Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
| ||
Relator: | CAETANO DUARTE | ||
Descritores: | APREENSÃO DE VEÍCULO LESÃO GRAVE PROVIDÊNCIA CAUTELAR | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/08/2009 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | - Os factos provados quanto ao justo receio da requerente resumem-se à desvalorização do veículo decorrente do seu uso e agravada pelo decurso do tempo. Parece-nos que este efeito é uma consequência normal da existência dum veículo: desvaloriza com o uso e com o decurso do tempo pelo que estaríamos perante facto notório que nem era preciso alegar. -não se vê em que medida a falta de entrega do veículo torna mais gravosa essa desvalorização: se o veículo não for usado, a sua desvalorização será provavelmente maior e o tempo decorreria e desvalorizaria sempre o veículo quer este fosse entregue ou não. (Sumário do Relator) | ||
![]() | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa M – S.A. intentou providência cautelar não especificada contra J pedindo a apreensão imediata do veículo M com a matrícula -76.. Alega ter celebrado com o requerido contrato de aluguer de longa duração de veículo sem condutor, tendo-se este obrigado a pagar mensalmente € 400,26. Estão por pagar as mensalidades 21 a 26 no valor global de € 2 478,68. A continuação da utilização do veículo pelo requerido importa uma desvalorização do mesmo, agravada pelo decurso do tempo e acarreta perigos de acidentes sem protecção de seguro ou a apreensão do veículo. Efectuada a produção da prova oferecida pela requerente, foi proferida a decisão de fls. 33 e 40 que julgou improcedente a providência. Desta decisão, vem o presente recurso de apelação interposto pelo requerente. ***************** Nas suas alegações, defende o apelante, em resumo: - O direito que se pretende acautelar com esta providência é o da restituição do veículo e não apenas um direito de natureza obrigacional; - O simples facto de o veículo não ser restituído justifica o receio do requerente em que lhe seja causada lesão grave e dificilmente reparável do seu direito à restituição do veículo; - Este receio resulta da recusa do requerido em proceder à entrega voluntária do veículo à requerente, continuando ilicitamente na posse do mesmo com os inerentes riscos e inconvenientes para a requerente; - A não restituição do veículo acarreta prejuízos irreparáveis, decorrentes da desvalorização da viatura pelo uso e pelo decurso do tempo. A recorrida não contralegou. O juiz a quo manteve a sua decisão. Corridos os vistos, cumpre decidir. ******************* Foram considerados provados os seguintes factos: - A requerente é uma sociedade que tem por objecto o exercício da actividade de aluguer de veículo automóvel sem condutor; - No exercício da sua actividade, a requerente celebrou com o requerido o contrato de aluguer de longa duração de veículo sem condutor n.º ..., o qual teve por objecto o veículo automóvel, marca M, com matrícula 76, chassis n.º adquirido pela requerente ao fornecedor designado ML, pelo preço de € 29 300,00, IVA incluído; - A propriedade sobre o veículo automóvel objecto do contrato ALD encontra-se inscrita a favor da requerente; - Nos termos do contrato ALD celebrado, o requerido obrigou-se a pagar à requerente alugueres mensais no valor de € 400,26, cada um, aos quais acresce o valor do IVA, calculado à taxa em vigor na data dos respectivos vencimentos; - No n.º 3 da clausula 4 da condições gerais do contrato de ALD, requerente e requerido acordaram em que o valor dos alugueres seria alterado em função de variações que viessem a verificar-se na taxa Euribor (a 3 meses); - O requerido não pagou à requerente, nem na data do seu vencimento, nem posteriormente, os alugueres a seguir descriminados, que somam o valor de € 2 478,68, IVA incluído: - aluguer 21 vencido em 20.04.2008 no valor de € 30,38; - aluguer 22 vencido em 20.05.2008 no valor de € 49,70; - aluguer 23 vencido em 20.06.2008 no valor de € 491,70; - aluguer 24 vencido em 20.07.2008 no valor de 487,64; - aluguer 25 vencido em 20.08.2008 no valor de € 488,63; - aluguer 26 vencido em 20.09.2008 no valor de € 488,63; - Em face do exposto no artigo precedente, a requerente comunicou ao requerido, através da carta registada datada de 08.10.2008 que deveria proceder à liquidação dos alugueres vencidos e não pagos no prazo máximo de 8 dias, sob pena de se considerar o contrato de ALD automaticamente rescindido nessa data e, consequentemente, constituído o requerido na obrigação de proceder à imediata devolução à requerente, nas instalações desta do veículo automóvel dele objecto; - Nos termos do disposto no nº 1 da clausula 14 das condições gerais do mesmo, tendo decorrido o prazo referido no artigo anterior, sem que o requerido tenha pago à requerente os alugueres vencidos, deve considerar-se o contrato de ALD automaticamente rescindido sendo o requerido obrigado a proceder à imediata devolução à requerente do veículo automóvel objecto do contrato, por força do disposto no n.º 3 da aludida clausula; - Até à presente data, o requerido não só não pagou à requerente os alugueres vencidos até à resolução do contrato de ALD, como não procedeu à devolução do veículo automóvel dele objecto; - Mesmo depois de contactado pela requerente nos termos atrás referidos, o requerido não pagou as quantias em dívida nem devolveu o veículo; - A circunstância de o veículo automóvel propriedade da requerente continuar a ser utilizado pelo requerido implica uma desvalorização do veículo; - A desvalorização do veículo automóvel é ainda acentuada pelo mero decurso do tempo. *************** O objecto do recurso é delimitado pelas alegações dos recorrentes – artigo 684º do Código de Processo Civil. No caso dos autos, há que decidir se pode considerar-se verificado o requisito do periculum in mora. Dispõe o n.º1 do artigo 381º do Código de Processo Civil: “1 –Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, (…) A interpretação que tem sido dada a este dispositivo legal é de se entender que basta um juízo de verosimilhança ou probabilidade relativamente ao direito cuja titularidade se invoca e, no que se refere à lesão grave e de difícil reparação, que se forme um juízo de verdade, de realidade ou certeza sobre o mesmo. Por outras palavras, basta que o direito que se pretende defender seja provável mas é necessário que a lesão exista efectivamente e se prove que é grave e a sua reparação se mostre difícil. Os factos provados quanto ao justo receio da requerente resumem-se à desvalorização do veículo decorrente do seu uso e agravada pelo decurso do tempo. Parece-nos que este efeito é uma consequência normal da existência dum veículo: desvaloriza com o uso e com o decurso do tempo pelo que estaríamos perante facto notório que nem era preciso alegar. Por outro lado, não se vê em que medida a falta de entrega do veículo torna mais gravosa essa desvalorização: se o veículo não for usado, a sua desvalorização será provavelmente maior e o tempo decorreria e desvalorizaria sempre o veículo quer este fosse entregue ou não. Mas admitamos que esta desvalorização pode ser considerada uma lesão grave do direito da requerente. Onde podemos encontrar a difícil reparabilidade dos prejuízos decorrentes desta desvalorização? A requerente não o explica e não vemos qualquer razão para o dar como assente. Se houvesse prova que o requerido tinha descaminhado ou visava descaminhar o veículo ou, por outra qualquer forma, tinha a intenção de não entregar o veículo nem pagar nada à requerente, poderíamos dar por provada essa difícil reparabilidade. Mas nada disso resulta dos autos e pode-se admitir que o requerido irá indemnizar a requerente por todos estes prejuízos. Por outras palavras, a desvalorização invocada e provada pela requerente não é, só por si, suficiente para justificar e dar como provado que o direito da requerente foi alvo de lesão grave e de difícil reparação. Em resumo, a requerente não logrou provar que o seu receio de lesão do seu direito se justifique. Não podia, por isso, a providência deixar de ser indeferida. ******************* Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando na íntegra a decisão recorrida. Custas pela apelante. Lisboa, 8 de Outubro de 2009 José Albino Caetano Duarte António Pedro Ferreira de Almeida Fernando António da Silva Santos |