Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | PEDRO JOSÉ ESTEVES DE BRITO | ||
Descritores: | ALTERAÇÃO NÃO SUBSTANCIAL DOS FACTOS DILIGÊNCIA PROBATÓRIA NULIDADE SANÁVEL CONTRADIÇÃO INSANÁVEL PROVA PROIBIDA MEDIDA DA PENA | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/22/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROVIDO | ||
Sumário: | I. O requerimento probatório que o arguido efetue na sequência da comunicação de uma alteração não substancial de factos (cfr. art.º 358.º, n.º 1, do C.P.P.) tem que se cingir aos factos objeto daquela comunicação e apresentar justificação bastante que permita concluir pela necessidade da produção da prova suplementar requerida, para que possa ser devidamente escrutinada a sua admissibilidade (cfr. art.º 340.º, n.ºs 1 e 4, do C.P.P.); II. Correspondendo o essencial a um grau mais exigente que o necessário, ao se indeferir a realização de uma diligência probatória por a mesma ser irrelevante, supérflua e até inadequada (cfr. art.º 340.º, n.º 4, als. b) e c), 1.ª parte, do C.P.P.), quer por referência ao objeto circunscrito ao facto novo comunicado (cfr. art.º 358.º, n.º 1, do C.P.P.), quer por referência ao objeto do processo (cfr. art.º 339.º, n.º 4, do C.P.P.), não é cometida a nulidade de omissão de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade (cfr. art.º 120.º, n.º 1, al. d), do C.P.P.), dado que não se verificando o requisito da necessidade (cfr. art.º 340.º, n.º 1, do C.P.P.), muito menos se verificava o da essencialidade. III. Contrariamente ao que acontece quanto às nulidades de sentença, as quais devem ser arguidas em recurso (cfr. art.º 379.º, n.º 2, do C.P.P.), a nulidade de omissão de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade (cfr. art.º 120.º, n.º 1, al. d), do C.P.P.), porque respeitante à prova a produzir em audiência de julgamento e dependente de arguição, tem que ser arguida antes do encerramento da produção da prova (cfr. art.º 360.º, n.º 1, do C.P.P.), ou seja, antes das alegações orais, na medida em que se trata de nulidade cometida em ato ao qual o recorrente assistiu (cfr. art.º 120.º, n.º 3, al. a), do C.P.P.), sob pena de se considerar sanada. IV. A contradição insanável entre factos provados, integrando o vício previsto no art.º 410.º, n.º 2, al. b), do C.P.P., ocorrerá quando, do próprio texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, resultar que se foram dados como provados dois ou mais factos que manifestamente não podem estar simultaneamente provados pois são contraditórios entre si, de modo a que apenas um ou alguns deles poderão persistir, sendo tal incompatibilidade insuscetível de ser ultrapassada através da própria decisão recorrida. V. No caso da fundamentação a que alude o art.º 374.º, n.º 2, do C.P.P., só existe a nulidade prevista no art.º 379.º, n.º 1, al. a), do C.P.P., por violação daquele preceito legal, se houver uma falta absoluta de tal fundamentação e não uma fundamentação meramente deficiente. VI. Salvo quando a lei dispuser de modo diferente (cfr. arts. 93.º, 139.º, n.º 1, do C.P.P. e 503.º, n.º 2, do C.P.C.), a prestação de quaisquer declarações processa-se por forma oral, não sendo autorizada a leitura de documentos escritos previamente elaborados para aquele efeito (cfr. art.º 96.º, n.º 1, do C.P.P.). VII. É prova proibida uma folha A4, escrita a computador e não assinada, incorporada no inquérito após ter sido entregue por uma testemunha, com capacidade de ouvir e falar e que não tem a prerrogativa de depor por escrito, no ato processual destinado à sua inquirição para que o seu depoimento fosse apenas e tão só o conteúdo daquela. VIII. Se o tribunal recorrido valorou tal meio de prova, a sentença recorrida está, nessa parte, ferida de nulidade, impondo-se que seja expurgada aquela valoração. IX. Não é necessária a intervenção do tribunal recorrido para reformular o raciocínio lógico-dedutivo com base apenas na prova permitida quando, atendendo à concreta relevância que a indevida valoração da prova proibida teve no raciocínio efetuado, se constatar que a mesma foi irrelevante para concluir pela verificação dos factos que se consideraram provados, tendo sido tão só utilizada para, juntamente com outros meios de prova válidos, credibilizar o depoimento oral prestado pessoalmente em audiência de julgamento por aquela testemunha. X. Um auto de denúncia/queixa é um ato processual que documenta a comunicação da ocorrência de um facto a uma entidade (denúncia) e a manifestação de vontade de haver processo (queixa) que, por força da autoridade pública que lhe é inerente, operada através da remissão do art.º 99.º, n.º 4, do C.P.P. para o art.º 169.º do C.P.P., atesta que foi realizada a denúncia/queixa nas circunstâncias de tempo e lugar nele exaradas, pela pessoa que aí está identificada e com a indicação dos factos nele narrados (cfr. arts. 99.º, 169.º e 246.º do C.P.P.), pelo que a aptidão do auto para provar factos apenas se reporta à materialidade praticada por aquele que exarou o auto, no caso, desde logo o que ouviu, mas não prova o crime em si mesmo. XI. O tribunal de recurso apenas deverá intervir alterando a medida das penas concretas em casos de manifesta desproporcionalidade na sua fixação ou quando os critérios de determinação da pena concreta imponham a sua correção, atentos os parâmetros da culpa e da prevenção em face das circunstâncias do caso. | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | I. Relatório: I.1. Das decisões recorridas: I.1.A. Da sentença recorrida: No âmbito do processo comum singular n.º 1077/19.0S5LSB, que corre termos no Juízo Local Criminal de Loures - Juiz 4, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, em 23-06-2023 foi proferida e depositada sentença, cujo dispositivo é do seguinte teor: “I – Parte Criminal a) Condenar o arguido, ..., pela prática em autoria material e na forma consumada, de um (1) crime de ofensa à integridade física simples (sobre a ofendida AA), previsto e punido pelos Arts.º 143º nº 1 do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 15,00 (quinze euros); b) Condenar o arguido, ..., pela prática em autoria material e na forma consumada, de um (1) crime de ofensa à integridade física simples (sobre o ofendido BB), previsto e punido pelos Arts.º 143º nº 1 do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 15,00 (quinze euros); c) Em cúmulo jurídico das penas parcelares acima aludidas e nos termos previstos pelos Arts.º 30.º, n.º 1 e 77.º do Código Penal, condenar a mesma arguida na pena global e única 160 (cento e sessenta) dias de multa, à taxa diária de €15,00 (quinze euros), no montante global final de €2.400,00 (dois mil e quatrocentos euros), convertíveis em até 106 (cento e seis) dias de prisão subsidiária, caso não efectue, culposamente, o seu pagamento voluntário ou coercivo (cfr. Art.º 49º, n.º 1 do Código Penal) e/ou nada requeira ou justifique; (…) II – Parte Civil e) Julgar o pedido de indemnização cível deduzido pelo demandante civil, CC, totalmente procedente, por provado, e consequentemente, condenar o arguido e demandado a pagar ao demandante cível a quantia global de €294,64, (duzentos e noventa e quatro euros e sessenta e quatro cêntimos), por conta da assistência médica prestada aos ofendidos, acrescida dos respectivos juros moratórios à taxa legal civil, desde a notificação do pedido cível e até integral pagamento, como peticionado;” I.1.B. Dos despachos recorridos: I.1.B.a. Do despacho de 19-06-2023: Em 19-06-2023 foi proferido despacho que, para além do mais, considerou “desnecessária nova admissão” quanto à documentação apresentada pelo arguido em 16-06-2023, por entender que já constava dos autos. I.1.B.b. Do primeiro despacho de 20-06-2023: Em 20-06-2023 foi proferido despacho que, para além do mais, não admitiu a junção aos autos de parte dos documentos apresentados pelo arguido em 16-06-2023. I.1.B.c. Do segundo despacho de 20-06-2023: Em 20-06-2023 foi igualmente proferido despacho em que indeferiu a arguição de nulidade efetuada pelo arguido relativamente ao despacho de 19-06-2023 (cfr. I.1.B.a.) e àquele outro despacho de 20-06-2023 (cfr. I.1.B.b.). I.2. Dos recursos: I.2.A. Do recurso interlocutório: Inconformado com os despachos de 19-06-2023 (cfr. I.1.B.a.) e 20-06-2023 (cfr. I.1.B.b. e I.1.B.c.), o arguido ... deles interpôs recurso em 04-09-2023, extraindo da motivação as seguintes conclusões: “1. Nos presentes autos foi o aqui Recorrente acusado pela prática de dois crimes de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143.º, n.º 1 do C.P. Na audiência de discussão e julgamento de 06.06.2023, o Tribunal recorrido comunicou uma alteração de factos, nos termos exarados em ata. 2. Face à alteração dos factos descritos na acusação, nomeadamente, à existência de menção a pontapés – facto que não existia na acusação – a defesa do Recorrente requereu prazo para exercer o seu direito de defesa, ao abrigo do n.º 1 do art.º 358.º do C.P.P.. 3. O Tribunal recorrido concedeu à defesa do Recorrente prazo de dez dias para exercer o seu contraditório, e nesta senda, o Recorrente apresentou a 16.06.2023, requerimento ao abrigo do art.º 358.º, n.º1 do C.P.P., no qual requereu a junção de dois documentos, um contendo fotografias e documentação clínica relativa ao estado do Recorrente depois das agressões sofridas durante os factos em discussão e outro com documentação clínica do Arguido que dá conta de problemas de saúde de que padece e que afetam a sua mobilidade. 4. Protestou ainda juntar dois relatórios médicos – junção que ocorreu por requerimento datado de 19.06.2023 – que são de igual forma comprovativos da sua sujeição a tratamentos de fisioterapia, tratamentos por ondas de choque e laserterapia de raios, desde 2018 até, pelo menos, 2021 (cfr. faturas juntas como Documento 2, no supra aludido requerimento). 5. A 19.06.2023 o Tribunal a quo proferiu despacho, no qual adiantou que a documentação apresentada já constava dos autos, considerando desnecessária nova admissão. A defesa do Recorrente, julgando discutível se o Tribunal recorrido havia tomado ou posição quanto à junção da documentação, intercedeu no início da audiência de discussão e julgamento de dia 20.06.2023, para esclarecer que nem toda a documentação se achava já junta. 6. Em seguida, foi proferido despacho pelo Tribunal recorrido que, embora admitindo a junção de alguma documentação, indeferiu a junção da seguinte documentação: guia de acolhimento e normas de admissão a medicina física e reabilitação, de todas as faturas, marcação de atos e pedidos de exames, porquanto considerou que a documentação em causa era exterior ao objeto do processo e irrelevante para o facto cuja alteração fora comunicada. 7. Inconformado com o teor do despacho, o Recorrente suscitou em audiência a nulidade desse e do despacho datado de 19.06.2023, ao abrigo do art.º 120.º, n.º 2 al. d) do C.P.P., porquanto os documentos cuja junção não foi admitida se prendiam, precisamente, com a comunicação efetuada pelo Tribunal, no que concerne aos pontapés que não constavam da acusação, e sobre os quais em momento anterior não fazia sentido juntar prova. 8. O Tribunal recorrido indeferiu a invocada nulidade, reiterando que não compreendia a relevância da referida documentação, uma vez que a defesa do Recorrente nada concretizou sobre a essencialidade da mesma e o respetivo motivo, bem como que já não se encontrava em prazo para colocar em causa uma situação (acusação) transitada em julgado. 9. Face ao exposto, não se pode o Recorrente conformar com o teor de tais despachos. 10. Assim, no primeiro despacho proferido pelo Tribunal a quo na audiência de discussão e julgamento de dia 20.06.2023, foi parcialmente indeferido o requerimento do Recorrente, por considerar que a documentação não se revelava pertinente para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa, e por crer que a documentação é alheia ao objeto do processo e à comunicação realizada pelo Tribunal. 11. Porém, não assiste razão ao Tribunal recorrido, desde logo porque o Recorrente requereu a junção da referida documentação ao abrigo do n.º 1 do art.º 358.º do C.P.P., por considerar que o facto que o Tribunal recorrido acrescentou importava um novo tipo de agressão supostamente perpetrada pelo Recorrente contra o Ofendido: pontapés no corpo deste último. 12. Se a lei concede prazo ao arguido para exercer o contraditório face à alteração dos factos que é comunicada pelo tribunal, claro está que toda e qualquer prova que o arguido pretender juntar no exercício desse direito tem de estar relacionada com essa mesma alteração. 13. O que não parece resultar da letra da lei é a exigência que essa prova se revele pertinente para a descoberta da verdade material e da boa decisão da causa além da comunicação efetuada, requisito que deve ser observado quando a prova é junta pelo art.º 340.º do C.P.P.. 14. Ademais, refere o Tribunal recorrido que o Arguido não justificou a pertinência de tais documentos, quando não se antevê de que forma o deveria fazer, quando a mesma, necessária e intrinsecamente se tem de prender com a comunicação da alteração dos factos comunicada – até porque é efetuada precisamente ao abrigo desse mesmo artigo. 15. Interpretou o Tribunal a quo erradamente o artigo 358.º n.º 1 do C.P.P., pois que tudo o que aí se exige é que essa prova esteja relacionada com o facto comunicado/alterado e não que se cumpram os requisitos do artigo 340.º do C.P.P.. 16. Porém, e ainda que assim não se entenda – caso se entenda que toda a prova junta ao abrigo do artigo 358.º, n.º1 C.P.P. exige o cumprimento dos requisitos do artigo 340.º C.P.P., ou seja, que se apresente justificação para a junção de tal documentação- importa relembrar que o Recorrente fez constar no requerimento de 16.06.2023 que a “documentação clínica do Arguido que dá conta de problemas de saúde de que padece e que afectam a sua mobilidade”. 17. Versando estes considerandos para o caso concreto, o facto comunicado veio alterar o facto 4 da acusação pública, que de “Em ato contínuo, o arguido desferiu diversos socos na face de BB e empurrou o mesmo contra o dolo” passou para “Em ato contínuo, o arguido desferiu diversos socos na face e na parte superior do corpo de BB, bem como pontapés na parte inferior e empurrou o mesmo contra o solo, entre outros.”. 18. Face a esta alteração, e sabendo o Arguido – conforme resulta das suas declarações prestadas em audiência de discussão e julgamento de dia 20.06.2023 – que padece de sérios problemas de mobilidade nos membros inferiores do corpo (pés) que o tornam fisicamente incapaz de dar pontapés, pretendeu juntar documentação referente a esse concreto problema de saúde, que afeta a sua mobilidade, cuja pertinência nasce da alteração comunicada. 19. A documentação tinha como fito comprovar que o Recorrente não tinha mobilidade para dar pontapés, logo, era prova que contribuía para a verdade material, permitindo ao Tribunal a quo fundamentar os factos que daria como provados e como não provados. 20. A junção de documentação que incide sobre a possibilidade de o Recorrente desferir ou não pontapés, é documentação relativa ao objeto do processo e à comunicação de alteração realizada e é prova que permite aferir da veracidade ou falsidade do facto imputado. Anteriormente não havia fundamento para a junção dessa documentação porque não estava em causa a capacidade ou não do Recorrente para dar pontapés. 21. A decisão do Tribunal de indeferir a junção dessa documentação não só colocou em crise a boa decisão da causa, como obstou à produção de prova relativamente a um facto nunca antes discutido no processo, negando possibilidade de defesa ao Recorrente. 22. Ademais, e a título de parênteses se dirá, que o argumento que o Tribunal a quo de o Recorrente nunca ter oferecido versão diferente dos factos, e nunca ter abordado a questão, revela-se ilógico, pois que, se pela primeira vez em todo o processo se fala de pontapés– nunca antes tendo sido alvo de discussão – não faria sentido que o se pronunciasse anteriormente. 23. No 1.º despacho proferido na audiência de 20.06.2023, o Tribunal a quo não indeferiu a junção de parte da documentação, admitindo a junção de três fotografias e um relatório de interpretação de imagiologia, declarando que sabia que as mesmas nada têm a ver com o objeto da comunicação, porém, vem rejeitar documentação clínica que está diretamente ligada à comunicação!!! É uma postura contrassenso e não faz qualquer sentido. 24. Ou seja, o Tribunal a quo admite a junção de fotografias apesar de declarar entender que as mesmas nada relevam para a factualidade alterada, mas rejeita a documentação clínica que se pretendeu também juntar por causa da alteração factual comunicada?!?! Como se justifica que o Tribunal recorrido, relativamente a uns elementos de prova (as fotografias), apesar de considerar que não têm qualquer valor probatório, mas por respeito ao direito à defesa do Arguido, admita a sua junção, mas, usando exactamente o mesmo argumento (irrelevância probatória), já não admite a junção da demais documentação?! 25. Com toda a honestidade e por paradoxal que possa parecer, o Recorrente só encontra uma razão para que, nas mesmíssimas circunstâncias, o Tribunal tenha aceitado as fotografias, mas rejeitado a documentação clínica apresentada: é que, precisamente, apenas a documentação clínica é apta a colocar em crise o “novo” facto comunicado pelo Tribunal! 26. Pelo exposto, não existia fundamento para rejeitar a junção da documentação apresentada pelo Recorrente, consubstanciando tal decisão uma violação do seu direito de defesa, pelo que se requer a V. Exas. sejam revogados os despachos acima enunciados e se ordene a substituição dos mesmos por outros que admitam a junção da documentação em causa, por padecerem de vício de nulidade do art.º 120.º, n.º 2, al. d), 2.ª parte do C.P.P.. 27. O Recorrente invocou sobre o mesmo (e sobre o anterior despacho de 19.06.2023) o referido vício de nulidade, ao abrigo do artigo 120.º, n.º 2 al. d) parte final do C.P.P., 28. O Tribunal a quo proferiu despacho no qual indeferiu a nulidade invocada, e os seus fundamentos resumem-se aos seguintes pontos (1) que o objeto do processo se encontra delimitado pela acusação pública, e que a comunicação realizada se tratou apenas da concretização de um facto, pelo que finda a produção de prova o Recorrente não pode agora colocar em causa todo o demais; (2) que não compreende a relevância da documentação junta e em que medida é que poderá auxiliar o tribunal na descoberta da verdade material; (3) que a defesa do Recorrente não justificou a essencialidade da documentação; (4) que o tribunal já admitiu anteriormente a junção de documentação que viabilizou o exercício do direito de defesa nesta matéria sobre a sua condição clínica; e (5) que a documentação é anterior e posterior aos factos. Concluindo pela inexistência de qualquer nulidade. 29. 1. - Quanto a este ponto, é certo que o objeto do processo se encontra delimitado pela acusação pública, porém, a comunicação realizada pelo Tribunal recorrido não se traduz na mera concretização de um facto da acusação… 30. Alterar um dos factos da acusação de modo a que nele passe a constar que o Recorrente deu pontapés ao Ofendido não é somente concretizar um facto, é agravar a conduta intrínseca imputada ao Recorrente. E mesmo que o Tribunal recorrido considerasse, num primeiro momento, que adicionar que o Recorrente desferiu pontapés é uma mera concretização do facto, assiste à defesa, no âmbito do direito ao contraditório e das garantias do seu direito de defesa pronunciar-se sobre o mesmo, demonstrando o porquê de tal não ser verdade ou ser de impossível verificação. Pelo que não pode merecer provimento o argumento do Tribunal a quo. 31. No que concerne ao argumento de que finda a produção de prova o Recorrente não pode agora colocar em causa todo o demais, admite-se que não se compreende o mesmo, pois não fazia sentido que o aquele falasse de uma situação além do objeto do processo. Se estavam a ser discutidos factos onde se alegava que o Recorrente tinha empurrado e soqueado o Ofendido, por que razão haveria o Recorrente de falar dos problemas de mobilidade nos membros inferiores? 32. Não existia, anteriormente à comunicação, necessidade de o Recorrente demonstrar a condição de saúde que afeta a sua mobilidade, pelo que o requerimento de 16.06.2023 não visa colmatar nada, uma vez que o facto era novo, não estando a colocar em causa a prova que já produzida! 33. 2 e 3. - Quanto aos argumentos de que o Tribunal recorrido não compreende a relevância da documentação, nem de que forma auxiliará na descoberta da verdade material, e que a defesa do Recorrente não justificou a essencialidade da documentação, dir-se-á, em primeiro lugar, que a lei não exige justificação. 34. Mas mesmo que se entendesse que era exigida justificação para juntar documentação, conforme já referido supra, o Recorrente apresentou-a (cfr. requerimento de 16.06.2023). 35. Em segundo lugar, e com o devido respeito, o Tribunal recorrido pareceu nem querer compreender a relevância da documentação. Toda a documentação junta estava relacionada com a mobilidade do Recorrente – como se escreveu no próprio requerimento de 16.06.2023 -, documentação que colocava em causa a veracidade do facto novo que o Tribunal comunicou, pelo que a documentação era e é essencial à descoberta da verdade material, ao apuramento das condutas que podem ou não ser imputadas ao Recorrente, à boa decisão da causa. 36. 4. - Discute-se ainda a questão de o Tribunal recorrido já ter admitido, anteriormente, junção de documentação sobre a condição clínica do Recorrente. 37. A condição clínica que anteriormente se juntou apenas comprova o estado do Recorrente após as agressões em discussão – e que já agora corrobora que o mesmo foi alvo de agressões. 38. Sendo aditado o facto em causa, a documentação junta incidia especificamente sobre a condição clínica que o Recorrente padece (pés de Rosa Mota), pelo que o exercício do seu direito de defesa não se pode bastar pela documentação junta anteriormente. 39. 5. Por fim, invoca o Tribunal recorrido o argumento que a documentação clínica junta, sejam as faturas, exames ou relatórios, são anteriores e posteriores à data da prática dos factos, pelo que não se alcança o propósito da junção. Este argumento auxilia fortemente a lógica da defesa, porque demonstra que o Recorrente não inventou nenhuma história para cegar o Tribunal recorrido, o Recorrente já tinha uma condição de saúde que afetava a sua mobilidade antes dos factos ocorrerem! Não criou agora uma falsa condição clínica para provar que não podia desferir pontapés, o Recorrente não poderia, não pode, nem poderá dar pontapés porque não possui mobilidade para tal. E o facto de a documentação ser também posterior aos factos só demonstra a gravidade da condição clínica do Recorrente, que se encontra há longos anos a ser sujeito a tratamentos, terapias, consultas e exames! 40. Pelo exposto, não assistia razão ao Tribunal para indeferir a nulidade invocada, pelo que o despacho que indeferiu a nulidade ser revogado e substituído por outro que a declare.” O referido recurso foi admitido por despacho de 20-10-2023. I.2.B. Do recurso da sentença condenatória: Inconformado com a sentença de 23-06-2023 (cfr. I.1.A.), o arguido ... dela interpôs recurso em 08-09-2023, requerendo a realização de audiência, extraindo da motivação as seguintes conclusões: “1. Vem o Arguido condenado pela prática de 2 crimes de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143.º n.º 1 CP, nas penas parcelares de 120 dias por cada crime e, em cúmulo jurídico, na pena única de 160 dias de multa à taxa diária de € 15,00, no montante global de € 2.400,00 convertíveis em 106 dias de prisão subsidiária, bem como no PIC deduzido pelo CC, no valor de € 294,64 – decisão que assente num grosseiro erro de julgamento. 2. Impugnam-se os factos 3, 4, 5, 12 e 13 (na sua totalidade), os factos 6 e 9 no segmento “Das agressões sofridas” e o facto 1 no segmento: “nunca tendo o arguido ..., pai da ofendida AA, aceitado tal união.” 3. Os elementos de prova que impõem decisão diversa são: Testemunhal - DD, 23/05/2023, entre as 10H51 e 11H03, cfr. Acta do mesmo dia lavrada a Fls…, EE, 23/05/2023, entre as 12H00 e 12H28, cfr. Acta do mesmo dia lavrada a Fls…; FF, 23/05/2023, entre as 11H31 e 11H48, cfr. Acta do mesmo dia lavrada a Fls…, GG, 23/05/2023, entre as 11H48 e 12H00, cfr. Acta do mesmo dia lavrada a Fls…; AA, 23/05/2023, entre as 10H17 e 10H49, cfr. Acta do mesmo dia lavrada a Fls. …, BB 23/05/2023, entre as 11H06 e fim às 11H31, cfr. Acta do mesmo dia lavrada a Fls…, todos gravados no suporte digital em uso no tribunal; Declarações do Arguido prestadas a 23/05/2023, entre as 12H28 e 12H57, cfr. Acta do mesmo dia lavrada a Fls…, e a 20/06/2023, entre as 14H33 e 14H49, cfr. Acta do mesmo dia lavrada a Fls…, ambos gravados no suporte digital em uso no tribunal; Documental - Auto de Denúncia de AA a fls. 2; Auto de Denúncia de BB a fls. 6 a 7; Episódio de Urgência do Recorrente a Fls. 123 e 124; Ficha clínica de AA a fls. 74; Ficha clínica de BB a fls. 102; Queixa apresentada pelo Recorrente contra o BB de fls. 119 a 121; Fotografias de fls. 251 a 254 (juntas com o RAI do Recorrente) e de Fls. … (juntas com requerimento de 19/06/2023); Relatório Médico de Fls… junto por requerimento de 19/06/2023. 4. Resultando da prova produzida duas versões dos factos opostas e incompatíveis, não pode aceitar-se que tenha sido dada prevalência à versão dos Ofendidos, valorando-a em desconformidade com as regras da experiência comum e desvalorizando incorrectamente a demais prova. 5. Mormente, as declarações prestadas pelo Recorrente deviam ter tido mereceram acolhimento! 6. Para as afastar, o tribunal recorrido convoca o momento em que o Recorrente falou (a final), dizendo que as declarações “não se revelaram totalmente críveis”, mas sem explicitar em que parte o foram e porquê e fazendo tábua rasa de que, por lei, o arguido tem o direito de (querendo) prestar declarações “em qualquer momento da audiência” (art.º 343.º/1 CPP) – sendo que o que declarou em julgamento foi totalmente coincidente com a versão factual narrada na queixa apresentada contra o Ofendido (fls. 119 a 121), no RAI e nas declarações prestadas nessa sede perante JIC -, parecendo-nos que o que possa declarar não será mais ou menos credível ou mais ou menos verosímil consoante o momento em que presta declarações… 7. Depois, não é verdade que o Recorrente não tenha respondido às questões concretas que lhe foram colocadas, sendo que apenas não o fez quanto ao envolvimento concreto da sua filha (min. 09:01 a 10:24 das declarações) – o que evidencia manifesto erro na apreciação das declarações do Recorrente. 8. Quanto à “postura assumida nos autos” pelo Arguido, também não serve para desvalorizar o que declarou, pois que essa postura é ter-se apresentado choroso no decurso do julgamento, o que é perfeitamente compreensível considerando que estava a defender-se de factos falsos imputados pela sua filha! 9. Consta da sentença que o Recorrente quis incriminar processualmente os Ofendidos, incluindo a sua filha, o que é também FALSO, pois só apresentou queixa contra o Ofendido BB (fls. 119 a 121 e despacho de arquivamento/acusação de fls. 188 e ss.). 10. Ao contrário do que consta da decisão recorrida, as declarações prestadas pelo Recorrente só são contrariadas pelas dos Ofendidos, mas são absolutamente compatíveis com a documentação clínica e fotográfica de fls. 123 e 124 e 251 a 254 e com a demais prova testemunhal. 11. Quanto às testemunhas de defesa FF e GG, não é verdade que se tenham contradito ou que as suas declarações encerrem discrepâncias (também assim se evidenciando erro de julgamento)! 12. Desde logo, é perfeitamente verosimil (de acordo com as regras da experiência comum) que, entre o momento em que a testemunha GG vê, da varanda, as agressões que o Recorrente está a sofrer às mãos dos Ofendidos e o momento em que a testemunha FF desce do 5º andar e chega à entrada do prédio, essas agressões já tivessem cessado – até porque, entretanto, já tinham chegado ao local a testemunha GG e o irmão da testemunha FF que tinham separado os intervenientes. 13. No que concerne à incompreensão manifestada quanto a, estando a testemunha GG na sala, ter visto e ouvido a situação que descreveu e os demais presentes naquela divisão não (mormente a testemunha FF), novo erro de análise da prova, pois que a testemunha GG não disse que estava na sala onde decorria o encontro das demais pessoas – tendo referido que estava numa “sala à parte” (min. 2:10 a 3:19 do seu depoimento), divisão apelidada pela testemunha FF de “escritoriozinho” ao pé da cozinha (min. 6:26 a 8:21 do depoimento desta testemunha). 14. E não é por a testemunha GG se encontrar num 5º andar que se pode concluir não ser compreensível que conseguisse ver os eventos ocorridos – até porque este, persistentemente sobre isso perguntado, foi sempre claro e coerente ao afirmar que o seu campo de visão estava totalmente desobstruído, bem como que existia boa iluminação (min. 3:38 a 4:50 do depoimento em causa). 15. De forma coincidente, as testemunhas FF e GG referem que este e o irmão da testemunha daquela desceram pelas escadas e FF pelo elevador, tendo aqueles chegado primeiro junto do Recorrente e Ofendidos, e a testemunha FF chegou após intervenção apaziguadora daqueles, descrevendo igualmente quem agarrava/separava quem (cfr. min. 5:03 a 5:47 do depoimento da testemunha GG e trecho de min. 8:55 a 11:19 da testemunha FF). 16. Não deixando de se notar a clara dualidade de critérios, pois que, quanto às notórias discrepâncias nos depoimentos dos Ofendidos, o tribunal recorrido, apesar de as reconhecer, menospreza-as, devido ao lapso temporal decorrido entre os factos e a realização do julgamento – factor que já não releva quanto às supostas discrepâncias nos depoimentos das testemunhas arroladas pela defesa… 17. Consta da sentença que as testemunhas GG e FF “denotaram ter tomado partido nos factos” ou evidenciaram “clara parcialidade”, mas não se expõe por que motivo assim se concluiu… Competia ao Tribunal recorrido explicitar porque considerou que assim foi; não o tendo feito, a sentença recorrida enferma do vício de insuficiência de fundamentação (arts. 379.º/1, al. a) e 374.º/2 C.P.P.) – nulidade que se deixa expressamente invocada. 18. Quanto à credibilidade dada aos depoimentos dos Ofendidos, veja-se que na denúncia apresentada (fls. 2 a 3), a única concreta ofensa que a Ofendida AA diz ter sofrido (para além de ter sido empurrada) foi “um soco na zona da garganta”, sendo que na descrição feita pelos Ofendidos em julgamento, nenhum referiu uma agressão na garganta, apenas falando de murros/socos na barriga (min. 7:25 a 8:32 do depoimento da Ofendida e min. 14:53 a 19:44 do depoimento do Ofendido). 19. A denúncia apresentada pelo Ofendido BB (Fls. 6 a 7) apenas refere genericamente “socos e empurrões”, sendo ilógico e incompreensível não ter concretizado que esses socos tivessem atingido a barriga da sua mulher, ainda para mais quando, em audiência, os Ofendidos declaram que o Recorrente socou a Ofendida AA propositadamente na barriga porque julgava que a mesma estava grávida – e se é certo que um auto de denúncia não pode servir para a prova dos factos ali denunciados, nada impede que seja valorado, no confronto com a prova produzida oralmente, para aferir da credibilidade dos depoimentos prestados em juízo. 20. No que concerne ao facto provado 5, nenhum dos Ofendidos declarou que a Ofendida tivesse sido empurrada contra uma parede, referindo-se ambos a uma caixa de correio (conforme min. 8:23 a 9:21 do depoimento da Ofendida e min. 14:53 a 19:44 do depoimento do Ofendido). 21. Já da nota de alta de fls. 74, se retira, por um lado, que a Ofendida referiu ter sido atingida na zona do esterno E NÃO A BARRIGA e, por outro lado, mesmo essa alegação NÃO foi confirmada clinicamente - o que é incompatível com a suposta agressão violenta na barriga referida pelos Ofendidos em juízo. 22. Nem mesmo o “exame directo” de fls. 112 e 113 confirma as declarações da Ofendida AA, pois ainda que se aceite que, na data em que foi elaborado, o seu subscritor tenha observado a Ofendida, apenas o fez mais de 1 ano depois da data dos factos e, lendo o segmento “Informação” e “Conclusões”, constata-se que se limitou à interpretação da ficha clínica/nota de alta de fls. 74 e não resulta de observação DIRECTA à suposta vítima. 23. Dessa nota de alta não consta que as lesões que a Ofendida relatou tivessem sido provocadas por “objecto de acção contundente”, mas tão só que esta disse que sofreu agressão física e o auto de exame acrescenta a expressão referida, sem esclarecer se por “lesões descritas” se refere às descritas pela Ofendida, ou as observadas pelo médico (“escoriações no cotovelo” e únicas dadas como provadas no facto 9). 24. Mutatis mutandis quanto ao exame directo ao Ofendido (fls. 114 e 115). 25. In casu, o auto de exame directo não pode valer como prova pericial, nem sequer pode valer para confirmar as declarações da Ofendida AA (em particular no que concerne a ter sido atingida na barriga). 26. Acresce que os Ofendidos dizem que o Recorrente provocou “arranhadelas” no Ofendido, que este diz terem sido na “parte de trás” (min. 12:13 a 14:48 do seu depoimento) e a Ofendida diz que o foram na cara (min. 13:35 a 13:54 do depoimento desta), mas tais lesões NÃO resultam nem do auto de exame directo, nem da nota de alta de Fls. 102! 27. Pelo que não se podia considerar que “a versão da acusação se revelou coerente, decorrendo da prova documental, pericial e testemunhal bastante”. 28. Quanto ao teor da referida fls. 82 dos autos, porque corresponde às declarações que a Ofendida prestou perante OPC em 26/02/2020, a sua valoração pelo tribunal recorrido só podia ocorrer se tivesse sido respeitado o artigo 356.º n.º 2 ou 3 do C.P.P. – pelo que tal “documento” não pode servir como prova. 29. Quanto ao facto 4 dado como provado, além de falso, é impossível, pois o Arguido padece de um problema nos calcanhares que lhe afecta a mobilidade, impossibilitando-o de dar pontapés. 30. É clamoroso o erro de julgamento quando a Mm.ª Juíza a quo, contrariando documentação clínica (Relatório Médico a Fls… junto por requerimento de 19/06/2023) e apesar de na sala de audiência não existirem escadas e de não ter visto o Arguido no espaço do tribunal, consigna que este não tem dificuldades em subir escadas... 31. Note-se que o Recorrente não disse que se encontrava totalmente limitado nos movimentos do dia-a-dia, mas mencionou (min. 3:55 a 4:20 das suas declarações) que, por vezes, tem crises que o impedem de andar e exigem que conte com a ajuda de terceiros para se movimentar, tal como referiu que a sua condição de saúde o impedia de fazer exercício físico (min. 5:41 a 6:37 das mesmas declarações). 32. Pontapear alguém do tronco para cima (como referiu o Ofendido, min. 14:53 a 19:45 do seu depoimento), não é um movimento do dia-a-dia, pelo que conjugando o que o Arguido referiu quanto a esta questão com as regras da experiência comum, é evidente que não podia ter desferido os ditos pontapés. 33. Ainda quanto a esta matéria, não deixa de se convocar o vício de contradição insanável previsto no art.º 410.º/2 al. b) CPP e que se verifica no confronto entre ter sido dado como provado em 4 que o Recorrente agrediu o Ofendido BB com pontapés e o que se deu como provado em 16 no que toca a padecer o Recorrente de “problemas de tendão e calcanhar em ambos os pés, dolorosos e que geram dificuldade de mobilidade”. 34. Reconhecida a dita nulidade, deverá ser expurgado do facto provado em 4 a referência a pontapés. 35. Quanto a ter o tribunal procurado desvalorizar o que foi declarado pelas testemunhas arroladas pelo Arguido porquanto não teriam sido indicadas em fase anterior do processo, cremos ser argumento manifestamente irrelevante e inatendível… 36. Parecendo-nos também não ter qualquer relevo o argumento usado para credibilizar a versão dos Ofendidos consistente em terem apresentado queixa contra o Arguido e se dirigido ao hospital (o que não seria compatível com serem eles os agressores). 37. “Esquece” o tribunal recorrido que a conduta do Arguido foi exactamente a MESMA – também apresentou queixa (embora apenas contra o Ofendido e não contra a sua filha - fls. 119 a 121) e também se dirigiu ao hospital (episódio de urgência a fls. 123 e 124) -, pelo que, seguindo a lógica do Tribunal recorrido, se o Recorrente fosse o agressor e não o agredido, não fazia sentido que, COMO FEZ, se dirigisse ao hospital e apresentasse queixa sendo que, também tal como os Ofendidos, o Recorrente apresentava marcas físicas bem visíveis (conforme fotografias de fls. 251 a 254 e juntas com o requerimento de 19/06/2023, das quais resulta inequívoco que foi agredido)! 38. Apesar de, em audiência, o Ofendido BB ter declarado que se limitou a agarrar as mãos do Recorrente (cfr. min. 14:53 a 19:45 do seu depoimento), tal é contraditório com as lesões que este apresentava no braço, costas e cara. 39. O Tribunal recorrido vem a rejeitar valorar tais fotografias pela sua alegada “parcialidade” (como pode um documento ser parcial?!), assim pondo em causa de forma inovadora, mas inadmissível, a fiabilidade destas e a fidedignidade das datas nelas apostas, questões que não suscitou quando aceitou a respectiva junção! 40. Se o Tribunal, quanto a estas fotos, teve dúvidas sobre a correspondência das datas das mesmas com a realidade e não perdendo de vista que aquelas, a terem sido tiradas na imediata sequência dos eventos de 25/08/2019, se revelam um elemento de prova essencial, então tinha a obrigação legal de ordenar, ao abrigo do artigo 340º/1 CPP, a realização das diligências pertinentes para dissipar tais dúvidas. Não o tendo feito, incorreu na nulidade prevista no art.º 120.º/2 al. d), parte final CPP – a qual, atenta a essencialidade de tal diligência para a descoberta da verdade material, aqui se invoca. 41. Seja como for, o estado em que está o Recorrente nas fotografias é o descrito pelas testemunhas EE, FF e GG (respectivamente a cada depoimento, nos min. 3:48 a 4:14; min. 11:19 a 12:07 e min. 8:44 a 9:58), como coincide com o relatório médico de urgência de fls. 123 e 124. Também os Ofendidos AA e BB falaram da t-shirt rasgada, visível nas fotografias (conforme trechos de minutos 7:35 a 8:15 do depoimento da Ofendida e minutos 14:53 a 19:44 do depoimento do Ofendido prestado no mesmo dia acima melhor identificados) – o que demonstra que não pode haver dúvidas que as fotos são contemporâneas do evento objecto dos autos. 42. De tudo o exposto, não podia o Tribunal recorrido ter concluído que a versão dos Ofendidos era merecedora de maior credibilidade. 43. Nestes termos, impõe-se que a factualidade (ou segmentos de factualidade) ora impugnada passe a figurar da matéria de facto dada como não provada, no que concerne aos factos provados 3, 4 e 5 por não corresponderem à efectiva dinâmica do sucedido, e, em consequência, os factos provados 12 e 13, e quanto aos factos provados 6 e 9 deve o segmento “Das agressões sofridas” ser dado como não provado ou, no limite, ser substituído em ambos os factos pela expressão “Da contenda”, 44. Ou que passe a constar dessa factualidade que a actuação do Recorrente sobre os Ofendidos ocorreu, única e exclusivamente, em defesa própria e em face da actuação do Ofendido BB sobre o Recorrente, sendo sempre dados como não provados os factos 12 e 13, 45. Ou, ainda e no limite, se se entender não ser possível ultrapassar a dúvida sobre quem iniciou a contenda (mesmo recorrendo à aplicação do in dubio pro reo), então a matéria de facto provada deve passar a reflectir essa incerteza. 46. A impugnação do segmento do facto provado 1 assenta, também, na incorrecta e inaceitável valoração que foi feita da prova produzida para a qual se aproveitam as considerações supra. 47. Quanto a este facto, não é verdade que a testemunha EE não tenha apresentado uma justificação para a sua filha ter decidido casar em segredo, conforme trechos de min. 13:15 a 14:29 e de min 16:47 a 17:49 do respectivo depoimento), pois que explicou que foi pedido à filha um namoro de 6 meses para solidificar a relação antes do matrimónio, o que a Ofendida não terá querido aceitar, e que é verosímil à luz das regras da experiência comum 48. Tal explicação é idêntica à que o Recorrente ofereceu na sessão de julgamento do dia 23/05/2023 (trecho de min. 00:05 a 3:25 das declarações em causa) e ainda corroborada pela testemunha DD (trecho de min. 5:33 a 8:55 do seu depoimento) – a qual esclareceu que o Recorrente não proibia nem que a filha contactasse com o Ofendido, nem que este se deslocasse a casa do Recorrente e da Ofendida, ou de se deslocar ao local de trabalho daqueles. 49. Do exposto, impõe-se concluir que também este facto 1 deve ser alterado, passando o segmento “nunca tendo o arguido ..., pai da ofendida AA, aceitado tal união” a figurar da matéria de facto dada como não provada. 50. Reconhecida a existência de erro de julgamento, das três, uma: se se considerar que a matéria de facto dada como provada deve passar para os factos não provados, terá que se determinar a absolvição tout court do Recorrente dos crimes por que foi acusado e condenado. 51. Se se entender que da matéria de facto provada deve passar a constar que o Recorrente actuou para afastar agressão de que estava a ser vítima, então deve ter-se por excluída a ilicitude dessa sua actuação – art.º 32.º/1/2 al. a) CP – levada a cabo em legítima defesa e 33.ºCP. 52. Finalmente, se a alteração da matéria de facto apenas for no sentido de se desconhecer quem iniciou a contenda, então estão reunidas as condições para se determinar, quanto a ambos os ilícitos imputados, a dispensa de pena (art.º 143.º/3 al. a) CP) por estar verificado o requisito do preceito e ainda do art.º 74.º CP. 53. Considerando a dinâmica dos factos, os meios empregues pelo Recorrente e as ligeiríssimas consequências para os Ofendidos, não poderá deixar de se considerar que, quer a ilicitude dos factos, quer a culpa do Recorrente são diminutas (artigo 74º n.º 1 alínea a) C.P.). 54. Tendo em conta que, neste cenário, Ofendidos e Recorrente são, simultaneamente, agressores e agredidos e que as lesões corporais recíprocas são semelhantes, há que considerar que o dano está reparado (art.º 74º/1 al. b) CP), crendo-se que à dispensa de pena não se opõem necessidades de prevenção (artigo 74.º n.º 1 alínea c) C.P.) – recordando-se, no que toca à prevenção especial que o Recorrente não tem antecedentes criminais e se encontra plenamente inserido, sob todos os pontos de vista (como provado em 23 e em 17, 18, 19 e 21). 55. Sendo que se V. Exas. absolverem o Recorrente em sede criminal, também terão que o absolver do pedido de indemnização deduzido pelo CC 56. Caso V. Exas. entendam manter inalterada a matéria de facto dada como provada, sempre se exigirá a correcção do quantum punitivo estabelecido em 1ª Instância, em respeito pelos arts. 71.º e 77.º CP (normas violadas pela decisão recorrida). 57. No que às penas parcelares diz respeito, face à concreta actuação do Recorrente, à simplicidade dos meios usados, às nada gravosas consequências para os Ofendidos e mesmo ponderando o contexto e os motivos que foram dados como provados, tem que se ter o dolo e a ilicitude como de grau baixo. 58. Depois, a negação dos factos imputados não equivale, obviamente, ao não reconhecimento da gravidade e censurabilidade da conduta – pelo que não pode ser tida por agravante. 59. Quanto à relação familiar existente entre o Recorrente e os Ofendidos, porque já terá sido devidamente ponderada aquando da análise do grau de ilicitude do facto, não se aceita uma dupla valoração negativa da mesma situação. 60. Não podemos também concordar que seja valorado contra o Recorrente o facto de as divergências familiares que, na óptica do Tribunal recorrido, terão estado na origem do evento objecto dos autos ainda não se mostrarem ultrapassadas, porque não é verdade que este tenha procurado ou pretenda que seja feita uma qualquer imputação delitual à sua filha, e porque a própria existência deste processo e a postura nele assumida pelos Ofendidos (de não prescindirem da punição do Recorrente) têm que ser vistas como um factor nada apaziguador. 61. Não podia o Tribunal recorrido ter sancionado na mesma medida o crime praticado contra o Ofendido e aqueloutro praticado contra a Ofendida, quando da factualidade descrita a culpa manifestada pelo Recorrente ao agredir a Ofendida (inadvertida) é significativamente mais reduzida do que a que se pode contemplar quanto ao Ofendido (intencional), assim como as lesões sofridas por este são superiores às daquela. 62. Consideramos que a pena de multa a aplicar ao Recorrente nunca poderia ter ultrapassado os 100 dias para os factos praticados contra o Ofendido e os 70 dias para os factos praticados sobre a Ofendida – também à razão de € 15/dia. 63. Quanto à pena única fixada, os elementos que o Tribunal recorrido escreve que ponderou para a alcançar não são aqueles a que o art.º 77.º CP manda atender (globalidade dos factos praticados e à personalidade do agente) – pelo que esta norma foi violada na sentença recorrida. 64. A pena única deve ser fixada em medida não superior a 120 dias (também à razão de € 15/dia). 65. Para efeitos do artigo 412º n.º 5 do C.P.P., o Arguido Recorrente manifesta expressamente que mantém interesse na apreciação do Recurso interlocutório apresentado no dia 4 de Setembro de 2023.” O referido recurso foi admitido por despacho de 09-10-2023. I.3. Das respostas: 1.3.A. Relativamente ao recurso interlocutório: Ao dito recurso (cfr. I.2.A.) respondeu a Digna Magistrada do Ministério Público junto do tribunal recorrido, pugnando pela sua improcedência, concluindo que “(…) a decisão recorrida ponderou devidamente a matéria submetida a apreciação, não enferma de qualquer vício nem violou qualquer norma jurídica, designadamente, o artº 32º da Constituição da República Portuguesa ou o artº 120º do Código de Processo Penal ou qualquer outra.” 1.3.B. Relativamente ao recurso da sentença condenatória: Ao mencionado recurso (cfr. I.2.B.) a Digna Magistrada do Ministério Público junto do tribunal recorrido também respondeu, pugnando pela sua improcedência, concluindo da seguinte forma: “1. Nos presentes autos, por sentença datada de 23-6-2023, o arguido ... foi condenado pela prática, em autoria material e na forma consumada, de dois crimes de ofensa à integridade física, p.p. pelo artº 143º, nº 1 do Código Penal, nas penas parcelares de 120 dias de multa à taxa diária de 15€, e em cúmulo jurídico, na pena única de 160 dias de multa à taxa diária de 15€ na quantia de global de 2.400€ 2. O arguido, ora Recorrente pretende que, no integral provimento do recurso interposto, seja revogada a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, e substituída por outra que o condene em pena de multa inferior. 3. O Recorrente impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto dada como provada, por entender que existe desconformidade entre essa decisão e a prova produzida em audiência de julgamento. 4. O Recorrente defende que, da prova apreciada em audiência de julgamento, não resulta que o mesmo tenha cometido o crime pelo qual o Tribunal “a quo” o condenou. 5. O que o Recorrente, na verdade, visa impugnar é o processo de formação da convicção do Tribunal “a quo”, que conduziu à fixação da matéria de facto dada como provada 6. O Tribunal “a quo” formou a sua convicção quanto aos factos provados atendendo à prova constante dos presentes autos, e produzida em sede de audiência de julgamento, valorada à luz do princípio da livre apreciação, consagrado no artº 127.º do Código de Processo Penal, e das regras de experiência comum e da lógica 7. Sempre que a convicção seja uma convicção possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve acolher-se a opção do julgador, até porque o mesmo beneficiou da oralidade e imediação da recolha da prova. 8. O tribunal de recurso só pode modificar a convicção do julgador quando a mesma violar os seus momentos estritamente vinculados (obtida através de provas ilegais ou proibidas, ou contra a força probatória plena de certos meios de prova) ou então quando afronte, de forma manifesta, as regras da experiência comum. 9. A reapreciação das provas gravadas pelo Tribunal da Relação não é susceptível de, por si só, pôr em causa o processo de formação da (livre) convicção do Tribunal “a quo”, tanto mais que este se encontra indelevelmente marcado pela imediação da prova. 10. Os motivos de facto que fundamentam a decisão não são nem os factos provados, nem os meios de prova, mas os elementos que em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos constituem o substrato racional que conduziu a que a convicção do Tribunal se formasse em determinado sentido, ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência. 11. A fundamentação da sentença impugnada cumpre os respectivos requisitos legais, nela se encontrando explicitado e explicado o processo de formação da convicção do Tribunal e o exame crítico das provas que o alicerçou, nomeadamente o raciocínio lógico-dedutivo seguido e o porquê, a medida e a extensão da credibilidade que mereceram (ou não mereceram) os depoimentos prestados em audiência. 12. Fundamentação que, de resto, se acha também alicerçada nas regras da experiência e em adequados juízos de normalidade, não se perfilando a violação de qualquer regra da lógica ou ensinamento da experiência comum. 13. Foi apreciada toda a factualidade relevante em ordem à sentença a proferir. 14. Não existe uma contradição irremediável ou uma incompatibilidade entre dois ou mais factos contidos no texto da decisão recorrida e dados como provados. 15. Inexiste erro notório na apreciação da prova. 16. A matéria dada como provada e não provada é a que resulta da análise da prova produzida e de acordo com os princípios de processo penal convergentes na área, com destaque - inevitável e desejável sob o ponto de vista da captação psicológica - para o da imediação. 17. Apreciados os diferentes critérios de determinação da medida concreta da pena estatuídos no artº 71º, do C.Penal, entende-se, salvo melhor opinião, por ajustada, suficiente e necessária a pena aplicada ao arguido no que respeita aos dias de multa. 18. Quer em termos de prevenção, quer quanto à medida da culpa, a pena mostra- se correctamente doseada. 19. No que respeita ao quantitativo diário, entende-se que face à situação económica e financeira do arguido e aos seus encargos pessoais, o quantitativo diário aplicado (15€) é próximo do mínimo legal, pelo que, não se mostra excessivo, antes adequado, sendo certo que o arguido não o põe em causa 20. O Tribunal a quo fundamentou exaustivamente a integração dos factos provados no tipo legal do crime de ofensa à integridade física, fundamentação a que aderimos na integra, pelo que, não assiste razão ao recorrente. 21. Não se mostra violado qualquer princípio ou norma legal, mormente os artºs 40º, 47º, 71º, 154º, do Código Penal e artºs 120º, nº 2, al. d), 127º, 379º, nº1, al. a), 374º, nº2, do Código de Processo Penal e consequentemente, qualquer nulidade. 22. A decisão recorrida não merece censura.” Foram os autos remetidos a este Tribunal da Relação. I.4. Do parecer: Nesta instância, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer através do qual propugnou pela improcedência dos recursos, acompanhando as respostas apresentadas pelo Ministério Público em primeira instância, e ainda de acordo com o seguinte: “(…) Quanto à nulidade da sentença, o arguido/recorrente recorreu do despacho que indeferiu parcialmente a junção de documentos por si requerida e do despacho que indeferiu a arguição de nulidade daquele despacho, com fundamento na sua nulidade ao abrigo do disposto no art.º 120.º, n.º 1, al. d), do CPP. Afigura-se-nos que o arguido/recorrente com este fundamento do recurso pretende ver reapreciada a questão da nulidade da sentença no caso de o recurso dos dois despachos não proceder, sob a perspetiva de não sendo procedente a junção dos documentos incumbir ao Tribunal a quo, oficiosamente, produzir a prova da defesa a que aqueles documentos se destinavam. Esquece, porém, que a produção de prova oficiosa só tem lugar nas condições previstas no art.º 340.º, do CPP e que não sendo procedente o recurso dos dois despachos, que vai precisamente decidir dobre a pertinência da junção dos documentos, ou seja sobre a verificação daquelas condições, tal questão não se colocará. Quanto à impugnação da decisão sobre a matéria de facto aquilo que o arguido/recorrente pretende é sobrepor a sua versão dos acontecimentos àquela que o Tribunal a quo deu como provada. Para tal, pretende que as declarações que prestou são mais credíveis do que as declarações das testemunhas a que o Tribunal a quo atendeu na sentença, ou seja, pretende colocar o processo de formação da convicção do Tribunal a quo, o princípio da livre apreciação da prova. Ora, a impugnação da decisão sobre a matéria de facto não corresponde a um novo julgamento, como o arguido/recorrente aprece pretender. Quanto ao imputado vício decisório não vemos, nem o arguido/recorrente o explica, como os factos provados 4 e 16 estão em contradição entre si e se excluem, pois que ter “problemas de tendão e calcanhar em ambos os pés, dolorosos e que geram dificuldade de mobilidade”, não exclui necessariamente que não se possa dar pontapés. Em todo o caso, não se nos afigura que a sentença padeça deste vício, uma vez que do seu texto, conjugado com as regras da experiência comum e com os critérios da lógica e da normalidade, não resulta que exista uma evidente contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão quanto aos factos provados 4 e 16.” I.5. Da tramitação subsequente: Cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (C.P.P.), nada foi acrescentado. Efetuado o exame preliminar, foi indeferida a realização da audiência e convidado o recorrente a apresentar as conclusões do recurso da sentença condenatória, ao que aquele acedeu. Colhidos os vistos, foram os autos submetidos a conferência. Nada obsta ao conhecimento do mérito, cumprindo, assim, apreciar e decidir. II. Fundamentação: II.1. Dos poderes de cognição do tribunal de recurso: Está pacificamente aceite na doutrina (cfr., por exemplo, MESQUITA, Paulo Dá, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo V, 2024, Livraria Almedina, pág. 217; POÇAS, Sérgio Gonçalves, in “Processo Penal – Quando o recurso incide sobre a decisão da matéria de facto, Julgar, n.º 10, 2010, pág. 241; SILVA, Germano Marques da, in Curso de Processo Penal, Vol. III, 2.ª edição, 2000, pág. 335) e jurisprudência (cfr., por exemplo, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-02-2024, processo n.º 105/18.1PAACB.S12) que, sem prejuízo do conhecimento oficioso de determinadas questões que obstem ao conhecimento do mérito do recurso (cfr., por exemplo, art.º 410.º, n.º 2, do C.P.P.), são as conclusões que delimitam o seu objeto e âmbito, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19-10-2995, para fixação de jurisprudência, in Diário da República n.º 298, I Série A, págs. 8211 e segs.3). Na verdade, se o objeto do recurso constitui o assunto colocado à apreciação do tribunal de recurso e se das conclusões obrigatoriamente devem constar, se bem que resumidos, as razões do pedido (cfr. art.º 412.º, n.º 1, do C.P.P.) e, assim, os fundamentos de facto e de direito do recurso, necessariamente terão de ser as conclusões que identificam as questões que a motivação tenha antes dado corpo, de forma a agilizar o exercício do contraditório e a permitir que o tribunal de recurso identifique, com nitidez, as matérias a tratar. II.2. Das questões a decidir: II.2.A. Da correção de um lapso: Na motivação da decisão da matéria de facto exarada na sentença recorrida consta o seguinte parágrafo: “GG, namorado da testemunha FF refere ter visto da janela da sala do 5º andar, já ao escurecer, gritos e o arguido chão, a AA a agarrar o pescoço e o ofendido a bater no arguido, negando a existência de provocações verbais. Refere que o ofendido ficou com a cara vermelha, com camisa rasgada, óculos partidos, constatando apenas agressões dos ofendidos ao arguido e não vice-versa. Questionado sobre se tem a certeza do que viu, uma vez que a sua versão é díspar das demais, disse que sim.” Uma vez que o ofendido do sexo masculino nestes autos é BB, sendo o recorrente o arguido, tendo a expressão “ofendido” sido utilizada duas vezes no parágrafo em causa, é evidente que, na primeira o tribunal recorrido se estava a referir a BB e, na segunda, ao arguido. Trata-se, pois, de um mero lapso de escrita em que incorreu o tribunal recorrido, sendo o mesmo evidenciado pelo próprio texto da sentença recorrida, que não tem nem teve qualquer influência ou repercussão no sentido decisório da sentença recorrida e que é suscetível de correção oficiosa por esta instância de recurso, nos termos do art.º 380.º, n.ºs 1, al. b), e 2, do C.P.P. Pelo exposto e ao abrigo do citado preceito legal, onde na motivação da decisão da matéria de facto exarada na sentença recorrida consta: “Refere que o ofendido ficou com a cara vermelha, com camisa rasgada, óculos partidos, constatando apenas agressões dos ofendidos ao arguido e não vice-versa.” deve passar a ler-se: Refere que o arguido ficou com a cara vermelha, com camisa rasgada, óculos partidos, constatando apenas agressões dos ofendidos ao arguido e não vice-versa. II.2.B. Do objeto dos recursos: Tendo em conta o exposto quanto aos poderes de cognição do tribunal de recurso (cfr. II.1.), são as seguintes as questões a conhecer, pela ordem da prevalência processual sucessiva que revestem: II.2.B.a. Do recurso interlocutório: A. Se os despachos recorridos de 19 e 20-06-2023, ao não admitirem parte dos documentos juntos pelo recorrente na sequência da comunicação de uma alteração não substancial de factos, violaram o disposto no art.º 340.º do C.P.P. e/ou 358.º do C.P.P. ou omitiram diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade, estando feridos de nulidade (cfr. art.º 120.º, n.º 2, al. d), do C.P.P.) (cfr. II.4.A.). II.2.B.b. Do recurso da sentença condenatória: B. Se o tribunal recorrido, ao não ordenar a realização das diligências pertinentes para apurar a data das fotografias juntas, incorreu na nulidade por omissão de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade (cfr. art.º 120.º, n.º 2, al. d), do C.P.P.) (cfr. II.4.B.); C. Se a sentença recorrida padece do vício de contradição insanável da fundamentação, a que alude o art.º 410.º, n.º 2, al. b), do C.P.P., quanto aos factos tidos por provados nos pontos 4. e 16. (cfr. II.4.C.); D. Se a sentença recorrida é nula por falta de fundamentação no que se refere à decisão sobre a matéria de facto (cfr. arts. 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, al. a), do C.P.P.) (cfr. II.4.D.); E. Se a sentença é nula por indevida valoração como meio de prova de elemento processual insuscetível de tal valoração (cfr. II.4.E.); F. Se há erro de julgamento, nos termos do art.º 412.º, n.º 3, als. a) e b), do C.P.P. quanto aos factos tidos por provados na sentença recorrida em parte dos seus pontos 1., 6. e 9. e nos seus pontos 3., 4., 5., 12. a 13. (cfr. II.4.F.); e G. Se estão verificados os pressupostos para a dispensa de pena ou, em alternativa, se as penas parcelares e única são excessivas (cfr. II.4.G.). II.3. Ocorrências processuais com relevo para apreciar as questões objeto de recurso: Ora, com relevo para o definido objeto do recurso, e resultante dos atos processuais a seguir assinalados, importa atentar no seguinte: II.3.A. Do escrito de fls. 82 (cfr. fls. 80 a 82): No dia 26-02-2026, na esquadra da P.S.P. de Loures, AA, perante o agente JJ, após se identificar e ser informada da possibilidade de se recusar a prestar depoimento, o que declinou, entregou uma folha A4, escrita a computador, não assinada, desejando que o seu depoimento fosse o conteúdo daquela, tendo a mesma sido incorporada no processo. II.3.B. Do despacho do encerramento do inquérito (cfr. ref.ª 149138072 de ...-...-2021): II.3.B.a. Do despacho de arquivamento: Em 25-06-2021 o Ministério Público proferiu despacho de arquivamento relativamente a BB, quanto ao crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143.º, n.º 1, do Código Penal (C.P.) e quanto ao crime de dano, p. e p. pelo art.º 212.º, n.º 1, do C.P., alegadamente cometidos em 25-08-2019, entre as 20h30min e as 21h, junto ao edifício sito na ... e sobre a pessoa e bens, respetivamente, do recorrente. II.3.B.b. Do despacho de acusação: Em 25-06-2021 o Ministério Público deduziu acusação contra o recorrente imputando-lhe a prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso efetivo, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1 do Código Penal, relativamente a BB, e um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1 do Código Penal, relativamente a AA, porquanto considerou suficiente indiciados os seguintes factos: “1. O ofendido BB e a ofendida AA são casados entre si, nunca tendo o arguido ..., pai da ofendida AA, aceitado tal união. 2. No dia 25.08.2019, pelas 20h55, os ofendidos BB e AA, estavam a sair de um edifício sito na ..., após aí terem prestado as suas condolências pela morte de uma pessoa conhecida. 3. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, e no momento em que já se encontravam na via pública, o arguido, sem nada que o fizesse prever, e com recurso à força física, agarrou BB com os seus braços. 4. Em ato contínuo, o arguido desferiu diversos socos na face de BB e empurrou o mesmo contra o solo. 5. Nessa sequência, e após AA se ter colocado entre o seu marido e o seu pai, ora arguido, por forma a tentar defender o primeiro, o arguido desferiu dois socos na barriga de AA, projetando-a contra uma parede. 6. Das agressões sofridas, resultaram para BB dores e múltiplas escoriações a nível da região orbitária esquerda e membro superior e inferior direito. 7. Em virtude de tais lesões, BB teve de receber assistência médica no serviço de urgências do CC, onde deu entrada pelas 23h10, do dia 25.08.2019. 8. Tais lesões determinaram, para BB, oito dias para cura sem afetação da capacidade de trabalho. 9. Das agressões sofridas, resultaram para AA dores e escoriações no cotovelo esquerdo. 10. Em virtude de tais lesões, AA teve de receber assistência médica no serviço de urgências do CC, onde deu entrada pelas 23h13, do dia 25.08.2019. 11. Tais lesões determinaram, para AA, oito dias para cura sem afetação da capacidade de trabalho. 12. O arguido quis e conseguiu agir do modo descrito com o propósito, concretizado, de molestar o corpo e a saúde de BB e de AA, bem sabendo que deste modo lhes iria provocar dores e lesões, o que veio a suceder. 13. O arguido agiu, assim, de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal.” Foi indicada como prova: “(…) toda a dos autos, nomeadamente: A - Testemunhal: 1. AA - identificada a fls. 80; 2. BB - identificado a fls. 85; 3. KK - identificado a fls. 91; B - Pericial 1. Auto de exame direto – fls. 112-113; 2. Auto de exame direto – fls. 114-115. C - Documental 1. Auto de denúncia – fls. 2 e 3; 2. Auto de denúncia – fls. 6 e 7; 3. Ficha clínica sobre AA - fls. 74; 4. Ficha clínica sobre BB - fls. 102; 5. Aditamento n.º 1 – fls. 104.” II.3.C. Do requerimento de abertura de instrução apresentado pelo recorrente na qualidade de assistente (cfr. ref.ª 1136444 de 17-09-2021): Na sequência do despacho de arquivamento (cfr. II.3.B.a.), em 17-09-2021 o recorrente, na qualidade de assistente, requereu a abertura de instrução. II.3.D. Da documentação junta pelo arguido em 17-09-2021 (cfr. ref.ª 1136444 de 17-09-2021): O recorrente juntou aos autos a seguinte documentação: - Doc. n.º 1: Informação clínica do serviço de atendimento permanente da unidade hospitalar “Cuf” referente ao dia 25-08-2019, referindo como hora de admissão 22h04min e data e hora de alta o dia 26-08-2019, pelas 00h55min, com uma rubrica ao lado da inscrição “Nome: LL; n.º da Ordem dos Médicos: ...”; - Doc. n.º 2: Fatura/recibo V FR..., data de ...-2019, emitida em nome do arguido, referente a um episódio de urgência geral, no valor de EUR 40; - Doc. n.º 3: um relatório referente a estudo, referentes ao arguido e ao dia 25-08-2019 23:15, onde consta a menção “Dr(a): MM” e “OM: ...”, sem conter qualquer assinatura ou rubrica, cujo teor já era mencionado no Doc. n.º 1; - Docs. n.ºs 4 a 11: 8 fotografias; e - Doc. n.º 12: Fatura/recibo FT 1/..., de ...-2020 da “...”, em nome do arguido, e referente a uma armação e duas lentes, no valor de EUR 765, com a menção que, destes, já avia sido adiantado EUR 382, 50; Dois talões do pagamento em terminais de pagamento automático, ambos no valor de EUR 382, 50, um do dia ...-2020 e o outro de ...-2020, em nome do arguido. II.3.E. Da decisão instrutória (cfr. ref.ª 151422464 de 31-01-2022): Em 31-01-2022, foi proferido despacho de não pronúncia, relativamente a BB, quanto ao crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143.º, n.º 1, do Código Penal (C.P.) e quanto ao crime de dano, p. e p. pelo art.º 212.º, n.º 1, do C.P., pela qual foi considerada suficientemente indiciada a seguinte factualidade: “1-No dia 25 de Agosto de 2019 pelas 20H55 o assistente ... encontrava-se junto à entrada do edifício sito na .... 2- Nessas circunstâncias de tempo e lugar encontravam-se a sair do mesmo edifício BB e AA. 3- O assistente sofreu dores e escoriações em várias partes do corpo, tais como cabeça, braço e tórax. 4- O assistente ... recebeu assistência médica em serviço de atendimento permanente do Hospital CUF em Lisboa onde deu entrada pelas 22H04 do dia 25.08.2019. 5- Os óculos do assistente ficaram partidos”; e como não suficientemente indiciada a seguinte factualidade: “I- Ao avistar o assistente ... e sem que nada o fizesse prever o arguido BB começou a agredi-lo com as mãos e os pés desferindo-lhe vários golpes na face, membros superiores e zona do tórax, partindo-lhe os óculos e rasgando-lhe a camisa. II- As lesões e a assistência médica referidas em 3 e 4 resultaram das agressões referidas em I. III- Tais lesões determinaram-lhe para o assistente incapacidade para executar o seu trabalho. IV- De igual modo e ainda face às agressões do arguido o assistente também viu a sua camisa ficar rasgada e os seus óculos partidos. V- O arguido [BB] quis e conseguiu agir do modo descrito com o propósito concretizado de danificar os óculos e a camisa do assistente bem sabendo que deste modo lhe iria provocar danos o que veio a suceder. VI-O arguido [BB] agiu livre, deliberada e conscientemente bem sabendo que as suas condutas eram proibidas por lei.” O recorrente não interpôs recurso de tal decisão. II.3.F. Da contestação (cfr. ref.ªs 12768618 de 14-09-2023 e 12823223 de 28-09-2023): Em 14-09-2022, o recorrente apresentou contestação do seguinte teor: “No âmbito dos presentes autos, encontra-se o Arguido acusado pela prática de dois (2) crimes de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1 do Código Penal. O Arguido dispensa-se, para já, de se pronunciar, de forma integral, quanto aos concretos contornos factuais da imputação efetuada relegando a sua defesa para a audiência de discussão e julgamento.” II.3.G. Da alteração não substancial de factos comunicada (cfr. ref.ª 157161814 de 06-06-2023): No dia 06-06-2023, data designada para a leitura da sentença, pelo tribunal recorrido foi ordenada a reabertura da audiência de julgamento e proferido o seguinte despacho: “O Tribunal entende pertinente realizar uma comunicação, nos termos e para os efeitos do artigo 358º, n.º 1 do C.P.P., indiciariamente e da prova recolhida em sede de audiência de julgamento, designadamente tendo por base os depoimentos prestados pelos ofendidos, o Tribunal entende que será de comunicar o seguinte facto indiciariamente apurado: - Em ato contínuo o arguido desferiu diversos socos na face e na parte superior do corpo de BB, bem como pontapés na parte inferior e empurrou o mesmo contra o solo, entre outros. O Tribunal comunica tal circunstância aos sujeitos processuais para, querendo, exercerem o contraditório, nos termos e para os efeitos do artigo 358º, n. º1 do Código Processo Penal. Igualmente e por lapso do Tribunal verificou-se que no decurso da audiência de julgamento, e não obstante o arguido ter prestado declarações a final, da parte do Tribunal não foi recolhida, nem foram feitas diligências, no sentido de aferir da sua situação socio-económica. Por o Tribunal considerar pertinente para a boa decisão da causa tal informação, estando o arguido aqui presente, nesta data, entende-se que será igualmente de reabrir a audiência nos termos e para os efeitos previstos no artigo 369º, n. º2 e 371º, n. º1 do C.P.P..” De seguida, “dada a palavra à Ilustre Mandatária do arguido para se pronunciar no seu uso, em súmula, disse não prescindir do prazo para preparação de defesa, nos termos do artigo 359º, n. º4 do C.P.P. e 358º e requereu ainda que as declarações sobre a situação socio-económica do arguido sejam prestadas na data que vier a ser designada para continuação da presente audiência, em prazo não inferior a 10 dias.”, após o que foi proferido despacho concedendo “o prazo de 10 dias para a Defesa exercer o respetivo contraditório, sobre a comunicação agora realizada”, tendo sido designado o dia 20-06-2023, pelas 13h45min para continuação da audiência de julgamento. II.3.H. Do requerido pelo arguido em virtude daquela comunicação: II.3.H.a. Em 16-06-2023 (cfr. ref.ª 13911250 de 16-06-2023): Em 16-06-2023 o arguido apresentou um requerimento do seguinte teor: “(…) na sequência da comunicação de alteração não substancial dos factos nos termos do artigo 358.º n.º 1 do Código de Processo Penal, vem, nos termos do mesmo artigo, requerer a V. Exa. a junção da documentação clínica e fotográfica do estado do Arguido após as agressões sofridas durante o(s) facto(s) em discussão – conforme Documento 1 – bem como a junção de documentação clínica do Arguido que dá conta de problemas de saúde de que padece e que afectam a sua mobilidade – conforme Documento 2 – mais requerendo sejam tomadas novas declarações ao Arguido. No que concerne à documentação clínica do Arguido junta unitariamente como Documento 2, o Arguido desde já protesta juntar dois relatórios médicos que, apesar de solicitados imediatamente após a sessão de julgamento, não foram até ao momento entregues ao Arguido.” Juntou4 os seguintes documentos: 1. 11 fotografias não numeradas; 2. Cópia da informação clínica do serviço de atendimento permanente da unidade hospitalar “Cuf” referente ao dia 25-08-2019, referindo como hora de admissão 22h04min e data e hora de alta o dia 26-08-2019, pelas 00h55min, com uma rubrica ao lado da inscrição “Nome: LL; n.º da Ordem dos Médicos: ...”; 3. Um relatório referente a estudo, referentes ao arguido e ao dia 25-08-2019 23:15, onde consta a menção “Dr(a): MM” e “OM: ...”, sem conter qualquer assinatura ou rubrica, cujo teor já era mencionado na informação clínica do serviço de atendimento permanente da unidade hospitalar “Cuf ”; 4. Fatura/recibo V FR2019/..., data de ...2019, emitida em nome do arguido, referente a um episódio de urgência geral, no valor de EUR 40; 5. Guia de acolhimento e normas de amissão e frequência – medicina física e reabilitação – Clínica CUF não datado e não assinado, onde constam as regras referentes à avaliação médica, aos tratamentos de fisioterapia, às presenças e faltas, ao equipamento e vestuário e à cobertura dos tratamentos por seguradora ou subsistema; 6. Uma cópia de um relatório de imagiologia (RM coluna lombosagrada) referente ao arguido e a um exame realizado em 16-09-2016 onde se conclui: “hérnia subligamentar L5-S1 com expressão lateral esquerda, nomeadamente foraminal, podendo ocorrer algum compromisso ganglionar correspondente, a valorizar apenas no contexto clínico.”; 7. Uma cópia de uma marcação de uma consulta de ortopedia – anca para o dia 11-05-2017, pelas 15h; 8. Cópia da 2.ª via de 8 faturas, emitidas pela CUF, em nome do arguido, datadas de 09, 10, 15, 16, 18, 22, 23 e 25-01-2018, cada uma delas no valor de EUR 1, 40 e todas referentes a “Tratamento medicina física e reabilitação” e, em concreto, a “laserterapia de raios infra-vermelhos”, “massagem manual de mais de uma região”, “fortalecimento muscular/mobilização articular com monotorização contínua” e “manipulação de membros”; 9. Uma cópia do “Pedido de exames para imagiologia”, datado de 04-07-2018, e referente a “ECO PM-Tendão Aquiles”, assinado pelo médico requisitante; 10. Uma cópia do “Pedido de exames para imagiologia”, datado de 04-07-2018, e referente a “RX Tibio-Tarsica – 2 incidências” e “RX PE – 2 incidências”, assinado pelo médico requisitante; 11. Uma cópia do “Pedido de exames para imagiologia”, datado de 04-07-2018, e referente a “ECO PM-Tendão Aquiles”, assinado pelo médico requisitante; 12. Os pedidos de tais exames na CUF; 13. Cópia da 2.ª via de 1 faturas, emitida pela CUF, em nome do arguido, datada de 04-07-2018, no valor de EUR 1, 25 e referente a “Tratamento medicina física e reabilitação” e, em concreto, a “laserterapia de raios infra-vermelhos”, “massagem com técnicas especiais”, “técnicas especiais de cinesiterapia” e “fortalecimento muscular/mobilização articular com monotorização contínua”; 14. Um pedido de exames na ... (“RX Tibio-Tarsica – 2 incidências”, “RX PE – 2 incidências” e “ECO PM-Tendão Aquiles”); 15. Cópia da 2.ª via de 9 faturas, emitidas pela CUF, em nome do arguido, datadas de 03, 04, 06, 09, 11, 13, 16, 20 e ...-...-2018, cada uma no valor de EUR 1, 40 e referentes a “Tratamento medicina física e reabilitação” e, em concreto, a “laserterapia de raios infra-vermelhos”, “massagem com técnicas especiais”, “técnicas especiais de cinesiterapia” e “fortalecimento muscular/mobilização articular com monotorização contínua”; 16. Cópia da 2.ª via de 1fatura, emitida pela CUF, em nome do arguido, datada de …-2018, no valor de EUR 15 e referentes a “consulta subsq-fisiatria”; 17. Cópia da 2.ª via de 1 fatura, emitida pela CUF, em nome do arguido, datada de …-2018, cada uma no valor de EUR 130 e referentes a “Ressonância” e, em concreto, a “ressonância magnética”, “osteoarticular dedicada”, “ressonância magnética” e “osteoarticular dedicada”; 18. Cópia da 2.ª via de 3 faturas, emitidas pela CUF, em nome do arguido, datadas de 05 e 12-…-2018 e …-2018, cada uma no valor de EUR 70 e referentes a “terapia por ondas de choque – duas zonas”; 19. Uma cópia de marcação de “ondas de choque” para os dias 30-12-2020, pelas 14h, 05-01-2021, pelas 18h20min, 12-01-2021, pelas 18h40min, 10-01-2021, pelas 18h40min e 26-01-2021, pelas 18h40min; 20. Cópia da 2.ª via de 1 fatura, emitida pela CUF, em nome do arguido, datada de …-2020, no valor de EUR 55 e referentes a “terapia por ondas de choque – uma zona”; 21. Cópia de um recibo em nome do arguido emitido pela CUF, no valor de EUR 11, referente ao pagamento de duas faturas, uma referente a janeiro e a outra a fevereiro, ambas de 2021; 22. Cópia de 3 faturas, emitidas pela CUF, em nome do arguido, datadas de 12, 19 e …-2021, cada uma no valor de EUR 55 e referentes a “terapia por ondas de choque – uma zona”; 23. Um pedido de exames na CUF (“RX Cotovelo – 2 incidências”); 24. Um pedido de exames na CUF (“ECO Osteoarticular - cotovelo”); 25. Cópia de 1 fatura, emitidas pela CUF, em nome do arguido, datada de …-2021, no valor de EUR 55 e referente a “terapia por ondas de choque – uma zona”; e 26. Uma cópia de marcação de “ECO Osteoarticular - cotovelo” e “RX Cotovelo – 2 incidências” para o dia 03-02-2021. II.3.H.b. Em 19-06-2023 (cfr. ref.ª 13914444 de 19-06-2023): Em 19-06-2023, o arguido veio “(…) requerer a junção aos autos de relatório médico que protestou juntar em requerimento submetido aos autos no dia 16 de Junho de 2023, ao abrigo do artigo 358.º do C.P.P..” Juntou cópia de um relatório médico, assinado, datado de 16-06-20235 e do seguinte teor: “O Sr. ... é seguido desde Janeiro de 2018 na consulta de Fisiatria por queixas ao nível de em ambos os tendões de Aquiles, com repercussão importante nas atividades de vida diária. Tem realizado tratamento de fisioterapia e ondas de choque de forma regular na ... Era portador dos seguintes exames: Ressonancias magnéticas pés 8/8/2018: Alteracoes inflamatorias em ambos os tendoes de Aquiles, verificando-se espessamento com edema e entesopatia calcica na sua area de insercao no calcaneo.Admitimos existir conflito com o contorno postero-superior do calcaneo (Haglund) com hipersinal envolvente.Nao documentamos patologia disruptivaRestantes grupos tendinosos nao apresentam alteracoes.Integridade ligamentarNao ha expressao de liquido nos recessos articulares.A fascia plantar nao revela alteracoes significativas.Conclusao:Evidente tendinopatia inflamatoria aquiliana com expressao bilateral, evidenciando-se aspectos de entesopatia calcica insercional, e provavel conflito com o calcaneo (deformidade de Haglund), a ser valorizado clinicamente. Ecografia 13-7-2018 pés: Entesopatia expressiva dos tendoes aquilianos, mais expressiva a direita. Admite-se esporao posterior do calcaneo. Sem evidencia de roturas. Alteracoes inflamatorias ligeiras no tendao direito, caracterizadas por ligeiro espessamento e hipoecogenicidade estrutural. Rx 13-7-2018: Tibiotarsicas e pes 2pp. Normal imagem radiologica das tibio-tarsicas. Em relacao aos pes, observamos entesopatia calcica evidente da insercao distai do tendao de Aquiles bilateralmente. Sem outras alteracoes osseas ou articulares a referir. (imagem exuberante!!!) (…)” II.3.I. Da decisão do tribunal recorrido perante a defesa apresentada: II.3.I.a. Do despacho recorrido de 19-06-2023 (cfr. ref.ª 157300651 de 19-06-2023): No dia 19-06-2023 foi proferido o seguinte despacho pelo tribunal recorrido: “Visto. Tomei conhecimento do teor dos requerimentos apresentados pela defesa nesta data e em 16-06-2023. Notifique os demais sujeitos processuais do seu teor. * Desde já se adianta que a documentação apresentada em 16-06-2023 já constava dos autos, pelo que é desnecessária nova admissão. Quanto ao relatório apresentado nesta data, deverá o mesmo ficar junto aos autos, sem prejuízo do contraditório que sobre o mesmo possa ser exercido – v. Art.º 165º nº1 do CPP. * Em audiência de julgamento serão recolhidas declarações complementares ao arguido.” II.3.I.b. Do despacho recorrido de 20-06-2023 (cfr. ref.ª 157322621 de 20-06-2023): Na sessão da audiência de julgamento de 20-06-2023 foi pedida a palavra pela ilustre mandatária do recorrente que, no seu uso, disse: “Tendo tido conhecimento do despacho proferido pelo Tribunal, relativamente aos documentos juntos no dia 16, há algumas fotografias que já estavam juntas aos autos, mas há outras que não estavam, e todas elas são de dois dias depois, não sendo mencionada distinção no despacho proferido”; após o que foi proferido o seguinte despacho: “Na sequência da comunicação realizada pelo Tribunal, vem a defesa requerer a junção de mais documentação. Conforme já foi adiantado em despacho, no requerimento datado de 16 de junho do corrente ano, constam fotografias e documentação clínica que já se acha junta aos autos, sendo absolutamente desnecessário a sua repetição. No entanto, verificamos agora que existem três fotografias que não constam juntas no processo e não obstante de se entender que as mesmas são absolutamente irrelevantes no caso concreto, atenta a comunicação agora realizada pelo Tribunal, mas tendo em vista a conferir o direito de defesa pelo arguido, admite-se a sua junção aos autos, correspondentes às fotografias, que não estão numeradas mas pela ordem que constam no requerimento serão as fotografias números 10 a 12 do requerimento datado de 16 de junho do corrente ano. Igualmente, nesse requerimento se faz menção a uma guia de acolhimento e normas de admissão a medicina física e reabilitação na CUF Alvalade, e tal documento parece-nos tratar-se de uma cópia e que se quer se acha assinado, pelo que da perspetiva do Tribunal esta guia de acolhimento é absolutamente irrelevante para a prova vertida na acusação pública e para o facto comunicado pelo Tribunal. No que concerne ao relatório de interpretação datado de 16-09-2016, o Tribunal admite a sua junção aos autos, constando do mesmo um eventual problema clínico do aqui arguido. No mais, no que concerne às marcações de ato, faturas referentes a 2017, 2018 a 2021, que constam desse mesmo requerimento datado de 16-06-2023, o Tribunal entende que, perante a defesa assumida pelo arguido, nesta sessão de audiência de julgamento, tal documentação, da nossa perspetiva, não se revela pertinente, tendo em consideração a factualidade constante na acusação pública e, bem assim, aquela comunicada e considerando a defesa assumida pelo arguido até este momento e na sua contestação. No mais, a documentação agora apresentada e em concretização e complemento do que já consta, admite-se a sua junção aos autos. Importa ainda pelo Tribunal esclarecer o seguinte: Nos presentes autos o arguido na sua contestação não apresentou qualquer versão divergente, o mesmo não consta como demandante civil, pelo que o Tribunal entende que toda a documentação, cuja junção agora se requer, não se revela pertinente para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa, considerando o objeto do processo e a comunicação realização pelo Tribunal. No mais, viabilizando a linha de defesa e argumentativa assumida no decurso da audiência de julgamento, no que tange às fotografias e ao relatório médico a que se fez menção o Tribunal admite a sua junção aos autos, ao abrigo do disposto no artigo 165.º, n. º 1 e 340.º, n.º 1 do C.P.P.” II.3.J. Da posição da defesa em face de tais decisões (cfr. ref.ª 157322621 de 20-06-2023): Após a prolação das ditas decisões (cfr. II.3.I.), na dita sessão da audiência de julgamento, foi pedida a palavra pela Ilustre mandatária do arguido, que no seu uso disse: “A defesa do arguido face ao despacho agora proferido e, ainda, face ao despacho datado de 19-06-2023, vem invocar a nulidade dos mesmos, nos termos do artigo 120.º n.º 2 al. d) parte final, na medida em que os documentos cuja a junção não foi admitida por se considerar exteriores ou irrelevantes face ao objeto, porquanto tais documentos prendem-se, precisamente, com a comunicação efetuada por este Tribunal, no que concerne aos pontapés, que não constavam da acusação e sobre os quais em momento anterior não fazia sentido juntar prova em sentido contrário. Face ao exposto e ainda que o arguido nas suas declarações vá apenas clarificar os motivos pelos quais tal facto não corresponde nem poderia corresponder à verdade, os documentos cuja junção foi indeferida, pese embora, tenham sido juntos ao abrigo do artigo 358.º revelam-se essenciais para corroborar com aquilo que é a condição médica do arguido, nulidade que deverá ser declarada com as devidas consequências legais.” II.3.K. Da decisão do tribunal recorrido sobre a nulidade arguida (cfr. ref.ª 157322621 de 20-06-2023): Na dita sessão da audiência de julgamento, sobre o mencionado requerimento (cfr. II.3.J.), foi proferida a seguinte decisão pelo tribunal recorrido: “Vem a defesa do arguir a nulidade do nosso anterior despacho, ao abrigo do disposto no artigo 120. º, n.º 1 al. b) parte final do C.P.P. Nos presentes autos, o objeto do processo mostra-se devidamente delimitado pelo teor da acusação pública, sendo que, não obstante o arguido ter vindo suscitar a abertura de instrução, o despacho que sobre ela recaiu e que não acolheu a sua pretensão não mereceu qualquer reação por parte da defesa do mesmo. Assim sendo, e a esse propósito e no que tange a essa parte, a apreciação da causa e a decisão de não pronúncia nessa matéria, mostra-se devidamente transitada em julgado. No âmbito da presente sessão de audiência de julgamento e considerando o teor da contestação do arguido nos presentes autos, não foi adiantada qualquer versão sobre o modo como os factos decorreram, limitando-se o arguido a proferir declarações a final e arrolando prova testemunhal que foi devidamente ouvida em sede de audiência de julgamento. É certo que a versão trazida em audiência pelo arguido é antagónica àquela que consta da acusação. Todavia, não se afere que estando concluída a produção de prova e cingindo-se o presente incidente ao uma concretização de um facto já constante da acusação pública, que se possa neste momento colocar em causa todo o demais. Efetivamente, o exercício do direito da defesa do arguido esta circunscrito ao facto comunicado pelo Tribunal. Não se compreende a relevância de junção aos autos de faturas e agendamentos de atos médicos e, bem assim, de guia de acolhimento de caráter genérico e que sequer é direcionado, em exclusivo, ao utente e aqui arguido. Na verdade, não se alcança em que medida é que tal documentação poderá de alguma forma colocar em causa ou auxiliar o Tribunal, na descoberta da verdade material, sobre o facto comunicado na passada sessão de audiência de julgamento. Acresce que, a documentação que o Tribunal não admitiu e que agora se coloca em causa, com o requerimento formulado, invocando a respetiva nulidade, reportam-se a datas anteriores e posteriores aos factos em apreço, nos presentes autos. Não se alcançando o propósito visado com o mesmo, uma vez que, e por parte da defesa, nada foi concretizado sobre essa matéria e sobre a essencialidade de tal documentação e o respetivo motivo. Por outro lado, não se pode em audiência de julgamento tentar colmatar o que não foi, oportunamente, realizado e nem colocar em causa uma situação que já se mostra transitada em julgado. Acresce ainda dizer que, em abono da defesa que o arguido vem assumindo nesta audiência de julgamento, o Tribunal admitiu a junção aos autos das fotografias, complementares daquelas que já constavam dos mesmos autos e, bem assim, de um relatório médico viabilizando a possibilidade do exercício do direito de defesa nesta matéria, inclusivamente, sobre a sua eventual condição clínica à data dos factos e posterior aos mesmos. Nesta senda, entendemos que não foi preterida qualquer formalidade essencial, tendo em vista a descoberta da verdade material e a boa decisão da causa e, bem assim, considerando o incidente gerado ao abrigo no disposto no artigo 358.º, nº 1 do C.P.P. Assim sendo, e por todo o exposto, consideramos que inexiste qualquer nulidade a ponderar muito menos aquela a que se faz alusão e ao abrigo no disposto no artigo 120.º, n.º 1 al. d) in fine, do C.P.P., indeferindo-se, por isso, o agora requerido.” II.3.L. Da leitura/audição de declarações ou depoimentos prestados em fases anteriores: Da leitura das atas da audiência de julgamento e da audição integral da gravação das declarações e depoimentos aí prestados, bem como dos requerimentos então efetuados e despachos proferidos nessa sede, não consta que aí tenha sido requerida e/ou ordenada a leitura/audição de declarações ou depoimentos prestados em fases anteriores (cfr. arts. 356.º e 357.º do C.P.P.) II.3.M. Do relatório da sentença recorrida (cfr. ref.ª 157356450 de 23-06-2023): No relatório da sentença recorrida, para além do mais, consta: “(…) Na sequência do despacho proferido em acta datado de 20-06-2020 e em que foi apreciada a junção de documentação e indeferiu a requerida nulidade suscitada pela defesa, deverá constar dos autos em papel cópia de toda a documentação que se pretendeu juntar pela defesa, para cabal esclarecimento, ficando nos autos e como admitida aquela que o foi expressamente, determinando a devolução ao apresentante dos originais.” II.3.N. Da matéria de facto considerada na sentença recorrida: Foi a seguinte a matéria de facto considerada em sede de sentença recorrida pelo tribunal de 1.ª instância: “A) Factos Provados Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos, com interesse para a sua decisão: 1. O ofendido BB e a ofendida AA são casados entre si, nunca tendo o arguido ..., pai da ofendida AA, aceitado tal união. 2. No dia 25.08.2019, pelas 20h55, os ofendidos BB e AA, estavam a sair de um edifício sito na ..., após aí terem prestado as suas condolências pela morte de uma pessoa conhecida. 3. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, e no momento em que já se encontravam na via pública, o arguido, sem nada que o fizesse prever, e com recurso à força física, agarrou BB com os seus braços. 4. Em ato contínuo, o arguido desferiu diversos socos na face e na parte superior do corpo de BB, bem como pontapés e empurrou o mesmo contra o solo, entre outros. 5. Nessa sequência, e após AA se ter colocado entre o seu marido e o seu pai, ora arguido, por forma a tentar defender o primeiro, o arguido desferiu dois socos na barriga de AA, projetando-a contra uma parede. 6. Das agressões sofridas, resultaram para BB dores e múltiplas escoriações a nível da região orbitária esquerda e membro superior e inferior direito. 7. Em virtude de tais lesões, BB teve de receber assistência médica no serviço de urgências do CC, onde deu entrada pelas 23h10, do dia 25.08.2019. 8. Tais lesões determinaram, para BB, oito dias para cura sem afetação da capacidade de trabalho. 9. Das agressões sofridas, resultaram para AA dores e escoriações no cotovelo esquerdo. 10. Em virtude de tais lesões, AA teve de receber assistência médica no serviço de urgências do CC, onde deu entrada pelas 23h13, do dia 25.08.2019. 11. Tais lesões determinaram, para AA, oito dias para cura sem afetação da capacidade de trabalho. 12. O arguido quis e conseguiu agir do modo descrito com o propósito, concretizado, de molestar o corpo e a saúde de BB e de AA, bem sabendo que deste modo lhes iria provocar dores e lesões, o que veio a suceder. 13. O arguido agiu, assim, de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal. Mais se provou, 14. Em consequência da conduta do arguido os ofendidos careceram de receber tratamento médico e Hospitalar junto do CC, o que sucedeu no próprio dia acima descrito, com custo de € 115,57 para os cuidados prestados à ofendida AA e de € 179,07 para os cuidados prestados ao ofendido BB, no valor global de €294,64. Provou-se ainda quanto às condições pessoais do arguido, 15. O arguido tem 64 anos. 16. Padece de diversos problemas de saúde ao nível lombar, gastrointestinal, próstata e problemas de tendão e calcanhar em ambos os pés, dolorosos e que geram dificuldade de mobilidade, mas que não impedem o normal decurso do seu dia-a-dia, não detendo qualquer incapacidade diagnosticada ou declarada. 17. Vive com a mulher e com um filho menor de 16 anos. 18. É empresário no ramo da … e …, em .... 19. Vive da actividade desenvolvida, auferindo cerca de €3.800,00 mensais 20. A mulher trabalha com o arguido e no mesmo ramo, auferindo cerca de €1.250,00 mensais. 21. Habita com a família em casa cedida pela empresa de que o arguido é titular, sem pagar renda pela mesma até este momento. 22. Tem o 11º ano de escolaridade. 23. Do seu certificado do registo criminal nada consta. B) Factos Não Provados Não deixaram de se provar quaisquer outros factos com relevância para a boa decisão da causa. Não se provaram outros factos repetidos, conclusivos, acessórios e sem relevância para a decisão da causa.” II.3.O. Dos motivos de facto, indicação e exame crítico das provas exarados na sentença recorrida: É a seguinte a motivação da decisão de facto apresentada pelo tribunal de 1.ª instância: “O Tribunal gizou a sua convicção atendendo ao conjunto das diligências realizadas em audiência, analisando-as global e criticamente, segundo as regras da experiência comum e segundo a livre convicção do julgador, nos termos do Art.º 127.º do Código de Processo Penal. Em sede de audiência o arguido compareceu e optou por falar apenas afinal, negando quaisquer agressões aos ofendidos ou mal-estar com o casamento de ambos, aludindo que eles é que o agrediram, tendo optando inicialmente por nada fazer dadas as relações de parentesco. Mais disse que não foi contra o casamento dos ofendidos e que não compreende o motivo pelo qual a filha saiu de casa sem avisar. Diz sofrer de problemas de saúde e que limitam a sua actividade física, o que sucede há vários anos, apesar de não deter qualquer incapacidade declarada. Não obstante as declarações prestadas pelo arguido, estas não se revelaram totalmente críveis, considerando a postura assumida nos autos, os despachos de arquivamento proferidos e o despacho de não pronúncia nesta matéria, conjugado com a globalidade da demais prova. Igualmente não se revelou totalmente crível a versão do arguido, porquanto os seus problemas de saúde gravosos não foram anteriormente adiantados e nem confirmados pelas testemunhas de defesa, sendo que a postura do arguido e no decurso do julgamento não levantou qualquer questão nessa matéria. Igualmente a documentação junta aos autos e sobre a questão de saúde do arguido não permite outras conclusões. Pelo Tribunal foi especialmente valorado o depoimento dos ofendidos AA e BB, que corroboraram a acusação, referindo que o arguido e a família foram contra o seu casamento e que lhe vêm movendo verdadeira perseguição e a outros familiares do ofendido, fazendo com que tenham mudado de país. Esclareceram que na ocasião e no seguimento da morte de um amigo comum e a quem foram prestar condolências à família, cruzaram-se no exterior do edifício com arguido que, ao vê-los e sem motivo ficou exaltado, começando aos gritos, com insultos e ameaças, sendo que o arguido veio na direcção do ofendido BB, agarrou-o e começou a agredir com socos na parte superior do corpo e também com pontapés, caindo ao chão, e que mediante auxilio da ofendida AA e que se colocou no meio, o arguido e seu progenitor agrediu-a com socos na barriga, desequilibrando-se e ao tentar segurar-se, esta rasgou a camisa do progenitor e aqui arguido. Ambos disseram ter ficado com lesões e careceram de tratamento médico, apresentando queixa de imediato. Negam que outras pessoas tenham presenciado o sucedido, salvo a testemunha de acusação já falecida, esclarecendo que o progenitor tem influência junto da comunidade em que se inserem e que esta tomou partido pelo arguido. Mais disseram que o arguido é violento em contexto familiar, que não é a primeira vez que é agressivo, designadamente com a progenitora da ofendida. Tais declarações revelaram-se críveis, pelos motivos expostos e apelando às regras da experiência, mantendo a versão dos factos ao longo do processo, em especial considerando as denúncias e o teor de fls. 82, admitindo-se algumas discrepâncias de pormenor motivadas pelo lapso temporal decorrido. Aliás, tal versão mostra-se consentânea com as fichas clínicas e com as lesões atestadas por exame pericial. As testemunhas de defesa, DD, FF, GG e EE apresentaram outra versão dos factos. Não podemos deixar de notar que tais testemunhas e indicando deter conhecimentos dos factos, não foram indicadas em sede de inquérito ou instrução, não obstante a postura do arguido nesta matéria, o que não podemos deixar de estranhar e notar. DD, funcionário do arguido e antigo colega da ofendida AA refere que o arguido é meigo e protector da mesma, que não era contra o namoro desta, ao mesmo tempo que alude que a ofendida é que tem personalidade explosiva e que até viu a mesma a agredir o arguido numa reunião de trabalho, tal como o ofendido BB e a sua família é que são conflituosos. Questionado admite que não detinha uma boa relação com a ofendida AA. EE, mulher do arguido e mãe da ofendida refere que a família sempre foi compreensiva com a mesma, apenas solicitando que esta reflectisse e ponderasse a relação, para conhecer melhor BB, não compreendendo a sua atitude de abandonar a família e sair de casa sem justificação. Nega que o marido seja agressivo ou violento, mas refere que a filha AA é impulsiva, dando a entender que já tiveram problemas com a mesma, mas sem esclarecer. Mais refere que a ofendida AA era competente e profissional, fazendo parte da empresa familiar, considerando-se a testemunha a sua melhor amiga. No dia dos factos apenas ouviu os gritos do marido e viu o mesmo magoado e com ferimentos, nada presenciando, mas confirmando a versão apresentada pelo arguido dos factos. Confrontada com a personalidade explosiva do arguido e se chegou a apresentar queixa contra o mesmo e por mais que uma vez, negou inicialmente, apenas admitindo mais à frente no seu depoimento que o chegou a fazer, devido a dificuldades de comunicação, o que não se considera crível. A testemunha FF confirmou que a ofendida e o marido vieram a casa do seu falecido progenitor prestar condolências, e que ninguém os confrontou ou pressionou, sendo que a determinada altura e coincidindo com a saída dos ofendidos, ouviu barulho e gritos no exterior em virtude de deter a janela aberta. Refere que o namorado GG presenciou também, estando no escritório. Descendo as escadas, verificou a discussão entre arguido e ofendida, visualizando a última a querer agredir o arguido, com discussões e estando em cima do mesmo, havendo necessidade do seu namorado GG e do seu irmão separar os ofendidos do arguido. Mais disse que o arguido ficou com a camisa rasgada, óculos partidos e cara arranhada. Não viu agressões e não presenciou lesões físicas nos ofendidos. GG, namorado da testemunha FF refere ter visto da janela da sala do 5º andar, já ao escurecer, gritos e o arguido chão, a AA a agarrar o pescoço e o ofendido a bater no arguido, negando a existência de provocações verbais. Refere que o arguido ficou com a cara vermelha, com camisa rasgada, óculos partidos, constatando apenas agressões dos ofendidos ao arguido e não vice-versa. Questionado sobre se tem a certeza do que viu, uma vez que a sua versão é díspar das demais, disse que sim. O tribunal valorou ainda a documentação junta aos autos, a qual não foi posta em crise de forma cabal e por isso foi especialmente ponderada, em especial autos de denúncia – fls. 2 e 3, 6 e 7; fichas clínicas sobre AA a fls. 74 e sobre BB a fls. 102; aditamento n.º 1 – fls. 104; documentação junta com o pedido de indemnização civil e em especial facturas de fls. 225 e 226 e que permite aferir o prejuízo do demandante. O Tribunal valorou ainda a demais documentação junta aos autos pela defesa do arguido, em sede de inquérito e instrução, bem como aquela admitida no final da audiência de julgamento. E nesta senda, decorrendo das fotografias alegadas marcas físicas para o arguido e bem assim, que o mesmo sofre de outros problemas de saúde, tal documentação só por si não permite infirmar que os factos decorreram como descrito pelos ofendidos, dado o estado de exaltação adiantado ao arguido e bem assim, a necessidade de defesa indicada pelos ofendidos. Já no que tange aos problemas de saúde do arguido, da sua presença em julgamento não decorrem lesões físicas evidentes e que inviabilizem a sua normal deslocação, o acto de sentar e levantar, subir de escadas, permanecer de pé durante tempo considerável (vários minutos) e enquanto presta declarações, sendo que não careceu de ser auxiliado por terceiros e nem faz uso de qualquer aparelho auxiliador. Igualmente e da documentação clínica apresentada pelo arguido não decorre a existência de qualquer concreta incapacidade física ou limitação de movimentos. O Tribunal valorou ainda o teor dos autos de exame directo de fls. fls. 112-113 e fls. 114-115, que se revelaram críveis, sendo por isso valorados, de onde decorre a existência de lesões e nexo causal entre o evento e os danos físicos sofridos, sendo que o seu teor se mostra subtraído à livre convicção do julgador nos termos do Art.º 163º nº1 do C.P. Penal. Analisando criticamente a prova, verificamos que a versão da acusação se revelou coerente, decorrendo de prova documental, pericial e testemunhal bastante, revelando-se a mesma concludente e atinente às regras da lógica e da experiência, designadamente o motivo da divergência familiar, apresentando a mesma versão ao longo dos autos, provando-se toda a factualidade acusatória, incluindo os apectos objectivos e subjectivos, bem como os factos comunicados, considerando a versão dos ofendidos. Na verdade, a versão da defesa não se revela crível, desde logo porquanto o arguido visou efectivamente incriminar os ofendidos incluindo a ofendida AA sua filha, desde logo considerando o despacho de arquivamento prévio e o requerimento de abertura de instrução. Por outro lado, não se compreende o motivo de tais testemunhas de defesa apenas agora terem sido indicadas. Considerando a versão da progenitora da ofendida e mulher do arguido esta não se revela crível, designadamente que perante uma família generosa, compreensiva e sem qualquer motivo em concreto esta última ofendida tenha optado por casar em segredo e abandonar a residência familiar sem qualquer justificação. Acresce que a testemunha querendo proteger o arguido e seu marido, apenas quando confrontada admitiu ter apresentado queixa contra o mesmo em determinada altura, sendo que a justificação revelada não se revela plausível à luz das regras da experiência. A testemunha DD evidenciou estar de mal com os ofendidos, evidenciando parcialidade, designadamente devido a confrontos com o ofendido BB, e bem assim com a ofendida AA, tal como a testemunha EE, tomando parte pelo marido e aqui arguido, sem esclarecer porque desconsidera a versão da ofendida, enquanto que as testemunhas FF e GG apresentaram versão diferente do modo como se desenrolaram os eventos presenciados. Neste último caso, não se compreende como alguém conseguiu visionar perfeitamente agressões a partir de um quinto andar, quando a própria namorada e testemunha, FF, chegando ao local dos factos disse nada ter presenciado de agressões. Aliás, não se compreende que estando a testemunha GG na sala, conforme alude, tenha ouvido e visto tudo o sucedido e os demais não, sendo que a sua namorada o coloca até noutra divisão, quando foi o próprio que deu o alerta, segundo a versão da testemunha FF. A versão das testemunhas FF e GG apresentam contradições, denotam ter tomado partido nos factos, evidenciando clara parcialidade e por isso, tais depoimentos são desconsiderados, não se revelando credíveis. Importa ainda realçar a circunstância de o arguido apenas prestar depoimento depois de produzida toda a prova, nada acrescentando e nada visando acrescentar, não pretendendo responder as questões concretas, denotando ao longo do julgamento explosões de personalidade e que apenas cessaram quando evidenciadas pelo Ministério Publico. Resta acrescentar que não se alcança credibilidade na versão do arguido e das suas testemunhas, mesmo apelando às regras da lógica e da experiência, que perante a actuação manifestamente agressiva dos ofendidos e perante situação de superioridade numérica que até terão presenciado, nada conseguiram conter em concreto, sendo que só agora surgem no processo. Por outro lado, a versão dos ofendidos revela-se mais plausível, coerente ao longo dos autos, aludindo ao estado de fúria e exaltação do arguido e optando apenas por se defender, esclarecendo o ofendido BB que detendo até conhecimentos de artes marciais optou por nada fazer dadas as relações de parentesco. Aliás, se eram os ofendidos os agressores, porque motivo foram apresentar queixa e ao hospital de imediato, evidenciando lesões físicas? Se eram os ofendidos os agressores, dada a juventude e superioridade numérica e os especiais conhecimentos de BB, porque motivo não ocorreram outras consequências mais gravosas para com o arguido? Tão-pouco se pode imputar aos ofendidos móbil económico, uma vez que não deduziram pedido de indemnização civil. Confrontando com a versão do arguido, que nada em concreto pretendeu esclarecer, os seus problemas de saúde não o impedem de fazer uma vida relativamente normal e nem que num acto de fúria se tenha excedido com murros e pontapés. As limitações descritas não inviabilizam tal actuação de forma manifesta. Assim sendo, a data dos factos decorre atestada com base nos autos de denúncia e confirmados em audiência pelos ofendidos. O circunstancialismo de tempo e lugar dos factos foi corroborado por todos, decorrendo ainda das denúncias apresentadas, provando-se nessa medida. A concreta actuação do arguido e dirigida a cada um dos ofendidos foi corroborado pelos ofendidos e aqui testemunhas, enquanto que o motivo das desavenças foram admitidos igualmente pelos ofendidos e em parte pelas testemunhas de defesa. Aliás, se nada existisse entre arguido e ofendidos, qual a razão para as divergências e o porquê das testemunhas de defesa tomarem conhecimento das mesmas, se nada se passava? Não se compreende. As concretas lesões apresentadas pelos ofendidos são compatíveis com a descrição realizada dos factos, existindo nexo de causalidade com uma acção contundente, desde logo a ofendida AA ao bater contra a parede, apresentando escoriações ao nível do cotovelo, enquanto que o ofendido BB apresentada escoriações múltiplas na face, membros superior e inferiores, sendo compatíveis com o agarramento, com o desferimentos de socos e pontapés e bem assim com a queda a que alude e por actuação do arguido e provando-se nessa medida. Não podia o arguido negar a proibição inerente à sua conduta quando globalmente considerada em sociedade. Nenhuma dúvida assistiu ao Tribunal sobre a dinâmica dos factos, uma vez que a versão da defesa e das suas testemunhas não se revelou convincente, evidenciando as últimas clara parcialidade. Mesmo a documentação clínica apresentada pelo arguido e constante dos autos não permite infirmar a versão da acusação (fls. 250 ss. e mesmo aquela junta em audiência.). Aliás, as testemunhas de defesa ao aludirem que não presenciaram tudo desde o princípio, até pela diferente localização, não podem dar a certeza que foram os ofendidos a iniciar a contenda de forma crível, sendo que tal sequer foi expressamente admitido pelo arguido, não querendo e nada esclarecendo com rigor e quando questionado. Igualmente e pela parcialidade evidenciada não nos é possível concluir que as lesões constantes das fotografias apresentadas pelo arguido e do seu aspecto decorram da situação descrita, uma vez que as datas nas máquinas podem até ser manipuladas, bem como que o estado apresentado não tenha sido decorrente da sua mesma actuação exaltada e enfurecida e da necessidade de defesa dos ofendidos, admitindo os últimos que careceram de afastar o arguido e bem assim que em desequilíbrio a ofendida segurou-se na camisola do arguido e que rasgou involuntariamente para evitar a queda. Igualmente se provou a factualidade inerente ao pedido de indemnização civil, decorrente da versão dos ofendidos e considerando a documentação clínica e a factura junta aos autos. Outra factualidade não foi ponderada, porquanto sequer consta da contestação do arguido, inexistindo outros factos relevantes e que importem aditar, para além daqueles que foram comunicados. A inexistência de antecedentes criminais do arguido está devidamente certificada e não foi questionada, provando-se nessa medida. As condições pessoais do arguido resultam apuradas com base nas suas declarações e nas pesquisas realizadas, críveis nesta parte. Inexistem factos não provados.” II.3.P. Da escolha e determinação da medida concreta das penas na sentença recorrida: É a seguinte a fundamentação da escolha e determinação da medida das penas: “(…) Assente que está que o arguido praticou dois crimes de ofensa à integridade física simples, tais ilícitos são punidos com pena de prisão de 1 mês a 3 anos ou com multa de 10 a 360 dias, atento o disposto nos Arts.º 41.º, nº 1, 47º nº 1 e 143º nº 1, todos do Código Penal, importando ainda ponderar o disposto no Art.º 16º nº 3 do C. Penal. O Art.º 40.º do Código Penal dispõe que a aplicação de uma pena visa a protecção de bens jurídicos, no sentido de tutela da crença e confiança da comunidade na sua ordem jurídico-penal e a reintegração do agente na sociedade, não podendo a pena ultrapassar a medida da culpa. Segundo o disposto no Art.º 71.º do Código Penal, a determinação da medida concreta da pena deverá, por seu turno, ser feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo o tribunal, no caso concreto, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele. Assim, há que considerar no caso concreto: - o grau de ilicitude dos factos, que se considera médio/alto, atento o modo como foram executados, o contexto e os motivos, e as consequências da actuação do arguido (ainda que as últimas não especialmente gravosas); - o dolo intenso revelado; - a postura em audiência perante os factos e não reconhecendo a gravidade e censurabilidade da sua conduta; - as relações familiares entre arguido e ofendidos e o facto das desavenças não se mostrarem ultrapassadas; - o facto do arguido estar inserido, a trabalhar, contando com apoio familiar e sendo bem reputado; - a circunstância de ser primário. Na determinação da medida concreta da pena, cumpre analisar conjuntamente as exigências de prevenção geral com as exigências de prevenção especial, que no caso concreto se fazem sentir. Dispõe o Art.º 70.º do Código Penal que (...) se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (...). Relativamente às exigências de prevenção geral, considera-se que in casu as mesmas são bastantes elevadas, dada a frequência com que ocorrem situações como as dos autos, geradoras de grande alarme social. No que respeita à prevenção especial, tais exigências são médias, atento o condicionalismo e as consequências dos factos. Assim e a favor do arguido é ponderado o facto de estar inserido, sendo primário. Contra o mesmo, a ilicitude e dolo intenso revelado, bem como a postura em julgamento. Por tudo o que acima foi visto e considerado, atendendo às necessidades de prevenção geral e especial que cabem ao caso, entendemos ser ainda adequado aplicar ao arguido e no caso concreto, uma pena de multa, por a mesma realizar de forma adequada, cabal e suficiente as finalidades da punição, satisfazendo plenamente os fins de prevenção geral e especial que se pretendem alcançar com a aplicação de uma sanção penal, mantendo intactas as expectativas da comunidade na validade das normas jurídicas violadas, mas devendo a mesma evidenciar a postura e a culpa do arguido. Sopesando todas as referidas circunstâncias, e, ponderando o disposto no Art.º 47.º, n.º 1 do Código Penal, entendemos como adequada a aplicação de uma pena de 120 (cento e vinte) dias de multa e para cada um dos ilícitos, respectivamente. No que se refere ao montante diário da pena de multa, preceitua o Art.º 47.º, n.º 2, do Código Penal, na redacção vigente e aplicável in casu que (...) cada dia de multa corresponde a uma quantia entre € 5 e € 500,00, que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais (...), ou seja, o montante diário da multa deve ser fixado em termos de constituir um sacrifício real para o condenado sem, no entanto, deixar de lhe serem asseguradas as disponibilidades indispensáveis ao suporte das suas necessidades e do respectivo agregado familiar. Assim, tendo em consideração a realidade sócio-economica do país, a evolução dos preços do consumidor, o valor do salário mínimo e considerando as condições pessoais do arguido, sendo que os valores mínimos estão adstritos para situações de carência social e financeira, que não é o caso, recorrendo a juízos de equidade, afigura-se adequada a fixação de uma taxa diária de € 15,00 (quinze euros). * Dado que nos presentes autos ocorre uma situação de concurso real de infracções (cfr. Art.º 30.º, n.º 1 do Código Penal), há deste modo que realizar o cúmulo entre as penas parcelares aplicadas. Nos termos do Art.º 77.º do Código Penal, a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, (não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e os 900 dias se for pena de multa) e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, considerando ainda o recurso ao disposto no Art.º 16º nº3 do C. P. Penal. Assim sendo, e no que concerne às penas de multa aplicadas, por revelarem idêntica natureza, fixa-se o limite máximo da pena em 240 (duzentos e quarenta) dias e o mínimo em 120 (cento e vinte) dias de multa. A pena do concurso é determinada, dentro da moldura referida, atendendo, em conjunto, aos factos e à personalidade do arguido. Tudo ponderado, designadamente os factores agravantes e atenuantes nos termos em que nos reportamos supra, decide-se aplicar ao arguido, em cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas, a pena única de 160 (cento e sessenta) dias de multa, à mesma taxa diária supra referida. (…)” II.4. Da apreciação das questões objeto do recurso: Cumpre agora analisar as já elencadas questões suscitadas pelo recorrente: II.4.A. Da não admissão de parte dos documentos juntos pelo arguido na sequência da comunicação de uma alteração não substancial de factos: O facto comunicado ao abrigo do disposto no art.º 358.º, n.º 1, do C.P.P. foi: “Em ato contínuo o arguido desferiu diversos socos na face e na parte superior do corpo de BB, bem como pontapés na parte inferior e empurrou o mesmo contra o solo, entre outros.” (cfr. II.3.N.). Ora, no despacho de acusação, constava: “Em ato contínuo, o arguido desferiu diversos socos na face de BB e empurrou o mesmo contra o solo.” (cfr. II.3.B.b.). Efetivamente, trata-se de uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação com relevo para a decisão da causa, pois que, consubstanciando modificações no que se refere à conduta (não seriam apenas socos mas também pontapés que teriam sido desferidos pelo recorrente) e às zonas atingidas (os socos não teriam atingido diretamente apenas a face da vítima mas também a parte superior do seu corpo, sendo que também teria sido atingida na parte inferior do corpo, desta feita por pontapés) quanto a uma das agressões físicas imputadas ao recorrente, o certo é que não têm por efeito a imputação de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis (cfr. art.º 1.º, al. f), do C.P.P.). Na sequência da comunicação efetuada, por o recorrente o ter requerido, foi-lhe concedido prazo (cfr. art.º 358.º, n.º 1, do C.P.P.) e, nesse âmbito, veio solicitar a produção de prova suplementar, consubstanciada na junção de diversa documentação, sendo que parte veio a ser indeferida nos despachos recorridos. Conjugando os despachos de 19 e 20-06-2023 (cfr. II.3.I.) e a menção feita no relatório da sentença recorrida (cfr. II.3.M.), constata-se que não foi admitida a junção dos documentos 1. a 5. e 7. a 26. que foram apresentados em 16-06-2023 (cfr. II.3.H.a.). O recorrente justificou a junção dos documentos 1. a 4. apresentados em 16-06-2023 (cfr. II.3.H.a.) por alegadamente se referirem ao “(…) estado do arguido após as agressões sofridas durante o(s) facto(s) em discussão (…)” e dos documentos 5. a 26. apresentados em 16-06-2023 (cfr. II.3.H.a.) por darem “(…) conta de problemas de saúde de que padece e que afectam a sua mobilidade (…)”. Ora, o incidente previsto no art.º 358.º, n.º 1, do C.P.P. apenas se refere à alteração verificada e comunicada, pelo que o requerimento probatório que o arguido faça, na sequência da mesma, terá que cingir-se a esse limitado objeto. Por outro lado, o dito requerimento probatório terá que ser apreciado nos termos do art.º 340.º do C.P.P., pelo que, para que possa ser devidamente escrutinada a sua admissibilidade, tem de ser acompanhado da respetiva justificação, para os efeitos do art.º 340.º do C.P.P. De outro modo, o juiz ficaria impedido de apreciar a legalidade dos meios de prova requeridos e de proferir decisão sobre a sua admissibilidade, à luz dos critérios de aferição fixados nos n.ºs 3 e 4 do citado art.º 340.º do C.P.P. (cfr. ALBERGARIA, Pedro Soares de, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo IV, Livraria Almedina, 2022, pág. 639; acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 24-05-2023, processo n.º 11/22.5PAGDM.P16; acórdão do Tribunal da relação do Porto, de 13-01-2016, processo n.º 411/12.9TALSD.P17; acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 13-03-2023, processo n.º 33/01.0GBCLD.L1-38; acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 26-10-2009, processo n.º 154/06.2IDBRG.G19; embora, em sentido contrário, o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 08-11-2023, processo n.º 2009/14.8JAPRT.P110)). Cumpre salientar que a situação processual em que o arguido se encontra perante a comunicação de uma alteração não substancial dos factos não é, sem mais, totalmente equiparável àquela em que se encontra após a dedução do despacho de acusação ou a prolação do despacho de pronúncia, sobretudo quando, como foi o caso dos autos, aquela surge após a produção de prova contraditada e/ou apresentada também pelo próprio arguido, tendo o próprio apresentado a sua versão dos factos que lhe são imputados. Por isso mesmo é que, desde logo, a lei processual penal estabelece, naqueles dois momentos processuais referidos, prazos diferentes para o exercício da defesa em julgamento. Na verdade, se na sequência do despacho de acusação ou pronúncia o arguido pode apresentar a sua defesa no prazo de 20 dias (cfr. art.º 315.º do C.P.P.), já na sequência da comunicação de uma alteração não substancial dos factos apenas o poderá fazer no “tempo estritamente necessário para a preparação da defesa” (cfr. art.º 358.º, n.º 1, do C.P.P.). Por outro lado, na sequência de uma comunicação de uma alteração não substancial de factos o que está em causa é a ponderação da adequação e necessidade de produção de um meio de prova novo em fase de julgamento, por referência a factos específicos cuja suscetibilidade de demonstração apenas surgiu nessa fase processual, o que é claramente uma exceção à regra decorrente do princípio do acusatório de acordo com o qual a acusação assume o papel determinante na fixação do objeto do processo (cfr. art.º 339.º, n.º 4, do C.P.P.). Ora, relativamente aos documentos 1. a 4. apresentados em 16-06-2023 (cfr. II.3.H.a), é o próprio recorrente que assume, na justificação que apresentou para a sua junção, que os mesmos não se prendem com a conduta que o mesmo teria assumido, objeto em causa na comunicação efetuada, mas sim com as consequências que lhe teriam advindo com o comportamento que outrem teria assumido para consigo. Acresce que, desses, os documentos 2. a 4. já constavam dos autos, tendo sido juntos na sequência de um requerimento efetuado pelo próprio recorrente em 17-09-2021 (cfr. Docs. 1 a 3 de II.3.D.). Por outro lado, dos documentos 1. apresentados em 16-06-2023 (cfr. II.3.H.a), ou seja, das 11 fotografias não numeradas, as oito primeiras correspondem ou retratam exatamente a mesma realidade representada nas fotografias já juntas pelo próprio recorrente em 17-09-2021 (cfr. Docs. 4, 6, 7, 8, 9 e 1011 de II.3.D.), pelo que só as três últimas eram completamente novas. Assim, no que se refere aos documentos referidos em 1. a 4. apresentados em 16-06-2023 (cfr. II.3.H.a.), com exceção das 3 últimas fotografias, constando já do processo, a sua (nova) junção era completamente impertinente e desnecessária (cfr. arts. 443.º, n.º 1, do C.P.C. e 4.º do C.P.P.). No que se refere às três últimas fotografias, as mesmas representam a face do recorrente ostentando lesões já retratadas em algumas das demais fotografias 17-09-2021 (cfr. Docs. 5, 7 e 11 de II.3.D.), embora claramente em momento temporal diferente daquele representado nestas, atenta a diferente indumentária que ostenta numas e noutras. Acresce que essas três fotografias foram juntas após ter sido produzida, em audiência de julgamento, toda a prova arrolada e, assim, após também terem sido inquiridas as testemunhas arroladas pelo recorrente e de este ter prestado declarações. Ora, de acordo com o que resulta da audição integral daqueles depoimentos e destas declarações, pela defesa foi então apresentada uma versão que apontava para o facto de, no circunstancialismo espácio-temporal referido na acusação, o arguido ter sido ele próprio agredido. Ora, assim sendo, não obstante as referidas três fotografias extravasarem o objeto da comunicação da alteração não substancial dos factos comunicada (cfr. art.º 358.º, n.º 1, do C.P.P.), mostravam-se relevantes à descoberta da verdade e à boa decisão da causa (cfr. art.º 340.º, n.º 1, do C.P.P.), razão pela qual foi pelo tribunal recorrido, e bem, admitida a sua junção aos autos. Na verdade, o art.º 340.º, n.º 1, do C.P.P. é um afloramento do princípio da investigação judicial sobre a prova na fase de julgamento e que impõe que este persiga a verdade material dos factos sujeitos à sua apreciação e, assim, a uma indagação exaustiva de todos os factos relevantes para um exame crítico e ponderado do que é objeto de julgamento (cfr. MESQUITA, Paulo Dá, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Romo IV, Livraria Almedina, 2022, pág. 413). Cumpre então agora analisar a decisão de não admissão dos documentos 5., 7. a 26 apresentados em 16-06-2023 (cfr. II.3.H.a.). No entanto, e para o efeito, cumpre também relembrar que o recorrente, na sequência da comunicação da alteração não substancial dos factos, requereu a junção dos mesmos, bem como de um relatório de imagiologia (RM coluna lombosagrada) referente ao arguido e a um exame realizado em 16-09-2016 onde se conclui padecer o mesmo de uma “hérnia subligamentar L5-S1 com expressão lateral esquerda, nomeadamente foraminal, podendo ocorrer algum compromisso ganglionar correspondente, a valorizar apenas no contexto clínico” (cfr. documento 6. apresentado em 16-06-2023 (cfr. II.3.H.a.), e de um outro relatório médico datado de datado de 16-06-2023, onde é referido desde quando e em que consultas o arguido é seguido, quais as suas queixas, bem como os exames que efetuou e o que deles resulta, alegando que os todos eles davam conta “(…) dos problemas de saúde de que padece e que afectam a sua mobilidade (…)” (cfr. documento apresentado em 19-06-2023 – II.3.H.b.). À luz da própria justificação avançada pelo recorrente, os ditos relatórios mostram-se idóneos a demonstrar os problemas de saúde de que o mesmo padecia e os seus efeitos, nomeadamente para a sua mobilidade. Ora, na estrita medida em que tal poderia, em abstrato, ser relevante para aferir da capacidade do recorrente levar a cabo as condutas imputadas, os ditos documentos ainda se inserem no limitado objeto circunscrito ao facto novo comunicado, sendo “necessários à descoberta da verdade e à boa decisão da causa” pela relevância que assumem para o cabal esclarecimento daquele. Contudo, as faturas e recibos são documentos contabilísticos e, mesmo que se referiram a atos clínicos, não são aptos a demonstrar os problemas de saúde de quem procedeu ao seu pagamento, bem como os eventuais efeitos daqueles para este. Por outro lado, os pedidos de marcação de exames médicos não os substituem, pelo que aqueles nada revelam sobre o que, com a realização destes, foi por eles eventualmente detetado. Por fim, uma guia de acolhimento e normas de admissão e frequência de uma unidade hospitalar poderá ser relevante para apurar as regras aí vigentes, mas nada revela sobre os problemas de saúde de um paciente, bem como as repercussões destes para o mesmo. Por outro lado, perante aqueles dois relatórios, não estando o julgador sujeito a uma “contabilidade das provas” (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 18-02-2009, processo n.º 1019/05.0GCVIS.C112), quer por referência ao objeto circunscrito ao facto novo comunicado (cfr. art.º 358.º, n.º 1, do C.P.P.), quer por referência ao objeto do processo (cfr. art.º 339.º, n.º 4, do C.P.P.), os documentos 5., 7. a 26. apresentados em 16-06-2023 são irrelevantes e supérfluos, e até inadequados ao fim visado, pelo que se impunha a sua não admissão (cfr. arts. 340.º, n.º 4, al. b) e c), 1.ª parte, e 358.º, n.º 1, do C.P.P.). É certo que a omissão de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade constitui uma nulidade dependente de arguição (cfr. art.º 120.º, n.º 1, al. d), do C.P.P.). Contudo, correspondendo o essencial a um grau mais exigente que o necessário (cfr. MESQUITA, Paulo Dá, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Romo IV, Livraria Almedina, 2022, pág. 4426), face ao já exposto, constata-se que os referidos documentos cuja junção não foi admitida não possuíam qualquer relevância para o esclarecimento dos factos em julgamento, sendo supérfluos, e até inadequados ao fim visado, pelo que, não se verificando o requisito da necessidade, muito menos se verificava o da essencialidade. Ora, o art.º 120.º, n.º 2, al. d), do C.P.P. impõe, para que da nulidade ali prevista se possa falar, que a diligência (probatória) omitida seja essencial à descoberta da verdade, excluindo-se assim à partida, como possível causa de nulidade, a omissão de diligências que não revistam essa essencialidade ou indispensabilidade por referência àquele que seja o objeto do julgamento no caso concreto (cfr. acórdão do Tribunal da relação do Porto, de 08-02-2023, processo n.º 1195/19.5PAPVZ.P113). Assim sendo, com a sua não admissão, nenhuma nulidade foi cometida pelo tribunal recorrido, nomeadamente a prevista no art.º 120.º, n.º 2, al. d), do C.P.P., uma vez que tal decisão lhe era imposta pelo art.º 340.º, n.º 4, do C.P.P. (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 09-12-2020, processo n.º 200/19.0GCVRL.G114). Assim, não merece censura a decisão do tribunal requerido. Improcede, pois, o recurso interlocutório. II.4.B. Da nulidade por omissão de diligências – diligências pertinentes para apurar a data das fotografias juntas – que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade (cfr. art.º 120.º, n.º 2, al. d), do C.P.P.): Em sede de recurso da sentença condenatória, o arguido defende que a não realização de “diligências pertinentes” para dissipar dúvidas quanto à data das fotografias por ele juntas, nomeadamente de uma “perícia ao equipamento que as tirou”, gera a nulidade por omissão de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade. O recurso pode ter como fundamento, mesmo que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, à inobservância de requisito cominado sob pena de nulidade que não deva considerar-se sanada (cfr. art.º 410.º, n.º 3, do C.P.P.). Conforme já resulta do exposto (cfr. II.4.A.), a omissão de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade constitui uma nulidade dependente de arguição (cfr. art.º 120.º, n.º 1, al. d), do C.P.P.). Ora, contrariamente ao que acontece quanto às nulidades de sentença, as quais devem ser arguidas em recurso (cfr. art.º 379.º, n.º 2, do C.P.P.), a nulidade aqui em causa, porque respeitante à prova a produzir em audiência de julgamento, deveria ter sido arguida antes do encerramento da produção da prova (cfr. art.º 360.º, n.º 1, do C.P.P.), ou seja, antes das alegações orais, na medida em que se trata de nulidade cometida em ato ao qual o recorrente assistiu (cfr. art.º 120.º, n.º 3, al. a), do C.P.P.), tal como é reafirmado pela jurisprudência dos tribunais superiores (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 19-05-2022, processo n.º 739/20.4JAFUN.L1-915; acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 09-12-2020, processo n.º 200/19.0GCVRL.G116; acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 14-02-2010, processo n.º 368/07.8TASLV.E117). Não o tendo feito, qualquer nulidade com tal fundamento, a existir, sempre se teria que considerar sanada, conforme resulta da lei processual penal (cfr. art.º 120.º, n.º 1, n.º 2, al. d), e n.º 3, al. a), do C.P.P.). Improcede, também nesta parte, o recurso. II.4.C. Da contradição insanável da fundamentação (cfr. art.º 410.º, n.º 2, al. b), do C.P.P.): A decisão da matéria de facto pode ser sindicada em sede de recurso, desde logo, pela verificação dos vícios previstos no art.º 410.º, n.º 2, do C.P.P. que, de resto, são de conhecimento oficioso, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19-10-2995, para fixação de jurisprudência, in Diário da República n.º 298, I Série A, págs. 8211 e segs.18). Tratam-se de vícios que têm que resultar do próprio texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, sendo que a contradição insanável na fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão apenas ocorrerá quando exista uma incompatibilidade, insuscetível de ser ultrapassada através da própria decisão recorrida, entre os factos provados, entre estes e os não provados, entre os meios de prova invocados na fundamentação de facto ou entre a fundamentação e a decisão (cfr. SIMAS SANTOS, Manuel e LEAL-HENRIQUES, Manuel, in Recursos Penais, 9.ª edição, Rei dos Livros, 2020, pág. 78). Assim, a contradição insanável entre factos provados abrangerá, pois, as situações em que se dão como provados dois ou mais factos que manifestamente não podem estar simultaneamente provados pois são contraditórios entre si, de modo a que apenas um ou alguns deles podem persistir (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22-06-2023, processo n.º 10469/18.1T9LSB.L1-919). Segundo o recorrente, o facto provado 4. (“Em ato contínuo, o arguido desferiu diversos socos na face e na parte superior do corpo de BB, bem como pontapés e empurrou o mesmo contra o solo, entre outros”) está em contradição com o facto provado 16. (“[O arguido] “Padece de diversos problemas de saúde ao nível lombar, gastrointestinal, próstata e problemas de tendão e calcanhar em ambos os pés, dolorosos e que geram dificuldade de mobilidade, mas que não impedem o normal decurso do seu dia-a-dia, não detendo qualquer incapacidade diagnosticada ou declarada”), uma vez que “é evidente que não podia ter desferido os pontapés” (cfr. II.3.N.). Contudo, como bem salienta a Exma. Procuradora-Geral Adjunta no seu parecer (cfr. I.4.), os referidos problemas de saúde do recorrente, por si só, de acordo com as mais elementares regras da experiência e da normalidade do acontecer, não impõem a impossibilidade física de o mesmo desferir pontapés, pelo que os ditos factos provados em 4. e em 16. não são incompatíveis entre si, não se excluindo mutuamente. Na verdade, dificuldade não é sinónimo de impossibilidade. Improcede, pois, neste segmento, o recurso interposto. II.4.D. Da fundamentação da sentença recorrida quanto à decisão sobre a matéria de facto (cfr. arts. 374.º, n.º 2, e 379.º, n.º 1, al. a), do C.P.P.): Segundo o recorrente a sentença recorrida está afetada da nulidade prevista nos arts. 374.º, n.º 2, e 379.º, n.º 1, al. a), do C.P.P., dado que padece do que apelidou ser o “vício de insuficiência de fundamentação”, no que se refere à decisão sobre a matéria de facto, uma vez que, apesar de constar na sentença recorrida, na motivação da decisão da matéria de facto exarada na sentença recorrida, que as testemunhas de defesa GG e FF “denotam ter tomado partido nos factos, evidenciando clara parcialidade”, nada consta quanto aos motivos pelos quais assim se concluiu. Ora, “as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei” (cfr. art.º 205.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa – C.R.P.), sendo que “os atos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão” (cfr. art.º 97.º, n.º 5, do C.P.P.). O art.º 379.º, n.º 1, al. a), do C.P.P. prevê a nulidade da sentença que não contiver as menções referidas no art.º 374.º, n.º 2, e n.º 3, al b), do C.P.P. Na parte que aqui interessa, o art.º 374.º, n.º 2, do C.P.P. estipula que “ao relatório segue-se a fundamentação que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal”. O dever de fundamentação das decisões judiciais é, sob o ponto de vista endoprocessual, um instrumento de racionalização técnica da atividade decisória do tribunal, com um triplo objetivo: fornecer ao julgador um meio de verificação e autocontrole crítico da lógica da decisão, permitir aos sujeitos processuais o perfeito conhecimento da situação objeto da decisão, habitando-os a dela recorrerem, se tal entenderem, bem como, por fim, garantir que o tribunal superior, em caso de recurso, se encontra em posição de poder exprimir, em termos mais seguros, um melhor juízo sobre a decisão de 1.ª instância. Contudo, tal dever assume também uma finalidade extraprocessual, tornando possível um controlo externo sobre a decisão, garantindo a transparência do processo e da decisão, fazendo emergir o carácter legitimador do órgão que a profere, implicando prestação de contas e a responsabilização dos juízes (cfr. acórdão do Supremo tribunal de Justiça, de 19-05-2022, processo n.º 1063/19.0GCALM.L2.S120). Assim, ainda que de uma forma concisa, mas tanto quanto possível completa, devem ser expostas as razões que estiveram na base da convicção do tribunal segundo a qual é correta a versão dos factos por si acolhida e que ditou a escolha entre os factos que ficaram provados e aqueles que não ficaram provados. Para tal deverão ser indicadas e examinadas criticamente as provas que sustentaram a convicção do tribunal, o que impõe que sejam expostas as razões que estiveram na base das opções tomadas pelo tribunal sobre cada uma das provas produzidas e, assim, os motivos pelos quais atendeu a determinadas provas e aqueles pelos quais não atendeu a eventuais provas em sentido contrário. Nesse sentido, a credibilidade de uma testemunha, ou a falta dela, deve ter o seu reflexo na fundamentação. Contudo, só existe violação do art.º 374.º, n.º 2, do C.P.P., se houver uma falta absoluta de tal fundamentação, não se verificando a nulidade em causa perante uma fundamentação deficiente (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07-06-2023, processo n.º 8013/19.2T9LSB.L1.S121). No presente caso, no que concerne às referidas testemunhas, lendo a motivação da decisão da matéria de facto exarada na sentença recorrida (cfr. II.3.O.), nela consta, nomeadamente, que: - A testemunha FF namora com a testemunha GG; - FF conhecia AA, mulher de BB, bem como o recorrente, pai desta; - Existia um mal-estar gerado pelo casamento de AA e BB; - No circunstancialismo espácio-temporal em causa, AA e BB prestaram condolências por ocasião da morte do pai de FF, amigo da família de AA e do recorrente; - De acordo com AA e BB, o arguido tem influência junto da comunidade em que se insere e que esta tomou partido pelo arguido; - As contradições entre os depoimentos prestados em audiência de julgamento por FF e GG, bem como em relação aos aí prestados por AA e BB; e - Não obstante o recorrente ter requerido a abertura de instrução, defendendo que havia sido agredido por BB, e em audiência de julgamento ter referido que teria sido agredido por este e também pela sua filha, versão que, de uma forma geral, encontrou algum apoio nos depoimentos prestados pelas testemunhas FF e GG em audiência de julgamento, estas não tinham sido arroladas por aquele na fase de instrução, mas só em julgamento. Desta forma, a sentença recorrida elenca, de forma suficiente, as razões para o tribunal recorrido não ter dado credibilidade às mencionadas testemunhas FF e GG e, em concerto, as razões para ter concluído pela sua parcialidade. Seja como for, no caso, não só não há uma falta absoluta de fundamentação, como o que fica evidente é que o recorrente não concorda com a argumentação do tribunal recorrido. Contudo, uma fundamentação em desacordo com a argumentação expedida pelo recorrente não conduz à nulidade em apreço (cfr. LOPES, José Mouraz, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo IV, Livraria Almedina, 2022, pág. 798). Assim, não se verifica a nulidade prevista nos arts. 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, al. a), do C.P.P. Improcede, pois, também nesta parte, o recurso interposto. II.4.E. Da nulidade da sentença por indevida valoração como meio de prova de elemento processual insuscetível de tal valoração: O recorrente entende que foi indevidamente valorado na sentença recorrida o teor de fls. 82 dado que, não estando sequer indicado como prova no despacho de acusação, corresponde ao depoimento que AA em 26-02-2020 prestou em inquérito, perante órgão de polícia criminal, sem que em audiência de julgamento tivesse sido respeitado o disposto no art.º 356.º, n.ºs 2 ou 3, do C.P.P. Efetivamente, no dia 26-02-2026, na esquadra da P.S.P. de Loures, AA, perante o agente JJ, após se identificar e ser informada da possibilidade de se recusar a prestar depoimento, o que declinou, entregou uma folha A4, escrita a computador, não assinada, desejando que o seu depoimento fosse o conteúdo daquela, tendo a mesma sido incorporada no processo (cfr. II.3.A.). No despacho de acusação não foi concretamente indicada como prova a referida folha incorporada a fls. 82 (cfr. II.3.B.a.). Por outro lado, na motivação da decisão da matéria de facto exarada na sentença recorrida (cfr. fls. II.3.O.) consta que: “Tais declarações revelaram-se críveis, pelos motivos expostos e apelando às regras da experiência, mantendo a versão dos factos ao longo do processo, em especial considerando as denúncias e o teor de fls. 82, admitindo-se algumas discrepâncias de pormenor motivadas pelo lapso temporal decorrido.” Assim, sendo evidente que foi valorado pelo tribunal recorrido o teor de fls. 82, importa analisar se tal valoração poderia ter ocorrido. Vigora entre nós o princípio da legalidade da prova, estipulando que em processo penal são admissíveis as provas que não forem proibidas por lei (cfr. art.º 125.º do C.P.P.). Ora, salvo quando a lei dispuser de modo diferente, a prestação de quaisquer declarações processa-se por forma oral, não sendo autorizada a leitura de documentos escritos previamente elaborados para aquele efeito (cfr. art.º 96.º, n.º 1, do C.P.P.). Assim, em processo penal, qualquer declarante, cujo depoimento seja admissível e necessário, deverá exprimir-se oralmente, regra que é afastada em virtude de condicionantes físicas ou psíquicas que imponham uma linguagem distinta da oral (cfr. art.º 93.º do C.P.P.) ou caso se trate de pessoa que, fruto de prerrogativas especiais, possa depor por escrito (cfr. arts. 139.º, n.º 1, do C.P.P. e 503.º, n.º 2, do C.P.C.). Deste modo, fora daqueles casos excecionais, não é admissível a junção de escrito cujo conteúdo não passe de um depoimento testemunhal (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 22-05-2002, processo n.º 1036/0222). No presente caso, é evidente que o escrito em causa foi elaborado com o intuito de servir como depoimento de AA em fase de inquérito, tratando-se, pois, de um vício substancial, no plano da admissibilidade (cfr. OLIVEIRA, Luís Pedro Martins de, in “Da Autonomia do Regime das Proibições de prova”, Prova Criminal e Direitos de Defesa – Estudos sobre teoria da prova e garantias de defesa em processo penal, Livraria Almedina, 2013, pág. 118), tendo sido desrespeitado um limite à descoberta da verdade, uma barreira colocada à determinação dos factos que constituem o objeto do processo, e não uma mera regra que disciplina o procedimento de realização e obtenção da prova (cfr., sobre a distinção entre as proibições de prova das meras regras de produção da prova, . ANDRADE, Manuel da Costa, in Sobre as proibições de prova em processo penal, Coimbra Editora, 1992, págs. pág. 83 a 90). Ora, se a lei não autoriza a sua produção, naturalmente que, mesmo assim, caso tenha sido produzida e seja incorporada nos autos, como aconteceu no presente caso, não podia a mesma ser valorada, pelo que, tendo sido, foi violada uma proibição de valoração de prova (cfr. MILHEIRO, Tiago Caiado, in Cometário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo I, Livraria Almedina, 2019, págs. 1042 e 1043). Deste modo, a sentença recorrida procedeu à indevida valoração, como se de um depoimento se tratasse, daquele elemento processual insuscetível de tal valoração. O art.º 118.º, n.º 3, do C.P.P. ressalva a autonomia do regime próprio da proibição da produção e valoração de prova, que só pode ser o previsto no art.º 126.º do C.P.P. (cfr. GASPAR, António Henriques, in Código de Processo Penal Comentado, Livraria Almedina, 2014, pág. 384), prevendo o art.º 126.°, n.º 2, do C.P.P. um elenco dos casos de nulidade da prova proibida que concretiza o princípio proibitivo fixado no art.º 126.°, n.º 1, do C.P.P. sempre sem prejuízo de outras normas do C.P.P. que prevejam nulidades absolutas de prova (cfr. ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de, in Comentário do Código do Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2.ª edição atualizada, Universidade Católica Editora, 2008, pág. 323; OLIVEIRA, Luís Pedro Martins de, in “Da Autonomia do Regime das Proibições de prova”, Prova Criminal e Direitos de Defesa – Estudos sobre teoria da prova e garantias de defesa em processo penal, Livraria Almedina, 2013, pág. 119). Na verdade, a gravidade excecional do vício em causa determina um tratamento excecional, devendo-se ter presente que algumas proibições de prova são denominadas de nulidades (cfr. art.º 126.º, n.ºs 1 e 3, do C.P.P.), em cumprimento da injunção constitucional (cfr. art.º 32.º, n.º 8, da C.R.P.), que não se podem considerar sanadas (cfr. art.º 449.º, n.º 1, al. e), do C.P.P). Assim, assentando em prova proibida, e desta forma inválida23, necessariamente deverá considerar-se a sentença recorrida está afetada de nulidade. Para as nulidades estabelece a lei que as mesmas têm o efeito de tornar inválido o ato em que se verifiquem, assim como aqueles que dele dependerem e que possam ser afetados pelas mesmas, sendo a abrangência processual dos efeitos de uma nulidade determinada na decisão que a reconheça e declare (cfr. art.º 122.º, n.º 1, do C.P.P.). No domínio das proibições de produção e valoração de prova, o legislador não foi tão eloquente, tendo omitido qualquer referência expressa ao problema. No entanto, nem a independência proclamada no art.º 118.º, n.º 3, do C.P.P., nem a referida omissão ditam, inevitavelmente, a sua exclusão (cfr. CORREIA, João Conde, in Cometário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo I, Livraria Almedina, 2019, pág. 1220). Quando a valoração da prova proibida seja o único suporte probatório em que assenta a sentença, ou quando, não sendo o único, seja estabelecida uma intrínseca ligação entre o meio de prova proibido e os demais meios de prova admissíveis, face a relevância causal do vício sobre a decisão ou à impossibilidade de, com segurança, determinar o peso que a prova proibida teve na convicção do julgador, sendo o vício reconhecido em sede de recurso, o único caminho admissível consiste precisamente na expurgação do dito meio de prova e à reformulação do raciocínio lógico-dedutivo à luz apenas da prova permitida, o que apenas poderá ser efetuado pelo tribunal recorrido (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 06-10-2016, processo n.º 535/13.5JACBR.C1.S124). Contudo, afigura-se que quando a valoração da prova proibida foi irrelevante para a decisão já não se imporá ao tribunal recorrido tal tarefa (cfr. ANDRADE, Manuel da Costa, in Sobre as proibições de prova em processo penal, Coimbra Editora, 1992, págs. 65 e 66; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12-03-2008, processo n.º JSTJ00025). Ora, no presente caso haverá que ter em conta que, conforme resulta da motivação da decisão da matéria de facto exarada na sentença recorrida (cfr. II.3.O.), embora o tribunal recorrido tenha atendido ao conteúdo do escrito junto a fls. 82, o relevo que lhe deu foi apenas e tão só para credibilizar o depoimento oral prestado pessoalmente em audiência de julgamento por AA, sendo que, para o efeito, nem sequer foi o único elemento processual tido em conta. Acresce que, como daquela também resulta, para concluir pela verificação dos factos que considerou provados, o tribunal recorrido firmou a sua convicção no depoimento oral prestado pessoalmente em audiência de julgamento por AA em conjugação com outros meios de prova que não no referido escrito. Deste modo, o tribunal recorrido não firmou diretamente a sua convicção sobre os factos objeto do julgamento, única ou conjuntamente com outros meios de prova, naquele escrito de fls. 82. Ora, assim sendo, não poderá deixar de se atender à concreta pertinência e relevo que a indevida valoração daquele elemento processual teve no raciocínio lógico-dedutivo efetuado pelo tribunal recorrido. Uma vez que é possível identificar, isolar, compartimentar e segmentar o relevo probatório da prova proibida em causa na fundamentação da convicção probatória do tribunal recorrido, apesar de a nulidade necessariamente afetar a sentença recorrida, conduzindo a que da mesma seja expurgada a valoração daquela, afigura-se que é ainda possível manter, no mais, o raciocínio lógico-dedutivo efetuado pelo tribunal recorrido, não sendo, pois, necessário, a sua reformulação por este. Procede, pois, nesta parte, o recurso interposto. II.4.F. Do erro de julgamento: A decisão da matéria de facto pode ser sindicada em sede de recurso pela designada impugnação ampla da matéria de facto a que se refere o art.º 412.º, n.ºs 3, 4 e 6, do C.P.P. O erro de julgamento, não estando restringido ao texto da decisão recorrida, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova produzida em audiência de julgamento, ocorre quando o tribunal considere provado um determinado facto, sem que dele tivesse sido feita prova, pelo que deveria ter sido considerado não provado, ou quando dá como não provado um facto que, face à prova que foi produzida, deveria ter sido considerado provado. Contudo, ao contrário do que o recorrente parece supor, o recurso da matéria de facto não visa a realização de um segundo julgamento sobre aquela matéria, desta feita com base na audição da gravação das declarações e depoimentos prestados em audiência de julgamento, ainda que a conjugando com a demais prova já constante do processo, nomeadamente pericial e documental. Na verdade, o recurso da matéria de facto é um remédio jurídico para obviar a eventuais erros ou incorreções da decisão recorrida no processo de formação da convicção, erros claros de julgamento, incluindo eventuais violações de regras e princípios de direito probatório, rigorosamente delimitado pela lei aos pontos de facto que o recorrente entende erradamente julgados (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 23-11-2011, processo n.º 158/09.3GBAVV.G2.S126). Desde logo porque o objeto do recurso não coincide com o objeto da decisão do tribunal de julgamento. Na verdade, este decide sobre uma acusação, aquele decide sobre a (correção da) sentença/acórdão (de facto), mas também porque não se encontra na mesma posição perante as provas. Efetivamente, o tribunal de recurso não dispõe de imediação total, embora tenha uma imediação parcial, relativamente a provas reais e à componente voz e sentido da prova pessoal, e encontra-se impedido de interagir com a prova pessoal (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-02-2023, processo n.º 38/17.9YGLSB.S127). Por isso mesmo é que, quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve especificar: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) As provas que devem ser renovadas (cfr. art.º 412.º, n.º 3, do C.P.P.). Sendo que, com relação às duas últimas especificações, quando as provas invocadas tenham sido gravadas, as mesmas devem ser feitas com referência ao consignado na ata, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens (das gravações) em que se funda a impugnação (cfr. art.º 412.º, n.º 4, do C.P.). É, pois, exigida a indicação dos factos individualizados que constam da sentença recorrida e que se consideram incorretamente julgados, só se satisfazendo tal exercício recursivo com a indicação do conteúdo específico dos meios de prova ou de obtenção de prova que impõem decisão diversa da recorrida, com a explicitação da razão pela qual assim se entende. Ora, a utilização do verbo impor, com o sentido de “obrigar a”, não é anódina (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 19-05-2010, processo n.º 696/05.7TAVCD.S128). Na verdade, a utilização do verbo impor (cfr. art.º 412.º, n.º 3, al. b), do C.P.P.), que aponta para a obrigação de impreterivelmente se aceitar algo, e não do verbo permitir, que admite a existência de várias hipóteses, legitima a conclusão de que não basta estar demonstrada a mera possibilidade de existir uma solução em termos de matéria de facto alternativa à fixada pelo tribunal, o que, aliás, é comum verificar-se, sendo necessário que o recorrente demonstre que a prova produzida no julgamento só poderia ter conduzido, em sede de matéria de facto provada e não provada, à solução por si (recorrente) defendida, e não àquela consignada pelo tribunal recorrido (cfr. acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 05-06-2024, processo n.º 466/21.5PAVNG.P129). Assim, “esta exigência corresponde, de algum modo, àquela que é exigida ao julgador para fundamentar os factos provados e não provados, porque do mesmo modo que o julgador tem o dever de fundamentar as decisões, também o recorrente tem que fundamentar o recurso” (cfr. acórdão do tribunal da Relação de Coimbra, de 12-07-2023, processo n.º 982/20.6PBFIG.C130). Seja como for, estando em causa a impugnação da matéria de facto pela via ampla ou alargada (cfr. art.º 412.º, n.ºs 3 e 4, do C.P.P.), esta instância de recurso não fica limitada à audição das passagens indicadas pelo recorrente (cfr. art.º 412.º, n.º 6, do C.P.P.). Na sentença recorrida foi dado como provado o facto 1 (cfr. II.3.N.) do seguinte teor: “1. O ofendido BB e a ofendida AA são casados entre si, nunca tendo o arguido ..., pai da ofendida AA, aceitado tal união.” O recorrente entende que o segmento final (“nunca tendo o arguido ..., pai da ofendida AA, aceitado tal união”) deveria ser dado como não provado em face das declarações do arguido e no depoimento da sua mulher, EE, que teriam sido corroborados pelo depoimento da testemunha DD. Da leitura da motivação da decisão da matéria de facto exarada na sentença recorrida (cfr. II.3.O.), verifica-se que, nesta parte, o tribunal recorrido se baseou na conjugação dos depoimentos de AA e BB, que lhe mereceram credibilidade, e dos depoimentos de EE e DD, bem como das próprias declarações do arguido, que não lhe mereceram credibilidade. Com base na audição integral da gravação das ditas declarações e depoimentos verifica-se que, nas declarações que o arguido prestou em audiência de julgamento, inicialmente afirmou que nunca aceitou a relação de AA e BB, embora logo após, corrigindo-se, afirmou que nunca se negou a aceitar a mesma32, tendo apenas pedido para namorarem algum tempo antes de casarem. Contudo, segundo a sua mulher, EE, mais do que ter sido efetuado semelhante pedido, teria mesmo ficado acordado com AA e BB que estes namorariam primeiro durante seis meses33. Mesmo ignorando a referida discrepância, pois um pedido é diferente de um acordo, atentas as mais elementares regras da experiência comum e da normalidade do acontecer, caso o arguido tivesse, de facto, aceitado a relação de AA e BB não se percebe a necessidade sentida por AA de fugir de casa e contrair casamento com BB, sem o conhecimento e sem a presença dos pais daquela34. Convém ter presente que é completamente ilógica a explicação avançada pelo arguido de acordo com a qual AA teria medo de ser trocada por outra pessoa, dado que BB a pressionaria para casar com ele, ameaçando-a de que, caso ela a tal não anuísse, casaria com outra35. Acresce que, não obstante a ilustre mandatária do recorrente ter questionado diretamente EE sobre a razão pela qual então AA e BB teriam casado em segredo, a mesma não avançou qualquer explicação, sendo que só após a pergunta lhe ter sido efetuada de diferentes formas, acabou por referir que a sua filha seria muito influenciável, nunca confirmando a avançada pelo seu marido36. Por seu turno, DD, empregado do recorrente37, embora tenha acabado por dizer que este não era contra a relação de AA e BB, o certo é que deu conta de “confusões” sobre o assunto39, referindo que o recorrente “não era muito a favor, mas também não era contra” tal relação40. Assim sendo, é evidente que os ditos meios de prova não impõem que se considere não provado o segmento do dito facto que, assim, se mantém inalterado. Na sentença recorrida foi ainda dado como provado o facto 5. (cfr. II.3.N.) do seguinte teor: “Nessa sequência, e após AA se ter colocado entre o seu marido e o seu pai, ora arguido, por forma a tentar defender o primeiro, o arguido desferiu dois socos na barriga de AA, projetando-a contra uma parede.” No que se refere, em concreto ao referido facto provado 5., o recorrente afirma que as testemunhas AA e BB, ofendidos, não afirmaram em julgamento que aquela tivesse sido projetada contra uma parede, conforme veio aí a ser dado como provado, tendo ambos se referido a uma caixa de correio. Da leitura da motivação da decisão da matéria de facto exarada na sentença recorrida (cfr. II.3.O.), verifica-se que, na parte referente à concreta superfície contra a qual AA foi projetada, o tribunal recorrido se baseou no depoimento daquela e no depoimento da testemunha BB, ambos prestados na audiência de julgamento. Ora, da audição da gravação da totalidade dos depoimentos prestados na sessão da audiência de julgamento de 23-05-2023 por AA e BB constata-se que, efetivamente, ambos afirmaram que aquela foi projetada contra uma caixa de correio41, pelo que o teor da parte final do facto provado em questão, neste aspeto, não se mostra absolutamente rigoroso. Contudo, convém ter presente que os trechos dos referidos depoimentos, mencionados pelo recorrente, nunca conduziriam a que considerasse integralmente como não provado o facto em causa. Por outro lado, a referida alteração nenhum relevo possui, continuando a tratar-se de uma superfície dura e plana. Na verdade, de acordo com os referidos depoimentos, tudo se passou quando estavam a abandonar um prédio, pelo que é evidente que a dita caixa de correio se encontrava incorporada numa parede. Seja como for, em função quer dos elementos de prova mencionados pelo recorrente, quer do próprio teor da motivação da decisão da matéria de facto exarada na sentença recorrida, cumpre fazer aqui funcionar a possibilidade concedida a esta instância de alteração da matéria de facto nos termos do art.º 431.º, al. b), do C.P.P. e, nessa medida, alterar o ponto 5.º da matéria de facto provada no sentido de clarificar a concreta superfície contra a qual AA foi projetada, no sentido de o mesmo passar a ter a seguinte redação: Nessa sequência, e após AA se ter colocado entre o seu marido e o seu pai, ora arguido, por forma a tentar defender o primeiro, o arguido desferiu dois socos na barriga de AA, projetando-a contra as caixas de correio existentes na parede do edifício. No mais, o recorrente limitou-se a defender, por atacado, que os factos dados como provados na sentença recorrida em parte dos seus pontos 6. e 9. e nos seus pontos 3., 4., 5., 12. e 13., que, no essencial, correspondem às condutas criminosas que o tribunal recorrido considerou demonstradas, foram incorretamente julgados, devendo ter sido dados como não provados, baseando-se numa pessoal e diferente valoração da prova produzida em audiência de julgamento. Na verdade, pugnou que se conferisse credibilidade à versão do recorrente e das testemunhas de defesa, retirando-a aos depoimentos dos ofendidos, em função da conjugação que faz com a demais prova que elenca, precisamente de forma inversa à efetuada pelo tribunal recorrido, indicando como prova demonstrativa da sua visão a gravação da totalidade das declarações e depoimentos prestados em audiência de julgamento e, assim, da prova aí produzida. Ora, do modelo do recurso consagrado no C.P.P. resulta que os recursos são sempre e só remédios jurídicos, não são a renovação de fases processuais anteriores, mormente a repetição da audiência de julgamento (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-02-2023, processo n.º 38/17.9YGLSB.S1). Com exceção do já mencionado quanto ao facto provado 5., analisando a motivação e as conclusões constata-se que o recorrente não alega, no que concerne aos referidos factos provados que também considera incorretamente julgados, que a descrição que a sentença recorrida faz do conteúdo das declarações do arguido e da assistente, bem como dos depoimentos das testemunhas elencadas, não corresponda ao que, na realidade, as mesmas declararam ou depuseram. Ou seja, não especifica, como deveria ter feito, que, por exemplo, o tribunal recorrido deu como provado um facto com base no depoimento de uma testemunha e a mesma nada declarou sobre o facto, que inexistia qualquer prova sobre um daqueles concretos factos dados por provados, que foi tido em conta para a prova de um daqueles factos um depoimento de uma testemunha sem razão de ciência da mesma que permitisse a prova do mesmo, ou que um facto foi dado como provado com base em provas insuficientes ou não bastantes para prova desse mesmo facto, nomeadamente com violação das regras de prova (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 04-02-2016, processo n.º 23/14.2PCOER.L1-942). Deste modo, não foi estabelecida qualquer relação entre o conteúdo específico de cada meio de prova suscetível de impor decisão diversa com o facto individualizado considerado incorretamente julgado. E isso explica que o recorrente acabe por apresentar três diferentes alternativas quanto à referida factualidade provada impugnada. O recorrente insurge-se contra as considerações feitas motivação da decisão da matéria de facto exarada na sentença recorrida a propósito da valoração das suas declarações em audiência de julgamento, considerando que terá sido prejudicado, desde logo quanto à credibilidade que lhe foi dada pelo tribunal recorrido, pelo facto de ter exercido o direito ao silêncio na fase inicial da audiência de julgamento. De facto, é um direito do arguido prestar declarações em qualquer momento da audiência de julgamento, desde que elas se refiram ao objeto do processo (cfr. art.º 343.º, n.º 1, do C.P.P.). Contudo, lida a motivação da decisão da matéria de facto exarada na sentença recorrida (cfr. II.3.O.), facilmente se constata que o tribunal recorrido começou por se limitar a constatar a evidência de o recorrente ter optado, em audiência de julgamento, por prestar declarações só após toda a produção de prova, opção que, como resulta do exposto, é perfeitamente legal. Acresce que, depois descreve as razões pelas quais retirou credibilidade à versão avançada em audiência de julgamento pelo recorrente, aí não constando, como fator de ponderação, o momento em que o mesmo prestou declarações. Finalmente, o tribunal recorrido aí também realçou que só após a produção de prova o recorrente prestou declarações, dando conta do modo como naquele momento o mesmo se posicionou face aos factos imputados. Seja como for, lida toda a motivação da decisão da matéria de facto exarada na sentença recorrida (cfr. II.3.O.), não resulta que o silêncio antecedente do recorrente tenha sido valorado desfavoravelmente pelo tribunal recorrido na questão da culpa (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 22-06-2021, processo n.º 4/21.0GCABT.E143). Por outro lado, neste processo, o recorrente não foi interrogado na qualidade de arguido em sede de instrução, onde prestou declarações na qualidade de assistente (cfr. ref.ª 151263821 de 19-01-2022). Acresce que na audiência de julgamento realizada não foi requerida e/ou ordenada a audição daquelas outras declarações prestadas pelo recorrente em sede de instrução (cfr. II.3.L.), pelo que não se poderá valorar o que aí tenha sido declarado. Em audiência de julgamento, o arguido, nas declarações que aí acabou por prestar, após descrever a agressão que lhe teria sido desferida por BB, que estaria acompanhado de AA, filha do arguido44, referiu que esta se teria metido no meio45, e só depois anunciou não pretender falar do envolvimento da sua filha na contenda46. Contudo, logo após referiu que a camisa que vestia teria sido rasgada, opinando que o foi pela filha47, tendo sido bastante preciso em imputar agressões a mais do que uma pessoa, e embora tenha reafirmado que não pretendia falar do envolvimento da sua filha, logo adiantou que achava que também tinha sido agredido pela sua filha48. Deste modo, é fundada a conclusão de que o recorrente visou, de facto, incriminar a sua filha, embora não no requerimento de abertura de instrução. Por outro lado, embora não com o alcance que a motivação da decisão de facto parece sugerir, o certo é que o recorrente claramente evitou responder, divagando da forma que entendeu, à pergunta concreta de qual, no seu entender, a razão pela qual teria sido agredido sem que nada o despoletasse, que foi repetida várias vezes49. Lida ainda a motivação da decisão da matéria de facto exarada na sentença recorrida é evidente que, a nível de “postura [do recorrente] assumida nos autos”, o que foi valorado foi a sua reação aos despachos que foram sendo proferidos nas distintas fases processuais do processo, a concreta posição que adotou em audiência de julgamento, bem como as “explosões de personalidade e que apenas cessaram quando evidenciadas pelo Ministério Publico” (cfr. II.3.O.). Ora, de facto, na sequência da queixa que apresentou, o Ministério Público proferiu despacho de arquivamento relativamente a BB e quanto ao crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143.º, n.º 1, do C.P. alegadamente cometido em 25-08-2019, entre as 20h30min e as 21h, junto ao edifício sito na ..., sobre a pessoa do recorrente (cfr. II.3.B.a.). Não obstante este, na qualidade de assistente, ter requerido a abertura de instrução (cfr. II.3.C.), tendo sido proferido despacho de não pronúncia onde foi considerado que não estava suficientemente indiciado que o mesmo tivesse então sofrido qualquer agressão, podendo recorrer de tal decisão (cfr. arts. 310.º, n.ºs 1 e 3, e 399.º do C.P.P.), conformou-se com ela, não interpondo qualquer recurso (cfr. II.3.E.). No entanto, não obstante aquela decisão ter transitado em julgado, o recorrente em audiência de julgamento insistiu que teria sido agredido por BB, no referido circunstancialismo de tempo e de lugar. Por outro lado, extrai-se da motivação da decisão da matéria de facto que em audiência de julgamento o arguido prestou declarações de pé, permanecendo sentado o resto do tempo. No que se refere às ditas “explosões de personalidade”, é evidente que o tribunal recorrido se estava a referir ao “choro”, ao “tremer” e ao “descontrolo”50, para utilizar as expressões usadas pela Magistrada do Ministério Público em 1.ª instância51, que o recorrente assumiu na audiência de julgamento. Cumpre salientar que tal comportamento motivou que o recorrente fosse instado para com tal cessar52, por mais do que uma vez53. Por outro lado, é também evidente que o recorrente só cessou com tal comportamento quando a sua mulher foi diretamente questionada sobre o assunto, pela Magistrada do Ministério Público, tendo então EE dado conta de que o mesmo normalmente não assumia semelhante conduta, tendo a mesma avançado que ele estaria a comportar-se desta forma por a própria filha lhe estar a imputar uma agressão, quando ele, como resulta do já exposto, também acabou por afirmar ter sido agredido por ela54. Por outro lado, sendo a denúncia a comunicação da ocorrência de um facto a uma entidade e a queixa, para além disso, a manifestação de vontade de haver processo, um auto de denúncia/queixa é um ato processual que tal documenta. No entanto, nessa vertente, apenas atesta que foi realizada a denúncia/queixa nas circunstâncias de tempo e lugar nele exaradas, pela pessoa que aí está identificada e com a indicação dos factos nele narrados (cfr. arts. 99.º, 169.º e 246.º do C.P.P.). Por força da autoridade pública que lhe é inerente, operada através da remissão do art.º 99.º, n.º 4, do C.P.P. para o art.º 169.º do C.P.P., deve atribuir-se fé ao auto no sentido de que corresponderá à realidade processual de que, nos termos expostos, de facto ocorreu. Assim, é perfeitamente lícito recorrer aos autos de denúncia/queixa para apurar a data da sua efetivação e, a partir dela, concluir até qual a concreta data em que ocorreram as agressões que, de acordo com os depoimentos concordantes de AA e BB, lhes teriam sido desferidas pelo recorrente55. Na verdade, cumpre salientar que apesar de AA e BB não terem sido precisos quanto ao circunstancialismo de tempo em que as referidas agressões teriam ocorrido, aquela foi segura em afirmar que teriam ocorrido na data em que apresentou a respetiva denúncia/queixa56. No entanto, ao contrário do concluído pelo tribunal recorrido, afigura-se irrelevante a curta diferença que mediou entre o momento em que AA e BB por um lado, e o recorrente por outro, apresentaram queixa57, sobretudo tendo em conta o prazo de extinção do direito de queixa (cfr. art.º 115.º, n.º 1, do C.P.). Contudo, a aptidão do auto para provar factos apenas se reporta à materialidade praticada por aquele que exarou o auto, no caso, o que ouviu, mas não prova o crime em si mesmo (cfr. MILHEIRO, Tiago Caiado, in Cometário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo II, Livraria Almedina, 2019, pág. 551). Daí que a denúncia/queixa deva conter, para além da menção aos “factos que constituem o crime” (cfr. arts. 243.º, n.º 1, al. a), e 246.º, n.º 3, do C.P.P.), a indicação dos “meios de prova conhecidos” (cfr. arts. 243.º, n.º 1, al. c), e 246.º, n.º 3, do C.P.P.), assim se excluindo, para prova daqueles, o próprio auto onde tudo o que foi comunicado e manifestado ficou documentado. Acresce que, não podendo servir como prova dos factos denunciados, o certo é que a denúncia/queixa também não constitui um depoimento prestado na qualidade de testemunha, sendo por isso mesmo que não é antecedido de qualquer juramento (cfr. arts. 91.º e 128.º a 139.º do C.P.P.), pelo que também não pode valer como prova testemunhal. Seja como for, o certo é que nada do que seja vertido num auto de denúncia/queixa poderá impor-se à prova que, entretanto, venha a ser produzida sobre os factos então comunicados (cfr. acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 09-11-2022, processo n.º 471/20.9PIVNG.P158). Por isso mesmo, sem mais, não assumem relevo, eventuais discrepâncias entre os factos que foram objeto de denúncia/queixa e o teor do depoimento prestado em audiência de julgamento pela pessoa que os comunicou, dado que só este, e não o auto onde aqueles ficaram documentados, poderá ser utilizado para demonstrar os factos então comunicados. Cumpre ainda salientar que, de acordo com as mais elementares regras da experiência comum e da normalidade do acontecer, agredir o corpo de outra pessoa, dependendo da forma como é perpetrada a agressão, não tem necessariamente que causar lesões exteriores (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 2/92, para fixação de jurisprudência, de 18-12-199159). Por seu turno, sendo a dor a expressão sintomática de uma lesão, pode esta verificar-se independentemente de ser ou não visível a sua manifestação externa (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18-12-1991, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 412, pág. 65). Analisado o teor dos apelidados “exames diretos” referentes a AA (cfr. ref.ª 146020388 de 09-10-2020) e a BB (cfr. ref.ª 146020841 de 09-10-2020) constata-se que os mesmos, inegavelmente, comportam um juízo médico, desde logo quanto à natureza da ação causadora das lesões exteriores resultantes das informações clínicas também juntas aos autos (cfr. fls. 74 e 102) e aos concretos dias para a sua cura, bem como quanto à verificação ou não de incapacidade para o trabalho, sequelas ou consequências permanentes. Ora, comportando tais “exames diretos” um juízo tecnicamente provado, de acordo com as exigências legais, as respetivas conclusões, na estrita medida que comportam um juízo técnico, não estão sujeitas a valoração do tribunal segundo o princípio da livre apreciação da prova, impondo-se, uma vez que não foram infirmadas por outro juízo técnico (cfr. art.º 163.º do C.P.P.). Na verdade, nestas circunstâncias, em confronto com as demais provas produzidas, o julgador não tem a faculdade de atribuir maior ou menor valor ao estrito juízo técnico-científico vertido nas conclusões, devendo pois ser julgada provada a factualidade a que se reporta aquele mesmo juízo independentemente do sentido para que pudessem apontar outros meios de prova, se aquele juízo, devidamente expresso e contextualizado, for suficiente para prova do facto objeto da perícia (cfr. LATAS, António, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo II, Livraria Almedina, 2019, pág. 491 a 500). Por outro lado, cumpre relembrar que não consta da factualidade dada como provada pelo tribunal recorrido que tenham sido desferidas pelo recorrente “arranhadelas” (cfr. II.3.N.). Acresce que, discrepância por discrepância, cumpre salientar que apesar de o recorrente ter referido que se aleijou nos joelhos60, tendo em 17-09-2021 (cfr. II.3.D.) e 16-06-2023 (cfr. II.3.H.a.) enviado ao processo fotografias que, supostamente, retratam as lesões externas que sofreu, nenhuma delas incidiu sobre os joelhos. Insurge-se ainda o recorrente de ter sido valorado pelo tribunal recorrido a ausência de dificuldades em o recorrente subir escadas, dado que na sala de audiências não existiam escadas. Cumpre salientar que ficou consignado na motivação da decisão da matéria de facto (cfr. II.3.O.) que: “Já no que tange aos problemas de saúde do arguido, da sua presença em julgamento não decorrem lesões físicas evidentes e que inviabilizem a sua normal deslocação, o acto de sentar e levantar, subir de escadas, permanecer de pé durante tempo considerável (vários minutos) e enquanto presta declarações, sendo que não careceu de ser auxiliado por terceiros e nem faz uso de qualquer aparelho auxiliador.” Ora, a referência a escadas resulta do teor das respostas dadas em audiência de julgamento pelo próprio recorrente às perguntas que lhe foram feitas precisamente pela sua ilustre mandatária e de onde resultou que o acesso ao edifício onde decorreu aquele ato processual era feito por escadas e, como tal, o recorrente teve que as subir, tendo o mesmo acabado por admitir que não tinha particulares dificuldades em subir escadas61. Da leitura da dita motivação da decisão de facto também é evidente que o uso da expressão “parcialidade” se refere à defesa e testemunhas arroladas pelo recorrente e não às fotografias por ele juntas. Sobre aspeto cumpre salientar que AA, na sequência do contacto efetuado por FF a dar conta que o pai desta tinha morrido, informou-a que iria apresentar condolências fazendo-se acompanhar do seu marido, dando-lhe conta do estado da relação entre ela e o recorrente62. Não obstante, FF, ao ser inquirida na audiência de julgamento, onde se identificou como sendo filha do falecido e namorada de GG, referiu-se a BB como sendo namorado de AA. Efetivamente a dita testemunha referiu que o seu namorado se encontrava num “escritoriozinho” situado perto da cozinha, e aquela, juntamente com o seu irmão e os seus tios, numa sala64. Contudo, a mesma referiu, perante gritos de discussão vindos do exterior, que teriam sido também por ela ouvidos, o seu namorado se teria dirigido a uma janela e, após ele se ter inteirado do que se passava no exterior, teria comunicado aos presentes que estava a ocorrer uma discussão entre o recorrente e a filha, ou seja AA. Por seu turno, GG, ao ser inquirido como testemunha, também se referiu a BB como sendo namorado de AA, afirmando desconhecer se os mesmos eram casados66. Acresce que, no que se refere à concreta divisão onde se encontraria, o que teria ouvido, como se teria inteirado do que se passava no exterior, o que teria então percecionado e o que teria comunicado à sua namorada e às demais pessoas aí presentes, apresentou uma versão completamente díspar da descrita por FF. Na verdade, é certo que referiu que se encontrava numa divisão distinta daquela outra onde se encontravam as demais pessoas. Contudo, foi preciso referir que se tratava de um género de uma sala de jantar e não de um escritório, acrescentando até que não existia qualquer escritório naquela residência67. Por outro lado, referiu que teria ouvido gritos de uma voz feminina68, após o que se teria dirigido a uma varanda e não a qualquer janela69, sendo que teria visto o arguido, de joelhos no chão, a ser agarrado pelo pescoço por AA e a ser batido por BB, o que teria transmitido à sua namorada e demais pessoas presentes71. Nessa medida, cumpre salientar que o recorrente, nas declarações que prestou em audiência de julgamento, ao descrever a contenda de que teria sido vítima, inicialmente foi totalmente omisso a ter sido agarrado no pescoço enquanto estava de joelhos no chão72, só o tendo feito quando perguntado diretamente sobre se teria sido agredido nessa posição73. Seja como for, da audição da gravação integral dos depoimentos prestados em audiência por FF, GG, EE e DD ficou evidente que nenhum deles assistiu ao início da contenda. Na verdade, embora FF e GG tenham também afirmado que se teriam deslocado até junto dos ofendidos e recorrente, afirmaram que quando lá chegaram já não estariam a ser desferidas agressões74. Por seu turno, EE referiu que não teria assistido a nada e que se teria deslocado à varanda da sua residência, altura em que apenas teria ouvido gritos do seu marido, razão pela qual se teria deslocado à porta, precisamente no momento em que o recorrente vinha a entrar75. Por fim, DD nunca referiu que se encontrava no local, pelo que a nada assistiu. Nessa medida, é certo que as referidas testemunhas que acorreram ao local nada podiam então conter, mas tão só evitar que novas agressões fossem desferidas. Contudo, pelo todo o já exposto, os seus depoimentos e as declarações do recorrente não têm a aptidão de infirmar a versão concordante dos ofendidos, que referiram terem sido agredidos pelo recorrente assim que o mesmo deles se aproximou, sem que lhe tivessem feito ou dito algo, versão que, conforme foi destacado pelo tribunal recorrido, encontra apoio nos boletins clínicos (cfr. fls. 74 e 102) e nos autos de exame direto (cfr. ref.ªs 146020388 e 146020841 de 09-10-2020). Por fim, cumpre salientar que a convicção do julgador não está sujeita a uma “contabilidade das provas”, pelo que a função de julgar não se resume à função de encontrar o máximo denominador comum entre as declarações e depoimentos prestados (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15-09-2015, processo n.º 61/14.5PAALM.L1-576). Acresce que uma prova sem divergências e até, por vezes, contradições, é uma utopia (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 25-09-2013, processo n.º 559/12.0JACBR-A.C277), não sendo a sua verificação automaticamente sinónimo de falta de credibilidade dos declarantes e testemunhas, caso sejam esses os meios de prova em causa, e sem que tal impeça o julgador de formar a sua convicção (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 17-03-2010, processo n.º 152/07.9TASRE.C178). Assim, a argumentação expendida pelo recorrente não impõe dar como não provada a referida factualidade provada impugnada. Acresce que, na estrita medida que se demonstrou que o recorrente agrediu BB assim que chegou junto dele e de AA, tendo depois agredido esta quando a mesma se meteu no meio daqueles, também não se pode reconhecer que o recorrente agiu para repelir uma qualquer agressão atual, iminente ou que estivesse a ser desferida por AA e/ou BB (cfr. arts. 31.º, n.º 2, al. a), e 32.º, do C.P.) ou que estão verificados os pressupostos para a dispensa de pena (cfr. art.º 143.º, n.º 1, al. a), do C.P.), hipóteses subsidiariamente defendidas pelo recorrente para o caso de não vingar a propugnada alteração da matéria de facto, no sentido de parte dos factos provados 6. e 9. e os factos provados 3., 4., 5., 12., 13., passarem a não provados. Assim, a argumentação expendida pelo recorrente, quer nas motivações, quer nas conclusões do recurso, não é de todo eficiente para produzir qualquer outra alteração da matéria de facto, mantendo-se, pois, no mais, a factualidade dada como provada, embora por razões nem sempre coincidentes com as expostas pelo tribunal recorrido. Improcede, pois, também nesta parte, o recurso. II.4.G. Da escolha e medida da sanção: Não estando verificados os pressupostos da dispensa de pena (cfr. art.º 143.º, n.º 3, al. a), do C.P.), conforme resulta do já exposto (cfr. II.4.F.), cumpre salientar que o tribunal de recurso apenas deverá intervir alterando a medida das penas concretas em casos de manifesta desproporcionalidade na sua fixação ou quando os critérios de determinação da pena concreta imponham a sua correção, atentos os parâmetros da culpa e da prevenção em face das circunstâncias do caso (cfr. DIAS, Jorge de Figueiredo, in Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pág. 197; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18-05-2022, processo n.º 1537/20.0GLSNT.L1.S179). Apesar de cada um dos crimes em causa ser punido com uma pena de prisão ou, em alternativa, com uma pena de multa (cfr. art.º 143.º, n.º 1, al. a), do C.P.), a opção por esta impõe-se. Na verdade, desde logo face à ausência de antecedentes criminais, afigura-se que a pena de multa ainda se mostra apta a realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, isto é, a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente do crime na sociedade, face à séria possibilidade de se alcançar, por essa via, a reinserção do recorrente, dissuadindo-o da prática de futuros crimes (cfr. arts. 40.º. n.º 1, e 70.º do C.P.). Cada um dos crimes de ofensa à integridade física simples é punido com uma pena de multa a fixar entre 10 e 360 dias de multa (cfr. arts. 47.º, n.º 1 e 143.º, n.º 1, do C.P.). Ora, a determinação da medidas de cada uma das penas de multa as penas tem como critérios a culpa do agente e as exigências de prevenção, sendo a função desempenhada por cada um destes critérios definida de acordo com a chamada teoria da moldura da prevenção ou da defesa do ordenamento jurídico (cfr. art.º 71.º, n.º 1, do C.P. e ANTUNES, Maria João, in Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, 2013, pág. 41 e segs.). Deste modo, a prevenção geral de integração está incumbida de fornecer o limite mínimo, que tem como fasquia superior o ponto ótimo de proteção dos bens jurídicos e inferior o ponto abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem pôr em causa a sua função tutelar (cfr. art.º 40.º, n.º 1, do C.P.). Por seu turno, a culpa, entendida em sentido material e referida à personalidade do agente expressa no facto, surge como limite inultrapassável de toda e qualquer consideração preventiva (cfr. art.º 40.º, n.º 2, do C.P.). Ora, dentro desses limites cabe à prevenção especial a determinação da medida concreta da pena, sendo de atender à socialização do agente. Assim, na determinação da medida da pena, o tribunal encontra-se vinculado à observância de três proposições político-criminais: - O direito penal é um direito de proteção de bens jurídicos; - A culpa é tão-só limite da pena, mas não seu fundamento; e - A socialização é a finalidade da aplicação da pena (cfr. RODRIGUES, Anabela Miranda, in “Medida da pena de prisão – desafios na era da inteligência artificial”, Revista de Legislação e Jurisprudência, n.º 4021, Ano 149.º, março-abril de 2020, pág. 260). Assim, importa ter em conta, dentro dos limites abstratos definidos pela lei, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo legal de crime, deponham a favor ou contra o recorrente, na medida em que se mostrem relevantes para a culpa ou para exigências preventivas. Contudo, apesar de estar assim vedada a valoração de circunstâncias que façam já parte do tipo de crime (cfr. art.º 71.º, n.º 2, do C.P.), não se poderá ignorar a ambivalência que as particulares circunstâncias do caso a atender podem possuir, relevando, assim, para a culpa, mas também para a prevenção (geral e especial), sem que dai resulte violada a proibição da dupla valoração (cfr. DIAS, Jorge de Figueiredo, in Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pág. 248). Atenta a frequência inquietante deste género de criminalidade, são elevadas as exigências de prevenção geral que se fazem sentir para se restabelecer a confiança na vigência e validade das normas violadas e que, assim, apontam para um firme sancionamento dos agentes deste género de criminalidade. Ora, a pena de multa não pode representar uma forma disfarçada de absolvição ou o Ersatz de uma dispensa ou isenção de pena que se não tem a coragem de proferir, antes devendo representar uma censura suficiente do facto e, simultaneamente, uma garantia para a comunidade da validade e vigência da norma violada (cfr. DIAS, Jorge de Figueiredo, in Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Editorial Notícias, 1993, pág. 119). Os factos são caracterizados por uma já considerável ilicitude, que não é de “grau baixo”, uma vez que o recorrente dirigiu a sua conduta também contra a sua filha e praticou diversas condutas contra esta e, sobretudo, contra BB, sendo também grave o modo de execução, tendo em conta a multiplicidade de zonas atingidas, o que é particularmente evidente no caso de BB. Apesar de não terem sido especialmente gravosas as consequências causadas, também não podem ser qualificadas de “nada gravosas”, atenta a necessidade de assistência hospitalar e o período de doença causado e, assim, a alteração que necessariamente implicaram na vida dos ofendidos. Por outro lado, o arguido agiu com a modalidade mais intensa de dolo, que se mostra direto, pelo que, sendo a forma mais gravosa de dolo, representa maior desvalor, não podendo, pois, ser qualificado de “baixo grau”. Para além disso, milita contra o recorrente a motivação para os crimes, ou seja, a não aprovação da sua parte da relação da sua filha com BB, bem como a forte persistência da resolução criminosa tomada e que transparece do facto de, não obstante se encontrar em inferioridade numérica, ter agredido os ofendidos na via pública e à saída do prédio onde estes foram apresentar condolências pela morte de um amigo do recorrente. Acresce que não hesitou em agredir a sua filha e, sobretudo, quando esta apenas procurou defender terceiro, relação familiar e concreta atitude que demandaria maior contensão por parte do arguido, o que eleva a sua culpa no concerne aos factos praticados contra AA. Assim, tudo ponderado, consta-se que a personalidade do recorrente manifestada nos factos é também bastante desvaliosa, o que milita contra si. Por outro lado, não ocorreu qualquer arrependimento sincero por parte do recorrente em relação à prática dos crimes aqui em causa e, assim, de um juízo crítico em relação ao seu comportamento anterior, não se verificando, desde logo, motivo para qualquer atenuação da pena (cfr. art.º 72.º, n.º 2, al. c), do C.P.). Por fim, após os factos, o recorrente manteve, aparentemente, boa conduta, o que milita a seu favor. Ora, tudo ponderado, afigura-se que as penas parcelares fixadas pelo tribunal recorrido não são manifestamente desproporcionais, não impondo os critérios de determinação da pena concreta a sua correção, atentos os parâmetros da culpa e da prevenção em face das circunstâncias do caso acima elencados. A pena única terá, considerando para o efeito as penas aplicadas parcelarmente, como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (cfr. art.º 77.º, n.º 1 e n.º 2 do C. P.). Assim, no presente caso, para o condenado a pena única de prisão terá como limite mínimo 120 dias de multa e 360 dias de multa no seu limite máximo. Estabelecida a moldura penal do concurso, deve determinar-se a pena conjunta do concurso, dentro dos limites daquela. Tal pena será encontrada em função das exigências de culpa e de prevenção, tendo o legislador fornecido, para além dos critérios gerais estabelecidos no art.º 71.º do C. P., um critério especial: “Na determinação concreta da pena serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente” (cfr. art.º 77.º, n.º 1, 2.ª parte, do C.P.). Importa, pois, detetar a possível conexão e o tipo de conexão que intercede entre os factos concorrentes, tendo em vista a totalidade da atuação do respetivo arguido como unidade de sentido, que possibilitará uma avaliação global e a “culpa pelos factos em relação” (cfr. MONTEIRO, Cristina Líbano, in “A Pena “Unitária” do Concurso de Crimes”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 16, n.º 1, págs. 162 e segs.). Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique (cfr. DIAS, Jorge de Figueiredo, in As Consequências Jurídicas do Crime, Editorial de Notícias, pág. 286). Na avaliação desta personalidade unitária do agente, releva, sobretudo a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência, ou eventualmente mesmo a uma carreira criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade, sendo que só no primeiro caso será de atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. No entanto, não pode ser esquecida a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do respetivo agente. A concreta circunstância que deva servir para determinar a moldura penal aplicável ou para escolher a pena não deve ser de novo valorada para quantificação da culpa e da prevenção relevantes para a medida da pena, nisso se traduzindo o princípio da proibição de dupla valoração (cfr. art.º 71.º, n.º 2, do C.P. e DIAS, Jorge de Figueiredo, in Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pág. 237). Contudo, apesar de os princípios da culpa e da prevenção se refletirem na imagem global do facto para determinação da moldura penal aplicável, nada impede que tais princípios entrem de novo em conta, sem qualquer restrição, na operação de determinação da medida concreta da pena única em caso de concurso de crimes. Neste contexto o princípio da proibição de dupla valoração não pode dizer-se violado (cfr. DIAS, Jorge de Figueiredo, in Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pág. 238). Ora, no presente caso, não obstante terem sido dois os crimes cometidos, com distintas vítimas, tendo todos sido praticados de forma dolosa, o certo é que foram praticados num único dia, numa vida aparentemente fiel ao direito, motivados por uma desavença familiar que necessariamente conduziu a uma radicalização de posições. Assim, da imagem global dos crimes aqui em causa afigura-se que o conjunto dos factos em apreço é reconduzível a uma mera pluriocasionalidade, ou seja, é fruto de circunstâncias meramente casuais, não sendo demonstrativo, por si só, de uma personalidade reveladora de uma facilidade para delinquir. Deste modo, não será de atribuir à pluralidade de crimes cometidos um efeito particularmente agravante dentro da moldura penal conjunta. Tudo ponderado, afigura-se que a pena única fixada pelo tribunal recorrido em 160 dias de multa também não é manifestamente desproporcional, não impondo os critérios de determinação da pena única a sua correção a favor do recorrente, atentos os parâmetros da culpa e da prevenção, em face das circunstâncias do caso acima elencados. Deste modo, quanto à medida das penas parcelares e da pena única, improcede o recurso. II.5 Das custas: Só há lugar ao pagamento da taxa de justiça quando ocorra condenação em 1ª instância e decaimento total em qualquer recurso (cfr. art.º 513.º, n.º 1, do C.P.P.), sendo o arguido condenado em uma só taxa de justiça, ainda que responda por vários crimes, desde que sejam julgados em um só processo (cfr. art.º 513.º, n.º 2, do C.P.P.), devendo a condenação em taxa de justiça ser sempre individual e o respetivo quantitativo ser fixado pelo juiz, a final, nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais (R.C.P.) (cfr. art.º 513.º, n.º 3, do C.P.P.). Assim, nos termos do art.º 8.º, n.º 9, do R.C.P. e da Tabela III a ele anexa, deve o recorrente ser condenado entre 3 UC e 6 UC a título de taxa de justiça, tendo em vista a complexidade da causa. Assim, na área do processo penal, tendo em conta o seu primacial interesse público, que escapa à vontade privada, bem como o estatuto do arguido enquanto sujeito processual e as garantias de defesa que lhe são reconhecidas, nomeadamente o direito ao recurso (cfr. art.º 32.º, n.º 1, da C.R.P.), o legislador entendeu que o arguido só poderia ser responsabilizado pelo pagamento das custas, em sede de recurso, caso decaísse totalmente e, sendo esse o caso, sendo apenas sancionado com uma única taxa de justiça. Ora, assim sendo, como não houve decaimento total, não há lugar a condenação em custas. III. Decisão: III.1. Do recurso interlocutório: Julga-se totalmente improcedente o recurso interlocutório interposto pelo arguido ... em 04-09-2023, mantendo-se os despachos recorridos de 19-06-2023 e 20-06-2023; e III.2. Do recurso da sentença condenatória: Julga-se parcialmente procedente o recurso interposto pelo arguido ... em 08-09-2023 e, em consequência: - Declara-se a nulidade da sentença recorrida na parte referente à valoração (indevida) de prova proibida (o escrito de fls. 82) e expurga-se a sua valoração; - Altera-se o ponto 5. da matéria de facto provada considerada em sede da sentença recorrida para: Nessa sequência, e após AA se ter colocado entre o seu marido e o seu pai, ora arguido, por forma a tentar defender o primeiro, o arguido desferiu dois socos na barriga de AA, projetando-a contra as caixas de correio existentes na parede do edifício. mantendo-se, no mais, a sentença recorrida. Sem custas. Lisboa, 22-10-2024 Pedro José Esteves de Brito Alda Tomé Casimiro Ester Pacheco dos Santos _______________________________________________________ 1. https://julgar.pt/wp-content/uploads/2015/10/021-037-Recurso-mat%C3%A9ria-de-facto.pdf 2. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/458ff4110b557ba080258ac5002d2825?OpenDocument 3. https://files.dre.pt/1s/1995/12/298a00/82118213.pdf 4. Embora não de forma individualizada e, assim, ao arrepio do que prescreve o regulamento da tramitação eletrónica dos processos nos tribunais judiciais (cfr. art.º 6.º, n.º 1, al. b), da Portaria n.º 280/2013, de 26-08). 5. Uma vez que a menção como datando de “316-06-2023”, atenta a data em que foi junto ao processo (19-06-2023), evidencia que se trata de um lapso, permitindo concluir que data de 16-06-2023. 6. https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/902246b71ca3e8ea802589bf0050bc0c?OpenDocument 7. https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/430ad8e976d6d51080257f4c004b73a0?OpenDocument 8. https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/441166df5a32aedb80257b2e003a89d0?OpenDocument 9. https://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/3a9904849dc3cb03802576870037d51d?OpenDocument 10. https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/a7da9143315fead080258a6e0050f127?OpenDocument 11. Na verdade, a primeira fotografia junta em 16-06-2023 corresponde ao Doc. n.º 8 junto a 17-09-2021, a segunda corresponde ao Doc. n.º 4, a terceira corresponde ao Doc. n.º 7, a quarta à mesma perspetiva do já representado no Doc. 9, a quinta à mesma perspetiva do já representado nos Docs. 4 e 8, a sexta corresponde ao Doc. n.º 10, embora esta esteja invertida, a sétima ao Doc. n.º 6 e a oitava ao Doc. n.º 9. 12. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/14a035b5daf2dd828025757400392b43?OpenDocument 13. http://www.gde.mj.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/4ba07ff9c6b0047380258956005334f6?OpenDocument 14. https://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/04a12b72e7498f5980258655004cf69f?OpenDocument 15. https://www.dgsi.pt/Jtrl.nsf/e6e1f17fa82712ff80257583004e3ddc/e9806bfa20a094e08025885a002de42b?OpenDocument 16. https://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/04a12b72e7498f5980258655004cf69f?OpenDocument 17. https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/-/75CEDD8E125278D280257DE100574FFE 18. https://files.dre.pt/1s/1995/12/298a00/82118213.pdf 19. https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/d554062af9a927d8802589e5004f8707?OpenDocument 20. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/90c6da39f801d65f8025884b00348994?OpenDocument 21. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/d6878c2bc7f7366d802589c9002c619e?OpenDocument 22. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/-/58025220871E6B4280256BC7004A8E55 23. Havendo até quem defenda que a cominação das provas proibidas não é a nulidade, mas sim o da inexistência jurídica (cfr. OLIVEIRA, Luís Pedro Martins de, in “Da Autonomia do Regime das Proibições de prova”, Prova Criminal e Direitos de Defesa – Estudos sobre teoria da prova e garantias de defesa em processo penal, Livraria Almedina, 2013, pág. 122). 24. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/02954fdc1781068280258045003c7ab7?OpenDocument 25. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/6082ccff48a8006980257421003b9252?OpenDocument 26. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/47eb7e0849111c6580257998003d0cef?OpenDocument 27. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/c7dcd6bda2db075d80258994005a27e8?OpenDocument 28. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/9ef00b0801a870188025773c004a035a?OpenDocument 29. https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/61409dedf43d4bec80258b5000462bf2?OpenDocument 30. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/a9590b9e5e74c3c7802589fd0039aad7?OpenDocument 31. Conforme resulta da audição da gravação das declarações do recorrente prestadas em 23-05-2023, de 00min42s a 00min52s. 32. Conforme resulta da audição da gravação das declarações do recorrente prestadas em 23-05-2023, de 00min42s a 02min23s. 33. Conforme resulta da audição da gravação do depoimento por ela prestado em 23-05-2023, de 14min38s a 16min04s, de 17min06s a 17min33s, de 17min46s a 17min53s. 34. Conforme resulta da conjugação da audição da gravação do depoimento de AA de 08min56s a 09min09s, de 15min03s a 16min03s, do depoimento de BB de 07min07s a 10min37s, do depoimento de EE de 14min29s a 15min09s, bem como das declarações do recorrente de 02min37s a 03min10s, todos prestados em 23-05-2023. 35. Conforme resulta da audição da gravação das declarações do recorrente prestadas em 23-05-2023, de 02min44s a 03min15s. 36. Conforme resulta da audição da gravação do depoimento por ela prestado em 23-05-2023, de 14min38s a 16min04s, de 16min47s a 17min33s, de 17min53s a 18min44s. 37. Conforme resulta da audição da gravação do respetivo depoimento prestado em 23-05-2023, de 01min11s a 01min24s. 38. Conforme resulta da audição da gravação do respetivo depoimento prestado em 23-05-2023, de 08min50s a 08min58s. 39. Conforme resulta da audição da gravação do respetivo depoimento prestado em 23-05-2023, de 06min29s a 06min32s. 40. Conforme resulta da audição da gravação do respetivo depoimento prestado em 23-05-2023, de 08min16s a 08min28s e de 08min54s a 09min15s. 41. Quanto ao depoimento de AA, prestado em 23-05-2023, de 8min11s e até 8min25s e também de 14min a 14min21s da respetiva gravação, e quanto ao depoimento de BB, também prestado em 23-05-2023, a partir de 16min11s e até 17min12s, da respetiva gravação. 42. https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/657c08333b1da02180257f5a004ad50e?OpenDocument 43. https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/b55898c650dc45de80258706007093dc?OpenDocument 44. Conforme resulta da audição da gravação das declarações do recorrente prestadas em 23-05-2023, de 5min57s a 9min24s. 45. Conforme resulta da audição da gravação das declarações do recorrente prestadas em 23-05-2023, de 9min7s a 9min14s. 46. Conforme resulta da audição da gravação das declarações do recorrente prestadas em 23-05-2023, de 9min14s a 9min17s. 47. Conforme resulta da audição da gravação das declarações do recorrente prestadas em 23-05-2023, de 9min53s a 9min06s. 48. Conforme resulta da audição da gravação das declarações do recorrente prestadas em 23-05-2023, de 10min07s a 10min22s. 49. Conforme resulta da audição da gravação das declarações do recorrente prestadas em 23-05-2023, de 13min28s a 18min32s. 50. Evidenciadas em vários momentos da audiência de julgamento, conforme resulta da audição da gravação, nomeadamente, durante o depoimento de de DD, prestado em 23-05-2023, de 04min51s a 05min15s, ou durante o depoimento de EE Chorela prestado em 23-05-2023, de 8min a 8min30s. 51. Conforme resulta da audição da gravação das alegações iniciais do Ministério Público prestadas em 30-05-2023, de 1min34s a 2min16s. 52. Conforme resulta, por exemplo, da audição da gravação do depoimento de EE Chorela prestado em 23-05-2023, de 5min10s a 5min30s. 53. Conforme resulta da gravação do depoimento de EE Chorela prestado em 23-05-2023, de 7min33s a 7min42s. 54. Conforme resulta da gravação do depoimento de EE Chorela prestado em 23-05-2023, de 25min33s a 26min50s. 55. Conforme resulta da gravação do depoimento de AA prestado em 23-05-2023, de 06min49s a 08min30s, bem como do depoimento de BB prestado na mesma data de 13min10s a 18min23s e de 20min41s a 21min23s. 56. Conforme resulta da gravação do depoimento de AA prestado em 23-05-2023, de 10min07s a 10min54s. 57. AA apresou queixa às 22h08min, do dia 25-08-2019 (cfr. ref.ª 23873899 de 04-09-2019), BB pelas 21h14min, do dia 25-08-2019 (cfr. ref.ª 23876618 de 05-09-2019), e o recorrente pelas 01h35min, do dia 26-08-2019 (cfr. ref.ª 8714734 de 30-08-2019) 58. https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/a1ca8c093b70d21180258903005a91e8?OpenDocument 59. https://files.dre.pt/gratuitos/1s/1992/02/033a00.pdf 60. Conforme resulta da audição da gravação das declarações do recorrente prestadas em 23-05-2023, de 22min04s a 22min09s. 61. Conforme resulta da audição da gravação das declarações do recorrente prestadas em 23-05-2023, de 12min26s a 14min31s. 62. Conforme resulta da audição da gravação do depoimento de AA prestado em 23-05-2023, de 05min44s a 06min09s. 63. Conforme resulta da audição da gravação das declarações do recorrente prestadas em 23-05-2023, de 08min19s a 08min23s. 64. Conforme resulta da audição da gravação do seu depoimento prestado em 23-05-2023, de 06min52s a 07min05s. 65. Conforme resulta da audição da gravação do seu depoimento prestado em 23-05-2023, de 07min06s a 07min52s. 66. Conforme resulta da audição da gravação do seu depoimento prestado em 23-05-2023, de 01min20s a 01min36s, de 02min27s a 02min35s. 67. Conforme resulta da audição da gravação do seu depoimento prestado em 23-05-2023, de 02min20s a 0227s, de 03min01s a 03min10s, de 08min a 08min18s. 68. Conforme resulta da audição da gravação do seu depoimento prestado em 23-05-2023, de 02min41s a 02min47s, de 07min39s a 07min45s. 69. Conforme resulta da audição da gravação do seu depoimento prestado em 23-05-2023, de 02min27s a 02min35s, de 06min46s a 06min53s, de 07min49s a 08min33s. 70. Conforme resulta da audição da gravação do seu depoimento prestado em 23-05-2023, de 02min47s a 03min01s. 71. Conforme resulta da audição da gravação do seu depoimento prestado em 23-05-2023, de 03min01s a 03min10s. 72. Conforme resulta da audição da gravação das declarações por si prestadas em 23-05-2023 de 05min57s a 12min57s. 73. Conforme resulta da audição da gravação das declarações por si prestadas em 23-05-2023 de 20min a 22min28s. 74. Conforme resulta da audição do depoimento de FF prestado em 23-05-2023 de 07min55s a 08minm40s e do depoimento prestado por GG no mesmo dia de 04min54s a 05min55s. 75. Conforme resulta da audição do seu depoimento prestado em 23-05-2023 de 03min47s a 04min26s. 76. https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/d932009dd0dc2f6480257ec9003b3242?OpenDocument 77. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/123dabb6825ce9cf80257bf800377401?OpenDocument 78. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/77a7903791d91f94802576fe004a9270?OpenDocument 79. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/deea6d084a733dfa802588470031b727?OpenDocument |