Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3519/23.1T8LRS.L1-8
Relator: RUI MANUEL PINHEIRO DE OLIVEIRA
Descritores: INVENTÁRIO
SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE PARTILHA
RECURSO
OBJECTO
VALIDADE MATERIAL DO ACORDO DE PARTILHA
IMPUGNAÇÃO EM ACÇÃO PRÓPRIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/12/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – É de 10 dias, na falta de disposição especial, o prazo para as partes requererem qualquer acto ou diligência, arguirem nulidades, deduzirem incidentes ou exercerem qualquer outro poder processual (cfr. art.º 149.º, n.º 1 do CPC), sob pena de se extinguir o direito de praticar o acto (art.º 139.º, n.º 3 do CPC);
II – Por isso, as questões relativas à alegada falta de fixação dos valores de bens que integram a herança e à invocada existência de erro na declaração negocial exteriorizada na conferência de interessados, bem como a pretensão de “cancelamento da adjudicação” aí acordada entre os interessados e de “realização de uma avaliação do imóvel”, devem ser suscitadas, arguidas ou formuladas pela interessada que esteve presente naquela conferência, assistida por advogado, no prazo de 10 dias a contra da data da conferência;
III – A sentença homologatória da partilha, sendo embora uma sentença de mérito, limita-se a absorver o conteúdo do acordo de partilha decorrente do encontro de vontades dos interessados, sendo a intervenção do juiz meramente fiscalizadora da legalidade do objecto desse acordo e da qualidade das pessoas que o celebraram, sem interferir no seu conteúdo material;
IV - As questões relativas ao conteúdo ou validade material do acordo de partilha, nomeadamente, a de saber se o mesmo está afectado por vícios da vontade, só poderão ser conhecidas em acção própria (art.º 291.º, n.º 1 do CPC) ou em recurso extraordinário de revisão (art.º 696.º al. d) do CPC);
V - O recurso da sentença homologatória da partilha tem que incidir, necessariamente, sobre um vício da própria sentença e visa obter a sua reapreciação e não obter uma primeira decisão sobre questões novas que não tenham sido suscitadas pelas partes perante o tribunal/entidade recorrida.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes na 8.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I – RELATÓRIO
1.1. Nos autos de inventário para partilha dos bens deixados por J e M, que correu termos no Cartório Notarial de L, em que exerce o cargo de cabeça-de-casal A e que em que é interessada M, veio esta, após a realização da conferência de interessados, apresentar requerimento, dirigido à senhora notária, onde concluiu da seguinte forma:
«Assim, e tendo em consideração que a aceitação da proposta ocorreu em erro, deve ser ordenada o cancelamento da adjudicação, e em consequência:
a) Ser ordenada a realização de uma avaliação do imóvel, e após esse facto, serem determinadas as tornas caso exista efetivamente obrigação das mesmas serem prestadas;
b) Caso o pedido de avaliação seja indeferido, desde já a Requerente indica que o imóvel tem o valor de pelo menos €70.000,00, disponibilizando-se para efetuar o pagamento de metade a título de tornas».

1.2. A interessada A, pronunciou-se, requerendo o desentranhamento do referido requerimento, por ser intempestivo e carecer de fundamento legal.
1.3. Por despacho da senhora notária de 22.12.2022, foi negado provimento à pretensão da interessada M e determinado o prosseguimento dos autos.
1.4. Inconformada, recorreu, em 18.01.2023, a interessada M, dizendo que o faz «para o Tribunal da Relação de Lisboa, nos termos do art.º 4.º n.º 2 al. b) e c) do Regime do Inventario Notarial», pedindo que tal decisão seja revogada e que seja ordenada a realização de nova conferência de Interessados, formulando as seguintes conclusões:
«a) Foi proferido Despacho em 22 de dezembro de 2022, pela Sr.ª Notária que indeferiu o pedido da Interessada, ora Recorrente M, de anulação da adjudicação dos bens realizada na conferência de interessados.
b) A ora Recorrente requereu o pedido de anulação da Adjudicação indicando que tinha apresentado a sua declaração negocial em erro, requerendo a realização de uma avaliação do imóvel objeto da partilha; ou caso o pedido de avaliação fosse indeferido, indicava que o imóvel tem o valor de pelo menos € 70.000,00, disponibilizando-se para efetuar o pagamento de metade a título de tornas.
c) Ora a Sr.ª Notária, indeferiu o Requerimento, pois entendeu que não tinha ocorrido erro na declaração negocial, e manteve a decisão de considerar que o imóvel teria o valor de €30.612,40, e deste modo atribuiria metade deste valor a título de tornas à Interessada, aqui Recorrente.
d) O Despacho, proferido, não aprecia a questão essencial no presente caso, ou seja, o erro negocial, com efeito o referido despacho limita-se a indicar que foi celebrado um acordo e as respetivas mandatárias devidamente notificadas, sem analisar se a declaração da interessada foi proferida em erro.
e) Em consequência é assim o referido despacho Nulo, devendo o mesmo ser substituído por outro que aprecie a existência de erro na declaração.
f) Acresce que a conferência de interessados destina-se a determinar o valor porque devem ser adjudicados os bens que os integram a herança.
g) Ora, na ata da conferência de interessados, não foi fixado o valor dos bens integrantes na herança, incluindo o valor atribuído ao imóvel.
h) Efetivamente a referida ata omite, totalmente o valor atribuído ao imóvel, só identificando o valor de um sofá e uma televisão, não tendo sido dado cumprimento ao despacho de 22 de setembro de 2022, proferido pela Sra. Notária, pois não foi fixado o valor dos bens designadamente o valor do imóvel.
i) O valor global, identificado na ata, não pode ser entendido como fixação do valor do imóvel, pois inclui, ao que se julga diversos bens.
j) Assim, deve também por este facto a conferência de interessados ser anulada.
k) A Interessada, aqui Recorrente, esteve efetivamente na conferência de interessados, e foi surpreendida pela proposta apresentada pelo Cabeça de Casal, que indicou atribuir ao imóvel o valor de cerca de €30.000,00.
l) A Recorrente, surpreendida com a proposta, e desconhecendo o valor dos imóveis na zona onde se localiza o mesmo, acabou por aceitar o valor indicado.
m) A Recorrente vive há vários anos no imóvel, que integra a herança, e que era dos seus pais, e ficou com a convicção que poderia continuar a viver na mesma.
n) Acresce que o facto da sua mandatária não estar presente “fisicamente”, levou a que a comunicação fosse difícil, e inibiu a interessada de realizar diversas questões.
o) A Recorrente tem como habilitações literárias o 9º ano de escolaridade, e não tem nem nunca teve qualquer função na área imobiliária.
p) O valor proposto para o imóvel, foi o valor patrimonial, mas fixado em 2018, que se encontra claramente desajustado, para a situação atual, pois imóveis semelhantes encontram-se a ser comercializados nos valores que variam entre €159.000,00 e €172.000,00.
q) A declaração negocial apresentada pela Recorrente, foi efetuada, no entanto, em erro, pois desconhecia qual o valor dos imóveis naquela zona, e julgava que poderia continuar a habitar no mesmo.
r) Sendo que o facto de poder habitar no mesmo, era essencial na declaração negocial da interessada.
s) Ora a Recorrente, realizou uma errada representação da realidade, o que leva a que a declaração que emitiu não esteja de acordo com a sua vontade, o que configura a existência de um “erro obstáculo”, conforme bem descreve o Dr. Pedro Nunes de Carvalho em “Considerações acerca do erro em sede de patologia da Declaração Negocial”.
t) Um homem médio, nunca aceitaria que fosse fixado o valor de cerca de €30.000,00 a um imóvel, localizado numa área nobre da cidade, junto ao metropolitano, com duas divisões, e ainda tivesse que deixar o mesmo e procurar outro para arrendar.
u) A Recorrente não teve consciência do facto de ao aceitar a atribuição do valor e a fixação das tornas, teria que deixar a habitação, e não tinha consciência do valor das habitações naquela localização.
v) Existiu claramente uma discrepância entre a vontade real e a declaração, porquanto a vontade real era a de permanecer a habitar a fração autónoma, e a de lhe ser fixado um valor justo.
w) Ocorreu a divergência entre a vontade real e a declarada, ou seja, a vontade real é continuar a habitar a fração autónoma, e a vontade declarada tem como implicação ter de deixar de habitar a referida fração.
x) No caso de erro na declaração, apesar de outras posições, entende-se que a mesma é anulável, e deste modo afeta a ata de conferência de interessados, devendo a mesma ser anulada e marcada nova conferência de interessados».
1.5. A interessada A contra-alegou, defendendo a improcedência do referido recurso, concluindo da seguinte forma:
«I. No recurso apresentado, a recorrente não indicou a espécie, o efeito e o modo de subida do recurso interposto.
II. Mais, não deu cumprimento ao ónus previsto no n.º 2 do artigo 639.º, quanto à matéria de direito, e ao n.º 1 do artigo 640.º, quanto à matéria de facto. 
III. Por outro lado, a recorrente extravasa o anterior pedido, pois requer agora que seja ordenada a realização de uma nova conferência de Interessados.
IV. Consequentemente, deverá ser rejeitado o douto recurso.
V. Caso assim não se entenda, o que não se concede, importa realçar que teor do despacho objeto de sindicância, apreciou corretamente a questão do erro negocial, concluindo-se que não poderia a interessada vir aos autos, sob o manto do erro da declaração negocial, requerer a avaliação do imóvel e a sua adjudicação.
VI. Com efeito, durante a conferência de interessados, a aqui recorrida manifestou o seu interesse na adjudicação do imóvel, obrigando-se a entregar as tornas devidas.
VII. Questionada, a recorrente não demonstrou interesse na aquisição do imóvel pelo valor atribuído, tendo aceitado a proposta apresentada.
VIII. A sua declaração negocial formou-se de maneira esclarecida, assente em bases corretas, e livre, sem deformações provindas de influências exteriores.
IX. Não poderá a recorrente invocar agora que ficou surpreendida com o valor atribuído ao imóvel uma vez que, na relação de bens por si subscrita em 15/06/2021, atribuiu ao imóvel precisamente a quantia de 30.612,40€.
X. Como tal, a recorrente apercebeu-se do alegado erro pelo menos desde 15/06/2021 e, será a partir desta data que deverá contar-se o prazo de um ano para arguição da anulabilidade.
XI. Por conseguinte, caducou o direito para arguir a anulabilidade, o que desde já se invoca.
XII. Sem prescindir, importa notar que a recorrente não apresentou oposição, reclamação ou impugnação no que respeita à relação de bens ou valores relacionados pela cabeça de casal, aqui recorrida.
XIII. E ainda que se reconheça que a declarante se encontrava em erro - o que não se concede -, sempre se dirá que a declarante, aqui recorrente, se encontrava culposamente em erro pois, não cumpriu todos os cuidados que lhe eram exigíveis para que pudesse, por si própria, ter juntado todos os conhecimentos necessários à boa formação da sua vontade negocial, p.e. ter solicitado atempadamente a avaliação ao imóvel.
XIV. Sem olvidar que a recorrente está desde o início deste processo patrocinada por Mandatário, que certamente a terá orientado nos meandros do processo de inventário.
XV. Assim sendo, se a real vontade da recorrente era permanecer na fração autónoma, então deveria propor que lhe fosse adjudicado o apartamento, o que não se verificou.
XVI. Aliás a recorrente foi clara ao informar que dos bens que compunham a herança, apenas pretendia o sofá em tecido e a televisão LCD.
XVII. Como tal, causa enorme perplexidade à aqui recorrida que a recorrente venha agora afirmar que não tinha consciência que com a atribuição do valor e a fixação de tornas, implicaria a desocupação do apartamento.
XVIII. Colocando-se a seguinte questão: pretendia a recorrente receber tornas, e ainda se manter no imóvel sem qualquer contrapartida financeira para a recorrida?!
XIX. Quando foi advertida na conferência de interessados que, em caso de venda ou adjudicação, teria de desocupar o imóvel, tendo respondido que precisaria de tempo para desocupar o imóvel.
XX. Pelo circunstancialismo supra, não poderá proceder a argumentação da aqui recorrente quanto refere que a sua declaração negocial, foi efetuada em erro, por desconhecer o valor dos imóveis naquela zona, e por pretender continuar a habitar no mesmo.
XXI. Com efeito, ocorre erro na declaração, ou erro obstáculo, quando, não intencionalmente, a vontade declarada não corresponde a uma vontade real do autor, existente, mas de sentido diverso.
XXII. In casu, não ocorre erro da declaração porque não existe qualquer divergência entre a declaração efetuada (adjudicação dos bens) e o realmente querido pela declarante, aqui recorrente (receber tornas).
XXIII. Mais, quando tais declarações foram constatadas presencialmente por oficial público (neste caso perante um Notário)!
XXIV. Portanto, o que a recorrente acordou na conferência de interessados não foi motivado por qualquer erro ou engano, mas sim porque ela assim o quis.
XXV. Mais, em momento algum a recorrente fez valer a sua posição (adjudicar o imóvel para si, e manter-se no imóvel), ou seja, que estaria em erro sobre as circunstâncias do acordo.
XXVI. Inclusive, com a adjudicação de todos os bens, foram as partes pessoalmente notificadas para, em vinte dias, proporem o mapa da partilha, não tendo a recorrente apresentado mapa de partilhas, ou informado sobre a sua vontade de se manter a residir no apartamento.
XXVII. Por outro lado, nada nos autos foi alegado que determine que a aqui recorrida tinha conhecimento ou não devesse ignorar da essencialidade do elemento sobre o qual incidiu o erro.
XXVIII. Assim, e face ao circunstancialismo acima descrito, inexiste erro na declaração determinante para a anulabilidade afirmada em sede de recurso.
XXIX. Face ao exposto, o douto despacho recorrido não merece qualquer censura, pelo que deve ser mantido na íntegra».

1.6. Por despacho da senhora notária de 23.02.2023, foi decidido que o referido recurso ficaria a aguardar o que viesse a ser interposto da sentença homologatória da partilha, nos termos do art.º 4.º do Regime do Inventário Notarial (anexo à Lei n.º 117/2019 de 13.09) e do art.º 1123.º, n.ºs 2 al. c), e 5 do CPC.
1.7. Remetidos os autos a tribunal judicial da Comarca competente, foi proferida sentença que homologou «(…) a partilha constante do acordo exarado na conferência de interessados, ocorrida em 03/11/2022 (acta com a referência 156400617) – artigo 5.º do regime anexo à Lei n.º 117/2019, de 13 de Setembro».

1.8. Mais uma vez inconformada, apelou a interessada M, em 23.05.2023, pedindo que a referida sentença seja revogada e ordenada a realização de nova conferência de interessados, para o que formulou as seguintes conclusões:
«a) A sentença, homologou o acordo exarado na conferência de interessados, mas ignorou totalmente, que a Recorrente, veio antes daquela homologação, ou seja, em 18 de dezembro de 2022, indicar que a aceitação da proposta realizada na conferência foi-o em erro, e tendo requerido, em consequência:
a) Ser ordenada a realização de uma avaliação do imóvel, e após esse facto, serem determinadas as tornas caso exista efetivamente obrigação das mesmas serem prestadas;
b) Caso o pedido de avaliação seja indeferido, desde já a Requerente indica que o imóvel tem o valor de pelo menos €70.000,00, disponibilizando-se para efetuar o pagamento de metade a título de tornas.
b) Ignorou ainda a douta sentença, que a Recorrente apresentou um recurso, do despacho a Fls ..., que indeferiu o indicado Requerimento.
c) Da leitura da conferência de interessados resulta à saciedade que a Recorrente se encontrava na mesma em erro, sendo este notório.
d) A Interessada, ora Recorrente, esteve efetivamente na conferência de interessados, e foi surpreendida pela proposta apresentada pelo Cabeça de Casal, que indicou atribuir ao imóvel o valor de cerca de €30.000,00.
e) A Recorrente, surpreendida com a proposta, e desconhecendo o valor dos imóveis na zona onde se localiza o mesmo, acabou por aceitar o valor indicado.
f) A Recorrente vive há vários anos no imóvel, que integra a herança, e que era dos seus pais, e ficou com a convicção que poderia continuar a viver no referido imóvel.
g) Acresce que o facto da sua mandatária não estar presente “fisicamente”, levou a que a comunicação fosse difícil, e inibiu a interessada de realizar diversas questões.
h) A Recorrente tem como habilitações literárias o 9º ano de escolaridade, e não tem nem nunca teve qualquer função na área imobiliária.
i) O valor proposto para o imóvel, foi o valor patrimonial, mas fixado em 2018, que se encontra claramente desajustado, para a situação atual, pois imóveis semelhantes encontram-se a ser comercializados nos valores que variam entre €159.000,00  e €172.000,00.
j) A declaração negocial apresentada pela Recorrente, foi efetuada, no entanto, em erro, pois desconhecia qual o valor dos imóveis naquela zona, e julgava que poderia continuar a habitar no mesmo.
k) Sendo que o facto de poder habitar no mesmo, era essencial na declaração negocial da interessada.
l) Ora a Recorrente, realizou uma errada representação da realidade, o que leva a que a declaração que emitiu não esteja de acordo com a sua vontade, o que configura a existência de um “erro obstáculo”, conforme bem descreve o Dr. Pedro Nunes de Carvalho em “Considerações acerca do erro em sede de patologia da Declaração Negocial”.
m) Um homem médio, nunca aceitaria que fosse fixado o valor de cerca de €30.000,00 a um imóvel, localizado numa área nobre da cidade, junto ao metropolitano, com duas divisões, e ainda tivesse que deixar o mesmo e procurar outro para habitar.
n) A Recorrente não teve consciência do facto de ao aceitar a atribuição do valor e a fixação das tornas, teria que deixar a habitação, e não tinha consciência do valor das habitações naquela localização.
o) Existiu claramente uma discrepância entre a vontade real e a declaração, porquanto a vontade real era a de permanecer a habitar a fração autónoma, e a de lhe ser fixado um valor justo.
p) Ocorreu a divergência entre a vontade real e a declarada, ou seja, a vontade real é continuar a habitar a fração autónoma, e a vontade declarada tem como implicação ter de deixar de habitar a referida fração.
q) No caso de erro na declaração, apesar de outras posições, entende-se que a mesma é anulável, e deste modo afeta a ata de conferência de interessados, devendo a mesma ser anulada e marcada nova conferência de interessados.
r) Acresce que a conferência de interessados destina-se a determinar o valor porque devem ser adjudicados os bens que os integram a herança.
s) Ora, na ata da conferência de interessados, não foi fixado o valor dos bens integrantes na herança, incluindo o valor atribuído ao imóvel.
t) Efetivamente a referida ata omite, totalmente o valor atribuído ao imóvel, só identificando o valor de um sofá e uma televisão, não tendo sido dado cumprimento ao despacho de 22 de setembro de 2022, proferido pela Sra. Notária, pois não foi fixado o valor dos bens designadamente o valor do imóvel.
u) O valor global, identificado na ata, não pode ser entendido como fixação do valor do imóvel, pois inclui, ao que se julga diversos bens.
v) Assim, deve também por este facto a conferência de interessados ser anulada.
w) Por outro lado, a referida conferência não identifica as verbas atribuídas a cada uma das interessadas, pois indica que “... Adjudicar à interessada A os restantes bens móveis e ainda o imóvel relacionado como verba 6...”.
x) Quais as verbas atribuídas a cada interessada? Não se sabe, pois a conferencia de interessados não indica.
y) Facto que leva a que a referida conferência seja nula e tenha que ser repetida.
z) Foi proferido Despacho em 22 de dezembro de 2022, pela Sr.ª Notária que indeferiu o pedido da Interessada, ora Recorrente M de anulação da adjudicação dos bens realizada na conferência de interessados, tendo sido apresentado recurso relativamente a esse indeferimento, pelo que deve o mesmo subir com o presente recurso.
aa) Sendo o referido despacho Nulo, devendo o mesmo ser substituído por outro que aprecie a existência de erro na declaração.
bb) A Recorrente requereu o pedido de apoio judiciário no processo de inventário».

1.9. A interessada A contra-alegou, pronunciando-se pela improcedência do recurso e alinhando as seguintes conclusões:
«I. No recurso apresentado, a recorrente não indicou a espécie, o efeito e o modo de subida do recurso interposto.
II. Mais, não deu cumprimento ao ónus previsto no n.º 2 do artigo 639.º, quanto à matéria de direito, e ao n.º 1 do artigo 640.º, quanto à matéria de facto.
III. Consequentemente, deverá ser rejeitado o douto recurso.
Caso assim não se entenda, o que não se concede,
IV. pretende a aqui recorrente, sob o manto do erro da declaração negocial, requerer a realização de uma nova conferência de interessados.
V. Sucede que, atento o circunstancialismo acima descrito, a sua declaração negocial formou-se de maneira esclarecida, assente em bases corretas, e livre, sem deformações provindas de influências exteriores.
VI. Não podendo a aqui recorrente invocar que ficou surpreendida com o valor atribuído ao imóvel uma vez que, na relação de bens por si subscrita em 15/06/2021, atribuiu ao imóvel precisamente a quantia de 30.612,40€.
VII. Assim sendo, a recorrente está alegadamente em erro pelo menos desde 15/06/2021 sendo que, será a partir desta data que deverá contar-se o prazo de um ano para arguição da anulabilidade.
VIII. Por conseguinte, caducou o direito para arguir a anulabilidade, o que desde já se invoca.
IX. Sem prescindir, importa notar que a recorrente não apresentou oposição, reclamação ou impugnação no que respeita à relação de bens ou valores relacionados pela cabeça de casal, aqui recorrida.
X. E ainda que se reconheça que a declarante se encontrava em erro - o que não se concede -, sempre se dirá que a declarante, aqui recorrente, se encontrava culposamente em erro pois, não cumpriu todos os cuidados que lhe eram exigíveis para que pudesse, por si própria, ter juntado todos os conhecimentos necessários à boa formação da sua vontade negocial.
XI. Sem olvidar que a recorrente está desde o início deste processo patrocinada por Mandatário.
XII. Assim sendo, se a real vontade da recorrente era permanecer na fração autónoma, então deveria propor que lhe fosse adjudicado o apartamento, o que não se verificou.
XIII. Como tal, não pode a recorrente afirmar que não tinha consciência que com a atribuição do valor e a fixação de tornas, implicaria a desocupação do apartamento.
XIV. Quando foi advertida na conferência de interessados que, em caso de venda ou adjudicação, teria de desocupar o imóvel, tendo respondido que precisaria de tempo para desocupar o imóvel.
XV. Pelo circunstancialismo supra, não poderá proceder a argumentação da aqui recorrente quanto refere que a sua declaração negocial, foi efetuada em erro, por desconhecer o valor dos imóveis naquela zona, e por pretender continuar a habitar no mesmo.
XVI. Com efeito, ocorre erro na declaração, ou erro obstáculo, quando, não intencionalmente, a vontade declarada não corresponde a uma vontade real do autor, existente, mas de sentido diverso.
XVII. In casu, não ocorre erro da declaração porque não existe qualquer divergência entre a declaração efetuada (adjudicação dos bens) e o realmente querido pela declarante, aqui recorrente (receber tornas).
XVIII. Mais, com a adjudicação de todos os bens, foram as partes pessoalmente notificadas para, em vinte dias, proporem o mapa da partilha, não tendo a recorrente apresentado mapa de partilhas, ou informado sobre a sua vontade de se manter a residir no apartamento.
XIX. Por outro lado, nada nos autos foi alegado que determine que a aqui recorrida tinha conhecimento ou não devesse ignorar da essencialidade do elemento sobre o qual incidiu o erro.
XX. Assim, e face ao circunstancialismo acima descrito, inexiste erro na declaração determinante para a anulabilidade afirmada em sede de recurso.
XXI. De igual modo, inexiste qualquer nulidade da ata da conferência de interessados, a qual cumpre com todos os requisitos legais.
XXII. Face ao exposto, tanto o despacho da Sra. Notária, como a douta sentença que homologou o mapa de partilhas, não merecem qualquer censura, pelo que devem ser mantidos na íntegra».

1.10. Em 11.01.2024, foi proferido acórdão por esta Relação, que decidiu:
«a) rejeitar, por inadmissibilidade legal, o recurso autónomo interposto em 18.01.2023 da decisão da notária de 22.12.2022, que negou provimento à pretensão da interessada M (de “cancelamento da adjudicação” na conferência de interessados, com as consequências que referiu) e que determinou o prosseguimento dos autos;
b) julgar totalmente improcedente a apelação interposta da sentença homologatória da partilha, confirmando-se a mesma».

1.11. Novamente inconformada, a interessada M interpôs recurso de revista para o STJ, que, por acórdão de 25.06.2024, decidiu: «julgar a revista procedente, pelo que se revoga em conformidade o acórdão recorrido determinado a baixa dos autos ao tribunal a quo para tomar conhecimento do recurso da decisão notarial, nos termos indicados».

1.12. Colhidos os vistos, cumpre decidir em conformidade com o determinado pelo STJ, sendo certo que se encontra já, definitivamente, adquirido que a decisão da senhora notária de 22.12.2022 é recorrível e que compete a este tribunal da Relação conhecer do recurso interposto pela interessada M em 18.01.2023.
II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
Decorre do disposto nos arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1 do CPC, que as conclusões delimitam a esfera de actuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial (cfr., neste sentido, Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2017, pág. 105 a 106), sendo que o tribunal ad quem não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e é livre na interpretação e aplicação do direito (cf. art.º 5.º, n.º 3 do CPC).
Assim, atendendo às conclusões supra transcritas, as questões essenciais a decidir consistem, basicamente, em saber:
Recurso de 18.01.2023:
a) se a decisão da senhora notária de 22.12.2022 é nula por não apreciar a questão do erro na declaração negocial (conclusões d) e e));
b) se a conferência de interessados realizada em 03.11.2022 deve ser anulada, por não ter fixado os valores dos bens integrante da herança (conclusões f) a j));
c) se a referida conferência de interessados deve ser anulada e repetida, por a declaração negocial ter sido efectuada em erro quanto ao valor indicado para o imóvel e por a recorrente julgar que podia continuar a habitar no mesmo (conclusões k) a x));
Recurso de 23.05.2023
a) se a sentença homologatória da partilha é nula por omissão de pronúncia (conclusões a) e b));
b) se a conferência de interessados realizada em 03.11.2022 deve ser anulada e repetida, por a declaração negocial da interessada M ter sido efectuada em erro-obstáculo (conclusões c) a q));
c) se a mesma conferência de interessados é nula e deve ser repetida, por não ter fixado o valor dos bens que integram a herança, nem identificado as verbas atribuídas a cada interessado (conclusões r) a y)).
III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Da tramitação dos autos, resultam provados os seguintes factos com relevância para a apreciação do objecto do presente recurso:
1. Em 09.04.2021, A requereu junto do Cartório Notarial de …, que se procedesse a inventário para partilha dos bens das heranças de J e M, que foram casados entre si, indicando como interessada M, tendo o processo sido aí registado com o n.º 130/21;
2. Por despacho da senhora notária de 19.04.2021, foi nomeada cabeça-de-casal a interessada M, que foi citada na sua própria pessoa e constituiu mandatário nos autos;
3. Por despacho da senhora notária de 20.01.2022, foi a referida M removida do cargo de cabeça-de-casal e nomeada, em sua substituição, a interessada e requerente do inventário A;
4. Em 25.01.2022, a cabeça-de-casal juntou a relação de bens, que não foi objecto de qualquer reclamação;
5. Por despacho da senhora notária de 22.09.2022, notificado às partes, foi designada data para a realização da conferência de interessados, nos seguintes termos:
«(…) designa-se o dia 03 de novembro de 2022 pelas 14:30 horas para a realização da conferência de interessados
Notifiquem-se os interessados para comparência pessoal no dia referido, podendo fazer-se representar por mandatário com poderes especiais ou confiar o mandato a qualquer outro interessado, sob pena de lhes ser aplicável a multa prevista no artigo 28º da Portaria 278/2013 na redação dada pela Portaria 46/2015 de 23 de fevereiro.
Notifiquem-se igualmente para comparência pessoal, e com a mesma cominação, os respetivos cônjuges dos interessados, salvo se o regime de casamento que entre eles vigore for o da separação de bens, caso em que apenas será necessária a presença se, de entre os bens a partilhar, constar a casa de morada de família respetiva.
A conferência destina-se a deliberar sobre:
a) A composição total ou parcial dos quinhões dos interessados e o valor porque devem ser adjudicados os bens que os integram; a indicação dos bens que devem ser objeto de sorteio; e o eventual acordo na venda de bens da herança e na distribuição do produto da alienação pelos interessados ou, não havendo deliberação sobre estas matérias, deliberar sobre quaisquer questões cuja resolução possa influir na partilha.
b) A aprovação do passivo da herança e forma de cumprimento dos legados.
c) Os pedidos de adjudicação de bens indivisíveis; e, eventualmente
d) Quaisquer questões cuja resolução possa influir na partilha.
Notifiquem-se os interessados com a advertência de que:
a) A conferência pode ser adiada, por determinação do notário ou a pedido de qualquer interessado, por uma só vez, se faltar algum dos convocados e houver razões para considerar viável o acordo sobre a composição dos quinhões.
b) A deliberação dos interessados presentes, relativa a questões cuja resolução possa influir na partilha, vincula os demais que, devidamente notificados, não tenham comparecido na conferência.
Atualize-se o valor do processo de inventário de acordo com o valor resultante da relação de bens apresentada € 32.332,40»;
6. No dia 03.11.2022 realizou a conferência de interessados, com a presença das interessadas A e M, o marido desta última e as mandatárias das interessadas (sendo a mandatária da interessada M, por teleconferência), constando da respectiva acta o seguinte:
«(…)
Explicados os motivos da presente diligência teve a mesma início com o seguinte resultado:
Não houve oposição, reclamação ou impugnação quanto ao inventário, relação de bens ou valores porque as mesmas foram relacionadas.
As interessadas, por acordo, compuseram o quinhão respetivo da seguinte forma:
Acordaram em adjudicar à interessada M o sofá em tecido, com três lugares, com marcas de uso no valor de € 40,00 e a televisão LCD no valor de € 120,00 vendo o restante do seu quinhão hereditário preenchido com o dinheiro das tomas.
Acordaram em adjudicar à interessada A os restantes bens móveis e ainda o imóvel relacionado como verba 6, tudo no valor global de €32.172,40, devendo a mesma prestar de tornas o que levar a mais do que competir.
Ficando, assim, adjudicados todos os bens, foram as presentes pessoalmente notificadas para, em vinte dias, proporem o mapa da partilha nos termos do artigo 1120º do CPC aditado pela Lei 117/2019 de 13 de setembro, fiando ainda a requerente pessoalmente notificada para juntar aos autos o DUC e respetivo comprovativo de pagamento devido pela remessa dos autos ao Tribunal para que seja proferida sentença homologatória da partilha.
Não havendo outro assunto a tratar foi encerrada a diligência e lavrada a presente ata»;
7. Apenas a interessada A apresentou proposta de mapa da partilha;
8. No dia 18.12.2022, a interessada M apresentou requerimento, dirigido à senhora notária, com o seguinte teor:
«…tendo tomado conhecimento do teor da Ata da Conferência de Interessados, vem expor e Requer conforme se segue:
I-Valor do Imóvel e Tornas a fixar
1. A Requerente aquando da Conferência de Interessados, ocorrida em 03 de novembro de 2022, foi surpreendida pela proposta apresentada pelo Cabeça de casal.
2. Colocada perante a questão do valor a atribuir ao imóvel, a Requerente aceitou fixar o valor do imóvel em €32.172,40.
3. Em face do valor fixado ao imóvel, aceitou que lhe fossem prestadas tornas.
4. A declaração negocial apresentada pela Requerente, foi efetuada, no entanto, em erro.
5. Com efeito a Requerente desconhecia o valor dos imóveis naquela zona.
6. Sendo que para imóvel daquela tipologia, os valores variam entre €159.000,00 e €172.000,00, conforme documentos n.ºs 1, 2, 3 e 4, que se juntam.
7. O valor indicado do imóvel foi referido em erro e encontra-se claramente desajustado, pois trata-se de um imóvel com área privativa de 50,65 m2, com 2 divisões, localizado em Moscavide, a escassos minutos a pé de uma estação do metropolitano, e junto a Expo.
8. A valor atribuído ao imóvel, pela Requerente, ocorreu em profundo erro, cuja consciência só ocorreu quando verificou o valor dos imóveis à venda em Moscavide.
9. Para esse erro previsivelmente contribuiu a ausência presencial da sua mandatária, o que dificultou o contacto com a mesma.
10. Ora a Requerente, realizou uma errada representação da realidade, o que leva a que a declaração que emitiu não esteja de acordo com a sua vontade, o que configura a existência de um "erro obstáculo", conforme bem descreve o Dr. Pedro Nunes de Carvalho em "Considerações acerca do erra em sede de patologia da Declaração Negociar”.
11. No mesmo sentido se pronuncia o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no processo n.º 67/14.4T8OHP-A.C1, que salienta que "I – O erro na declaração, ou erro obstáculo, existe quando, não intencionalmente v.g., por inadvertência, engano ou equívoco, a vontade declarada não corresponde a uma vontade real do autor, existente, mas de sentido diverso.
II- Existe erro obstáculo sobre a identidade da coisa que constitui objeto da declaração - error in corpore, quando a indicação ou a descrição que dela se faz, leve a identificar uma coisa diferente da que o declarante pretende".
III- Contudo, a relevância do erro obstáculo, para que o negócio seja anulável, carece:
-Que para o declarante seja essencial o elemento sobre o qual incidiu o erro, de tal forma que, se deste se tivesse apercebido, não teria celebrado o negócio;
- Que o declaratário conheça ou não deva ignorar a essencialidade do elemento sobre o qual incidiu o erro para o declarante."
12. Ora, no caso concreto se a Requerente tivesse consciência do valor atual do imóvel nunca tinha aceite o acordo, e desconhecia que naquela audiência iria ser discutido aquele facto.
13. Por outro lado, a Requerente não trabalha, nem nunca trabalhou na área imobiliária, pelo que desconhecia o valor do mesmo, e não lhe pode ser imputado qualquer obrigação de o saber.
14. Como refere Pedro Pais de Vasconcelos (Teoria Geral do Direito Civil, Almedina, 2010, 6 edição, págs. 658/659) "a vontade negocial pode estar viciada na sua formação, no processo de volição e de decisão, por deficiência de esclarecimento......e a parte cuja vontade tenha sido perturbada pode, se assim o desejar, libertar-se do negócio viciado, procedendo à sua anulação".
15. Também Manuel A. Domingues de Andrade, in (Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. II, 9ª reimpressão, Coimbra, 2003, pág. 233), caracteriza o erro nos moldes seguintes: "[o] erro-vício consiste na ignorância (falta de representação exacta) ou numa falsa ideia (representação inexacta), por parte do declarante, acerca de qualquer circunstância de facto ou de direito que foi decisiva na formação da sua vontade, por tal maneira que se ele conhecesse o verdadeiro estado das coisas não teria querido o negócio, ou pelo menos não o teria querido nos precisos termos em que o concluiu".
16. Pelo que se compreende que a Requerente se encontre em erro.
17. Sucede que o imóvel não foi adquirido pela Requerente mas sim pelos seus pais.
18. A Requerente por outro lado vive no imóvel, que integra a herança, sendo aquele a sua casa de família, pelo que terá direito de preferência na adjudicação do mesmo, direito esse que pretende exercer.
19. Assim, e tendo em consideração que a aceitação da proposta ocorreu em erro, deve ser ordenada o cancelamento da adjudicação, e em consequência:
a) Ser ordenada a realização de uma avaliação do imóvel, e após esse facto, serem determinadas as tornas caso exista efetivamente obrigação das mesmas serem prestadas;
b) Caso o pedido de avaliação seja indeferido, desde já a Requerente indica que o imóvel tem o valor de pelo menos €70.000,00, disponibilizando-se para efetuar o pagamento de metade a título de tornas»;
9. Por requerimento de 19.12.2022, a interessada A requereu o desentranhamento do referido requerimento, por ser intempestivo e carecer de fundamento legal;
10. Por despacho da senhora notária de 22.12.2022, foi organizado o mapa da partilha, de acordo com as adjudicações feitas na conferência de interessados;
11. Ainda por despacho da senhora notária de 22.12.2022, foi decidido que:
«Por requerimento registado em www.inventarios.pt com o número 2579569 de documento veio a interessada M alegar, em suma, erro na sua declaração negocial de aceitação do valor atribuído por acordo ao imóvel; desconhecimento de que na audiência iria ser discutido aquele facto; pretensão de exercer o direito de preferência na adjudicação do imóvel por nele residir vindo, ainda, requerer seja ordenada avaliação do imóvel e, em caso de indeferimento desta ultima pretensão seja fixado ao imóvel o valor de €70.000,00 disponibilizando-se para efetuar o pagamento de metade a titulo de tornas.
Por requerimento registado na referida plataforma com o número 2579582 de documento veio a cabeça de casal, A requerer o desentranhamento do requerimento suprarreferido por ser intempestivo e carecer de fundamento legal.
Cumpre tomar posição;
Em 03 de novembro de 2022 pelas 14:30 minutos realizou-se neste Cartório Notarial a Conferência de Interessados previstas no artigo 1111º do CPC aditado pela lei 117/2019 de 13 de setembro.
Nessa conferência, para a qual foram expedidas às interessadas as notas postais que se encontram registadas nos autos, encontravam-se presentes não só as interessadas como ainda o cônjuge da requerente … e as ilustres mandatárias das mesmas.
Do despacho de agendamento da conferência de interessados que acompanhava a notificação para comparência pessoal constava:
(…)
Na conferência as interessadas chegaram a acordo nos termos que constam da Ata da Conferência e que se transcrevem:
(…)
Assim,
As interessadas, acompanhadas das suas ilustres mandatárias, puseram fim ao processo, por acordo, na referida conferência de interessados.
A fracção em apreço tem um VPT de €30.612,40.
Notificada a interessada M da relação de bens para, em trinta dias, querendo, reclamar da relação de bens ou impugnar o valor dado aos mesmos, nada velo dizer ou peticionar.
Em sede de conferência de interessados, e na impossibilidade de obter acordo, a Lei ainda permite que os interessados requeiram a avaliação dos bens e/ou, nos casos em que a mesma é admissível, o pedido de adjudicação de bens nos termos dos artigos 1114º e 1115º do CPC.
Não foi o caso dos presentes autos, uma vez que as interessadas coadjuvadas pelas respetivas mandatárias, alcançaram o acordo que consta do Ata pelo que, tendo precludido o seu direito não pode agora a interessada vir aos autos, sob o manto do erro da declaração negocial, requerer a avaliação do imóvel e a sua adjudicação.
Como se retira da Ata da diligência, no final da mesma foram as ilustres mandatárias notificadas:
“…..
Ficando, assim, adjudicados todos os bens, foram as presentes pessoalmente notificadas para, em vinte dias, proporem o mapa da partilha nos termos do artigo 1120º do CPC aditado pela Lei 117/2019 de 13 de setembro, fiando ainda a requerente pessoalmente notificada para juntar aos autos o DUC e respetivo comprovativo de pagamento devido pela remessa dos autos ao Tribunal para que seja proferida sentença homologatória da partilha……”
Termos em que se nega provimento à pretensão da requerente e se determina o prosseguimento dos autos»;
12. Em 18.01.2023, a interessada M apresentou requerimento pelo qual interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa do despacho referido no n.º 11;
13. Por despacho da senhora notária de 23.02.2023, foi decidido:
«Por requerimento registado em www.inventarios.pt com o número 2588474 de documento veio a Interessada M interpor recurso da decisão proferida por este Cartório Notarial em despacho datado de 22 de dezembro de 2022 registado na referida plataforma com o número 2580950 de documento.
Notificada, velo a interessada A apresentar as suas contra-alegações com os fundamentos que constam do seu requerimento registado com o número 2594811 de documento.
Cumpre tomar posição;
O regime dos recursos em processos de inventário que tenham sido instaurados após 01 de janeiro de 2020 e estejam a correr em Cartórios Notariais encontra-se previsto no artigo 4º do Regime de Inventário Notarial, Regime este aprovado em anexo à Lei 117/2019 de 13 de setembro, nos termos do seu artigo 2º.
De acordo com o artigo 4º do RIN é igualmente aplicável o regime previsto no artigo 1123º do CPC, aditado pela já referida Lei.
Ora, por força da aplicação deste regime, e conforme o disposto no artigo 1123º nº 2 al. c) e nº 5 as decisões proferidas pelo notário na fase da partilha apenas sobem a final com o que vier a ser interposto da sentença homologatória da partilha.
No caso dos autos a interessada M não deduziu impugnação ou reclamação, nem do despacho determinativo da partilha, nem do mapa da partilha.
Assim, o recurso interposto fica a aguardar o que vier a ser interposto da sentença homologatória da partilha».
14. Por despacho da senhora notária de 30.03.2023, foi decidido:
«Nos presentes autos de inventário abertos para partilha dos bens deixados por óbito de J e M, tendo as interessadas chegado a acordo nos termos enunciados na Ata da Conferência de Interessados e tendo sido proferido despacho que retém o recurso entreposto até àquele que vier a subir com a sentença homologatória da partilha;
Remete-se, nos termos do artigo 5º do Regime do Inventário Notarial aprovado em anexo à Lei 117/2019 de 13 de setembro, e cumprido o disposto no artigo 7º o presente processo ao tribunal para que seja proferida sentença homologatória da partilha».
15. Remetidos os autos ao Juízo Local Cível de Loures, foi, em 25.04.2023, proferida a sentença recorrida, com o seguinte teor:
«Nos presentes autos de inventário para partilha de bens a que se procede por óbito de J e M, homologo por sentença a partilha constante do acordo exarado na conferência de interessados, ocorrida em 03/11/2022 (acta com a referência 156400617) – artigo 5.º do regime anexo à Lei n.º 117/2019, de 13 de Setembro.
Custas em conformidade com o disposto no artigo 1130.º do Cód. Processo Civil (artigo 2.º, n.º 1, do regime anexo à Lei n.º 117/2019, de 13 de Setembro).
Registe e notifique».

IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
4.1. Comecemos, então, por apreciar o mérito do recurso da decisão da senhora notária de 22.12.2022, interposto pela interessada M em 18.01.2023.
Recordemos que, através de requerimento datado de 18.12.2022, a interessa M, ora recorrente, havia requerido à senhora notária que fosse «ordenada o cancelamento da adjudicação, e em consequência: a) Ser ordenada a realização de uma avaliação do imóvel, e após esse facto, serem determinadas as tornas caso exista efetivamente obrigação das mesmas serem prestadas; b) Caso o pedido de avaliação seja indeferido, desde já a Requerente indica que o imóvel tem o valor de pelo menos € 70.000,00, disponibilizando-se para efetuar o pagamento de metade a título de tornas».
Alegou, para tanto, que a sua declaração negocial foi efectuada em erro, no que respeita ao valor atribuído ao imóvel adjudicado à interessada A e consequente aceitação do montante das tornas que lhe caberiam, e que vive no referido imóvel, o que lhe confere direito de preferência na adjudicação do mesmo, o qual pretende exercer.
As pretensões formuladas pela referida interessada foram indeferidas pela senhora notária, por, basicamente, ter entendido que se encontrava precludido o direito da mesma de requerer a avaliação e adjudicação de bens, uma vez que não reclamou da relação de bens, nem impugnou os valores atribuídos aos bens relacionados e, na conferência de interessados, não requereu a avaliação dos bens, nem formulou pedido de adjudicação de bens, antes tendo chegado a acordo com a outra interessada.

4.1.1. No recurso interposto em 18.01.2023, a referida interessada começa por defender que a decisão recorrida é nula por não apreciar a questão do erro na declaração negocial (conclusões d) e e)).
Vejamos.
Como é consabido, de acordo com o disposto no art.º 615.º, n.º 1 al. d) do CPC - disposição aqui aplicável por analogia - a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
Daqui decorre que só existe omissão de pronúncia quando o tribunal não se pronuncia sobre as questões com relevância para a decisão de mérito e não já quanto a todo e qualquer argumento aduzido.
Neste sentido, decidiu o acórdão do STJ de 10.12.2020, in www.dgsi.pt., que «A nulidade por omissão de pronúncia, representando a sanção legal para a violação do estatuído naquele nº 2, do artigo 608.º, do CPC, apenas se verifica quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre as «questões» pelas partes submetidas ao seu escrutínio, ou de que deva conhecer oficiosamente, como tais se considerando as pretensões formuladas por aquelas, mas não os argumentos invocados, nem a mera qualificação jurídica oferecida pelos litigantes».
Também o acórdão da RL de 08.05.2019, in www.dgsi.pt., considerou que «O vocábulo legal - “questões” - não abrange todos os argumentos invocados pelas partes. Reporta-se apenas às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, às concretas controvérsias centrais a dirimir».
In casu, a senhora notária pronunciou-se sobre todas as pretensões formuladas pela interessada, posto que indeferiu o requeridocancelamento da adjudicação”, bem como a realização de uma “avaliação do imóvel” e a indicação do valor feito pela interessada, apreciando, para tanto, as questões de que dependiam os pretendidos cancelamento e avaliação.
De resto, a senhora notária atentou no invocado erro na declaração, ao referir, expressamente, que «(…) as interessadas coadjuvadas pelas respetivas mandatárias, alcançaram o acordo que consta do Ata pelo que, tendo precludido o seu direito não pode agora a interessada vir aos autos, sob o manto do erro da declaração negocial, requerer a avaliação do imóvel e a sua adjudicação».
Saliente-se que, não raras vezes, as partes confundem os vícios que determinam as nulidades da sentença com o inconformismo quanto ao teor da decisão, como parece ocorrer no caso vertente. Todavia, as causas de nulidade, taxativamente, enumeradas no art.º 615.º do CPC, não visam o chamado erro de julgamento, nem a injustiça da decisão ou tão pouco a não conformidade dela com o direito aplicável.
E, assim sendo, sem necessidade de maiores considerações, se conclui que não se verifica a nulidade invocada.

4.1.2. Prossegue a recorrente, defendendo que a conferência de interessados deve ser anulada por não ter fixado, como deveria, o valor dos bens integrantes da herança, omitindo o valor do imóvel (conclusões f) a j)).
Não lhe assiste razão.
Como é consabido, compete ao cabeça-de-casal indicar o valor que atribui a cada um dos bens relacionados (arts. 1098.º, n.º 1 do CPC), que pode ser impugnado por qualquer interessado (art.º 1104.º do CPC), o que não sucedeu no caso dos autos.
Os valores indicados pela cabeça-de-casal podem, ainda, ser corrigidos na conferência de interessados, nos termos previstos no art.º 1111.º, n.º 2, als. a) e b) do CPC, mas não o foram in casu.
De resto, a avaliação dos bens poderia ter sido requerida até à abertura das licitações (art.º 1114.º, n.º 1 do CPC), o que também não ocorreu.
Ao invés, da acta da conferência de interessados consta, expressamente, que «Não houve oposição, reclamação ou impugnação quanto ao inventário, relação de bens ou valores porque as mesmas foram relacionadas» (cfr. n.º 6 dos factos provados, sendo nosso o sublinhado), o que significa que as partes aceitaram os valores pelos quais os bens foram relacionados, que, por isso, se tornaram definitivos.
E tanto assim é, que as partes logo acordaram na composição dos respectivos quinhões, tendo, precisamente, por referência os valores atribuídos aos diversos bens.
Aliás, e no que concerne ao imóvel relacionado, é a própria interessada recorrente que, nas conclusões K) e L) das suas alegações de recurso, acaba por reconhecer que a cabeça-de-casal atribuiu a esse imóvel o valor de € 30.000,00 e que ela o aceitou!
Acresce que a conferência de interessados teve lugar no dia 03.11.2022, sendo que a interessada, ora recorrente, só suscitou a questão relativa ao valor do imóvel relacionado e requereu o “cancelamento da adjudicação” em 18.12.2022.
Ora, de acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 149.º do CPC, «Na falta de disposição especial, é de 10 dias o prazo para as partes requererem qualquer ato ou diligência, arguirem nulidades, deduzirem incidentes ou exercerem qualquer outro poder processual», sendo certo que o decurso do prazo peremptório extingue o direito de praticar o acto (art.º 139.º, n.º 3 do CPC).
A interessada, ora recorrente, bem como a sua mandatária, estiveram presentes na conferência de interessados referida (não se compreendendo o exacto alcance do alegado, posteriormente, no n.º 9 do requerimento de 18.12.2022 e na al. n) das alegações do recurso de 18.01.2023…), pelo que, logo aí, tiveram conhecimento da alegada falta de fixação do valor dos bens integrantes da herança, decorrendo, desde então, o prazo de 10 dias de que aquela interessada dispunha para arguir eventuais nulidades decorrentes dessa omissão (art.º 199.º do CPC).
Ademais, na conferência de interessados as partes foram notificadas para, em vinte dias, proporem o mapa da partilha nos termos do art.º 1120.º do CPC, o que, por si só, deixava claro que se mostravam já resolvidas todas as questões susceptíveis de influir na partilha e na determinação dos bens a partilhar.
Enfim, a interessada não arguiu qualquer nulidade, nem requereu qualquer acto ou diligência dentro desse prazo (que terminou no dia 14.11.2022), pelo que perdeu o direito de o fazer, sanando-se eventuais nulidades.
Pelo exposto, impõe-se concluir pela improcedência do recurso nesta parte.

4.1.3. Finalmente, refere a recorrente que a conferência de interessados deve ser anulada e marcada uma nova conferência de interessados, por a declaração negocial ter sido efectuada em erro, pois aceitou o valor indicado para o imóvel, por desconhecer o seu valor real e por julgar que podia continuar a habitar no mesmo (conclusões k) a x)).
Aqui também, importa ter em conta que a conferência de interessados teve lugar no dia 03.11.2022, sendo que a interessada, ora recorrente, só suscitou a questão relativa ao erro na declaração e requereu, por esse motivo, o “cancelamento da adjudicação” em 18.12.2022.
Como se disse supra, de acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 149.º do CPC, «Na falta de disposição especial, é de 10 dias o prazo para as partes requererem qualquer ato ou diligência, arguirem nulidades, deduzirem incidentes ou exercerem qualquer outro poder processual», sendo certo que o decurso do prazo peremptório extingue o direto de praticar o acto (art.º 139.º, n.º 3 do CPC).
A interessada, ora recorrente, e a sua mandatária, estiveram presentes na conferência de interessados, pelo que tiveram aí conhecimento do alegado erro, decorrendo, desde essa data, o prazo de 10 dias de que aquela interessada dispunha para arguir eventuais nulidades decorrentes desse erro (art.º 199.º do CPC).
Repare-se que a própria interessada refere que desconhecia o valor real do imóvel e que um homem médio nunca o aceitaria, pelo que só pode entender-se que aceitou a proposta da outra interessada porque quis, sob pena de ter de concluir-se que não agiu com a diligência devida e que, por isso, só a si são imputáveis as consequências da sua precipitação e decisão.
Acresce que a interessada/recorrente não refere em que momento terá tido consciência de que o valor atribuído ao imóvel não correspondia ao seu valor real e de que a sua adjudicação à outra interessada implicava ter de “deixar a habitação”, pelo que não pode presumir-se que só tenha tomado conhecimento de eventuais nulidades em momento posterior à conferência.
Enfim, a interessada não arguiu o invocado erro na declaração ou qualquer nulidade dentro do prazo de que dispunha para o efeito, pelo que perdeu o direito de o fazer.
De resto, só no âmbito do recurso interposto em 18.01.2023 suscitou a interessada a questão de ser para si essencial o facto de poder continuar a habitar no imóvel, o que significa dizer que se está perante uma questão nova.
Ora, como é consabido, os recursos têm por escopo a reapreciação daquilo que foi decidido, estando vedado ao tribunal de recurso o conhecimento de questões novas, com excepção daquelas que devam ser de conhecimento oficioso.
Tal como salienta Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, Almedina, Coimbra, 7.ª ed., 2022, p. 139, «a natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina outra importante limitação ao seu objeto decorrente do facto de, em termo gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal ad quem com questões novas. Na verdade, os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando, nos termos já referidos, estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis». E, mais à frente (p. 141), «a assunção desta regra encontra na jurisprudência numerosos exemplos: a) As questões novas não podem ser apreciadas no recurso, quer em homenagem ao princípio da preclusão, quer por desvirtuarem a finalidade dos recursos, pois estes destinam-se a reapreciar questões, e não a decidir questões novas, por tal apreciação equivaler a suprimir um ou mais órgãos de jurisdição. b) os recursos destinam-se à apreciação de questões já antes levantadas e decidias no processo, e não a provocar decisões sobre questões que não foram antes submetidas ao contraditório e decididas pelo tribunal recorrido, a mesmo que se trate de questões de conhecimento oficioso».
A este respeito, o acórdão do STJ de 02.06.2015, in www.dgsi.pt., decidiu que «a questão nova não é susceptível de vir a obter um novo enquadramento jurídico, em sede de recurso, mas antes uma primeira e definitiva abordagem, pelo que, a menos que se reconduza a uma hipótese de conhecimento oficioso, está vedado, até com base no princípio da estabilidade da instância, ao Tribunal Superior a sua apreciação, que não pode conhecer e decidir o que, anteriormente, o não foi, por falta de atempada invocação».
Também o acórdão do STJ de 08.10.2020, in www.dgsi.pt, considerou que «(i) Os recursos são meios a usar para obter a reapreciação de uma decisão, mas não para obter decisões de questões novas, isto é, de questões que não tenham sido suscitadas pelas partes perante o tribunal recorrido. (ii) - As questões novas não podem ser apreciadas, quer em homenagem ao princípio da preclusão, quer por desvirtuarem a finalidade dos recursos: destinam-se a reapreciar questões e não a decidir questões novas, por tal apreciação equivaler a suprir um ou mais graus de jurisdição, prejudicando a parte que ficasse vencida».
A questão relativa ao invocado erro na declaração assente na essencialidade para a recorrente de poder continuar a habitar no imóvel, é, portanto, uma questão nova, que não foi colocada à sua senhora notária, nem abordada na decisão recorrida e que, por isso, está vedado a esta Relação conhecer.
Seja, no entanto, como for, importa não esquecer que o acordo celebrado pelas partes na conferência de interessados configura uma verdadeira transacção, que é, como se sabe, o contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante recíprocas concessões, e que pode envolver, nomeadamente, a extinção de direitos diversos do controvertido (art.º 1248.º do CC). Trata-se de um negócio jurídico privado, visando a criação, modificação ou extinção de direitos e deveres com conteúdo patrimonial, cujos efeitos jurídicos decorrem, portanto, do encontro de vontades das partes, sendo o conteúdo material desse acordo, totalmente, alheio à senhora notária.
Acresce que a acta de conferência de interessados que contém o acordo quanto à partilha, na medida em que explana o conteúdo de um acto presidido pelo notário, que a assinou, consubstancia um documento autêntico (arts. 369.º e segs. do CC), pelo que, salvo invocação da respectiva falsidade, mediante o incidente de falsidade (art.º 372.º do CC), faz prova plena de todos os factos que nela constam exarados como tendo sido praticados e/ou percepcionados pelo notário que presidiu a essa conferência.
Ora, nos termos do art.º 371.º, n.º 1, do CC, a acta em causa constitui prova plena de que as interessadas estiveram presentes na conferência de interessados e aí fizeram as declarações nela exaradas.
Dir-se-á que dessa acta não resulta plenamente provada a veracidade e validade das declarações das interessadas.
Sucede que, as questões relativas ao conteúdo ou validade material das declarações negociais, nomeadamente, a de saber se as mesmas são anuláveis por vícios da vontade, só poderão, salvo melhor opinião, ser conhecidas em acção própria (art.º 291.º, n.º 1 do CPC) ou, quanto muito, em recurso extraordinário de revisão (art.º 696.º al. d) do CPC), reunidos que estejam os seus pressupostos legais e contextos temporais.
Neste sentido, decidiu-se no RC de 26.04.2022, in www.dgsi.pt., que «I - Se alguma das partes pretender, no próprio processo em que foi proferida a sentença de homologação da transacção, que esta seja anulada terá de demonstrar que o objecto do litigio não estava na disponibilidade das partes ou não tinha idoneidade negocial ou as pessoas que intervieram na transacção não se apresentavam com capacidade e legitimidade para se ocuparem desse objecto. II – Se a parte pretender dar sem efeito a transacção com base na existência de vícios da vontade ou de vícios no objecto do negócio jurídico em que se traduz a transacção terá de instaurar acção na qual peça a declaração da nulidade ou a anulação desse negócio jurídico» (cfr., no mesmo sentido, o acórdão da RG de 30.11.2022, in www.dgsi.pt).
E, assim sendo, improcede o recurso, também, nesta parte.

4.2. Atentemos, agora, no mérito do recurso da sentença homologatória da partilha, interposto pela interessada M em 23.05.2023.
Nas conclusões formuladas (que, repete-se, delimitam o objecto do recurso - arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1 do CPC), a recorrente coloca em causa a sentença homologatória da partilha, com os seguintes fundamentos:
- ignorar a mesma o requerimento por si formulado em 18.12.2022 (e, portanto, que a aceitação da proposta feita na conferência de interessados foi-o em erro) e o recurso interposto em 18.01.2023 (conclusões a) e b)), o que se traduz na arguição da nulidade dessa sentença por omissão de pronúncia;
- a conferência de interessados realizada em 03.11.2022 ser anulável e dever ser repetida, na medida em que a declaração negocial da interessada M foi efectuada em erro-obstáculo (conclusões c) a q)), o que, subentende-se, conduzirá à anulação da sentença recorrida;
- a mesma conferência de interessados ser nula e dever ser repetida, já que não fixou o valor dos bens que integram a herança, nem identificou as verbas atribuídas a cada interessado (conclusões r) a y)), o que, mais uma vez por dedução lógica, afectará a sentença recorrida.

4.2.1. Começa a recorrente por alegar que a sentença homologatória da partilha ignorou o requerimento por si formulado em 18.12.2022 (e, portanto, não atentou que a aceitação da proposta por si feita na conferência de interessados foi determinada por erro), assim como ignorou que a recorrente apresentou recurso do despacho da senhora notária que indeferiu aquele requerimento (conclusões a) e b)).
Tal alegação configura, salvo melhor opinião, a arguição da nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
Com efeito, de acordo com o disposto no art.º 615.º, n.º 1 al. d) do CPC, a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
Esta nulidade prende-se com o facto de caber ao juiz a resolução de todas as questões que as partes tiverem submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução das outras (art.º 608.º CPC).
Certo é que só existe omissão de pronúncia quando o tribunal não se pronuncia sobre as questões com relevância para a decisão de mérito e não já quanto a todo e qualquer argumento aduzido (cfr., por exemplo, os acórdãos do STJ de 10.12.2020 e da  RL de 08.05.2019, in www.dgsi.pt.).
In casu, o tribunal a quo pronunciou-se sobre todas as questões que se lhe impunha apreciar na sentença homologatória da partilha.
Trata-se, como o próprio nome indica, de uma sentença homologatória, que serve para autenticar as partilhas e condenar os interessados no pagamento das custas e, eventualmente, do passivo aprovado ou reconhecido, sendo uma «decisão de natureza essencialmente formal, ainda assim, com reflexos na estabilização da partilha, logo que ocorra o seu trânsito em julgado» (cfr. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, in CPC Anotado, II, pág. 608).
Nas palavras de Lopes Cardoso, in Partilhas Judiciais, II, Almedina, 4.ª ed., 1990, p. 520, «constitui uma verdadeira chancela do que se deliberou, e o próprio art.º 1382.º a considera mais como uma homologação das partilhas do que um acto final de julgamento delas. Breve, concisa, a sentença limita-se a homologá-las, fazendo expressa referência aos nomes do inventariado e inventariante e condenando os interessados nas custas; destina-se a autenticar as partilhas».
As questões susceptíveis de influir na partilha e na determinação dos bens a partilhar são decididas em momento anterior, no saneamento do processo ou, quanto muito, no despacho que determina a organização do mapa da partilha.
O tribunal a quo não tinha, pois, que se pronunciar, na sentença homologatória, sobre o requerimento da interessada M de 18.12.2022.
A este respeito, não podemos deixar de salientar que a sentença em causa limitou-se a homologar a partilha nos precisos termos que haviam sido acordados pelas duas interessadas na conferência de interessados realizada em 03.11.2022 (da qual consta, aliás, não ter havido qualquer oposição, reclamação ou impugnação quanto ao inventário, relação de bens ou valores por que foram relacionados).
Como se disse já, o acordo das partes relativo à partilha configura uma verdadeira transacção, que  é, como se sabe,  o contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante recíprocas concessões, e que pode envolver, nomeadamente, a extinção de direitos diversos do controvertido (art.º 1248.º do CC).
Desta forma, através do referido acordo de partilha, as partes dispuseram da situação jurídica de direito substantivo afirmada em juízo, determinando, assim, o conteúdo dos seus próprios direitos e deveres (cfr., por exemplo, o acórdão da RP de 20.09.2021, in www.dgsi.pt).
Trata-se, pois, de um negócio jurídico privado e, como tal, assenta na autonomia de vontade dos contraentes, visando a criação, modificação ou extinção de direitos e deveres com conteúdo patrimonial.
Os efeitos jurídicos do referido acordo de partilha decorrem, portanto, do encontro de vontades das partes, sendo que a sentença homologatória, sendo embora uma sentença de mérito, limita-se a absorver o conteúdo do negócio jurídico das partes, condenando e absolvendo nos termos exactamente pretendidos e resultantes das concessões recíprocas das partes.
Vê-se, assim, que o juiz nada tem que ver com o conteúdo material do acordo de partilha, limitando-se, para conceder a respectiva homologação, à verificação de determinadas condições que se mostram extrínsecas àquele conteúdo.
Daí que, repete-se, o tribunal a quo não tivesse que pronunciar-se, na sentença homologatória, sobre o requerimento da interessada M de 18.12.2022.
De resto, tal como em cima se escreveu, a acta de conferência de interessados que contém o acordo quanto à partilha, na medida em que explana o conteúdo de um acto presidido pelo notário, que a assinou, consubstancia um documento autêntico (arts. 369.º e segs. do CC), pelo que, salvo invocação da respectiva falsidade, mediante o incidente de falsidade (art.º 372.º do CC), faz prova plena de todos os factos que nela constam exarados como tendo sido praticados e/ou percepcionados pelo notário que presidiu a essa conferência.
Inexistiam, por isso, quaisquer razões para que o juiz, no momento de proferir a sentença homologatória da partilha, não tivesse em conta o acordo das partes nela exarado, nos exactos termos que constam da acta, cuja falsidade não foi invocada.
De resto, a interessada M não coloca em causa os termos do acordo de partilha tal como constam da acta. O que ela defende é que as declarações negociais que fez e que foram aí exaradas estão inquinadas por erro (que qualifica de erro-obstáculo).
Ora, é certo que nos termos do art.º 371.º, n.º 1, do CC, a acta em causa apenas constitui prova plena de que as interessadas estiveram presentes na conferência de interessados e aí fizeram as declarações nela exaradas, não resultando plenamente provada a veracidade e validade dessas declarações.
Importa, no entanto, não esquecer que estamos perante um processo de inventário notarial, pelo que competia à senhora notária a apreciação e decisão do requerimento da interessada M de 18.12.2022 e, nomeadamente, das questões que a mesma suscitou relativas aos vícios da sua vontade.
É o que decorre do art.º 2.º do RPI, onde se dispõe que:
 «3 - Ao notário compete realizar todas as diligências do processo, sem prejuízo dos casos em que os interessados devam ser remetidos para os meios judiciais».
4 - Compete ao tribunal de comarca da circunscrição judicial da área do cartório notarial praticar os atos que caibam ao juiz, bem como apreciar os recursos interpostos de decisões do notário».
No caso dos autos, estava-se em face de uma questão que não era relativa à definição dos bens ou dívidas que integram o património a partilhar, pelo que competia à senhora notária, e não ao tribunal a quo, decidir a matéria em litígio (art.º 3.º, n.º 2 a contrario do RPI).
De igual modo, o tribunal a quo não podia ter conhecido do recurso interposto em 18.01.2023, quer porque o mesmo foi dirigido, expressamente, ao tribunal da Relação, quer porque da decisão da senhora notária de 22.12.2022, apenas, era admissível recurso a final, por não se tratar de uma decisão imediatamente impugnável perante o tribunal de Comarca.
Enfim, contrariamente ao propugnado pela recorrente, o tribunal a quo não ignorou, isto é, não omitiu pronúncia sobre o seu requerimento de 18.12.2022 ou sobre o seu recurso de 18.01.2023, uma vez que, quer um, quer outro não lhe foram dirigidos, pelo que se limitou a homologar, como lhe competia (art.º 5.º do RIN), o acordo/negócio de partilha, verificando determinadas condições que são extrínsecas ao conteúdo daquele negócio (validade do objecto e qualidade dos intervenientes) e absorvendo o conteúdo do mesmo.
Tal como se refere no acórdão da RP, de 20.09.2021, in www.dgsi.pt, «(…) dependendo é certo a eficácia da transação da prolação da sentença homologatória, constata-se que a função dessa sentença não é a de apreciar/decidir as razões e argumentos das partes sobre a respetiva controvérsia substancial e sim, apenas, diversamente, a de verificar/fiscalizar a regularidade e a validade do acordo, pelo seu objeto e pela qualidade das pessoas que nele intervieram».
A intervenção do juiz é meramente fiscalizadora da legalidade do objecto do acordo de partilha e da qualidade das pessoas que o celebram, não lhe cabendo conhecer do mérito do mesmo, sancionando a solução que as partes encontraram, antes absorvendo a solução que os interessados deram ao litígio, no âmbito da autonomia privada e dentro dos limites da lei.
As questões relativas ao conteúdo ou validade material desse negócio, nomeadamente, a de saber se o mesmo é anulável por vícios da vontade, só poderão, salvo melhor opinião, ser conhecidas em acção própria (art.º 291.º, n.º 1 do CPC) ou, quanto muito, em recurso extraordinário de revisão (art.º 696.º al. d) do CPC), reunidos que estejam os seus pressupostos legais e contextos temporais.
Neste sentido, decidiu-se no RC de 26.04.2022, in www.dgsi.pt., que «I - Se alguma das partes pretender, no próprio processo em que foi proferida a sentença de homologação da transacção, que esta seja anulada terá de demonstrar que o objecto do litigio não estava na disponibilidade das partes ou não tinha idoneidade negocial ou as pessoas que intervieram na transacção não se apresentavam com capacidade e legitimidade para se ocuparem desse objecto. II – Se a parte pretender dar sem efeito a transacção com base na existência de vícios da vontade ou de vícios no objecto do negócio jurídico em que se traduz a transacção terá de instaurar acção na qual peça a declaração da nulidade ou a anulação desse negócio jurídico» (cfr., no mesmo sentido, o acórdão da RG de 30.11.2022, in www.dgsi.pt).
Conclui-se, pois, que a sentença recorrida não padece de qualquer nulidade por omissão de pronúncia sobre o requerimento da interessada M de 18.12.2022 ou sobre o recurso interposto em 18.01.2023.

4.2.2. Prossegue a recorrente, defendendo que a conferência de interessados realizada em 03.11.2022 deve ser anulada e repetida, na medida em que a sua declaração negocial foi efectuada em erro-obstáculo (conclusões c) a q)).
No ponto 4.2.1 deste acórdão, viu-se já que as questões suscitadas pela recorrente no seu requerimento de 18.12.2022, nomeadamente, a relativa ao erro na sua declaração negocial exteriorizada em conferência de interessados, não foi colocada perante o tribunal recorrido, que sobre ela não se pronunciou na sentença homologatória da partilha, nem tinha que o fazer.
Tal pretensão de “anulação da conferência de interessados” nunca sequer foi formulada perante a senhora notária (tendo-se a interessada/recorrente limitado a requerer o “cancelamento da adjudicação” e a “realização de uma avaliação do imóvel”), sendo certo, ainda, que as questões suscitadas no requerimento de 18.12.2022 se mostram já, definitivamente, decididas (cfr. ponto 4.1. deste acórdão).
Ora, como se disse, os recursos têm por escopo a reapreciação daquilo que foi decidido, estando vedado ao tribunal de recurso o conhecimento de questões novas, com excepção daquelas que devam ser de conhecimento oficioso (cfr. Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, Almedina, Coimbra, 7.ª ed., 2022, p. 139 e segs., e acórdãos do STJ de 02.06.2015, e de 08.10.2020, in www.dgsi.pt).
A questão relativa à anulação da conferência de interessados, suscitada pela recorrente nas conclusões c) a q) é, portanto, uma questão nova, que não foi abordada na sentença recorrida e que, por isso, está vedado a esta Relação conhecer.
De resto, o fundamento invocado pela recorrente para a anulação dessa conferência reside, em última análise, nos alegados vícios da sua vontade, sendo certo que, tal como se decidiu no acórdão da RG de 30.11.2022, in www.dgsi.pt., «para se poder concluir pela anulabilidade da transação, por erro na declaração indispensável se torna uma discussão processual, com alegação e prova dos factos correspondentes ao invocado vício da vontade, pelo que não constitui este recurso o meio próprio para discutir a anulação da transação nos moldes pretendidos».
A sentença homologatória da partilha, ao concluir pela validade do acordo das partes exarado na acta da conferência de interessados, limitou-se, como se expôs anteriormente, a confirmar os termos e efeitos de um negócio jurídico de direito substantivo praticado no processo, exercendo uma função meramente fiscalizadora da legalidade do objecto desse negócio e da qualidade das pessoas que o celebraram, não lhe cabendo conhecer do mérito do mesmo e, muito menos, dos eventuais vícios da vontade que o inquinem.
O recurso dessa sentença homologatória tem de incidir, necessariamente, sobre um vício da própria sentença e não do acordo celebrado.
No caso dos autos, a recorrente não invoca qualquer vício da própria sentença homologatória (nomeadamente, que a fiscalização feita pelo juiz da regularidade e validade do acordo foi erroneamente realizada, por o objecto do litígio não estar na disponibilidade das partes ou por não possuir idoneidade negocial ou por os interessados intervenientes não se terem apresentado com capacidade e legitimidade requeridas), mas sim um vício da sua vontade no acordo de partilha que celebrou.
Tal vício convoca o regime da anulabilidade dos negócios jurídicos, sendo que o direito potestativo da destruição dos efeitos do acordo de partilha celebrado só pode ser feito através de acção judicial (art.º 287.º CC), onde a interessada alegará e provará a existência dos pretensos vícios da vontade, e nunca em recurso da sentença homologatória.
Soçobra, pois, a pretensão da recorrente.
4.2.3. Finalmente, defende a recorrente que a conferência de interessados realizada em 03.11.2022 é nula e deve ser repetida, já que não fixou o valor dos bens que integram a herança, nem identificou as verbas atribuídas a cada interessado (conclusões r) a y)).
A questão relativa à fixação do valor dos bens a partilhar foi objecto do recurso interposto em 18.01.2023 e supra decidida no ponto 4.1.2, pelo que nada mais cumpre decidir, valendo neste lugar a argumentação e conclusões aí extraídas.
No que concerne à acusada falta de identificação das verbas atribuídas a cada interessado, não só tal não corresponde ao que decorre da acta da conferência de interessados (cfr. n.º 6 dos factos provados, sendo certo que a expressão “restantes bens móveis” abrange, por exclusão de parte e de forma clara e evidente para qualquer declaratário, todos os demais bens que não estão expressamente referidos no acordo), como constitui, mais uma vez, uma questão nova, que nunca foi formulada perante a senhora notária e que, por isso, sempre estaria vedado a esta Relação conhecer.
4.3. Aqui chegados, conclui-se pela total improcedência das conclusões formuladas pela recorrente e, por esta via, dos dois recursos por si interpostos, cujas custas serão por si integralmente suportadas (sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie) – art.º 527.º do CPC.
V – DECISÃO
Pelos fundamentos expostos, acorda-se em julgar totalmente improcedentes as apelações interpostas pela interessada M em 18.01.2023 e em 23.05.2023, confirmando-se as decisões recorridas.
Custas de ambas as apelações pela apelante (sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie).
Notifique.

Lisboa, 12.09.2024
Rui Oliveira
Marília Fontes
Ana Paula Olivença