Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | SUSANA MESQUITA GONÇALVES | ||
Descritores: | NULIDADES DA SENTENÇA BANCO INSTITUIÇÃO DE CRÉDITO TRANSMISSÃO DE RESPONSABILIDADES BES OBRIGAÇÃO | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 09/26/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTE | ||
Sumário: | (elaborado pela Relatora, nos termos do artigo 663, n.º 7, do Código de Processo Civil) I. As nulidades da decisão não incluem o erro de julgamento seja de facto ou de direito. As nulidades típicas da sentença reconduzem-se a vícios formais decorrentes de erro de atividade ou de procedimento (error in procedendo) respeitante à disciplina legal. Trata-se de vícios de formação ou atividade (referentes à inteligibilidade, à estrutura ou aos limites da decisão) que afetam a regularidade do silogismo judiciário, da peça processual que é a decisão e que se mostram obstativos de qualquer pronunciamento de mérito, enquanto o erro de julgamento (error in judicando) que resulta de uma distorção da realidade factual (error facti) ou na aplicação do direito (error juris), de forma a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa, traduzindo-se numa apreciação da questão em desconformidade com a lei, consiste num desvio à realidade factual (nada tendo a ver com o apuramento ou fixação da mesma) ou jurídica, por ignorância ou falsa representação da mesma. II. Não se deve considerar excluída a transmissão das responsabilidades do BES na execução de contratos em que o Novo Banco passou a ocupar a posição daquela entidade bancária, sempre que essa exclusão afete o sinalagma contratual, devendo, nessas situações, considerarem-se igualmente transmitidas as responsabilidades associadas aos elementos do ativo transferidos. | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa I. Relatório: V (…), Lda., com sede (…), intentou a presente ação declarativa de processo comum contra Novo Banco, S.A., com sede (…), pedindo que: a) se considere a Cláusula 9.ª das Condições Gerais excluída do Contrato de Financiamento (…), por violação dos deveres de comunicação e informação previstos nos artigos 5.º, 6.º e 8.º da LCCG; caso assim não se entenda. b) se declare nula, por abusiva, a comunicação e, consequentemente, a alteração unilateral do spread do Contrato Financiamento n.º (…), ao abrigo dos artigos 5.º e 6.º da LCCG, e por violar o princípio da boa-fé, previsto no artigo 15.º da LCCG e no artigo 227.º do Código Civil, conjugados com o artigo 294.º e 295.º do Código Civil; caso assim não se entenda, c) se declare nula, por abusiva, a Cláusula 9.ª das Condições Gerais do Contrato de Financiamento n.º (…), por violação do princípio da boa-fé e dos artigos 15.º, 16.º, 22.º e 19.º, n.º 1, alínea d), da LCCG; caso assim não se entenda, d) se considere ilícita a alteração unilateral do spread por violação da Cláusula 9.º das Condições Gerais e Particulares do Contrato de Financiamento n.º (…), ao abrigo do artigo 762.º n.º 2 do Código Civil; e) em todo o caso e na decorrência dos anteriores pedidos, que se condene o Réu: (i) à restituição da soma dos montantes semestrais entregues pela Autora por aplicação de taxa que não a taxa Euribor 6 meses acrescida do spread de 2%, prevista na cláusula 9.º das Condições Particulares do Contrato de Financiamento n.º (…), acrescido do correspondente montante pago a título de imposto de selo, o valor pago a título de comissões, bem como os valores entregues em excesso a título de amortizações de capital, que tudo somado perfaz um montante global € 153.358,49, e ao pagamento de juros moratórios desde a citação. (ii) À restituição de todos os montantes que vierem a ser exigidos à Autora pelo Réu por aplicação de taxa que não a taxa Euribor 6 meses acrescida do spread de 2%, prevista na cláusula 9.º das Condições Particulares do Contrato de Financiamento n.º (…), desde a data da instauração da presente ação e até à prolação da sentença, em virtude da procedência dos anteriores pedidos. Alegou, em síntese: - No dia 30 de Janeiro de 2008, foi celebrado entre a Autora, o Réu, LS (…) e MR (…), os últimos na qualidade de prestadores de garantia de aval, o contrato de financiamento n.º (…); - O Contrato de Financiamento n.º (…) foi integralmente redigido pelo Réu, tendo sido o texto final do contrato remetido e disponibilizado à Autora em cima da data de celebração do contrato, com uma antecedência insuficiente para o efetivo esclarecimento e compreensão dos termos do mesmo; - O contrato tinha a duração de 180 meses e foi acordada a aplicação de uma taxa de juro variável que resultaria da soma de duas componentes: o indexante Euribor 6 meses e o spread de 2%; - No início de 2009, o Réu alterou unilateralmente o spread aplicável ao financiamento para 3,5%, tendo o Réu comunicado a alteração por meio de cartas, justificando a alteração e referindo o carácter excecional do ajustamento, sendo ainda estabelecido o prazo de 30 dias para a Autora resolver o contrato com fundamento na alteração aos spreads aplicáveis; - Nestas comunicações o Réu não estabelece a relação entre os fundamentos elencados e a necessidade de alteração do spread aplicável ao contrato, não identifica o tipo de operação para a qual afirma ter havido aumento de custo na obtenção de fundos e não quantifica tal aumento; - A Autora, por carta, demonstrou a sua discordância relativamente à alteração unilateral à taxa de spread; - Em resposta, o Réu explica que o contrato previa a possibilidade de alteração unilateral da taxa de juro no caso de alterações supervenientes do mercado; - A cláusula em questão nunca foi objeto de negociação pelas partes e nunca foi devidamente explicada à Autora pelo Réu; - O Réu enviou posteriormente minutas de alteração ao contrato onde consta o spread de 3%, solicitando a sua assinatura, ao que a Autora respondeu referindo não aceitar e expressamente rejeitar as alterações; - A Autora assinou a minuta apenas para comprovar a sua receção; - O Réu procedeu às alterações unilaterais, aplicando taxas de juros diferentes das taxas de juros acordadas; - O Réu não justificou, não comunicou as subsequentes alterações, nem informou a Autora do direito a resolver o contrato com fundamento nas alterações; - Como forma de minimizar as consequências nefastas da subida unilateral do spread e para conseguir prever a quantificação deste, foi a Autora forçada a celebrar sucessivas alterações ao contrato, com as quais não se conformou; - Foi assim cobrado indevidamente pelo Réu à Autora o montante de €153.358,49; - Em Março de 2008 foram celebrados entre Autora e Réu dois contratos de swap para cobertura de riscos inerentes à alteração da taxa de juro que vigoraram até 30 de Julho de 2012. Regularmente citado o Réu apresentou contestação, excecionando a sua ilegitimidade e impugnando a matéria alegada pela Autora, alegando, designadamente, que: - A questão da (in)validade da alteração da taxa de spread bancário surge no âmbito do contrato de financiamento entre o Banco Espírito Santo, S.A. e a Autora, não existindo à data o Réu; - A grande maioria dos factos a que a Autora se refere foram praticados antes da criação do Réu; - A inércia da Autora em recorrer aos tribunais durante um tão longo período de tempo e os acordos sobre spread e taxa de juros que celebrou com o “BES” e com o Réu foram de molde a criar a fundada convicção de que a Autora abandonara as suas queixas iniciais; - Todas as alterações do spread e da taxa de juros tiveram a aceitação da Autora; - Foi efetuado um estorno a favor da Autor no montante de € 12.443,27, relativamente à redução do spread de 4,5% para 3,75% referente ao período de 30 de Janeiro de 2013 a 29 de Julho de 2014; - A única alteração de spread que existiu desde que o Réu sucedeu ao “BES” foi a de 1 de Junho de 2016 e deu-se por acordo entre as partes, sem que a Autora tenha formulado qualquer objeção ou reserva; - Posteriormente ocorreu a alteração do tipo de taxa de juros de variável para fixa, que ocorreu também com o acordo, reduzido a escrito, de ambas as partes; - A alteração do spread por iniciativa do “BES” acontece na sequência do desencadear da crise do “subprime” a que acresceu a crise das dívidas soberanas, o que levou a uma queda abrupta e prolongada das taxas de referências e a uma absoluta falta de liquidez dos mercados do crédito; - No período de 31 de Julho de 2009 a 30 de Janeiro de 2011 o spread voltou para os 2%, tendo as partes assinado o respetivo acordo, que abrangeu não só a matéria relativa ao spread como a renúncia da Autora às reclamações anteriormente apresentadas; - A Autora assinou o contrato com inteira liberdade e negociou-o com o “BES”. Notificada para o efeito a Autora pronunciou-se sobre a exceção de ilegitimidade substantiva invocada pelo Réu, pugnando pela sua improcedência. * Dispensou-se a realização da audiência prévia, tendo-se procedido à prolação de despacho saneador, no qual se decidiu pela absolvição parcial do Réu do pedido e se procedeu à identificação do objeto do litígio e à enunciação dos temas da prova. Na sequência do recurso interposto dessa decisão, foi proferido acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa que determinou a realização de audiência prévia, no âmbito da qual se procedeu à prolação de despacho saneador, decidindo-se pela absolvição parcial do Réu do pedido e procedendo-se à identificação do objeto do litígio e à enunciação dos temas da prova. Dessa nova decisão foi interposto recurso, na sequência do qual veio a ser proferido acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça foi anulado o saneador sentença na parte em que apreciou a exceção perentória de ilegitimidade substantiva do Réu, determinando o prosseguimento dos autos, com produção da prova, para apreciação do mérito da causa, incluindo no que se refere à exceção de ilegitimidade substantiva. Nesse seguimento, foi proferido despacho, identificando-se o objeto do litígio e enunciando-se os temas da prova. * Realizou-se o julgamento, com observância do formalismo legal, na sequência do qual foi proferida sentença cujo segmento decisório aqui se reproduz: “(…) Tendo em atenção as considerações expendidas e as normas legais citadas, julga-se a ação parcialmente procedente e nesses termos: 1 – Declara-se nula a Cláusula 9.ª das Condições Gerais do Contrato de Financiamento (…), considerando-se a mesma excluída dos termos do contrato e, em consequência, condena-se o Réu NOVO BANCO, S.A. a restituir à Autora V (…), LDA. os valores pagos em excesso por esta no âmbito do contrato de financiamento n.º (…) quanto ao período compreendido entre 3 de Agosto de 2014 a 29 de Janeiro de 2016, quantia que deverá ser liquidada em posterior incidente e que corresponde à diferença entre os montantes efectivamente pagos pela Autora nesse período (que inclui capital amortizado, juros remuneratórios, comissões e imposto de selo) e o valor devido por aplicação da taxa Euribor a 6 meses, acrescida do spread de 3%. 2 – Absolver o Réu do demais peticionado. * Custas a cargo da Autora e do Réu, provisoriamente, em parte iguais. * Notifique e registe. (…).” * Não se conformando com essa decisão, dela veio a Autora recorrer. A concluir as suas alegações formulou as seguintes conclusões: “(1) Enquanto questão prévia, importa referir que a douta Sentença da qual se recorre contém um lapso manifesto dado que, se por um lado, “Também ficou decidido que a Autora tem direito à restituição das quantias pagas por imposição contratual baseada na cláusula contratual geral excluída e bem assim os juros que sobre tais quantias se venceram e vencerem.”, conforme resulta da página 36 da Sentença, (2) Contudo, o dispositivo é omisso quanto aos “juros que sobre tais quantias se venceram e vencerem”, condenando o Recorrido “(…) a restituir à Autora V (…), LDA. os valores pagos em excesso por esta no âmbito do contrato de financiamento n.º (…) quanto ao período compreendido entre 3 de Agosto de 2014 a 29 de Janeiro de 2016, quantia que deverá ser liquidada em posterior incidente e que corresponde à diferença entre os montantes efectivamente pagos pela Autora nesse período (que inclui capital amortizado, juros remuneratórios, comissões e imposto de selo) e o valor devido por aplicação da taxa Euribor a 6 meses, acrescida do spread de 3%”. (3) Não comportando tal omissão a nulidade da Sentença, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, entende a Recorrente que deverá ser o dispositivo da Sentença retificado, ao abrigo do artigo 614.º, n.º 2 do CPC, para que, em conformidade com o julgado, nela se incluam também os juros que se venceram e vencerem sobre as quantias a cuja restituição o Tribunal a quo condenou o Recorrido. (4) A Recorrente não se conforma com douta Sentença do Tribunal a quo na parte em que absolve o Recorrido da obrigação de restituir à Recorrente as quantias pagas por imposição contratual baseada em cláusula contratual geral que declarou excluída do contrato de financiamento n.º (…), por nula, pedido com fundamento em ilegitimidade substantiva. (5) Entende a Recorrente que na decisão recorrida, não só não está devidamente fundamentada, como padece de contradições entre os fundamentos que invoca e a matéria de facto provada e a própria decisão, o que, consequentemente comporta a sua nulidade. (6) Com efeito, a Sentença não está devidamente fundamentada já que o Tribunal a quo decide por referência errónea ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31 de março de 2022, que anulou o saneador-sentença na parte em que apreciou a exceção perentória de ilegitimidade substantiva do Recorrido, para fundamentar a sua decisão de absolver parcialmente o Recorrido. (7) Sucede que aquele Acórdão não se pronunciou sobre mérito dos presentes autos, determinando apenas a sua continuidade para “apuramento da matéria de facto controvertida”, entendendo ser necessário proceder ao apuramento dos factos alegados para decidir corretamente sobre o pedido, face à detetada possibilidade de transmissão para o NOVO BANCO da responsabilidade pela restituição dos valores pagos em excesso pela Recorrente. (8) Não pode considerar-se fundamentação suficiente a afirmação genérica de já não existia sinalagma contratual entre a Autora e o Réu por não constar da factualidade apurada que a Autora não tenha cumprido as obrigações resultantes do contrato de financiamento com fundamento na exceção de não cumprimento ou tenha invocado a compensação relativamente a prestações devidas. (9) Quando a exceção de não cumprimento ou invocação de compensação relativamente às prestações devidas, a que alude, foram apenas dois mecanismos que o STJ referiu a título meramente exemplificativo para ilustrar situações das quais resultaria em abstrato (e não no caso concreto) uma quebra do equilíbrio contratual. (10) No caso concreto, dada a natureza do contrato de mútuo, tal factualidade nunca poderia estar apurada, por impossível, pois o mecanismo da exceção do não cumprimento implica que cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efetuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo, tal como resulta do artigo 428.º do Código Civil; e, nos presentes autos, a contraprestação do Recorrido já se havia esgotado com a colocação do capital mutuado à disposição do Recorrente em 2008. (11) Assim, a Sentença não se encontra fundamentada, na parte em que decide pela não transmissão para o Recorrido da totalidade das responsabilidades associadas ao Contrato de Financiamento, o que, nos termos do artigo 615.º, n. 1, al. b), equivale a falta de fundamentação, com o que aqui se verifica a sua nulidade. (12) Também se verifica nulidade da douta Sentença, ao abrigo do artigo c) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, quando ela atribui à Recorrente o direito à restituição das quantias pagas por imposição contratual e juros sobre tais quantias, decorrentes das alterações unilaterais de spread operadas desde 2008, ao abrigo de uma Cláusula contratual que agora declara nula, e, ao mesmo tempo, a Sentença exime o Recorrido da obrigação de restituir a totalidade daqueles valores, impedindo a recorrente de exercer na integralidade o direito de crédito declarado na própria Sentença. (13) Com efeito, não se pode deixar de concluir que na Sentença a decisão contradiz-se a si mesma, declarando um direito e impedindo parcialmente o seu exercício. (14) A Sentença padece também de erro de julgamento, dado que fez uma errada interpretação e aplicação da lei e dos factos - e bem assim do sentido do Acórdão do STJ de 31 de março de 2022 - nos quais se suporta, deles extraindo conclusões de onde não poderiam ser retiradas, como a verificação da exceção da ilegitimidade substantiva do Recorrido quanto à obrigação de restituição dos valores indevidamente cobrados pelo BES na vigência do contrato objeto da presente ação, em momento anterior à Deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014. (15) Assim, tendo considerado provado que foi o Novo Banco – e não o BES – quem, na decorrência de aprovação, pelo BES, de redução de spread com data retroativa, efetuou um estorno a favor da Recorrente, no dia 27 de Agosto de 2014 (ou seja, já após a resolução do BES), no montante de €12.433,27, conforme resulta da matéria de facto provada em 27 e 28 - não podia o Tribunal a quo concluir não se terem transmitido as responsabilidades associadas aos elementos do ativo transferidos no âmbito daquele contrato de financiamento, mormente, a da restituição dos valores pagos em excesso pela Recorrente em períodos anteriores a 3 de agosto de 2014. (16) Assim, face à matéria de facto provada, a decisão nunca poderia ser outra senão a de condenar integralmente o Recorrido à restituição de todas as quantias pagas por imposição contratual baseada na Cláusula nula e bem assim os juros que sobre tais quantias se venceram e vencerem, a que o Tribunal determinou ter a Recorrente direito, e não apenas quanto às datas posteriores a 3 de Agosto de 2014, demonstrada que ficou a transmissão das responsabilidades associadas aos elementos do ativo transferidos para o Recorrido. (17) Por outro lado, o Tribunal a quo, faz uma interpretação enviesada de parte do texto do Acórdão do STJ no qual se sustenta, quando confunde a abstenção da Recorrente em lançar mão de dois meios de defesa exemplificados pelo STJ, com o perigar de um sinalagma perante a não transmissão das responsabilidades do BES para o banco de transição. (18) Com o que conclui pela extinção do sinalagma finda a duração do contrato – o que não corresponde à verdade, dado que à data da propositura da presente ação, com o que a Recorrente se pretendeu defender do abusivo exercício de um direito por banda do Recorrido o contrato ainda decorria - interpretação essa que não encontra correspondência, nem no texto, nem no sentido do raciocínio do STJ. (19) Resulta daquele Acórdão que o Banco de Portugal não pode determinar uma transferência parcial de direitos e obrigações para a entidade de transição que impeça uma cessão integral das posições contratuais da entidade bancária objeto da medida de resolução, sempre que tal resulte num desequilíbrio superveniente entre as prestações das partes. (20) Defende o STJ que “A exclusão de uma contingente responsabilidade do Novo Banco pela restituição de quantias alegadamente pagas em excesso ao BES, a título de juros remuneratórios, mesmo antes da resolução desta instituição bancária, é suscetível de colocar em causa a cessão integral da posição contratual do BES naquele contrato, uma vez que essa eventual responsabilidade continuaria a incidir sobre esta entidade, apartando-se da relação contratual que atualmente tem como partes a Autora e o Novo Banco, o que pode afetar o sinalagma inerente a tal relação, vedando à Autora a utilização de mecanismos como a exceção de não cumprimento e a compensação, perante o Novo Banco, mediante a invocação do direito de crédito correspondente à alegada responsabilidade” (negrito e sublinhado nossos). (21) O STJ quis ilustrar que não pode haver exclusão de responsabilidades contingentes se com tal exclusão uma das partes, no caso a Recorrente, ficar despojada de quaisquer meios de defesa oponíveis ao Recorrido, incluindo o direito a recorrer à via judicial para pedir a declaração de nulidade de uma clausula contratual abusiva e o reembolso integral do pago indevidamente ao abrigo da qual o Recorrido veio a receber quantias que não lhe eram devidas, para efetivar a invocação do direito ao crédito que agora lhe foi judicialmente reconhecido. (22) Resulta, pois, daquele Acórdão, que não pode acontecer uma transferência parcial de direitos e obrigações para a entidade de transição que impeça uma cessão integral das posições contratuais da entidade bancária objeto da medida de resolução, sempre que de tal resulte um desequilíbrio superveniente entre as prestações das partes. (23) Assim, uma vez materializado com a Sentença o direito de crédito da Recorrente à restituição das quantias que pagou indevidamente ao abrigo da abusiva utilização da Cláusula 9.º das Condições Gerais do contrato com a declaração de nulidade dessa mesma cláusula, tem de se verificar transmitida para o Recorrido a responsabilidade por essa restituição uma vez que ela resulta de um direito (o direito à declaração de nulidade de cláusula ilícitas) que faz parte das posições contratais transmitida. (24) Caso contrário, estaremos perante um inaceitável desequilíbrio entre as partes, permitindo-se por um lado que o Recorrido tenha recebido da Recorrente as prestações referentes a amortização do capital mutuado, integralmente entregue à Recorrente pelo BES (e não pelo Recorrido), e por outro lado que o Recorrido seja exonerado da obrigação de restituir à Requerente as quantias que pagou indevidamente, tudo no contexto e por força do mesmo contrato de mútuo. (25) Andou assim mal o Tribunal a quo, ao interpretar incorretamente o sentido e o teor do Acórdão do STJ, entendendo que para não deixar de se exigir a manutenção do sinalagma ou equilíbrio contratual entre a Recorrente e Recorrido, bastava que a Recorrente não tivesse exercido e tivesse deixado de exercer os direitos à exceção de não-cumprimento e à compensação. Efetivamente o sinalagma (que o STJ usa como sinónimo de exigência de equilíbrio contratual) tem de se manter - e manteve quando foi reconhecido à Recorrente o direito à restituição das quantias que pagou indevidamente no âmbito do Contrato de Financiamento - pelo que esse direito tem de ser exercido relativamente à totalidade do pagamento indevido. (26) Aliás, e conforme resulta da matéria provada em 27 e 28 da douta Sentença, o próprio Recorrido confessou ter realizado um estorno de juros indevidamente cobrados no âmbito do contrato de financiamento antes da medida de resolução do BES, donde se conclui pela existência de uma obrigação de restituição de montantes cobrados em excesso à Recorrente antes de 03 de agosto de 2014. (27) Assim, tivesse o Tribunal a quo feito uma correta interpretação e aplicação da lei e dos factos, não deixaria de decidir pela legitimidade substantiva do Recorrido, condenando-o a restituir à Recorrente todas as quantias pagas por imposição contratual baseada em tal cláusula contratual geral [que declara excluída do contrato, por nula] e bem assim os juros que sobre tais quantias se venceram e vencerem, referentes a todos os períodos a cuja restituição decidiu que a Recorrente tem direito, e não apenas quanto ao período compreendido entre 3 de Agosto de 2014 a 29 de Janeiro de 2016. (28) A Recorrente difere do STJ quando este refere que “(…) Ora, a invocada responsabilidade (…), pelo menos, era contingente, uma vez que não se encontrava reconhecida, pelo que, tal responsabilidade encontrava-se abrangida pela referida cláusula genérica de exclusão de transferência de responsabilidades para o Novo Banco, encarada esta na sua literalidade, além de se encontrar prevista nas subalíneas específicas exemplificativas (iii) e (v) (…)” atribuindo caráter contingente à reclamação dos montantes pagos indevidamente pela recorrente ao abrigo da Cláusula 9.ª. (29) Isto porquanto resulta provado (factos 27 e 28 da matéria de facto provada) ter o Recorrido realizado um estorno de juros com o intuito de regularizar a situação de cobrança excessiva de montantes a título de juros do empréstimo, reportada a um período anterior à medida de resolução do BES, reconhecendo por isso a existência da pretensão da Recorrente à devolução dos montantes que lhe estavam a ser cobrados abusivamente pelo BES a título de juros contratuais. (30) Manifestamente, perante (i) as comunicações trocadas entre a Recorrente e o BES e a Recorrente e o Recorrido e (ii) o pagamento, pelo Recorrido, de passivos do BES pré-resolução no âmbito do contrato de financiamento, não pode qualificar-se o passivo em causa como incerto, meramente possível ou duvidoso – contingente – ou considerá-lo desconhecido à data da resolução do BES. Por outro lado, (31) Resulta dos pontos 11, 12 e 16 da Deliberação do BdP de 3 de agosto de 2014 que a criação do NOVO BANCO teve em vista a sucessão deste nos direitos e obrigações de que o BES detinha na sua esfera jurídica. (32) Resulta, ainda, que o objetivo das Deliberações do BdP foi o de proteger os depositantes e demais clientes do BES da exposição ao universo GES e às condutas ilícitas dos acionistas, obrigacionistas e administradores do BES e das empresas do GES. (33) O dever de proteger os depositantes no âmbito das medidas de resolução de instituições financeiras encontra-se previsto no artigo 145.º-C do RGICSF e no artigo 31.º, n.º 2, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho. (34) Portanto, o direito de crédito da Recorrente reconhecido na Sentença nasce de uma situação jurídica duradoura que integra um conjunto de direitos e deveres de ambos os contraentes e que não terminou com a resolução bancária do BES nem começou com a sucessão do Recorrido na posição jurídica do NOVO BANCO. (35) Da Deliberação do BdP não resulta que todos os passivos do BES tenham sido excluídos da transferência para o NOVO BANCO, nem o sistema jurídico permite tal entendimento, ao estabelecer limites às medidas de resolução de instituições bancárias, que têm como teleologia a proteção da confiança dos depositantes, a solidez financeira e a estabilidade do sistema financeiro. (36) Na seleção de ativos e passivos a transferir para o banco de transição, o BdP não pode olhar só aos interesses públicos da estabilidade do sistema financeiro ou da salvaguarda do erário público, devendo ainda ter em consideração as situações privadas concretas. (37) É aplicável o artigo 145.º-O, n.º 6, do RGICSF, nos termos do qual a medida de resolução não deve prejudicar a cessão integral das posições contratuais da instituição de crédito objeto de resolução. (38) O direito de crédito invocado pela Recorrente não tem qualquer ligação ao GES ou aos comportamentos ilícitos e danosos dos funcionários do BES ou dos acionistas, administradores e gestores do BES ou do GES que conduziram o BES a uma situação de insolvência e motivaram a resolução bancária tal como esta foi constituída. (39) Não se poderá opor à presente ação o argumento de que o BdP excluiu o crédito exigido pela Recorrente com base na necessidade de garantir a eficácia da medida de resolução aplicada ao BES, uma vez que se trata de montantes entregues em excesso cuja prestação ao BES não foi contratualizada. (40) O direito de crédito da Recorrente não resulta de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais (sublinhado nosso), nem em momento algum a Recorrente as alegou ou deduziu factos que as sustentassem. (41) O direito da Recorrente à restituição das quantias indevidamente pagas a título de juros remuneratórios ou spread, no âmbito do contrato de financiamento inicialmente celebrado com o BES, não é, do ponto de vista do mutuante e para efeito das Deliberações do BdP de 03 de agosto de 2014 e de 29 de dezembro de 2014, um passivo contingente, desconhecido, resultante de fraude ou de violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais. (42) E por isso, não se encontra abrangido pelas exclusões previstas nos pontos A), B) ou C) das referidas Deliberações, tendo transitado da esfera jurídica do BES para a esfera jurídica do Recorrido, como parte integrante e incindível da posição jurídica de mutuante em que o Recorrido sucedeu ao BES. (43) Como já se viu, que o crédito que resulta para a Recorrente da declaração de nulidade da Cláusula 9.ª do contrato de financiamento inicialmente celebrado com o BES, coloca Recorrente em análoga, mutatis mutandis, à posição de um depositário no BES, já que tal como ele, a colocou numa posição de titular de um crédito sobre o banco. (44) Deste modo, o Recorrido tem de assumir a posição jurídica do BES por inteiro, com todos os seus direitos e obrigações, inclusivamente, a obrigação de restituição dos montantes indevidamente cobrados à Autora Recorrente no âmbito do contrato de financiamento. (45) E assumiu a posição jurídica do BES enquanto credor do capital e dos juros devidos ao abrigo do Contrato de Financiamento, o que significa que a Recorrente continuou adstrita à necessidade de efetuar a prestação; de igual modo, o Recorrido tem de assumir a obrigação de restituição dos montantes indevidamente cobrados à Recorrente no âmbito do contrato de financiamento resultante da Sentença. (46) A relação jurídica quando transmitida transfere-se na sua totalidade, ou seja, como uma unidade que transporta um conjunto de direitos e obrigações, e o direito de crédito de que a Recorrente se arroga decorre de uma situação jurídica duradoura que integra um conjunto de direitos e deveres de ambos os contraentes e que não terminou com a resolução bancária do BES nem começou com a sucessão do Recorrido na posição jurídica do BES, pelo que, em termos materiais, existe indiferenciação prática entre o BES e o Recorrido, que tem legitimidade substantiva para a presente ação. NESTES TERMOS, O presente recurso deverá ser julgado procedente e a Sentença recorrida ser revogada - na parte que absolve parcialmente o Recorrido - e substituída por outra que o condene - também - ao pagamento da restituição das quantias pagas por imposição contratual baseada na clausula agora declarada nula pelo Tribunal a quo, referentes aos períodos que vigoraram de 31 de julho de 2008 a 30 de janeiro de 2009; de 31 de janeiro de 2009 a 30 de julho de 2009; de 31 de janeiro de 2011 a 30 de julho de 2011; de 30 de janeiro de 2013 a 29 de julho de 2014 e bem assim os juros que sobre tais quantias se venceram e vencerem, seguindo-se os ulteriores termos legais, só assim se fazendo a costumada justiça!” * O Réu apresentou contra-alegações. * Em 28.11.2023 foi proferido o seguinte despacho: “I - Da rectificação do dispositivo e das nulidades invocadas pela Recorrente: Veio a Recorrente requerer a rectificação do dispositivo, porquanto deverá constar do mesmo os juros que se venceram e vencerem sobre as quantias a cuja restituição o Tribunal condenou o Recorrido. Ora, salvo o devido respeito e melhor entendimento, consta da sentença que “No entanto, não restam dúvidas que da matéria de facto provada não resulta os valores efectivamente pagos nesses períodos pela Autora ao abrigo do contrato de financiamento e os valores que deveriam, ter sido pagos com base nos spread acima mencionados. Deste modo, os valores a restituir à Autora deverão ser liquidados em posterior incidente.”. Deste modo, o Tribunal entende que não existe nenhum erro a ser corrigido. Para além do alegado erro, veio a Recorrente arguir as nulidades da sentença por a mesma não especificar os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão e por os fundamentos estarem em oposição com a decisão. Cumpre apreciar, nos termos do artigo 641.º, n.º 1 do Código de Processo Civil. Nos termos do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, na sua alínea b), é nula a sentença quando “Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.”. Ora, como refere FERNANDO AMÂNCIO FERREIRA (in MANUAL DOS RECURSO EM PROCESSO CIVIL, página 48), a falta de motivação susceptível de integrar a nulidade de sentença é apenas a que se reporta à falta absoluta de fundamentos quer estes respeitem aos factos quer ao direito. A motivação incompleta, deficiente ou errada não produz nulidade, afectando somente o valor doutrinal da sentença e sujeitando-a consequentemente ao risco de ser revogada ou alterada quando apreciada em recurso. Dito isto, e salvo melhor opinião, é do entendimento do Tribunal que a sentença sob apreço não padece do vício invocado, porquanto a sentença está fundamentada de facto e de direito. Também é sancionada com a nulidade a sentença quando “Os fundamentos estejam em oposição com a decisão”, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil. Neste item, a lei refere-se à contradição real entre os fundamentos e a decisão: a construção da sentença é viciosa, uma vez que os fundamentos referidos pelo juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente. No entanto, salvo o devido respeito, e no seguimento do explanado na sentença, em primeiro lugar foi analisado a exclusão da cláusula para posteriormente o Tribunal ter decidido que o NOVO BANCO apenas poderia ser obrigado a restituir valores por si recebidos após 3 de Agosto de 2014. Pelo exposto, tendo em conta as normas citadas e pelas razões expostas, improcede a arguição das nulidades da sentença invocada pela Recorrente, mantendo-se a mesma nos seus precisos termos. Notifique. (…).” * O recurso foi corretamente admitido. * Foram os autos remetidos a este Tribunal e colhidos os vistos legais. * II. Questões a Decidir: Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do Recorrente – art.ºs 635º, n.º 4 e 639º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante apenas CPC) –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal são as seguintes: - Das nulidades da sentença; - Do erro de julgamento; - Da retificação do dispositivo da sentença. * III. Fundamentação de Facto: Na sentença recorrida foram considerados como provados os seguintes factos: “1. No dia 30 de Janeiro de 2008, foi celebrado entre a Autora, o BANCO ESPÍRITO SANTO, S.A. (BES), LS (…) e MR (…), os últimos na qualidade de prestadores de garantia de aval, o contrato de financiamento n.º (…), nos seguintes termos: “Entre o BES e V (…), LDA., (…), adiante designado (s) por Cliente, e O Cliente também designado por Prestador da Garantia da Hipoteca LS (…) e MR (…), (…), adiante designados por Prestador (es) de Garantia do Aval, É celebrado o presente contrato de financiamento (o «Contrato»), que se rege pelas seguintes condições particulares e gerais: Condições particulares 1. Crédito: Montante Máximo Global de 1.350.000,00 EUR (…). 2. Finalidade: Apoio ao investimento. 3. Data Efectiva: A data efectiva corresponde à data da celebração da escritura pública de constituição de hipoteca. 4. Prazo: 180 meses. 5. Disponibilização: Imediata. 6. Conta D/O: (…). 7. Carência Carência de Capital no prazo de 24 meses. 8. Utilização Regime de utilização: Utilização única. - Reutilização: Crédito não reutilizável. - Multiusos: Não - Multidivisas: Não 9. Juros Taxa de Juro: correspondente à Média Mensal (MM) EURIBOR 6 meses acrescida de 2,0 ponto (s) percentual (ais). Fixação da Taxa de Juro: A taxa de juro é fixada no primeiro dia de cada período de 6 meses. Taxa anual efectiva (TAE: Decreto-Lei 220/94, de 23 de Agosto): 6,9357%. Pagamento de juros: 6 meses. 10. Reembolso Reembolso do Crédito: O montante do saldo em dívida será reembolsado ao BES pelo Cliente de acordo com o seguinte plano: - 26 amortizações semestrais, iguais e sucessivas, variando a percentagem, de amortização de capital, em função da incidência dos juros, de acordo com o disposto na Cláusula com epígrafe “Juros” do presente contrato, perfazendo uma prestação constante de capital e juros. Plano com início 30 meses após a data efectiva prevista no presente contrato. Reembolso antecipado: O Cliente pode antecipar o reembolso do saldo em dívida, parcial ou totalmente, mediante pré-aviso de 15 dias, sem qualquer penalização. 11. Comissões: - Comissão de Montagem de 0,125% 12. Comunicações: (…) 13. Garantias de Crédito: - Livrança subscrita pelo Cliente e avalizada; - Hipoteca do Prédio Rústico descrito na Conservatória do Registo Predial de (…) sob o n.º (…), ainda não inscrito a favor do Cliente e/ou Garantia e inscrito na Matriz Predial Rústica sob o Art.º (…) da freguesia de (…), concelho de (…);”. 2. Na mesma data, as partes subscreveram o documento denominado “CONTRATO DE CRÉDITO - CONDIÇÕES GERAIS”, que se encontra junto aos autos a fls. 115 vs. a 116 vs., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido e no qual se destaca, nomeadamente: “9. Juros §1. O montante de capital creditado na Conta D/O vence juros dia a dia. §2. Salvo se diferentemente for disposto nas condições particulares, os juros são pagos postecipadamente no final dos períodos indicados nas condições particulares, contando-se o primeiro período a partir da data da primeira Utilização do Crédito. §3. O Cliente assume integralmente o pagamento dos juros, ainda que existam entidades encarregues de procederem ao pagamento de parte ou da totalidade dos mesmos, e não o façam pontualmente, como por exemplo nos casos de bonificação ou comparticipação. §4. As taxas de juro dos financiamentos de prazo igual ou inferior a um ano podem ser alteradas, mediante comunicação do seu novo valor ao Cliente, com uma antecedência de pelo menos 15 (quinze) Dias Úteis, como condição para a renovação do financiamento. §5. As taxas de juro dos financiamentos de prazo superior a um ano podem ser alteradas, desde que a comunicação do seu novo valor seja comunicada com uma antecedência de pelo menos 15 (quinze) Dias Úteis em relação ao período em causa, podendo o Cliente efectuar o reembolso antecipado do crédito, sem qualquer penalização, no prazo de 30 dias sobre a data em que lhe for comunicada a alteração. §6. Nos financiamentos com indexante, a sua variação não justifica qualquer incumprimento e não confere a qualquer das partes o direito de alterar ou resolver o Contrato. §7. No caso de alterações supervenientes do mercado o justificarem, o BES poderá modificar a taxa de juro ou outros encargos, assistindo ao Cliente o direito a resolver o Contrato no prazo de trinta dias sobre a data em que lhe for comunicada a alteração. §8. Para os efeitos do Contrato, consideram-se alterações supervenientes quando: a) Não seja viável determinar a taxa de juro aplicável ou a taxa alternativa para qualquer período de contagem. b) O custo de obtenção de fundos no mercado para o BES se torne superior à taxa de juro aplicável.”. 3. O crédito destinou-se à compra do prédio rústico denominado Herdade (…) sito na freguesia e concelho de (…), descrito na Conservatória de Registo Predial de (…) sob o número (…) da referida freguesia e inscrito na matriz predial rústica da referida freguesia sob o artigo (…). 4. A escritura de compra e venda da Herdade (…) foi celebrada no mesmo dia em que foi celebrado o Contrato de Financiamento n.º (…). 5. O BES alterou o spread para 2,25% que vigorou de 31 de Julho de 2008 a 30 de Janeiro de 2009. 6. No início de 2009, em data não concretamente apurada, o BES remeteu carta à Autora, com o seguinte teor: “Assunto: Alteração de condições de Financiamento Contrato de Abertura de Crédito n.º (…) Exmos. Senhores, Como é do conhecimento geral, os mercados financeiros têm sido atingidos, desde Agosto de 2007, por uma crise de enormes repercussões com origem nos Estados Unidos, a qual rapidamente se alastrou a toda a economia mundial. A partir de meados de Setembro de 2008, com a falência do banco de investimento Lehman Brothers, esta crise acentuou-se de forma substancial. As principais consequências deste cenário tão adverso são: - um enorme agravamento do custo de obtenção de fundos, destinados à concessão de crédito por parte das entidades bancárias a nível mundial, reflectindo um forte aumento dos prémios de risco e de liquidez exigidos pelos investidores; - uma redução muito significativa da liquidez disponível, deixando os Bancos nacionais e internacionais com acesso muito limitado aos seus habituais instrumentos de financiamento (por exemplo as securitizações, empréstimos obrigacionistas, obrigações hipotecárias, …). Os próprios mercados interbancários deixaram de funcionar com normalidade. A recente possibilidade dos bancos (nacionais e internacionais) poderem efectuar emissões obrigacionistas com o aval dos respectivos Estados, veio confirmar o elevado custo de obtenção de fundos, pois os bancos, para além do pagamento do spread dessas emissões, pagam ainda ao Estado o custo das garantias concedidas pelo mesmo. Face a este contexto, torna-se necessário proceder ao ajustamento das condições aplicadas ao financiamento em referência. Assim, informamos que, a partir do próximo período de contagem de juros, o spread aplicável passará a ser de 3.5%, mantendo-se inalteradas as restantes condições contratuais. Mais informamos que, de acordo com a lei, V. Exas. dispõem do prazo de 30 (trinta) dias para, querendo, resolver o supra referido contrato com fundamento na presente alteração. Certos da Vossa compreensão para o carácter excepcional deste ajustamento, continuamos, como sempre, completamente disponíveis para a prestação de esclarecimentos complementares que V. Exas. julguem necessárias e subscrevemo-nos com a maior consideração e estima.”. 7. No início de 2009, em data não concretamente apurada, o BES remeteu carta à Autora, com o seguinte teor: “Assunto: Alteração de condições de Financiamento Contrato de Abertura de Crédito n.º (…) Exmos. Senhores, Como é do conhecimento geral, os mercados financeiros têm sido atingidos, desde Agosto de 2007, por uma crise de enormes repercussões com origem nos Estados Unidos, a qual rapidamente se alastrou a toda a economia mundial. A partir de meados de Setembro de 2008, com a falência do banco de investimento Lehman Brothers, esta crise acentuou-se de forma substancial. As principais consequências deste cenário tão adverso são: - um enorme agravamento do custo de obtenção de fundos, destinados à concessão de crédito por parte das entidades bancárias a nível mundial, reflectindo um forte aumento dos prémios de risco e de liquidez exigidos pelos investidores; - uma redução muito significativa da liquidez disponível, deixando os Bancos nacionais e internacionais com acesso muito limitado aos seus habituais instrumentos de financiamento (por exemplo as securitizações, empréstimos obrigacionistas, obrigações hipotecárias, …). Os próprios mercados interbancários deixaram de funcionar com normalidade. A recente possibilidade dos bancos (nacionais e internacionais) poderem efectuar emissões obrigacionistas com o aval dos respectivos Estados, veio confirmar o elevado custo de obtenção de fundos, pois os bancos, para além do pagamento do spread dessas emissões, pagam ainda ao Estado o custo das garantias concedidas pelo mesmo. Face a este contexto, torna-se necessário proceder ao ajustamento das condições aplicadas ao financiamento em referência. Assim, informamos que, a partir do próximo período de contagem de juros, o spread aplicável passará a ser de 3.5%, mantendo-se inalteradas as restantes condições contratuais. Mais informamos que, de acordo com a lei, V. Exas. dispõem do prazo de 30 (trinta) dias para, querendo, resolver o supra referido contrato com fundamento na presente alteração. Certos da Vossa compreensão para o carácter excepcional deste ajustamento, continuamos, como sempre, completamente disponíveis para a prestação de esclarecimentos complementares que V. Exas. julguem necessárias e subscrevemo-nos com a maior consideração e estima.”. 8. No período de 31 de Janeiro de 2009 a 30 de Julho de 2009, o BES aplicou o spread de 3,25%. 9. A Autora remeteu carta ao BES, datada de 5 de Fevereiro de 2009, com o seguinte teor: “(…) Relativamente ao contrato de empréstimo hipotecário número (…) de 30 de Janeiro de 2008 e do contrato de empréstimo pessoal que temos elaborado com o Banco Espírito Santo SA, (…), vimos manifestar, perante a informação fornecida pelos vossos colaboradores, que nos opomos determinantemente à aplicação de determinadas formas de cálculo dos juros que pretendem aplicar e que não cumprem as condições estabelecidas por V. Exas. na concessão e outorgamento do referido contrato de empréstimo hipotecário, firmado em escritura pública (…), e do contrato de financiamento número (…). Nós não podemos aceitar que V. Exas. violem as condições acordadas e que apliquem novos juros, sem que exista uma justificação dos factos que possam determinar a Vossa vontade de acordar algo diferente do inicialmente acordado, tanto para o contrato de hipoteca como para o contrato de financiamento, os juros devem ser os correspondentes aos da média mensal da taxa Euribor a seis meses incrementada em dois pontos percentuais, não podendo unilateralmente aplicar-se uma mudança no cálculo dos juros dos dois empréstimos. Apesar do facto do Banco Espírito Santo, SA, ter estudado, analisado e aprovado apenas há um ano a operação financeira instrumentada nos citados a contratos hipotecário e de financiamento, cujos termos foram redigidos por V. Exas. e têm agora a intenção de substituir, os termos e as condições de ambos os contratos incorrendo assim numa clara violação dos mesmos, implicando por consequência gravíssimos e sérios danos à sociedade. É que factos como os acima descritos podem causar sérios danos e de impossível reparação, pelo que a fim de os evitarmos, exigimos que se abstenham de realizar operações nas nossas contas, que representam a aplicação de juros diferentes do contratado sem o nosso conhecimento prévio e aceitação expressa, limitando-se V. Exas. a aplicar o cálculo dos juros acordados, ou seja, a média mensal da Euribor seis meses acrescida de dois pontos percentuais.”. 10. O BES remeteu carta à Autora, datada de 8 de Maio de 2009, com o seguinte teor: “Contrato n.º (…) (..) Temos presente comunicação de V. Exas., relativa ao assunto em epígrafe, a qual foi objecto da nossa melhor atenção, cumprindo-nos solicitar que nos relevem a morosidade verificada na nossa resposta. Após análise, esclarecemos que nas condições gerais do contrato celebrado entre V. Exas. e o Banco Espírito Santo, encontra-se prevista, na cláusula 9, ponto 7, onde se refere que “no caso de alterações supervenientes de mercado o justificarem, o BES poderá modificar a taxa de juro ou outros encargos, assistindo ao Cliente o direito de resolver o presente contrato”. Importa ainda referir que as alterações apesar de suportadas contratualmente, forma alvo de reunião com V. Exas. e consequente esclarecimento sobre os motivos que estiveram na origem das alterações reclamadas. (…).”. 11. A Autora remeteu carta ao BES, datada de 18 de Junho de 2009, com o seguinte teor: “Após termos recebido de V. Exas. documentação onde solicitavam à V (…), LDA, a aceitação e assinatura dos mesmos, somos a informar que não os aceitamos porque pressupõem alterações às condições vigentes no contrato de empréstimo hipotecário número (…) (financiamento n.º (…)) e no contrato de empréstimo (…), ambos celebrados com o Banco Espírito santo, SA a 30 de Janeiro de 2008. Os documentos referidos pressupõem uma alteração das condições básicas, que nos conduziram à assinatura do financiamento ao BES e concedido à V (…), LDA. Já comunicamos, mediante carta registada com data de 5 de Fevereiro, que a V (…), LDA rejeita, de forma expressa, a aplicação de cálculo de juros diferente da contratada, isto é, a média mensal da taxa Euribor a seis meses, incrementado em dois pontos percentuais, cuja aplicação e cálculo temos vindo a reclamar ao BES. Da mesma forma a V (…), LDA rejeita expressamente, e não aceita, qualquer outra modificação das condições particulares do financiamento que mantém com o BES em virtude de ambos os contratos. A V (…), LDA tem cumprido com todas as obrigações contratadas com o BES, assim como tem efectuado o pagamento de todos os juros que o BES tem vindo a aplicar sobre os referidos contratos de empréstimo, apesar de não aceitar a forma de cálculo que o BES tem aplicado. As alterações que o BES pretende introduzir nos contratos de financiamento, podem originar graves prejuízos à V (…), LDA. Desta forma a V(…), LDA, comunica que continuará, com carácter preventivo, a efectuar os pagamentos dos juros que o BES aplique, sem que isso pressuponha a aceitação tácita da modificação por Vós pretendida, pelo que informamos que a V(…), LDA se reserva o direito de exercer as acções que julgue necessárias em defesa dos próprios interesses.”. 12. A Autora elaborou e assinou uma carta que foi recebida pelo BES no dia 4 de Setembro de 2009, com o seguinte teor: “(…) 2.- V (…), LDA e seus avalistas, assinam o presente documento de “alteração de financiamento nº (…)” unicamente como comprovativo de o terem recebido e de terem tomado conhecimento do mesmo. A V (…), Lda e seus avalistas não pressupõem, neste documento, a sua aprovação já que não aceitam, e expressamente rejeitam, as alterações que contem relativamente ao contrato inicial de 30 de Janeiro de 2008, sendo que este documento pretende a alteração das condições inicias do empréstimo são as únicas que devem reger as partes. A assinatura deste documento também não pressupõe a novação do contrato de empréstimo de 30 de Janeiro de 2008, cujos termos e condições devem prevalecer em todo o caso, pois mantém[1]se vigente e aplicável entre as partes.”. 13. A Autora remeteu email ao BES a 22 de Outubro de 2009 no qual consta: “serve o presente para comunicar que estou disposto a deixar todas as minhas reivindicações "se em 30 de julho de 2009 colocarem o spread que assino no contrato (dos 2%)”. 14. No dia 15 de Novembro de 2009 foi assinado pela Autora um documento denominado “Alteração ao contrato de financiamento n.º (…)”, com a data de 30 de Julho de 2009, com o seguinte teor: “Entre BANCO ESPÍRITO SANTO, S.A. (…) e V (…), LDA., (…), adiante designado (s) por Cliente, e O Cliente também designado por Prestador da Garantia da Hipoteca LS (…) e MR (…), (…), adiante designados por Prestador (es) de Garantia do Aval, É celebrada a presente Alteração ao contrato de financiamento acima identificado, nos termos seguintes: 1. Alteração ao contrato São alteradas as seguintes condições particulares de financiamento, mantendo-se as restantes condições particulares e gerais em vigor. Condições particulares alteradas 9. Juros Taxa de Juro: correspondente à Média Mensal (MM) EURIBOR 6 meses, arredondada à milésima, acrescida de um spread de 2 ponto(s) percentual (ais). Fixação da Taxa de Juro: A taxa de juro é fixada no primeiro dia de cada período de 6 meses. Taxa anual efectiva (TAE: Decreto-Lei 220/94, de 23 de Agosto): 3,0800%. Pagamento de juros: 6 meses. 2. Comissões - Na sequência da presente alteração é devida uma comissão de EUR 3,00 que o BES fica autorizado a debitar na Conta D/O do Cliente. 3. Produção de efeitos A presente alteração ao contrato produzirá os seus efeitos a partir da data da sua assinatura pelas partes. (…)”. 15. O BES remeteu carta datada de 3 de Dezembro de 2009 à Autora, com o seguinte teor: “Crédito/ Financiamentos (…) Temos presente comunicação por V. Exas., relativa ao assunto em epígrafe, a qual foi objecto da nossa melhor atenção, solicitando desde já que nos seja relevada a morosidade verificada na nossa resposta. A contribuição dos nossos Clientes é de extrema importância na detecção de situações que, pelo seu carácter de insatisfação, nos orientam na tomada de medidas internas entendidas por adequadas, no sentido de corresponder às vossas legítimas expectativas, motivo pelo qual o assunto apresentado, foi reportado ao Departamento competente. Mais informamos que, tomámos conhecimento que a mesma foi objecto de esclarecimento por parte do Centro de Empresas do Alentejo, através de reuniões havidas com V. Exas., onde foram acordadas novas condições a aplicar ao Contrato de Crédito/ Financiamento, encontrando-se em vigor o spread de 2%, retroagido ao dia 31-07-2009. (…).”. 16. Em 31 de Janeiro de 2011, o BES comunica nova alteração do spread para 3%, a qual vigorou até 29 de Julho de 2011. 17. Foi reposto mais tarde o spread nos 2% para vigorar de 30 de Julho de 2011 a 29 de Julho de 2012. 18. Em 3 de Maio de 2011, Autora e BES subscreveram o documento denominado “Alteração ao contrato de financiamento n.º (…)”, com o seguinte teor: “Entre o BES e V (…), LDA., (…), adiante designado (s) por Cliente, e o cliente também designado por Prestador da Garantia da Hipoteca LS (…), (…), adiante designado(s) por Prestador(s) de Garantia do Aval, MR (…), (…), adiante designado(s) por Prestador(s) de Garantia do Aval, É celebrada a presente alteração ao contrato de financiamento acima identificado, nos termos indicados: 1. Alteração ao contrato São alteradas as condições particulares do contrato de financiamento, mantendo-se as restantes condições particulares e gerais em vigor: Condições particulares alteradas 8. Juros 8.1. Taxa de Juro: Correspondente à Média Mensal (MM) EURIBOR 6 Mês(es), arredondada à milésima, acrescida de um spread de 3.00000 ponto(s) percentual (ais). 8.2. Fixação da Taxa de Juro: A taxa de juro é fixada no primeiro dia de cada período de 6 Mes(es). 8.3. Taxa anual efectiva (TAE: Decreto-Lei 220/94, de 23 de Agosto): 4.67500%. 8.4. Pagamento de Juros: Semestral. 2. Comissões (…). 3. Produção de Efeitos A presente alteração ao contrato produzirá os seus efeitos a partir do dia 30/07/2012 e após a sua assinatura pelas partes. (…)”. 19. Em 30 de Janeiro de 2013 é comunicado pelo BES a alteração do spread para 4,5%. 20. A Autora enviou email ao Réu a 23 de Julho de 2013, com o seguinte teor: “Ainda estou esperando notícias sobre os tópicos discutidos. O dia 30 de Julho está a aproximar-se e o vencimento do contrato a longo prazo e não falamos nada.”. 21. A 29 de Julho de 2013, foi enviado um email pelo BES à Autora comunicando que: “Quanto ao contrato de longo prazo e de acordo com o vosso correio o banco propôs uma mudança do spread para 3%, a partir de 30.07.2013, porém em outubro/2012 aumentamos a grande maioria dos contratos a longo prazo incluindo o contrato a longo prazo da V(…) e a proposta era modificar o spread de 3% para 4,5%. No entanto, foi possível aprovar a redução do spread de 4,5% para 4%.”. 22. A Autora remeteu email ao BES a 29 de Janeiro de 2014, com o seguinte teor: “Continuo sem ter conhecimento de quanto é o spread que irão cobrar tanto no L/P e no C/P. Já, de uma maneira unilateral e sem falar comigo, em pagamentos anteriores dos contratos L/P e C/P, me cobraram o que queriam. Há dinheiro na conta, no momento, não sei se será suficiente para atender às L/P e C/P, mas como você não me diz o spread, não consigo calcular a quantia exata de dinheiro ... Espero que depois se não houver o suficiente, não haja juros ou recargas”. 23. A Autora remeteu email ao BES a 19 de Fevereiro de 2014 com o seguinte teor: “Como tu bem dizias ontem, consome-me ver a quantidade de dinheiro que me foi retirada, as alterações dos spreads de forma unilateral por parte do banco, mais a quantidade de dinheiro importante que supõe a cobertura dos tipos, e por esse motivo peço-lhe para lutar por 3,5”. 24. A 20 de Março de 2014, a Autora volta a enviar um email para o BES no qual expõe que: “Mais uma vez, lhe envio este escrito para mostrar minha insatisfação com a maneira unilateral em que sobem os spreads sem contar ou chegar a qualquer tipo de acordo comigo. Já são múltiplas as ocasiões em que discutimos sobre esta questão, nunca alcançando um acordo ou uma explicação do motivo pelo qual sobem a taxa de spread, violando o contrato que assinamos em 2008 (…) Lembramos que, atualmente, nas últimas parcelas, foi mantido um spread de 4,5”. 25. O BES remeteu carta datada de 28 de Julho de 2014 à Autora, com o seguinte teor: “Assunto: Modificação da Taxa de Juro Contrato de Financiamento n.º (…) (…) Na sequência das conversas havidas, temos o prazer de informar V. Exas. que procederá este Banco à alteração das actuais condições aplicáveis ao contrato cima melhor identificado a partir de 30/07/2014, passando o spread aplicável a ser de 3,75000%. Mantém-se em vigor as demais condições contratuais anteriormente estabelecidas. (…)”. 26. O spread de 3,75% vigorou de 30 de Julho de 2014 até 29 de Janeiro de 2016. 27. O Réu NOVO BANCO, S.A. remeteu email datado de 22 de Agosto de 2014 à Autora, com o seguinte teor: “(…) No passado dia 23/07/2014 foi aprovado redução de spread com data retroactiva. Desta forma vimos por este meio solicitar vossa autorização para estorno de juros e respectivo imposto de selo com data-valor de 30/07/2014. (…)”. 28. O Réu efectuou um estorno a favor da Autora, no dia 27 de Agosto de 2014, no montante de € 12.433,27. 29. Em 1 de Junho de 2016, Autora e Réu subscreveram o documento denominado “Alteração ao contrato de financiamento n.º (…)”, com o seguinte teor: “Entre o Banco e V (…), LDA., (…), adiante designado(s) por Cliente, o cliente também designado por Prestador da Garantia da Hipoteca MR (…), (…), adiante designado(s) por Prestador(s) de Garantia do Aval LS (…), (…), adiante designado(s) por Prestador(s) de Garantia do Aval, Considerando que: a) O Banco Espírito Santo S.A. concedeu ao Cliente um financiamento em 30/01/2008, pelo valor inicial de 1.350.000,00 EUROS; b) Por deliberação do Conselho de Administração do Banco de Portugal (…) foi constituído o NOVO BANCO, S.A., (…), para o qual foram transferidos determinados activos e passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco Espírito Santo, S.A. identificados na referida deliberação incluindo o presente financiamento; É celebrada a presente alteração ao contrato de financiamento acima identificado, nos termos indicados: 1. Alteração ao contrato São alteradas as condições particulares do contrato de financiamento, mantendo-se as restantes condições particulares e gerais em vigor: Condições particulares alteradas 9.1. Taxa de Juro: Correspondente à EURIBOR a 12 Mês(es), arredondada à milésima, acrescida de um spread de 3,00000 ponto(s) percentual(ais). (…) 3. Produção de Efeitos A presente alteração ao contrato produzirá os seus efeitos a partir do dia 01-06-2016. (…)”. 30. Na mesma data, as partes subscreveram o documento denominado “CONTRATO DE CRÉDITO - CONDIÇÕES GERAIS”, do qual consta, nomeadamente: “9. Juros (…) §7. O Banco poderá modificar a taxa de juro ou outros encargos, incluindo comissões, em caso de alterações supervenientes de mercado ou quando exista razão atendível para o efeito. §8. Para os efeitos do presente contrato, consideram-se nomeadamente as seguintes situações: a) A modificação de regras legais ou regulamentares em vigor à data da celebração do contrato que imponham o agravamento dos valores das provisões para riscos de crédito, das reservas de caixa, dos rácios de solvabilidade ou, em geral, qualquer encarecimento do crédito; b) A impossibilidade de determinação da taxa de juro aplicável ou da taxa alternativa para qualquer período de contagem de juros, por extinção da taxa aplicável ou o do indexante que lhe serve de base; b) O agravamento do custo de fundos para o Banco face àquele que vigorava na data de celebração do contrato, desde que tal agravamento seja relevante e determinado por razões externas ou fora da esfera de influência do Banco, o qual deverá ser objetivamente justificado.”. 31. Em 30 de Julho de 2017, Autora e Réu subscreveram o documento denominado “Alteração ao contrato de financiamento n.º (…)”, com o seguinte teor: “Entre o Banco e V (…), LDA., (…), adiante designado(s) por Cliente, o cliente também designado por Prestador da Garantia da Hipoteca MR (…), (…), adiante designado(s) por Prestador(s) de Garantia do Aval LS (…), (…), adiante designado(s) por Prestador(s) de Garantia do Aval, É celebrada a presente alteração ao contrato de financiamento acima identificado, nos termos indicados: 1. Alteração ao contrato São alteradas as condições particulares do contrato de financiamento, mantendo-se as restantes condições particulares e gerais em vigor: Condições particulares alteradas 9.1. Taxa de Juro: Nominal fixa de 3,02%. 9.2. Fixação da taxa de Juro: Não aplicável. 14. Outras Estipulações: - Derrogação de cláusulas das Condições Gerais (…) 3. Produção de Efeitos A presente alteração ao contrato produzirá os seus efeitos a partir do dia 30-07-2017. (…)”. 32. Na mesma data, as partes subscreveram o documento denominado “CONTRATO DE CRÉDITO - CONDIÇÕES GERAIS”, do qual consta, nomeadamente: “9. Juros (…) §7. O Banco poderá modificar a taxa de juro ou outros encargos, incluindo comissões, em caso de alterações supervenientes de mercado ou quando exista razão atendível para o efeito. §8. Para os efeitos do presente contrato, consideram-se nomeadamente as seguintes situações: a) A modificação de regras legais ou regulamentares em vigor à data da celebração do contrato que imponham o agravamento dos valores das provisões para riscos de crédito, das reservas de caixa, dos rácios de solvabilidade ou, em geral, qualquer encarecimento do crédito; b) A impossibilidade de determinação da taxa de juro aplicável ou da taxa alternativa para qualquer período de contagem de juros, por extinção da taxa aplicável ou o do indexante que lhe serve de base; b) O agravamento do custo de fundos para o Banco face àquele que vigorava na data de celebração do contrato, desde que tal agravamento seja relevante e determinado por razões externas ou fora da esfera de influência do Banco, o qual deverá ser objetivamente justificado.”. 33. O Réu remeteu carta datada de 27 de Dezembro de 2018 à Autora, com o seguinte teor: “Assunto: Modificação da Taxa de Juro Contrato de Financiamento n.º (…) (…) Na sequência das conversas havidas, temos o prazer de informar V. Exas. que procederá este Banco à alteração das actuais condições aplicáveis ao contrato acima melhor identificado a partir de 30-01-2019, passando a taxa nominal fixa aplicável a ser de 2,250%. Mantém-se em vigor as demais condições contratuais anteriormente estabelecidas. (…)”. 34. Em 18 de Março de 2008, foram celebrados, entre o BES e a Autora, dois contratos de swap para cobertura de riscos inerentes à alteração da taxa de juro com as referências (…) e (…), nos quais a Autora foi compradora e o Réu vendedor. 35. Os contratos de swap vigoraram de 30 de Julho de 2008 a 30 de Julho de 2012. 36. O contrato de swap com a referência (…) previa que, caso a Euribor 6 meses se fixasse abaixo da barreira inferior de 3,25%, a Autora pagaria o resultado da subtracção da Euribor da taxa de 3,89% sobre o nominal de, inicialmente, € 1.350.000,00, ou seja, o montante do Contrato de Financiamento n.º (…). 37. O contrato de swap com a referência (…) previa que, caso a Euribor 6 meses se fixasse abaixo da barreira inferior de 3,25%, a Autora pagaria o resultado da subtracção da Euribor da taxa de 3,89% sobre o nominal de € 250.000,00. 38. Os contratos de swap tinham periodicidade semestral. 39. A data de fixing teria lugar dois dias antes do início do período de cálculo. 40. As datas de pagamentos foram semestrais, nos dias 30 de Janeiro e Julho, tendo início em 30 de Janeiro de 2009 e terminando a 30 de Julho de 2012. 41. Durante a vigência dos contratos de swap, de 30 de Julho de 2008 a 30 de Julho de 2012, a taxa Euribor 6 meses apenas não se fixou abaixo da barreira inferior de 3,25% nas respectivas datas de fixing, no dia 28 de Julho de 2008. 42. Nos seguintes períodos de vigência dos contratos de swap a taxa Euribor 6 meses fixou-se sempre abaixo da barreira de 3,25%. 43. A Autora pagou ao BES, no âmbito dos contratos de swap, até 30 de Julho de 2012, os valores acordados. 44. O NOVO BANCO, S.A. foi constituído pelo BANCO DE PORTUGAL (BdP) no dia 3 de Agosto de 2014 como banco de transição no âmbito da resolução do BES. 45. Com a resolução do BES, foi transferida para o NOVO BANCO, S.A. “a totalidade da actividade prosseguida pelo Banco Espírito Santo, S.A., bem como um conjunto dos seus activos e passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão”. 46. Não foram transferidos do BES para o NOVO BANCO, S.A. quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais do BES que, à 20:00 horas do dia 3 de Agosto de 2014, fossem contingentes ou desconhecidos, nomeadamente todas as indemnizações relacionadas com o incumprimento de contrato assinados e celebrados antes das 20h00 do dia 3 de Agosto de 2014. 47. O NOVO BANCO, S.A. sucedeu ao BES no contrato de financiamento (…). 48. A crise do subprime e a crise das dívidas soberanas levariam, por um lado, a uma queda abrupta e prolongada das taxas de referência e, por outro lado, a uma absoluta falta de liquidez dos mercados de crédito. 49. A queda das taxas contribuiu para a redução da remuneração dos empréstimos concedidos pelos Bancos. 50. A falta de liquidez dos mercados aumentou o custo do “funding” dos bancos. 51. Após a falência do Lehman Brothers, os bancos portugueses deixaram de conseguir emitir dívida nos mercados internacionais, tendo o Estado Português, no início de 2009, estabelecido uma linha para cada banco, que vigorou até 2015, ao abrigo da qual os Bancos poderiam emitir empréstimos obrigacionistas com garantia do Estado. 52. Em 31 de Janeiro de 2019, com as alterações de spread e taxa de juros, a Autora pagou a quantia de €1.444.919.58.” * Nessa sentença foram considerados como não provados: “Dos factos alegados, não resultaram provados os factos incompagináveis com os factos dados como provados, nomeadamente: a) O texto final do Contrato (…) foi remetido e disponibilizado à Autora em cima da data de celebração do contrato. b) Com uma antecedência insuficiente para o efectivo esclarecimento e compreensão dos termos do referido Contrato de Financiamento n.º (…). c) A Cláusula 9.ª das Condições Gerais do Contrato de Financiamento n.º (…) foi objecto de negociação pelas partes. d) O conteúdo da Cláusula 9.ª das Condições Gerais do Contrato de Financiamento n.º (…) foi devidamente explicado à Autora pelo BES. e) Como forma de minimizar as consequências nefastas da subida unilateral do spread aplicável ao Contrato de Financiamento n.º (…) e para conseguir prever a quantificação destes, foi a Autora forçada a celebrar sucessivas alterações ao Contrato de Financiamento n.º (…). f) As alterações ao contrato apenas foram celebradas pela Autora para tentar minimizar as perdas ocorridas em virtude da alteração unilateral do spread aplicável ao Contrato de Financiamento n.º (…) pelo Réu. g) A Autora resignou-se a pagar o valor das prestações resultantes das alterações ao spread aplicável por estar convicta que o não pagamento poderia redundar em incumprimento do contrato e na perda do imóvel hipotecado. h) A perda do imóvel causaria avultados prejuízos patrimoniais para a Autora. i) A Autora viu-se forçada a celebrar a alteração ao Contrato de Financiamento n.º (…) por crer ser essa a sua única opção para reduzir os prejuízos patrimoniais sofridos. j) Relativamente ao período compreendido entre 30 de Janeiro de 2013 e 29 de Julho de 2014, em que tinha sido inicialmente estabelecido um spread de 4,5%, esse valor viria a ser reduzido por decisão do NB para 3,75%. k) A diferença entre o montante que se cobrou a título de juros e o montante que, segundo o Contrato n.º (…) celebrado a 30 de Janeiro de 2008, deveria ter sido cobrado, acresce o montante de €124.604,15. l) A diferença entre o montante que se deveria ter pago pela incidência do imposto e o montante que a Autora efectivamente pagou acresce €4.995,46. m) Houve um acréscimo de €23.758,88 que já teria sido amortizado a título de capital resultante da diferença entre o valor das amortizações efectivamente realizadas e o valor das amortizações que deveriam ter sido realizadas. n) O Réu conhecia a verdadeira situação financeira da Autora e sabia que esta não tinha maneira de aceder a um empréstimo junto de outro banco em tão reduzido período de tempo. o) A Autora viu-se obrigada a pagar mais de juros do que foi inicialmente convencionado, tendo sofrido um prejuízo de €153.358,49. p) A Autora, através dos seus representantes, negociou o contrato com o BES. q) O BES, através dos funcionários que, ao tempo, acompanhavam a Cliente, esclareceu todos os aspectos mais relevantes das Condições Gerais, em particular os relacionados com a cláusula 9.ª. r) Para além do custo inerente ao empréstimo, os bancos tinham de suportar o custo da garantia do Estado, o qual, no caso do BES, nos 3 primeiros anos, foi da ordem dos 1,5%. s) Em 31 de Janeiro de 2019, tivesse o spread mantido desde o início do contrato (o valor de 2%) e levando em conta o imposto de selo, a Autora teria pago de capital, spread e imposto de selo, o montante total de €1.324.082,46.” * IV. Mérito da Causa: - Das nulidades da sentença. Considera a Recorrente, nos pontos 5 a 11 das conclusões recursivas, que a sentença recorrida é nula por não estar devidamente fundamentada. Defende, para o efeito, que o Tribunal a quo recorre ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31 de março de 2022, proferido no apenso B, que anulou o saneador-sentença na parte em que apreciou a exceção perentória de ilegitimidade substantiva do Réu, para fundamentar a sua decisão de o absolver parcialmente do pedido. No entanto, aquele Acórdão não se pronunciou sobre o mérito dos autos, determinando apenas a sua continuidade para “apuramento da matéria de facto controvertida”, entendendo ser necessário proceder ao apuramento dos factos alegados para decidir sobre o pedido, face à possibilidade de transmissão para o Réu da responsabilidade pela restituição dos valores pagos em excesso pela Autora. Refere que não pode considerar-se fundamentação suficiente a afirmação genérica de que já não existia sinalagma contratual entre a Autora e o Réu, por não constar da factualidade apurada que a Autora não tenha cumprido as obrigações resultantes do contrato de financiamento com fundamento na exceção de não cumprimento ou tenha invocado a compensação relativamente a prestações devidas, quando a exceção de não cumprimento ou a invocação de compensação relativamente às prestações devidas foram apenas dois mecanismos referidos naquele Acórdão do STJ a título exemplificativo para ilustrar situações das quais resultaria em abstrato (e não no caso concreto) uma quebra do equilíbrio contratual. Assim, conclui que a sentença recorrida não se encontra fundamentada na parte em que decide pela não transmissão para o Réu da totalidade das responsabilidades associadas ao Contrato de Financiamento, o que, nos termos do artigo 615º, n.º 1, al. b), do CPC, equivale a falta de fundamentação, com o que se verifica a nulidade da sentença. Vejamos. As nulidades da sentença são vícios formais e intrínsecos de tal peça processual e encontram-se taxativamente previstos no artigo 615º do CPC. Conforme se refere no Acórdão do STJ de 03.03.2021, processo n.º 3157/17.8T8VFX.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt, é, desde há muito, entendimento pacífico que as nulidades da decisão não incluem o erro de julgamento seja de facto ou de direito. As nulidades típicas da sentença reconduzem-se a vícios formais decorrentes de erro de atividade ou de procedimento (error in procedendo) respeitante à disciplina legal. Trata-se de vícios de formação ou atividade (referentes à inteligibilidade, à estrutura ou aos limites da decisão) que afetam a regularidade do silogismo judiciário, da peça processual que é a decisão e que se mostram obstativos de qualquer pronunciamento de mérito, enquanto o erro de julgamento (error in judicando) que resulta de uma distorção da realidade factual (error facti) ou na aplicação do direito (error juris), de forma a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa, traduzindo-se numa apreciação da questão em desconformidade com a lei, consiste num desvio à realidade factual (nada tendo a ver com o apuramento ou fixação da mesma) ou jurídica, por ignorância ou falsa representação da mesma. Como ensinava o Prof. José Alberto Reis, “Código de Processo Civil Anotado”, 1981, Vol. V, páginas 124 a 125, o magistrado comete erro de juízo ou de julgamento quando decide mal a questão que lhe é submetida, ou porque interpreta e aplica erradamente a lei, ou porque aprecia erradamente os factos; comete um erro de atividade quando, na elaboração da sentença, infringe as regras que disciplinam o exercício do seu poder jurisdicional. Os erros da primeira categoria são de carácter substancial: afetam o fundo ou o efeito da decisão; os segundos são de carácter formal: respeitam à forma ou ao modo como o juiz exerceu a sua atividade. E, como salienta o Prof. Antunes Varela, “Manual de Processo Civil”, 2ª edição, pág. 686, perante norma do Código de Processo Civil de 1961 idêntica à atual, o erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade com o direito aplicável, não se incluiu entre as nulidades da sentença. As nulidades ditam a anulação da decisão por ser formalmente irregular, as ilegalidades ditam a revogação da decisão por estar desconforme ao caso (decisão injusta ou destituída de mérito jurídico) - cfr. neste sentido o Acórdão do STJ de 17.10.2017, Processo nº 1204/12.9TVLSB.L1.S1. De acordo com o disposto no artigo 615º, nº 1, al. b), do CPC, e com relevo para concreta situação que agora nos ocupa, é nula a sentença quando “Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (…).” A nulidade em razão da falta de fundamentação de facto e de direito está relacionada com o comando que impõe ao Tribunal o dever de discriminar os factos que considera provados e de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes. É na fundamentação que o Tribunal colhe legitimidade e autoridade para dirimir o conflito entre as partes e lhes impor a sua decisão, sendo a fundamentação imprescindível ao processo equitativo e contraditório. Só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na alínea b), do n.º 1 do citado artigo 615º do CPC. Como já afirmava o Prof. José Alberto Reis, ob. citada, pág. 140, “Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade.” No mesmo sentido, e a título meramente exemplificativo, veja-se o Acórdão do STJ de 09.12.2021, Processo n.º 7129/18.7T8BRG.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt. Ora, na situação dos autos temos por seguro que a sentença recorrida não enferma da nulidade que a Recorrente lhe aponta. O Tribunal a quo decidiu no sentido da não transmissão para o Réu da totalidade das responsabilidades associadas ao Contrato de Financiamento. E, conforme se pode ler na sentença recorrida, fundamentou essa sua decisão da seguinte forma: “Assim, nos termos explanados pelo SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (a que este Tribunal adere), para aferir se ocorre ou não transmissão das responsabilidades do BES para o Réu (que passou a ocupar a posição daquela entidade bancária no contrato de financiamento), impõe-se verificar se tal afecta o sinalagma contratual, caso em que a verificar-se que tal influencia o sinalagma, deverão ser transmitidas as responsabilidades associadas aos elementos do activo transferidos. Ora, da matéria de facto provada, nomeadamente no facto provado em 1, resulta que o contrato de financiamento em causa nos autos tinha a duração de 180 meses (com data de início de 30 de Janeiro de 2008). Assim, findo o prazo de duração do contrato, não consta da factualidade apurada que a Autora não tenha cumprido as obrigações resultantes do contrato de financiamento com fundamento na excepção de não cumprimento ou tenha invocado a compensação relativamente a prestações devidas. Deste modo, já não existe sinalagma contratual entre a Autora e o Réu, não devendo ser transmitidas as responsabilidades associadas aos elementos do activo transferidos. Para além disso, verifica-se que as alterações unilaterais dos spread ao contrato de financiamento que originam a obrigação de restituição foram efectuadas pelo BES (e não pelo Réu), ou seja, em datas anteriores a 3 de Agosto de 2014. No entanto, de verificar que quanto à última alteração unilateral do spread para 3,75% (facto provado em 25), spread que vigorou a partir de 30 de Julho de 2014 até 29 de Janeiro de 2016, quando o spread deveria ser de 3% (spread acordado na alteração ao contrato de financiamento em causa nos autos ocorrida em Maio de 2011 - facto provado em 18), foi o Réu que recebeu as referidas quantias (a partir da sua criação a 3 de Agosto de 2014). Assim, apenas nessa parte, é o Réu responsável pela restituição dos valores pagos em excesso pela Autora (e pelo Réu recebidos) quanto ao período compreendido entre 3 de Agosto de 2014 a 29 de Janeiro de 2016 (…).” Conforme decorre do exposto, o Tribunal a quo expôs as razões de facto e de direito que o levaram a decidir no sentido em que decidiu, ou seja, fundamentou a sua decisão. Não se vislumbra, sequer, que essa fundamentação seja, como refere a Recorrente, “gravemente deficiente”. Se é verdade que o Tribunal a quo reproduziu, na sentença, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no apenso B, a verdade é que apenas o fez como linha orientadora da decisão a proferir. Por isso referiu expressamente que “nos termos explanados pelo SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (a que este Tribunal adere), para aferir se ocorre ou não transmissão das responsabilidades do BES para o Réu (que passou a ocupar a posição daquela entidade bancária no contrato de financiamento), impõe-se verificar se tal afecta o sinalagma contratual, caso em que a verificar-se que tal influencia o sinalagma, deverão ser transmitidas as responsabilidades associadas aos elementos do activo transferidos”. Tendo por base essa orientação, o Tribunal a quo concluiu depois, com base na factualidade apurada (que identificou) e no enquadramento jurídico que entendeu pertinente (e que também identificou), que já não existia o dito sinalagma contratual entre a Autora e o Réu, decidindo no sentido acima exposto. Dúvidas não temos de que a decisão em análise está fundamentada, não enfermando da nulidade que a Recorrente lhe aponta, motivo pelo qual improcede, quanto a essa concreta questão, o recurso em análise. Considera ainda a Recorrente, agora nos pontos 5, 12 e 13 das respetivas conclusões recursivas, que a sentença recorrida é nula por padecer de contradições entre os fundamentos que invoca e a matéria de facto provada e a própria decisão. Refere para o efeito que a sentença atribui à Autora o direito à restituição das quantias pagas por imposição contratual e juros sobre tais quantias, decorrentes das alterações unilaterais de spread operadas desde 2008, ao abrigo de uma cláusula contratual que agora declara nula, e, ao mesmo tempo, exime o Réu da obrigação de restituir a totalidade daqueles valores, impedindo a Autora de exercer na integralidade o direito de crédito declarado na própria sentença. Conclui assim que a decisão se contradiz a si mesma, declarando um direito e impedindo parcialmente o seu exercício, o que implica a sua nulidade nos termos do artigo 615º, n.º 1, al. c), do CPC. Dispõe o citado normativo, na parte que aqui nos interessa, que é nula a sentença quando “Os fundamentos estejam em oposição com a decisão (…).” A nulidade da sentença contemplada neste normativo pressupõe um erro de raciocínio lógico consistente em a decisão emitida ser contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la. Essa nulidade ocorrerá quando os fundamentos invocados pelo juiz conduzam logicamente não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto. Como se afirmou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26.01.2017, processo n.º 8838/12.0T8BVNG.P2.S1, disponível em www.dgsi.pt: “(…) III - A causa de nulidade prevista no art.º 615º, nº 1, al. c), ocorre quando “há um vício real de raciocínio do julgador em que a fundamentação aponta num sentido e a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente. IV – Saber se o enquadramento jurídico feito no acórdão e a conclusão a que nele se chegou são, ou não, acertados ou injustos, constitui matéria de que não cabe curar em sede de nulidade de sentença/acórdão. Trata-se de questão a envolver eventual erro de julgamento e nunca fundamento de nulidade do acórdão, que se prende tão só com a estrutura formal da decisão”. Por outro lado, essa nulidade verifica-se quando existe contradição entre os fundamentos exarados pelo juiz na fundamentação da decisão e não entre os factos provados e a decisão (cfr. neste sentido o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18.01.2018, processo n.º 25106/15.8T8LSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt). Analisemos então se a sentença objeto de recurso enferma da nulidade que lhe é apontada. A sentença recorrida concluiu pela nulidade da Cláusula 9.ª das Condições Gerais do Contrato de Financiamento (…), considerando a mesma excluída dos termos desse contrato, nulidade essa que, conforme se refere no seu texto, “acarreta, ao abrigo do disposto no artigo 289.º do Código Civil, a restituição das quantias pagas por imposição contratual baseada em tal cláusula contratual geral e bem assim os juros que sobre tais quantias se venceram e vencerem.” No entanto, o Tribunal a quo entendeu que a respetiva obrigação de restituição, cuja existência reconheceu, apenas em parte é da responsabilidade do Réu, concretamente, a parte relativa aos montantes pagos em excesso pela Autora e recebidos pelo Réu a partir da data de 03.08.2014 (data da “Medida de Resolução” aplicada ao BES pelo Banco de Portugal). Já no que se refere à obrigação de restituição dos montantes pagos em excesso pela Autora até essa data, entendeu que a mesma não se transmitiu para o Réu. Na perspetiva da sentença recorrida, uma coisa é reconhecer à Autora o direito à restituição dos montantes por si pagos em excesso, outra é determinar o responsável por essa restituição. E o Tribunal a quo entendeu que essa responsabilidade apenas em parte onera o Réu, explicando porquê. Não se depreende, em face do exposto, qualquer relação de exclusão formal entre a fundamentação de facto e de direito e o dispositivo da decisão recorrida, pelo que terá de se concluir que a sentença recorrida não enferma da nulidade que lhe é apontada. Obviamente que tal não equivale a afirmar que, no plano do mérito da causa, se concorde com a posição defendida na sentença recorrida Improcede assim, também quanto a tal questão, o recurso interposto. * - Do erro de julgamento: Defende a Recorrente, nos termos explanados nos pontos 14 e seguintes das conclusões recursivas, que a sentença recorrida padece de erro de julgamento, dado que fez uma errada interpretação e aplicação da lei e dos factos e, bem assim, do sentido do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31.03.2022, proferido no apenso B. Cumpre analisar. Temos por seguro que a orientação a seguir na resolução do presente litígio nos é dada pelo citado Acórdão do STJ, proferido no apenso B da presente ação, o qual, a nosso ver, e tal como refere a Recorrente, não foi corretamente interpretado pelo Tribunal a quo. Entendemos ser útil reproduzir aqui o seu teor. Escreveu-se nesse Acórdão: “(…) Nesta ação, a Autora fundamenta um pedido de restituição do valor dos juros que, na sua perspetiva, lhe foram cobrados em excesso, invocando, por um lado, a nulidade da cláusula contratual que prevê o modo de cálculo desses juros e, por outro lado (numa relação implicitamente subsidiária), o incumprimento do disposto nessa mesma cláusula. O Banco de Portugal, por deliberação de 3.08.2014, aplicou ao BES uma medida de resolução de transferência da generalidade da sua atividade para um banco de transição – o Novo Banco – criado especialmente para o efeito, tendo, nesse mesmo dia, aprovado a transferência para o Réu dos ativos, passivos e elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do BES, nos termos constantes do Anexo 2 dessa deliberação, o qual foi retificado por deliberação do Banco de Portugal, de 11 de Agosto de 2014, passando a constar da subalínea (v) da alínea (b) do número 1 desse anexo que não se transferiam para o Novo Banco quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais No dia 29 de dezembro de 2015, o Banco de Portugal adotou nova deliberação (deliberação contingências), utilizando o denominado poder de retransmissão dos ativos e passivos entre o BES e o Novo Banco que havia ficado expressamente previsto no número 2, do Anexo 2, da deliberação de 3 de Agosto. Na alínea A dessa deliberação, o Banco de Portugal clarificou que, nos termos da alínea b), do número 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto de 2014, não foram transferidas para o Novo Banco quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais do BES que, às 20 horas do dia 3 de agosto de 2014, fossem contingentes ou desconhecidos (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais, independentemente da sua natureza (fiscal, laboral, civil ou outra) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do BES, tendo na alínea B da mesma deliberação, em particular, clarificado não terem sido transferidos do BES para o Novo Banco os passivos do BES que respeitassem a indemnizações relacionadas com o incumprimento de contratos assinados e celebrados antes das 20 horas do dia 3 de agosto de 2014 (iii) e todos os créditos e indemnizações relacionados com a alegada anulação de determinadas cláusulas de contratos de mútuo, em que o BES era mutuante (v). Nessa deliberação adiantaram-se as razões que justificam que as responsabilidades contingentes e desconhecidas do BES não se devam considerar transferidas para o Novo Banco: (...) 7. O Banco de Portugal considerou ser proporcional e de interesse público não transferir para o banco de transição as responsabilidades contingentes ou desconhecidas do BES (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do BES nos termos da subalínea (v) a (vii) da alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto, uma vez que a certeza relativamente às responsabilidades do banco de transição é essencial para garantir a continuidade das funções críticas desempenhadas pelo Novo Banco e que anteriormente tinham sido desempenhadas pelo BES. (...) 9. Importa clarificar que o Banco de Portugal, enquanto autoridade pública de resolução, decidiu e considera que todas as responsabilidades contingentes e desconhecidas do BES (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do BES, estão abrangidas pelas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 da Deliberação, não tendo sido, portanto, transferidas para o Novo Banco. (...) 12. Se o número de processos pendentes nos tribunais judiciais e a diferente orientação nas decisões até hoje tomadas conduzirem a que, de modo significativo, não venha a ser reconhecida adequadamente a seleção efetuada pelo Banco de Portugal (enquanto autoridade pública de resolução) dos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão transferidos do BES para o Novo Banco (decisão sobre o «perímetro de transferência»), pode ficar comprometida a execução e a eficácia da medida de resolução aplicada ao BES, a qual, entre outros critérios, se baseou num critério de certeza quanto ao perímetro de transferência. 13. Foi esse critério de certeza que permitiu calcular as necessidades de capital da instituição de transição, o Novo Banco, e foi com base nesse cálculo que o Fundo de Resolução realizou o capital da instituição de transição. 14. Caso viessem a materializar-se na esfera jurídica do Novo Banco responsabilidades e contingências por força de sentenças judiciais, o Novo Banco seria chamado a assumir obrigações que de modo algum lhe deveriam caber e cuja satisfação não foi pura e simplesmente tida em consideração no montante do capital com que aquele banco de transição foi inicialmente dotado. (...) Após esta clarificação, não restaram dúvidas de que, tendo em atenção o tipo de resolução do BES e o modo de constituição da nova entidade bancária de transição, o Banco de Portugal determinou que não se transfeririam para o Novo Banco quaisquer passivos que, às 20 horas do dia 3 de agosto de 2014, fossem contingentes ou desconhecidos, sendo as hipóteses descritas na alínea B desta deliberação meramente exemplificativas. Ora, a invocada responsabilidade pela restituição do excesso de juros cobrados já existente à data da resolução do BES, independentemente dos diferentes fundamentos invocados pela Autora para justificar esse dever de restituição, pelo menos, era contingente, uma vez que não se encontrava reconhecida, pelo que, tal responsabilidade encontrava-se abrangida pela referida cláusula genérica de exclusão de transferência de responsabilidades para o Novo Banco, encarada esta na sua literalidade, além de se encontrar prevista nas subalíneas específicas exemplificativas (iii) e (v). Contudo, como tem sido objeto de chamadas de atenção [1], no mesmo artigo 145.º-O do RGICSF, que no seu n.º 1 permite que que o Banco de Portugal possa determinar “a transferência parcial ou total de direitos e obrigações de uma instituição de crédito, que constituam ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão, e a transferência da titularidade das ações ou de outros títulos representativos do seu capital social para instituições de transição para o efeito constituídas, com o objetivo de permitir a sua posterior alienação, no n.º 6 desse mesmo artigo limita o alcance desse poder, dispondo que a eventual transferência parcial dos direitos e obrigações para a instituição de transição não deve prejudicar a cessão integral das posições contratuais da instituição de crédito objeto de resolução, com transmissão das responsabilidades associadas aos elementos do ativo transferidos, nomeadamente no caso de contratos de garantia financeira, de operações de titularização ou de outros contratos que contenham cláusulas de compensação e de novação. Atento o disposto neste último preceito, o Banco de Portugal, ao abrigo da referida competência, não poderá determinar uma transferência parcial de direitos e obrigações para a entidade de transição que impeça uma cessão integral das posições contratuais da entidade bancária objeto da medida de resolução, nomeadamente nas situações enumeradas na parte final do referido n.º 6, artigo 145.º-O, e que se encontram mais pormenorizadamente descritas nos artigos 145.º-AC, 145.º-AD e 145.º-AE do RGICSF. Esta limitação não se aplica, no entanto, apenas a estas situações expressamente, mas exemplificativamente previstas, mas a todas aquelas em que uma transmissão parcial dos direitos e obrigações ponha em causa o sinalagma da relação contratual objeto de transmissão, gerando um desequilíbrio superveniente entre as prestações das partes [2]. Daí que a referida cláusula genérica de exclusão de transmissão de responsabilidades contingentes e desconhecidas para o Novo Banco constante do anexo 2 da deliberação de 03.08.2014, retificada pela deliberação de 11.08.2014 e clarificada pela deliberação de 29 de dezembro de 2015 (contingência), do Banco de Portugal, deva ser interpretada à luz desta limitação às transmissões parciais, considerando-se que a mesma não abrange a exclusão de transmissão das responsabilidades inseridas num contrato ou em complexos contratuais em que a posição nele assumida pelo BES transitou para o Novo Banco. Numa interpretação restritiva do referido item daquelas deliberações, em coerência com a amplitude da competência do Banco de Portugal nesta matéria, não se deve considerar excluída a transmissão das responsabilidades do BES na execução de contratos em que o Novo Banco passou a ocupar a posição daquela entidade bancária, sempre que essa exclusão afete o sinalagma contratual, devendo, nessas situações, considerarem-se igualmente transmitidas as responsabilidades associadas aos elementos do ativo transferidos. Na presente ação é invocado pela Autora, como causa de pedir, a transmissão do BES para o Novo Banco da posição contratual daquele num contrato celebrado em 30.01.2008, intitulado de financiamento, através do qual o BES disponibilizou de imediato à Autora 1.350.000,00€, mediante o pagamento de juros remuneratórios, tendo-se clausulado o reembolso da quantia adiantada em 26 amortizações semestrais, com início 30 meses após a data de celebração do contrato (período de carência de reembolso de capital). Estamos perante um contrato de mútuo bancário, tendo o Novo Banco passado a ocupar nesse contrato a posição de mutuante em 3 de agosto de 2014. Nessa altura, na versão da Autora, o BES já havia efetuado integralmente a prestação que recaía sobre o mutuante – a entrega do capital mutuado à mutuária – não tendo o Novo Banco qualquer obrigação a cumprir, enquanto as prestações devidas pela mutuária (restituição do capital mutuado e pagamento de juros remuneratórios), por se encontrarem fracionadas no tempo, apenas tinham sido parcialmente cumpridas perante o BES, uma vez que ainda não haviam decorrido os prazos para as realizar integralmente. Com a transmissão para o Novo Banco da posição contratual do BES neste contrato, as prestações relativas ao reembolso do capital e ao pagamento de juros passaram por isso a ser feitas ao Novo Banco que as têm vindo a receber. A exclusão de uma contingente responsabilidade do Novo Banco pela restituição de quantias alegadamente pagas em excesso ao BES, a título de juros remuneratórios, mesmo antes da resolução desta instituição bancária, é suscetível de colocar em causa a cessão integral da posição contratual do BES naquele contrato, uma vez que essa eventual responsabilidade continuaria a incidir sobre esta entidade, apartando-se da relação contratual que atualmente tem como partes a Autora e o Novo Banco, o que pode afetar o sinalagma inerente a tal relação, vedando à Autora a utilização de mecanismos como a exceção de não cumprimento e a compensação, perante o Novo Banco, mediante a invocação do direito de crédito correspondente à alegada responsabilidade. Na presente ação, a defesa por exceção deduzida pelo Réu quando alegou a sua ilegitimidade substantiva para ser responsabilizado pela restituição do valor dos juros alegadamente pagos em excesso, foi apreciada no despacho saneador, tendo o Réu desde logo sido absolvido do pedido na parte respeitante à restituição do valor dos juros de mora pagos em excesso antes da data de resolução do BES, apesar de inexistir qualquer matéria de facto apurada, uma vez que o Réu impugnou a quase totalidade dos factos constantes da petição inicial. Face à possibilidade, acima detetada, da transmissão para o Novo Banco da responsabilidade por essa restituição não estar abrangida pela exclusão determinada pelo Banco de Portugal no anexo 2 da deliberação de 03.08.2014, retificada pela deliberação de 11.08.2014 e clarificada pela deliberação de 29 de dezembro de 2015 (contingência), é necessário apurar os factos alegados na presente ação, para depois, então, aplicar o direito, não sendo possível, como fez a primeira instância, com a aprovação da Relação, decidir nessa parte já a ação. A decisão da exceção perentória da ilegitimidade substantiva foi, pois, extemporaneamente proferida, devendo o processo prosseguir para permitir a produção de prova sobre a factualidade pertinentemente alegada, quer pela Autora, quer pela Ré, e que se mostra controvertida, e será em função do que se apurar nesse julgamento que se poderá ponderar sobre a eventual existência de uma ilegitimidade substantiva do Novo Banco, relativamente aos pedidos formulados pela Autora. (…).” – sublinhado nosso. Ora, produzida a prova e em face da mesma, o Tribunal a quo concluiu o seguinte: - A Cláusula 9.ª das Condições Gerais do Contrato de Financiamento (…), constituindo uma cláusula contratual geral, é nula por violação do artigo 5.º, n.º 2 e do artigo 6.º, n.º 1 da LCCG, devendo considerar-se excluída dos termos desse contrato, por efeito do artigo 8.º, alíneas a) e b) do mesmo diploma legal; - Essa nulidade, ao abrigo do disposto no artigo 289.º do Código Civil, acarreta a obrigação de restituição das quantias pagas por imposição contratual baseada em tal cláusula contratual geral e, bem assim, dos juros que sobre tais quantias se venceram e vencerem; - Com base nessa cláusula contratual geral considerada nula e excluída do contrato, foram aplicadas ao Contrato de Financiamento (…), sem o acordo da Autora e por iniciativa unilateral do BES, as seguintes alterações de spread: a) alteração do spread para 2,25%, no período que vigorou de 31 de Julho de 2008 a 30 de Janeiro de 2009 (facto provado em 5), quando o spread deveria ser de 2% (spread acordado no contrato celebrado em 30 de Janeiro de 2008 – facto provado em 1); b) alteração do spread para 3,25%, no período que vigorou de 31 de Janeiro de 2009 a 30 de Julho de 2009 (facto provado em 8), quando o spread deveria ser de 2% (spread acordado no contrato celebrado em 30 de Janeiro de 2008 – facto provado em 1); c) alteração do spread para 3%, no período de 31 de Janeiro de 2011 a 30 de Julho de 2011 (facto provado em 16), quando o spread deveria ser de 2% (spread acordado no contrato celebrado em 30 de Janeiro de 2008 – facto provado em 1); d) alteração do spread para 4,5%, a 30 de Janeiro de 2013 (facto provado em 19) sendo que foi comunicado ao Réu, a 29 de Julho de 2013, a aprovação da redução do spread de 4,5% para 4% (facto provado em 21), spread que se manteve até 29 de Julho de 2014, quando o spread deveria ser de 3% (spread acordado na alteração ao contrato de financiamento em causa nos autos ocorrida em Maio de 2011 - facto provado em 18). Sabe-se que foi aprovada a redução de spread com data retroativa, tendo o BES procedido ao estorno de juros e imposto de selo, no valor de 12.433,27€ (facto provado em 28); e) alteração do spread para 3,75% (facto provado em 25), spread que vigorou a partir de 30 de Julho de 2014 até 29 de Janeiro de 2016, quando o spread deveria ser de 3% (spread acordado na alteração ao contrato de financiamento em causa nos autos ocorrida em Maio de 2011 - facto provado em 18). - Quanto aos períodos referidos nas alíneas a) a e), a Autora tem direito à restituição das quantias pagas por imposição contratual baseada na dita Cláusula 9.ª das Condições Gerais do Contrato de Financiamento (…), considerada nula e excluída desse contrato, e, bem assim, dos juros que sobre tais quantias se venceram e vencerem. Aqui chegados, importa referir que relativamente a tudo quanto acabou de se expor não foi a sentença proferida nos autos objeto de recurso, motivo pelo qual se tem como assente. Como bem se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no apenso B da presente ação, cujo teor subscrevemos na íntegra, “(…) não se deve considerar excluída a transmissão das responsabilidades do BES na execução de contratos em que o Novo Banco passou a ocupar a posição daquela entidade bancária, sempre que essa exclusão afete o sinalagma contratual, devendo, nessas situações, considerarem-se igualmente transmitidas as responsabilidades associadas aos elementos do ativo transferidos.” Ora, dúvidas não temos de que na presente situação, face à factualidade apurada e ao enquadramento que na sentença lhe foi dado e que acima ficou exposto, não se poderá considerar excluída a transmissão da responsabilidade do BES para o Réu no que toca à obrigação de restituição dos montantes indevidamente cobrados e recebidos pelo BES e efetivamente pagos pela Autora, porquanto essa exclusão afeta o sinalagma contratual, na medida em que veda à Autora a possibilidade de repor o equilíbrio contratual, invocando o direito de crédito que lhe assiste e que emerge diretamente dessa obrigação de restituição. Note-se que em causa está o recebimento pelo BES de montantes cobrados com base numa cláusula contratual que foi considerada nula e excluída do contrato celebrado com a Autora. Excluir a transmissão para o Réu da obrigação de restituição à Autora de montantes cobrados e efetivamente pagos com base numa cláusula que foi excluída do contrato resultaria num inegável desequilíbrio entre as prestações a que cada uma das partes contratualmente se vinculou. Como refere a Recorrente, o Réu assumiu a posição jurídica do BES enquanto credor do capital e dos juros devidos ao abrigo do Contrato de Financiamento (…), o que significa que a Autora continuou adstrita à necessidade de efetuar a prestação contratualmente prevista. De igual modo, o Réu tem de assumir a obrigação de restituição dos montantes indevidamente cobrados à Autora no âmbito desse mesmo contrato, independentemente de esses montantes lhe terem sido pagos a si ou ao BES, cuja posição jurídica assumiu. A relação jurídica emergente desse contrato transferiu-se na sua totalidade para o Réu, com todos os direitos e obrigações dele emergentes. O direito de crédito reconhecido à Autora na presente ação decorre de uma relação contratual que não terminou com a resolução bancária do BES nem começou com a sucessão do Réu na posição jurídica do BES. Não reconhecer essa realidade equivaleria a negar à Autora a possibilidade de repor o equilíbrio contratual. Ora, conforme resulta do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no apenso B, o Banco de Portugal não pode determinar uma transferência parcial de direitos e obrigações para a entidade de transição, o aqui Réu, que impeça uma cessão integral das posições contratuais da entidade bancária objeto da medida de resolução, sempre que tal resulte num desequilíbrio superveniente entre as prestações das partes. E tal solução não resulta prejudicada pelo facto de, eventualmente, o contrato se encontrar findo, pois esse facto não encerra em si a virtualidade de sanar o apontado desequilíbrio decorrente, sublinhe-se, da cobrança de montantes, pelo mutuante, sem cobertura contratual. Quanto à alusão, no Acórdão do STJ proferido no apenso B, à possibilidade de invocação pela Autora da exceção de não cumprimento ou da compensação de créditos com base no direito de crédito de que se arroga e que emerge da responsabilidade pela restituição dos montantes indevidamente recebidos, a mesma apenas visou ilustrar que não pode haver exclusão de responsabilidades contingentes se com tal exclusão uma das partes, no caso a Autora, ficar despojada de quaisquer meios de defesa oponíveis ao Réu. Não tendo a Autora lançado mão desses mecanismos, nada a inibe de exigir do Réu o pagamento do seu crédito. Assim sendo, na procedência, quanto a esta matéria, do presente recurso, conclui-se que terá o Réu de ser condenando a restituir à Autora todas as quantias pagas por imposição contratual baseada na Cláusula 9ª das Condições Gerais do Contrato de Financiamento (…), uma vez que a mesma foi excluída do contrato, acrescidas dos juros que sobre tais quantias se venceram e vencerem, estando em causa, conforme se decidiu na sentença recorrida em sede de “Enquadramento Jurídico”, as quantias pagas nos períodos de 31.07.2008 a 30.07.2009, 31.01.2011 a 30.07.2011 e 30.01.2013 a 29.01.2016. Tal como se refere na sentença recorrida, uma vez que da matéria de facto provada não resultam os valores que foram indevidamente pagos pela Autora nesses períodos, os mesmos deverão ser apurados em posterior incidente de liquidação. Esses valores corresponderão à diferença entre os montantes efetivamente pagos pela Autora nesses períodos (que incluem capital amortizado, juros remuneratórios, comissões e imposto de selo) e os valores devidos por aplicação da taxa Euribor a 6 meses, acrescida, nos períodos de 31.07.2008 a 30.07.2009 e de 31.01.2011 a 30.07.2011, do spread de 2%, e no período de 30.01.2013 a 29.01.2016, do spread de 3%. * - Da retificação do dispositivo da sentença. Defende a Recorrente, nos pontos 1 e 2 das suas conclusões recursivas, que o dispositivo da sentença deve ser retificado no sentido de, em conformidade com o julgado, nele se incluírem os juros que se venceram e vencerem sobre as quantias a cuja restituição o Réu foi condenado pelo Tribunal a quo. Entendemos que lhe assiste razão, pois se o Tribunal a quo concluiu, em sede de “Enquadramento Jurídico”, que esses juros eram devidos, terá de os considerar no dispositivo da sentença. * V. Decisão: Pelo exposto, acordam os Juízes Desembargadores que compõem o coletivo desta 2ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa abaixo identificados em julgar parcialmente procedente o presente recurso, revogando-se parcialmente a decisão recorrida. Consequentemente, Declara-se nula a Cláusula 9.ª das Condições Gerais do Contrato de Financiamento (…), considerando-se a mesma excluída dos termos do contrato e, em consequência, condena-se o Réu NOVO BANCO, S.A. a restituir à Autora V (…), LDA. os valores pagos em excesso por esta no âmbito do contrato de financiamento n.º (…) nos períodos compreendidos entre 31.07.2008 e 30.07.2009, 31.01.2011 e 30.07.2011 e 30.01.2013 e 29.01.2016, quantia que deverá ser apurada em posterior incidente de liquidação e que corresponde à diferença entre os montantes efetivamente pagos pela Autora nesses períodos (que incluem capital amortizado, juros remuneratórios, comissões e imposto de selo) e os valores devidos por aplicação da taxa Euribor a 6 meses, acrescida, nos períodos de 31.07.2008 a 30.07.2009 e de 31.01.2011 a 30.07.2011, do spread de 2%, e no período de 30.01.2013 a 29.01.2016, do spread de 3%, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contabilizados desde a data em que cada um desses valores foi pago até efetivo e integral pagamento. * Custas pela Recorrente e pela Recorrida na proporção de, respetivamente, 40% e 60%. Registe. Notifique. * Lisboa, 26.09.2024 Susana Mesquita Gonçalves Rute Sobral Orlando Nascimento |