Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | EUGÉNIA PEDRO | ||
Descritores: | RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO COM FUNDAMENTO EM FACTO PREVISTO NO N.º 2 DO ARTIGO 394.º DO CT DANOS INDEMNIZÁVEIS | ||
Nº do Documento: | RP202406282255/22.0T8VFR.P1 | ||
Data do Acordão: | 06/28/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 4. ª SECÇÃO SOCIAL | ||
Área Temática: | . | ||
Sumário: | I - Nas situações caso de resolução do contrato de trabalho com fundamento em facto previsto no n.º 2 do artigo 394.º do Código do Trabalho, o trabalhador tem direito, nos termos do nº1 do art. 396º do C.Trabalho a uma indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, a fixar pelo critério aí enunciado. Porém, se o montante efectivo dos danos patrimoniais e não patrimoniais exceder o limite máximo resultante desse nº1, ao trabalhador assiste o direito, nos termos do nº3 do mesmo artigo, à indemnização correspondente ao valor efectivo dos danos, que exclui a resultante do nº1. II - Os factos provados em sentença, transitada em julgado, proferida num processo de impugnação judicial de decisão administrativa proferida pela Autoridade das Condições do Trabalho contra um empregador não podem ser transpostos para uma acção declarativa emergente de contrato de trabalho que aprecie a mesma questão, intentada pelo trabalhador contra o mesmo empregador, porquanto, atenta a diferente natureza dos processos e a falta de identidade das partes, não é configurável nem a excepção de caso julgado, nem a autoridade do caso julgado. (elaborado pela relatora, nos termos do nº7 do art. 663º do C.P.Civil) | ||
Reclamações: | |||
Decisão Texto Integral: | Apelação-Proc.2255/22.0T8VFR.P1 Juízo do Trabalho de Stª Mª da Feira-J2 Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I - Relatório AA, residente na Rua ..., ... ..., intentou a presente Acção Emergente de Contrato Individual de Trabalho, com processo comum, contra ”Escola de Condução A..., Ldª”, NIPC ...68, com sede na Rua ..., ..., em ..., peticionando que: - Se reconheça e declare que a resolução do contrato de trabalho que mantinha com a Ré, por si operada, com invocação de justa causa, foi lícita, e consequentemente, seja a Ré condenada a pagar-lhe a quantia de 27.855,54€, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, até integral pagamento. A fundamentar a sua pretensão, alegou, em síntese, que resolveu o seu contrato de trabalho com a Ré em 03.06.2022, invocando justa causa, porquanto realizou quarenta e três horas e cinquenta minutos de horas extraordinárias / trabalho suplementar nos anos de 2020, 2021 e até ao mês de Julho de 2021, cuja remuneração, no valor de € 132,34 não lhe foi paga pela ré, apesar de tal lhe ter sido solicitado repetidamente. Além disso, o pagamento dos subsídios em duodécimos foi desde Outubro de 2015 mal calculado e indevidamente pago, porquanto a Ré calculou e pagou os subsídios em duodécimos apenas sobre o vencimento base, sem incluir as diuturnidades e o acréscimo respeitante ao exercício das funções de Directora de Escola, função que a autora desempenhava, encontrando-se em dívida para com a autora nos seguintes montantes: 1391,43€, entre Outubro de 2015 e Setembro de 2021; 100,40€, entre Outubro de 2021 e Maio de 2022. E até meados de Agosto de 2021 a ré reconhecia à autora três diuturnidades que lhe pagava, sendo que em Junho de 2021 adquiriu o direito a uma quarta diuturnidade que nunca lhe foi paga. Sucede que, a partir do final do mês de Agosto de 2021, a nova gerência da R. passou a pagar-lhe apenas uma diuturnidade, apesar de estar ciente, como estava, de que a autora tinha como data de admissão 1 de Outubro de 2008. A ré assumiu ao longo de vários meses comportamentos reiterados e repetidos de não pagamento, mesmo depois de instada consecutivamente pela autora e pelo seu advogado - não só nada dizendo, como nada pagando, fazendo com que a autora visse a sua retribuição diminuída, causando-lhe danos e transtornos e incómodos, causando-lhe abalo moral. Por todos estes factos, resolveu o contrato de trabalho, com justa causa, assistindo-lhe o direito a ser indemnizada, devendo a indemnização ser calculada com base em 40 dias de retribuição por cada ano, reclama igualmente o pagamento dos créditos salariais em dívida, a título de formação e proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal (cinco meses) do ano de 2022, devendo ainda ser indemnizada pelos danos morais sofridos, a fixar em valor não inferior a €1.500. * Realizada a audiência de partes em 15.09.2022, as partes não se conciliaram. (cfr. ata de fls.77)* A R. contestou a ação e deduziu incidente de intervenção principal provocada da transmitente sociedade “Escola de Condução B..., Lda, ao abrigo do disposto no artº 317º, nº 1 do C.P.C. ex vi artº 1º, nº2, do Cód. Proc. Trabalho, a fim de nesta ação ficar reconhecida aquela responsabilidade solidária e a condenação na satisfação do direto de regresso da Ré sobre a chamada quanto aos créditos que vierem a ser reconhecidos à Autora relativamente ao período temporal que vai até 10.08.2021. Alega que a A. foi inscrita na Segurança Social como trabalhadora dependente da sociedade Ré em 30.06.2017 e só nessa data começou a laborar na Ré, sendo que na cláusula sétima do contrato de cessão de quotas outorgado a 10.08.2021 e anexo II ao mesmo, outorgado a 10.08.2021, consta a identificação da Autora como sendo a única trabalhadora da sociedade cedente e que a sua data de admissão foi a 30.06.2017. Além disso, no referido contrato, quem outorga em nome e em representação da cedente “Escola de Condução B..., Lda” onde declara e subscreve que a A. apenas foi admitida na Ré em 30.06.2017 é a mesma pessoa que assinou a declaração junta como documento nº24 com a petição. Mais refere que, aquando da rescisão do contrato de trabalho por iniciativa da trabalhadora, que se efetivou em 30.06.2022 na sequência da carta enviada pela Autora e recebida pela Ré a 07.06.2022 veio a ser por esta efetuado o pagamento à A. da quantia global € 1.853,06, tendo emitido a declaração da situação de desemprego (Mod. 5044) com a indicação de que cessação do contrato operou por denúncia da trabalhadora, e enviou por carta registada à trabalhadora, que veio a ser devolvida. Mais alega que o atual representante da Ré que assumiu a gerência em Agosto 2021 desconhecia a divergência entre a A. e a anterior gerência da Ré por não lhe ter sido transmitido ou dado conhecimento da divergência entre a trabalhadora e a Escola de Condução A..., quanto a essas concretas questões, sendo que a Ré efetuou o aludido pagamento no final do contrato, no pressuposto que tinha para si como certo de que a A. estava a rescindir livre e unilateralmente o seu contrato de trabalho, de forma amigável, e que com tal pagamento a mesma se considerava paga de todos os créditos que considerava ter para com a Ré. Concluiu que os factos alegados pela A. não constituem fundamento para a resolução do seu contrato por justa causa e, mesmo que assim se não entenda, não é justificada a fixação da indemnização em 40 dias de retribuição. * Por requerimento datado de 10.11.2022, a A. pronunciou-se quanto à requerida intervenção principal provocada, quanto à matéria de exceção deduzida na contestação e quanto aos documentos juntos pela Ré.* Por despacho de 25.11.2022, fixado à acção o valor de €27.939,11.Foi proferido despacho saneador, tendo sido indeferida a requerida intervenção principal provocada da sociedade transmitente “Escola de Condução B..., Ldª” e dispensou-se a fixação do objeto do litígio e dos temas de prova. * Realizou-se a audiência de julgamento, com observância das formalidades legais, no termo da qual foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:Pelo exposto, o Tribunal decide julgar parcialmente procedente a presente ação, e consequentemente, condenar a Ré a reconhecer a justa causa de resolução do contrato de trabalho operada pela A. e a pagar-lhe: a)- a quantia de €12.485,80 (doze mil, quatrocentos e oitenta e cinco euros e oitenta cêntimos), a título de indemnização pela resolução por justa causa, acrescida de juros de mora, calculados desde a data do trânsito da presente decisão, à taxa legal de 4% e até integral pagamento; b)- a quantia líquida de €1.491,83 (mil, quatrocentos e noventa e um euros e oitenta e três cêntimos), a título de diferenciais entre os valores pagos, em duodécimos, a título de subsídio de férias e subsídio de Natal, e os devidos, entre outubro de 2015 a maio de 2022; c)- a quantia líquida de €801,10 (oitocentos e um euros e dez cêntimos), a título de diuturnidades em dívida dos meses de junho e julho de 2021 e agosto de 2021 a maio de 2022; d)- a quantia ilíquida de €2.971,60 (dois mil, novecentos setenta e um euros e sessenta cêntimos), a título de formação não ministrada.; e) Às quantias referidas em b- e d- acrescem juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data dos respetivos vencimentos, até efetivo e integral pagamento. f)- condeno a Ré a pagar à Autora, a quantia de €750 (setecentos e cinquenta euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida dos juros a contar do trânsito em julgado da presente decisão, até integral pagamento. g)- No mais, absolver a Ré dos pedidos. Custas da ação, por A. e R., na proporção do decaimento, nos termos do artigo 527º, nºs 1 e 2, do CPC. Registe e Notifique.” Inconformada com a decisão, a Ré apelou da sentença, terminando as suas alegações com as conclusões que se transcrevem: 1. O presente recurso tem na sua génese a sentença da Meritíssimo Juiz a quo que julgou parcialmente procedente, por provada, a acção pela A. intentada e, em conformidade, condenou a R. a reconhecer a justa causa de resolução do contrato de trabalho operada pela A. e a pagar-lhe: a) a quantia de €12.485,80 (doze mil, quatrocentos e oitenta e cinco euros e oitenta cêntimos), a título de indemnização pela resolução por justa causa, acrescida de juros de mora, calculados desde a data do trânsito da presente decisão, à taxa legal de 4% e até integral pagamento; b) a quantia líquida de €1.491,83 (mil, quatrocentos e noventa e um euros e oitenta e três cêntimos), a título de diferenciais entre os valores pagos, em duodécimos, a título de subsídio de férias e subsídio de Natal, e os devidos, entre outubro de 2015 a maio de 2022; c) a quantia líquida de €801,10 (oitocentos e um euros e dez cêntimos), a título de diuturnidades em dívida dos meses de junho e julho de 2021 e agosto de 2021 a maio de 2022; d) a quantia ilíquida de €2.971,60 (dois mil, novecentos setenta e um euros e sessenta cêntimos), a título de formação não ministrada.; e) Às quantias referidas em b- e d- acrescem juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data dos respetivos vencimentos, até efetivo e integral pagamento. f) a quantia de €750 (setecentos e cinquenta euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida dos juros a contar do trânsito em julgado da presente decisão, até integral pagamento. g) No mais, absolver a Ré dos pedidos. 2. A Recorrente pretende a reapreciação da matéria de facto, isto por um lado, por outro lado foi decidido no âmbito de um outro processo, Processo n.º 1151/22.6T8VFR- juiz 2, a questão da antiguidade da A., tendo sido dado como provado que a A. era trabalhadora da R. desde 2011, decisão esta já transitada em julgado, pelo que e quanto a este facto formou-se caso julgado, e para o Venerando TRIBUNAL da Relação do Porto, com efeito meramente devolutivo subida nos próprios autos. 3. A douta sentença de que ora se recorre não deixou de constituir uma surpresa para a ora recorrente, pelo peso da condenação que sobre si recaiu (que – a vingar - ultrapassará os EUR. 12.485, 80 de indemnização - a não ser que seja, ainda que parcialmente, revertida por esse Venerando Tribunal, como é de justiça). 4. É certo que a recorrida realizou quarenta e três horas e cinquenta minutos de horas extraordinárias / trabalho suplementar, relativas aos anos de 2020 e 2021 e até ao mês de Julho de 2021, que não lhe foram pagas pela recorrente, apesar de tal lhe ter sido solicitado repetidamente. 5. Essas horas devidas ascendem à quantia de EUR. 132,24, o que face ao valor da condenação (EUR. 12.485, 80) é manifestamente desproporcional. 6. Para o efeito deveria o Tribunal a quo ter em consideração os seguintes fatores, nomeadamente que: a) a R. efectuou o pagamento à A. da quantia global € 1.853,06, emitiu a declaração da situação de desemprego (Mod. 5044) com a indicação de que cessação do contrato operou por denúncia da trabalhadora; b) atual representante da recorrente que assumiu a gerência em Agosto 2021 desconhecia a divergência entre a recorrida e a e a anterior gerência da recorrente; c) recorrente efetuou o aludido pagamento no final do contrato, no pressuposto que tinha para si como certo de que a recorrida estava a rescindir livre e unilateralmente o seu contrato de trabalho, de forma amigável, e que com tal pagamento a mesma se considerava paga de todos os créditos que considerava ter para com a recorrente. 7. A Meritíssima Juiz a quo deu como provado que a Recorrente “estava ciente de que a autora tinha como data de admissão 1 de outubro de 2008 (facto provado 10). 8. Porém, os elementos de prova junto aos autos quanto a este facto são insuficientes ou mesmo inexistentes, desde logo, porque: a) o contrato de cessão de quotas outorgado a 10.08.2021 constar a identificação da recorrida como a única trabalhadora da sociedade cedente e que a sua data de admissão foi a 30.06.2017; b) ser essa a informação que consta da comunicação de admissão de trabalhador na Segurança Social; c) ser essa a informação que consta dos documentos da contabilidade e da informação do contabilista. 9. E é por isso que, a partir do dia em que o a quota foi transmitida para o atual titular, o Exmo. Sr. BB, que os recibos de passaram a indicar a data de admissão da recorrente, 30/06/2017, porque era esta a data que a recorrida tinha como certa, verdadeira e única. 10. Neste sentido foi o depoimento de parte, Exmo. Sr. BB, na audiência do dia, 2023-02-03 sistema Habilus Média Studio 2255-22.0T8VFR_2023-02-03_10-14-42, que a instância da Meritíssima Juiz a quo disse o seguinte (00:04:54 a 00:16:33). 11. Exmo. Sr. BB, até pela idade, que tem, 83 anos, acreditou e confiou sempre na bondade das informações que lhe prestavam pela anterior gerência, que alias estava a ser coadjuvada por advogada. 12. Acresce que, a Meritíssima juíza a quo, que proferiu a presente decisão que ora se recorre, foi a mesma Juiz de Direito que proferiu a decisão no âmbito do Proc, n.º 1151/22.6T8VFR do Juízo do Trabalho de Santa Maria da Feira – Juiz 2 do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro (cfr. Doc. n.º 1). 13. Esta decisão foi proferida a 23.06.2022, tendo já transitada em julgado. 14. No âmbito da decisão Proc, n.º 1151/22.6T8VFR, a mesma Juiz de Direito, deu como provado entre outros, o seguinte facto: “só quando a trabalhadora deixou de exercer funções para a C..., Lda e passou afaze-lo para a arguida, facto que ocorreu em julho de 2017, é que esta ultima sociedade assumiu por escrito a antiguidade que a trabalhadora já tinha adquirido desde que iniciou funções na C..., Lda, depois de ser cessado contrato de trabalho com a empresa Escola de Condução B..., Lda, ou seja desde Outubro de 2011. (facto provado n.º 30 do Doc. n.º 1). 15. Por outro lado, deu como não provado que “a trabalhadora AA foi admitida ao serviço da arguida a 01.10.2008” 16. Este mesmo Tribunal que profere esta mesma decisão deu como provado um facto que no âmbito do processo que ele próprio alude na sua sentença, que deu como não provado ?!?. 17. Desta feita, há assim lugar à arguição da exceção de caso julgado, nos s termos do art. 577.º, al. i) e art. 578.º do CPC. 18. Nesta esteira, prescreve o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 6 de Setembro de 2011. 19. Tendo sido reconhecido que a recorrida tinha uma antiguidade desde 2011, reconhecimento este por decisão já transitada em julgado, deverá considerar-se quanto a este facto que a recorrida trabalhava para a recorrente desde outubro de 2011, produtora de todos os seus efeitos, quanto a esta questão da antiguidade. 20. Exceção dilatória essa que a recorrente argui e que deverá ser julgada procedente a mesma, e consequentemente deverá ser relevada para efeitos dos cálculos salariais. 21. O Tribunal a quo, embora não permitisse que tal processo (Proc, n.º 1151/22.6T8VFR) fosse apensado aos presentes autos, dele tinha inteiro conhecimento, porque nele decidiu e porque o mesmo foi referido na audiência de julgamento, quando o mandatário da recorrente questionou a anterior gerência sobre o facto de existir ou não existir valores por pagar da anterior gerência à recorrida, conforme resulta do depoimento da testemunha CC, na audiência de julgamento do dia 2023-03-10, no sistema Habilus Média Studio 2255-22.0T8VFR_2023-03-10_15-32-43, que a instancia do mandatário da recorrente disse que (00:22:12 ao 00:22:39). 22. A Meritíssima Juiz a quo, para fundamentar a sua decisão valorou o contrato de trabalho a termo certo, junto a fls. 63 e a declaração junta a fls. 24. 23. Tais documentos foram impugnados pela Recorrente, 24. Sendo que no contrato de trabalho figura como entidade empregadora a sociedade C..., LDA e como trabalhadora a recorrida e não se encontra assinado pela Recorrente. 25. Quanto à declaração junta a fls. 24, encontra-se assinada e carimbada pelo então gerente da empresa recorrente à data de 2017, ou seja, pelo Exmo. Sr. CC, e refere que em 20 de junho de 2017 a recorrida era trabalhadora da empresa C..., Lda, e que no dia 30 de junho de 2017 passaria a ser trabalhadora da recorrente. 26. Sendo que tal declaração não foi sequer dada a conhecer à atual gerência nem aos seu sócios aquando da aquisição das quotas. 27. Acresce que, no referido contrato, temos o mesmo autor da “declaração”, a outorgar em nome e em representação da cedente “Escola de Condução B..., Lda” onde declara e subscreve que a recorrida. apenas foi admitida na Ré em 30.06.2017. 28. Aliás, a própria anterior gerência, quando elaborou e entregou à recorrida a tal declaração, considerou que a antiguidade era 2011, nunca 2008, conforme resulta do depoimento do Exmo. Sr. CC, na audiência de julgamento do dia 2023-03-10, no sistema Habilus Média Studio 2255-22.0T8VFR_2023-03-10_15-32-43, (00:28:20 ao 00:29:03). 29. Por todos estes motivos, nunca poderia, nem podem, ser aceites como válidos e sobretudo valorados enquanto documentos de prova de que a recorrente tem uma antiguidade desde 2008. 30. Como tal, tendo o Tribunal a quo incorrido em erro de apreciação de prova ao dar como provado o ponto 10) dos factos provados, deverá o mesmo ser transferidos para a secção dos factos não-provados e constar dos factos provados que a “A Ré estava ciente de que a autora tinha como data de admissão Outubro de 2011”, justamente o que deve ser concluído e decidido pelo douto Tribunal ad quem. (DO DIREITO) 31. Assim e, muito embora tenha andado bem ao reconhecer a existência de justa causa de resolução do contrato de trabalho por parte do A.,, incorreu em erro nos pressupostos de facto e de direito, o que levou à fixação de uma indemnização exagerad(íssim)a, impondo-se, por isso, a sua revogação nessa parte, substituindo-a por outra que arbitre uma indemnização mais consentânea com a realidade fixada pelos factos e pelos critérios indemnizatórios legais, mormente do art. 396.º do CT e do art. 496º do CC. 32. Foram violados, entre outros, as normas dos art. 577.º, al. i), art. 578.º do CPC, 396.º, art. 496º do CC. NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, POR PROVADO E, EM CONSEQUÊNCIA REVOGAR-SE A DECISÃO RECORRIDA, SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE ARBITRE UMA INDEMNIZAÇÃO MAIS CONSENTÂNEA COM A REALIDADE FIXADA PELOS FACTOS E PELOS CRITÉRIOS INDEMNIZATÓRIOS LEGAIS, MORMENTE DO ART. 396.º DO CT E DO ART. 496º DO CC. ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA. A A. respondeu, terminando as suas contra-alegações com as seguintes conclusões que igualmente se transcrevem: 1. O cerne e a única verdadeira questão do douto recurso da ré conforma-se em colocar em causa a provada e decidida antiguidade da autora que reportada foi a Outubro de 2008. 2. É evidente, para qualquer conhecedor da jurisprudência que a este respeito existe, que a Sentença assume (toda ela, mas) concretamente neste ponto um pundonor que não deixa a questão por decidir e fundamentar devidamente e muito ajustadamente. 3. Seria pois sempre uma tarefa sumamente ingrata para a ré/recorrente oferecer argumentos que pudessem trazer um mínimo de sombra que fosse à exegese que atravessa toda a sentença. 4. É, no entanto difícil entender que, por via disso ou apesar disso (ou devido a qualquer outro factor) a recorrente se tenha enredado de forma tão indiscernível e inverosímil numa questão, afinal tão simples; não sendo aceitável que a recorrente tenha baralhado a questão desta forma, 5. Porque é incompreensível que se a ré/recorrente entendia que a antiguidade não deveria quedar-se em 2008, como foi dado como provado e decidido, mas sim em 2011, tenha discorrido em páginas e páginas consecutivas sobre uma antiguidade supostamente de 2017 que o (novo) gerente achava que era de 2017 e pensava que era de 2017 e o anterior gerente lhe disse que era de 2017 … para, inutilizando e deixando sem préstimo todo este seu próprio argumentário, concluir: a ré reconhece que a antiguidade é de 2011! 6. Mas não é, como a sra. Juíza detalhou copiosamente na Sentença, a páginas 14 a 18 (início) e 21 e 22 (início); e não é porque a autora demonstrou, através de prova concludente, a identidade gemelar da ré com a(s) restante(s)empresa(s) e o percurso da autora nessas mesmas empresas (além da declaração de 2017 que lhe reconheceu a antiguidade provada) - uma prova, aliás, que o Tribunal reconheceu ex abundatia. 7. Devem manter-se como provados os pontos 10º e 15º dos factos provados que resultam - além da prova testemunhal e documental e do contrato de trabalho junto com a Petição - do ofício da Segurança Social, junto aos autos em 14/12/2022, por onde se constata que a autora iniciou a sua relação laboral com C..., Lda. em Outubro de 2008. 8. A junção de documento que a ré/recorrente efectua (rectius: pretende efectuar) com as suas alegações de recurso é inadmissível, desde logo porque o documento não poderia ser assim junto, sem uma palavra sequer de justificação. 9. Além disso, apenas poderia ser junto acaso se reunissem os pressupostos e condições estabelecidos nos artigos 423º e/ou 425º e/ou 651º do Código de Processo Civil, o que não é o caso, pois a ré poderia ter junto o documento em causa ab initio, isto é logo que apresentou a sua Contestação, em final de Outubro de 2022 (quando o fez, há largos meses que tinha esse mesmo documento em seu poder - o documento é uma Notificação de Junho de 2022) ou ainda na Primeira Instância, nos prazos que a lei estabelece. 10. A consequência da inadmissibilidade da junção do documento é o respectivo desentranhamento dos autos; mas se assim não fosse, o que somente por dever de cautela e patrocínio se concebe, a verdade é que o documento não diz o que a ré diz que ele diz, pois ali, nesse processo de contra -ordenação (apenas) não foi demonstrada essa antiguidade – bem ao contrário do que nestes autos sucedeu, onde foi provada à saciedade. 11. Nunca por nunca se verifica o caso julgado que a recorrente sustenta, pois tal instituto não se aplica a questões de facto e é a um ponto de facto que a recorrente pretende aplicá-lo e transportá-lo para estes autos, sendo certo precisamente que «os fundamentos de facto, nunca por nunca, formam, por si só, caso julgado, de molde a poderem impor-se extraprocessualmente”» como refere o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12-07-2023, citado no corpo destas contra-alegações. 12. Em todo o caso jamais poderia existir caso julgado, já que a autora não interveio, muito menos foi parte no processo de onde a ré pretende transportar a factualidade em causa; nem existe entre estes autos e aqueles (de contra-ordenação) qualquer identidade, seja das partes, seja do pedido, seja da causa de pedir. 13. O recurso aqui em causa debruça-se quase exclusivamente sobre a operação e raciocínio que conduziram ao reconhecimento da antiguidade da autora; de pouco ou nada mais tratando, excepto duas ou três questões laterais, sem pedidos de alteração da decisão que lhes correspondam, e excepto um tímido e infundamentado protesto contra o montante da indemnização que o Tribunal reconheceu à autora. 14. Tanto nuns casos como nos outros (e por todas as 46 páginas da Sentença) a decisão recorrida desenvolve e detalha, de forma precisa e meticulosa, aquilo a que se pode verdadeiramente chamar uma resposta antecipada ao recurso. 15. A recorrente, fazendo por ignorar que o recurso é sobretudo (ou apenas) a reapreciação de uma decisão judicial e a sua impugnação motivada, nunca enfrenta nenhuma das afirmações, iterações ou conclusões da Sentença, optando por um viés lateral e inconsequente que deixa assim intocadas todas as asserções que a sra. Juíza levou ao seu despacho - e que intocadas devem permanecer no ordenamento jurídico. 16. A recorrente pretende assentar todo o seu recurso nas declarações dos seus legais representantes (o actual e o anterior, sendo que o actual apenas prestou depoimento de parte - que consta na assentada, pelo que as declarações que nela não constam não constituem meio de prova) num processo em que foram ouvidas mais de dez testemunhas e juntos quase 40 documentos (mais as declarações de parte da autora); assim, a recorrente perante uma Sentença que conheceu e examinou todos esses meios de prova, efectuou a respectiva análise crítica e enquadrou devidamente o seu valor probatório e relevância processual, pretende discutir, arrasar e desfazer todo esse acervo probatório com três ou quatro frases e meia dúzia de palavras interessadas, parciais, inconsequentes e contraditórias dos seus gerentes, o actual e o anterior – com o significativo e relevante pormenor de que eles são precisamente aqueles que irresponsavelmente criaram a situação relatada nos autos e os conduziram ao respectivo desfecho. 17. Estes autos foram habilitados e preenchidos com prova concludente, daí os factos alegados pela autora terem sido (genericamente) provados, como a sentença reconheceu e fundamentou; e como a sentença desenvolveu e fundamentou, a lei aplicável compreende e conforma todos os direitos que doutamente lhe foram reconhecidos. 18. A sentença recorrida, bem alicerçada e categórica, deve ser louvada, e bem assim a bondade dos seus fundamentos. Terminou, pugnando pela manutenção integral da sentença. * O recurso foi admitido como apelação, com subida imediata nos próprios autos e efeito meramente devolutivo. Nesta Relação o Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso, dizendo, no essencial, o seguinte: “4.1. Quanto à matéria de facto entende-se que a Recorrente não cumpre com o determinado pelo art.º 640º do CPC, indicando os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida e a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. Faz uma apreciação com um resultado diferente da prova, mas a opinião diferente não é suficiente para se considerar cumprido o determinado por aquele preceito legal. Nesta matéria vigora, como é sabido, o princípio da livre apreciação da prova – art.º 607º, 5 do CPC – devendo a recorrente identificar os erros cometidos na apreciação dos meios de prova produzidos, o que, salvo melhor opinião, não é feito, e inviabiliza o conhecimento do recurso. 4.2. Refere a Recorrente que a antiguidade da trabalhadora é diferente, como se concluiu/julgou noutro processo. Ora, o caso julgado formal tem força obrigatória dentro do próprio processo onde foi proferida a sentença ou despacho. E o caso julgado material apenas se constitui sobre sentença ou despacho saneador que aprecie o mérito da causa – v. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luis Filipe Sousa, CPC anotado, 3ª edição, Almedina, Coimbra, p. 798. Não pode falar-se de caso julgado em relação a factos considerados provados ou não provados de um processo para outro. Em cada processo é feita alegação e prova dos factos articulados pelas partes. Poderia penas juntar-se certidão da decisão como elemento de prova neste processo. Não assiste, pois, razão à Recorrente, neste particular. 4.3. Quanto à decisão de direito entende-se que também não merece censura a douta sentença recorrida. Com efeito as diuturnidades fazem parte integrante da retribuição. Não sendo pagas é uma parte da retribuição que não é paga, verificando-se uma violação culposa de garantias legais e convencionais do trabalhador, uma lesão culposa de interesses patrimoniais sérios do trabalhador. Importa decidir se se verifica, ou não, justa causa para a Recorrente/autora, resolver o contrato de trabalho, com base na falta de pagamento culposa de parte da retribuição, ou seja, os valores correspondentes às diuturnidades. Entende-se que se verifica uma situação de falta culposa de pagamento integral da retribuição, como também se refere no Ac. da RL de 23.04.2008, proferido no processo n.º 961/2008-4, www.dgsi.pt. E, numa situação de não pagamento de diuturnidades, durante 12 anos consecutivos, presume-se a existência de justa causa e o trabalhador pode resolver o contrato, bastando a prova do incumprimento continuado. Nesta situação de caracter continuado e de efeitos duradouros, que se agrava com o decurso do tempo, o prazo de caducidade não se inicia e a partir da falta de pagamento de qualquer uma das referidas diuturnidades, mas sim a partir da data da cessação dessa situação de incumprimento continuado ou então a partir do momento em que os efeitos dessa falta, no contexto da relação laboral, assumem tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se torna impossível, ou seja, se torna intolerável para o trabalhador, perante esses factos e as suas nefastas consequências, a manutenção da relação de trabalho. Como se lê, ainda, em situação semelhante, no Ac. do STJ de 21.04.2022, proferido no proc. 340/19.5T8GRD-A.C1.S1, www.dgsi.pt, “o não pagamento, na integra, da retribuição correspondente a quatro meses é objetivamente tão grave, como violação do dever principal do empregador, que justifica a resolução do contrato de trabalhão pelo trabalhador, sem necessidade de invocar outros factos, tanto mais que tal incumprimento, nos termos da lei, se considera culposo.” E, decorrido este período sem que se vislumbrasse a possibilidade real de reverter a situação, não sendo viável qualquer outra solução, chegou o momento em que já não era possível aguentar mais, sendo o corte da relação contratual a única solução que restava à trabalhadora/recorrida. Sendo válida a causa de resolução do contrato de trabalho outra não podia ser a decisão, senão a de condenar a Recorrente a pagar à recorrida as quantias a que tem direito. Deve, assim, ser confirmada a douta sentença recorrida.” * Foram colhidos os vistos legais. Nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre decidir: II. Delimitação do objecto do processo / Questões a decidir Como resulta das disposições legais conjugadas dos artsº 635º, nºs 3 e 4, 637º, nº 2, 1ª parte, 639º, nºs 1 a 3, e 635º, nº 4 do Código de Processo Civil, aplicáveis por força do art.º 87º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação apresentada, sem prejuízo, naturalmente, das questões de conhecimento oficioso. Assim, considerando as conclusões da recorrente, as questões a decidir, são: - saber a decisão da matéria de facto deve ser alterada por violação do caso julgado ou erro de julgamento. - saber se a indemnização fixada pela resolução do contrato se mostra fixada segundo os critérios legais. III. Fundamentação O Tribunal recorrido decidiu assim a matéria de facto: Factos Provados Da petição inicial: 1º- 1. A autora trabalhou na empresa ré até 3 de Junho de 2022. 2º- Nessa data, a autora efetivou a cessação do contrato de trabalho com a ré, através de carta registada com aviso de receção, em que invocou a resolução com justa causa, junta como documento nº1 com a petição, cujo teor é o seguinte: “Venho comunicar a imediata resolução, com justa causa, do contrato de trabalho celebrado com a vossa empresa, com os seguintes fundamentos: Solicitei, através do meu Advogado, à vossa empresa, em 12 de Agosto de 2021, o seguinte: …«A minha constituinte, srª AA incumbiu-me de solicitar o pagamento das horas extraordinárias efectuadas e não pagas, relativas aos anos de 2020 e 2021 até ao mês de Julho de 2021 - totalizam essas horas extraordinárias não pagas 43,50 horas. (…) Além disso, o pagamento dos subsídios em duodécimos foi, nestes últimos anos, sempre mal calculado e indevidamente pago, conforme exposição que a minha constituinte já vos fez chegar, não tendo sido pagos os retroactivos, o que, aliás, foi inclusivamente recusado. Solicito a resolução imediata das questões acima enunciadas, designadamente com a liquidação integral das quantias devidas à minha constituinte…» E insisti, através de carta que enviei à vossa empresa em 16 de Setembro de 2021, ali chamando a atenção de que A vossa empresa nada fez, não tendo liquidado o que me é devido e nem sequer responderam à carta do meu Advogado de 12 de Agosto de 2021, ou ofereceram qualquer tipo de solução ou resposta para as questões que nela se suscitam. Tendo-se limitado, após esta carta, através da vossa Advogada e através de e-mail que esta enviou ao meu advogado em 30 de Setembro de 2021, a solicitar elementos relativamente ao que tinha exposto nesta minha carta 16 de Setembro 2021 - ora, estes elementos foram enviados através da minha carta de 15 de Outubro de 2021 que não mereceu sequer uma resposta da vossa parte. Pior do que isso, a vossa empresa, a partir do mês do final do mês de Agosto de 2021, efectuou uma diminuição no meu vencimento, ao desconsiderar as diuturnidades que vinham constando no meu recibo e vinha recebendo (três) diuturnidades e apenas considerando uma diuturnidade. O que se relacionará, também, com a indicação, nos meus recibos de vencimento desde 31/08/2021 e até 31/05/2022, como minha data de admissão 30/06/2017, quando a minha admissão se reporta já ao ano de 2008, como bem sabem. E que em Junho de 2021 passei a ter 4 diuturnidades, uma vez que decorreram mais 3 anos desde a anterior diuturnidade (que havia ocorrido em 2018), Sendo certo que até 14/08/2021 estavam, pelo menos, reconhecidas pela vossa própria empresa 3 diuturnidades que me eram pagas, todos os meses, o que torna a alteração subsequente, a partir do final de Agosto de 2021 injustificada e injustificável. Reiterei, por diversas vezes, que me dispunha a resolver amigavelmente estas questões, designadamente solicitando pessoalmente que fosse correctamente considerada a minha antiguidade e os meus inerentes direitos, tal como as diuturnidades a que tenho direito (e que são, repita-se, agora e desde Junho de 2021, quatro). A vossa empresa, no entanto, persistiu e persiste não só em colocar a situação no âmbito da legalidade, como se limita a ouvir as minhas solicitações e a receber as cartas do meu Advogado e as minhas próprias cartas sem responder, ignorando continuamente as minhas repetidas solicitações. E persistindo nessa posição, mesmo após a intervenção da ACT (Autoridade para as Condições do Trabalho) que reconheceu a existência dos direitos que invoco, verificando-se que mesmo a intervenção da ACT é insuficiente para regularizarem a minha situação e é insuficiente para sequer encetarem qualquer iniciativa de diálogo, no sentido de um entendimento e desfecho acordado para todas as questões em causa, primando a vossa empresa pela total ausência de resposta às minhas interpelações. A vossa conduta consubstancia uma violação continuada do dever de pagar pontualmente e integralmente a retribuição de me é devida, o que se vem agravando com o decurso da relação contratual e se tornou ainda mais grave no final do mês de Agosto de 2021, aquando do pagamento então efetuado (e como já referido). O não pagamento em causa tem repercussões sérias na minha esfera patrimonial, criando dificuldades económicas, já que o meu único rendimento é o que provém do meu salário e com o qual suporto as minhas despesas e me sustento. Ora, a não regularização das quantias em falta e a não reposição da legalidade, Designadamente quanto ao não reconhecimento da minha antiguidade e das diuturnidades e o não pagamento das horas extraordinárias efectuadas e não pagas relativas aos anos de 2020 e 2021 até ao mês de Julho de 2021, que totalizam 43 horas e 50 minutos (…) e ainda a falta do ajustamento (actual e com retroactivos) do pagamento dos subsídios em duodécimos. A não regularização das quantias em falta e a falta de qualquer resposta da vossa parte impossibilita a subsistência da relação de trabalho e implica que cesse, de imediato, a minha relação laboral com a vossa empresa, através desta resolução com justa causa, tal como previsto na legislação aplicável. Implicando, por isso, que venha por este meio nesta altura, fazer cessar através de resolução com justa causa o contrato de trabalho com a vossa empresa. Não me foram pagas, na íntegra, as quantias a que tenho direito e não foi reposta a legalidade da minha situação laboral na vossa empresa, como insistentemente solicitei, desde o que diz respeito à antiguidade e às diuturnidades que não me foram reconhecidas e ainda a falta de pagamento do trabalho suplementar efetuado - com a correspondente falta de pagamento devido tal como acima, e nas missivas anteriores, explicitado. Esta situação conduz à imediata impossibilidade /inexigibilidade de manutenção da relação laboral da minha parte, atendendo à gravidade do incumprimento em causa, da situação insustentável criada pela vossa empresa e da persistência em nada fazerem e nem sequer dialogarem comigo sobre estas questões, apesar das repetidas solicitações para o efeito. E ainda, designadamente, ao reflexo que tal situação representa na minha condição financeira e económica. Fico a aguardar o envio, no prazo de cinco dias úteis, da declaração modelo 5044 da Segurança Social e do Certificado de Trabalho, Sem prejuízo do pagamento de todos os créditos que detenho sobre a vossa empresa, como acima referidos, e ainda os emergentes da cessação do contrato, acrescidos da indemnização de antiguidade, nos termos da lei - e que solicito me sejam pagos de imediato. “ 3º- Nas cartas que dirigiu à Ré em 12.08.2021 e 16.09.2021, a A. solicitou à Ré o pagamento de 43,50h de trabalho suplementar, relativas aos anos de 2020 e 2021 e até ao mês de Julho de 2021. (resposta restritiva e concretizadora do artigo 6º da p.i.) 4º- A Ré calculou e pagou os subsídios de férias e de Natal em duodécimos apenas sobre o vencimento base, sem incluir as diuturnidades e a parte respeitante a Directora de Escola, função que a autora desempenhava. 5º- A esse título, a ré está em dívida para com a autora nos seguintes montantes: - 1391,43€, entre Outubro de 2015 e Setembro de 2021 (auferindo nos anos de 2015 e 2016, de vencimento base mensal €700,25, diuturnidade €22,70 e diretora €63,03; no ano de 2017 de vencimento base mensal €730, diuturnidade €23,00 e diretora €65,70; ano de 2018, de vencimento base mensal €745, diuturnidade €47 e diretora €67,05; no ano de 2019 de vencimento base mensal €760, diuturnidade €71,70 e diretora €68,40; no ano de 2020 de vencimento base mensal €783, diuturnidade €72,90 e diretora €117,45; no ano de 2021 de vencimento base mensal €800, diuturnidade €74,40 e diretora €120) e 100,40€, entre Outubro de 2021 e Maio de 2022. (resposta concretizadora do artigo 12º da p.i.) 6º- Até meados de Agosto de 2021 a ré reconhecia à autora 3 diuturnidades que lhe pagava. 7º- Desde Junho de 2021, a autora tinha já direito a 4 diuturnidades e não as três que a ré lhe pagou nos meses de Junho e Julho de 2021. 8º- A partir do final do mês de Agosto de 2021, a Ré indicou que a autora tinha só direito a uma diuturnidade e consequentemente começou a pagar-lhe só uma diuturnidade, no valor de €24,80. (resposta concretizadora do artigo 17º da p.i.) 9º- E passou a fazer constar no recibo de vencimento da autora: "ADMISSÃO 30-06-2017". 10º- A Ré estava ciente de que a autora tinha como data de admissão 1 de Outubro de 2008. 11º- A autora deixou de receber uma diuturnidade nos meses de Junho e Julho de 2021, o que ascende a 49,60€ (24,80€ x2) e três diuturnidades entre Agosto de 2021 e Maio de 2022, o que ascende a 751,50€ (24,80€ x 3 x 5 + 25,30 x 3 x 5), o que totaliza 801,10€. 12º- Pelo menos desde a data de recebimento das cartas referidas em 3º, a Ré assumiu comportamentos reiterados e repetidos de não pagamento, mesmo depois de instada consecutivamente pela autora e pelo seu Advogado, não só nada dizendo, como nada pagando. 13º- Fazendo com que a autora visse a sua retribuição diminuída, causando-lhe transtornos, já que a Autora que vivia única e exclusivamente com a remuneração que lhe era paga pela ré. 14º- E causando angústia à autora que viu a ré não só não lhe pagar o que lhe devia como lhe reduziu o valor que lhe pagava, sem qualquer justificação e sem sequer falar com a autora sobre essa mesma decisão. 15º- A autora iniciou o seu contrato de trabalho com a ré em 1 de Outubro de 2008, tendo-lhe sido reconhecida a antiguidade proveniente da empresa C..., Lda. 16º- A ré não deu à autora formação, em nenhum dos 13 anos e sete meses que ela para si trabalhou. 17º- A autora interpelou a ré, por carta, em 12 de Agosto de 2021, através do seu Advogado. 18º- E em 16 de Setembro de 2021, a autora enviou nova carta à ré. 19º- A ré, através da sua Advogada, em 30 de Setembro de 2021, manifestou a posição que consta no referido documento, designadamente disponibilidade para conversar sobre este assunto que se reportava já então ao pagamento de horas extraordinárias, ao pagamento de subsídios em duodécimos e diuturnidades. 20º- Em 15 de outubro de 2021, a A. enviou os elementos e esclarecimentos sobre todos e cada um dos pontos vindos de referir, tanto à ré como à sua Advogada, através de (duas) cartas. 21º- A ré nada fez e desde essa altura não mais respondeu às missivas da autora e nem sequer encetou qualquer diálogo com a autora, apesar de esta lhe ter proposto, sempre e repetidamente resolver amigavelmente as questões em causa, dando oportunidade à ré de solucionar as questões em causa e também de consigo dialogar a esse respeito. 22º- A autora solicitou, repetidamente, a correção de todas as questões acima expostas, mas a ré não só não o fez, como ignorou as interpelações nesse sentido, por parte da autora, como se esta não as tivesse efetuado. 23º- A autora insistiu, repetidamente, para que fossem efetuados os pagamentos de todos os retroativos, o que fez, tanto de forma verbal perante a gerência, como através de missivas que enviou à ré, por si e/ou através do seu Advogado. 24º- Mas nada logrou, por parte da ré, nem obteve sequer resposta alguma, deixando a ré por liquidar a totalidade dos montantes respeitantes aos retroativos dos duodécimos e duodécimos que se foram vencendo, devidos à autora e às diuturnidades devidas, nada fazendo, nada corrigindo. 25º- A Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) moveu contra a Ré processo de contraordenação, designadamente pelos factos aqui referidos, que culminou na aplicação de uma coima à ré. 26º- A Ré impugnou judicialmente a decisão do ACT, o que deu origem ao processo 1151/22.6T8VFR do Juízo do Trabalho de Santa Maria da Feira – Juiz 2 do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro. 27º- A conduta da ré referida em 24- gerou, na pessoa da autora, ansiedade, preocupação, angústia, tristeza, inquietação e sofrimento. 28º- A autora sofreu e sofre de angústia pela situação criada pela ré e pela completa ausência de resposta que se prolongou durante meses e meses, encontrando-se ainda ansiosa, desassossegada, perturbada, triste, com stress. 29º- E sofreu abalo moral, psíquico e nervoso. Da contestação: 30º- A A. foi inscrita na Segurança Social como trabalhadora dependente da sociedade Ré em 30.06.2017. 31º- Na cláusula sétima do contrato e anexo II ao mesmo do contrato de cessão de quotas outorgado a 10.08.2021 consta a identificação da Autora como sendo a única trabalhadora da sociedade cedente e que a sua data de admissão foi a 30.06.2017. 32º- No referido contrato, quem outorga em nome e em representação da cedente “Escola de Condução B..., Lda” onde declara e subscreve que a A. apenas foi admitida na Ré em 30.06.2017 é a mesma pessoa que assinou a declaração junta como documento nº24 com a petição. 33º- Aquando da rescisão do contrato de trabalho por iniciativa da trabalhadora, que se efetivou em 30.06.2022 na sequência da carta enviada pela Autora e recebida pela Ré a 07.06.2022 veio a ser por esta efetuado o pagamento à A. da quantia global € 1.853,06 (mil oitocentos cinquenta e três euros e seis cêntimos), nela se incluindo o pagamento em duodécimos dos subsídios de férias e de Natal e as férias proporcionais ao tempo trabalhado no ano da cessação. 34º- O pagamento de tal quantia ocorreu por transferência bancária efetuada no dia 06.07.2022 para a canta bancária da Autora. 35º- A Ré emitiu a declaração da situação de desemprego (Mod. 5044) com a indicação de que cessação do contrato operou por denúncia da trabalhadora, e enviou por carta registada à trabalhadora, que veio a ser devolvida. 36º- O atual representante da Ré que assumiu a gerência em Agosto 2021 desconhecia, até essa data, a divergência entre a A. e a anterior gerência da Ré por não lhe ter sido transmitido ou dado conhecimento da divergência entre a trabalhadora e a Escola de Condução A..., quanto a essas concretas questões. 37º- Na cláusula nona do referido contrato (v. doc. 2) é acordado entre cedente e cessionária que a cessão de quotas é feita “…livre de quaisquer ónus e encargos…”. Factos Não Provados - A autora efetuou um conjunto de quarenta e três horas e cinquenta minutos de horas extraordinárias / trabalho suplementar, relativas aos anos de 2020 e 2021 e até ao mês de Julho de 2021 e que totalizam as 43,50 horas; - Essas horas extraordinárias não lhe foram pagas pela ré, apesar de tal lhe ter sido solicitado repetidamente; - As horas extraordinárias devidas pela ré à autora ascendem à quantia de 132,24€; - A Ré não pagou à A. o proporcional de férias (cinco meses) do ano de 2022; o proporcional de subsídio de férias (cinco meses) do ano de 2022; e o proporcional de subsídio de Natal (cinco meses) do ano de 2022. - A A. iniciou funções laborais na Ré em 01.07.2017. - O pagamento efetuado pela Ré à a. no final do contrato engloba todos créditos salarias a si devidos por referência a tal data, onde se incluem outros valores, além da remuneração do mês de Junho de 2022, o prémio de director de escola e diuturnidades. - A Ré efectuou tal pagamento no pressuposto que tinha para si como certo de que a A. estava a rescindir livre e unilateralmente o seu contrato de trabalho, de forma amigável, e que com tal pagamento a mesma se considerava paga de todos os créditos que considerava ter para com a Ré. - A Ré pagou as diuturnidades e outros créditos que a trabalhadora lhe apresentava, independentemente de serem legalmente devidos ou não; - O actual legal representante da Ré desconhecia a existência do processo nº1157/22.68VFR do Juiz 2 do Tribunal do Trabalho de Santa Maria da Feira; - Asseguraram à cessionária que até à data de 10.08.2021 responderia a anterior gerência. * Da impugnação da decisão da matéria de facto - Do caso julgado A Ré/recorrente começa por pedir a alteração da decisão da matéria de facto, com fundamento na sentença proferida em 23.6.2022 (transitada em julgado) no Proc. n.º 1151/22.6T8VFR do Juízo do Trabalho de Santa Maria da Feira – Juiz 2, cuja cópia junta, alegando que factualidade provada e não provada em tal sentença é contraditória com a decisão da matéria de facto do presente processo, nomeadamente quanto à questão da antiguidade da A. ao seu serviço, pois naquela considerou -se que tal antiguidade devia reportar-se a Outubro de 2011, dando-se como não provado que a Autora tivesse sido admitida ao seu serviço em 1.10.2008 e no ponto 10 do presente processo o mesmo tribunal deu como provado que a Ré estava ciente que a A. tinha como data de admissão 1 de Outubro de 2008, e invocando a excepção de caso julgado, nos termos do art. 577.º, al.i) e 578º do C.P.Civil, sustenta que este Tribunal de recurso deve dar como provado que “A Ré estava ciente que a Autora tinha como data de admissão Outubro de 2011”. A recorrida nas contra-alegações diz que a junção da referida sentença é intempestiva, pois a Ré podia ter procedido a tal junção logo com a contestação e deve ser desentranhada. Para o caso de assim não se entender, pronuncia-se pela inexistência de caso julgado, aduzindo que tal instituto não se aplica a questões de facto e é a um ponto de facto que a recorrente pretende aplicá-lo e transportá-lo para estes autos e, além disso, não interveio, muito menos foi parte no processo de onde a ré pretende transportar a factualidade em causa; nem existe entre estes autos e aqueles (de contra-ordenação) qualquer identidade, seja das partes, seja do pedido, seja da causa de pedir. Na verdade, a recorrente juntou com as suas alegações cópia da sentença proferida 23.6.2022 no Proc. 1151/22.6T8VFR do Juízo do Trabalho de Santa Maria da Feira, sendo certo que já na contestação, apresentada em 26.10.2022, se referiu a tal processo sem invocar a excepção de caso julgado, requerendo a apensação do mesmo que lhe foi indeferida, com a menção de que podia juntar certidão das peças que tivesse por relevantes. Estamos pois perante uma questão nova não suscitada, nem conhecida na primeira instância que, por regra, não são cognoscíveis em sede de recurso. Porém, sendo o caso julgado do conhecimento oficioso apreciar-se-á, admitindo-se a a junção da sentença apresentada, que se tem como transitada, até porque não era recorrível, tendo em conta o valor da coima aplicada. Atentando em tal sentença, vemos que se reporta a um processo de contra-ordenação laboral em que foi arguida a aqui Ré que impugnou judicialmente a coima que lhe foi aplicada pela Autoridade para as Condições do Trabalho por incumprimento em relação à aqui Autora de disposições da convenção colectiva de trabalho aplicável. Nela foi objecto de discussão a antiguidade da Autora, tendo sido dado como não provado que esta tivesse sido admitida ao serviço da Ré em 1.10.2008, considerando-se que a sua antiguidade devia reportar-se a Outubro de 2011(facto nº 30), e a coima aplicada à arguida, aqui R., foi reduzida de 9 para 6 UCS. Pretende a R. que tais factos sejam considerados nestes autos, invocando para tal a excepção do caso julgado. Vejamos As excepções da litispendência e do caso julgado pressupõem, nos termos dos arts 580º e 581º do C.P.Civil, a repetição de uma causa e repete-se uma causa quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir. Como é consabido, a decisão judicial transitada em julgado passa a ter «força obrigatória» dentro do próprio processo, como estabelece o art. 620º, nº1 do C.P.Civil, e também fora do próprio processo quando julgue de mérito, como estatui o art. 619º, nº1 do mesmo diploma legal. A referida força obrigatória desdobra-se assim numa dupla eficácia, que corresponde aos efeitos negativo e positivo do caso julgado. Rui Pinto, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, 2018, Almedina, p.185 e 186 escreve: “O efeito negativo do caso julgado consiste na proibição de repetição de nova decisão sobre a mesma pretensão, por via da excepção dilatória de caso julgado, regulada em especial nos arts. 577º al. i) e 580º e 581º. Classicamente, corresponde-lhe o brocardo non bis in idem. O efeito positivo ou autoridade do caso consiste na vinculação das partes e do tribunal a uma decisão anterior. Classicamente, corresponde-lhe o brocardo judicata pro veriate habetur. Enquanto o efeito negativo do caso julgado leva a que apenas uma decisão possa ser produzida sobre um mesmo objecto processual, mediante a exclusão do poder jurisdicional para a produção de uma segunda decisão, correspondendo-lhe a excepção de caso julgado; o efeito positivo do caso julgado admite a produção de decisões de mérito sobre objectos processuais materialmente conexos, na condição da prevalência do sentido decisório da primeira decisão.” A propósito do caso julgado, o Supremo Tribunal de Justiça em acórdão de 16 de dezembro de 2021, processo nº 5837/19.4T8GMR.G1.S1,in www.dgsi.pt, explicitou:“A exceção de caso julgado material comporta um efeito negativo, consistente na inadmissibilidade das questões abrangidas por caso julgado anterior voltarem a ser discutidas, entre as mesmas partes, em ação futura, tendo como requisitos a tríplice identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir, nos termos do artº 581º do Código Civil. Diferentemente, a autoridade do caso julgado tem, antes, o efeito positivo de impor a primeira decisão à segunda decisão de mérito e, sem prescindir da identidade das partes, dispensa a identidade do pedido e da causa de pedir nos casos em que existe uma relação de prejudicialidade entre o objeto da ação já definitivamente decidida e a ação posterior, ou seja, quando o fundamento da decisão transitada condiciona a apreciação do objeto de uma ação posterior, por ser tida como situação localizada dentro do objeto da primeira ação, sendo seu pressuposto lógico necessário.” Ora, como refere a recorrida, quando existe caso julgado, nos termos do art. 619, nº1 do C.P.Civil, é a decisão de mérito sobre a relação material controvertida proferida no primeiro processo que se torna obrigatória e não os factos apreciados. Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2ª ed., Coimbra Editora, p. 716, escrevem: “Os factos considerados como provados nos fundamentos da sentença não podem considerar-se isoladamente cobertos pela eficácia do caso julgado, para o efeito de extrair deles outras consequências, além dos contidos na decisão final.” Em processo civil, a decisão sobre matéria de facto não tem eficácia jurídica senão no concreto processo para o qual foi produzida a prova, não tendo autonomia em relação à sentença final. Ora, no presente caso, a Autora não foi parte no processo de contra-ordenação promovido pela Autoridade das Condições de Trabalho, o que afasta desde logo, quer a excepção do caso julgado invocada pela Ré, quer a autoridade do caso julgado, por falta de identidade das partes. E, não obstante os dois processos terem na sua origem a mesma realidade factual, são processos de diferente natureza, que se regem por normas (processuais e substantivas) distintas, visando o primeiro apurar a responsabilidade contraordenacional da R. e o presente a sua responsabilidade jurídico-laboral perante a trabalhadora, não existindo uma relação de prejudicialidade entre ambos. Assim, regendo-se por normas distintas e sendo diversa a prova produzida em cada um deles, pode muito bem suceder que a decisão da matéria de facto não seja coincidente. Sobre esta questão já se pronunciou esta Secção Social no acórdão de 11.10.2018, proferido no Proc. nº 6246/16.9T8MTS.P1, (Relatora Desembargadora Rita Romeira) disponível in www dgsi.pt,(tal como os demais citados sem indicação de outra proveniência): “Não ocorre, nem a excepção, nem a autoridade de caso julgado, entre um Processo de Recurso de Contra-ordenação e um Processo Comum, acção declarativa onde é, respectivamente, arguida e ré, a mesma empregadora porque, o trabalhador, A. no último, não foi parte interveniente no primeiro (cuja competência cabe à ACT, nos termos do disposto no art. 2º, nº 2, al. k) do Dec. Regulamentar nº 47/2012 de 31.07), nem o objecto deste constitui questão condicionante ou prejudicial da controvertida na acção comum, por estarem em causa processos com natureza diferente e porque, as regras que regem o processo contra-ordenacional e o processo laboral cível são distintas, desde logo, as garantias do processo criminal em que assenta o primeiro, como é exemplo a presunção de inocência, que proíbe a actuação de presunções legais, permitidas no segundo, como é exemplo o disposto no art. 258º, nº 3, do C. do Trabalho.” E também no acórdão de 3.10.2022, proferido no processo 3003/18.5T8MAI.P1, não publicado, relatado pelo Desembargador António Luís Carvalhão, aqui 2ª Adjunto, não publicado, no qual se decidiu:“Não existe fundamento para importar os factos dados como provados em sentença proferida em processo que apreciou impugnação judicial de decisão administrativa que sancionou a Empregadora pela prática de contraordenação [não se configurando a autoridade do caso julgado, nem se aplicando as presunções previstas nos art.ºs 623º (oponibilidade a terceiros da decisão penal condenatória) e 624º (eficácia da decisão penal absolutória) do Código de Processo Civil, que não têm aplicação em relação a processo de impugnação judicial de contraordenação”. Destarte, não existindo arrimo legal para transportar os factos dados como provados no processo contraordenacional para os presentes autos, o ponto nº10 dos factos provados não pode ser alterado no sentido pretendido pela recorrente com base na sentença proferida em tal processo. - Do erro na apreciação da prova produzida Por outro lado, a recorrente também sustenta que o tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento porque a prova produzida nestes autos não permite concluir que a Autora tem como data de admissão Outubro de 2008, aduzindo, em suma, que a Srª Juíza a quo, valorou para tal o contrato de trabalho a termo certo, junto a fls. 63 e a declaração junta a fls. 24, no entanto, em tal contrato figura como empregadora a sociedade C..., Lda, e não se encontra assinado pela recorrente, e a declaração, assinada e carimbada pelo gerente da empresa recorrente à data de 2017, CC, refere que em 20 de junho de 2017 a recorrida era trabalhadora da empresa C..., Lda, e que no dia 30 de junho de 2017 passaria a ser trabalhadora, da Escola de Condução A..., Lda, Ré, ora recorrente, não foi dada a conhecer à atual gerência nem aos seus sócios aquando da aquisição das quotas, tendo o dito CC que outorgou em representação da cedente “Escola de Condução B..., Lda”, detentora da totalidade das quotas da Escola de Condução A..., Lda Ré, então declarado que a recorrida apenas foi admitida na Ré em 30.06.2017, informação que foi tida como certa e verdadeira pelo cessionário Sr. BB, como resulta do depoimento de parte prestado na audiência do dia 2023-02-03. E acrescenta que como decorre do depoimento de CC, prestado na audiência de julgamento do dia 2023-03-10, a anterior gerência, quando elaborou e entregou à recorrida tal declaração, considerou que a antiguidade da A. reportaria a 2011 e não 2008, localizando na gravação e transcrevendo algumas passagens de tais depoimentos. E termina requerendo que o ponto 10) dos factos provados seja transferido para a secção dos factos não-provados, passando a constar dos factos provados que a “A Ré estava ciente de que a autora tinha como data de admissão Outubro de 2011”, A recorrida pronunciou-se pela improcedência da impugnação, dizendo, em síntese, que a recorrente pretende assentar todo o seu recurso nas declarações dos seus legais representantes (o actual e o anterior), num processo em que foram ouvidas mais de dez testemunhas e juntos quase 40 documentos (mais as declarações de parte da autora), tendo a sentença examinado todos esses meios de prova e efectuado a respectiva análise crítica. Considerando-se suficientemente cumpridos os ónus do art. 640º do C.P.Civil, apreciemos a impugnação, não deixando de se assinalar que a decisão proposta pela recorrente para os factos do ponto nº10 é contraditória com os factos dados como provados no ponto nº15 que não impugnou e, por isso, no estrito cumprimento do formalismo legal, tal circunstância levaria ao indeferimento da impugnação, no entanto, reverenciando o princípio da verdade material, conhecer-se-á da mesma, consignando-se que procedemos à audição integral do depoimento de parte do legal represente da Ré, BB, do depoimento da testemunha CC e também das declarações de parte da Autora. Vejamos antes de mais a fundamentação do Tribunal a quo que apreciou conjuntamente os factos dos pontos 10 e 15, que efectivamente são indissociáveis . “Quanto aos factos referidos em 10º e 15º, os mesmos resultam da análise conjugada da prova documental (contrato de trabalho a termo certo junto a fls 63 e declaração junta a fls 24) com o que resulta da prova testemunhal e por declarações produzida. Como resulta da análise do documento nº24, junto com a petição inicial, quando a A. passa para os quadros da aqui R., em 30.06.2017, o gerente desta CC emitiu-lhe uma declaração, através da qual declara que a A. mantém todos os direitos adquiridos na empresa C..., Ldª, não perdendo por isso quaisquer direitos ou regalias que tenha adquirido até à presente data. Na data em que emite essa declaração, o aludido CC, além de gerente da Ré A..., é igualmente o gerente da C..., Ldª e é o gerente da Escola de Condução B..., Ldª. Ou seja, o CC é e sempre foi o patrão da A., que punha e dispunha nas três empresas para as quais a A. trabalhou, em momentos temporais distintos, sempre a pedido do patrão, considerando por isso que, quando lhe foi reconhecida a antiguidade na empresa C..., Ldª a mesma cobria todo o período temporal em que tinha trabalhado sempre para o mesmo patrão. Essa interpretação, face à confusão entre as sociedades aludidas, decorrente de serem os mesmos os sócios e gerente, em vários momentos temporais, o facto de se dedicarem ao mesmo objeto social, e o facto de ser sempre a mesma pessoa que surge na figura de “patrão”, afigura-se-nos atendível e legítima, pelo que quando se diz que a antiguidade salvaguardada respeita à empresa C..., Ldª, deve considerar-se a antiguidade desde a data do primeiro contrato com esta empresa, em 2008, ainda que de junho de 2009 a setembro de 2011, tivesse trabalhado na empresa B..., mas continuando a dar aulas na empresa C..., (o que reforça aquela ideia de confusão societária manifesta) como várias testemunhas que mereceram a credibilidade do Tribunal confirmaram. Quanto ao facto de os sócios e gerentes da C..., Ldª e da Escola de Condução B..., Ldª, serem os mesmos, em vários momentos temporais da vida da sociedade (como sucedeu em 2017, quando é emitida a declaração junta a fls. 24 com a petição, ou em 2008 e 2009 quando a A. vai trabalhar para a B..., ou quando em 2011, quando regressa para a C...) e ao facto de o objeto social das duas, no que respeita ao ensino da condução automóvel, ser igual, foram desde logo valoradas as certidões comerciais das duas sociedades juntas no requerimento datado de 13.01.2023, A gerente e sócia da C..., Ldª, D. DD é sócia da B... e companheira do gerente dessa empresa no período de abril de 2006 a 16.12.2021, sendo que este também foi gerente da C..., Ldª entre 27.04.2006 e 23.03.2018, tendo sido destituído do cargo, sendo evidente que as pessoas (sócios e gerentes) de uma e de outra empresa se cruzam por relações pessoais e familiares, no período de tempo que para os autos releva, o que explica que todos os que trabalharam nessas empresas e que foram inquiridos como testemunhas, a par da A., refiram que os patrões foram sempre os mesmos, independentemente da concreta denominação das empresas C... Ldª ou B..., Ldª, e eram a D. DD e o companheiro CC e independentemente das concretas escolas de condução em que trabalhassem, pois que tudo se confundia no universo da empresa “C..., Ldª”. Aliás, mesmo relativamente à aqui R. verifica-se que, à data de cessão de quotas realizada em 10.08.2021, verifica-se que quem detinha a totalidade do capital social da Ré era a Escola de Condução B..., Ldª. E isso mesmo parece também resultar do extrato de remunerações da A. junto da S.Social, junto em 14.12.2022, do qual decorre que a A. recebeu remunerações da B... de junho de 2009 a setembro de 2011, mas em setembro de 2009 recebeu uma remuneração da C..., Ldª, o que é bem revelador dessa confusão societária que as testemunhas evidenciaram nos seus depoimentos, pois tudo era dos mesmos donos, que punham e dispunham como entendiam e que nos permite concluir que quando se afirmou na declaração junta como documento nº24 que se mantinha a antiguidade e direitos adquiridos na empresa C..., se quis aqui incluir todo o período temporal, desde que a A. iniciou funções nessa empresa e independentemente de, entre 2009 a 2011, ter trabalhado na B..., pois todas essas escolas de condução faziam parte do mesmo grupo económico, tanto assim que, mesmo nesse período a A. vinha dar aulas duas vezes por semana à escola de condução D..., pertença da C..., Ldª. A par dos documentos juntos, foi valorada a prova testemunhal, que foi relevante para permitir perceber que as escolas de condução referidas faziam todas parte do mesmo universo empresarial da “C..., Ldª”, existindo uma verdadeira confusão de patrimónios sociais. A testemunha EE, administrativa na Escola de Condução D... e E..., desde 2010 e até 2021, escolas que refere pertenciam à C..., Ldª e eram todas dos mesmos patrões. Depôs de forma clara e coerente, revelando ter conhecimento direto dos factos, tendo sido colega de trabalho da A. Refere que a A. dava aulas de código e de condução: estava em Aveiro, na Escola de Condução B..., que era dos mesmos patrões, durante o dia e também vinha dar aulas a alunos da C..., no mesmo período de tempo. Soube pela A. que a Ré lhe tinha deixado de pagar as diuturnidades a que tinha direito, considerando a A. que tinha direito a 4, e que antes de agosto de 2021 já estava receber 3 e passou a receber uma depois dessa data. Como estava muitas vezes com a A., ao fim-de-semana, ela queixava-se disso, só falava disso, estando “stressada” com essa situação, estava ansiosa, “um bocado deprimida”. Queixava-se que não estavam a ouvi-la, a atual gerência, nem a querer perceber a situação dela. Igualmente a testemunha FF, instrutor e dono escola condução, e que trabalhou com a A, de 2008 a 2013, na escola de condução D..., refere que eram responsáveis na altura a DD e CC, mas não sabe se ele era gerente. Era ela que pagava, ele era mais instruções operacionais do dia-a-dia. Como o mesmo afirmou, de forma clara e segura, para eles trabalhadores, as escolas de condução tanto de Aveiro (a B...), como da ... (D...), eram da D. DD e era tudo a mesma coisa. A A. era instrutora como ele; nesse período, a A. ia mais a Aveiro e ele estava na Feira, mas à noite, nesse período, a A. ainda vinha dar aulas de código, à Escola de condução D..., Feira, que era tudo da mesma patroa e do mesmo grupo económico; de resto, só assim se compreende que viesse dar aulas a outra escola de condução que pertencia a empresa formalmente distinta da sua, como fazia, sem que se levantassem problemas de incompatibilidade. Confirmou ainda que, a partir de certa altura, a A. ficou como diretora da escola. Também neste sentido o depoimento da testemunha GG, nascido em ../../1993, que depôs de forma completamente desinteressada, tendo apenas vindo afirmar que a A. foi instrutora dele de código, na escola de condução D..., na ..., em 2009/2010 (ou seja, precisamente num período de tempo em que trabalhava na B..., reforçando a ideia que já deixamos sublinhada desta confusão societária entre as empresas geridas por DD e CC). Afirmou com total segurança que a A. e o FF é que lhe deram aulas de código, depois condução foi só o FF e que começou a tirar a carta quando fez 16 anos. Também a testemunha HH, veio confirmar que a A. foi instrutora dela de código e de condução, na escola de condução D..., na ..., em 2009/2010, ou seja, numa altura em que a mesma trabalhava na B.... Por fim e sobre esta questão foi valorado o depoimento da testemunha II, funcionária da Escola de Condução D... (da C..., Ldª”), de 1991 a 2003, que depôs de forma clara, coerente, assertiva, não denotando qualquer animosidade e logrando em toda a linha convencer, pela forma segura com que depôs. Referiu que a Escola de Condução D... era da C..., Ldª, e que só em 2007/2008, quando veio trabalhar para a ... (inicialmente, em 1991, começou a trabalhar no Porto, depois passou para ... e depois é que foi para a ...), conheceu a A.. Afirmou, sem qualquer hesitação, que a A. trabalhava ali, duas vezes por semana, das 20h22h, e em Aveiro, noutra escola de condução, que também pertencia à D. DD (que era efetivamente sócia dessa empresa, gerida à data pelo seu companheiro), situação que não causava a quem quer que fosse qualquer estranheza, porque eram empresas do mesmo grupo, eram sempre da C.... Como afirmou, embora a A. trabalhasse noutras escolas pertencentes ao mesmo grupo, também vinha dar aulas à escola de condução D..., aliás, afirmou que a A. fazia parte dos mapas de trabalho da escola de condução D... e recebia ordens da DD. (…) Quanto ao depoimento da testemunha CC, gerente da C..., Ldª e também sócio e gerente da B... e A..., o mesmo foi valorado com muitas cautelas, pois que o mesmo tem um interesse no desfecho da lide, porquanto não ignora o mesmo que a informação que consta do contrato de cessão de quotas realizado em agosto de 2021 relativa à data de admissão da A. (que foi por si transmitida), não se mostra correta e não é consentânea com a antiguidade que a A. tem na empresa Ré e que o mesmo lhe reconheceu, quando subscreveu a declaração junta como documento nº24 com a petição, situação que não corrigiu mesmo após saber que a mesma estava a ser usada pela atual gerência da Ré para reduzir a retribuição paga à A., retirando-lhe diuturnidades que lhe estavam a ser pagas antes da cessão de quotas.Refere que a A. começou a trabalhar na empresa C..., Ldª em 2008, em outubro de 2008 (encontrando-se junto a fls. 63, o primitivo contrato celebrado entre a A. e C..., Ldª, datado de 01.10.2008; em 2009 passou para a B..., até outubro de 2011, com um novo contrato e daí para a C... de 2011 a 2017 e depois para a A.... Apesar de querer passar a ideia que se tratam de empresas diferentes e que a A. nunca trabalhou para escolas da C... quando era funcionária da B..., tal facto foi amplamente contrariado pela prova testemunhal supra referida e a que já se fez referência, que confirma precisamente o contrário: a A., enquanto trabalhava na B..., também trabalhava na Escola de condução D... da C..., vindo dar aulas a esta escola duas vezes por semana. E nem se diga, como fez a testemunha, que tal não era possível, por não ser legal, por o alvará não o permitir, pois todos sabemos a distância entre o que é legal e o que sucede na prática e a verdade é que várias testemunhas vieram afirmar que a A. trabalhava na escola de condução D..., na ..., no período de tempo em que formalmente era trabalhadora da B..., sem que o alvará ou o facto de terem sedes em diferentes locais, tivesse constituído qualquer obstáculo a que tal sucedesse na prática. Confirma ser sua a assinatura do documento junto a fls. 24 com a p.i. Quanto ao depoimento da testemunha JJ, que trabalhou na Ré, sendo filha do atual gerente da Ré, depôs de forma marcadamente parcial, quanto aos poucos factos de que tinha conhecimento direto, não logrando convencer. No que ao contrato de cessão de quotas respeita, assinado pelo pai, nada soube esclarecer. Referiu que não recebeu quaisquer reclamações da A., apesar de a custo ter acabado por reconhecer que a A. reclamou verbalmente que não lhe estavam a pagar as diuturnidades corretamente, tendo-lhe dito que fosse à contabilidade. Ora, a prova documental junta não deixa margem para quaisquer dúvidas quanto ao facto de que a Ré teve efetivo conhecimento das reclamações verbais e escritas da A.; aliás, foi a própria testemunha que assinou o A/R de duas destas cartas (a junta como documento nº4 e a junta como documento nº2 com a petição) dirigidas pela A. ou pelo seu Advogado à Ré, e o facto de a testemunha afirmar que não as recebeu, só retira credibilidade ao seu depoimento. E nem se diga que a testemunha não leu o seu teor; é que, como decorre do seu depoimento, a mesma já sabia perfeitamente quais eram as reclamações da A. E também não convenceu o depoimento da testemunha BB, filho do atual gerente da Ré. Refere que acompanhou a negociação da cessão de quotas, sendo que na altura que foi feito o contrato, em agosto de 2021, o CC falou-lhe da funcionária, a aqui A., referindo que confiaram na palavra deste quanto ao que o mesmo disse a esse propósito, designadamente à data de admissão da A. Este depoimento causou logo a maior estranheza, pois que não é de acordo com as regras da normalidade que não verificassem aquilo que lhes estava a ser dito pelo CC. Quanto às cartas que a A. remeteu à Ré, a reclamar da sua situação, afirma que pensa que eram dirigidas ao antigo gerente, sem que alcance como pode afirmar tal, quando as cartas têm como destinatária a aqui Ré, não se vislumbrando como pode afirmar que se dirigiam a outra pessoa, diferente do destinatário que delas consta. Naturalmente, o que pretendeu com o seu depoimento foi dar a ideia, falsa, de que a A. não reclamou junto da atual gerência, da sua situação laboral, designadamente de não lhe estarem a ser pagas as diuturnidades devidas, nem mesmo aquelas que antes do contrato de cessão de quotas estavam a ser pagas, sem qualquer justificação plausível, pois que, ainda que tivesse acreditado na palavra do CC, não podia deixar de verificar nos recibos de vencimento da A. que lhe estavam a ser pagas três diuturnidades antes da cessão de quotas, pelo que não se compreende como, a que título, com que fundamento, lhe passam a pagar apenas uma, sendo evidente que nenhum interesse a atual gerência demonstrou por indagar essa situação e verificar se a mesma correspondia ou não à verdade, independentemente do que ficara a constar a esse propósito no contrato de cessão de quotas. Teve-se ainda em conta o depoimento da testemunha DD, que confirmou ter passado um cheque pessoal para pagar à A. valores que esta reclamava a título de diuturnidades, cheque cuja cópia foi junta em 14.03.2023, emitido em 29.06.2018 e que o fez porque queria resolver amigavelmente essa situação, tanto mais que gostava do trabalho da A (tanto assim que a A. passara, sempre por necessidades de serviço e por conveniência da entidade patronal, de umas escolas para outras, e em todas a DD era sócia). A A. apresentou-lhe aquelas contas e resolveu pagar o valor de €1.289,50, sem cuidar de saber se eram ou não devidas tais quantias e designadamente se eram devidas três diuturnidades, afirmando que esse acordo que fez com a A. foi particular. Acontece que, neste segmento, o seu depoimento não convenceu, porque contrariado pela prova documental junta. Com efeito, não suscita qualquer dúvida que a Ré assumiu o pagamento das três diuturnidades à A., contadas desde janeiro de 2009 e disso nos dão conta os recibos de vencimento juntos aos autos, pelo que tal valor passou a fazer parte, inequivocamente da retribuição da A., não podendo ser retirado, sem mais, como foi. A A. assou de umas escolas para as outras, sempre por necessidades de serviço Uma última nota para fazer referência às declarações da A. e depoimento do legal representante da Ré. Quanto às declarações de parte da A., as mesmas lograram no essencial convencer, na parte em que foram corroboradas por outros elementos de prova. Como a mesma afirmou, as escolas de condução apenas se distinguiam pelo nome, porque tudo o resto era igual: as pessoas eram as mesmas, DD e CC e as funções também. Em 2009 assinou contrato com a B..., mas os patrões eram os mesmos, sendo que nessa altura vinha dar aulas 2 dias por semana, às segundas e quartas, na escola de condução D..., da C.... Posteriormente, em 2011, passou da B... para a Escola de condução E..., em .... E daí, em 30.06.2007, passou para a A..., mas como afirma as suas funções eram as mesmas, o mesmo salário, a mesma situação. Nessa altura, porque já estava cansada dessas mudanças de empresa, sem que os seus direitos ficassem acautelados, pediu a declaração de antiguidade, junta a fls. 64, sendo que como começou a trabalhar na C..., Ldª, em 1.10.2008 e todas as escolas onde trabalhou pertenciam aos mesmos patrões e faziam parte desse mesmo grupo económico da C..., os direitos adquiridos na empresa C... reportam-se a todo o período desde aquele primeiro contrato em 01.10.2008 até 2017, data em que passou para os quadros da A.... Aliás, refere que essa declaração foi pedida por si, precisamente para salvaguardar a sua antiguidade desde o primeiro contrato que celebrara com a C..., Ldª, apesar de ter trabalhado em escolas que eram detidas formalmente por outras sociedades, mas todas com ligações societárias entre si. Confirmou ainda que esta situação laboral, o facto de lhe retirarem diuturnidades, de não lhe resolverem o problema, desgastou-a imenso psicologicamente, além dos problemas económicos que lhe causou resultantes da diminuição de um rendimento, com o qual contava e tinha como certo. Quanto ao depoimento de parte do legal representante da Ré BB, o mesmo foi pouco esclarecedor, já que o atual gerente da Ré se escudou no teor do contrato de cessão de quotas que celebrou para alijar as suas responsabilidades, mas esquecendo que a A. é completamente alheia a esse contrato, e aos termos em que foi celebrado. Como resulta claro da assentada lavrada na ata da audiência de julgamento do dia 3 de fevereiro de 2023, por entender que os assuntos anteriores à data da sua aquisição de quotas deviam ser tratados pelo anterior dono (CC), o mesmo desvalorizou completamente as reclamações que a A. lhe fez, logo no dia em que lhe foi apresentada, não cuidando de verificar se tinham ou não fundamento, pretendendo manifestamente desresponsabilizar-se de uma responsabilidade que era sua e só sua, pois que a trabalhadora é funcionária da A... e é essa empresa (independentemente de quem sejam os titulares das suas quotas em cada momento) que responde perante a trabalhadora. Se no negócio de cessão de quotas lhe foram omitidos factos relevantes quanto à situação da trabalhadora, isso é questão que tem de resolver com o cedente, em ação própria; o que não pode pretender é que seja a A. a sofrer as consequências de um negócio em que não interveio e ao qual é completamente alheia. É para nós inconcebível no quadro de uma relação de trabalho pautada pela boa fé que, tendo a A. reclamado junto do gerente da Ré que lhe estavam a ser pagas três diuturnidades antes da cessão de quotas e que por isso não havia fundamento para que tivessem passado a pagar-lhe apenas uma, como sucedeu, o gerente se tenha limitado a dizer-lhe que, de acordo com as indicações do contabilista, que nem sequer foi indicado para ser ouvido como testemunha, a mesma só tinha direito a uma diuturnidade, quando a mesma tinha recibos emitidos pela Ré, em datas anteriores, em que estavam a ser pagas três diuturnidades, sendo pois evidente, para qualquer gestor criterioso, que a palavra do contabilista não podia ser suficiente para esclarecer a situação da A., tanto mais que a Ré tinha os recibos de vencimento da A. e teve acesso à declaração junta como documento nº24 com a petição, como resulta evidente do email junto como documento nº4, com o requerimento datado de 14.03.2023, email esse datado de 19.11.2021. Tinha pois obrigação de fazer mais e, se considerava, como considera, que a responsabilidade pela errada informação que lhe foi dada no contrato era imputável ao Sr. CC, era ele que tinha de resolver essa situação e não a trabalhadora, pelo que a sua atitude de reencaminhar as cartas de reclamação da A. para o CC, cartas que eram dirigidas à Ré, da qual é o gerente, deixando a A. sem qualquer resposta às suas reclamações, é demonstrativa e reveladora de uma atitude no mínimo desrespeitadora para com a sua trabalhadora, pois que nem sequer cuidou de falar com o CC sobre esta situação, como se impunha que fizesse para resolver um problema criado à trabalhadora e ao qual era alheia.” Como se vê a Srª Juíza a quo fundamentou cabalmente a sua convicção relativamente aos factos em questão e para tal considerou não só o contrato de trabalho e a declaração juntos pela A. com a petição inicial e os depoimentos do actual gerente da Ré, BB, e do gerente anterior, CC, a que a recorrente se reporta, mas também a demais documentação carreada para os autos, as declarações de parte da A. e os depoimentos de várias testemunhas, meios de prova que apreciou criticamente no seu conjunto e aos quais a recorrente não faz qualquer referência. A recorrente pretende afinal fazer assentar a alteração por que pugna no presente recurso apenas em parte da prova que foi efetivamente atendida pelo Tribunal recorrido para formar a sua convicção, com a agravante de indicar apenas algumas passagens do depoimento de parte do seu actual legal representante e do depoimento do anterior gerente da R, passagens essas que foram escolhidas no sentido de darem suporte à convicção que defende, porém, apreciando-se tais depoimentos na sua totalidade, os mesmos revelaram-se parciais e não merecem credibilidade. Com efeito, a recorrente, quanto à prova em que suporta a alteração, indicou passagens parcelares, que em parte transcreveu e pretende, com base nessa prova parcelar, dar suporte à convicção que defende, não atendendo à demais prova produzida, quando, como se disse, o Tribunal teve no caso em consideração toda a prova que foi produzida e que analisou e conjugou globalmente, sendo que foi desse juízo crítico e ponderado que extraiu e fundou a sua convicção, o que justificaria que a aqui Recorrente não se tivesse limitado a fundar a alteração que defende apenas nessa indicação parcelar da prova produzida, para sem mais afirmar que só por si suportaria tal alteração. Na verdade, para impugnação da decisão sobre matéria de facto com fundamento em erro de julgamento, é necessário que se ponha em causa a avaliação da prova feita pelo tribunal a quo, assinalando as deficiências de raciocínio que levaram a determinadas conclusões ou assinalando a insuficiência dos elementos considerados para as conclusões tiradas, o que a recorrente não fez. De resto, importa também ter presente que segundo o disposto no art. 607º, nº5 do C.P.Civil, o juiz decide a matéria de facto segundo a sua íntima convicção, formada no confronto com os vários meios de prova que aprecia livre e criticamente de acordo com as regras da experiência comum e operações de raciocínio lógico, como a dedução e a indução, sendo que, no presente caso, não encontramos razões, nem a recorrente as indicou, para discordarmos da apreciação feita pelo Tribunal a quo do conjunto os elementos probatórios disponíveis, antes pelo contrário, corroboramos a valoração pelo mesmo efectuada. Destarte, pelas razões expendidas na motivação transcrita, entendemos ter ficado demonstrado que com a declaração datada de 29 de junho de 2017, o então gerente da R. CC reconheceu que a A. mantinha todos os direitos adquiridos desde a sua admissão inicial ao serviço da C..., Lda, em outubro de 2008, na qual nunca deixou de trabalhar, apesar de no período de Junho de 2009 a Outubro de 2011 ter assinado um contrato de trabalho com a “B..., Lda”, cujo gerente era o mesmo, passando a exercer as suas funções predominantemente na escola explorada por esta última. Tal reconhecimento traduziu-se no pagamento das correspondentes diuturnidades e vincula a gerência subsequente à cessão de quotas ocorrida em 2021, mesmo que nessa cessão o representante da cedente (CC que tinha subscrito a dita declaração) tenha omitido tal facto à cessionária, o que pode determinar responsabilidade contratual entre as partes no contrato de cessão de quotas, mas não prejudicar a Autora. Porém, entendemos que o ponto 10 dos factos provados não expressa com exactidão a factualidade provada, pelo que, alterando-se a respectiva redacção, no mesmo passará a constar: 10. A Ré estava ciente que quando a A. foi admitida ao seu serviço em 30.6.2017, lhe foram garantidos todos os direitos adquiridos desde a sua entrada ao serviço da sociedade C..., Lda, em 1.10.2008 e, por isso, a sua antiguidade reportava a esta data. E, oficiosamente, ao abrigo do disposto no art. 662º, nº1 e 663º, nº2 do C.P. Civil, tendo em conta que, como já dissemos, estes factos são indissociáveis dos constantes do ponto nº15, também se altera a redacção deste, onde passará a constar: 15. A Autora iniciou o seu contrato com a R. em 30.6.2017, tendo-lhe sido reconhecida a antiguidade proveniente da empresa C..., Lda, desde 1de Outubro de 2008. E, concomitantemente, elimina-se da factualidade não provada o seguinte: - A A. iniciou funções laborais na R. em 1.7.2017. Em suma, a impugnação da recorrente não procede, mas altera-se oficiosamente a decisão da matéria de facto nos termos sobreditos. O Direito Determinação da indemnização devida à A. pela resolução do contrato com justa causa No que que concerne à solução jurídica a recorrente não contesta a existência de justa causa para a resolução do contrato de trabalho por parte da Autora, sustenta, porém, que o tribunal recorrido incorreu em erro nos pressupostos de facto e de direito, o que levou à fixação de uma indemnização exageradíssima impondo-se, por isso, a sua revogação nessa parte, substituindo-se por outra que arbitre uma indemnização mais consentânea com a realidade fixada pelos factos e pelos critérios indemnizatórios legais, mormente do art. 396.º do CT e do art. 496º do CC. Por seu turno, a recorrida pugna pela confirmação integral da sentença. O quadro factual a atender é o fixado na 1ª instância com as alterações ora determinadas aos pontos 10 e 15, sublinhando-se que o reconhecimento da justa causa assentou no facto de a Ré a partir de Agosto de 2021 ter deixado de pagar à Autora as diuturnidades a que esta tinha direito e não incluir nos duodécimos dos subsídios de férias e de Natal o valor respeitante a tais diuturnidades e ao acréscimo remuneratório que lhe era devido pelo exercício das funções de directora da escola. A A. não logrou provar o alegado crédito por prestação de trabalho suplementar, também invocado na comunicação de resolução do contrato, sendo a R. absolvida nessa parte, pelo que não se percebe a alusão da R. à desproporção entre tal crédito e a indemnização fixada (conclusões 4 e 5). E face ao teor da comunicação de resolução do contrato, transcrita no nº2 dos factos provados, em que a A. diz expressamente “venho comunicar a imediata resolução, com justa causa, do contrato de trabalho…” carece de qualquer fundamento a recorrente vir dizer (conclusão 6) que tinha para si como certo que a recorrida estava a rescindir livre e unilateralmente o contrato de forma amigável e que se considerava paga de todos os créditos com o recebimento da quantia global de € 1.853, 06. Mas vejamos se o Tribunal recorrido respeitou os critérios legais na fixação da indemnização. Sobre a fixação da indemnização no caso de resolução do contrato pelo trabalhador com justa causa rege o art. 396º do C. Trabalho, sob a epígrafe «indemnização ou compensação devida ao trabalhador» 1- Em caso de resolução do contrato com fundamento em facto previsto no nº 2 do artigo 394º, o trabalhador tem direito a indemnização, a determinar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau da ilicitude do comportamento do empregador, não podendo ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades. 2- No caso de fração de ano de antiguidade, o valor da indemnização é calculado proporcionalmente. 3- O valor da indemnização pode ser superior ao que resultaria da aplicação do n.º 1 sempre que o trabalhador sofra danos patrimoniais e não patrimoniais de montante mais elevado. (…) Como se vê, o nº 1 diz ter o trabalhador direito a indemnização, a fixar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades em função da antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude do comportamento do empregador.E o nº 3 e prevê que a indemnização pode ser superior ao valor que resulta do nº 1 sempre que o trabalhador demonstre que sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais de montante mais elevado. Como se articulam estas duas normas? Importa lembrar que o art. 396º surge para resolver as dúvidas surgidas com o regime decorrente do art. 443º do CTrab/2003 que no seu nº1 dispunha « - A resolução do contrato com fundamento nos factos previstos no n.º 2 do artigo 441.º confere ao trabalhador o direito a uma indemnização por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, devendo esta corresponder a uma indemnização a fixar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade.” Este normativo previa a ressarcimento de todos os danos (patrimoniais e não patrimoniais) mas simultaneamente fixava um limite indemnizatório que podia impossibilitar, exactamente nos casos de maior gravidade, a reparação integral dos danos sofridos pelo trabalhador, o que suscitou várias críticas, nomeadamente na doutrina. Albino Mendes Baptista, in Estudos sobre o Código Trabalho, p. 39, defendeu “ser forçoso concluir que o legislador disse mais do quês queria dizer, ou seja importa proceder a uma interpretação restritiva do preceito, deixando de fora, desde logo, os danos não patrimoniais que, por natureza, são insusceptíveis de sujeição a um espartilho legislativo.” Em resposta a tais críticas, o legislador em 2009 introduziu no nº3 do art. 396º. É agora claro que o nº 1 do artigo 396º não constitui obstáculo a que seja ressarcida a totalidade do dano, ainda que ultrapasse o valor resultante da aplicação da fórmula constante nesse normativo. O nº 3 constitui uma válvula de escape, permitindo que, demonstrados danos superiores ao montante que resulta da aplicação do nº 1, seja esse o valor a atribuir. Contudo, a indemnização é só uma. O nº 1 do artigo refere que “o trabalhador tem direito a indemnização, … atendendo ao valor da retribuição e ao grau da ilicitude do comportamento do empregador “. Considerando o teor de toda a norma, não pode deixar de se considerar que se abrangem todos os danos sofridos que forem indemnizáveis nos termos do direito. Notem-se os dizeres do nº 3, “O valor da indemnização pode ser superior ao que resultaria da aplicação do n.º 1 sempre que o trabalhador sofra danos patrimoniais e não patrimoniais de montante mais elevado”. E neste sentido se tem firmado a jurisprudência dos tribunais superiores. - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8.10.2014, Proc. nº 1113/12.1T4AVR.C1.S1 (Relator Pinto Hespanhol) “Em caso de resolução do contrato de trabalho com fundamento em facto previsto no n.º 2 do artigo 394.º do Código do Trabalho de 2009, a indemnização a que o trabalhador tem direito resulta da ponderação conjunta dos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, dando lugar a uma indemnização única, tal como reza o n.º 1 do artigo 396.º subsequente, sendo certo que o valor da indemnização pode ser superior ao que resultaria da aplicação daquele n.º 1, quando o trabalhador sofra danos patrimoniais e não patrimoniais de montante mais elevado.” - Acórdão desta Secção Social da Relação do Porto, de 8.6.2022, Proc. nº n756/20.4T8MAI.P1(Relator António Luís Carvalhão) “A indemnização prevista no nº 1 do art.º 396º do Código do Trabalho, abrange os danos patrimoniais e não patrimoniais, tratando-se de indemnização fixada conjuntamente com os critérios ali referidos, apenas se podendo fixar um valor fora desse critério, como prevê o nº 3 do mesmo artigo, isto é superior, no caso de o valor assim arbitrado não se mostrar adequado à salvaguarda de todos os danos (patrimoniais e/ou patrimoniais) efetivamente sofridos”. - Acórdão da Relação de Lisboa de 25-09-2019, Proc. 2910/18.0T8PDL.L1-4(Relator Duro Mateus Cardoso) “I-Deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, através de um critério de equidade e o seu montante deve ser proporcionado à gravidade do dano, usando-se todas as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas, e das realidades. II- O nº 3 do art. 396º do CT/2009, possibilita a ultrapassagem do limite estabelecido no nº 1 do mesmo artigo, sempre o trabalhador sofra danos patrimoniais e não patrimoniais de montante mais elevado ao que resultaria da aplicação daquele nº 1. III- Quando o trabalhador peticione indemnização por danos patrimoniais e/ou não patrimoniais cujo cômputo seja inferior à indemnização que resulta da aplicação do art. 396º-1 do CT/2009, a indemnização a atribuir fica limitada ao que advém da aplicação do nº 1 de tal artigo, não se somando as duas indemnizações. IV- E caso a indemnização por danos patrimoniais e/ou não patrimoniais cujo cômputo seja superior à indemnização que resulta da aplicação do art.396º-1 do CT/2009, o total indemnizatório ficará limitado ao valor dessa indemnização por danos patrimoniais e/ou não patrimoniais, não se somando, igualmente, as duas indemnizações.” O Tribunal a quo fixou uma indemnização ao abrigo do nº1 do art. 396º, nos seguintes termos: “Da factualidade apurada, é possível imputar à Ré empregadora a prática de comportamentos suscetíveis de integrar a violação do direito da A, enquanto sua trabalhadora, ao pagamento da retribuição, consagrado no artigo 127º, b), do CT de 2009. E violou esse direito da A. ao pagamento da retribuição, porque deixou de lhe pagar a partir de agosto de 2021, pontualmente e na íntegra, o valor das diuturnidades a que tinha direito, três até maio de 2021 e quatro a partir dessa data, além de que nos duodécimos dos subsídios que pagava desde 2015, não incluía a parcela da retribuição respeitante a diuturnidade e diretor. Estes comportamentos são objetivamente graves, violam o direito da trabalhadora consagrado no artigo 127º, b), do CT de 2009 e são suscetíveis, em abstrato, de integrarem a justa causa de resolução prevista no artigo 394º, nº2, a), do CT de 2009. Além disso, pelo menos desde agosto de 2021, a A. pediu à Ré a retificação destas situações, solicitando pessoalmente que fosse corretamente considerada a sua antiguidade e pagas as diuturnidades a que tinha direito (que desde Junho de 2021, são quatro). A Ré limitou-se a ouvir a solicitações da A. e a receber as cartas da A. e do seu Advogado, sem responder, ignorando continuamente as repetidas solicitações da A.. Este comportamento da Ré consubstancia uma violação continuada do dever de pagar pontualmente e integralmente a retribuição que é devida à A., o que se vem agravando com o decurso da relação contratual. Essa falta de pagamento do valor das diuturnidades devidas (a que acresce o facto de lhe ser retirado um valor das diuturnidades que já recebia até julho de 2021, €74,40, passando a ser-lhe pago apenas €24,80 desde agosto de 2021) tem repercussões na esfera patrimonial da A., já que o seu único rendimento é o que provém do seu salário e assume gravidade acrescida pela reiteração da conduta todos os meses, que se traduz além do mais, numa violação do dever de respeito que é devido ao trabalhador, pois que a Ré nada fez para resolver esta situação, relativa ao reconhecimento da antiguidade A. e das diuturnidades devidas e a falta do ajustamento do pagamento dos subsídios em duodécimos, desde outubro de 2015. E a Ré não podia desconhecer que os seus comportamentos eram ilícitos e que as suas condutas eram suscetíveis de lesar a A., desde logo em termos patrimoniais, desde logo porque a A. ao longo de vários meses reclamou dessa situação. Além disso, a Ré não provou que a falta de cumprimento da obrigação de pagamento das retribuições da A. não procedeu de culpa sua, pois que como já supra se explicitou o facto de no contrato de cessão de quotas ter sido colocada como data de admissão da A. a data de 30.06.2017, facto que não se mostra correto nem acautela a antiguidade da A. que lhe foi reconhecida pela própria Ré na declaração que entregou à A. e junta como documento nº24 com a petição, não legitimava a Ré a reduzir-lhe o valor das diuturnidades, por decisão unilateral, a partir de agosto de 2021, nem a verificar de acordo com os seus próprios registos contabilísticos qual a antiguidade da A. que devia ser considerada. No caso, resulta claro que, na data da resolução (03.06.2022), encontravam-se em dívida diuturnidades devidas e que integram a retribuição da A. e diferenciais dos duodécimos dos subsídios pagos desde outubro de 2015, há vários e sucessivos meses, pelo que se presume culposa a falta de pagamento, razão pela qual assiste à A. justa causa para resolver o respetivo contrato de trabalho. A A. não deu origem, nem contribuiu, para a situação de falta de pagamento integral da sua retribuição, reclamando reiteradamente que fosse reposta a situação. Face à natureza alimentar e essencial da retribuição, ao valor da retribuição mensal auferida pela Autora que vai pouco além do salário mínimo, ao valor das diuturnidades e subsídios em falta, ao lapso de tempo em que se prolongou a falta de pagamento dessas quantias, é de concluir que não lhe era exigível, naquelas circunstâncias, manter a relação laboral. (…) Atendendo às circunstâncias concretas e ao valor mensal do salário e ao valor das diuturnidades em falta e diferenciais dos duodécimos em falta, a manutenção do contrato de trabalho representaria uma insuportável e injusta imposição à A., que durante meses reclamou dessa situação, pedindo que fossem pagas as quantias devidas e reposto o pagamento dos valores que, até julho de 2021, já vinham sendo pagos a título de diuturnidades, sem obter qualquer solução por parte da Ré, não lhe sendo exigível a manutenção de tal vínculo, perante um quadro de agravamento reiterado da situação, de desrespeito reiterado traduzido numa atitude de manifesto desprezo e desconsideração face Às reclamações da A., tornando-se inexigível que, ao fim de 10 meses consecutivos, em que a Ré estava repetidamente a desrespeitar o contrato, mostrando que essas situações de incumprimento era irreversível e não iria repor as quantias em falta, a A. tivesse de continuar a trabalhar para a Ré.Face às circunstâncias concretas, a manutenção do contrato de trabalho representaria uma insuportável e injusta imposição ao A., não lhe sendo exigível a manutenção de tal vínculo. Conclui-se pela existência de justa causa de resolução do contrato de trabalho. (…) Existindo justa causa para a resolução do contrato de trabalho, como se apurou que existia, assiste à A. o direito à indemnização a que alude o art.º 396.º do Código do Trabalho. Preceitua o nº1 do artigo 396º do CT que a resolução do contrato nestes termos confere ao trabalhador o direito a uma indemnização calculada entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade e fração, não podendo ser inferior a três meses. A A. tinha como retribuição base mensal à data da cessação do contrato €820 e de diuturnidades devia receber €99,20 (€24,80x4) e uma antiguidade de 13 anos e 7 meses. Atendendo à antiguidade da A., à retribuição base e diuturnidades que auferia (retius, devia auferir) à data da cessação, à gravidade da conduta da Ré que persiste no seu incumprimento durante mais de 10 meses consecutivos, sem dar qualquer resposta à A. sobre essa situação, consideramos adequado fixar o valor de referência em um mês por cada ano de trabalho. É assim devida a indemnização pela cessação do contrato de trabalho, no montante de €12.485,80, calculada à razão de 30 dias de retribuição de base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade (€919,20x13+€919,20x7:12). A este valor acrescem juros de mora, calculados desde a data do trânsito da presente decisão, à taxa legal de 4% e até integral pagamento (artigo 559º do C.Civil e Portaria nº291/2003, de 08.04.” E, de seguida, arbitrou uma compensação autónoma de € 750,00 pelos danos morais sofridos pela A. Como vimos, tal procedimento não se mostra conforme ao disposto no art. 396º do C.Trabalho, pois, a indemnização prevista no nº 1 abrange os danos patrimoniais e não patrimoniais, como decorre do nº 3, e é fixada segundo o critério aí enunciado. Apenas se pode fixar um valor fora desse critério, isto é superior, no caso de o valor assim arbitrado não se mostrar adequado à salvaguarda de todos os danos efetivamente sofridos pelo trabalhador. Isto é, se a indemnização adequada aos danos patrimoniais e/ou não patrimoniais sofridos pelo trabalhador é coberta pelo valor referido no nº 1 do art.º 396º, o trabalhador fica ressarcido, sem acrescer qualquer quantia a título de danos não patrimoniais; se a indemnização adequada aos danos patrimoniais e/ou não patrimoniais sofridos pelo trabalhador for de montante superior ao que resulta do estabelecido no nº 1 do art.º 396º, então será compensado pelo valor considerado adequado, cabendo ao trabalhador provar a sua existência e a relação causal dos danos com a cessação do contrato de trabalho. Aqui chegados, importa aferir se é de manter a condenação da Ré no pagamento de € 750,00 a título de compensação por danos não patrimoniais, a acrescer à indemnização fixada ao abrigo do disposto no nº 1 do art.º 396º do Código do Trabalho. O Tribunal a quo fixou a indemnização no valor de € 12. 485,80, tendo em conta que a retribuição base mensal da A. à data da cessação do contrato era €820 e de diuturnidades devia receber €99,20 (€24,80x4) e tinha uma antiguidade de 13 anos e 7 meses. Assim, atendendo à antiguidade da A., à retribuição base e diuturnidades que auferia (retius, devia auferir) e à gravidade da conduta da Ré que persistiu no seu incumprimento durante mais de 10 meses consecutivos, sem dar qualquer resposta à A. sobre essa situação, considerou adequado fixar o valor de referência em um mês por cada ano de trabalho. Como se vê, não fez aqui qualquer ponderação dos danos de natureza não patrimonial, autonomizando a respectiva compensação, como se o nº 1 do art.º 396º, não se reportasse a tais danos, arbitrando, a seguir, para compensação dos mesmos a quantia de € 750, referindo o seguinte: “Provou-se, com interesse a este propósito: Pelo menos desde a data de recebimento das cartas referidas em 3º, a Ré assumiu comportamentos reiterados e repetidos de não pagamento, mesmo depois de instada consecutivamente pela autora e pelo seu Advogado, não só nada dizendo, como nada pagando; fazendo com que a autora visse a sua retribuição diminuída, causando-lhe transtornos, já que a Autora que vivia única e exclusivamente com a remuneração que lhe era paga pela ré; e causando angústia à autora que viu a ré não só não lhe pagar o que lhe devia como lhe reduziu o valor que lhe pagava, sem qualquer justificação e sem sequer falar com a autora sobre essa mesma decisão; - A ré nada fez e desde outubro de 2021 não mais respondeu às missivas da autora e nem sequer encetou qualquer diálogo com a autora, apesar de esta lhe ter proposto, sempre e repetidamente resolver amigavelmente as questões em causa, dando oportunidade à ré de solucionar as questões em causa e também de consigo dialogar a esse respeito; a autora solicitou, repetidamente, a correção de todas as questões acima expostas, mas a ré não só não o fez, como ignorou as interpelações nesse sentido, por parte da autora, como se esta não as tivesse efetuado; a autora insistiu, repetidamente, para que fossem efetuados os pagamentos de todos os retroativos, o que fez, tanto de forma verbal perante a gerência, como através de missivas que enviou à ré, por si e/ou através do seu Advogado; mas nada logrou, por parte da ré, nem obteve sequer resposta alguma, deixando a ré por liquidar a totalidade dos montantes respeitantes aos retroativos dos duodécimos e duodécimos que se foram vencendo, devidos à autora e às diuturnidades devidas, nada fazendo, nada corrigindo; esta conduta da ré gerou, na pessoa da autora, ansiedade, preocupação, angústia, tristeza, inquietação e sofrimento; a autora sofreu e sofre de angústia pela situação criada pela ré e pela completa ausência de resposta que se prolongou durante meses e meses, encontrando-se ainda ansiosa, desassossegada, perturbada, triste, com stress e sofreu abalo moral, psíquico e nervoso. Para que exista obrigação de indemnizar os danos não patrimoniais é necessário que se verifiquem os requisitos da responsabilidade civil previstos no art.º 483.º do Código Civil e que tais danos, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, nos termos do art.º 496.º, nº1, daquele diploma legal. Dispõe o mencionado art. 483.º que “Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.” (…) Não há dúvida, da matéria de facto provada que, o comportamento da Ré, revela um desrespeito culposo pelos direitos da A. enquanto trabalhadora.Tais comportamentos da R., assumem caráter culposo e atentam contra a dignidade da A., enquanto trabalhadora, sendo causa adequada do abalo psicológico que sentiu, tanto mais que já trabalhava na empresa Ré há vários anos, sobretudo porque a Ré além de não lhe pagar as diuturnidades devidas, de lhe retirar parcialmente o valor que já lhe pagava a esse título (de €74,30, para €24,80), não deu resposta às várias solicitações da A. para se resolver a situação por acordo, votando-a a um completo desprezo, ignorando a A. a partir de outubro de 2021, deixando-a sem qualquer resposta e não pagando os valores devidos. Os danos sofridos pela A., supra descritos, em virtude destes comportamentos culposos da R., integram uma lesão grave dos direitos da A., em receber a retribuição a que tem direita e a ver a sua entidade patronal tratá-la com o respeito devido. Tais danos que, pela sua gravidade, merecem a tutela do direito devem ser indemnizados, com base na equidade, nos termos do disposto nos conjugados artigos 483.º e 496.º 1 e 3, do Código Civil. Como elucidam Pires de Lima e Antunes Varela, “O montante da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais deve ser calculado em qualquer caso (haja dolo ou mera culpa do responsável) segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica è às do lesado e do titular da indemnização, às flutuações da moeda, etc. E deve ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, da justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida [Código Civil Anotado]. Perante o quadro factual a atender, afigura-se-nos equilibrada e ajustada uma indemnização a título de danos morais, no montante de € 750,00.” Concordamos que os danos morais sofridos pela Autora assumiram gravidade suficiente para justificar a compensação arbitrada que se mostra ajustada e equitativa. Mas haverá razões que justifiquem que tal montante deva acrescer à indemnização de €12.485,80 fixada nos termos do nº 1 do art.º 396º do Código do Trabalho? Cremos que o factor de cálculo de 30 dias de retribuição base por cada ano completo de antiguidade ponderado pelo Tribunal a quo logrou a fixação de montante indemnizatório que se nos afigura suficiente e adequado ao ressarcimento de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pela A., globalmente ponderados. E assim sendo não existe fundamento legal para o arbitramento da compensação no valor de €750,00 pelos danos não patrimoniais sofridos pela A., procedendo nesta medida a apelação da recorrente e impondo-se a correspondente alteração da decisão recorrida. * Quanto à responsabilidade pelas custas, tendo em conta que a impugnação da decisão da matéria de facto da recorrente improcedeu, apenas há que ponderar no vencimento desta a quantia de € 750,00, pelo que as custas do recurso ficam a cargo da Recorrente e Recorrida na proporção do decaimento que se fixa em 97,4% e 2,6% respetivamente – cf. art.º 527º do Código de Processo Civil. * IV. DECISÃO Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, decidem: I) alterar a redação dos pontos 10 e 15 dos factos provados, nos termos sobreditos. II) revogar a alínea f) do dispositivo da sentença recorrida na parte em que condenou a Ré a pagar à Autora a quantia de € 750,00 a título de compensação dos danos não patrimoniais, abrangendo a indemnização no valor de € 12.485,80 o ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais. III) manter, no mais, a sentença recorrida. Custas na 1ª instância, nos termos fixados na sentença. Custas do recurso pela Recorrente e Recorrida na proporção do decaimento (que se fixa em 97,4% e 2,6% respetivamente), com taxa de justiça conforme tabela I-B anexa ao RCP -cfr. art.º 7º, nº 2 do RCP). Notifique Porto, 28 de junho de 2024 Os Juízes Desembargadores Relatora: Eugénia Pedro 1ª Adjunta: Germana Ferreira Lopes 2º Adjunto: António Luís Carvalhão |