Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | ISABEL FERREIRA | ||
Descritores: | PROCESSO DE INVENTÁRIO NULIDADES DE SENTENÇA CASO JULGADO FORMAL PASSIVO RELAÇÃO DE BENS RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS REMESSA PARA OS MEIOS COMUNS | ||
Nº do Documento: | RP2024062020941/20.8T8PRT-A.P1 | ||
Data do Acordão: | 06/20/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
Sumário: | I – As causas de nulidade da sentença não incluem o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável ou o erro na construção do silogismo judiciário. II – O caso julgado formal pressupõe que exista uma efectiva apreciação de determinada questão processual e a contradição entre julgados pressupõe que as duas decisões se pronunciem sobre a mesma concreta questão processual. III – O despacho genérico de admissão de provas não faz caso julgado formal no processo. IV – Não se pronuncia directamente sobre a prova requerida o despacho que, depois de admitida prova a ser produzida, considerou o tribunal, melhor apreciada a questão, em posição de decidir a reclamação à relação de bens, o que fez, com o que ficou naturalmente prejudicada a produção de prova, o que se declarou. V – Não sendo relacionado pelo cabeça-de-casal, o passivo pode ser reclamado pelos credores respectivos até à conferência de interessados, caso em que a apreciação do mesmo poderá ter lugar nesta conferência, em conformidade com o disposto no artigo 1111.º, n.º 3, do Código de Processo Civil. VI – Não deve ser conhecida no inventário, mas em acção comum, a alegação de que o negócio de partilha de um único bem (um imóvel) pertencente à herança da inventariada mulher, por todos os herdeiros (tendo o bem sido adjudicado a uma das herdeiras e os restantes recebido tornas), não corresponde à realidade, pois o que se quis fazer foi uma partilha das duas heranças, dos dois inventariados, relativamente apenas a uma das herdeiras, a qual foi inteirada com o referido imóvel e ainda um outro (que não estava registado em nome de qualquer dos inventariados, e relativamente ao qual existe uma escritura de venda, anterior, em que a vendedora é uma pessoa diferente dos inventariados), tendo ficado completamente preenchido o seu quinhão, até porque não pagou quaisquer tornas. | ||
Reclamações: | |||
Decisão Texto Integral: | Processo nº 20941/20.8T8PRT-A.P1 (Comarca do Porto – Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia – Juiz 4) Relatora: Isabel Rebelo Ferreira 1º Adjunto: Ernesto Nascimento 2º Adjunto: António Paulo Vasconcelos * Acordam no Tribunal da Relação do Porto:I – AA requereu, no Cartório Notarial de BB, no Porto, em 26/09/2018, a instauração de inventário para partilha dos bens das heranças abertas por óbito de CC, falecido em 23/09/1954, e de DD, falecida em 02/02/1989, indicando como cabeça-de-casal EE. Citada a cabeça-de-casal, a mesma prestou compromisso de honra e declarações de cabeça-de-casal, em 15/11/2018, tendo apresentado relação de bens em 20/11/2018. Das declarações de cabeça-de-casal e dos restantes elementos constantes dos autos resulta que os inventariados foram casados segundo o regime de comunhão geral de bens, tendo deixado quatro filhos, a requerente, a cabeça-de-casal, FF e GG, os quais eram solteiros à data do óbito do pai, estando casados à data do óbito da mãe, com excepção da requerente do inventário. O filho FF foi casado com HH, segundo o regime de comunhão geral de bens, a qual faleceu em 10/06/2013, tendo aquele falecido em 24/04/2014, tendo deixado três filhos, II, JJ e KK, todos casados segundo o regime de comunhão de adquiridos. O filho GG foi casado com LL, segundo o regime de comunhão geral de bens, e faleceu em 07/10/2003, tendo esta falecido em 09/02/2005, tendo deixado três filhos, MM, NN e OO, aqueles casados segundo o regime de comunhão de adquiridos e este solteiro e declarado inabilitado por sentença de 06/11/2018, transitada em julgado em 12/12/2018, a qual fixou o começo da incapacidade em 29/11/1986, sendo seu curador provisório nomeado para estes autos PP (cfr. despacho de 21/04/2023). Por requerimento de 28/01/2019, QQ, casada com o interessado II, alegando que, por escritura de 28/11/2018, este lhe doou um décimo indiviso do quinhão hereditário que lhe pertencia nas heranças ilíquidas e indivisas abertas por óbito dos seus pais, as quais integram como bens dos seus activos os quinhões hereditários destes nas heranças indivisas em partilha nos presentes autos, e que, por esse motivo é interessada directa na partilha e tem o direito a intervir nos autos a esse título, deduziu incidente de intervenção principal espontânea, o qual foi admitido por despacho de 05/12/2022. Em Dezembro de 2020 os autos foram remetidos para tramitação judicial, ao abrigo do disposto no art. 12º, nº 1, da Lei nº 117/2019, de 13/09, inicialmente distribuídos ao Juízo Local Cível do Porto, do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, e depois, na sequência do despacho de 18/02/2022, ao Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia, do mesmo Tribunal, onde se encontram actualmente a correr os seus termos. Na relação de bens apresentada em 20/11/2018, a cabeça de casal relacionou os seguintes bens: BENS DO ACTIVO a) Comuns às duas heranças IMÓVEIS Todos sitos nas freguesias de ... e ..., concelho de Baião: Verba 1 Prédio rústico, denominado por "Quinta ... ou da ...", sito no Lugar ... e ..., descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o número ..., da freguesia ..., composto por: 1) prédio rústico, composto por terra de pastagem, ramada, pomar e oliveiras, inscrito na matriz sob o artigo rústico ... (anteriormente artigo rústico ... da freguesia ... (extinta), com o valor patrimonial tributário de 46,89 € 2) prédio rústico, composto por terra de pastagem, oliveiras e castanheiros, inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo rústico ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 11,62 € Verba 2 Prédio rústico, composto por terreno a vinha, sito em ..., descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o número ..., da freguesia ..., inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo rústico ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 1.047,48 €. Verba 3 Prédio misto, sito em ..., descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o número ..., da freguesia ..., composto por: 1) prédio urbano composto por casa de cave, rés-do-chão e andar, com logradouro, inscrito na matriz sob o artigo urbano ... (anteriormente artigo urbano ... da freguesia ... (extinta)) com o valor patrimonial tributário de 2.479,62€; 2) prédio rústico composto por terreno a vinha, inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo rústico ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 698,32 €; Verba 4 Prédio misto, denominado por "Quinta ... ou da ...", sito no Lugar ... e ..., descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o número ..., da freguesia ..., composto por: 1) prédio urbano, composto por casa de habitação de rés-do-chão e andar com terreiro, inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo urbano ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 23.620,48€; 2) prédio urbano, composto por casa de habitação de rés-do-chão e andar, inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo urbano ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 3.730,12 €; 3) prédio rústico, composto por terreno de pastagem, vinha, oliveiras, fruteiras, castanheiros, pinhal e mato, inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo rústico ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 589,60 €; Verba 5 Prédio rústico denominado por "...", composto por terreno de pinhal, mato e pastagem, sito no Lugar ..., descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o número ..., da freguesia ..., inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo rústico ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 108,49 €; Verba 6 Prédio rústico, composto por pastagem, videiras, castanheiros e oliveiras, sito no Lugar ..., descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o número ..., da freguesia ..., inscrito na matriz sob o artigo ..., com o valor patrimonial tributário de 28,61€; b) Próprios da herança de DD IMÓVEIS Todos sitos nas freguesias de ... e ..., concelho de Baião: Verba 7 Prédio urbano, composto por casa de rés-do-chão, primeiro andar e sótão, com quintal e logradouro, sito no Lugar ..., descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o número ..., da freguesia ..., inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo urbano ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 2.949,89 €; Verba 8 Prédio urbano, composto por casa de rés-do-chão e andar, com quintal, eira e espigueiro, sito no Lugar ..., descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o número ..., da freguesia ..., inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo urbano ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 1.367,04 €; Verba 9 Prédio rústico, denominado por "...", composto por cultura, sito no Lugar ..., descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o número ..., da freguesia ..., inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo rústico ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 71,44 €, Verba 10 Prédio rústico, denominado por "...", composto por cultura com ramada, sito no Lugar ..., descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o número ..., da freguesia ..., inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo rústico ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 21,57 €; Verba 11 Prédio misto, denominado por "Quinta ...", sito em ..., descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o número ... da freguesia ..., composto por: 1) prédio urbano composto por casa de rés-do-chão e andar, com logradouro, inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo urbano ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 5.739,47 €; 2) prédio urbano composto por casa de rés-do-chão para ... e alambique, inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo urbano ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 1.966,59 €; 3) prédio rústico, denominado por "..." composto por terra de pinhal, mato e pastagem, inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo rústico ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 32,52 €; 4) prédio rústico, denominado por "Quinta ...", composto por terra de pomar, ramadas, oliveiras, pastagem, pinhal, eucaliptal, mato e sobreiros, inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo rústico ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 2.022,88 €; 5) prédio rústico, denominado por "...", composto por terra de pinhal e mato, inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo rústico ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 45,14 €; 6) prédio rústico, denominado por "...", composto por terra de mato, inscrito na matriz sob o artigo ... (anteriormente artigo rústico ... da freguesia ... (extinta) com o valor patrimonial tributário de 0,67 €; Verba 12 Concessão de UM SÉTIMO INDIVISO de um jazigo constituído por duas sepulturas térreas com os números trezentos e trinta e seis e trezentos trinta sete, no Cemitério Privativo ... dentro de Cemitério ..., com o valor atribuído de 1.000,00 €. O interessado II apresentou o requerimento de 23/12/2018, no qual, para além de outras questões já apreciadas e/ou que já não estão em causa neste momento, apresentou reclamação à relação de bens, reclamando do seguinte: a) omissão de relacionação de bens móveis e objectos de prata: todos os instrumentos e alfaias existentes e armazenados nas propriedades descritas nas verbas nºs 1 a 11, e que são ou foram utilizados na sua exploração agrícola, as vasilhas e existências nelas contidas, todo o recheio existente nas casas que integram as verbas nºs 3, 4, 7, 8 e 11 da relação de bens, composto por louças, roupas de cama e mesa, mobílias, de quarto, sala, cozinha e demais dependências, tapetes, talheres de prata, candeeiros, cortinas, quadros, aparelho de televisão e de amplificação sonora e demais objectos de decoração e de utilização doméstica; b) omissão de relacionação do passivo, consistente em dívida das heranças em causa nos autos às heranças do seu filho e nora, FF e HH, da quantia total de € 130.937,73, decorrente dos empréstimos elencados nos arts. 44º a 102º do requerimento; c) impugnação dos valores indicados dos bens imóveis das verbas nºs 1 a 11, que têm valores de mercado superiores aos valores matriciais, indicando apenas o valor que entende ser o da verba nº 11, € 241.000,00, e limitando-se a indicar um valor global para as restantes verbas, de € 438.000,00, tendo requerido a avaliação dos imóveis. Indicou, para o efeito, meios de prova: depoimentos de parte, declarações de parte, rol de testemunhas e documentos. Por requerimento de 23/01/2019, a cabeça-de-casal e a requerente do inventário responderam à reclamação, alegando que sempre foi entendido pelos interessados – filhos dos inventariados – que instrumentos e alfaias das quintas e recheio das casas não seriam nem retirados, nem relacionados individualmente, acompanhando as verbas a que estão associados, requerendo, para o caso de se entender o contrário, a concessão de prazo para relacionar esse bens, negando a existência do passivo e aduzindo que as verbas relacionadas já foram avaliadas por acordo dos interessados, sendo desnecessária nova avaliação. Os interessados MM e NN pronunciaram-se por requerimento de 25/01/2019, aduzindo, no que à reclamação interessa, que “as quintas não são lucrativas, tendo vindo a requerer contribuições dos herdeiros a fundo perdido (e nunca “empréstimos” à Herança …)”. Em 23/09/2022 foi proferido o seguinte despacho: «Visto. Admite-se a prova indicada, apenas devendo ser notificadas as pessoas que deverão prestar depoimento de parte/declarações de parte e as testemunhas cuja notificação expressamente se pediu. Para a sua produção designo os próximos dias 1) 18 de Outubro, às 15 horas, com a produção dos depoimentos de parte/declarações de parte 2) 20 de Outubro, às 9,15 horas, com a inquirição das testemunhas. Notifique.» E na sequência de requerimentos entretanto apresentados, foi proferido, em 10/10/2022, o seguinte despacho: «Requerimento de 27/09/2022: Expeça carta precatória para audição das testemunhas que não residem neste concelho, devendo estas ser notificadas da data da diligência. Notifique. * Requerimento de 06/10/2022: Por conta[c]to telefónico, solicite aos ilustres advogados que informem se têm disponibilidade no dia 13 de dezembro, de manhã e de tarde.»Por despacho de 12/10/2022, a data da diligência foi alterada para o dia 13/12/2022, e no despacho de 05/12/2022, além do mais, decidiu-se: «Requerimentos de 22/11/2022 e de 02/12/2022: Destinando-se as normas dos artigos 503.º e 505.º, do CPC, à prova testemunhal, não encontra o tribunal fundamento bastante para considerar que esse regime não pode ser extensível às declarações de parte, quando quem as deve prestar seja uma das pessoas que consta do elenco previsto no artigo 503.º, 1 e 2, do CPC, o que então se determina considerando que a interessada que pede para ser ouvida por escrito será juíza e está colocada num tribunal superior. Nesta medida, admite-se a prestação de declarações de parte por QQ por escrito, sendo à matéria que consta do requerimento eletrónico que antecede. Notifique, com cópia dos documentos que constam do requerimento que antecede, devendo ainda ser cumprido o disposto no artigo 505.º, 4, do CPC.» No decurso da diligência de 13/12/2022, foi proferido o seguinte despacho: «Considerando que a cabeça de casal admite existirem bens móveis, decide-se que os deverá relacionar no prazo de 10 dias. Deverá ainda a cabeça de casal no mesmo prazo juntar certidões das descrições prediais dos bens imóveis relacionados, documentos que não se conseguiram encontrar no processo. (…) * Considerando que a cabeça de casal vai relacionar os bens móveis e que em função desse relacionamento poderão existir novas reclamações não vai o tribunal proceder à diligência de produção de prova no dia de hoje na medida em que poderá ter de a repetir, desta forma evitando atos inúteis.Notifique, solicitando aos ilustres mandatários que caso possam, informem as testemunhas que deveriam comparecer no dia de hoje à tarde de que não se devem deslocar ao tribunal de forma a poupar-lhes essas deslocações e o tempo perdido.» A cabeça-de-casal apresentou relação de bens móveis por requerimento de 16/12/2022. Por despacho de 12/01/2023, determinou-se, quanto à relação de bens: «Relação de bens de 16/12/2022: Notifique os interessados nos termos e para os efeitos do artigo 1104.º, do CC. Uma vez que ainda não sucedeu, deverá a interessada QQ, cuja intervenção foi recentemente admitida, ser ainda notificada nos mesmos termos da relação de bens inicialmente apresentada pela cabeça-de-casal.» A interessada QQ, na sequência dessa notificação, apresentou o requerimento de 22/02/2023, no qual, para além de tecer diversas considerações que nada relevam para as finalidades do inventário, invoca as seguintes questões: - “oposição ao inventário”, alegando que a requerente do inventário não tem direito a quinhoar nas heranças sob inventário, “de um ponto de vista material de justiça”, e que a posição a que esta se arroga constitui abuso de direito e conduz ao seu enriquecimento sem causa, pois, por conta da herança que haveria de receber dos pais, aquela recebeu um imóvel sito em Vila Nova de Gaia e um imóvel sito no Porto, assim ficando inteirada do seu quinhão hereditário, não tendo que quinhoar nos imóveis sitos no ..., tendo o acordo sido concretizado na escritura de partilha parcial de 13/02/1996, sendo que, ao contrário do que foi declarado na escritura, a requerente não pagou quaisquer tornas aos seus irmãos, bem como o valor atribuído ao imóvel não corresponde à verdade. Pretende a interessada que seja reconhecido esse abuso e seja declarado que a requerente “nenhum direito detém, na realidade, nas heranças inventariadas, estando, por conseguinte, impedida de exercer qualquer direito ou posição na herança”, ou, caso assim não se entenda, que aquela “seja condenada, em qualquer caso, a devolver às heranças inventariadas tudo aquilo com que se achará então locupletada à custa dessa mesma herança, isto é, a devolver à herança, para partilha no presente inventário, os ditos imóveis sito na Rua ..., no Porto, e em Vila Nova de Gaia, em espécie ou em valor”; - reclamação à relação inicial de bens (imóveis), alegando que “assume e faz suas a reclamação de bens e a impugnação do valor dos bens deduzidas no inventário dos autos, por seu marido II, e constantes dos arts. 105 e seguintes do correspondente requerimento, aderindo também aos pedidos por ele formulados, e reiterando-os como próprios”, e reclamando a relação dos imóveis, ou o seu valor, que alegou terem sido recebidos pela requerente nos termos da primeira questão por si levantada; - reclamação à relação de bens móveis, reclamando a relacionação de um faqueiro em prata “composto, no mínimo, por 144 peças, comportando 12 colheres de sobremesa, 12 garfos de sobremesa, 12 facas de sobremesa, 12 colheres de sopa, 12 garfos de carne, 12 facas de carne, 12 garfos de peixe, 12 facas de peixe, 12 garfos de bolo, 12 colheres de chá, 12 colheres de café, bem como 12 talheres de servir (espátula para peixe, garfo para servir peixe, garfo para salada, colher para salada, concha, concha para molho, colher para arroz, colher para açúcar, faca para assado, garfo para assado, espátula para bolos, colher para azeitonas)”, com valor não inferior a € 7.500,00; de “um conjunto de cubas de inox de diversas capacidades, existentes no 3º armazém da Quinta ...”, “madeiras, utensílios e caixas várias depositadas na casa dita das ...”, “1 prensa de mosto (móvel) existente na Quinta ...”, “balsas, pipas, tonéis, utensílios e medidas integrantes dos armazéns da Quinta ...”, “bomba eléctrica de mosto”, “um conjunto de várias mangueiras do armazém dos tonéis”, “um conjunto de electrodomésticos existentes na Quinta ... (fogão, máquinas de lavar e de café, entre outras)” e “restantes utensílios domésticos como serviços de louça, de copos, faqueiros, etc.”; da “marca de vinhos ..., registada no INPI – Instituto Nacional da Propriedade Industrial, como MARCA NACIONAL Nº ...” (ou então, de “um crédito da herança sobre os aludidos MM e OO correspondente ao valor da referida marca”, “nunca inferior a € 5.000,00”); de um tractor “marca ... com a matrícula ..-AO-.., assim como o seu atrelado ... e caixa com a matrícula AV-....”; de “um número provavelmente não inferior a 1500 esteios de pedra de xisto que foram recentemente extraídos da parte superior da Quinta ... ao ter sido arrancada a vinha que aí se encontrava plantada, num valor também não inferior a 12.500 €”; e de “bens móveis, alfaias e instrumentos titulados em nome dessa A..., Lda.”; - reclamação do valor atribuído aos bens relacionados: remetendo para o alegado pelo seu marido quanto aos bens imóveis e requerendo a avaliação dos bens móveis relacionados; - reclamação de omissão de relacionação do passivo nos mesmos termos reclamados pelo seu marido; - falta de prestação de contas por parte da cabeça-de-casal. Indicou, para o efeito, meios de prova: depoimentos de parte, declarações de parte, rol de testemunhas e documentos. A cabeça-de-casal e os demais interessados representados pelo mesmo mandatário apresentaram resposta à reclamação, nos termos do requerimento de 29/03/2023, alegando, no que às questões suscitadas interessa, que: - o imóvel de Vila Nova de Gaia que foi transmitido à requerente do inventário nunca fez parte do património dos inventariados; - não corresponde à verdade que tenha existido a partilha parcial a favor da requerente do inventário; - alguns dos bens móveis reclamados constam já da relação de bens apresentada pela cabeça-de-casal; - não têm de ser relacionados bens pertencentes à sociedade “A..., Lda.”; - a marca “...” nunca foi registada no INPI como pertencendo a qualquer das heranças a partilhar; - já foi feita avaliação dos bens móveis; - não existe o passivo reclamado, pois que as entregas em dinheiro feitas pelos filhos dos inventariados ao longo dos anos não foram a título de empréstimo, mas a título definitivo; - não foi efectuado qualquer pedido concreto quanto à prestação de contas; - não há que relacionar o faqueiro, que foi furtado, correndo o risco de perda do bem por conta da herança; - os bens reclamados no ponto 72, als. a), c), e), g) e h), assim como o tractor e as alfaias, não pertencem às heranças; - os bens móveis que a reclamante alega estarem depositados no imóvel designado ... (“madeiras, utensílios e caixas várias”), o conjunto de mangueiras referido na alínea f) da alegação 72, que não foram objecto de relacionação dado o respectivo estado de degradação, não tendo qualquer valor, os esteios de pedra de xisto reportados nas alegações 89, 92 e 93, que estão, uns encostados a muros de suporte de socalcos na Quinta ..., e outros depositados na Quinta ..., e todos os rolos de arame usado e gasto que se encontram na dita ...” na Quinta ..., na garagem da ..., ou na ..., podem, com a anuência da cabeça-de-casal e dos demais interessados, ficar com a reclamante e seu marido, fazendo-os seus, removendo-os para onde entenderem e quando entenderem, independentemente do desfecho da partilha. Em 21/04/2023 foi proferido o seguinte despacho: «(…) Reclamação apresentada por II (requerimento cuja data não se consegue descortinar, sabendo-se que foi apresentada no início do processo quando este ainda era tramitado no cartório notarial): Visto. (…) 4) Reclamação quanto à relação de bens móveis: Na diligência que teve lugar a 13/12/2022 ficou estabelecido que a cabeça de casal iria relacionar os bens móveis, o que já veio fazer, razão pela qual as considerações tecidas quanto à falta de relacionamento destes bens anteriormente perderam atualidade. 5) Reclamação quanto ao passivo: O tribunal pretende dele conhecer na conferência de interessados, quando se realizar, conforme prevê o artigo 1106.º, do CPC, considerando a posição que os interessados nessa altura manifestarem e os documentos juntos que o possam comprovar. 6) Impugnação quanto ao valor dos bens imóveis: Refere expressamente o artigo 1098.º, 1, a), do CPC, que na relação de bens imóveis o valor a atribuir deve ser o respetivo valor tributário, o que a cabeça de casal terá cumprido, razão pela qual a reclamação é destituída de interesse, não sendo aqui discutida. Note-se, porém, que o facto de se dever relacionar os bens imóveis pelos seus valores tributário[s] não significa que as partes não possam, como dois interessados já vieram manifestar, solicitar a sua avaliação para efeitos de conhecimento do seu, se assim se quiser chamar, “real valor” que será o considerado para efeitos da partilha ou venda. Face ao teor da decisão proferida, que considerou ultrapassadas/prejudicadas as questões levantadas, não se admite qualquer meio de prova. Notifique. * Reclamação apresentada por QQ (requerimento de 22/02/2023): Visto.* 1) Questão prévia: A questão prévia levantada, relacionada com alegados conluios entre interessados, não tem qualquer interesse para este processo, razão pela qual não se toma conhecimento do exposto, que aqui não será discutido. 2) Oposição ao inventário: Do exposto não resulta que efetivamente todos os interessados tenham efetuado uma partilha extrajudicial da herança que aqui se partilha, não tendo sido junto nenhum documento que o ateste conforme obriga o artigo 2102.º, do CC, podendo apenas terem existido negociações nesse sentido mas que não se concretizaram. Assim, sendo a requerente filha de CC, é sua herdeira nos termos dos artigos 2132.º e 2133.º, 1, b), do CC, o que lhe confere, à luz do artigo 1085.º, 1, a), do CPC, legitimidade para requerer o inventário, não se conseguindo encontrar nesta descrição qualquer impedimento para o vir requerer ou abuso de direito que não lho permitisse. Desta forma, por não ter qualquer relevo, não se toma conhecimento do exposto, que aqui não será discutido. 3) Reclamação quanto à relação de bens imóveis: Refere expressamente o artigo 1098.º, 1, a), do CPC, que na relação de bens imóveis o valor a atribuir deve ser o respetivo valor tributário, o que a cabeça de casal terá cumprido, razão pela qual a reclamação é destituída de interesse, não sendo aqui discutida. Note-se, porém, que o facto de se dever relacionar os bens imóveis pelos seus valores tributário não significa que as partes não possam, como dois interessados já vieram manifestar, solicitar a sua avaliação para efeitos de conhecimento do seu, se assim se quiser chamar, “real valor” que será o considerado para efeitos da partilha ou venda. 4) Reclamação quanto à relação de bens móveis: Visto. Embora tivesse ficado o tribunal com a impressão que todos os interessados o haviam compreendido, na diligência que teve lugar a 13/12/2022 ficou estabelecido que ao cabeça de casal iria relacionar os bens móveis, o que já veio fazer, razão pela qual as considerações tecidas quanto à falta de relacionamento destes bens anteriormente perderam atualidade. Em relação ao passivo, o tribunal pretende dele conhecer na conferência de interessados, quando se realizar, conforme prevê o artigo 1106.º, do CPC, considerando a posição que os interessados nessa altura manifestarem e os documentos juntos que o possam comprovar. No mais, relativamente à reclamação à relação de bens móveis propriamente dita, admite-se a prova testemunhal elencada, sendo as testemunhas a apresentar. Indefere-se ao requerido em C), C1), a) e b), por não ter relevo para a discussão sobre a falta de relacionamento de bens móveis. Oportunamente, após a avaliação dos bens que foi pedida, será marcada data para a produção de prova oral. Notifique, sendo ainda à cabeça de casal nos termos do requerido em C2, a) e b) devendo responder em 10 dias (notificação que se faz sem ter conseguido compreender da resposta à reclamação à relação de bens se aceita a existência dos esteios e arames referidos no artigo 89) da reclamação). * Resposta à reclamação à relação de bens da cabeça de casal (requerimento de 29/03/2023): Visto.* Fossem os interessados capazes de esperar pelos despachos judiciais que se pronunciam sobre as questões que são colocadas e não vivessem num frenesim de apresentação de requerimentos grande parte do exposto neste requerimento poderia ter sido evitado. Assim, face ao acima referido, não se toma conhecimento do alegado no que se prende com a questão prévia, com a oposição ao inventário, com o valor de relacionamento dos bens imóveis e, agora, com o passivo. No mais, relativamente à resposta à reclamação à relação de bens móveis propriamente dita, admite-se a prova por depoimento de parte, por declarações de parte e testemunhal elencada, sendo as testemunhas a apresentar. Oportunamente, após a avaliação dos bens que foi pedida, será marcada data para a produção de prova oral. Notifique. (…) * Os interessados II e QQ vieram requerer a avaliação dos bens imóveis relacionados, tendo a interessada QQ requerido ainda a avaliação dos bens móveis, alegando, em síntese, o seu desfasamento com o valor real.* O artigo 1113.º, do CPC, prevê a possibilidade dos interessados pedirem a avaliação dos bens relacionados, apenas fazendo-a a lei depender de tal requerimento ser apresentado até à abertura das licitações, momento processual a que ainda não chegamos. Relativamente aos bens imóveis, não será de estranhar que os valores que constam das inscrições matriciais possam não ter correspondência com o valor real dos bens, desde logo por, neste caso, as datas dessas avaliações serem de 1983, embora outras de 2015 e de 2017. No que se prende com os bens móveis, considerando o seu número e variedade, admite-se igualmente que os interessados procurem o conforto de um especialista para determinar o seu valor Em face disso, admite-se a avaliação dos bens imóveis e dos bens móveis relacionados, que será levada a cabo por perito singular, embora um para os bens imóveis e outro para os bens móveis, que se solicita à Secção que indique, bem assim que efetue um cálculo do valor dos encargos para cada uma das avaliações que caberá aos requerentes das avaliações suportar. Notifique.». Deste despacho veio o interessado reclamante II interpor recurso (requerimento de 17/05/2023), tendo, na sequência da respectiva motivação, apresentado as seguintes conclusões, que se transcrevem: «1- O recorrente II, notificado das declarações prestadas nos autos pela cabeça-de-casal nomeada (a Interessada EE) e da relação de bens por ela junta aos autos, ainda na fase que estes autos tramitaram em Cartório Notarial, deduziu em 23/12/2018, reclamação contra relação de bens – que consta, agora, no CITIUS sob a refª 419971455 com data de 23/12/2018 -, na qual reclamou pelo relacionamento de um passivo das heranças sob partilha em relação às heranças abertas e indivisas de seus Pai e Mãe (Dr. FF e Drª HH) no valor total e global de € 130.937,73, decorrente de diversas quantias que seus falecidos Pai e Mãe, bem como as heranças abertas e indivisas por óbito destes, emprestaram às heranças sob partilha, no período compreendido entre Maio de 2000 e 2018 – pontos 43 a 103 da reclamação. 2- Logo então e nessa reclamação, o Recorrente juntou dois documentos para demonstração da existência desses empréstimos e exigibilidade da referida dívida das heranças sob partilha, um constituído por um livro em que seu Pai, ao longo de vários desses anos (entre 2000 e 2012), inscrevera as quantias que mutuara às heranças sob partilha – das quais era cabeça-de-casal –, e outro constituído por um ficheiro informático, elaborado por, e partilhado entre, todos os herdeiros, no qual foram registados os empréstimos ocorridos entre 2016 e 2018, e também com tal fim probatório requereu a prestação de depoimentos de parte da Requerente do Inventário (a Interessada AA), da Interessada cabeça-de-casal e dos Interessados MM, NN e OO, bem como de suas irmãs (JJ e KK), cuja intervenção principal nessa mesma reclamação havia suscitado, indicando expressamente que tais depoimentos deveriam versar sobre os factos por si alegados de 43 a 107 da reclamação (os respeitantes ao passivo reclamado), requerendo, ainda, o recorrente ser ouvido em declarações de parte quanto a tal matéria (artºs 43 a 107) e, por fim, com os mesmos objetivos, requereu, também, a inquirição de duas testemunhas, cuja notificação para a diligência de inquirição requereu. 3- Em 23/9/2022, após várias incidências processuais (melhor supra alegadas no corpo das alegações), o Mtmº Juiz a Quo debruçando-se, quer sobre a reclamação deduzida pelo Recorrente contra a relação de bens em 2018, quer sobre a resposta à mesma que a cabeça-de-casal e a Requerente do Inventário haviam deduzido (em 23/1/2019 e na fase de tramitação notarial), negando a existência dos empréstimos e da dívida das heranças sustentada pelo recorrente (na qual requereram o depoimento de parte do recorrente, a prestação de declarações de parte, versando todas a matéria de facto respeitante à reclamada dívida das heranças, juntaram documentos e arrolaram 7 testemunhas), proferiu decisão (com a refª CITIUS 440297822) na qual admitiu a prova indicada, especialmente a que havia sido requerida pelo recorrente, determinando a notificação “das pessoas que deverão prestar depoimento de parte/declarações de parte e as testemunhas”, cuja notificação havia sido expressamente requerida e calendarizando o dia 18 de Outubro, às 15 horas, para produção dos depoimentos de parte/declarações de parte e o dia 20 de Outubro, às 9,15 horas, para a inquirição das testemunhas, 4- Após reagendamento das referidas datas, e ainda antes de a mulher do recorrente, QQ, ter sido admitida a intervir nestes autos como Interessada Direta, o recorrente II (por requerimento de 22/11/2022 – ref CITIUS 43959248) requereu a junção aos autos de 5 documentos para prova dos factos por si alegados na reclamação a respeito do passivo cujo relacionamento pretende e aditou sua referida mulher como testemunha, esclarecendo, depois, através do requerimento de 2/12/2022, refª CITIUS 44046077, quais os factos sobre que iria incidir o depoimento de sua mulher QQ, entre os quais os respeitantes ao passivo que o recorrente pretende ver ser relacionado, tendo, através do despacho com a refª CITIUS 442924695 de 5/12/2022 (e dado que, nesse mesmo despacho foi admitida a Intervenção da mulher do recorrente, QQ, como Interessada Direta nestes autos), o Mtmº Juiz a Quo acabado por não admitir a sua inquirição como testemunha, mas, sim, admitindo “a prestação de declarações de parte por QQ por escrito, sendo à matéria que consta do requerimento eletrónico que antecede”, Isto é, à matéria indicada no sobredito requerimento do recorrente de 2/12/2022, versando, assim, as questões e factos relativos ao passivo cujo relacionamento o Recorrente II visa, tal como fez constar na sua reclamação de dezembro de 2018. 5- Na sequência dessas decisões, foram notificados os Interessados indicados pelo recorrente para prestarem depoimento de parte, foi, também ele, notificado para aprestação de declarações de parte e as testemunhas que havia arrolado e que só não ocorreram na data agendada – 13/12/2022 - por ter sido concedido prazo à cabeça-de-casal para relacionar os bens móveis que, existiam, e não haviam sido relacionados – cfr. a Ata com a refº CITIUS443208595 -, assim possibilitando serem produzidas reclamações contra a mesma (no que respeitava aos bens móveis a relacionar, quanto aos Interessados que já haviam exercidos os direitos previstos no artº 1104º do CP em momento anterior), facultar à mulher do recorrente a possibilidade de exercer os seus direitos de oposição ao inventário e reclamação contra a relação de bens, e ocorrer, num só momento processual, a produção da prova (testemunhal e por depoimento/declarações de parte) já requerida e que viesse a ser requerida). 6- Na sequência da reclamação contra a relação de bens que a mulher do Recorrente, QQ, deduziu em 22/2/2023 (com a refª CITIUS 44797034) após ter sido admitida a intervir nestes autos como Interessada direta, e versando a reclamação contra a relação de bens deduzida pelo aqui Recorrente em 2018, e no que ao passivo respeita, o Mtmº Juiz a Quo proferiu a decisão recorrida que, no seu ponto 5), refere que “o tribunal pretende dele conhecer na conferência de interessados, quando se realizar, conforme prevê o artigo 1106.º, do CPC, considerando a posição que os interessados nessa altura manifestarem e os documentos juntos que o possam comprovar” e, como tal, na parte final desse despacho se escreveu que “face ao teor da decisão proferida, que considerou ultrapassadas/prejudicadas as questões levantadas, não se admite qualquer meio de prova”, assim rejeitando a produção das provas requeridas pelo Recorrente na reclamação deduzida em 2018 e que, antes, pelas decisões evidenciadas nas conclusões antecedentes, haviam já sido admitidas. 7- As decisões identificadas nas conclusões 3 e 4 supra, não foram objeto de recurso interposto por qualquer Interessado ou por quem quer que seja, e, como tal, transitaram em julgado, sobre elas se formando caso julgado formal. 8- De acordo com as disposições dos artºs 620º e 625º, nºs 1 e 2 do CPC as decisões que recaiam unicamente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo, não podendo o Juiz voltar a pronunciar-se e a decidir questão que já houvesse decidido, sendo a última, ou nova, decisão que venha ser proferida sobre a mesma questão ineficaz, devendo cumprir-se a primeira. 9- Daí que ao, na decisão recorrida, se decidir indeferir a produção das provas por confissão - prestação de depoimentos de parte -, por declarações de parte e a inquirição das testemunhas que (para demonstração dos factos alegados como fundamento da sua pretensão de ser relacionado o passivo que reclamou) o Recorrente II havia requerido e haviam sido, por decisões transitadas em julgado, admitidas, a decisão recorrida voltou a pronunciar-se sobre questão – admissão das provas requeridas pelo recorrente – que já antes havia sido apreciada e decidida no processo, violando, por isso, o caso julgado formal que sobre tais decisões, de admissão dessas provas, se havia formado. 10- Não tendo ocorrido qualquer alteração ou modificação, seja quanto à alegação factual, seja em termos da tramitação processual, que pudesse determinar uma alteração dos pressupostos existentes à data em que tais provas foram admitidas pelas decisões proferidas em primeiro lugar e que transitaram em julgado. 11- A decisão sob recurso que, pronunciando-se pela segunda vez, sobre a prova testemunhal, por confissão e declarações de parte que o Recorrente II requereu para demonstração dos factos e fundamentos da sua pretensão de relacionamento e verificação do passivo das heranças sob partilha que reclamou, alterou as anteriores decisões que as admitiram, agora as rejeitando, sendo assim ilícita, nula ou sempre ineficaz e ilícita, nos termos das disposições dos artºs 615º nº 1 alínea d), 620º, 625º e 195º do CPC, assim por ela violadas. 12- O Paradigma do processo judicial de inventário judicial alterou-se radicalmente com a reforma introduzida pela Lei 23/2013, optando o legislador por concentrar na fase inicial e prévia à conferência de Interessados a discussão e decisão das questões decisivas ou relevantes para a partilha a efetuar, não só estatuindo a necessidade da prestação das declarações de cabeça-de-casal e relacionamento dos bens em momento prévio à chamada dos Interessados para os termos do inventário, como impondo aos Interessados o ónus de deduzirem as suas reclamações e pretensões contra a relação de bens, logo na fase inicial, e subordinando-a a efeitos cominatórios e preclusivos, como, ainda, prevendo momentos processuais de saneamento e decisão das questões suscitadas, por forma a que a Conferência de Interessados se realize quando o universo dos herdeiros, Interessados e seus direitos, bem como o acervo dos bens e direitos a partilhar se achem já definidos. 13- Tal ocorre, igualmente em relação ao passivo da herança, pois não só as disposições do artº 1104º nº 1 alíneas d) e e) são expressas, quer no ónus que o legislador agora faz impender sobre os Interessados de deduzirem no prazo de 30 dias previsto no corpo desse nº 1, as suas reclamações contra a relação de bens, quer quanto à necessidade de impugnarem os créditos e as dívidas da herança, sob pena de tais direitos ficarem precludidos. 14- Da concatenação das disposições dos artºs 1106º e 1111º do CPC, decorre que atualmente, não só os interessados têm um ónus de impugnação dos créditos e das dívidas da herança, como é antecipada para a subfase da oposição a suscitação e decisão de uma questão – o reconhecimento do passivo - que anteriormente estava relegada para o momento da conferência de Interessados que, agora, e de acordo com o artº. 1111º do CPC elenca como único assunto a submeter à discussão e decisão na Conferência de Interessados, a deliberação sobre o passivo e a forma do seu pagamento e já não a sua verificação e reconhecimento, ocorridos em momento e fase processual anterior. 15- Ocorrendo nos autos divergências entre os Interessados a respeito do passivo das heranças cujo reconhecimento e relacionamento o aqui recorrente pretende ver ser efetuado (como se evidenciou nas conclusões anteriores), de acordo com as disposições dos nºs 4, 1, 2 e 3 do artº 1106º do CPC, o juiz deverá, quanto aos interessados que não reconheçam o passivo/dívida, apreciar a sua existência e montante quando a questão puder ser resolvida com segurança pelo exame dos documentos apresentados. 16- Sem prejuízo da limitação que a jurisprudência e doutrina descobre nas normas no sentido, quer da relevância e irrelevância da confissão da dívida reclamada ou relacionada por falta de impugnação atempada, nos termos das regras dos nºs 1 e 2 do artº 1106º e 574º nº 2 do CPC, quer da necessidade da demonstração da sua existência por documento, tal exigência de prova documental, não afasta, nem impede, a produção de outras provas para demonstração da sua existência e em ordem à sua verificação pelo julgador, sejam elas requeridas pelos Interessados, mormente os que pugnam pelo reconhecimento da dívida, sejam até oficiosamente determinadas. 17- Como resulta das conclusões anteriores, do confronto do teor da reclamação contra relação de bens deduzida pelo recorrente e da resposta à mesmas deduzidas ainda na fase de tramitação notarial, pela Requerente do Inventário e pela cabeça-de-casal (em 23/1/2019, agora com a refª CITIUS 419971415) , bem como da apresentada pelos Interessados MM e NN em 24/1/2019, agora com a refª CITIUS 419971414 de 25/1/2019), no que ao passivo respeita, não são postas em causa pelos Interessados as inscrições efetuadas no livro e ficheiro Excel juntas como documentos probatórios da existência dos empréstimos efetuados às heranças sob partilha (documentos 1 e 2 da reclamação do recorrente), nem se as mesmas significam e traduzem a transferência das quantias que representam, desde a esfera patrimonial dos falecidos Pai e Mãe, e depois heranças indivisas abertas pelos seus óbitos, para a esfera patrimonial das heranças sob partilha, centrando-se a divergência, sim, quanto à qualificação dessas deslocações patrimoniais, que o recorrente pugna corresponderem a empréstimos efetuados às heranças indivisas sob partilha ao longo de vários anos, e os demais Interessados sustentam terem-se tratado de “entregas feitas pelos herdeiros a título definitivo ao cabeça-de casal, para pagamento dos encargos das heranças e realização de trabalhos de beneficiação dos prédios que as integram”. 18- Por assim ser, data vénia, impõe-se e é essencial para decisão a respeito do reconhecimento desse passivo reclamado pelo recorrente, a produção de outras provas para além das documentais, que as esclareçam, complementem e permitam interpretar, e valorar, em específico a prova por confissão, por declarações de parte e testemunhal que permitirá esclarecer a real natureza dessas deslocações patrimoniais, contribuindo decisivamente para o enquadramento factual e contextual em que as mesmas ocorreram e assim possibilitar o seu reconhecimento como passivo das heranças sob partilha, ou não. 19- Nenhuma limitação ocorre no que respeita à prova ou validade dos empréstimos em que o recorrente fundamental a sua pretensão quanto ao passivo objeto de reclamação (nem o Mtmº Juiz a Quo tal convocou para proferir a decisão recorrida) e que as provas requeridas são lícitas e permitidas nos termos da lei substantiva e processual, tanto mais que os documentos probatórios juntos aos autos com o mesmo fim e acima indicados são documentos particulares – artº s 341º, 352º, 362º, 376º, 392º e 396º do CC e artºs 542º, 466º e 495 e seguintes do CPC – estando o exame desses documentos está compreendido e sujeito ao princípio da livre apreciação da prova ínsito no artº 607, nº 5 do CPC e a conclusão a deles extrair para tomada da decisão quanto ao passivo reclamado, deverá ter em conta, quer os referidos documentos, quer as demais provas produzidas a respeito dessa questão e dos factos que lhe inerem (máxime os que permitem interpretar tais documentos) 20- Competindo ao recorrente o ónus de demonstração dos factos que alegou para fundamento da sua pretensão de ver ser reconhecido e relacionado o passivo das heranças sob partilha que quantificou na reclamação que deduziu contra a relação de bens – artº 342º do CC.-, tem ele o direito a ver serem produzidas as provas que oportunamente e com a sobredita finalidade requereu, no caso a prestação de depoimentos e declarações de parte e a audição de testemunhas – artºs 410º, 411º e 413º do CPC. 21- Questão e decisão – sobre o reconhecimento do passivo controvertido - que, como decorre das conclusões já acima formuladas, deve ser conhecida e decidida, não só após a produção d[a]s provas requeridas e tidas por necessárias, como em momento prévio á Conferência de Interessados, ao invés do [que] se decidiu desacertadamente na decisão recorrida. 22- O direito à prova é parte essencial do direito fundamental de acesso ao direito (artigo 20º da Constituição da República Portuguesa), na vertente do direito a um processo equitativo, constituindo-se como peça fundamental para a realização efetiva do direito de ação judicial, pelo que as regras dos artº 1106º nºs 3 e 4, bem como as do artº 1111º, nº 3 do CPC, entendidas no sentido de imporem que a decisão de reconhecimento de passivo de uma herança, apenas pode ser tomada na conferência de interessados, mediante os posicionamentos dos Interessados na partilha e somente mediante o exame dos documentos que para tanto forem apresentados (sufragado na decisão recorrida), excluindo a produção de quaisquer outras provas, – mesmo a prova por confissão/depoimento de parte ou testemunhal requerida – são inconstitucionais, violando a regra do artº 20º nº 4 da CRP. 23- Pois, então, introduziram uma limitação da parte ao acesso ao direito, na vertente do seu direito à prova e a um processo equitativo, impedindo-a de carrear para os autos os elementos probatórios que permitem influir no exame dos documentos apresentados, seja quanto ao seu teor e ao que representam, seja quanto ao contexto em que foram produzidos, sejam quanto ao que efetivamente pretenderam representar, que viola esse seu direito merecedor de tutela constitucional. 24- Violou, pois, a decisão recorrida as regras dos artºs 341º, 342º, 352º, 362º, 376º, 392º e 396º.do CC, os artºs 195º, 410º, 411º, 413º,.411º, 466º, 495 , 542º, 607, nº 5 , 615º nº 1 alínea d), 620º e 625º , nºs 1 e 2, 1104º nº 1 alíneas d) e e) 1101º, 1106º, 1110º e 1111º do CPC e o artº 20º nº 4 da CRP. Termos em que, V.Exªs julgando procedente o recurso farão JUSTIÇA». Deste mesmo despacho veio ainda a interessada reclamante QQ interpor recurso (requerimento de 18/05/2023), tendo, na sequência da respectiva motivação, apresentado as seguintes conclusões, que se transcrevem: «1- O marido da recorrente, II, notificado das declarações prestadas nos autos pela cabeça-de-casal nomeada (a Interessada EE) e da relação de bens por ela junta aos autos, ainda na fase que estes autos tramitaram em Cartório Notarial, deduziu em 23/12/2018, reclamação contra relação de bens – que consta, agora, no CITIUS sob a refª 419971455 com data de 23/12/2018 -, na qual reclamou pelo relacionamento de um passivo das heranças sob partilha em relação às heranças abertas e indivisas de seus Pai e Mãe (Dr. FF e Drª HH) no valor total e global de € 130.937,73, decorrente de diversas quantias que seus falecidos Pai e Mãe, bem como as heranças abertas e indivisas por óbito destes, emprestaram às heranças sob partilha, no período compreendido entre Maio de 2000 e 2018 – pontos 43 a 103 da reclamação - juntando, logo então, dois documentos para demonstração da existência desses empréstimos e exigibilidade da referida dívida das heranças sob partilha, um constituído por um livro em que o Sogro da recorrente, ao longo de vários desses anos (entre 2000 e 2012), inscrevera as quantias que mutuara às heranças sob partilha – das quais era cabeça-de-casal –, e outro constituído por um ficheiro informático, elaborado por, e partilhado entre, todos os herdeiros, no qual foram registados os empréstimos ocorridos entre 2016 e 2018.. 2- Também para prova da existência e exigibilidade do passivo cujo relacionamento reclamou, o marido da recorrente, requereu, logo então, a prestação de depoimentos de parte da Requerente do Inventário (a Interessada AA), da Interessada cabeça-de-casal e dos Interessados MM, NN e OO, bem como de suas irmãs (JJ e KK), cuja intervenção principal nessa mesma reclamação havia suscitado, .ser ouvido em declarações de parte quanto a tal matéria (artºs 43 a 107) da dita reclamação e a inquirição de duas testemunhas. 3- Pretensão à qual se opuseram, por um lado, a cabeça-de-casal e a Requerente do Inventário deduzindo (em 23/1/219, na fase de tramitação notarial e agora com a refª CITIUS 419971415) resposta, negando a existência dos empréstimos e da dívida das heranças sustentada pelo marido da recorrente. 4- Logo em 28/1/2019 (refª CITIUS 419971413), a recorrente requereu nos autos, ainda na fase notarial, ser admitida como Interessada Direita no inventário e assim poder exercer os direitos que lhe assistiam, o que, por força de diversas incidências processuais, só veio a ser objeto de pronúncia através do despacho com a refª CITIUS 442924695 de 5/12/2022, na sequência do que deduziu em 22/2/2023 (refª CITIUS 44797034), entre o mais, oposição ao inventário e reclamação contra a relação de bens, formulando expressamente pretensão no sentido de dever ser relacionado e reconhecido (máxime perante os demais Interessados que em tal não assentissem) o passivo das heranças sob partilha já antes reclamado por seu marido, II (em 2018), decorrente de empréstimos efetuados por seu sogros e heranças indivisas abertas pelos seus óbitos, alegando, para tanto os factos que constam dos pontos 103 a 130 da sua reclamação, para além de ter dado como reproduzido o que seu marido alegara e a prova que produzira (máxime a documental) na dita reclamação que ele efetuara em 2018 (mormente os 2 documentos que instruíram essa reclamação), 5- Requerendo, para além disso, e também em ordem a demonstrar os factos alegados como fundamento dessa sua pretensão, a produção de provas por confissão - prestação de depoimentos de parte de todos os Interessados, incluindo seu marido -, por declarações de parte e arrolando 4 testemunhas. 6- Tendo os demais Interessados, à exceção de seu marido, respondido à sua reclamação, especialmente no que respeita ao passivo, não o reconhecendo (D5 dessa resposta), antes os qualificando como entregas a título definitivo para pagamento de encargos das heranças e realização e trabalhos de beneficiação dos prédios que as integram – requerimento com a refª CITIUS 45169443 de 29/3/2023 -, juntando documentos, requerendo a inquirição de 10 testemunhas e o depoimento departe da recorrente, para prova dos factos que, fundamentando esse posicionamento, alegaram. 7- A decisão recorrida, versando a reclamação contra a relação de bens deduzida pela recorrente e no que ao passivo respeita, refere no seu ponto 4), 2º parágrafo, que “o tribunal pretende dele conhecer na conferência de interessados, quando se realizar, conforme prevê o artigo 1106.º, do CPC, considerando a posição que os interessados nessa altura manifestarem e os documentos juntos que o possam comprovar” e, como tal, “no mais, relativamente à reclamação de bens móveis propriamente dita, admite-se a prova testemunhal elencada, sendo as testemunhas a apresentar”, assim indeferindo, no mínimo tacitamente, a produção das provas que a recorrente requereu (depoimentos e declarações de parte, prova testemunhal) versando os factos alegados respeitantes ao reconhecimento do passivo. 8- O Paradigma do processo judicial de inventário judicial alterou-se radicalmente com a reforma introduzida pela Lei 23/2013, optando o legislador por concentrar na fase inicial e prévia à conferência de Interessados a discussão e decisão das questões decisivas ou relevantes para a partilha a efetuar, não só estatuindo a necessidade da prestação das declarações de cabeça-de-casal e relacionamento dos bens em momento prévio à chamada dos Interessados para os termos do inventário, como impondo aos Interessados o ónus de deduzirem as suas reclamações e pretensões contra a relação de bens, logo na fase inicial, e subordinando-a a efeitos cominatórios e preclusivos, como, ainda, prevendo momentos processuais de saneamento e decisão das questões suscitadas, por forma a que a Conferência de Interessados se realize quando o universo dos herdeiros, Interessados e seus direitos, bem como o acervo dos bens e direitos a partilhar se achem já definidos. 9- Tal ocorre, igualmente em relação ao passivo da herança, pois não só as disposições do artº 1104º nº 1 alíneas d) e e) são expressas, quer no ónus que o legislador agora faz impender sobre os Interessados de deduzirem no prazo de 30 dias previsto no corpo desse nº 1, as suas reclamações contra a relação de bens, quer quanto à necessidade de impugnarem os créditos e as dívidas da herança, sob pena de tais direitos ficarem precludidos. 10- Da concatenação das disposições dos artºs 1106º e 1111º do CPC, decorre que atualmente, não só os interessados têm um ónus de impugnação dos créditos e das dívidas da herança, como é antecipada para a subfase da oposição a suscitação e decisão de uma questão – o reconhecimento do passivo - que anteriormente estava relegada para o momento da conferência de Interessados que, agora, e de acordo com o artº. 1111º do CPC elenca como único assunto a submeter à discussão e decisão na Conferência de Interessados, a deliberação sobre o passivo e a forma do seu pagamento e já não a sua verificação e reconhecimento, ocorridos em momento e fase processual anterior. 11- Ocorrendo nos autos divergências entre os Interessados a respeito do passivo das heranças cujo reconhecimento e relacionamento o aqui recorrente pretende ver ser efetuado (como se evidenciou nas conclusões anteriores), de acordo com as disposições dos nºs 4, 1, 2 e 3 do artº 1106º do CPC, o juiz deverá, quanto aos interessados que não reconheçam o passivo/dívida, apreciar a sua existência e montante quando a questão puder ser resolvida com segurança pelo exame dos documentos apresentados. 12- Sem prejuízo da limitação que a jurisprudência e doutrina descobre nas normas no sentido, quer da relevância e irrelevância da confissão da dívida reclamada ou relacionada por falta de impugnação atempada, nos termos das regras dos nºs 1 e 2 do artº 1106º e 574º nº 2 do CPC, quer da necessidade da demonstração da sua existência por documento, tal exigência de prova documental, não afasta, nem impede, a produção de outras provas para demonstração da sua existência e em ordem à sua verificação pelo julgador, sejam elas requeridas pelos Interessados, mormente os que pugnam pelo reconhecimento da dívida, sejam até oficiosamente determinadas. 13- Como resulta das conclusões anteriores, do confronto do teor da reclamação contra relação de bens deduzida pela recorrente e da resposta à mesmas , bem como da reclamação efetuada por seu marido e respostas às mesmas ainda na fase de tramitação notarial, no que ao passivo respeita, não são postas em causa pelos Interessados que o não reconhecem as inscrições efetuadas no livro e ficheiro Excel juntas como documentos probatórios da existência dos empréstimos efetuados às heranças sob partilha (documentos 1 e 2 da reclamação do recorrente), nem se as mesmas significam e traduzem a transferência das quantias que representam, desde a esfera patrimonial dos falecidos Pai e Mãe, e depois heranças indivisas abertas pelos seus óbitos, para a esfera patrimonial das heranças sob partilha, centrando-se a divergência, sim, quanto à qualificação dessas deslocações patrimoniais, que a recorrente pugna corresponderem a empréstimos efetuados às heranças indivisas sob partilha ao longo de vários anos, e os demais Interessados sustentam terem-se tratado de “entregas feitas pelos herdeiros a título definitivo ao cabeça-de casal, para pagamento dos encargos das heranças e realização de trabalhos de beneficiação dos prédios que as integram”. 14- Por assim ser, data vénia, impõe-se e é essencial para decisão a respeito do reconhecimento desse passivo reclamado pela recorrente, a produção de outras provas para além das documentais, que as esclareçam, complementem e permitam interpretar, e valorar, em específico a prova por confissão, por declarações de parte e testemunhal que permitirá esclarecer a real natureza dessas deslocações patrimoniais, contribuindo decisivamente para o enquadramento factual e contextual em que as mesmas ocorreram e assim possibilitar o seu reconhecimento como passivo das heranças sob partilha, ou não. 15- Nenhuma limitação ocorre no que respeita à prova ou validade dos empréstimos em que a recorrente fundamental a sua pretensão quanto ao passivo objeto de reclamação (nem o Mtmº Juiz a Quo tal convocou para proferir a decisão recorrida) e que as provas requeridas são lícitas e permitidas nos termos da lei substantiva e processual, tanto mais que os documentos probatórios juntos aos autos com o mesmo fim e acima indicados são documentos particulares – artº s 341º, 352º, 362º, 376º, 392º e 396º do CC e artºs 542º, 466º e 495 e seguintes do CPC – estando o exame desses documentos está compreendido e sujeito ao princípio da livre apreciação da prova ínsito no artº 607, nº 5 do CPC e a conclusão a deles extrair para tomada da decisão quanto ao passivo reclamado, deverá ter em conta, quer os referidos documentos, quer as demais provas produzidas a respeito dessa questão e dos factos que lhe inerem (máxime os que permitem interpretar tais documentos) 16- Competindo à recorrente o ónus de demonstração dos factos que alegou para fundamento da sua pretensão de ver ser reconhecido e relacionado o passivo das heranças sob partilha que quantificou na reclamação que deduziu contra a relação de bens – artº 342º do CC.-, tem ela o direito a ver serem produzidas as provas que oportunamente e com a sobredita finalidade requereu, no caso a prestação de depoimentos e declarações de parte e a audição de testemunhas – artºs 410º, 411º e 413º do CPC. 17- Questão e decisão – sobre o reconhecimento do passivo controvertido - que, como decorre das conclusões já acima formuladas, deve ser conhecida e decidida, não só após a produção das provas requeridas e tidas por necessárias, como em momento prévio á Conferência de Interessados, ao invés do se decidiu desacertadamente na decisão recorrida. 18- O direito à prova é parte essencial do direito fundamental de acesso ao direito (artigo 20º da Constituição da República Portuguesa), na vertente do direito a um processo equitativo, constituindo-se como peça fundamental para a realização efetiva do direito de ação judicial, pelo que as regras dos artº 1106º nºs 3 e 4, bem como as do artº 1111º, nº 3 do CPC, entendidas no sentido de imporem que a decisão de reconhecimento de passivo de uma herança, apenas pode ser tomada na conferência de interessados, mediante os posicionamentos dos Interessados na partilha e somente mediante o exame dos documentos que para tanto forem apresentados (sufragado na decisão recorrida), excluindo a produção de quaisquer outras provas, – mesmo a prova por confissão/depoimento de parte ou testemunhal requerida - são inconstitucionais, violando a regra do artº 20º nº 4 da CRP. 19- Pois, então, introduziram uma limitação da parte ao acesso ao direito, na vertente do seu direito à prova e a um processo equitativo, impedindo-a de carrear para os autos os elementos probatórios que permitem influir no exame dos documentos apresentados, seja quanto ao seu teor e ao que representam, seja quanto ao contexto em que foram produzidos, sejam quanto ao que efetivamente pretenderam representar, que viola esse seu direito merecedor de tutela constitucional, 20- A recorrente deduziu oposição ao inventário, alegando, de 19 a 52 dessa sua peça processual, em síntese, factos tendentes a, após prova, demonstrarem ter sido celebrado entre todos herdeiros e interessados um acordo extrajudicial de partilha, global, das heranças em causa nos autos, parcialmente cumprido e formalizado com a celebração de uma escritura pública de partilha (parcial) e revelado, quer em escritos, documentos, e comunicações ao mesmo posteriores, pelo qual a Requerente do Inventário [ 21- Concluiu a recorrente na sua oposição ao inventário, que a conduta da requerente AA de requerer o presente inventário, nele assumindo uma posição própria de Interessada e o direito a quinhoar nos bens ainda indivisos, constitui um inadmissível abuso do direito, e, também, que essa sua conduta traduz a tentativa de obter um locupletamento ilícito e injusto que, de facto e na realidade e por força da iniciativa processual da Requerente e dos atos por ela praticados existe, pois pretende ela através da partilha comungar dos bens imóveis sitos no ..., quando, conforme se alegou supra, já foi e ficou inteirada do quinhão que lhe cabe na herança em que tais bens se integram – ponto 47 da oposição. 22- Para demonstração da existência e celebração desse acordo de partilha, a recorrente alegou na sua oposição os factos e juntou aos autos os documentos [ 23- Na decisão recorrida tomada a respeito da oposição da recorrente ao inventário, ocorre oposição entre os fundamentos convocados na e para a tomada da decisão e a decisão proferida, porquanto, se nela se afirma (a) que o exposto (leia-se, o alegado pela recorrente na sua oposição ao inventário), não traduz uma partilha extrajudicial das heranças sob partilha nos autos), mas apenas meras negociações, (b) que apenas uma partilha extrajudicial formalmente válida, de acordo com as prescrições do artº 2102º do CC, poderia relevar para efeito de se poder “encontrar” na conduta da requerente AA um abuso do direito, que se afirma não se descortinar, para, depois, Acabar por se afirmar decidir não tomar conhecimento – e como tal não decidir - da pretensão da recorrente a tal respeito. 24- Ao afirmar-se na decisão que o alegado pela recorrente apenas pode consubstanciar meras negociações no sentido do estabelecimento de uma partilha extrajudicial, acaba a decisão por se pronunciar em sentido adverso ao acordo extrajudicial de partilhas que a recorrente alegou ter sido efetivamente estabelecido e celebrado entre todos os Interessados, assim conhecendo da sua pretensão, ao invés do afirma decidir, o que nos termos do artº 615º nº 1 línea c) é causa de nulidade da decisão proferida, que expressamente se argui. 25- A decisão tomada, apesar de concluir pela mera possibilidade da existência de simples negociações e não, quer pelo estabelecimento de uma partilha extrajudicial (ainda que inválida por vício de forma), quer pelo estabelecimento de um acordo extrajudicial de partilhas, não especifica um único facto dado por demonstrado, nem uma única razão jurídica ou norma legal, que fundamente tal decisão. 26- Pois a falta da forma exigida pela lei para o estabelecimento válido, eficaz e operante de uma partilha extrajudicial, não obsta a que se possa alegar, e também, demonstrar, que tal partilha ou acordo de partilha extrajudicial foi efetivamente estabelecido Especialmente quando a recorrente alegou que todos os então e únicos herdeiros e interessados nas heranças agora sob partilhas manifestaram a sua vontade em partilhar tais heranças, preenchendo os seus quinhões com a atribuição dos bens e pela forma que também alegou, o que significa terem eles estabelecido um acordo – no caso extrajudicial e verbal – de partilhas dessas heranças, que, obviamente, não se pode manifestar e exteriorizar apenas pela prática de actos escritos e formais que o revelem, como por comportamentos e condutas das partes que o outorgaram. 27- A conclusão afirmada na decisão da possibilidade da existência de meras negociações e não da celebração de um acordo extrajudicial de partilhas (ainda que formalmente inválido), não se fundou num único facto que se tivesse indicado como dado por demonstrado, ou sequer na não demonstração dos factos que, visando a prova da existência e celebração desse acordo, a Recorrente alegou oportunamente, dado que aa decisão recorrida não especifica os seus fundamentos de facto, quer provados, quer não provados. 28- a decisão recorrida desconsiderou, assim, quer a prova documental oferecida e produzida pela recorrente na sua oposição, quer a que seu marido havia oferecido e ela convocou, de onde não extraiu qualquer facto que, tido por provado, a fundamentasse, quer a prova que requereu fosse produzida, nem sequer se pronunciando sobre tais provas, delas concluindo pela demonstração ou não de quaisquer factos. 29- Assim, como sobre tais provas nem sequer emitiu pronúncia, também, com a decisão recorrida, veio a negar e cercear à recorrente o direito a produzir prova – a prova que requereu, visando a demonstração, quer dos factos atinentes à celebração do dito acordo extrajudicial e partilha, quer à conduta abusiva da Requerente do Inventário, assim, indeferindo a prova por confissão, por declarações de parte e testemunhal que a recorrente ofereceu e requereu fosse produzida sobre tais factos, mas também a prova por documentos em poder da parte contrária requerida na oposição, e que era, e é, apta à, e relevante para a demonstração, quer da celebração do acordo de partilhas, quer do abuso de direito. 30- A denegação desta prova pelo despacho recorrido coarctou e inviabilizou severamente a possibilidade de defesa e demonstração, no plano dos factos, dos direitos que a recorrente invoca, designadamente a celebração e um acordo extrajudicial e partilha, o abuso do direito e o enriquecimento sem causa da requerente do inventário, sendo ilícita e redundando numa restrição inadmissível do acesso ao Direito e a um processo justo e equitativo que constitucionalmente lhe cabe, nos termos e fundamentos já expressos nas anteriores conclusões. 31- A decisão recorrida se tenha pronunciado sobre o abuso do direito, não conheceu do enriquecimento sem causa que foi alegado pela recorrente a nº.s 19,51, 127, 128 e no pedido 1 (como fundamento ou excepção relevante para o não reconhecimento à requerente do inventário de um direito a quinhoar nas heranças inventariadas, ou então para a determinar à conferência dos bens que lhe foram adjudicados no âmbito de um acordo de partilha entre os diversos interessados. 32- A decisão recorrida é, data venia, errada ao concluir que dos factos alegados pela recorrente na sua oposição apenas pode resultar a existência de meras negociações e não resulta, (leia-se, nem pode resultar) o estabelecimento de um acordo extrajudicial de partilhas e uma atuação em abuso de direito da Requerente AA, erro, que, vem a inquinar a decisão proferida, ao se decidir omitir a pronúncia sobre a pretensão da recorrente, cerceando-se o direito que a recorrente tem a produzir prova sobre os factos em que a fundou, pois, conforme acima se evidenciou nas conclusões anteriores, a circunstância do acordo extrajudicial de partilha alegado pela recorrente não ter chegado a ser reduzido a escrito num documento e não ter sido observada a forma legalmente exigível para a validade do alegado acordo, não importa, nem significa que o mesmo não tenha (ou possa ter) sido efetivamente estabelecido, ainda que verbalmente, entre os Interessados e herdeiros (isto independentemente da inobservância da forma legal exigida para sua validade). 33- Erra, também, e mais, acaba por não admitir que um acordo de partilha extrajudicial ferido de nulidade por falta de forma, possa produzir efeitos, como o de tornar abusiva conduta contrária ao seu teor e convenções, pois, ao invés do decidido, a nulidade por preterição da forma legal, do alegado e invocado acordo verbal de partilha extrajudicial, não o torna nem incapaz de produzir efeitos jurídicos, nem irrelevante, substantiva e processualmente. 34- A nulidade por vicio de forma de um acordo pode ser restringida por abuso do direito, podendo ser paralisada por abuso do direito, tornando-se nessa medida o negócio, apesar de inválido, eficaz contra o sujeito, por força da inoponibilidade da posição jurídica por ele exercida com abuso. 35- Logrando a recorrente demonstrar, após produção e prova, como é seu direito, que a Requerente do Inventário, seu irmãos e demais Interessados, cumpriram e respeitaram durante décadas o acordo de partilhas que haviam celebrado e que, depois de falecido o Sogro da recorrente – administrador e cabeça-de-casal de tais heranças durante mais de 50 anos - , a requerente do inventário, a Interessada AA, instigada embora por sobrinhos seus, colocou tudo em causa, fazendo tábua rasa e atuando em sentido contrário, quer ao acordo que estabeleceu, quer até à conduta e atuação que antes mantivera, designadamente arrogando ao requerer e intervir neste inventário uma posição e o direito a quinhoar nos bens ainda indivisos (quando nos ternos do acordo celebrado e por ela durante décadas respeitado não o tinha), atua ela com abuso de direito que pode e deve ser paralisado, nos ter[ 36- A decisão recorrida, tudo reduzindo à (in) validade formal do acordo de partilhas extrajudicial alegado, e cerceando o direito da recorrente em produzir a prova que requereu em ordem, já à demonstração do estabelecimento do acordo extrajudicial e partilha que alegou, já à atuação em abuso de direito da Requerente e Interessada AA, é manifestamente ilícita. 37- Conforme resulta da decisão recorrida, no 3º parágrafo do ponto 4), a respeito da reclamação deduzida pela recorrente quanto aos bens móveis a partilhar, decidiu-se, apenas admitir aprova testemunhal requerida e oferecida pela recorrente, assim, pelo menos tacitamente, se indeferindo as demais provas – por confissão (depoimento de parte de todos os Interessados) e por declarações de parte que a recorrente oportunamente – na reclamação- requereu. 38- Decisão de indeferimento, nula e ilícita, quer por não conter qualquer fundamentação, quer por violar o direito da recorrente a demonstrar, através de tais provas, os factos que alegou, nos termos melhor alegados nas conclusões antecedentes e no corpo da alegação. 39- Violou, pois, a decisão recorrida as disposições dos [ Termos em que, V.Exªs julgando procedente o recurso farão JUSTIÇA» A cabeça-de-casal e os demais interessados representados pelo mesmo mandatário apresentaram contra-alegações, pugnando pelo não provimento dos recursos e pela manutenção da decisão recorrida. * Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.*** II - Considerando que o objecto do recurso, sem prejuízo de eventuais questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas suas conclusões (cfr. arts. 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do C.P.C.), e tendo ainda em conta que “as questões que integram o objeto do recurso e que devem ser objeto de apreciação por parte do tribunal ad quem não se confundem com meras considerações, argumentos, motivos ou juízos de valor”, cabendo ao tribunal de recurso “apreciar as questões solicitadas, sob pena de omissão de pronúncia”, mas não “responder, ponto por ponto, a cada argumento que seja apresentado para a sua sustentação” (cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Almedina, 7ª ed. actualizada, 2022, págs. 135 e 136), são as seguintes as questões a tratar, por ordem lógica de precedência:a) nulidade da decisão recorrida; b) violação do caso julgado formal; c) momento do conhecimento da reclamação do passivo e produção das respectivas provas; d) posição da requerente do inventário na partilha decorrente de anterior acordo de partilha. ** Apreciemos a primeira questão.As causas de nulidade da sentença são as que estão taxativamente previstas no art. 615º, nº 1, do C.P.C., não se incluindo entre as nulidades da sentença “o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário” (Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª ed. revista e actualizada, 1985, pág. 686). No caso, entre as alegações de cada um dos recorrentes e as comuns a ambos, embora de forma não exactamente clara e escorreita, e misturada com questões que contendem com eventual erro de julgamento, está invocada a nulidade da decisão recorrida nos termos das alíneas b), c) e d) do nº 1 do art. 615º do C.P.C.. A recorrente QQ invoca a violação da alínea b) por a decisão recorrida, na parte em que se pronuncia sobre a invocada partilha extrajudicial, não especificar os factos, provados e não provados, nem as razões jurídicas ou as normas legais que fundamentam a decisão, e por, na parte em que se pronuncia sobre a prova a produzir quanto à reclamação à relação de bens móveis, não conter qualquer fundamentação (segundo a recorrente, ao admitir apenas a prova testemunhal, o tribunal recorrido indeferiu, pelo menos tacitamente, “as demais provas – por confissão (depoimento de parte de todos os Interessados) e por declarações de parte” que requereu, sem qualquer fundamentação). A situação prevista na alínea b) da referida norma reconduz-se à falta de fundamentação e para que se verifique a nulidade em causa tem de tratar-se de uma falta absoluta, “embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”, não bastando que “a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente” (ob. e auts. cits., pág. 687). Relativamente aos fundamentos de direito, há que salientar que “não é indispensável, conquanto seja de toda a conveniência, que na sentença se especifiquem as disposições legais que fundamentam a decisão: essencial é que se mencionem os princípios, as regras, as normas em que a sentença se apoia” (idem, págs. 687 e 688). No caso concreto, a decisão recorrida, na parte em que se pronuncia sobre a oposição ao inventário apresentada pela recorrente, aprecia os fundamentos de facto invocados, no pressuposto de que os mesmos se verificam [“Do exposto não resulta que efetivamente todos os interessados tenham efetuado uma partilha extrajudicial da herança que aqui se partilha (…) podendo apenas terem existido negociações nesse sentido mas que não se concretizaram”], ou seja, aprecia os factos invocados para inferir que deles não se conclui a ocorrência da alegada partilha extrajudicial. Sendo assim, ao decidir tomando por base o pressuposto da realidade de todos os factos alegados, obviamente não tem que fazer uma apreciação casuística dos factos (nem motivar essa apreciação), posto que, mesmo demonstrando-se todos, a conclusão do tribunal foi a de que os mesmos não traduzem a realização de uma partilha extrajudicial. Ademais, a decisão contém ainda os fundamentos de direito (discussão do aspecto jurídico da causa - ainda que de forma sucinta) em que se baseou para chegar à decisão de que a questão suscitada não tem relevo, não pondo em causa a possibilidade de a requerente do inventário requerer o mesmo – pode-se concordar ou não com os mesmos, mas eles constam da decisão. Ora, pode-se entender que existiu erro de julgamento ou que a decisão não é correcta e é injusta, mas isso não significa que exista falta de fundamentação. Citando o Ac. da R.P. de 13/01/2022, publicado na Internet, em www.dgsi.pt, com o nº de proc. 820/19.2T8STC.E2, “a incompletude ou deficiência da fundamentação empregue na sentença apelada poderá afectar o seu valor intrínseco mas não é, como vimos, reconduzível à nulidade em causa”. E na parte que respeita à reclamação à relação de bens móveis, salvo melhor opinião, não se vislumbra que da mesma se possa concluir que tenha havido um qualquer indeferimento da prova por depoimentos de parte e por declarações de parte. Com efeito, o tribunal pronunciou-se sobre a prova testemunhal, admitindo-a, e pronunciou-se sobre o requerido nas várias alíneas do ponto C), indeferindo-o, por entender que tal não tinha qualquer relevo para a discussão sobre a falta de relacionamento de bens móveis. Se nada diz quanto às declarações de parte e aos depoimentos de parte é porque, pura e simplesmente, não os tomou em consideração, eventualmente não inferindo que estes respeitassem à questão atinente aos bens móveis – se pretendesse indeferir, tê-lo-ia dito expressamente como o fez quanto ao requerimento do ponto C). O que sucede é que a interessada, ora recorrente, não indicou especificamente que pretendia essa prova produzida quanto aos bens móveis cuja falta acusou (aliás, sendo certo que levantou várias questões diferentes no seu requerimento, indicou apenas genericamente que tal prova deveria incidir sobre “todos os factos supra alegados” e “toda a matéria de facto alegada supra”, em desrespeito pela exigência resultante do disposto no art. 452º, nº 2, do C.P.C., também aplicável às declarações de parte por força do art. 466º, nº 2, do C.P.C., onde se determina que hão-de ser indicados “de forma discriminada” os factos sobre que irão incidir o depoimento e as declarações), não cabendo ao tribunal “adivinhar” a concreta factualidade de quais questões deveria ser abrangida pela prova em causa. Portanto, também nesta parte não se pode concluir pela inexistência de fundamentação, desde logo porque nem se pode concluir que foi proferida a decisão que a recorrente invoca. É, assim, de concluir que a decisão recorrida, no que respeita ao que efectivamente foi decidido, contém os fundamentos nos quais se estribou, pelo que não se verifica a nulidade invocada pela recorrente. Não merece, portanto, provimento o recurso da interessada QQ nesta parte. Esta mesma recorrente invoca ainda a violação da alínea c) pela circunstância de ocorrer oposição entre os fundamentos e a decisão na parte respeitante à oposição que apresentou ao inventário. A situação prevista na alínea c), 1ª parte, da norma em causa, respeita aos casos de “oposição entre a decisão e os fundamentos em que ela repousa”, referindo-se a lei “à contradição real entre os fundamentos e a decisão e não às hipóteses de contradição aparente, resultantes de simples erro material, seja na fundamentação, seja na decisão”. Há aqui “um vício real no raciocínio do julgador”, pois “a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente” (idem, págs. 689 e 690). Ora, vista a decisão recorrida, designadamente na parte colocada em crise pela recorrente, verifica-se que a fundamentação e a decisão não estão em contradição, pois que da primeira resulta que o tribunal a quo entende que a questão levantada pela recorrente não constitui nenhum impedimento ao prosseguimento do inventário com todos os interessados, incluindo a requerente do inventário (acrescentando não vislumbrar abuso de direito que a esta não permitisse requerer o inventário) e na parte decisória decide-se precisamente não tomar conhecimento do exposto, por não ter qualquer relevo, em consonância com o que se disse na fundamentação. Mais uma vez, pode-se concordar ou não com a decisão e/ou com os fundamentos, pode-se entender que existiu erro de julgamento ou que a decisão não é correcta e é injusta, mas isso não significa que exista contradição entre os fundamentos e a decisão. Independentemente da concordância ou não com a decisão, da leitura da mesma percebe-se o motivo pelo qual a parte decisória foi no sentido tomado pelo tribunal recorrido. É de concluir, pois, que não ocorre também esta nulidade invocada pela recorrente. Não merece, portanto, provimento o recurso ainda nesta parte. Os recorrentes invocam igualmente a violação da alínea d) da norma em apreço: o recorrente II pela circunstância de o tribunal recorrido se ter pronunciado segunda vez sobre a prova por si requerida quanto ao relacionamento e verificação do passivo e a recorrente QQ por ocorrer omissão de pronúncia quanto à prova requerida e ao invocado enriquecimento sem causa, no que concerne à oposição ao inventário por si apresentada. Na referida alínea d) prevê-se a nulidade da sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. A primeira parte respeita às denominadas situações de omissão de pronúncia e a segunda parte às de excesso de pronúncia. Questões e não argumentos, pois que estes não se confundem com aquelas. O juiz deve pronunciar-se sobre todas as questões com relevo para as pretensões das partes, suscitadas por estas ou de conhecimento oficioso, mas isso não implica que a sua decisão se debruce sobre todos os argumentos esgrimidos, como é jurisprudência pacífica. Além disso, essa apreciação deve existir desde que o conhecimento da questão não se mostre prejudicado pela solução que tenha sido dada a outra questão conhecida previamente. No que respeita à questão do relacionamento do passivo, verifica-se que, ao contrário do que refere o recorrente, o tribunal recorrido não se pronunciou directamente sobre a prova requerida, ou seja, não houve um segundo despacho sobre a mesma questão. Sucedeu apenas que, depois de ter admitido prova a ser produzida, o tribunal, melhor apreciada a questão, considerou-se em posição de decidir a reclamação à relação de bens por aquele apresentada, o que fez, com o que ficou naturalmente prejudicada a produção de prova, o que se declarou [é certo que a expressão utilizada poderá não ter sido a mais feliz, pois que se diz “não se admite qualquer meio de prova”, quando se poderia ter dito “fica prejudicada a produção da prova anteriormente admitida”, mas o segmento anterior da parte decisória em causa não deixa dúvidas de que o decidido se deveu “ao teor da decisão proferida, que considerou ultrapassadas/prejudicadas as questões levantadas”]. Sendo certo que nada impedia o tribunal a quo de, sendo momento de analisar os novos requerimentos entretanto apresentados, apreciar todas as reclamações apresentadas até ao momento e considerar-se em posição de as conhecer sem necessidade de produção de prova. Saber se a decisão proferida sobre a questão poderia ou não ter sido no sentido em que o foi (nomeadamente por violar o caso julgado formal, como alega o recorrente) contende com o mérito da decisão e não com a existência de qualquer nulidade da mesma. No caso concreto, a decisão recorrida conheceu efectivamente as questões que lhe eram colocadas e não extravasou os limites desse conhecimento – reafirma-se: pode-se concordar ou não com a decisão tomada e/ou com os seus fundamentos, pode-se entender que existiu erro de julgamento ou que a decisão não é correcta e é injusta, mas isso não significa que tenha existido excesso de pronúncia. Não merece, portanto, provimento o recurso do interessado II nesta parte. Igualmente não se verifica a omissão de pronúncia assacada à decisão recorrida. Com efeito, a questão a conhecer pelo tribunal recorrido era a da “oposição ao inventário” deduzida pela recorrente, respeitante à existência de partilha extrajudicial anterior e consequente exclusão da interessada requerente do inventário. E a decisão recorrida apreciou efectivamente a questão que lhe era colocada respeitante a esta pretensão da recorrente, concluindo que o exposto não tinha qualquer relevo para o inventário, pelo que “não se toma conhecimento do exposto, que aqui não será discutido”. Ora, obviamente que a circunstância de o tribunal recorrido ter concluído que a questão não tinha relevo e não havia que a discutir no inventário prejudicou a apreciação da eventual produção de prova sobre a questão, para além de que o invocado enriquecimento sem causa constitui um argumento esgrimido pela recorrente como fundamento para a pretendida exclusão da interessada requerente do inventário e não a questão a decidir, que respeita a esta pretensão de exclusão, a qual foi apreciada. Ainda nesta parte, reafirma-se, pode-se concordar ou não com a decisão tomada e/ou com os seus fundamentos, pode-se entender que existiu erro de julgamento ou que a decisão não é correcta e é injusta, mas isso não significa que tenha existido omissão de pronúncia. Não merece, portanto, provimento o recurso da interessada QQ nesta parte. Resta fazer uma referência final à circunstância de se ter constatado anteriormente que o tribunal, a propósito da prova a produzir quanto à relação dos bens móveis, não fez referência às declarações de parte e aos depoimentos de parte requeridos na parte final do requerimento de 22/02/2023 desta interessada. Não tendo a interessada cumprido com a exigência de discriminação dos concretos factos a que pretendia a prova em causa, como já se disse, e, portanto, podendo estar em causa qualquer das várias questões levantadas naquele requerimento, verifica-se que essa produção de prova sempre teria ficado prejudicada relativamente a todas as outras questões apreciadas, com excepção da reclamação à relação de bens móveis. E nesta parte, como decorre do que se disse anteriormente, não pode concluir-se que houve omissão de pronúncia, simplesmente porque o tribunal recorrido pode ter entendido que esta prova não respeitava a esta reclamação. E mesmo o tribunal de recurso não tem como o concluir, na medida em que falta a referida especificação dos factos sobre que irão incidir os depoimentos e declarações. Portanto, não se pode concluir pela existência de qualquer nulidade também quanto a esta circunstância constatada pelo tribunal de recurso. E se acaso a interessada pretende a produção de tal prova, o que tem de fazer (se não o tiver feito ainda no processo) é esclarecer o tribunal a quo da sua pretensão e indicar os concretos factos respeitantes a esta questão sobre que pretende a referida prova e, então sim, verificar se o tribunal decide ou não a expressa questão que nessa parte lhe seja colocada. Concluindo o tratamento desta questão, anota-se que uma coisa é a existência de preterição de formalidades que a lei impõe ou de prática de actos que a lei não permite, outra coisa é o acerto da decisão em si. Os recorrentes podem discordar da bondade da decisão proferida pelo tribunal, o que lhes é legítimo, mas essa sua discordância não significa que aquela padeça de nulidade por esse motivo. * Passemos à segunda questão, sendo a factualidade relevante a que consta do relatório antecedente, retirada da análise do processo principal de inventário.Nos termos do disposto no art. 620º, nº 1, do Código de Processo Civil, as sentenças e os despachos que recaiam unicamente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo. Dispondo ainda o art. 625º, nº 2, do Código de Processo Civil, que, em caso de contradição existente entre duas decisões que, dentro do processo, versem sobre a mesma questão concreta da relação processual, cumpre-se a que passou em julgado em primeiro lugar. “Despacho que recai sobre a relação processual é todo aquele que, em qualquer momento do processo, aprecia e decide uma questão que não seja de mérito”, “tendo apenas eficácia intraprocessual” (António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil anotado, Vol. I, 3ª ed., Almedina, pág. 802). O caso julgado formal “é a simples preclusão dos recursos ordinários” e o seu fundamento é “uma razão de disciplina ou ordem no desenvolvimento do processo” (cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Ed., 1993, pág. 304). Como resulta do que decorre das normas citadas, o caso julgado formal pressupõe que exista uma efectiva apreciação de determinada questão processual e a contradição entre julgados pressupõe que as duas decisões se pronunciem sobre a mesma concreta questão processual. Com efeito, “o caso julgado, seja formal ou material, pressupõe o pronunciamento jurisdicional sobre uma determinada questão suscitada pelas partes ou decorrente dos poderes oficiosos do tribunal. A decisão jurisdicional conformadora de caso julgado tem necessariamente um objecto (a factualidade submetida à apreciação jurisdicional) e um conteúdo (o sentido da valoração judicial)”. Já o despacho que seja “nitidamente tabelar ou genérico”, “que não se pronuncia em concreto” sobre a questão a que respeita, contendo “apenas mera declaração” sobre a mesma, “sem a apreciar directamente”, “não é susceptível de constituir caso julgado formal”, posto que o tribunal não emite qualquer pronúncia, qualquer valoração jurídica (cfr. Ac. do S.T.J. de 23/03/2021, publicado em www.dgsi.pt, com o nº de proc. 2551/18.1T8VCT.G1.S1). No caso, ocorre que: - por um lado, o primeiro despacho referido pelo recorrente (de 23/09/2022) é um despacho tabelar ou genérico, quanto à admissão das provas, pois que apenas se limita a admitir genericamente “a prova indicada”, não se pronunciando especificadamente sobre a concreta prova por declarações de parte, a concreta prova por depoimento de parte e a concreta prova testemunhal, não apreciando nenhuma efectiva questão de admissibilidade ou não que quanto a elas se colocasse; - por outro lado, o despacho recorrido não se pronuncia sobre a mesma questão processual, ou seja, no caso, a admissibilidade da prova indicada pelo ora recorrente, antes conhece da questão da reclamação apresentada quanto ao passivo, cuja solução prejudicou a produção da prova anteriormente admitida. Com efeito, como se disse a propósito da primeira questão, a decisão recorrida “não se pronunciou directamente sobre a prova requerida”, não havendo “um segundo despacho sobre a mesma questão”. “Sucedeu apenas que, depois de ter admitido prova a ser produzida, o tribunal, melhor apreciada a questão, considerou-se em posição de decidir a reclamação à relação de bens por aquele apresentada, o que fez, com o que ficou naturalmente prejudicada a produção de prova, o que se declarou [é certo que a expressão utilizada poderá não ter sido a mais feliz, pois que se diz “não se admite qualquer meio de prova”, quando se poderia ter dito “fica prejudicada a produção da prova anteriormente admitida”, mas o segmento anterior da parte decisória em causa não deixa dúvidas de que o decidido se deveu “ao teor da decisão proferida, que considerou ultrapassadas/prejudicadas as questões levantadas”].” Portanto, é de concluir que nem o despacho de 23/09/2022 fez caso julgado quanto à admissibilidade das provas (pelo que, por exemplo, aquando da inquirição das pessoas até poderia constatar-se algum impedimento, podendo o tribunal nessa altura recusar alguma audição, independentemente do despacho anteriormente proferido), nem o despacho recorrido se pronuncia sobra a questão da admissibilidade das provas, isto é, não aborda a mesma questão processual. O que significa que não ocorre a violação do caso julgado invocada pelo recorrente II, não merecendo provimento o recurso nesta parte. * Vejamos agora a terceira questão, sendo a factualidade relevante igualmente a que consta do relatório antecedente.Os recorrentes pretendem que a decisão recorrida não podia ter relegado o conhecimento da reclamação do passivo para a conferência de interessados, invocando o disposto no art. 1106º do C.P.C.. Incorrem, porém, num erro. É que esta norma respeita às situações de dívidas relacionadas pelo cabeça-de-casal, regulando o que fazer caso haja, ou não, impugnação das mesmas por algum dos interessados ou por todos. Sendo neste caso que a questão da impugnação do passivo tem de ser decidida em momento prévio à conferência de interessados (note-se o que consta do art. 1104º do C.P.C.: os interessados podem, além do mais, apresentar reclamação à relação de bens e impugnar os créditos e as dívidas da herança). Ora, não é esta a situação dos autos, em que não foi relacionado qualquer passivo pela cabeça-de-casal, nada havendo que impugnar nessa parte pelos interessados, nem qualquer decisão de verificação do passivo a tomar nos termos do art. 1106º do C.P.C.. Com efeito, o que sucede nos autos é uma originalidade, que o legislador nem sequer previu expressamente: a reclamação por parte de dois interessados de uma suposta dívida da herança não relacionada pelo cabeça-de-casal, que onera todos os herdeiros, incluindo o próprio reclamante (e a reclamante cessionária). Pois que, de acordo com as regras da experiência, não é normal admitir que um herdeiro venha reclamar a consideração de uma dívida da herança a um terceiro que não foi relacionada. Assim, a lei prevê, quanto ao passivo: - que o mesmo seja relacionado pelo cabeça-de-casal, podendo os restantes interessados no inventário impugnar a sua existência e/ou o seu montante (arts. 1097º, nº 3, al. d), 1098º, nº 3, e 1104º, nº 1, al. e), todos do C.P.C.); - que o mesmo, não sendo relacionado pelo cabeça-de-casal, possa ser reclamado pelos credores respectivos até à conferência de interessados (cfr. art. 1088º do C.P.C.). Na primeira situação a verificação do passivo é efectuada nos termos do art. 1106º do C.P.C., na segunda situação a apreciação poderá ter lugar na conferência de interessados em conformidade com o disposto no art. 1111º, nº 3, do C.P.C.. Anote-se que os reclamantes não assumem a posição de credores, qualquer deles, no passivo que reclamam. Tendo em conta a descrição fáctica que efectuam, a credora será a herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de FF (filho dos ora inventariados e pai e sogro dos reclamantes), na qual os reclamantes assumem a posição de interessados, mas não os únicos – devendo a mesma ser representada por todos os herdeiros no exercício do direito de reclamação do crédito, atento o disposto no art. 2091º, nº 1, do C.P.C.. Ainda assim, assumindo-se que se esteja perante uma situação equiparável à do art. 1088º do C.P.C., não obstante não ser a herança a reclamar o crédito, então, tal como decidido pelo tribunal recorrido, a questão deverá ser apreciada na conferência de interessados (veja-se que, mesmo tendo a reclamação sido apresentada antes, porque até à conferência podem ser apresentadas outras reclamações de outros credores, é adequado que tudo seja decidido de uma só vez nesta ocasião, isto é, no momento final para apresentação de reclamações pelos credores). Neste sentido, veja-se João Espírito Santo, O inventário judicial: genealogia, recodificação e regime geral, in Revista de Direito Comercial, “liber amicorum”, págs. 278 a 283 e 299 a 302, disponível para consulta, e onde consultámos, na Internet, em https://www.revistadedireitocomercial.com/o-inventario-judicial-genealogia-recodificacao-e-regime-geral). Igualmente indicando o caso previsto no art. 1088º do C.P.C. como exemplo de situação de apreciação do passivo a submeter à conferência de interessados, veja-se António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil anotado, Vol. II, 2ª ed., Almedina, pág. 627. Insurgem-se ainda os recorrentes com a circunstância de que esta apreciação na conferência de interessados não permitirá a produção de outras provas indicadas, tendo o despacho recorrido aduzido que a questão será conhecida “considerando a posição que os interessados nessa altura manifestarem e os documentos juntos que o possam comprovar”. Ora, o despacho recorrido limitou-se a aplicar a esta situação o mesmo princípio de apreciação do passivo que decorre do art. 1106º, nº 3, do C.P.C., sendo que, obviamente, não havendo acordo dos interessados, caberá ao juiz decidir e nessa circunstância, ou os documentos juntos permitem com segurança verificar a questão da existência da dívida ou não permitem (o que defendem os recorrentes), caso em que o juiz remeterá as partes para os meios comuns, onde poderão produzir todas as provas que entenderem relevantes ao caso – a posição dos recorrentes não fica fragilizada, pois a apreciação dos documentos não serve apenas para decidir que a dívida existe, também serve para decidir que a mesma não existe de acordo com o mesmo princípio: “a questão puder ser resolvida com segurança pelo exame dos documentos apresentados”. Assim, caso os documentos não permitam concluir com segurança nem por uma coisa, nem por outra (que é o que defendem os recorrentes), a decisão do juiz não pode ser a do não reconhecimento da existência da dívida, mas a remessa das partes para os meios comuns, de acordo com o princípio geral do art. 1093º do C.P.C. – e com isso, o direito à prova dos recorrentes está sempre salvaguardado. Conclui-se, assim, que não merece reprovação o despacho recorrido na parte em que relegou o conhecimento da reclamação quanto ao passivo para a conferência de interessados. Pelo que, também nesta parte não podem obter provimentos os recursos apresentados pelos recorrentes. * Resta apreciar a quarta questão, sendo a factualidade relevante a que consta do relatório antecedente e ainda a seguinte, retirada da análise do processo principal de inventário:1) Por escritura de partilha, outorgada no dia 13/02/1996, no Primeiro Cartório Notarial do Porto, FF e mulher, HH, como primeiros outorgantes, por si e na qualidade de procuradores de GG e mulher, LL, EE, como segunda outorgante, AA, como terceira outorgante, e RR, marido da segunda outorgante, como quarto outorgante, declararam que: “no dia dois de Fevereiro de mil novecentos oitenta e nove, na freguesia ..., desta cidade, onde teve a sua última residência habitual, na Rua ..., faleceu, sem testamento ou qualquer outra disposição de bens de sua última vontade, DD, natural da freguesia ..., concelho de Baião, no estado de viúva. Que, como herdeiros, lhe sucederam, seus filhos atrás identificados, primeiro outorgante marido e seu representado marido, a segunda e a terceira outorgantes, devidamente habilitados por escritura de vinte e oito de Novembro de mil novecentos e oitenta folhas 78, do respectivo livro no e nove, lavrada folhas 197-C, deste Cartório. Que, pela presente escritura, procedem à partilha do seguinte bem da herança da falecida DD: ---Prédio urbano, destinado a habitação, composto por casa de três pavimentos, cave, rés do chão e andar, com logradouro, sito na Rua ..., da freguesia ..., desta cidade, descrito na Primeira Conservatória do Registo Predial do Porto sob o número ..., a folhas ..., do Livro ..., registado a favor da autora da herança por inscrição ..., a folhas ..., do Livro ..., e inscrito na respectiva matriz sob o artigo ..., com o valor patrimonial de 239 760$00. Que atribuem ao referido imóvel e a esta partilha o referido valor patrimonial de DUZENTOS TRINTA E NOVE MIL SETECENTOS E SESSENTA ESCUDOS. Que o referido valor divide-se por quatro, por tantos serem os herdeiros da falecida, para se calcular o quinhão hereditário de cada um, que é de CINQUENTA E NOVE MIL NOVECENTOS E QUARENTA ESCUDOS. Que procedem à partilha propriamente dita, adjudicando à terceira outorgante, para pagamento do seu quinhão, î identificado imóvel, no valor de DUZENTOS E TRINTA E NOVE MIL SETECENTOS E SESSENTA ESC[ E que os primeiro outorgante e seu representado marido e a segunda outorgante já receberam, em dinheiro, da terceira outorgante, a respectiva torna.”, tendo ainda o quarto outorgante declarado que presta consentimento ao seu cônjuge para esta partilha; 2) Por escritura de compra e venda, outorgada no dia 10/04/1995, no Primeiro Cartório Notarial do Porto, SS, como primeira outorgante, AA, como segunda outorgante, e TT, como terceira outorgante, declararam: a primeira outorgante que “com reserva para si e, por sua morte, para sua irmã, a terceira outorgante, do respectivo usufruto, vende à segunda, pelo preço de DUZENTOS E SETENTA MIL ESCUDOS, que dela já recebeu, a raiz ou nua propriedade do seu prédio urbano constituído por dois pavimentos, com logradouro, sito na Rua ... e cento e doze, da freguesia ..., concelho ..., descrito na Segunda Secção da Segunda Conservatória do Registo Predial, desta cidade, sob o número ... a folhas três verso do Livro ..., e inscrito na matriz urbana sob o artigo ..., com o valor fiscal de DUZENTOS SESSENTA E SETE MIL OITOCENTOS E QUARENTA ESCUDOS”; declarando a segunda outorgante que “aceita o presente contrato” e a terceira outorgante que “aceita a reserva do usufruto”. Pretende a recorrente que a requerente do inventário, filha dos inventariados, não tem direito a quinhoar nas heranças sob inventário, porque, por acordo de partilha extrajudicial (e verbal) já foi inteirada do seu quinhão na totalidade, tendo recebido os imóveis a que respeitam as duas escrituras acabadas de referir. Alegou que o acordo se concretizou na escritura de partilha referida no ponto 1 e que, ao contrário do aí declarado, não pagou quaisquer tornas aos irmãos e o valor do imóvel indicado não corresponde à verdade. Invoca ainda que estamos apenas perante uma situação de nulidade por vício de forma, que pode ser paralisada com recurso à figura do abuso de direito, e pretende produzir prova para demonstrar o por si alegado. Salvo o devido respeito, desde logo se diga que a situação relatada não configura qualquer situação de nulidade por vício de forma, ou seja, não estamos perante um caso em que tenha sido efectuado um negócio jurídico de partilha extrajudicial, parcial, respeitante apenas a uma única herdeira, por acordo verbal não reduzido a escrito – aí, sim, haveria um vício de forma, por o negócio, respeitante a imóveis, não respeitar a forma legalmente prescrita (cfr. art. 80º, nº 2, al. l), do Código do Notariado, na redacção em vigor à data da escritura de partilha referida no ponto 1, e art. 220º do C.C.). Estamos antes perante a alegação de uma situação de simulação relativa (cfr. art. 241º do C.C.). Com efeito, existe um negócio formal que foi feito, que consistiu na partilha de um único bem (um imóvel) pertencente à herança da inventariada DD, por todos os herdeiros, tendo o bem sido adjudicado a uma das herdeiras e os restantes recebido tornas, e vem alegar-se que o negócio que se quis fazer na realidade foi uma partilha de duas heranças, dos dois inventariados, relativamente apenas a uma das herdeiras, a qual foi inteirada com referido imóvel e ainda um outro que não estava registado em nome de qualquer dos inventariados, e relativamente ao qual existe uma escritura de venda, anterior, em que a vendedora é uma pessoa diferente dos inventariados, tendo ficado completamente preenchido o seu quinhão, até porque não pagou quaisquer tornas. Ora, para além do aparente absurdo desta alegação, o que se verifica desde logo é que ocorrem aqui alguns obstáculos a que a questão possa ser decidida no inventário: - no inventário só podem partilhar-se bens dos inventariados, existentes à data dos respectivos óbitos: o imóvel de Vila Nova de Gaia não era dos inventariados, tendo inclusivamente sido vendido por uma terceira pessoa, à ora requerente do inventário, por escritura pública; - foram realizados dois negócios jurídicos formais, que se pretendem pôr em causa, invocando factos contrários ao que consta dos documentos, incluindo quitação do pagamento de tornas, em termos de se concluir estar perante negócios simulados, com a pretensão de os demonstrar com a recurso a prova por declarações de parte, depoimentos de parte e testemunhas. Tendo em conta as diversas restrições de prova que decorrem do direito probatório material existentes no Código Civil, facilmente se constata que a questão levantada nunca poderia ser conhecida no presente inventário. Na verdade: - no negócio referido no ponto 2 intervieram terceiras pessoas que não são (ou os seus herdeiros) parte no presente inventário; - no negócio referido no ponto 1 foi dada quitação do pagamento de tornas pelos três irmãos da ora requerente do inventário (à data os únicos herdeiros dos ora inventariados), o que, tratando-se de uma declaração confessória inserida num documento autêntico e feita perante o próprio devedor de tornas, faz prova plena do declarado, nos termos do art. 358º, nº 2, do Código Civil – assim, esta prova só pode ser contrariada nos termos do art. 347º do Código Civil e não é admitida prova testemunhal (cfr. art. 393º, nº 2, do C.C.), nem prova por declarações de parte (cfr. Luís Filipe Pires de Sousa, Direito Probatório Material, Almedina, 2ª ed., 2021, pág. 279) – podendo, antes, haver lugar a uma acção autónoma de declaração de nulidade ou anulação da confissão (art. 464º do C.P.C.); - estando em causa a simulação, no caso invocada por cessionária de quinhão hereditário de um dos simuladores (o que a equipara a herdeira, para este efeito), a recorrente sucede “na precisa situação jurídica de natureza não pessoal que tinha o autor da herança”, sendo-lhe aplicável “as restrições de prova que impendiam sobre o simulador”, até porque, no caso, não estão em causa “interesses específicos da sua posição” de cessionária, nem a defesa de “um direito próprio” contra os actos simulados do seu sogro (idem, págs. 225 e 226). Sendo assim, igualmente quanto ao acordo simulatório e ao negócio dissimulado é inadmissível prova testemunhal, nos termos do art. 394º, nºs 1 e 2, do Código Civil, e prova por declarações de parte. Sendo a situação a acabada de descrever, afigura-se-nos manifesto que esta questão não pode ser resolvida no inventário, não só porque não se enquadra nas funções do inventário previstas no art. 1082º do C.P.C., mas também porque, ainda que se entenda que poderia estar em causa a definição de direitos de interessados directos na partilha, trata-se de questão cuja complexidade, nomeadamente ao nível probatório, torna inconveniente a sua apreciação neste processo (cfr. art. 1093º do C.P.C.). Donde, e independentemente daquela que foi a, sucinta, fundamentação do despacho recorrido, certo é que o mesmo acertou quando assume que não há que tomar conhecimento da referida questão no inventário (anotando-se que o recurso aos meios comuns, no caso, está à disposição das partes, mesmo que tal não seja expressamente dito no despacho que não conhece da questão). Perante o exposto, é de concluir que deve manter-se a decisão recorrida, sendo negado provimento ao recurso da interessada QQ também nesta parte. * Uma nota final quanto à invocação, transversal a todas as questões levantadas nos dois recursos, da violação do direito à prova dos interessados recorrentes.Como se vê da análise de todas as questões apreciadas no recurso, as decisões tomadas pelo tribunal recorrido em nada contenderam directamente com o direito à prova, não tendo posto em causa por qualquer forma esse direito. A não produção de prova no caso deveu-se a ter ficado prejudicada pelas soluções dadas às questões apreciadas pelo tribunal recorrido, que não importaram a necessidade de produção de prova. * Em face do resultado do tratamento das questões analisadas, é de concluir pela não obtenção de provimento dos recursos interpostos pelos interessados II e QQ e pela consequente confirmação da decisão recorrida.*** III - Por tudo o exposto, acorda-se em negar provimento aos recursos, confirmando-se a decisão recorrida.** Custas das apelações pelos recorrentes (art. 527º, nºs 1 e 2, do C.P.C.).* Notifique.** Sumário (da exclusiva responsabilidade da relatora - art. 663º, nº 7, do C.P.C.):……………………………… ……………………………… ……………………………… * Porto, 20/06/2024datado e assinado electronicamente * Isabel Ferreira Ernesto Nascimento António Paulo Vasconcelos |