimento desde 2016-12-23; ii) uma dívida de €10.000,00, sem data de incumprimento, com a referência “não aplicável”. 4. Consultado o MAPA DE RESPONSABILIDADES de 31-DEZ-2016, a A. verificou que tinha comunicada uma dívida, em situação “regular”, por “descoberto em depósito à ordem” no valor de €83,00, e que em Out. de 2019 contabilizava €6.870,28. 5. Em 2019-01-18, a A., através do seu mandatário, dirigiu um pedido de esclarecimento à R., onde solicitava informações sobre as referidas comunicações à CRC. 6. Até à data, a A. não recebeu quaisquer esclarecimentos da R. sobre a comunicação efetuada, e que se manteve, não obstante os pedidos efetuados no sentido de os obter. 7. A A. não teve, nem antes nem depois da consulta por si efetuada, conhecimento de estar em situação de incumprimento por conta dos débitos comunicados ou por qualquer outro. 8. Depois de ter tomado conhecimento desta situação, a A. ficou preocupada, angustiada e em sofrimento por ver o seu bom nome manchado. 9. Isto porque, à data com 73 anos, e tendo sido empresária mais de 20 anos, sempre foi tida como cumpridora das suas obrigações,… 10. ….sentindo-se vexada ao ser confrontada, no Banco 2... com a recusa da entrega dos cheques, assim como os pedidos de esclarecimentos efetuados. 11. Bem como se sente limitada e envergonhada porque ciente de que qualquer entidade bancária, financeira ou outra tem acesso às informações ali vertidas. 12. Sentindo-se com contínua preocupação no seio familiar enquanto não vir o seu nome limpo. 13. A R. sabe que ao comunicar tais informações à CRC, sem que as mesmas correspondam à realidade, põe em causa o seu bom nome, a sua honra e o seu bem estar da A.. 14. Aos 27/01/1993, a A. e BB solicitaram junto do Banco 3..., S.A. a abertura de uma conta de depósitos à ordem, conta essa à qual foi atribuído o n.º .... 15. Em 01/02/1999, a referida conta passou a ser titulada, única e exclusivamente, pela A. AA, ficando o referido BB, entretanto desvinculado da titularidade da conta, a intervir tão só na qualidade de Procurador. 16. Em 21/12/1998, por proposta contratual formulada pela A. em 21/12/1998 e aceite pelo referido Banco 3... em 01/02/1999, foi celebrado entre essas partes um contrato designado de Conta de Gestão de Tesouraria. 17. Associada a esse contrato, por proposta formulada e aceite pelas partes nas mesmas datas, foi formalizado um contrato designado de Abertura de Crédito no valor de Esc. 2.000 contos (dois milhões de escudos), contravalor em Euros €10.000,00. 18. A conta de depósitos à ordem titulada pela A., bem como a referida conta corrente, anteriormente abertas junto do Banco 3... transitaram, para a R. Banco 1..., S.A. na sequência da DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO BANCO DE PORTUGAL tomada em reunião extraordinária de 20/12/2015, clarificada pela DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO BANCO DE PORTUGAL de 04/01/2017. 19. A transferência desses contratos para o Banco R. no seguimento das DELIBERAÇÕES DO BANCO DE PORTUGAL foi acompanhada da migração informática das operações bancárias subjacentes, passando a R. a fazer as comunicações à CRC. 20. Por referência ao MAPA DE RESPONSABILIDADES de 31/12/2018, a dívida então reportada pelo valor de €4.275,30 corresponde a saldo negativo existente na conta de depósitos à ordem n.º ... que, no Banco R., foi renumerada para n.º ... e que, à data de 31/01/2020, apresentava um saldo negativo de €7.778,44. 21. Esta quantia englobava juros, imposto de selo, comissões e outros encargos. 22. A divida reportada pelo valor de €10.000,00 diz respeito ao crédito concedido ao abrigo do designado Contrato de Abertura de Crédito, sob a forma de Conta Corrente Caucionada, a qual assume, no Banco R., o n.º .... B) Factos não provados a) A R., incluindo o Balcão ..., tenha prestado sempre todos os esclarecimentos à A. quanto aos contratos celebrados com o Banco 3... e a sua transmissão para a R., assim como os valores em dívida e comunicados à CRC. b) A R. tenha enviado à A. todos os extratos bancários com todas as informações. c) As contas em causa tenham sido movimentadas pela sua titular, aqui A., e ou seu procurador e mediante autorização daquela, e na qual eram lançados, a crédito, todos os depósitos efetuados e, a débito, todos os pagamentos através dela processados. d) Por efeito de tais movimentações, se tenha gerado: - na conta de depósito à ordem n.º ..., à data de 31.01.2020, um saldo devedor de €7.778,44, correspondente ao crédito que o R./Reconvinte concedeu, assim, à A./Reconvinda e titular da conta; - conta corrente n.º ..., um saldo negativo de €10.000,00. * Impugnação da decisão sobre matéria de factoO recorrente que pretenda impugnar, com sucesso, a decisão sobre matéria de facto com fundamento em erro de julgamento, tem de cumprir (“sob pena de rejeição”)[3] vários ónus de especificação, previstos no artigo 640.º, n.º 1, do Código de Processo Civil. O ónus fundamental[4] consiste na especificação dos concretos pontos de facto que considera terem sido incorrectamente julgados pelo tribunal recorrido, obrigação que só se satisfaz com a indicação do facto individualizado que consta da sentença recorrida[5]. A delimitação precisa dos pontos de facto controvertidos constitui um elemento determinante na definição do objecto do recurso em matéria de facto e para a consequente possibilidade de intervenção do tribunal de recurso. O reexame da matéria de facto é, necessariamente, segmentado, tem em vista a correcção de pontuais erros de julgamento. Estes ónus de especificação, que a lei processual civil (em especial o citado artigo 640.º, n.º 1, do CPC) põe a cargo do recorrente, decorrem dos princípios, considerados estruturantes do processo civil, da cooperação e da lealdade e boa-fé processuais. Como é patente face ao teor das conclusões que atrás reproduzimos, a recorrente cumpriu o ónus primário ou fundamental de delimitação do objecto de recurso quanto à impugnação da matéria de facto, especificando os pontos de facto que considera mal julgados. Do elenco de factos provados, a recorrente considera incorrectamente julgados os seguintes (conclusão XI): «6. Até à data, a A. não recebeu quaisquer esclarecimentos da R. sobre a comunicação efetuada, e que se manteve, não obstante os pedidos efetuados no sentido de os obter. 7. A A. não teve, nem antes nem depois da consulta por si efetuada, conhecimento de estar em situação de incumprimento por conta dos débitos comunicados ou por qualquer outro. 13. A R. sabe que ao comunicar tais informações à CRC, sem que as mesmas correspondam à realidade, põe em causa o seu bom nome, a sua honra e o seu bem estar da A..» Cumprindo o ónus previsto no artigo 640, n.º 1, al c), do CPC, a recorrente manifesta o entendimento de que a decisão devia ser a de dar como provado o seguinte: “6. Até à data, a A. não recebeu quaisquer esclarecimentos da R. sobre a comunicação efectuada, e que se manteve, não obstante os pedidos efectuados no sentido de os obter, desde logo porquanto tais pedidos foram formulados também em nome do seu marido, BB”. «7. Até à data, a A. não recebeu quaisquer esclarecimentos da R. sobre a comunicação efectuada, e que se manteve, não obstante os pedidos efectuados no sentido de os obter, desde logo porquanto tais pedidos foram formulados também em nome do seu marido, BB”. 13. (Passar para os factos não provados) Do elenco de factos não provados, a recorrente entende que foram mal julgados os descritos nas alíneas b), c) e d), que devem passar para o aglomerado de factos provados com o seguinte conteúdo: «b) A R. remeteu à A. todos os extractos bancários com todas as informações relativas aos saldos existentes (quer da Conta Corrente, quer da Conta de Depósitos à Ordem)» «c) As contas em causa foram movimentadas pela sua titular, aqui A., e ou seu procurador e mediante autorização daquela, e na qual eram lançados, a crédito, todos os depósitos efectuados e, a débito, todos os pagamentos através dela processados» «d) Por efeito de tais movimentações se tenha gerado: - na conta de depósito à ordem n.º ..., à data de 31.01.2020, um saldo devedor de € 7.778,44, correspondente ao crédito que o R./Reconvinte concedeu, assim, à A./Reconvinte e titular da conta; - conta corrente n.º ..., um saldo negativo de € 10.000,00 “Já que, de facto, crê-se ter sido feita prova esclarecedora e segura do teor e do contexto dos documentos bancários oferecidos aos autos e de que, de facto, a A. é devedora das quantias comunicadas ao BANCO DE PORTUGAL.» Além disso, defende a recorrente que devem ser aditados ao elenco dos provados os seguintes factos (conclusões XXII e XXIII): «-Por contrato particular celebrado em 30/12/2020, a C..., S.A., que havia adquirido ao Banco 1..., S.A. as responsabilidades reportadas ao Banco de Portugal, cedeu-as à B..., S.A., sociedade esta representada por A...» «- O reporte, junto da CRC do Banco de Portugal, das responsabilidades em causa nos presentes autos está a ser feito pela B..., S.A.» Outro importante ónus que recai sobre o recorrente é o de indicar as concretas provas (constantes do processo ou que nele tenham sido registadas) que impõem decisão diversa da recorrida, ónus que se cumpre com a indicação do conteúdo específico do meio de prova ou de obtenção de prova que impõe outra decisão[6]. Além disso, o recorrente tem de expor a(s) razão(ões) por que, na sua avaliação, as provas impõem decisão diversa da recorrida. Não basta que indique provas que sugiram ou até sustentem decisão diversa; exige-se-lhe que relacione o conteúdo específico do meio de prova que impõe decisão diversa da recorrida com o facto individualizado que considera incorrectamente julgado e que explicite os motivos dessa imposição. É essa explicitação que constitui o cerne do dever de especificação. A reapreciação (parcelar) da matéria de facto requer (sempre nos limites traçados pelo objecto do recurso) a reponderação especificada, um juízo autónomo da força e compatibilidade probatória das provas que serviram de suporte à convicção, formada na primeira instância, relativamente aos factos impugnados, e por isso é fundamental que o recorrente especifique as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida. Como se alcança do que vimos de expor, os pontos 6 e 7 dizem respeito à falta de resposta do Banco recorrente ao pedido formulado pela autora através do seu advogado para que lhe fornecesse informações sobre as comunicações à CRC do BP, feitas pela ré “Banco 1..., S.A.”, que reportavam dívidas daquela em situação de incumprimento. A recorrente propõe que o ponto 7 passe a ser do mesmo teor que o ponto 6; portanto, uma repetição inútil. Quanto ao ponto 6, teria o mesmo conteúdo que foi fixado na decisão recorrida, mas com este acrescento: «desde logo porquanto tais pedidos foram formulados também em nome do seu marido, BB”. Ou seja, a recorrente não nega a falta do esclarecimento solicitado, mas quer que fique expressa a justificação que apresenta para essa omissão. Baseia-se, para tanto, no depoimento da testemunha CC, que afirmou que o pedido de esclarecimento foi feito em nome de BB (marido da autora) e por isso causou confusão. A verdade é que o pedido foi efectuado pelo advogado em nome da autora e do marido (como admite a recorrente) e por isso não havia qualquer motivo para confusão. Não há, pois, nenhuma razão válida para qualquer alteração aos pontos 6 e 7. Quanto ao ponto 13, cremos não estar equivocados se dissermos que a recorrente não pretende impugnar o facto de que uma comunicação à CRC do BP de responsabilidades de crédito em situação de incumprimento, sendo inverídica, põe em causa o bom nome, a reputação e a honra do cliente. O que a recorrente não aceita é que tenha cometido um ilícito civil ao efectuar aquelas comunicações, já por constituir o cumprimento de uma obrigação legal, já porque, na sua óptica, as comunicações são correctas, pois as dívidas da autora e o incumprimento eram uma realidade. Assim, o facto descrito sob o n.º 13 está estritamente ligado à questão fundamental de saber se, efectivamente, havia responsabilidades de crédito da autora em situação de incumprimento e a resposta a essa questão de facto passa por saber se, com a celebração do contrato de abertura de crédito, sob a forma de conta corrente caucionada, o “Banco 3...” entregou à autora a quantia de 2.000.000$00 (€ 10.000,00), que esta não reembolsou, pois só assim se compreende que a conta corrente n.º ... apresente um saldo negativo de €10.000,00 (facto que na primeira instância foi dado como não provado, mas que a recorrente insiste ser verdadeiro). Mas antes de abordarmos essa questão, cabe referir que, ao contrário do que afirma a recorrente, baseando-se no depoimento da referida CC, não há nenhuma evidência de que os valores reportados ao CRC «foram já recebidos do Banco 3...” e que a ré não tinha como saber que as informações reportadas não estavam correctas (conclusão XIV). Se assim era, se não podia saber que as informações não estavam correctas, como poderia ter tanta certeza de que o estavam (correctas)? No entanto, foi muito lesta a comunicar os alegados incumprimentos à CRC. A lisura de procedimentos e elementares regras de prudência impunham que, uma vez que as contas eram originariamente de outra instituição bancária e perante o avolumar do saldo devedor, antes de qualquer comunicação à CRC de um incumprimento do cliente, a ré procurasse contactar a autora e se inteirasse da situação para se certificar que havia responsabilidades de crédito em situação de incumprimento. Tanto mais que, do que é possível extrair dos documentos que constam do processo, designadamente dos mapas de responsabilidades, o “Banco 3...” não tinha reportado à CRC nenhuma situação dessas. Analisados os extractos apresentados pela ré, o que se verifica é que o último que teria sido emitido pelo “Banco 3...” é de 30.11.2015 (que coincide com a altura em que os activos sob gestão desta instituição de crédito, nomeadamente contas de depósitos e contas correntes, por deliberação do Banco de Portugal, transitam para o Banco 1...) e dele se extrai que o saldo da conta de depósitos à ordem (DO) apresentava, nessa data, saldo zero (e um saldo contabilístico de € 65,18). Depois, a partir de 31.12.2015, surgem os extractos emitidos pelo Banco 1... e os saldos continuam a ser os mesmos (com ligeira diferença quanto ao saldo contabilístico), o que, de algum modo, vem ao encontro das declarações da autora, segundo a qual há muito que teria encerrado essa conta (talvez mais propriamente, teria deixa de a movimentar). Sem motivo aparente, a situação altera-se a partir do extracto relativo ao período de 01.12.2016 a 31.12.2016 (documento junto com a contestação), surgindo um saldo devedor de € 82,58, que no mapa de responsabilidades de 31.12.2016, surge como “descoberto em depósito à ordem” no valor de € 83,00 (ponto 4 dos factos provados). E desse saldo devedor de umas dezenas de euros passa-se rapidamente para uma dívida de milhares de euros. No entanto, os extractos apresentados pela ré/recorrente evidenciam que a autora, titular da conta, não efectua sobre ela qualquer operação, a crédito ou a débito. Todos os movimentos são a débito, efectuados pelo Banco 1..., e são débitos de juros, de imposto de selo, de comissões, etc. Por isso, revela-se correcta a decisão de considerar não provado (alíneas c) e d) do elenco de factos não provados) que o saldo devedor de € 7.778,44 (à data de 31.01.2020) resultava de movimentos efectuados pela autora, ou pelo seu procurador, sobre essa conta de DO (que o Banco 1... renumerou, passando a ter o n.º ...). Aliás, vale a pena reproduzir aqui a súmula (feita na sentença recorrida) do depoimento da testemunha CC, empregada da ré que tinha a responsabilidade de fazer as comunicações à CRC do BP, para se aquilatar da ligeireza com que o assunto foi tratado: «Verificou, no que diz respeito à A., que a mesma tinha aberto conta Banco 3... em 1993, com uma alteração depois em 1998, ficando o BB como seu procurador e confirmou ter havido em 2016 uma migração tecnológica das responsabilidades do Banco 3... para a R.. Insistindo que a informação que foi reportada ao CRC estava correta e não havia nada a corrigir, limitou-se a dizer que, no momento da análise, tal era para si esclarecedor assim acontecer, mas que não viu os extratos, não sabe a que respeita o valor €4.275,30, nem o que o compunha, não fez a análise dos extratos, não tinha de o fazer, não lhe foi pedido, só viu que o saldo correspondia ao reporte, não analisou o conteúdo. Enfim, esta testemunha não sabia dizer como se chegou a esse valor nem tão pouco sabia se o cliente recebeu os extratos…. Afirmou que havia também uma linha de crédito, conta corrente associada à conta bancária – mas que não havia créditos vencidos. Apesar de ter apresentado um depoimento perentório de a A. ter uma divida digna de reporte ao CRC do BP, não se compreendeu em que elementos substanciais, que não apenas a informação conclusiva procedimental de uma migração informática, se baseou para assim concluir não sabendo também o que se tratava afinal a quantia que tinha sido atribuída à A. como devedora significativa para estar lançada na “Lista” objeto de reporte.» Quanto à responsabilidade de crédito do montante de € 10.000,00, ainda ao contrário do que defende a recorrente, baseando-se no depoimento da testemunha DD, nada permite afirmar que se trata de um crédito vencido e não satisfeito. De resto, a própria recorrente acaba por admitir isso mesmo quando veio responder ao convite, feito por despacho de 29.10.2020, para que concretizasse os factos que deram lugar ao reclamado crédito de €10.000,00 referente ao contrato de abertura de crédito sob a forma de conta corrente caucionada com o n.º ..., designadamente, a/s data/s: ● em que a quantia em causa foi disponibilizada; ● em que foi utilizada; ●em que foi efetuada a interpelação para a sua devolução. ● Juntar prova documental do que afirmar. Que entre o “Banco 3...” e a autora foram celebrados, em Fevereiro de 1999, de forma associada, um “CONTRATO DE CONTA DE GESTÃO DE TESOURARIA” e um “CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO”, sob a forma de Conta Corrente Caucionada, é ponto que não suscita qualquer controvérsia. Pelo referido contrato, o “Banco 3...” concedeu à autora uma abertura de crédito até ao limite de 2.000.000$00 (€ 10.000,00). A abertura de crédito integra-se na categoria dos chamados negócios especiais de crédito bancário, sedimentados nos usos e nas cláusulas contratuais gerais. Trata-se de um contrato pelo qual uma das partes (normalmente um Banco) se obriga a conceder a outra (creditada) crédito até certo limite, em determinadas condições, cabendo à creditada decidir se, quando e em que termos irá utilizar o benefício[7]. Trata-se de um contrato bancário nominado[8], mas legalmente atípico, e consensual, pois fica perfeito com o acordo entre as partes, sem necessidade de qualquer entrega, ao contrário do que sucede com o mútuo clássico[9]. Com a abertura de crédito, o cliente bancário fica com uma disponibilidade que pode movimentar, mediante pedido escrito dirigido por fax ou por carta ao banqueiro ou automaticamente, sacando, por exemplo, a descoberto sobre uma conta de depósito à ordem, anexa à abertura de crédito. A abertura de crédito pode ser simples ou em conta corrente. No primeiro caso, o crédito disponibilizado pode ser usado uma vez. No segundo, o cliente pode sacar diversas vezes sobre o crédito, solvendo as parcelas de que não necessite, numa conta corrente com o banqueiro. Pode ser garantida, quando seja acompanhada de uma garantia, pessoal ou real, e a descoberto, na hipótese inversa. Como se pode constatar pelo teor dos escritos que formalizaram os aludidos contratos, o contrato/conta de gestão de tesouraria (CGT) apresenta-se como uma conta de depósitos à ordem, associada a um plano de aplicações financeiras e, eventualmente, um contrato de abertura de crédito, sob a forma de conta corrente caucionada. A gestão dessa conta é feita pelo próprio banco em função das situações de liquidez que venha a registar e das necessidades de tesouraria do titular. Como referiu a ré/recorrente em resposta ao aludido convite, na cláusula 3.ª estipulou-se que “(…) o crédito disponibilizado só poderá ser mobilizado, total ou parcialmente, pelos Clientes mediante a utilização das seguintes linhas de crédito: (…) a) Conta Corrente Caucionada” E, nos termos da cláusula 3.2, nesse caso “A mobilização do crédito disponibilizado pela linha da Conta Corrente Caucionada deverá efectuar-se por valores iguais ou múltiplos de 100.000$00 (Cem mil Escudos), os quais serão creditados na CGT (…)”. É, pois, perfeitamente claro que o “Banco 3...” não entregou à autora a quantia de 2.000.000$00 (€ 10.000,00), ficando esta com uma dívida de valor correspondente que teria de solver, mas que disponibilizou esse montante como crédito que a cliente poderia utilizar ou não, total ou parcialmente, conforme as suas necessidades de tesouraria. Competia, então, à ré/recorrente alegar e demonstrar que a autora efectivamente utilizou (todo) esse valor e não fez o reembolso. O convite, nesse sentido, contido no despacho de 29.10.2020 era de meridiana clareza. No entanto, a recorrente veio dizer que não lhe foi possível «obter toda a movimentação da Conta de Gestão de Tesouraria/Conta Corrente Caucionada n.º ... (entretanto renumerada para o n.º ...)». O que se pode retirar dos extractos que a recorrente fez chegar aos autos é que, pelo menos, desde que ocorreu a migração das contas do “Banco 3...” para o Banco 1..., não houve nenhuma utilização dessa disponibilidade de crédito. Enquanto a conta esteve sedeada no “Banco 3...”, a autora terá feito uso do crédito disponibilizado (sacando os valores – de € 500,00 ou múltiplos deste montante - indicados na coluna denominada “desc. autorizado” ou “descoberto autorizado”), mas não é possível saber (nem a recorrente concretizou) qual o valor utilizado e o que foi reembolsado. A testemunha DD não disse, nem podia dizer, mais que isso. Como se assinala na motivação da decisão recorrida «Perguntado expressamente, se concedido o crédito se sabia se a A. usou esse dinheiro o mesmo respondeu negativamente e informou que só conseguiram extratos até cinco anos antes» e, ainda, que «Concedeu que não podia confirmar se os extratos tinham sido enviados assim como não podia atestar que o crédito de €10.000,00 tinha sido usado pela A.». Por isso a recorrente não podia ter comunicado à CRC um incumprimento de responsabilidades de crédito sem que antes se certificasse que, realmente, ocorria tal incumprimento, mas foi exactamente isso que fez. * Foquemo-nos agora na pretendida ampliação da matéria de facto, recordando que a recorrente pretende que sejam aditados os seguintes factos:«-Por contrato particular celebrado em 30/12/2020, a C..., S.A., que havia adquirido ao Banco 1..., S.A. as responsabilidades reportadas ao Banco de Portugal, cedeu-as à B..., S.A., sociedade esta representada por A...» «- O reporte, junto da CRC do Banco de Portugal, das responsabilidades em causa nos presentes autos está ser feito pela B..., S.A.» Nos termos do disposto na alínea c) (trecho final) do n.º 2 do artigo 662.º do CPC, a Relação determina a ampliação da decisão da matéria de facto sempre que a considere indispensável, ou seja, sempre que à luz das diversas soluções plausíveis das questões de direito e tendo em conta o objeto do recurso, determinado facto ou acervo factual seja necessário para dar suporte a uma dessas soluções e isso independentemente da solução perfilhada pelo Tribunal da Relação, havendo lugar à anulação da decisão em que se verifique a omissão da matéria objeto de ampliação sempre que não constem do processo todos os elementos que nos termos do n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil permitam a ampliação da decisão da matéria de facto[10]. Se bem interpretamos a pretensão da recorrente, a ampliação por que pugna justificar-se-ia porque não está «em condições de cumprir com a sentença que ordena a rectificação da informação junto do Banco de Portugal porquanto, neste momento, não está a reportar qualquer responsabilidade imputada à A.» (conclusão LIV). Mostra-se documentalmente provada a cessão do alegado crédito da recorrente a “C..., S.A.” (que, por seu turno, teria cedido o mesmo crédito a “B..., S.A.”). No entanto, como bem refere a recorrente (conclusão LIII), «a informação divulgada pelo Banco de Portugal, constante da Central de Responsabilidades de Crédito, é da responsabilidade das entidades que a tenham transmitido, cabendo exclusivamente a estas proceder à sua alteração ou rectificação (artº 3º nº 2 daquele DL 204/2008 de 14 de Outubro)» e foi a recorrente quem comunicou àquela “Central” o suposto incumprimento de responsabilidades da autora. Por outro lado, nem a “C..., S.A.”, nem a “B..., S.A.” são partes neste processo e por isso o tribunal não pode determinar que sejam estas a rectificar a informação transmitida. Se depois de a recorrente proceder à retificação, persistir a situação, ou seja, se alguma destas sociedades financeiras continuar a transmitir informações não verdadeiras, caberá à autora tomar as medidas que entender necessárias e adequadas. Por isso, ressalvado o devido respeito por entendimento diverso, consideramos inútil o aditamento daqueles factos, pois não teriam qualquer repercussão na decisão de direito. Concluindo, improcede totalmente a impugnação da decisão sobre matéria de facto. 2. Fundamentos de direito Sustenta a recorrente que mal andou o Tribunal a quo quando concluiu que não foi demonstrado o saldo negativo ou que não foi demonstrado o fundamento jurídico da sua existência, querendo, certamente, referir-se à conta de depósitos à ordem. Esteve, ainda, mal o tribunal ao concluir que, «não obstante se ter concluído um contrato de abertura de crédito na modalidade de conta corrente, ficou por demonstrar que a entidade bancária tivesse efetivamente disponibilizado o valor reportado à CRC e reclamado em sede de pedido reconvencional.» Por último, o tribunal teria, ainda, falhado por ter considerado que a R. não logrou demonstrar a factualidade constitutiva do direito que se arrogava, «impondo-se a procedência do pedido de declaração de inexistência da divida pela mesma comunicada à CRC do BP e a improcedência total do pedido reconvencional». O inconformismo do Banco 1... relativamente à decisão destas questões de direito tem subjacente a procedência da impugnação em matéria de facto, mas já concluímos que a razão não está com a recorrente. Era fundamental que a recorrente lograsse inverter a decisão quanto aos factos descritos nas alíneas c) e d) do elenco dos não provados, mas as provas que indicou não impõem, sequer sugerem, decisão diversa. Por outro lado, a recorrente alega que não se verificam os pressupostos da obrigação de indemnizar e, desde logo, a prática de um facto ilícito. Havendo responsabilidade civil, a consequência fundamental é o nascimento da obrigação de indemnizar a cargo do lesante e é no normativo dos artigos 483.º e segs. e 562.º e segs. do Código Civil que devem ser buscados o suporte legal da indemnização reparatória/compensatória e os critérios da sua determinação. Na responsabilidade civil aquiliana a obrigação de indemnizar (ou o correspondente direito à indemnização) depende da verificação de vários pressupostos de facto que constituem a causa de pedir da respectiva acção indemnizatória. Concretamente, no âmbito da responsabilidade civil subjectiva, a obrigação de indemnizar só surge se o autor alegar e provar os factos em que se traduzem os pressupostos de que depende a aplicação do citado art.º 483.º do Cód. Civil: prática de um acto ilícito, culpa do lesante, existência de danos indemnizáveis e nexo de causalidade adequada entre aquele e estes. Em primeiro lugar, é necessário que o agente pratique um facto ilícito que, em regra, se traduz numa acção, mas pode manifestar-se através de uma omissão. A ré rejeita que tenha praticado qualquer ilícito porque se limitou a cumprir a obrigação legal que recai sobre as instituições bancárias de enviar ao Banco de Portugal a informação referente aos saldos, que se registaram no final de cada mês, das operações de crédito realizadas com particulares, empresas ou outras entidades, designadamente com a autora (com a particularidade de, neste caso, se tratar de contas que transitaram do “Banco 3...” para a sua esfera de actividade). Mas o tratar-se do cumprimento de uma obrigação legal não desresponsabiliza os bancos pelas comunicações efectuadas, pois que, como se ponderou no acórdão da Relação de Guimarães de 25.10.2018 (processo n.º 900/17.9T8GMR.G1), «a comunicação de uma incorrecta informação à Central de Responsabilidades de Crédito ofende a honra e o bom nome da pessoa visada na comunicação». Ora, a verdade é que a recorrente comunicou àquela CRC que a autora estava em situação de incumprimento de responsabilidades de crédito, mas não provou que essa informação fosse correcta, que realmente a autora fosse devedora dos montantes correspondentes aos saldos negativos daquelas contas e é essa incorrecção que a faz cair nas malhas do ilícito. Como bem refere a sentença recorrida, aludindo à conta de depósitos à ordem, «a R. não alegou a factualidade necessária para compreender de onde emerge este apontado saldo devedor que vai crescendo sem se saber qual a sua concreta data e origem». E quanto à abertura de crédito em conta corrente caucionada, só não é rigorosa a afirmação de que «ficou por demonstrar que a entidade bancária tivesse efetivamente disponibilizado o valor reportado à CRC e reclamado em sede de pedido reconvencional», pois o que não está provado é a efectiva utilização pela creditada (autora), em seu benefício, do montante (€ 10 000,00) do crédito disponibilizado ou, talvez mais precisamente, que valores foram mobilizados e não foram reembolsados para que se possa dizer que a cliente tem uma responsabilidade de crédito incumprida, justificativa da comunicação à CRC do BP feita pela recorrente. Mas, além de negar a prática de qualquer facto ilícito, a recorrente também rejeita que tenha agido culposamente, escudando-se na circunstância de a informação que passou a ser comunicada (à CRC) transitou do “Banco 3...” na sequência da migração informática das operações bancárias subjacentes à transferência das contas deliberada pelo Conselho de Administração do BP de 20.12.2015. Fica, no entanto, por explicar porque é que, antes dessa migração e dessa transferência, não foi reportada qualquer situação de incumprimento e imediatamente após essa transição já existem incumprimentos. Como se enfatizou no acórdão da Relação de Coimbra de 28.01.2014 (processo n.º 1776/11.5 T2AVR.C1), na esteira do acórdão do STJ de 19.05.2011, «O automatismo dessa comunicação e as consequências que dela nascem para o cliente impõem um reforço do cuidado e da diligência por forma a evitar o erro e as suas consequências». Como, também, já se assinalou, havia uma razão acrescida para que o Banco 1... fosse especialmente prudente no conteúdo das comunicações a efectuar à CRC relativamente aos clientes que transitaram do “Banco 3...” e o mínimo que se lhe exigia, perante situações de aparente incumprimento, era que os contactasse e procurasse esclarecer e resolver essas situações. No entanto, a recorrente não teve esse cuidado mínimo, pois limitou-se a olhar para o saldo devedor (que estava em galopante aumento), como admitiu a testemunha CC. A actuação da recorrente é passível de um juízo de censura porque não agiu como podia e lhe era exigível que actuasse no caso concreto, evidenciando grave negligência. Os clientes de uma instituição bancária têm o direito de esperar que esta actue com zelo e diligência e que esteja devidamente apetrechada para evitar erros como o cometido pela recorrente. Também quanto a este aspecto, não podemos deixar de amparar a posição da primeira instância expressa neste trecho da fundamentação.: «Cabia à entidade bancária adquirente, através dos meios que tem ao seu dispor, verificar em substância da existência do que a transposição eletrónica lhe dava conta, e refletir se o montante era devido e a que título, sendo reprovável que se tivesse limitado a inscrever a informação sem o fazer de forma apoiada e consistente com o enquadramento jurídico de centralização de riscos de crédito, não se sabendo até à presente data sequer como é que um valor de €83,00 dito em situação regular em Dez de 2016, se transforma em Dez de 2018 numa dívida, afinal, com relevo em termos de risco, no montante de €4.275,30, com registo de incumprimento desde 23/12/2016! E diz-se assim porque foi evidente que a R., através do Balcão a que a A. se dirigiu não soube dizer o que se tratavam as dívidas lançadas, nem na migração e comunicação se fez a análise aprofundada da situação, nem se demonstrou que ou de que modo o tivesse efetuado para justificar esse lançamento e comunicação para a “Lista dos Maus Pagadores”». Questiona, ainda, a recorrente a verificação de nexo de causalidade entre a sua actuação e os danos (morais) sofridos pela autora, pois não é possível afirmar que «os danos não se teriam verificado caso o R. adoptasse um comportamento diferente» (conclusão XLII). Ressalvado o devido por tal entendimento, o que se afigura manifesto é que os danos sofridos pela autora (vexame quando, no Banco 2..., viu ser-lhe recusada a entrega de cheques por ter informação negativa no BP; preocupação e angústia por ver o seu nome manchado; vergonha por estar ciente que qualquer instituição bancária ou financeira tem acesso às informações que a recorrente fez chegar à CRC) são causa directa e necessária da actuação incorrecta da recorrente. Nesta matéria, a orientação prevalecente na jurisprudência é a da causalidade adequada, estabilizada em torno de fórmulas deste tipo: «É necessário, portanto, não só que o facto tenha sido, em concreto, condição “sine qua non” do dano, mas também que constitua, em abstracto, segundo o curso normal das coisas, causa adequada à sua produção». Não é, essencialmente, diversa a denominada formulação negativa da causalidade, segundo a qual «o facto que actuou como condição do dano só deixará de ser considerado como causa adequada se, dada a sua natureza geral, se mostrar de todo em todo indiferente (gleichgültig) para a verificação do dano, tendo-o provocado só por virtude das circunstâncias excepcionais, anormais, extraordinárias ou anómalas, que intercederam no caso concreto»[11]. Já o Professor A. Menezes Cordeiro (in Tratado de Direito Civil Português, II, Direito das Obrigações, Tomo III, Almedina, 2010, págs. 537 e segs) faz notar que, como «alternativa clara à fórmula da adequação», se tem vindo a firmar a teoria do escopo da norma violada, segundo a qual «a causalidade juridicamente relevante verifica-se em relação aos danos causados pelo facto, em termos de conditio sine qua non, nos bens tutelados pela norma jurídica violada». Seja qual for a teoria e a fórmula que se adopte, é de primeira evidência que ocorre o necessário laço causal entre os actos praticados (comunicações à CRC de incumprimentos de responsabilidades da autora que não estão devidamente comprovados) e os prejuízos invocados pela autora e dados como provados. Como se decidiu no acórdão da Relação de Guimarães de 25.10.2018, «a comunicação de uma incorrecta informação à Central de Responsabilidades de Crédito ofende a honra e o bom nome da pessoa visada na comunicação». Mas, na óptica da recorrente, tudo isso não passa de simples incómodos que não merecem a tutela do direito, logo, insusceptíveis de fundamentar o direito a uma indemnização (conclusão XLVI), no que, está bem de ver, não a acompanhamos. Não é por acaso que ter informações negativas no BP é, comummente, referido como constar da “lista negra”. É, na verdade, um ferrete, uma nódoa moral indelével, estigmatiza e só não se sente ofendido, envergonhado e humilhado quem é, realmente, incumpridor. Não era o caso da autora, que sempre cumpriu as suas obrigações no exercício da actividade empresarial a que se dedicou durante 20 anos, honrando os compromissos assumidos, nomeadamente com a banca. Mas a irresignação da recorrente não se ficou por aqui, pois insurge-se contra o montante indemnizatório fixado na primeira instância (€ 5 000,00) e pretende a sua redução para € 1 000,00. É o dano e a sua gravidade, revelada na amplitude e intensidade do sofrimento suportado pela vítima o parâmetro fundamental a considerar, pois é precisamente esse sofrimento que se pretende compensar através da indemnização. A compensação deve, então, ser proporcional à gravidade do dano, apreciada objectivamente, «não sendo de acolher pretensões manifestamente excessivas, mas também excluindo tendências banalizadoras dos valores e interesses morais, como a saúde, a integridade física, o bem-estar, etc., que se pretende defender»[12]. Não podemos menosprezar, como faz a recorrente, a gravidade das consequências para a autora da sua actuação censurável. É fácil imaginar quão ultrajante foi para a autora chegar a um balcão do Banco 2... e ser confrontada com uma informação que a apontava como “caloteira” (perdoe-se-nos o plebeísmo), ela que sempre terá pautado o seu comportamento pela honestidade e pelo cumprimento escrupuloso das suas obrigações. A ter em consideração, também, a persistência da situação, que dura há vários anos, pois a recorrente ainda não rectificou a informação incorrecta que transmitiu à CRC do BP. Também não pode passar em claro a perspectiva de a autora ter de suportar este calvário ainda por bastante tempo. Isto porque a recorrente mantém, em sede de recurso, a sua pretensão de que a recorrida seja condenada, em via de reconvenção, a pagar-lhe a quantia de € 17 778,44 e juros de mora por aquilo que alega serem créditos vencidos e não satisfeitos, apesar de ter cedido esses alegados créditos, estando a cessionária (ou uma das cessionárias) a exigir à autora o pagamento do mesmo crédito. Na sentença recorrida são indicadas várias decisões de tribunais superiores em que, por situações com evidentes afinidades com a presente, foram arbitradas indemnizações de montantes bem superiores. Assim, o montante de € 5.000,00, se peca, é pela sua modéstia. * A recorrente insurge-se, por último, contra a aplicação de sanção pecuniária compulsória, argumentando que, tendo cedido os créditos comunicados ao BP à “C..., S.A.”, que, por seu turno, os cedeu à “B...”, o que acarretou que também se tenha transferido para a cessionária a obrigação de fazer o reporte ao Banco de Portugal, nunca poderá ser-lhe aplicada tal sanção (conclusão LI).No entanto, já concluímos que é à recorrente que cabe proceder à rectificação da informação incorrecta transmitida à CRC, como esta expressamente reconhece (conclusão LIII), pelo que é de manter aquela sanção. Improcedem, assim, todas as conclusões do recurso. III – Dispositivo Por tudo o exposto, acordam os juízes desta 5.ª Secção Judicial (3.ª Secção Cível) do Tribunal da Relação do Porto em julgar improcedente a apelação de Banco 1..., S.A.” e, em consequência, confirmar a decisão recorrida. As custas do recurso ficam a cargo doa recorrente (artigo 527.º, n.os 1 e 2, do Cód. Processo Civil). (Processado e revisto pelo primeiro signatário). Porto, 26/6/2023 Joaquim Moura Ana Paula Amorim Manuel Domingos Fernandes __________________ [1] Segue-se, com alterações, o relatório da sentença recorrida. [2] Notificada às partes mediante expediente elctrónico elaborado em 01.09.2022 [3] Como se decidiu no Ac. STJ de 30.06.2020 (processo n.º 1008/08.3TBSI.E1.S1), «III - A cominação para a falta de especificações constantes das als. a), b) e c) do n.º 1 do art. 640.º do CPC é a rejeição da impugnação da decisão de facto, não havendo lugar a qualquer despacho de aperfeiçoamento nos termos do n.º 3 do art. 639.º do CPC». [4] No Ac. STJ de 16.12.2020 (processo n.º 8640/18.5YIPRT.C1.S1) fala-se em dois ónus que recaem sobre o recorrente que impugna a decisão sobre matéria de facto: «Um ónus principal, consistente na delimitação do objecto da impugnação (indicação dos pontos de facto que considera incorrectamente julgados) e na fundamentação desse erro (com indicação dos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação que impunham decisão diversa e o sentido dessa decisão) – Art.º 640º nº 1 do CPC; e Um ónus secundário, consistente na indicação exacta das passagens relevantes dos depoimentos gravados – art.º 640º nº 2 al. a) do CPC.». [5] Sendo certo que, em casos-limite, a impugnação pode implicar toda a matéria de facto, nem por isso o recorrente está desobrigado de especificar os concretos pontos de facto por cuja alteração se bate (cfr. A.S. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5.ª edição, pág. 163, em nota de pé de página). Esta especificação serve para delimitar o objecto do recurso e por isso tem de constar das conclusões. [6] O Sr. Conselheiro Abrantes Geraldes (ob. cit., pág. 170, nota de pé de página) afirma ser «infundada a rejeição do recurso da matéria de facto com fundamento na falta de indicação, nas conclusões, dos meios probatórios ou dos segmentos da gravação em que o recorrente se funda. O cumprimento desses ónus no segmento da motivação parece suficiente para que a impugnação da decisão da matéria de facto ultrapasse a fase liminar, passando para a apreciação do respectivo mérito», citando jurisprudência do STJ nesse sentido. No Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, pág. 771, de que é autor em conjunto com Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, precisa-se que «é objecto de debate saber se os requisitos do ónus impugnatório devem figurar apenas no corpo das alegações ou se também devem ser levados às conclusões, sob pena de rejeição do recurso» e anota-se que «o Supremo tem vindo a sedimentar como predominante o entendimento de que as conclusões não têm de reproduzir (obviamente) todos os elementos do corpo das alegações e, mais concretamente, que a especificação dos meios de prova, a indicação das passagens das gravações e mesmo as respostas pretendidas não têm de constar das conclusões, diversamente do que sucede, por razões de objectividade e de certeza, com os concretos pontos de facto sobre que incide a impugnação». [7] Cfr. Professor Antunes Varela, Rev. Leg. e Jurisp., 114.º, 115 [8] A abertura de crédito vem referida no art.º 362.º do Cód. Comercial como uma operação de banco. [9] Prof. Menezes Cordeiro, “Manual de Direito Bancário”, 541 que, neste ponto, vamos seguir de perto. [10] Assim, A. S. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª edição, Almedina, pág. 307, que adverte: «Não basta que os factos tenham conexão com alguma “das soluções plausíveis da questão de direito”. Considerando a fase em que agora nos encontramos, a Relação deve ponderar o enquadramento jurídico em face do objecto do recurso ou de outros elementos a que oficiosamente puder atender, contando também com o que possa esperar-se de uma eventual intervenção do Supremo ao abrigo do disposto no art. 682.º, n.º 3.» [11] Professor Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I, 6ª Edição, Almedina, pág. 861. [12] Ac. desta Relação de 17.09.2009, proferido no processo n.º 1943/05.0TJVNF.P1, acessível em www.dgsi.pt |