Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | TRIGO MESQUITA | ||
Descritores: | ALTERAÇÃO NÃO SUBSTANCIAL DOS FACTOS DESPACHO A DESIGNAR DIA PARA JULGAMENTO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 03/29/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
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Sumário: | 1- A alteração prevista pelo artigo 358.º do C.P.Penal há-de ocorrer em julgamento, e já no cotejo das provas aí disponibilizadas e produzidas. 2- No momento do despacho a que se refere o art.° 311.° do C.P.Penal, não sendo patente um claro erro de subsunção dos factos constantes da acusação, não pode o juiz convolar os factos para outro tipo legal de crime por respeito do princípio acusatório. (sumariado pelo relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 9.ª Secção Criminal de Lisboa: I. No processo nuipc.º 170/01.0 ZFLSB do 1.º Juízo Criminal de Lisboa, o Ministério Público veio interpor recurso do despacho judicial proferido pelo Mmo juiz (de julgamento) que desatendeu a sua pretensão, segundo a qual sustentava: - que o arguido está acusado pela prática de um crime de uso de documento falso, p. p. pelo art° 256°, n.1 c) e n. 3 do Cód. Penal; - mas que há elementos que indicam que o arguido também operou e interveio na sua viciação, logo está igualmente incurso na prática do crime de falsificação do documento, pelo que deveria ter sido alvo de acusação pública; - a falsificação consome o uso; - face a uma alteração (não substancial dos factos), nos termos do art° 358°, n. 1 do CPP, desde já, deve proceder-se à respectiva requalificação jurídica dos factos constantes da acusação; - não obstante a acusação ter sido recebida (art° 311° CPP), nos seus precisos termos, o despacho proferido não preclude a possibilidade de conhecimento, a posteriori, de questões prévias e incidentais que não tenham ainda sido suscitadas; - e assim, subsumido o facto ao crime de falsificação de documento, deve considerar-se a incompetência dos tribunais portugueses, na medida em que o tipo não esta elencado nas situações previstas no art° 5° do Código Penal. Neste Tribunal o Exmº Procurador-Geral Adjunto teve vista dos autos, emitindo parecer no sentido da improcedência do recurso. Foi cumprido o artigo 417.º n.º 2 do C.P.Penal. II. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. O despacho revidendo indeferiu a promoção do Ministério Público porque: 1°- O processo foi acusado e foi proferida pronúncia; 2°- Não houve instrução; 3°- Nos autos não surgiram novos elementos probatórios/indiciários; 4°- Só em sede de audiência de julgamento, perante novos dados ou provas que sejam carreados é possível lançar mão do previsto no art° 358° CPP, pois que é nessa fase que tal instituto se mostra contemplado. A acusação deduzida pelo MºPº na qual é imputada ao arguido a prática de um crime, fixou o objecto do processo (na parte que para o caso releva). Com efeito, «o objecto do processo penal é o objecto da acusação, sendo este que, por sua vez, delimita e fixa os poderes de cognição do tribunal (actividade cognitória) e a extensão do caso julgado (actividade decisória). É a este efeito que se chama a “vinculação temática do tribunal” (Figueiredo Dias, in “Direito Processual Penal”, vol. 1º, pág. 145). O que é uma decorrência da estrutura acusatória do processo criminal ( v. art.º 35º, n.º 2, da Constituição ), através do qual tem-se em vista “assegurar as garantias de defesa do arguido, protegendo-o contra a alteração ou o alargamento do objecto do processo, por forma a possibilitar-lhe a organização da sua defesa, como impõe o princípio do contraditório” (ac. da Relação de Lisboa, de 20/05/97, CJ 1997,3,143). E como o arguido não se defende somente de uma acusação de factos, mas também da qualificação jurídica a que se procede na acusação ou pronúncia, daí que o C.P.Penal em obediência ao princípio do contraditório imponha a obrigatoriedade de indicação tanto na acusação (art.º 283.º, n.º 3, c), como na pronúncia (art.º 308.º, n.º 2 ), e no despacho que designa dia para julgamento (art.º 313.º, n.º 2 ), das disposições legais incriminadoras. Estando, pois, delimitada pela acusação a actividade cognitiva e decisória do tribunal e sendo nela imputada ao arguido a prática do concreto crime, não pode o juiz nesta fase processual (antes do julgamento) pronunciar-se sobre o próprio mérito do objecto da causa, sendo certo que deste faz parte a qualificação jurídica. Tomar posição sobre ela será tomar posição como defensor ou como acusador, uma vez que ainda não exerce funções de julgador nem pode antecipar-se a elas, pelo que não restava ao Mmo Juíz senão proferir despacho com o sentido e alcance do proferido. É que o artigo 358.º (Alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia) do C.P.Penal que estabelece que: 1 - Se no decurso da audiência se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, com relevo para a decisão da causa, o presidente, oficiosamente ou a requerimento, comunica a alteração ao arguido e concede-lhe, se ele o requerer, o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa. 2 - Ressalva-se do disposto no número anterior o caso de a alteração ter derivado de factos alegados pela defesa. 3 - O disposto no n.º 1 é correspondentemente aplicável quando o tribunal alterar a qualificação jurídica dos factos descritos na acusação ou na pronúncia há-de ocorrer em julgamento, e já no cotejo das provas aí disponibilizadas e produzidas. E, in casu, no momento em que se procedeu ao despacho a que se refere o art.° 311.° do CPP, não sendo patente um claro erro de subsunção dos factos constantes da acusação, não lhe competia convolar os factos para outro tipo legal de crime por respeito do princípio acusatório. III. 1.º O despacho recorrido não só não viola qualquer norma processual ou constitucional, como, fazendo correcta apreciação do teor do requerimento em causa e decidindo, nos termos vindos de expor, em conformidade com os preceitos legais, não merece a censura que o recorrente lhe dirige. 2.º Pelo exposto nega-se provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida. |