Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | GABRIELA CUNHA RODRIGUES | ||
Descritores: | CONTRATO DE MANDATO RESPONSABILIDADE CIVIL PERDA DE CHANCE | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 11/21/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Sumário: | I– Pelo contrato de mandato, o advogado fica, em regra, adstrito a uma obrigação de meios. II– A doutrina da perda de chance como dano autónomo propugna a concessão de uma indemnização quando fique demonstrado, não o nexo causal entre o facto ilícito e o dano final, mas apenas que as probabilidades de obtenção de uma vantagem, ou de evitamento de um prejuízo, foram sérias e consideráveis. III– Acompanhando esta tese, preconiza-se a indemnização do dano «avançado» constituído pela perda de chance. IV– Entre o limiar de seriedade da chance, localizada na probabilidade nula ou irrelevante e o limiar da certeza da causalidade, situada na alta probabilidade, não detetamos no caso a denominada situação intermédia de «chances sérias e reais, que expressam probabilidades consideráveis». V– Ainda que o 1.º Réu tivesse intentado atempadamente a ação de impugnação com fundamento na anulabilidade da deliberação do Júri, inexistiria uma probabilidade séria e considerável de procedência da ação e da consequente oportunidade de progressão do Autor na carreira. VI– Na hipótese de se seguir a teoria da conexão do risco ou das esferas de risco, a solução seria a mesma, pois falharia sempre a referida probabilidade séria e considerável. VII– Segundo as várias soluções plausíveis de Direito, não se verifica no caso perda de chances, o que faz cair por terra o fundamento da responsabilidade civil profissional do 1.º Réu e considerar adequada a prolação de saneador-sentença. SUMÁRIO: [artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil (doravante CPC) - da responsabilidade da relatora] | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa. I–Relatório: 1.–OR…… interpôs recurso da sentença proferida na ação declarativa sob a forma de processo ordinário que intentou, no dia 10.5.2013, contra FL…… e Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A.. 2.–O Autor formulou o pedido de condenação dos Réus no pagamento de uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, incluindo os resultantes da perda de oportunidade de obter uma decisão judicial favorável, danos esses a liquidar em incidente posterior. 3.–Alegou, em suma, que: - É militar no ativo dos quadros permanentes da Marinha Portuguesa, detendo atualmente o posto de cabo da classe de Fuzileiros; - Por requerimento datado de 24.9.2009, o Autor apresentou candidatura ao concurso de admissão ao Curso de Formação Complementar de Oficiais (CFMCO), que habilitava ao ingresso, em 2009, na classe de Oficiais Técnicos Superiores Navais dos Quadros Permanentes (TSN-QP), na área de «Oceanografia»; - Na mesma data, apresentou candidatura ao concurso de admissão ao Curso de Formação Militar Complementar de Oficiais (CFMCO), que habilitava ao ingresso, em 2009, na classe de Oficiais do Serviço Técnico – ramo de Especialistas – dos Quadros Permanentes (STESP-QP), nas áreas de «Engenharia dos Materiais», assim como na de «Engenharia Naval, Engenharia Forense, Engenharia Mecânica ou Design de Materiais», estando habilitado como «Bacharel – Licenciatura de Bolonha em Engenharia e Design de Materiais»; - O concurso para admissão ao Curso de Formação Complementar de Oficiais destinava-se ao preenchimento, entre outras, de 1 (uma) vaga por militar habilitado com licenciatura obtida antes da adequação aos princípios do processo de Bolonha ou com o 2.º ciclo obtido depois da adequação ao processo de Bolonha em «Engenharia Geográfica», «Geografia», «Geologia», «Cartografia», «Ciências do Mar» ou «Oceanografia»; - O concurso para admissão ao Curso de Formação Militar Complementar de Oficiais destinava-se ao preenchimento, entre outras, de 2 (duas) vagas por militares habilitados, no mínimo, com bacharelato obtido antes da adequação aos princípios do processo de Bolonha ou com o 1.º ciclo de estudos do ensino superior (licenciatura) obtido depois da adequação ao processo de Bolonha em «Engenharia Mecânica», «Engenharia e Gestão Industrial», «Engenharia dos Materiais» ou «Engenharia Naval»; - Na fase documental do concurso de admissão ao curso de formação complementar de oficiais, o Autor não foi aceite com o fundamento de não se encontrar habilitado com a licenciatura definida e publicitada no aviso de abertura do respetivo concurso; - Na fase documental do concurso de admissão ao curso de formação militar complementar de oficiais, o Autor foi aceite, sem condição, ao concurso; - Nos termos das listas referentes ao CFCO 2009, o Autor foi notificado da intenção de ser excluído do concurso de admissão com o fundamento de não se encontrar habilitado com uma das licenciaturas exigidas no aviso de abertura; - No Anexo J da OP2/019/28JAN10, foram publicadas as listas de ordenação e propostas de classificação final dos candidatos admitidos ao concurso de admissão ao CFMCO 2009 e ao concurso de admissão ao CFCO 2009, tendo o Autor obtido a classificação de 15,45 valores; - Relativamente ao concurso de admissão ao CFMCO, o Autor, candidato a uma das duas vagas da alínea a) do n.º 2 do aviso de abertura do concurso, com a classificação de 15,45 valores, não ficou apurado para o curso «por as vagas já terem sido ocupadas por outros candidatos melhor classificados»; - Contudo, os candidatos AJ…… e EM……, candidatos às mesmas vagas, ficaram apurados para o curso com as classificações de 13,63 e 13,62 valores, respetivamente; - Em sede de audiência dos interessados, o Autor emitiu pronúncia escrita e em 24.3.2010 foi notificado da deliberação do Júri de Seleção do concurso de admissão ao CFMCO 2009, a qual indeferiu a pretensão do Autor e deliberou a sua exclusão do concurso, com o fundamento de não possuir habilitação em «Engenharia Mecânica», «Engenharia e Gestão Industrial», «Engenharia dos Materiais» ou «Engenharia Naval»; - Sucede que o Autor detém o grau de licenciatura, ao abrigo do processo de Bolonha, tendo-se licenciado na vasta área das engenharias (estudos gerais de engenharia) pela OPEN UNIVERSITY de Inglaterra, instituição estrangeira idónea e devidamente reconhecida pelo Estado Português e pelo Ministério da Educação; - Para efeitos de preenchimento dos requisitos de acesso aos concursos supra mencionados, o Autor procedeu sempre ao esclarecimento do que lhe foi exigido; - O Autor procurou os serviços jurídicos do 1.º Réu, em 25.3.2010, para que intentasse ação administrativa especial de impugnação, com fundamento em anulabilidade, da deliberação de 3.3.2010, notificada ao Autor em 24.3.2010, do júri de seleção do concurso de admissão ao curso de formação militar complementar de oficiais, bem como do despacho de concordância com esta deliberação, a qual não aceitou o Autor, excluindo-o do concurso, com o fundamento de o mesmo não possuir habilitação em «Engenharia Mecânica», «Engenharia e Gestão Industrial», «Engenharia dos Materiais» ou «Engenharia Naval»; - Era também intenção do Autor que o primeiro Réu impugnasse a decisão do mesmo júri que admitiu ao concurso os dois contrainteressados que a ele concorreram juntamente com o Autor, bem como a decisão final que os considerou providos no cargo, quando tiveram classificação inferior à do Autor; - Uma vez que para tal violação não está prevista de forma expressa outra sanção, o 1.º Réu era também de opinião que era de intentar ação administrativa especial de impugnação dos atos supra indicados, com fundamento em anulabilidade, contra a Marinha de Guerra Portuguesa; - Essa ação deveria ter sido intentada, no máximo, no prazo de três meses após notificação ao Autor dos atos acima indicados, em 24.3.2010; - Só em 6.9.2012 é que o primeiro Réu intentou, em nome do Autor, ação administrativa contra a Marinha de Guerra Portuguesa; - Para além disso, não foi instaurada qualquer ação administrativa especial de anulação de atos administrativos, como devia ter sido, mas sim uma ação administrativa comum, para reconhecimento de direito e de qualidade, nos termos do artigo 37.º, n.º 2, alíneas a) e b), do CPTA; - Aquilo para que o Autor expressamente mandatou o 1.º Réu, em 25.3.2010, foi para instaurar ação de impugnação dos atos administrativos em causa, tendo o mesmo pago ao 1.º Réu para tal a quantia de 1 000,00 €; - O 1.º Réu não cumpriu o acordado e, contra a vontade expressa do Autor, intentou ação diversa; - Em consequência, o prazo para impugnação dos atos administrativos que eram visados, de três meses, já findou há muito, tendo caducado o direito do Autor de instaurar ação administrativa especial de impugnação com fundamento em anulabilidade; - Não podendo mais o Autor impugnar tais atos, por anuláveis, perdeu a oportunidade de poder vir a ingressar no Curso de Formação Militar Complementar de Oficiais (CFMCO), por via da alegação da anulabilidade dos atos; - Toda esta situação causou ao Autor uma grande angústia, além de um estado de frustração e de impotência profundos; - Pelos danos não patrimoniais causados ao Autor com a conduta do primeiro Réu, devem ambos os Réus ser condenados a pagar-lhe uma indemnização de valor não inferior a 30 000,01 €; - Por não se ter tentado, nem ter sido obtida, a anulação dos atos em causa, assim não tendo sido provido no cargo a que teria direito, deixou o Autor de auferir a diferença salarial entre o que aufere enquanto cabo e o que iria auferir enquanto oficial, o mesmo sucedendo com todos os subsídios e abonos correspondentes, desde a data em que deveria ter sido provido no cargo até à data da reforma do Autor; - Além de lhe ser devida a antiguidade respetiva e todas as regalias institucionais devidas a um oficial da Marinha, sendo estes prejuízos a liquidar em momento oportuno, para efeitos da condenação dos réus no seu pagamento ao Autor; - O 1.º Réu incumpriu o mandato que lhe foi outorgado pelo Autor, tendo-se tornado responsável pelos danos causados; - A 2.ª Ré é responsável solidariamente com o 1.º Réu por força do contrato de seguro de responsabilidade civil profissional dos advogados celebrado com a Ordem dos Advogados e através do qual assumiu o pagamento de indemnizações que possam ser exigidas aos advogados, por erro ou omissão no exercício da atividade profissional de advocacia. 4.–O 1.º Réu contestou, invocando a pendência de causa prejudicial e impugnando os factos alegados pelo Autor. Sustentou, em suma, que: - O Autor procurou os seus serviços de molde a que lhe fosse possível aceder aos Cursos de Oficiais da Marinha identificados na petição inicial; - Após ter analisado os documentos que o Autor lhe entregou, os factos em causa apenas se subsumiriam à propositura de ação administrativa comum e não ação administrativa especial; - Informou o Autor da necessidade de efetuar o registo e validação do «Bachelor of Engeneering» junto das entidades portuguesas competentes; - O concurso foi direcionado para todos os militares que estivessem habilitados com bacharelato obtido antes da adequação aos princípios do processo de Bolonha ou com o 1.º ciclo obtido depois da adequação ao processo de Bolonha; - Devido ao facto de o Autor não ter habilitação de Bacharel antes da adequação aos princípios de Bolonha e não estar validado, na ordem jurídica portuguesa, o 1.º ciclo (bacharel) obtido antes da adequação ao processo de Bolonha, entendeu intentar ação administrativa comum para reconhecimento de direitos e qualidades; - Entendeu que a figura processual de impugnação de atos administrativos em nada serviria os interesses do Autor, o qual só veio a fazer o registo do seu diploma na Direção Geral do Ensino Superior em 11.1.2013. 5.–A Ré Tranquilidade também contestou, invocando a exclusão da apólice em virtude de o 1.º Réu, à data do início da vigência do contrato, ter conhecimento dos factos e circunstâncias em questão e que os mesmos eram potencialmente geradores da sua responsabilidade civil profissional e não ter comunicado tal situação à seguradora. Arguiu que dos factos alegados na petição inicial não resultam preenchidos os pressupostos essenciais e cumulativos da responsabilidade civil profissional, tendo o Autor sido excluído do mencionado concurso devido ao facto de não possuir as habilitações exigidas no aviso de abertura do concurso, não tendo o candidato apresentado qualquer documento comprovativo do reconhecimento do seu grau académico. Acrescenta ainda que a hipotética ação de anulabilidade do ato teria reduzidíssimas probabilidades – senão mesmo nulas – de satisfazer as pretensões do Autor, não existindo qualquer nexo de causalidade entre os factos e omissões imputáveis ao Réu FL...... e os pretensos danos sofridos. 6.–O Autor apresentou articulado de réplica, sustentando que sempre se deverá considerar cumprido o dever de participação à seguradora aquando da citação de ambos os Réus para a presente ação. Invocou que a 2.ª Ré é parte legítima para estar no lado passivo da demanda e que, assim não se entendendo, deve ser declarada a inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 100.º e 101.º do Regime do Contrato de Seguro. Alegou igualmente que o fundamento da exclusão do Autor do concurso foi o de não possuir habilitação em «Engenharia Mecânica», «Engenharia e Gestão Industrial», «Engenharia dos Materiais» ou «Engenharia Naval», sendo que o Autor tinha o grau de licenciatura, ao abrigo do processo de Bolonha, tendo-se licenciado em estudos gerais de engenharia pela Open University de Inglaterra. 7.–Por despacho de 22.10.2013, foi endereçado convite ao Autor no sentido do aperfeiçoamento da petição inicial e da junção de documentos essenciais: «a)- Aclaração do alegado no artº 39º da petição inicial por forma a que se compreendam as razões de facto pelas quais se conclui que atenta a sua idade o autor não pode concorrer a outro concurso de acesso à carreira de oficial. b)- Aclaração do alegado no artº 48º da petição inicial, esclarecendo quais os meios de que lançou mão para tentar obter a nulidade dos actos, se intentou, para o efeito alguma acção judicial e, na afirmativa, para que junte certidão dos articulados dessa acção com menção do estado da mesma; c)- Liquidação mínima do dano alegado no artº 58º da petição inicial, indicando o montante que aufere enquanto cabo, o que iria auferir enquanto oficial e o período esperado em que manteria esta última remuneração; d)- Junção de certidão dos articulados da acção administrativa intentada em seu nome pelo 1º réu com menção do estado actual dessa causa. O aperfeiçoamento deverá constar de articulado avulso que se cinja aos limites do convite, sem necessidade de reprodução do que já foi alegado. Prazo: 15 (quinze) dias.» 8.–O Autor apresentou resposta ao convite formulado por articulado de 13.11.2010. 9.–Por despacho de fls. 322 a 324, a instância foi declarada suspensa em virtude da relação de prejudicialidade que intercedia entre a presente ação e as ações intentadas pelo Autor sob os n.ºs 981/12.1BESN e 345/13.0BESNT, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra. 10.–Uma vez decididas por sentenças transitadas em julgado, foi determinado o prosseguimento da instância. 11.–Após a realização da audiência prévia, o Tribunal a quo proferiu saneador-sentença, no qual julgou a ação improcedente e, em consequência, absolveu os Réus do pedido. 12.–Inconformado com o assim decidido, o Autor interpôs recurso de apelação do saneador-sentença, apresentando as seguintes CONCLUSÕES: «A- O Tribunal “a quo” não considerou como provado que o A. tenha contratado o primeiro R. como seu advogado, quando o próprio R. o afirma na sua contestação, pelo que, ao não dar este facto como provado, e ao não referir sequer a contratação do primeiro R. pelo A., o Tribunal recorrido deixou de se pronunciar sobre questão que devia ter apreciado, com o que tornou a sentença por si proferida nula, nos termos do disposto no art.º 615.º, n.º 1, al. d) do CPC; B- Não se tendo efetuado julgamento para produção de prova, fica por provar o que o Autor alegou na sua petição, ou seja, que contratou os serviços do Réu Francisco Pessoa Leitão na específica data de 25 de março de 2010, para que o mesmo intentasse ação administrativa especial de impugnação, com fundamento em anulabilidade, da deliberação de 03/03/2010, notificada ao autor em 24/03/2010, do júri de seleção do concurso de admissão ao curso de formação militar complementar de oficiais, bem como do despacho de concordância com esta deliberação; C- Essa ação deveria ter sido intentada, no máximo, no prazo de três meses após notificação ao Autor dos atos acima indicados, em 24/03/2010, mas apenas em 6 de setembro de 2012 é que o primeiro Réu intentou, em nome do Autor, ação administrativa contra a Marinha de Guerra Portuguesa; D - Não tendo sido instaurada ação administrativa especial de anulação de atos administrativos, mas uma ação administrativa comum, para reconhecimento de direito e de qualidade, nos termos do art.º 37.º, n.º 2, alínea a) e b) do CPTA (vide doc. n.º 20 que se junta e se dá por reproduzido), em que não foi deduzido pedido de impugnação dos atos praticados relativos à exclusão do Autor do concurso, nem pedido de anulação do provimento no cargo dos outros candidatos, nem pedido de provimento no cargo por parte do Autor, na sequência do eventual reconhecimento do direito alegado pelo Autor nessa ação, pela mão do primeiro R.; E - O Tribunal incorreu em erro de julgamento quanto à matéria de facto e em erro de julgamento quanto à matéria de direito, impedindo a produção de prova sobres estes factos pelo facto de não ter efetuado julgamento, os quais se revelavam de conhecimento essencial para sindicância judicial da atuação profissional do 1º. R. quanto ao A. no âmbito da sua contratação por este; F - Com a ausência de realização de julgamento o Tribunal recorrido tornou a sua decisão nula, de harmonia com o disposto no art.º 615.º, n.º 1, als. c) e d) do CPC, sendo ainda nula, nos termos do disposto no art.º 615.º, n.º 1, al. b), dado que não especifica estes concretos fundamentos a título de justificação da decisão proferida, devendo, assim, a decisão recorrida ser revogada, ordenando-se a realização de julgamento para que seja feita produção de prova destes factos; H - O Tribunal não apreciou, nem curou de interpretar, que o facto de o primeiro R. ter instaurado ação para reconhecimento de direitos em nome e em representação do Autor nada serviria os interesses do A. para o efeito pretendido, ou seja, o de ver o reconhecimento do seu grau académico obtido no Reino Unido refletido nos concursos a que havia concorrido, já que, seguindo o raciocínio quer do Tribunal “a quo”, quer do 1º. R., o mero registo formal do seu grau académico nos termos já referidos cumpriria o fim a que a ação para reconhecimento de direitos se destinava; I - Ao não ter sido feita produção de prova sobre isto, o Tribunal “a quo” colocou-se na posição de ter deixado de se pronunciar sobre facto que era essencial ao conhecimento da causa, assim tendo incorrido em erro na interpretação da matéria de facto que suporta a interpretação da matéria de direito aplicável, tendo tornado a decisão proferida nula, nos termos do disposto no art.º 615.º, n.º 1, als. b) e d) do CPC; J - Não tendo o primeiro R. instaurado a ação pretendida pelo aqui A., o prazo para impugnação dos atos administrativos que eram visados, de três meses, findou entretanto, tendo caducado o direito do Autor de a instaurar, o que o impossibilitou de impugnar tais atos, tendo perdido qualquer oportunidade de poder vir a ingressar no Curso de Formação Militar Complementar de Oficiais (CFMCO), por via da alegação da anulabilidade dos atos; K - Ao não ter sido produzida prova sobre estes factos, e ao não terem sido dados quer como provados, quer como não provados, o Tribunal “a quo” tornou a sentença que proferiu nula, nos termos do disposto no art.º 615.º, n.º 1, als. b) e d) do CPC; L - O Autor detém o grau de licenciatura, ao abrigo do processo de Bolonha, o que já sucedia quando concorreu aos concursos abertos pela Marinha Portuguesa e constantes da matéria de facto dada como provada; M - O Autor é membro da categoria superior em instituições de engenharia estrangeiras, como é o caso da ROYAL INSTITUTION OF NAVAL ARCHITECTS de Inglaterra e na SOCIETY OF NAVAL ARCHITECTS AND MARINE ENGINEERS dos Estados Unidos da América e, com as mesmas habilitações académicas que tinha em 2008, inscreveu-se, sem mais, na Ordem dos Engenheiros portuguesa, Região Sul, em Portugal, tendo sido aceite a sua inscrição por esta Ordem Profissional; N - O que foi alegado, mas não consta da sentença recorrida, com o que esta é nula, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, als. b) e d) do CPC. O - O Decreto-lei n.º 341/2007, de 12 de outubro, veio aprovar o regime jurídico do reconhecimento de graus académicos superiores estrangeiros, e a deliberação n.º 568/2009, da Direção-Geral do Ensino Superior, reconheceu com nível, objetivos e natureza idênticos ao grau de licenciado o grau Bachelor with honours do 1.º Ciclo (Licenciatura), do qual o Autor é detentor, ou seja, estabeleceu os casos em que o reconhecimento do grau académico estrangeiro obtido no Reino Unido é automático, como sucede com o aqui Autor; P - No caso de o reconhecimento do grau académico obtido no estrangeiro ser automático, como é o caso, não era necessário que o A. procedesse ao seu registo formal nos termos do disposto no art.º 10.º do D.L. n.º 341/2007; Q - Ao ter feito interpretação diversa do disposto no art.º 10.º do D.L. n.º 341/2007 de 12 de outubro, desconsiderando o disposto na deliberação n.º 568/2009, da Direção-Geral do Ensino Superior, o Tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento da matéria de direito aplicável, devendo, com este fundamento, ser a sentença recorrida revogada; R - A Marinha Portuguesa aceitou e assumiu, num primeiro passo, que o grau académico do Autor era reconhecido na ordem jurídica interna portuguesa, por via das deliberações já referidas e, ao ter excluído o A. do concurso numa fase em que tal já não era possível face ao procedimento concursal, incorreu em diversas ilegalidades; S - Sendo essas que deveriam ter sido sujeitas a sindicância judicial na altura própria, no início de 2010, o que não sucedeu por incúria do primeiro R.; T - Ao não produzido prova sobre estes factos, o Tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento quanto à matéria de facto e de direito aplicável, assim como tornou a sentença recorrida nula, nos termos do disposto no art.º 615.º, n.º 1, als. c) e d) do CPC, devendo a mesma ser revogada com este fundamento; U - A atuação do júri do concurso no âmbito do procedimento concursal da Marinha Portuguesa fez incorrer a deliberação de exclusão do A. do mesmo em diversas ilegalidades, nomeadamente, em vício de violação de lei, na violação do princípio da igualdade, do princípio da igualdade de tratamento e acesso à função pública e do princípio da tutela da confiança, mais sendo as normas regulamentares daquele concurso, de que o A. foi excluído, inconstitucionais, o que deveria ter sido alegado na altura pelo 1º. R. junto do Tribunal competente; V - Não se produziu sequer prova de qualquer dos danos alegados pelo Autor, nomeadamente, dos não patrimoniais por si expressamente alegados no petitório, o mesmo tendo sucedido com os danos patrimoniais aí vertidos, com o que a sentença recorrida é nula, nos termos do disposto no art.º 615.º, n.º 1, al.s b) e d) do CPC; W - O objeto do litígio foi circunscrito pelo Tribunal “a quo” ao apuramento do direito do A. a ser indemnizado pelos R.R. por danos sofridos em decorrência de serviços realizados pelo 1º R., atento, no que concerne à responsabilidade da 2ª R., o contrato de seguro de responsabilidade civil profissional dos Advogados celebrado entre a Ordem dos Advogados e o 1º R.; X - Da sentença recorrida apenas se conclui que, por um lado, seria bastante improvável que o A. visse reconhecida a sua pretensão e, por outro, que não estando o aqui 1º R. vinculado a uma obrigação de resultados, mas apenas de meios, este nunca seria responsável pelo hipotéticos danos que adviriam para o A. da falta de instauração de uma ação de impugnação da deliberação do júri do concurso que excluiu o A. do mesmo, por falta de habilitações adequadas; Y - O profissional com a obrigação de meio a que se vinculou para com o Autor – a propositura de ação administrativa especial de impugnação de atos administrativos, por anuláveis – não executou o acordado com o cliente, não agiu segundo as exigências das leges artis, nem dos deveres deontológicos da classe e dos conhecimentos jurídicos existentes, não atuando de acordo com o dever objetivo de cuidado, pelo que, a vitória judicial, incerta, ficou irremediavelmente afastada com a atuação do advogado e aqui 1º. R.; Z - Não se podendo dizer que, nos termos do art.º 10.º, n.º 1 do D.L. n.º 341/2007 de 12 de outubro, a eficácia do grau académico do Autor obtido no Reino Unido dependia do seu registo prévio, já que, no caso do A., o reconhecimento das suas habilitações operava de forma automática; AA - Ao julgar em sentido diverso, absolvendo os R.R. dos pedidos deduzidos contra si pelo A., o Tribunal recorrido cometeu erro de julgamento quanto à interpretação da matéria de facto e de direito, devendo a sentença recorrida ser revogada com este fundamento, e substituída por outra que condene os R.R. nos pedidos, com o que VV.» 13.–A Recorrida Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. apresentou alegações de resposta, com as seguintes CONCLUSÕES: «1ª.- As alegações apresentadas pelo Recorrente não contêm fundamentos impugnatórios, nem verdadeiras conclusões, pois as proposições finais - que apresentam mais de 26 pontos elencados em 5 páginas! - não constituem qualquer enunciado fundamentado, sintético e resumido dos fundamentos do recurso, limitando-se o ora Recorrente a “vazar os pormenores argumentativos próprios da alegação”, pelo que o recurso deverá ser liminarmente rejeitado (v. Ac. STJ de 1996.07.10, Proc. 96S069, www.dgsi.pt; cfr. arts. 639º, 640º, 652º a 656º, 679º e 682º do CPC) – Cfr. texto nºs 1 a 3; 2ª. In casu, o A. Recorrente não alegou, demonstrou ou provou a existência de qualquer Dano, consistente na “supressão ou diminuição duma situação jurídica favorável que estava protegida pelo Direito” (v. Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, 1980, Vol. II, AAFDL, p.p. 283; cfr. Gomes da Silva, O Dever de Prestar e o Dever de Indemnizar, 1944, 80), consubstanciado em perda de oportunidade ou de “chance” que fundamente a pretensão indemnizatória peticionada, não tendo minimamente ficado provado ou sequer sido alegado uma probabilidade séria de procedência das alegadas ações administrativas a apresentar e apresentadas tendo em vista a defesa dos alegados direitos invocados, que inexistem (v. arts. 483º e segs. e 798º e segs. do C. Civil; cfr. art. 342º do C. Civil) – Cfr. texto nºs 4 a 6; 3ª. O Recorrente não invocou ou demonstrou – como lhe competia (v. art. 342º do C. Civil) –, nem se verificam in casu os pressupostos de que dependeria a responsabilidade do R. pelos pretensos danos e prejuízos invocados (arts. 9º, 342º, 496º, 483º e segs., 562º a 566º, 798º e segs., do C. Civil), pelo que a douta Sentença recorrida não enferma de quaisquer erros de julgamento e não merece censura (v. arts. 9º, 342º, 473º e segs., 496º, 483º e segs., 562º a 566º, 570º, 592º e 798º e segs., do C. Civil) – Cfr. texto nºs 4 a 6.» Termina pugnando pela confirmação do saneador-sentença. 14.–O Recorrido Francisco Pessoa Leitão não apresentou alegações de resposta. 15.–No dia 15.10.2019, foi proferido despacho de admissão do recurso de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos, e com efeito devolutivo. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. * II–ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO Sendo o objeto do recurso balizado pelas conclusões do Recorrente, ressalvadas as questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal (artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do CPC), a solução a alcançar pressupõe a análise das seguintes questões: - Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia quanto aos factos alegados pelo Autor e por falta de fundamentação relativamente ao não prosseguimento da ação com a produção de prova, ao abrigo do artigo 615.º, n.º 1, alíneas b), c) e d), do CPC; - Do erro de julgamento quanto ao não prosseguimento da ação com a produção de prova em audiência final; - Do erro de julgamento na aplicação do regime da responsabilidade civil fundada em perda de chance, designadamente no que concerne à aplicação do regime jurídico previsto no Decreto-lei n.º 341/2007, de 12.10 (regime jurídico do reconhecimento de graus académicos superiores estrangeiros), quando conjugado com a Deliberação n.º 568/2009, da Direção-Geral do Ensino Superior. * III–FUNDAMENTAÇÃO Fundamentação de facto São os seguintes os factos considerados provados no saneador-sentença recorrido [aos quais acrescentámos o ponto n.º 25 e trechos das sentenças proferidas nos processos referidos nos pontos n.ºs 20 e 21, para melhor compreensão, ao abrigo do disposto nos artigos 607.º, n.º 4, e 663.º, n.º 2, do CPC]: 1- O Autor é militar no ativo dos Quadros Permanentes da Marinha, possuindo atualmente o posto de cabo (CAB) da classe de Fuzileiros, encontrando-se a prestar serviço na Escola de Fuzileiros de Vale de Zebro, em Palhais, Barreiro. 2- Em 18.9.2009, foi publicitada no Anexo J da Ordem da Direção do Serviço de Pessoal, 2.ª série, n.º 178 (OP2/178/18SET09), a abertura de concurso interno limitado para admissão ao Curso de Formação Complementar de Oficiais (CFCO), que habilitava ao ingresso, em 2009, na classe de Oficiais Técnicos Superiores Navais dos Quadros Permanentes (TSN-QP), nos termos que constam do documento junto a fls. 16v, cujo teor se dá por reproduzido. 3- No mesmo anexo, foi igualmente publicitada a abertura de concurso para admissão ao Curso de Formação Militar Complementar de Oficiais (CFMCO), que habilitava ao ingresso, em 2009, na classe de Oficiais do Serviço Técnico – ramo de Especialistas – dos Quadros Permanentes (STESP-QP), conforme documento junto a fls. 17 e 17v. 4- O concurso para admissão ao Curso de Formação Complementar de Oficiais destinava-se ao preenchimento, entre outras, de 1 (uma) vaga por militar habilitado com licenciatura obtida antes da adequação aos princípios do processo de Bolonha ou com o 2.º ciclo obtido depois da adequação ao processo de Bolonha em «Engenharia Geográfica», «Geografia», «Geologia», «Cartografia», «Ciências do Mar» ou «Oceanografia». 5- O concurso para admissão ao Curso de Formação Militar Complementar de Oficiais destinava-se ao preenchimento, entre outras, de 2 (duas) vagas por militares habilitados, no mínimo, com bacharelato obtido antes da adequação aos princípios do processo de Bolonha ou com o 1.º ciclo de estudos do ensino superior (licenciatura) obtido depois da adequação ao processo de Bolonha em «Engenharia Mecânica», «Engenharia e Gestão Industrial», «Engenharia dos Materiais» ou «Engenharia Naval». 6- Nos termos da alínea e) do parágrafo 2 do último aviso de abertura de concurso, 2 (duas) vagas seriam preenchidas por militares habilitados com bacharelato ou licenciatura em qualquer área de educação e formação, excetuando as áreas de técnicas de diagnóstico e terapêutica, enfermagem e música. 7- Em 24.9.2009, o Autor apresentou candidatura ao concurso de admissão ao CFCO 2009, na área de «Oceanografia», nos termos que constam do documento cuja cópia consta de fls. 18. 8- Em 24.9.2009, o Autor apresentou candidatura ao concurso de admissão ao CFMCO 2009, pretendendo concorrer, nos termos da alínea a) do parágrafo 2º do respetivo aviso de abertura, às vagas destinadas a «Engenharia dos Materiais» e nos termos da alínea e) do mesmo parágrafo, às vagas destinadas a «Engenharia Naval», «Engenharia Forense», «Engenharia Mecânica» ou «Design de Materiais», declarando estar habilitado como «Bacharel – Licenciatura de Bolonha em Engenharia e Design de Materiais», conforme consta do documento junto a fls. 18v. 9- No Anexo J da OP2/225/25NOV09, foram publicadas as listas dos candidatos admitidos e excluídos do concurso de admissão CFMCO 2009 e do concurso de admissão ao CFCO 2009. 10- Nos termos das listas publicadas relativamente ao CFMCO 2009, o Autor foi admitido ao concurso para o preenchimento das vagas estabelecidas na alínea e) do parágrafo 2, do aviso de abertura do concurso de admissão. 11- Nos termos das listas referentes ao CFCO 2009, o Autor foi notificado da intenção de o excluir do concurso de admissão por não se encontrar habilitado com as licenciaturas exigidas no aviso de abertura. 12- No Anexo J da OP2/019/28JAN10 foram publicadas as listas de ordenação e propostas de classificação final dos candidatos admitidos ao concurso de admissão ao CFMCO 2009, constando da ata da reunião de júri de seleção do concurso de admissão ao Curso Militar Complementar de Oficiais (CFMCO) que o Autor tinha obtido a classificação de 15,45 e que o mesmo não tinha sido apurado para o curso por as vagas a que concorreu já terem sido ocupadas por outros candidatos melhor classificados, nos termos que constam do documento junto de fls. 27 a 31 dos autos. 13- Nessa mesma reunião do Júri foi determinado que os candidatos fossem notificados para, querendo, se pronunciarem por escrito, no prazo de 10 dias. 14- Em 2.2.2010, o Autor foi pessoalmente notificado da proposta de classificação final dos candidatos ao CFMCO 2009, para efeitos de se pronunciarem por escrito no prazo de 10 dias. 15- Em 3.2.2010, o Autor emitiu pronúncia por escrito nos termos que constam de fls. 32v e 33, pedindo a reavaliação do apuramento das vagas e colocação dos candidatos à área A) e que lhe fosse reconhecida a validade da sua licenciatura de Bolonha. 16- Foi elaborada informação dirigida ao Júri sobre o teor da pronúncia do Autor em sede de audiência prévia nos termos que constam de fls. 40 a 42v, da qual conclui com a seguinte proposta: «Após reavaliação do currículo do candidato, indefere-se a sua pretensão de ser aceite às vagas estabelecidas nas alíneas a) e b) do número 2 do aviso de abertura do concurso de admissão ao Curso de Formação Militar Complementar de Oficiais 2009 por não possuir habilitação em “Engenharia Mecânica”, “Engenharia e Gestão Industrial”, “Engenharia dos Materiais”, “Engenharia Naval”, “Engenharia Mecânica”, “Engenharia e Gestão Industrial”, “Engenharia dos Materiais” ou “Engenharia Naval”». 17- Em 3.3.2010, o Júri de Seleção do concurso de admissão ao CFMCO 2009 deliberou por unanimidade indeferir a pretensão do Autor formulada em sede de audiência dos interessados, nos seguintes termos: «Após reavaliação do currículo do candidato, indefere-se a sua pretensão de ser aceite às vagas estabelecidas nas alíneas a) do número 2 do aviso de abertura do concurso de admissão ao Curso de Formação Militar Complementar de Oficiais 2009 por não possuir habilitação em “Engenharia Mecânica”, “Engenharia e Gestão Industrial”, “Engenharia dos Materiais” ou “Engenharia Naval”». 18- Em 24.3.2010, o Autor foi pessoalmente notificado da deliberação do Júri de Seleção do concurso de admissão ao CFMCO 2009 tomada sobre a pronúncia escrita emitida sobre a pronúncia escrita emitida pelo Autor em sede de audiência dos interessados. 19- O registo na Direção-Geral do Ensino Superior do Ministério da Educação e Ciência do diploma que titula o grau académico superior do Autor – grau de licenciado -, obtido no Reino Unido, foi efetuado em 11.1.2013. 20- Em 15.10.2013, o Autor intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra ação administrativa especial de impugnação de ato administrativo e de condenação em indemnização civil [com o n.º de processo 345/13.0BESNT], visando a deliberação de 3.3.2010 do júri do concurso de admissão ao curso de formação complementar de oficiais, ação essa na qual foi proferida sentença, já transitada em julgado, sentença essa que julgou procedente a exceção de caducidade do direito de ação do Autor e absolveu os Réus da instância. [Lê-se na fundamentação da referida sentença que: «8.2.3. Quanto à caducidade do direito de acção Pedem a caducidade do direito de ação do A o Estado-Maior da Armada, o Estado Português representado pelo MP, e o contrainteressado EM……. Essencialmente, todos assentam na circunstância de o A utilizar a arguição da nulidade, que defendem não existir, para poder dizer que está em tempo, quando o que alega sempre seria caso de vício de anulabilidade, arguível em três meses, e o A vir em 2013 impugnar o ato administrativo de 03/03/2010, - e actos consequentes – publicitado e de que foi pessoalmente notificado em 24/03/2010, bem como normas do procedimento concursal aberto em 2009, com violação do prazo de 3 meses, estabelecido no artigo 58-2-n), CPTA, a que adiciona um pedido de condenação em indemnização por danos morais e patrimoniais. 8.2.3.1. O Autor, no desiderato de forçar o tribunal a conhecer, mesmo que fora de prazo, supostos vícios de actos aparentemente inimpugnáveis, por consolidados na Ordem Jurídica, socorre-se do pedido de nulidade do acto deliberatório e atos subsequentes, e do pedido indemnizatório com base em acto “ilícito”, para poder continuar a impugnar os actos a todo o tempo e litigar em várias frentes, com a base na mesma causa de pedir, a seu contento. Deve dizer-se que a alegação de nulidade não vincula os tribunais. Se assim fosse estava encontrado o método, inaceitável [artigo 9, CC], de inutilizar o artigo 58-2-b), do CPTA.(…) A-Quanto à falta absoluta de fundamentação O pano de fundo de toda a argumentação do A, - nesta, como pelo menos na acção 981/12.1BENST –, é a questão de ter sido considerado que o A não possuía habilitação em “Engenharia Mecânica”, “Engenharia e Gestão Industrial”, “Engenharia dos Materiais” ou “Engenharia Naval”, como refere nos ponto 15 e 26, 28, 29 e 30, e depois em 67 e 67, da PI. O A alega,[67, 68, 72, da PI], em suma, que o dever de fundamentação está elevado pela CRP a direito fundamental, pelo que, nos termos do artigo 133-2-d), do CPA, o acto é nulo, porque ali se comina que são nulos os actos que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental. (…) No caso, como pode ver-se, o silogismo jurídico da decisão percebe-se perfeitamente. Também na acção 981/12.1BENSNT, que o A refere no ponto 33 da PI, o mesmo expõe a fundamentação do acto. Em 03/03/2010, perante os fundamentos do projecto de decisão, o autor pronunciou-se em sede de audiência prévia, nos termos acima referidos; em 01/03/2010, foi elaborada informação, dirigida ao Júri, como dela consta, a qual explana em 16 pontos e várias páginas a fundamentação, rebatendo, ponto por ponto, em concreto, os argumento do A, alegados em sede de audição prévia; e, em 03/03/2010, o Júri deliberou por unanimidade indeferir a pretensão do A formulada em audiência prévia, e decidir manter a exclusão do mesmo. O fundamento é claro e foi, em resumo, o de que o A não possuía a habilitação que reivindicava ter, obtida no estrangeiro, a saber a licenciatura naquelas áreas do concurso. É essa licenciatura aquela cujo reconhecimento o A pede na acção 981/12.1BESNT. Ora, mesmo que existisse falta de fundamentação, - e não existe-, tal facto constituiria um vício gerador de anulabilidade, como resulta dos artigos 163-1, ex vi 161-1-2-g) [anteriores 133-1-f)], do CPA, apenas gerando nulidade a absoluta falta de forma legal, o que não é o caso. (…) B-Quanto à alegada violação do núcleo essencial da igualdade e do acesso à função O A alega, de forma temerária, a violação do que chama o núcleo essencial do que diz ser o direito fundamental da igualdade e de acesso à função pública. Com isto quer o A concitar o princípio da igualdade e do direito de aceder à função pública; e, mais precisamente o que considera ser um seu direito subjectivo a aceder a oficial. Todavia, não se vislumbra, como pode, em face dos requisitos do concurso prévia e genericamente estabelecidos, em abstrato, para todo do qualquer concorrente, e, portanto, em plena igualdade de regras e requisitos, vir o Autor alegar que foi violado o princípio da igualdade e do acesso à função de oficial, por que não foi provido no concurso. Fica a ideia, outrossim, que, o que A pretende não é o respeito pelo princípio da igualdade ou o respeito pelo núcleo essencial do direito à igualdade e ao acesso ao posto de oficial, mas sim um tratamento privilegiado que lhe permita ser tratado de forma distinta dos demais, acedendo à função sem reunir os requisitos pré-estabelecidos para o concurso. E vai mais além, o que desde já se salienta, ao pretender que, se não puder ser colocado como oficial, [sem reunir os requisitos], então que se declarem inconstitucionais as normas do concurso e que seja indemnizado pelos danos patrimoniais e não patrimoniais, de modo a ficar, por via paralela, em situação de igualdade com os concorrentes que foram providos a oficiais no mesmo concurso de 2009, «até à data da reforma do A». Ora, claro está que o A pressupõe que reúne os requisitos, ou seja, que possuía uma licenciatura com as componentes exigidas para o concurso, que é o que lhe foi negado pelo júri e que constituiu a razão de ser fundamental para ser excluído. Mas o princípio da igualdade [artigo 13 da CRP] e o direito a não ser discriminado, neste sentido de ser tratado segundo aquele princípio, significa tratar por igual o que é igual e de modo diverso o que é diverso. O princípio da igualdade visa obstar a decisões arbitrárias. Mas, a nosso ver, o que o A pretende conduziria sim à arbitrariedade a seu favor. O artigo 47, da CRP, salvaguarda o direito geral, programático, de todos terem acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra, por via de concurso. Ou seja, não se trata de qualquer direito absoluto, e está sujeito aos limites e termos estabelecidos pela lei ordinária, como de resto é próprio dos direitos relativos. Como acima acabamos de referir, as regras foram pré estabelecidas, em abstrato, para abranger todos os concorrentes, partindo todos em pé de igualdade para o respetivo preenchimento dos requisitos do concurso por cada candidato ao mesmo. O Autor não preencheu tais requisitos, segundo o júri. Mas não se vê onde é que tenham sido violados quaisquer princípios constitucionais, - e também legais, consagrados desde logo nos artigo 3º/ss, do CPA-, que o Autor alega na PI. Como se pode ver, apesar de, na ação 981/12.1BESNT, do TAF de Sintra, pedir que lhe seja reconhecido o grau académico de licenciatura que o júri não reconheceu, o Autor vem também agora, [cfr 74 a 83/s da PI] discutir a mesma matéria, interpretação e aplicação do DL 341/2007, de 12/10, a deliberação 568/2009, o despacho 6431/2009, pretendendo sempre obter do tribunal, através do (ab)uso da agitação das nulidades, a fortiori, decorridos cerca de três anos após o conhecimento dos actos, os mesmos efeitos que poderia, eventualmente, ter obtido através da acção impugnação anulatória desses mesmos actos, se os tivesse impugnado. (…) C-Quanto à violação da boa-fé, nomeadamente, da tutela da confiança Tendo sempre por pano de fundo a circunstância de o Júri não lhe ter reconhecido a habilitação académica com as vertentes pedidas no concurso e obtida no estrangeiro, o Autor alega a violação pelo acto do júri, e actos subsequentes, dos princípios da boa-fé, nomeadamente, da tutela da confiança. O artigo 6-A do CPA, estabelece que «1.No exercício d aactividade aministratova e em todas as suas formas e fases, a Administração Pública e os particulares dvem agir e relacionar-se segundo as regras da boa-fé. 2. No cumprimento do disposto no número anterior, devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face das situações consideradas, e, em especial: i) A confirança suscitada na contraparte pela actuação em causa; b) O objectivo a alcançar com a actuação empreendida». (…) O Autor, salvo o devido respeito, mais uma vez alega em abstrato e de forma genérica, agora a propósito dos princípios da boa-fé e da tutela da confiança, a violação dos mesmos. Com efeito, e em termos concretos, o ponto que se lhe surpreende na alegação é o de que, no seu entender, o júri devia ter considerado o A detentor das valências e licenciatura em questão, e, todavia, não considerou. E é nisto, e praticamente só com base nisto, que o A multiplica argumentos, pedidos e supostas nulidades, que, todavia, não se vislumbra e não existem. (…) Se lhe vier a ser reconhecido na acção 981/12.1BESNT, o grau académico de licenciatura e com aquelas valências do concurso, isso é questão cuja lide está pendente e que aqui não pode ser dirimida. Todavia, como se pode ver, é com fundamento neste facto, relativo ao reconhecimento ou não da licenciatura, ao tempo e com as valências então exigidas pelo concurso, e praticamente só com base nisso, que radica toda a múltipla argumentação e crítica que o Autor assaca aos actos agora impugnados. (…) D/E-Finalmente, quanto à alegada violação da Diretiva 2005/36/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 07/09/2005; e quanto à alegada violação dos princípios da livre circulação de pessoas e serviços entre Estados-membros. O A alega [102, Pu que a Diretiva 2005/36/CE do Parlamento e do Conselho, de 07/09/2005, visou a abolição dos obstáculos à livre circulação de pessoas e serviços entre os Estados-membros, assim como o direito de exercer uma profissão num Estado-membro diferente daquele em que se tenham adquirido as respetivas qualificações profissionais, mediante o reconhecimento de qualificações académicas, entre elas a qualificação académica do Autor. E que, o DL 341/2007, de 12/10, aprova o regime do reconhecimento de graus académicos superiores estrangeiros [103/s, Pg. Portanto, [109, PI], conclui, todas as normas concursais, no sentido de excluírem o A, com o fundamento de não possuir habilitações académicas, deverão ser consideradas inconstitucionais. O princípio da livre circulação é, com se sabe, um dos pilares da EU. Não se percebe, todavia, o silogismo utilizado pelo A que, partindo da existência em abstrato daquele princípio, tira a conclusão de que todas as normas concursais que apontem no sentido de excluírem o A, com o fundamento de não possuir habilitações académicas, isto é, os requisitos do concurso a preencher, pré-estabelecidos para todos os concorrentes, devem ser consideradas inconstitucionais. O A não oferece, mais uma vez, qualquer concretização ou demonstração da alegada inconstitucionalidade, com base nestes preceitos, nem o tribunal a vislumbra. Assim, tal como acima, também aqui entendemos que, em face do alegado pelo A, nos pontos 100 a 109, nada mais há a dizer, a não ser que a alegação não tem cabimento. Em suma, não se verifica qualquer situação determinante da sanção da nulidade. (…) é manifesto que, quer se conte o prazo de 3 meses, ou 90 dias, da notificação do A, em 24/03/2010 ou da publicação em 2010, quando a presente acção deu entrada em juízo, a 15/03/2013, quase três anos após o conhecimento / notificação, as decisões agora impugnadas, já se tinham consolidado na Ordem Jurídica e, portanto, à data da propositura da presente acção, estava caducado o direito de acção de impugnação das mesmas. Em face de tudo o exposto, julgo procedente a excepção da caducidade do direito de acção do A, o que obsta ao prosseguimento do processo, quanto à impugnação do acto, e absolvo da instância os Réus e os Contra-interessados (…)»]. 21- Em 6.9.2012, o Autor intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra ação administrativa comum para reconhecimento de direitos e qualidades, [com o n.º de processo 981/12.1BESNT] nos termos do artigo 37.º, n.º 2, a) e b), do CPTA, formulando os seguintes pedidos: a)- Reconhecer, nos termos da legislação em vigor, o grau académico de licenciatura ao Autor, e, subsequentemente, fazê-lo constar no registo individual do Autor, e torná-la pública através da publicitação em Ordem do Pessoal n.º 2, emitida pela Direção do Serviço de Pessoal; b)- Reconhecer ao Autor o pleno direito a concorrer aos concursos de acesso à categoria de oficial para os quadros permanentes; c)- Permitir ao Autor o acesso ao próximo concurso de acesso ao Curso de Formação Militar de Oficiais (CPMCO) TSN, ou ao Concurso de Admissão ao Curso de Formação Complementar de Oficiais (CFCO), STESP, na qual seja requisito de acesso à licenciatura em Engenharia nas áreas de menção do Autor; d)- Mais se requer que, após a aceitação e a frequência do(s) Curso(s) a que o mesmo seja aceite e sujeito a seleção – e desde que o frequente e tenha nele aproveitamento -, sejam os seus efeitos, para fins de antiguidade e promoção, à data de final do(s) referido(s) Curso(s), retroagidos aos concursos de acesso ao Curso de Formação Militar de Oficiais (CFMCO) TSN, ou ao Concurso de Admissão ao Curso de Formação Complementar de Oficiais (CFCO), STESP, ambos de 2009. Em 3.5.2018, foi proferida sentença julgando a ação improcedente, sentença essa que transitou em julgado. [Consta da fundamentação da referida sentença que: «Em causa nos presentes autos acção de reconhecimento de direitos (de uma situação jurídica subjectiva), está a declaração jurisdicional da existência de um direito ou interesse legalmente protegido, de uma qualidade ou condição. O seu interesse processual, nos termos do artigo 39.º do CPTA, advém do fundado receio de que a Ré venha reiterar a posição que assumiu em concursos anteriores não reconhecendo a titularidade do grau de licenciado (alíneas B) e C) dos factos provados). O Autor alega ser titular do grau de licenciado e que a Ré não reconhece essa titularidade, ao ter-lhe recusado o acesso a dois concursos para admissão à categoria de oficiais (CFMCO e CFCO), partindo do pressuposto de que esse reconhecimento é imposto à Ré através da mera apresentação do documento comprovativo de esse grau ter sido conferido pela The Open University em Inglaterra, sem necessidade de qualquer procedimento por parte das entidades portuguesas com competência no âmbito do ensino superior. Sem razão, como se passará a explicitar. O reconhecimento de graus académicos superiores estrangeiros é efectuado nos termos do Decreto-Lei n.º 341/2007, de 12 de Outubro e o respectivo procedimento de registo consta da Portaria n.º 29/2008, de 10 de Janeiro (aprovou o Regulamento do Processo de Registo de Diplomas Estrangeiros). O reconhecimento consiste no procedimento em que a qualificação académica estrangeira é comparada a uma qualificação portuguesa relativamente ao nível. Distingue-se assim do procedimento de equivalência, em que a qualificação estrangeira é comparada em termos de nível mas também em termos de duração e conteúdo programático, fixando-se a área científica da equivalência (este procedimento é regulado pelo Decreto-Lei n.º 283/83, de 21 de Junho). O pedido do Autor respeita ao reconhecimento do grau académico de licenciado. Determina-se no artigo 4.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 341/2007 que, aos titulares de graus académicos conferidos por instituição de ensino superior estrangeira cujo nível, objectivos e natureza sejam idênticos aos dos graus de licenciado, mestre ou doutor conferidos por instituições de ensino superior portuguesas, é reconhecida a totalidade dos direitos inerentes à titularidade dos referidos graus. O reconhecimento do grau académico é concedido pela Comissão de reconhecimento a que se refere o art. 8º e com a composição aí prevista e os efeitos do reconhecimento dependem do registo prévio do diploma, nos termos do disposto no art. 10º/1 do referido Decreto-Lei n.º 341/2007. O registo pode ser feito numa Universidade Pública Portuguesa, na Direcção-Geral do Ensino Superior ou num Instituto Politécnico Público Português, nos termos do disposto no art. 11º. No acto de registo é ainda fixada a classificação na escala de classificação portuguesa, nos termos do disposto no art. 14º. Temos, assim, que o registo é condição de eficácia do reconhecimento do grau académico, nos termos enunciados. No caso dos autos, a matéria de facto nada revelou quanto ao reconhecimento do grau académico pela entidade competente mas demonstrou que o registo respectivo apenas ocorreu a 11.01.2013, após a propositura da acção (alínea D)). Considerando a disciplina enunciada, da qual decorre que o reconhecimento de graus académicos obtidos no estrangeiro não opera de forma automática (na certeza de que não foi alegado ou provado que vigorasse acordo internacional passível de afastar a disciplina do DL nº 341/2007, nos termos previstos no art. 5º) e está dependente de reconhecimento pela Comissão prevista no art. 8º e de registo por uma das entidades referidas no art. 11º do DL nº 341/2007; Considerando que à data da propositura da presente acção, não se encontrava reconhecido e registado pelas entidades competentes a grau académico que o Autor obteve em Inglaterra (alínea D) dos factos provados); Não podia a Ré ter reconhecido ao Autor a titularidade das habilitações académicas conferidas pelo grau que o Autor obteve no estrangeiro, uma vez que o mesmo não tinha sido objecto do competente reconhecimento e registo nos termos do DL nº 341/2007, devendo improceder a acção, na totalidade.»] 22- O 1.º Réu é advogado, com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados. 23- Entre a Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A. e a Ordem dos Advogados foi celebrado um contrato de seguro de grupo, temporário, anual, com início em 1.1.2012, do ramo de responsabilidade civil profissional, titulado pela Apólice n.º 0002866129, nos termos que constam das Condições Particulares, Especiais e Gerais cuja cópia consta de fls. 76 a 92v, dando-se o seu teor por integralmente reproduzido. 24- Através de tal contrato, a Ré Tranquilidade declarou assumir, entre outros, o risco resultante da «Responsabilidade Civil Profissional dos Advogados com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados em prática individual ou societária», com um limite de 150 000,00 € por sinistro. [acrescentado] 25– O Autor procurou os serviços jurídicos do Autor, em 25.3.2010, de molde a poder aceder ao Curso de Oficiais de Marinha, quer no: a)- Curso de Formação de Oficiais (CFCO), que habilitava ao ingresso na classe de Oficiais Técnicos Superiores Navais (TSN). b)- Curso de Formação Complementar de Oficiais (CFMCO) que habilitava ao ingresso na classe de oficiais – ramo de especialistas dos quadros permanentes (STESP-QP). Consta da motivação da decisão sobre a matéria de facto o seguinte: B)–Motivação «A factualidade referida no ponto 1- dos Factos Provados resultou demonstrada face ao acordo das partes, sendo que relativamente ao referido de 2- a 6- foi tido em consideração o teor dos documentos de fls 16v a 17v e quanto ao aludido em 7- e 8- o teor dos documentos de fls 18 e 18v, respectivamente. Relativamente ao referido em 9-, o tribunal formou a respectiva convicção com base no teor do documento de fls 19 e 19v e no que concerne ao aludido em 10- no teor do documento de fls 24 a 26. Para efeitos da prova dos factos plasmados em 11- foi considerado o teor do documento de fls 26v. Quanto ao aludido em 12- e 13-, a factualidade em causa resultou demonstrada face ao teor de fls 27 a 31 e em relação ao referido em 14- considerou-se o teor do documento de fls 31v. Os factos referidos em 15- ficaram provados face ao documento de fls 32v e 33, os aludidos em 16- por força do teor de fls 40 a 42v, os plasmados em 17- nos termos do documento de fls 43 a 44 e quanto ao constante do ponto 18- face ao teor de fls 44v. A factualidade referida em 19- resultou demonstrada por força do teor do documento de fls 45 e 45v, a plasmada em 20- por força da certidão de fls 385 a 399 e 404 e a referida em 21- por força da certidão de fls 417 a 424. Os factos referidos em 22- resultaram do acordo das partes e os aludidos em 23- e 24-do teor das Condições Particulares, Especiais e Gerais do Contrato de Seguro de fls 76 a 92v.». Apreciação do recurso Da nulidade da sentença ao abrigo do artigo 615.º, n.º 1, alíneas b), c) e d), do CPC a)- O Apelante alega que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre factos relevantes, incorrendo em omissão de pronúncia desde logo quando não considerou como provado que o Autor tenha contratado o 1.º Réu como seu advogado, no dia 25.3.2010, quando o próprio o afirma na sua contestação – artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC. Mais sustenta a nulidade da sentença no disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea c) e d), do CPC, considerando que o processo não prosseguiu para a audiência final, para se apurar se as negociações foram no sentido de o 1.º Réu intentar uma ação administrativa especial de impugnação, com fundamento em anulabilidade da deliberação de 3.3.2010 (notificada ao Autor em 24.3.2010), do júri de seleção do concurso de admissão ao curso de formação militar complementar de oficiais, bem como do despacho de concordância com esta deliberação. Considera ainda nula a sentença, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.ºs 1, alínea b), do CPC, dado que não especifica os concretos fundamentos a título de justificação da decisão proferida. Cumpre apreciar. b)- Nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do CPC, é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Trata-se de um vício formal, em sentido lato, traduzido em error in procedendo ou erro de atividade que afeta a validade da sentença. Só a absoluta falta de fundamentação – e não a sua insuficiência ou erroneidade – integra a previsão da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º, cabendo o putativo desacerto da decisão no campo do erro de julgamento (neste sentido, vide o acórdão do STJ, de 2.6.2016, p. 781/11, www.dgsi.pt). A não concordância da parte com a subsunção dos factos às normas jurídicas e/ou com a decisão sobre a matéria de facto de modo algum configuram causa de nulidade da sentença – cf. acórdão do TRL de 17.5.2012, p. 91/09, www.dgsi.pt. Ora, a assinalada falta ou insuficiente fundamentação do saneador-sentença é questão diversa, que não se confunde com qualquer nulidade da sentença prevista no artigo 615.º do CPC. O reparo do Apelante coloca-se, antes, no domínio da justificação da elaboração de um saneador-sentença, sem a subsequente produção de prova. No saneador-sentença recorrido decidiu-se do mérito da causa, absolvendo-se os Réus dos pedidos, com a seguinte justificação: Considerou-se que, «III. Tendo em conta o disposto no art. 595°, n°1, alínea b), do Código de Processo Civil e como se referiu na audiência prévia, cumpre, neste momento, conhecer directamente do pedido formulado pelo A. contra os RR., na medida em que os autos fornecem já todos os elementos para a decisão a proferir e as questões a decidir se encontram discutidas pelas partes.» Não estamos, obviamente, perante uma falta de fundamentação do saneador-sentença. Se a matéria de facto e o Direito foram precipitada ou incorretamente julgados, é questão que se prende com eventual erro de julgamento, pelo que deve improceder esta alegação de nulidade da sentença. c)- Preceitua o artigo 615.º, n.º 1, alínea c), do CPC que é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível. Ocorrerá uma contradição lógica entre os fundamentos e a decisão quando o julgador seguir determinada linha de raciocínio na fundamentação da sentença, apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decidir em sentido divergente. No que tange à obscuridade conducente à ininteligibilidade da decisão, ensinava Alberto dos Reis a este propósito que: «A sentença é obscura quando contém algum passo cujo sentido é ininteligível; é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes. Num caso não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos. É evidente que, em última análise, a ambiguidade é uma forma especial de obscuridade. Se determinado passo da sentença é suscetível de duas interpretações diversas, não se sabe, ao certo, qual o pensamento do juiz.» (Código de Processo Civil Anotado, V Volume, p. 151). A decisão judicial é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível e é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes. Como se escreveu no acórdão do STJ de 28.9.2006 (p. 06A2018, www.dgsi.pt), a ininteligibilidade da decisão não se reporta ao conteúdo ou mérito, mas à exteriorização formal do discurso quo tale, perfilando-se, nesta perspetiva, situações de ambiguidade expositiva, de obscuridade, de excessivo gongorismo impeditivo da univocidade ou, no limite, de meros lapsos de escrita. Voltando ao caso concreto, não vislumbramos qualquer ambiguidade ou obscuridade na decisão, pelo que improcede a nulidade invocada nesta parte, sendo a incompreensibilidade manifestada pelo Apelante dirigida antes a um potencial erro de julgamento. d)- O artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC dispõe que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Esta nulidade está diretamente relacionada com o artigo 608.º, n.º 2, do CPC, segundo o qual «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.» Neste circunspecto, há que distinguir entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos pelas partes. Citando Alberto dos Reis, «São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.» (in Código de Processo Civil Anotado, obra citada, p. 143). Ou seja, a omissão de pronúncia só sucede quando não haja pronúncia sobre pontos fáctico-jurídicos estruturantes da posição dos pleiteantes, nomeadamente os que se prendem com a causa de pedir, pedido e exceções e não quando tão só ocorre mera ausência de discussão das «razões» ou dos «argumentos» invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas. No que tange ao excesso de pronúncia (segunda parte da alínea d) do artigo 615.º do CPC), o mesmo ocorre quando o juiz se ocupa de questões que as partes não tenham suscitado, sendo estas questões os pontos de facto ou de direito relativos à causa de pedir e ao pedido, que centram o objeto do litígio. Feitas estas considerações gerais, vejamos a sua pertinência no caso concreto. O que o Apelante põe em causa é a ausência de pronúncia sobre a matéria fáctica relativa ao contrato de mandato celebrado, bem como sobre a interpretação e aplicação do direito aos factos provados. Ora, a omissão de factos ou a incorreta aplicação do Direito aos factos prende-se com a ocorrência de um erro de julgamento e não uma omissão ou um excesso de pronúncia. Tal nulidade não ocorre no caso em apreço como ressalta do explanado. Do erro de julgamento quanto ao não prosseguimento da ação com a produção de prova em audiência final a)- O Apelante argui que, não se tendo efetuado julgamento para produção de prova, fica por provar o que alegou na sua petição inicial, ou seja, que contratou os serviços do Réu FL...... em 25.3.2010. Mais argumenta que tal contrato se destinava a intentar uma ação administrativa especial de impugnação, com fundamento em anulabilidade, da deliberação de 3.3.2010 do júri de seleção do concurso de admissão ao curso de formação militar complementar de oficiais, bem como do despacho de concordância com esta deliberação. Alega ainda que o Tribunal incorreu em erro de julgamento quanto à matéria de facto e de Direito, impedindo a produção de prova sobres estes factos pelo motivo de não ter efetuado julgamento, os quais se revelavam de conhecimento essencial para sindicância da atuação profissional do 1º. Réu quanto ao Autor no âmbito da sua contratação por este. b)- Antes de mais, assiste razão ao Apelante quanto à prova por acordo do facto acrescentado ao elenco dos factos provados sob o ponto 25. Se é controvertido que tenha sido acordado entre as partes que a ação a intentar seria uma ação administrativa especial de impugnação, resultou provado por acordo, por falta de impugnação por banda dos Réus, nos termos dos artigos 574.º, n.º 2, 607.º, n.ºs 4 e 5, do CPC, que o Autor solicitou serviços jurídicos ao 1.º Réu, no dia 25.3.2010. Daí ter-se acrescentado tal facto, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 607.º, n.º 4, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, ambos do CPC. Perguntar-se-á: havendo matéria controvertida a dilucidar, será prematura a prolação de saneador-sentença? Como explicitam Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, «O juiz conhece do mérito da causa no despacho saneador, total ou parcialmente, quando para tal, isto é, para dar resposta ao pedido ou à parte do pedido correspondente, não haja necessidade de mais provas do que aquelas que já estão adquiridas no processo. Tal pode acontecer por inconcludência do pedido (…), procedência ou improcedência de exceção perentória (…) e procedência ou improcedência do pedido. Este conhecimento só deve ter lugar quando o processo contenha todos os elementos necessários para uma decisão conscienciosa, segundo as várias soluções plausíveis de direito e não apenas tendo em vista a partilhada pelo juiz da causa.» (Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 3.ª edição, Coimbra: Almedina, p. 659). A fundamentação das decisões judiciais, à luz do artigo 208.º da Constituição da República Portuguesa, assume duas funções: - uma, de âmbito endoprocessual, que visa impor ao juiz um momento de verificação e de controlo crítico da lógica da decisão, permitindo às partes o recurso da decisão com perfeito conhecimento da situação, e ainda colocar o tribunal de recurso em posição de expressar, com maior segurança, um juízo concordante ou divergente; - outra, de dimensão extraprocessual, que procura tornar possível um controlo externo sobre a fundamentação factual, lógica e jurídica da decisão, garantindo a transparência da decisão. A questão do julgamento antecipado da lide tem sido abordada pela jurisprudência dos tribunais superiores no sentido maioritário de só ser admissível «se o processo contiver, seguros, todos os elementos que possibilitem decisões segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, e não somente aqueles que possibilitem a decisão de conformidade com o entendimento do juiz do processo» – cf. acórdão do TRC de 21.1.2014 (p. 208/12.6TBVZL-A.C1, in www.dgsi.pt). Por outras palavras, «o estado do processo relevante para o efeito deve ser perspetivado na ótica do quadro das soluções de direito plausíveis, o que significa que, havendo factos controvertidos pertinentes para a apreciação de algumas daquelas soluções plausíveis, deve o processo prosseguir para necessária instrução e julgamento em audiência final» – cf. acórdão do TRL de 11.11.2014 (p. 505/10.5TVLSB. L1); cf., ainda, completando o périplo pelas Relações, os acórdãos do TRE de 8.3.2012 (p. 278/07.9 TBORQ.E1), do TRP de 5.12.2016 (p. 406/14.8TBMAI.P1) e do TRG de 5.1.2017 (p. 1703/15.0T8BCL.G1); na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, cf. o acórdão de 18.12.2012 (p. 1345/10.7TVLSB.L1.S1), todos consultados in www.dgsi.pt) – cf. Paulo Ramos de Faria, Relevância das Soluções Plausíveis da Questão de Direito na Enunciação dos Temas da Prova, texto de apoio da intervenção na ação de formação contínua do CEJ sobre Temas de Direito Civil e Processual Civil, de 28.4.2017, sob o terceiro subtema do políptico Perdidos na renumeração: cinco regimes que não sobreviveram à sucessão de Códigos de Processo Civil? – in https://elearning.cej.mj.pt/course/view.php?id=455. Numa breve resenha histórica, a possibilidade de julgamento imediato da causa no despacho saneador foi introduzida pelo Decreto n.º 18552, de 3.7.1930 (que desenvolve o processo comum sumário, criado pelo Decreto n.º 3, de 29.5.1907), nos seguintes termos: «Neste despacho deve também o juiz conhecer de todas as outras questões para cuja decisão o processo lhe ofereça os elementos necessários» (artigo 10.º, segunda alínea). Esta norma foi adquirida para o processo comum ordinário pelo n.º 4 do artigo 102.º do Decreto n.º 21287, de 26.5.1932. Prevendo-se inicialmente a decisão antecipada do juiz quando «o processo lhe ofereça os elementos necessários», entre 1962 e 1997 vigorou uma distinção entre os casos em que subsiste e aqueles em que não existe controvérsia sobre a questão de facto. Assim, no despacho saneador, o juiz devia «conhecer diretamente do pedido, se a questão de mérito for unicamente de direito e puder já ser decidida com a necessária segurança ou se, sendo a questão de direito e de facto, ou só de facto, o processo contiver todos os elementos para uma decisão conscienciosa». Com a reforma de 1995/1996, passou a vigorar uma fórmula aglutinadora também adotada pelo CPC de 2013: o juiz pode «conhecer imediatamente do mérito da causa, sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação, total ou parcial, do ou dos pedidos deduzidos». Afinal, em que circunstâncias o tribunal pode julgar antecipadamente improcedente a ação, encontrando-se controvertidos os factos que integram o único ou principal fundamento da demanda? Sendo incontroversa a questão de facto respeitante ao fundamento que corresponde à correta interpretação da lei, na abordagem que o tribunal superior faz da causa (acompanhando a posição do juiz a quo), e decidindo sem possibilidade de recurso sobre o mérito da causa, parece-nos apodítico que deve ser emitida pronúncia confirmatória sobre o fundo da causa (Paulo Ramos de Faria, obra citada, p. 12). Nesse caso, «é manifestamente desadequado sujeitar dezenas de intervenientes a uma atividade instrutória inútil e onerosa – envolvendo testemunhas, peritos e profissionais forenses, por exemplo –, quando o tribunal ad quem dispõe de total jurisdição para fazer valer definitivamente a sua solução para a questão de direito (…).» (Paulo Ramos de Faria, obra citada, p. 12). Porém, no caso dos autos não é tão linear este raciocínio. Para além de não estar vedado, em princípio, o recurso de revista, permanece por dilucidar matéria de facto controvertida relativa ao contrato de mandato celebrado e aos danos finais sofridos pelo Autor. Ora, o critério legal a utilizar para avaliar das possibilidades de antecipar a decisão deve ser objetivo e não subjetivo. Ainda que o julgador se considere habilitado a solucionar o diferendo, partindo apenas do núcleo de factos incontroversos, há que indagar se isso é suficiente perante outras soluções jurídicas carecidas de melhor maturação e de apuramento de factos controvertidos. De regresso à situação em apreço, à luz das considerações supra expendidas, não podemos deixar de repensar as questões problematizadas pelo Apelante. Por um lado, não há dúvida de que está por esclarecer a amplitude total do conteúdo do contrato celebrado e que foram impugnados todos os danos patrimoniais e não patrimoniais invocados. Por outro lado, parece-nos claro que o Tribunal a quo não prefigurou outras soluções plausíveis de Direito relativamente à não verificação da perda de chances, ante o esmagador material decisório recolhido, em face de duas sentenças proferidas nos Tribunais Administrativo e Fiscais de Sintra, transitadas em julgado. Repescamos aqui as palavras da sentença proferida no processo n.º 345/13.0BESNT, descrito no ponto 20 da factualidade provada: «O Autor, salvo o devido respeito, mais uma vez alega em abstrato e de forma genérica, agora a propósito dos princípios da boa-fé e da tutela da confiança, a violação dos mesmos. Com efeito, e em termos concretos, o ponto que se lhe surpreende na alegação é o de que, no seu entender, o júri devia ter considerado o A detentor das valências e licenciatura em questão, e, todavia, não considerou. E é nisto, e praticamente só com base nisto, que o A multiplica argumentos, pedidos e supostas nulidades, que, todavia, não se vislumbra e não existem. (…) Se lhe vier a ser reconhecido na acção 981/12.1BESNT, o grau académico de licenciatura e com aquelas valências do concurso, isso é questão cuja lide está pendente e que aqui não pode ser dirimida. Todavia, como se pode ver, é com fundamento neste facto, relativo ao reconhecimento ou não da licenciatura, ao tempo e com as valências então exigidas pelo concurso, e praticamente só com base nisso, que radica toda a múltipla argumentação e crítica que o Autor assaca aos actos agora impugnados. (…)». Está aqui bem enunciada a questão principal dos presentes autos. O que releva é a avaliação dos pressupostos da responsabilidade civil profissional do advogado, ora 1.º Réu, com base na figura da perda de chance, a qual só pode fundar-se, pela sua álea e incerteza, numa decisão de probabilidade séria ou considerável. No saneador-sentença, o Tribunal recorrido apontou para um panorama da jurisprudência nacional em que «a orientação dominante do Supremo Tribunal de Justiça tem sido restritiva, em particular, no domínio da perda de chances processuais fundada em violação dos deveres profissionais do advogado, ancorando-se na ideia de que “a mera perda de chance não tem, em geral, virtualidade jurídico-positiva para fundamentar uma pretensão indemnizatória, por contrariar o princípio da certeza dos danos e as regras da causalidade adequada”, só podendo ser atendida em situações pontuais e residuais, como aquelas em que ocorra a perda de um bilhete de lotaria, ou em que se seja ilicitamente afastado de um concurso, ou no caso de atraso de um diagnóstico médico que tenha diminuído substancialmente as possibilidades de cura de um doente – cfr Acórdão do STJ, de 26/10/2010, relatado pelo Exm.° Juiz Conselheiro Azevedo Ramos, no recurso de revista n.º 1410/04.0TVLSB.L1.S1, disponível na Internet – http://www.dgsi.pt/jstj. Assim, o douto acórdão do STJ, de 29/04/2010, relatado pelo Exm.º Juiz Conselheiro Sebastião Póvoas, no processo n.º 2622/07.0TBPNF.P1.S1, o qual pode ser consultado in www.dgsi, que versa sobre um caso de responsabilidade de advogado por deserção de um recurso interposto de uma sentença proferida em 1.ª instância, destaca como jurisprudência seguida por aquele Tribunal a dos seguintes arestos: - um de 9/02/2006 (06B016), a considerar a exigência de alegação e a demonstração de que “há uma forte probabilidade de a oportunidade se não voltar a repetir ou mesmo se perdeu definitivamente”; - dois, de 6/03/2007 (07-A138) e de 16/06/2009 (1623/03.1TCLRS. S1), a afastarem, na prática, a perda de chance por, tratando-se de casos de concursos públicos, dependeram de juízos de discricionariedade e de manifesta álea, tornando imprevisível a ocorrência do dano e assim afastando o nexo causal; - e outro de 22/10/2009 (409/09.4YFLSB), a concluir que a perda de chance não releva na vertente jurídica, “por contrariar o princípio da certeza dos danos e da causalidade adequada”. No citado aresto, considera-se que “a perda de chance mais não é do que uma oportunidade de obter uma futura vantagem patrimonial que se gorou”, tratando-se portanto de “imaginar ou prever a situação que ocorreria não fora o ilícito”, o que não se traduz num dano presente, “no sentido de se achar concretizado no momento da fixação da indemnização”, nem também, em rigor, num dano futuro “por não se inserir na definição do n.º 2 do artigo 564.º do CC, já que este tipo de dano tem de ser previsível, tendo-se como certa ou suficientemente provada a sua verificação, afastando-se os prejuízos eventuais, incertos ou hipotéticos”. Daí extrai-se que “a perda de oportunidade, não sendo um dano presente – imediato ou mediato -, só pode ser qualificado de dano futuro mas eventual e hipotético, salvo se a prova permitir com elevado grau de probabilidade, ou verosimilhança, concluir que o lesado obteria certo benefício não fora a chance perdida”. Do exposto, pode concluir-se que a orientação dominante da jurisprudência do STJ vai no sentido de que a perda de chances processuais não constitui um dano autónomo, na medida em que ofende os princípios de certeza do dano e da causalidade adequada, com ressalva das hipóteses em que a prova permita com elevado grau de probabilidade ou verosimilhança concluir que o lesado obteria certo benefício não fora a chance perdida.» Como veremos, há outras soluções plausíveis. Alguma jurisprudência tem vindo a perspetivar a perda de chance como dano autónomo. Todavia, outro trecho do saneador-sentença demonstra que foi efetuada esta ponderação: «Mas ainda que se defenda uma solução mais permissiva em termos da admissibilidade da ressarcibilidade do dano por perda de chance, nada nos permite concluir, com se referiu, que o A., devido à não interposição da acção para a qual diz ter mandatado o 1º R., tenha perdido a possibilidade de obter um resultado que lhe seria favorável. O direito ao ressarcimento com fundamento em perda de chance depende da avaliação que se faça da probabilidade da obtenção de uma vantagem e do lucro que o lesado teria alcançado se essa probabilidade se tivesse realizado. Refira-se ainda que, como se disse já, não se pode também descurar a margem de liberdade de actuação, inerente à autonomia profissional e independência técnica da intervenção forense e que são as exigências específicas próprias dum exercício profissional, designadamente em sede de competência (saber e experiência) e diligência, que fundamentam a responsabilidade de quem presta profissionalmente serviços. Pelos fundamentos referidos, os factos alegados não permitem concluir pela prática de facto ilícito, ainda que a título de negligência, imputável ao R., nem que a conduta do mesmo seja causa directa, determinante e necessária dos prejuízos alegadamente sofridos pelo A., pelo que o pedido formulado contra este tem que soçobrar.» Aqui se vê que o Tribunal recorrido equacionou também a solução de Direito mais permissiva do ressarcimento da perda de chance como dano autónomo. Assim, vislumbra-se à partida que não estamos perante um saneador-sentença precoce. Sem embargo, melhor aquilataremos da propriedade do decidido mediante a análise mais detalhada do enquadramento jurídico. Do erro de julgamento na aplicação do regime da responsabilidade civil fundada em perda de chance a)- O Autor intentou a presente ação com base na falta de cumprimento por parte da Ré dos serviços de advocacia que lhe solicitou. Ficou provado que foi indeferida a pretensão do Autor de ser aceite às vagas estabelecidas nas alíneas a) e b) do número 2 do aviso de abertura do concurso de admissão ao Curso de Formação Militar Complementar de Oficiais 2009 por não possuir habilitação em «Engenharia Mecânica», «Engenharia e Gestão Industrial», «Engenharia dos Materiais», «Engenharia Naval», «Engenharia Mecânica», «Engenharia e Gestão Industrial», «Engenharia dos Materiais» ou «Engenharia Naval». Mais se demonstrou que, em 3.3.2010, o Júri de Seleção do concurso de admissão ao CFMCO 2009 deliberou por unanimidade indeferir a pretensão do Autor formulada em sede de audiência dos interessados nos seguintes termos: «Após reavaliação do currículo do candidato, indefere-se a sua pretensão de ser aceite às vagas estabelecidas nas alíneas a) do número 2 do aviso de abertura do concurso de admissão ao Curso de Formação Militar Complementar de Oficiais 2009 por não possuir habilitação em “Engenharia Mecânica”, “Engenharia e Gestão Industrial”, “Engenharia dos Materiais” ou “Engenharia Naval”». Apurou-se que, em 24.3.2010, o Autor foi notificado pessoalmente da deliberação do Júri de Seleção do concurso de admissão ao CFMCO 2009 tomada sobre a pronúncia escrita emitida sobre a pronúncia escrita emitida pelo Autor em sede de audiência dos interessados. Mais se provou que, em 15.10.2013, o Autor intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra ação administrativa especial de impugnação de ato administrativo e de condenação em indemnização civil, visando a deliberação de 3.3.2010 do júri do concurso de admissão ao curso de formação militar complementar de oficiais, ação essa na qual foi proferida sentença, já transitada em julgado, que julgou procedente a exceção de caducidade do direito de ação do Autor e absolveu os Réus da instância. Lê-se na fundamentação da referida sentença que «(…) é manifesto que, quer se conte o prazo de 3 meses, ou 90 dias, da notificação do A, em 24/03/2010 ou da publicação em 2010, quando a presente acção deu entrada em juízo, a 15/03/2013, quase três anos após o conhecimento / notificação, as decisões agora impugnadas, já se tinham consolidado na Ordem Jurídica e, portanto, à data da propositura da presente acção, estava caducado o direito de acção de impugnação das mesmas. Em face de tudo o exposto, julgo procedente a excepção da caducidade do direito de acção do A, o que obsta ao prosseguimento do processo, quanto à impugnação do acto, e absolvo da instância os Réus e os Contra-interessados (…). O 1.º Réu aceitou representar o Autor como advogado. O tipo de vínculo jurídico que se desenha entre o Autor e o 1.º Réu é o de mandato, como vem prefigurado nos artigos 1157.º e ss. do Código Civil. Autor e 1.º Réu celebraram entre si um contrato de mandato, com representação, nos termos do qual este se obrigou a praticar, por conta e no interesse daquele, atos jurídicos inscritos no âmbito da sua atividade de advogado - artigo 1157.º do Código Civil. Quanto à natureza da responsabilidade do advogado, discute-se se a responsabilidade civil profissional do advogado é de natureza contratual, extracontratual ou mista, discussão que não é despicienda já que são diferentes os regimes em questões como, por exemplo, quanto ao ónus da prova (artigos 799.º e 487.º do Código Civil). Defendemos, conforme a maioria, a concorrência de ambas as responsabilidades, dado que o mesmo ato ou omissão do advogado pode constituir responsabilidade contratual ou extracontratual, havendo que fixar, em cada caso concreto, qual o regime jurídico a adotar (cf., neste sentido, Moitinho de Almeida, Responsabilidade dos Advogados, 1985, p. 13, Cunha Gonçalves, Tratado de Direito Civil, 1937, tomo XII, p. 762 e, entre outros, acórdão do STJ de 17.10.2006, p. 06A2723, em www.dgsi.pt.) Se o advogado não cumpre ou cumpre defeituosamente as obrigações que lhe advém do exercício do mandato que firmou com o constituinte, tacitamente ou com procuração, incorre em responsabilidade civil contratual para com ele; se o advogado praticou facto ilícito lesivo dos interesses do seu constituinte, já a sua responsabilidade civil para com o mesmo constituinte é extracontratual ou aquiliana. Vejamos, no caso, se os factos provados permitem assacar responsabilidade contratual ao 1.º Réu por incumprimento do contrato de mandato. Os pressupostos da obrigação de indemnizar no quadro da responsabilidade contratual são: - a violação ilícita de um direito ou interesse alheio; - o nexo de imputação do facto ao agente; - o dano; - o nexo de causalidade entre o facto e o dano (cf. artigos 562.º, 563.º, 564.º, n.º 1, 566.º 798.º, 799.º e 808.º, n.º 1, do Código Civil). Segundo o regime do contrato de mandato, o mandatário é obrigado, além do mais, a praticar os atos compreendidos no mandato segundo as instruções do mandante, a prestar as informações que este lhe peça relativas ao estado da gestão e a comunicar ao mandante, com prontidão, a execução do mandato ou, se não o tiver executado, a razão por que assim procedeu (artigo 1161.º do Código Civil). Tratando-se de mandatário forense, como é o caso, há que considerar as obrigações específicas do advogado para com o seu cliente, previstas no artigo 83.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26.1, em vigor à data dos factos (atualmente, está em vigor o EOA, aprovado pela Lei n.º 145/2015 de 9.9). De acordo com o artigo 83.º, n.º 1, do Estatuto da Ordem dos Advogados, constituem deveres do advogado, além do mais: «c) dar ao cliente a sua opinião conscienciosa sobre o merecimento do direito ou pretensão que este invoca, assim como prestar, sempre que lhe for pedido, informação sobre o andamento das questões que lhe forem confiadas; d) estudar com cuidado e tratar com zelo a questão de que seja incumbido, utilizando, para o efeito, todos os recursos da sua experiência, saber e actividade». Pelo contrato de mandato, o advogado fica, em regra, adstrito a uma obrigação de meios. Não se lhe impõe a obrigação de sair vitorioso da causa. O que lhe cumpre é representar o cliente em juízo, defendendo pela melhor forma possível os interesses que lhe confiou. Segundo o artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 3/99, de 13.1 (LOFTJ), em vigor à data dos factos (atualmente, artigo 12.º, n.º 3, da Lei n.º 62/2013, de 26.8), no exercício da sua atividade, os advogados gozam de discricionariedade técnica e encontram-se apenas vinculados a critérios de legalidade e às regras deontológicas próprias da profissão. O advogado goza de discricionariedade técnica na orientação a dar aos casos que lhe são confiados, pressupondo a lei que tem competência para tal, a qual lhe é dada pela sua presumida preparação técnico-jurídica, sendo certo que, além do mais, tem sempre a possibilidade e o dever de recusar o seu patrocínio quando, por qualquer motivo, não se julgue apto a assumi-lo. Cumpridos à partida os deveres específicos do advogado para com o seu cliente, é um dado assente que as opções que o advogado possa erigir como adequadas no exercício da sua função, perante o caso concreto, não poderão responsabilizá-lo, desde que o tenha feito conscientemente de harmonia com o que lhe é exigível, atenta a legislação aplicável e com a ponderação da jurisprudência e doutrina a eles atinentes. Não sendo o Direito à partida uma ciência exata, mas antes «do razoável», ter-se-á de aceitar como normal que sobre um determinado assunto possa haver divergências acerca da solução justa a conferir-lhe e das vias a trilhar nesse sentido. Seria absurdo exigir ao causídico, por exemplo, a previsão do entendimento de quem irá julgar o seu caso. De responsabilidade civil só poderá falar-se, pois, quando o mandatário judicial, obrigado a agir conscienciosamente na senda do objetivo alcançado, o deixe soçobrar por falta de empenhamento, traduzido v.g. em deficiência no estudo e acompanhamento dos respetivos termos e prazos processuais, ocorrência muitas vezes fundamental ao êxito de um pleito. O incumprimento ou o cumprimento defeituoso da prestação do 1.º Réu analisa-se pela omissão dos atos tendentes a produzir tal resultado ou na prática de atos inadequados à obtenção do desiderato pretendido. b)- Volvendo à situação em espécie, está provado que o 1.º Réu intentou uma ação administrativa especial de impugnação de deliberação de Júri no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra quando já se tinham consolidado na Ordem Jurídica as decisões impugnadas. Quando a ação deu entrada em juízo, a 15.3.2013, tinham decorrido quase três anos após o conhecimento pelo Autor da deliberação do Júri, logo se verificando a caducidade do direito de ação. Assim, como resulta do ponto 18 da factualidade provada, o Autor foi pessoalmente notificado em 24.3.2010 da deliberação do Júri de Seleção do concurso de admissão ao CFMCO 2009. Decorre ainda do ponto 25 dos factos provados que o Autor procurou os serviços jurídicos do Autor logo no dia 25.3.2010. Ora, nos termos do disposto no artigo 58.º, n.º 2, alínea b), e n.ºs 3 4, do Código do Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), salvo disposição em contrário, a impugnação de atos anuláveis tem lugar no prazo de 3 meses (n.º 2, alínea b). Mas antes da referida ação, o Autor, patrocinado pelo 1.º Réu, já intentara em 6.9.2012, uma ação administrativa comum para reconhecimento de direitos e qualidades, com o n.º de processo 981/12.1BESNT, ao abrigo do artigo 37.º, n.º 2, a) e b), do CPTA, conforme descrito no ponto 21 da factualidade provada. No saneador-sentença recorrido entendeu-se que os factos alegados não permitem concluir pela prática de um facto ilícito, ainda que a título de negligência, imputável ao 1.º Réu. Aqui discordamos do entendimento do Tribunal recorrido, que terá antecipado o conceito de perda de chance para o momento da apreciação da ilicitude da atuação do 1.º Réu. Na verdade, é possível cogitar se o 1.º Réu desrespeitou o referenciado artigo 83.º, n.º 1, alínea d), do Estatuto da Ordem dos Advogados, ao omitir um estudo mais cuidado e zeloso da questão que lhe foi confiada. Ao intentar uma ação administrativa especial de impugnação da deliberação do Júri apenas em 15.3.2013, precedida de uma ação administrativa comum de reconhecimento de licenciatura proposta em 6.9.2012, o 1.º Réu omitiu de forma negligente um acompanhamento zeloso do caso que lhe foi confiado. Podia e devia ter previsto a hipótese de se estar perante atos que padecem do vício da anulabilidade, pelo que a sua impugnação judicial está sujeita ao espartilho de um prazo consabidamente curto. Respigamos, a propósito, as palavras da sentença proferida no processo n.º 345/13.0BESNT 8.2.3.1: «O Autor, no desiderato de forçar o tribunal a conhecer, mesmo que fora de prazo, supostos vícios de actos aparentemente inimpugnáveis, por consolidados na Ordem Jurídica, socorre-se do pedido de nulidade do acto deliberatório e atos subsequentes, e do pedido indemnizatório com base em acto “ilícito”, para poder continuar a impugnar os actos a todo o tempo e litigar em várias frentes, com a base na mesma causa de pedir, a seu contento.» Assim, pode concluir-se, em sentido diverso da argumentação expendida na sentença em análise, que o 1.º Réu praticou um ato ilícito e culposo (cf. presunção de culpa prevista no artigo 799.º do Código Civil). Mas a dúvida maior reside noutra equação: será a atuação do 1.º Réu causa direta, determinante e necessária dos prejuízos alegadamente sofridos pelo Autor? c)- Cumpre aquilatar do nexo de causalidade entre a conduta negligente e os invocados danos. Seguindo o pensamento de Pessoa Jorge, os pressupostos da responsabilidade civil podem reconduzir-se essencialmente a dois: o ato ilícito e o prejuízo reparável, integrando-se o nexo de imputação no primeiro pressuposto e o nexo de causalidade no segundo (Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, Livraria Petrony, 1968, pp. 55-56). Não obstante os pressupostos indicados se apresentem de forma estanque e individualizada, a sua discriminação não afasta a sua permeabilidade. Nalguns casos, os pressupostos da responsabilidade civil interagem de forma dialética, presenciando-se o sistema móvel de que fala Wilburg (cf. R. Guichard Alves, A ideia de um sistema móvel, em especial no domínio da responsabilidade civil. Apresentação da tradução de Walter Wilburg «Desenvolvimento de um sistema móvel no Direito Civil», Revista Direito e Justiça, Vol. XIV, 2000, Universidade Católica, apud Patrícia Helena L. Cordeiro da Costa, in «Dano de Perda de Chance e a sua Perspectiva no Direito Português – Dissertação de Mestrado», Verbo Jurídico, p. 12). Segundo o artigo 562.º do Código Civil, «Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.» Por sua vez, nos termos do artigo 563.º do mesmo Código, «A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão». De harmonia com o artigo 564.º, n.º 1, do referido diploma, «O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão». Destes normativos legais perpassa uma ideia de certeza do dano. Júlio Gomes analisou este requisito da certeza do dano da seguinte forma: «Tradicionalmente exige-se, para que o dano seja ressarcível, que o mesmo seja certo (…). O dano meramente eventual não é ressarcível, porque falta o requisito da certeza. E é evidente que esta certeza é uma certeza apenas relativa, não absoluta: o lucro cessante nunca existiu, e não chegará a existir. “O critério é inevitavelmente influenciado pela capacidade imperfeita de prever os eventos em razão dos limites do conhecimento humano, sempre que se entra no campo do hipotético”. A propósito da demonstração da existência de um lucro cessante, a referência tradicional de que o dano deve ser certo não nos deve, pois, induzir em erro. O lucro cessante é, necessariamente, uma realidade hipotética que não chegou a verificar-se e se situa no domínio das probabilidades. Assim, a certeza da existência de um lucro cessante não pode nunca ser uma certeza matemática, mas será apenas uma certeza meramente relativa (…).» (Em Torno do Dano da Perda de Chance – Algumas Reflexões, em Studia Iuridica 91, Ars Iudicandi, Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor António Castanheira Neves, Volume II: Direito Privado, Coimbra Editora, 2008, pp. 291-292). E acrescenta que «a exigência que o dano seja certo é não apenas imposta pelo bom senso, mas é também necessária para a aplicação do princípio de que a indemnização não deve enriquecer o lesado. Mas esta exigência de certeza suscita sérias dificuldades, porque a vida social não é feita de certezas matemáticas. A certeza a que aqui se faz referência é apenas uma probabilidade suficiente. É este relativismo da certeza, que explica a possibilidade de reparar o dano futuro» (obra citada, p. 291, nota 7). Alinhamos com o entendimento de Luis Medina Alcoz, quando defende que o problema da perda de oportunidade diz respeito não à teoria da causalidade jurídica ou de imputação objetiva, mas à teoria da causalidade física (La Teoría de la Pérdida de Oportunidad – Estudio Doctrinal y Jurisprudencial de Derecho de Danos Público y Privado, Thomson – Civitas, Editorial Aranzadi, 2007, p. 264, apud Patrícia Helena L. Cordeiro da Costa, obra citada, p. 21). Para este Autor, uma hipótese de perda de oportunidade pode colocar-se quando não se logra a prova de que um determinado facto foi causa física de um determinado dano. Segundo esta perspetiva, a hipótese de oportunidade perdida coloca-se apenas quando o julgador, depois de aplicar as regras e critérios positivos que orientam e limitam a sua capacidade de valoração, não encontra um grau suficiente de probabilidade para optar pela hipótese segundo a qual o agente causou o dano. A questão que, de imediato, se coloca é, então, a de determinar qual é esse grau suficiente de probabilidade e quais são as regras ou critérios a que se deve recorrer para o calcular. Citando Patrícia Helena L. Cordeiro da Costa, «(…) em tese geral a doutrina da perda de chance propugna a concessão de uma indemnização quando fique demonstrado, não o nexo causal entre o facto ilícito e o dano final, mas simplesmente que as probabilidades de obtenção de uma vantagem, ou de evitamento de um prejuízo, foram reais, sérias, consideráveis.» (obra citada, p. 28). Tal como afirma Luis Medina Alcoz, «a perda de oportunidade apresenta-se em situações que podem qualificar-se tecnicamente de incerteza, onde a probabilidade causal se situa entre dois extremos: por um lado, o limiar de seriedade da chance, localizada na probabilidade nula ou irrelevante; por outro lado, o limiar da certeza da causalidade, situada na alta probabilidade. Através destes dois limiares, importa, pois, distinguir três tipos de hipóteses: - a perda de oportunidade genérica, imperfeita, simples ou comum, abaixo do limiar de seriedade da chance, e que não dá direito a qualquer reparação; - a perda de oportunidade superespecífica, superqualificada, ou perfeita, igual ou acima do limiar da certeza da causalidade, e que determina a afirmação do nexo causal entre o facto e o dano final; - a perda de oportunidade específica, qualificada, situada entre os dois limiares, e que pode dar lugar à actuação da doutrina da perda de chance. São os casos de chances sérias e reais, que expressam probabilidades consideráveis, malgrado serem insuficientes para efeito de afirmação do nexo causal.» (obra citada, pp. 316-317, apud Patrícia Helena L. Cordeiro da Costa, obra citada, p. 28). Também Rute Teixeira Pedro tem defendido de forma consistente a tutela autónoma reparatória das chances. Segundo esta Autora, ela «Representará uma defesa de segunda linha, que operará para garantir o funcionamento do instituto da responsabilidade civil (…). Ora, considerando a “«chance» perdida como um valor conexo a um bem do lesado”, não se exigirá, assim, que a chance, em si mesma, seja “susceptível de ser judicialmente accionada”, sendo suficiente que ela respeite “a um direito susceptível de se fazer valer judicialmente” (…). Desta forma, parece-nos que, entre nós, não se colocarão grandes dificuldades, quanto à subsunção no art. 483.º, dos comportamentos frustradores daquelas espécies de chances, nem quanto à sua consideração como danos juridicamente reparáveis. No que à responsabilidade contratual diz respeito, não se duvidará da relevância jurídica da violação das chances que constituem o objecto sobre que incide a prestação debitória (…)» (A Responsabilidade Civil do Médico – Reflexões sobre a Noção da Perda de Chance e a Tutela do Doente Lesado, Coimbra Editora, 2008, pp. 383-385; cf. ainda, da mesma Autora, Reflexões sobre a noção de perda de chance à luz da jurisprudência, ebook CEJ, Novos Olhares sobre a Responsabilidade Civil, Coleção Formação Contínua, outubro de 2018, pp. 185-210,in http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/civil/eb_ReponsCivil_2018.pdf). Acompanhando esta tese, verifica-se que o nexo causal entre o facto e o dano não deixa de ser reconhecido, sendo indemnizado não o dano final, mas o dano «avançado» constituído pela perda de chance. Este dano é, ainda, um dano certo, pois a chance foi irremediavelmente afastada por causa do ato do lesante. Ainda que possa ser apelidada de artifício, não deixa de ser um instrumento ao serviço da justiça, emoldurada pela lei, evidenciando-se a função reparatória da responsabilidade civil, sem descurar as suas funções preventiva e até punitiva. Nas palavras de Rute Teixeira Pedro, «(…) através da noção da perda de chance “faz-se «avançar» a incerteza do encadeamento causal dos acontecimentos – e, portanto, do âmbito do «an respondeatur» – para o da valoração dos danos – e, portanto, para o âmbito do «quantum respondeatur»”» (cf. Reflexões sobre a noção de perda de chance à luz da jurisprudência, ebook CEJ, obra citada, p. 192). Tem-se vindo a assistir a um crescimento muito acentuado da jurisprudência em que é debatida a ressarcibilidade do dano da perda de chance, com uma aceitação muito consistente da suscetibilidade de reparação de tal dano no que respeita à responsabilidade civil do advogado, propugnando-se o chamado «julgamento dentro do julgamento». A título de exemplo de decisões de Tribunais superiores em que se expressa a aceitação da ressarcibilidade da perda de chance por violação dos deveres na execução do mandato pelo advogado, destacamos os acórdãos do STJ de 30.11.2017 (p. 12198/14.6T8LSB.L1.S1), de 11.1.2017 (p. 540/13.1T2AVR.P1.S1), de 5.5.2015 (p. 614/06.5TVLSB.L1.S1), de 30.4.2015 (p. 338/11.1TBCVL.C1.S1), de 30.9.2014 (p. 739/09.5TVLSB.L2-A.DS1), de 1.7.2014 (824/06.5TVLSB.L2.S1), de 6.3.2014 (p. 23/05.3TBGRD.C1.S1), de 14.3.3013 (p. 78/09.1TVLSB.L1.S1), e de 5.2.2013 (p. 488/09.4TBESP.P1.S1), todos consultáveis em www.dgsi.pt. Chegados a este ponto, não podemos deixar de fazer referência a uma tese que centra a problemática da perda de chance no requisito do nexo de causalidade, rejeitando a tese da autonomia do dano. É sempre salutar o permanente revisitar dos requisitos da responsabilidade civil, à luz da evolução do Direito e da vida em sociedade. Num estudo denominado «Perda de chance revisitada : a propósito da responsabilidade do mandatário forense», Rui Cardona Ferreira analisa as teorias sobre o nexo de causalidade, designadamente as teorias da conditio sine qua non e da causalidade adequada, a teoria do escopo da proteção da norma violada e a teoria da conexão do risco, para concluir que «a indemnização pela perda de chance só pode ser construída, em termos dogmaticamente satisfatórios e quando esteja em causa um dano patrimonial, através da admissibilidade de uma modelação do critério de causalidade com base na ideia de criação ou elevação ilícita de um risco de materialização do dano final (o único, quanto a nós, a indemnizar, ainda que apenas parcialmente).» (p. 1325). A ideia de erigir o risco em critério de causalidade ou imputação, importada do Direito Penal, bebe na fonte histórica do Código Civil. Como nos dá conta o Autor (obra citada, pp. 1325-1326), no artigo 850.º do Anteprojecto do Código Civil, na sua versão extensa, Vaz Serra propôs um preceito com seis números, sob a epígrafe «nexo causal», do qual vale a pena reproduzir aqui os n.ºs 1 a 3, conforme segue: «1.- Não existe o dever de indemnização quando o facto, segundo a sua natureza geral e as regras da vida corrente, era indiferente para que surgissem danos da espécie dos produzidos, de sorte que, apenas por circunstâncias extraordinárias, se tornou tal facto uma condição dos mesmos danos. 2.- Não é necessário que o facto, tido como causa jurídica do dano, dê só por si lugar a este, bastando que seja condição do mesmo dano e satisfaça o requisito do parágrafo antecedente. 3.- O facto é indiferente para a produção do dano, quando, pela sua natureza geral, isto é, sem as qualidades desprovidas de importância jurídica e tida em conta a idoneidade das outras qualidades para a produção de um resultado como o que se verificou, segundo a experiência da vida, o perigo de que o dano se produza não é aumentado por esse facto, o qual também não altera os perigos actuais. Não se têm em consideração os aumento ou alterações tão pequenos que ninguém, em geral, conta com eles» (In Direito das obrigações — Anteprojeto (parte extensa), in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 100, pp. 342-343). Considera o Autor que «a opção do legislador por um determinado modelo de causalidade - entre nós, pela teoria da causalidade adequada -, além de dever ser sempre situada historicamente de modo a não impedir o progresso jus-científico, não pode, simplesmente, ter o efeito de isentar de responsabilidade certas áreas do ordenamento jurídico e da vida em sociedade» (obra citada, p.1326). Também Mafalda Miranda Barbosa tem aprofundado estudos sobre a causalidade, adotando a teoria das esferas de risco também para a abordagem da problemática da perda de chance – cf., entre outros, «Novas perspetivas em torno da causalidade na responsabilidade médica», ação de Formação Contínua do CEJ sobre Responsabilidade Civil Médica, 16.12.2016, in https://elearning.cej.mj.pt/course/view.php?id=435, e «Do nexo de causalidade ao nexo de imputação», ebook CEJ, Novos Olhares sobre a Responsabilidade Civil, Coleção Formação Contínua, outubro de 2018, pp. 41-78, in http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/civil/eb_ReponsCivil_2018.pdf. Rui Cardona Ferreira alerta, porém, para o facto de o abaixamento da fasquia da causalidade para limiares inferiores aos que subjazem à teoria da causalidade adequada, segundo o entendimento tradicional do artigo 563.º do Código Civil, dever ser rodeado dos necessários cuidados, apelando para a necessidade de prova por parto do lesado de uma considerável probabilidade de obtenção de ganho de causa na ação originária que se frustrou, não fora a falta cometida pelo mandatário forense (obra citada, p. 1328). Ora, seguindo a tese da teoria da conexão do risco ou das esferas de risco, a solução sempre seria a mesma in casu, pois falharia sempre o requisito da probabilidade considerável e séria de obtenção pelo ora Autor de ganho de causa na ação que se frustrou e, consequentemente, de progressão na carreira. Descendo ao caso concreto, à luz das considerações expendidas, adotando a tese da admissibilidade da indemnização pela perda de chance, verifica-se que entre o limiar de seriedade da chance, localizada na probabilidade nula ou irrelevante e o limiar da certeza da causalidade, situada na alta probabilidade, não detetamos no caso uma situação intermédia de «chances sérias e reais, que expressam probabilidades consideráveis». Nada nos permite concluir que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra teria reconhecido a anulabilidade da deliberação que determinou a exclusão do Autor do concurso em causa, e que lhe permitiria a frequência de um curso com vantagens de progressão na carreira, caso a ação de impugnação tivesse sido proposta atempadamente. A deliberação do júri do concurso foi no sentido de, após reavaliação do currículo do candidato, indeferir a pretensão do candidato de ser aceite às vagas estabelecidas nas alíneas a) do número 2 do aviso de abertura do concurso de admissão ao Curso de Formação Militar Complementar de Oficiais 2009, por não possuir habilitação em «Engenharia Mecânica», «Engenharia e Gestão Industrial», «Engenharia dos Materiais» ou «Engenharia Naval». O Autor invoca que detém o grau de licenciatura, ao abrigo do processo de Bolonha, tendo-se licenciado na área das engenharias (estudos gerais de engenharia) pela Open University de Inglaterra, instituição idónea e reconhecida pelo Estado Português. Mas não se pode confundir «Estudos Gerais de Engenharia», com as concretas áreas da Engenharia que faziam parte dos requisitos da candidatura. Acresce que o registo na Direção-Geral do Ensino Superior do Ministério da Educação e Ciência do diploma que titula o grau académico superior do Autor – grau de licenciado –, obtido no Reino Unido, só foi efetuado em 11.1.2013, ou seja, mais de três anos depois de se ter candidatado. Estabelece o artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 341/2007, de 12.10, que: «Aos titulares de graus académicos conferidos por instituição de ensino superior estrangeira cujo nível, objectivos e natureza sejam idênticos aos dos graus de licenciado, mestre ou doutor conferidos por instituições de ensino superior portuguesas, é reconhecida a totalidade dos direitos inerentes à titularidade dos referidos graus». O reconhecimento do grau académico é concedido pela Comissão de Reconhecimento referida no artigo 8.º do diploma em causa, estabelecendo o artigo 10.º, n.º 1, do referido Decreto-Lei que «A produção dos efeitos do reconhecimento depende do registo prévio do diploma». O registo pode ser feito numa Universidade Pública Portuguesa, na Direção-Geral do ensino Superior ou num Instituto Politécnico Público Português, nos termos do disposto no artigo 11.º. No ato de registo é ainda fixada a classificação na escala de classificação portuguesa, nos termos do disposto no artigo 14.º. Do exposto se conclui que o registo é condição de eficácia do reconhecimento de graus académicos obtidos no estrangeiro, não operando tal reconhecimento de forma automática. Aliás, dos factos alegados pelo Autor não resulta que vigorasse acordo internacional passível de afastar a disciplina do Decreto-Lei em apreço - vide artigo 5.º do aludido diploma. Esta é a argumentação do saneador-sentença recorrido, o qual seguiu de perto a sentença proferida a 3.5.2018, no processo n.º 981/12.1BESNT, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra. O Apelante argui ainda que não foi tida em consideração a Deliberação n.º 568/2009, da Direção-Geral do Ensino Superior do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Consta da referida Deliberação de 19.2.2009, o seguinte: «O Decreto-Lei n.º 341/2007, de 12 de Outubro, vem regular o reconhecimento de graus académicos superiores estrangeiros, e alargar o sistema, já anteriormente adoptado para o grau de doutor, através do Decreto-Lei 216/97, de 18 de Agosto, aos graus de licenciado e mestre. Deste modo, a presente deliberação pretende afastar um obstáculo importante à circulação de diplomados, assente no princípio do reconhecimento mútuo. Dada a particularidade do sistema de atribuição de graus verificada no Ensino Superior no Reino Unido, tornou -se necessário analisar as suas especificidades no que concerne à sua adequação aos graus atribuídos em Portugal, nos termos do exposto no Decreto-Lei n.º 74/2006, de 24 de Março, alterado pelo Decreto-Lei n.º 107/2008, de 25 de Junho. Assim, e na sequência de consulta efectuada junto das entidades competentes, entende a Comissão de Reconhecimento de Graus Estrangeiros aprovar o seguinte: Deliberação genérica n.º 6 1 — São reconhecidos com nível, objectivos e natureza idênticos ao grau de licenciado e mestre os graus constantes da seguinte tabela: Grau Portugal/Graus pós-Bolonha Bachelor with honours 1.º Ciclo — Licenciatura MA (Ordinary MA) — Escócia Master’s Degree 2.º Ciclo — Mestrado Master of Philosophy 2 — Não são abrangidos pela presente deliberação os graus efectuados em regime de franquia, entendendo -se por franquia, para efeitos da presente deliberação, o regime pelo qual instituições de ensino superior outorgam graus académicos em territórios exteriores ao país em que são desenvolvidos. 3 — A presente deliberação vem revogar, no que se aplica ao Reino Unido, a deliberação Genérica n.º 2, constante da deliberação n.º 2430/2008, publicada na 2.ª Série do Diário da República, de 9 de Setembro.» Ressalta da análise da presente deliberação que a sua previsão se reporta ao reconhecimento de equivalências com o Reino Unido, não consagrando um regime especial que afaste as exigências do reconhecimento de grau académico obtido no estrangeiro e do registo como condição de eficácia desse reconhecimento, nos termos previstos nos artigos 4.º, 8.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 341/2007. Não operando tal reconhecimento de forma automática nem sequer se poderia concluir, à data em que o Autor se candidatou, que possuía uma licenciatura. Ademais, é de relevar na apreciação do presente recurso o destino de uma terceira ação: a ação administrativa comum para reconhecimento de direitos e qualidades, intentada nos termos do artigo 37.º, n.º 2, a) e b), do CPTA, em que o Autor, patrocinado pelo 1.º Réu, peticionava o reconhecimento do grau académico de licenciatura do Autor e o subsequente registo individual e publicitação. Lê-se na referida sentença que: «Considerando que à data da propositura da presente acção, não se encontrava reconhecido e registado pelas entidades competentes a grau académico que o Autor obteve em Inglaterra (alínea D) dos factos provados); Não podia a Ré ter reconhecido ao Autor a titularidade das habilitações académicas conferidas pelo grau que o Autor obteve no estrangeiro, uma vez que o mesmo não tinha sido objecto do competente reconhecimento e registo nos termos do Dl nº 341/2007, devendo improceder a acção, na totalidade» (ponto 21.º da factualidade provada). Conclui o Autor na alínea M) das alegações que é membro da categoria superior em instituições de engenharia estrangeiras, como é o caso da Royal Institution of Naval Architects de Inglaterra e na Society of Naval Architects and Marine Engineers dos Estados Unidos da América e, com as mesmas habilitações académicas que tinha em 2008, inscreveu-se, sem mais, na Ordem dos Engenheiros portuguesa, Região Sul, em Portugal, tendo sido aceite a sua inscrição por esta Ordem Profissional. Como é óbvio, estes factos não são suscetíveis de, por si, atribuírem os direitos que o Autor reclama. Sob a conclusão da alínea U), o Apelante sustenta que a atuação do júri do concurso no âmbito do procedimento concursal da Marinha Portuguesa fez incorrer a deliberação de exclusão do Autor do mesmo em diversas ilegalidades, nomeadamente, em vício de violação de lei, na violação do princípio da igualdade, do princípio da igualdade de tratamento e acesso à função pública e do princípio da tutela da confiança, mais sendo as normas regulamentares daquele concurso, de que o Autor foi excluído, inconstitucionais, o que deveria ter sido alegado na altura pelo 1º. Réu. junto do Tribunal competente. Aqui não podemos deixar de reproduzir mais uma vez um excerto da sentença proferida no processo n.º 345/13.0BESNT: «Como acima acabamos de referir, as regras foram pré estabelecidas, em abstrato, para abranger todos os concorrentes, partindo todos em pé de igualdade para o respetivo preenchimento dos requisitos do concurso por cada candidato ao mesmo. O Autor não preencheu tais requisitos, segundo o júri. Mas não se vê onde é que tenham sido violados quaisquer princípios constitucionais, - e também legais, consagrados desde logo nos artigo 3º/ss, do CPA-, que o Autor alega na PI. Como se pode ver, apesar de, na ação 981/12.1BESNT, do TAF de Sintra, pedir que lhe seja reconhecido o grau académico de licenciatura que o júri não reconheceu, o Autor vem também agora, [cfr 74 a 83/s da PI] discutir a mesma matéria, interpretação e aplicação do DL 341/2007, de 12/10, a deliberação 568/2009, o despacho 6431/2009, pretendendo sempre obter do tribunal, através do (ab)uso da agitação das nulidades, a fortiori, decorridos cerca «de três anos após o conhecimento dos actos, os mesmos efeitos que poderia, eventualmente, ter obtido através da acção impugnação anulatória desses mesmos actos, se os tivesse impugnado. (…)» No mais, remetemos para a transcrição mais extensa que consta do ponto 20 da factualidade provada. Todos os argumentos do Autor foram rebatidos na sentença proferida no processo n.º 981/12.1BESNT, não obstante o apelidado «(ab)uso da agitação das nulidades». Foram afastados os vícios da inconstitucionalidade, ilegalidade e nulidade invocados pelo Autor. Deste modo, conclui-se que, ainda que o 1.º Réu tivesse intentado atempadamente a ação de impugnação com fundamento na anulabilidade da deliberação do Júri, inexistiria uma probabilidade séria de procedência da ação e da consequente oportunidade de progressão do Autor na carreira. Perante o exposto, é de concluir que, segundo as várias soluções plausíveis de Direito, não se verifica no caso em apreço a perda de chances, o que faz cair por terra o fundamento da responsabilidade civil profissional do 1.º Réu e considerar adequada a prolação de saneador‑sentença. d)- Em face dos fundamentos de facto e de Direito supra explanados, a apelação do Recorrente deve improceder e, em consequência, o saneador-sentença recorrido deve ser confirmado, ainda que com fundamentação diversa no que concerne à verificação in casu dos requisitos da ilicitude e da culpa. Vencido o Recorrente, é responsável pelo pagamento das custas processuais do recurso – cf. artigos 527.º, n.º 1, 529.º, 607.º, n.º 6, e 663.º, n.º 2, do CPC. * IV–DECISÃO Nestes termos, acordam os Juízes da 2.ª Secção deste Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar o saneador-sentença recorrido, com fundamentação diversa. Mais se decide condenar o Apelante no pagamento das custas do recurso. * Lisboa, 21 de novembro de 2019 (Gabriela Cunha Rodrigues) (Arlindo Crua) (António Moreira |