Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
5088/23.3T8VNF.G1
Relator: ANTERO VEIGA
Descritores: TRABALHO IGUAL SALÁRIO IGUAL
REMUNERAÇÃO ADICIONAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/09/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
Resultando da factualidade provada que o trabalho executado pelos autores, manobradores de máquinas, têm as mesmas aptidões que outros colegas diferentemente remunerados, e consiste nas mesmas tarefas, nos mesmos horários de trabalho no mesmo local, e que executam os mesmos serviços, os solicitados pela empregadora, demonstrado está a igualdade de trabalho quanto à natureza, qualidade e quantidade.
A diferenciação salarial não pode ter como fundamento meras condições conjunturais do mercado de trabalho.
Decisão Texto Integral:
 Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

AA, e BB, idf. nos autos, intentaram a presente ação declarativa sob a forma de processo comum laboral contra “EMP01..., Unipessoal, Lda.”, idf. nos autos formulando o seguinte pedido:

“Deverá a presente ação ser julgada procedente por provada, considerando-se discriminatório o comportamento da Ré empregadora, condenando-se a Ré a pagar aos Autores as quantias reclamadas e que ascendem a 3.008,60€ quanto ao 1º Autor, e ao 2º autor o valor 31.257,56€.

Deverá ainda a Ré, ser condenada no pagamento dos juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento”.
Alegaram, em síntese, que foram admitidos ao serviço da “EMP02..., S.A.” que, em março de 2020, transmitiu os seus contratos de trabalho à Ré, sendo que, a partir de tal data, passaram a trabalhar sob as ordens, direção e fiscalização da Ré, no exercício das tarefas habituais de manobradores de máquinas, nas instalações da EMP03..., para quem a Ré presta serviços de transporte e logística. Mais alegaram que desempenham as mesmas funções e praticam os mesmos horários de trabalho que os trabalhadores CC e DD, sendo que estes recebem uma prestação retributiva pelo trabalho prestado ao fim de semana, motivo pelo qual entendem que nada justifica o tratamento diferenciado e discriminatório.
A ré contestou impugnado o direito, porquanto o colega CC apenas auferia a remuneração adicional de 100 % por trabalho prestado aos fins-de-semana porque tal acréscimo foi acordado há mais de 17 anos entre a EMP02..., S.A. com um grupo muito restrito de trabalhadores (6 apenas), que não recebia subsídio de turno e que se ficou a dever ao facto de à data, se verificar uma enorme dificuldade em encontrar trabalhadores para laborar durante os fins-de-semana, sendo o pagamento do acréscimo de 100% por trabalho prestado ao Sábado e ao Domingo um mecanismo gizado pela EMP02..., S.A. para motivar os trabalhadores a prestar trabalho normal nesses dias e que se manteve aquando da transmissão dos contratos de trabalho para a Ré porque esta estava obrigada a manter os direitos contratuais adquiridos.
Mais alegou que, ao invés daquela majoração, os Autores recebem um subsídio de turno no montante mensal correspondente a 35 % da retribuição base, que não era paga pela EMP02... ao grupo de trabalhadores com quem os Autores se comparam.
Por fim, alegou que o trabalhador CC já não é trabalhador da Ré desde ../../2023 e que, desde janeiro de 2023, deixou de existira majoração de fim de semana, passando a ser regulado, em duas prestações, uma, que passou a ser designada por “Subsídio de Turno”, tal como sucede com todos os demais trabalhadores desta categoria profissional, que laboram ao fim-de-semana e outra, que passou a ser designada por “Complemento Tutoria”.

Realizado o julgamento o Mmº Juiz proferiu decisão nos seguintes termos:

“Face ao exposto, julga-se a ação parcialmente procedente, em função do que se decide:

1. Condenar a Ré “EMP01..., Unipessoal, Lda.” a pagar ao Autor AA a quantia que se vier a apurar em posterior incidente de liquidação de sentença devida pelas horas de trabalho prestado efetivamente aos Sábados e Domingos entre novembro de 2022 e janeiro de 2023, considerando a majoração de 100 % na remuneração relativa ao tempo de trabalho, atendendo ao valor da hora de trabalho e deduzido o valor do subsídio de turno pago;
2. Condenar a Ré “EMP01..., Unipessoal, Lda.” a pagar ao Autor BB a quantia que se vier a apurar em posterior incidente de liquidação de sentença devida pelas horas de trabalho prestado efetivamente aos Sábados e Domingos entre 2015 e janeiro de 2023, considerando a majoração de 100 % na remuneração relativa ao tempo de trabalho, atendendo ao valor da hora de trabalho e deduzido o valor do subsídio de turno pago;
3. Ao montante apurado em resultado do referido em 1. e 2., acrescerão juros de mora, à taxa legal em vigor em cada momento, contados desde a data da decisão proferida em posterior incidente de liquidação, até efetivo e integral pagamento.
(…)
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Inconformada a ré interpôs recurso apresentando as seguintes conclusões:
(…)
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Sem contra-alegações.
A Exº PGA deu parecer no sentido da improcedência.
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Colhidos os vistos dos Ex.mos Srs. Adjuntos há que conhecer do recurso.
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Factualidade:

A. Os Autores foram admitidos ao serviço da empresa “EMP02... SA” que, em março de 2020, transmitiu os contratos de trabalho dos Autores, assim como todos os direitos e obrigações, para a Ré.
B.. Desde março de 2020, os Autores trabalham sob as ordens, direção e fiscalização da Ré, no exercício das tarefas habituais de manobradores de máquinas, cumprindo o horário de trabalho de 8 horas por dia, semanalmente rotativo e de acordo com as escalas pré-definidas pela Ré empregadora.
C. No âmbito da sua atividade de manobrador de máquinas, os Autores desempenham as seguintes tarefas; operar/conduzir o empilhador; colocar e retirar cargas da estanteria; empilhar cargas, carregar e descarregar camiões; assegurar a manutenção e limpeza do empilhador, entre outras.
D. O Autor AA iniciou a sua prestação laboral na empresa EMP02... por contrato de trabalho a termo incerto em 2014 tendo sido reintegrado como trabalhador com contrato de trabalho sem termo na Ré por decisão judicial que correu termos neste tribunal sob o processo n.º 5777/21.7T8VNF.
E. O Autor BB começou a trabalhar em 01/04/2015, na empresa EMP02..., e mais tarde foi reintegrado como trabalhador efetivo na Ré por decisão judicial que correu termos neste tribunal sob o processo n.º 2962/21.....
F. Os autores desempenham as tarefas de manobrador de máquinas nas instalações da empresa EMP03..., para quem a Ré presta serviços de transporte e logística.
G. A Ré no âmbito dos seus poderes de direção, tem equipas de trabalhadores destinados a desempenhar as suas funções durante a semana e equipas destinadas aos fins de semana.
H. No âmbito da sua atividade, os Autores desempenham funções durante o fins-de-semana, sendo que o podem fazer durante o período diurno ou noturno, mediante as necessidades da Ré empregadora.
I. Os Autores praticam o seguinte horário de trabalho: sábados das 8h00 às 19h00, domingos das 6h00 às 14h00, segunda das 00h00 às 08h00 e mais 8 horas de trabalho efetivo diurno em dois dias por semana em função das necessidades da empresa ou, sábados das 19h00 às 6h00 de domingo, e domingos das 14h00 às 24h00, e mais 8 horas de trabalho efetivo diurno em dois dias por semana, em função das necessidades da empresa.
J. Os trabalhadores CC (enquanto esteve ao serviço da Ré) e DD detém a categoria profissional de manobrador de máquinas, trabalham no mesmo departamento dos Autores e executam as funções adstritas a operador de empilhador, nomeadamente, operar/conduzir o empilhador; colocar e retirar cargas da estanteria; empilhar cargas, carregar e descarregar camiões; assegurar a manutenção e limpeza do empilhador, entre outras
K. Os trabalhadores CC (enquanto esteve ao serviço da Ré) e DD praticam os mesmos horários de trabalho do que os Autores.
L. O trabalhador CC auferia uma prestação retributiva por cada hora de trabalho em período diurno efetuada durante os fins-de-semana no valor a dobrar e por cada hora de trabalho em período noturno efetuada durante os fins de semana no valor a dobrar acrescida de 25 % da retribuição horária e não auferia qualquer subsídio de turno.
M. Os Autores, ao invés de auferirem a prestação retributiva referida em L., auferiam um subsídio de turno correspondente a 35% da retribuição base.
N. Eliminado: As tarefas desempenhadas pelo trabalhador CC eram de igual natureza, quantidade e qualidade que as dos Autores.
O. Desde janeiro de 2023, a Ré deixou de pagar a majoração de fim de semana.
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Com interesse para a decisão da causa, não se provaram quaisquer outros factos, designadamente que:

1. A remuneração adicional de 100% por trabalho prestado aos fins-de-semana pelo trabalhador CC foi acordado há mais de 17 anos entre a “EMP02..., S.A.” com um grupo muito restrito de trabalhadores, que não recebiam subsídio de turno.
2. A razão de ser de tal acordo prendia-se com o facto de, à data, se verificar uma enorme dificuldade em encontrar trabalhadores que estivessem dispostos a laborar durante os fins-de-semana.
3. O pagamento do acréscimo de 100% por trabalho prestado ao Sábado e ao Domingo foi um mecanismo gizado pela “EMP02..., S.A.” para motivar os trabalhadores a prestar trabalho normal nesses dias.
4. O trabalhador CC tem antiguidade superior à dos Autores.
Aditado
- A remuneração adicional de 100% por trabalho prestado aos fins-de-semana pelo trabalhador CC foi acordado há mais de 17 anos (em 2002) entre a “EMP02..., S.A.” com o grupo inicial de trabalhadores, que passaram a exercer funções aos fins de semana, designadamente no horário referido em “I”.
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Conhecendo do recurso:

Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente.

Questões colocadas:

- Alteração de decisão relativa à matéria de facto:
Deve ser considerado não escrito o facto N, ou eliminar-se a expressão “quantidade e qualidade”. (nada foi alegado quanto a quantidade e qualidade do trabalho)

Devem considerar-se provados os pontos 1 a 4 não provados, aditando-se:

1. A remuneração adicional de 100% por trabalho prestado aos fins-de-semana pelo trabalhador CC foi acordado há mais de 17 anos (em 2002) entre a “EMP02..., S.A.” com um grupo muito restrito de trabalhadores, que não recebiam subsídio de turno.
2. A razão de ser de tal acordo prendia-se com o facto de, à data, se verificar uma enorme dificuldade em encontrar trabalhadores que estivessem dispostos a laborar durante os fins-de-semana.
3. O pagamento do acréscimo de 100% por trabalho prestado ao sábado e ao Domingo foi um mecanismo gizado pela EMP02... e S.A. para motivar os trabalhadores a prestar trabalho normal nesses dias.
4. O trabalhador CC tem antiguidade superior à dos Autores, tendo sido admitido em 2002.
- Não demonstração da natureza igual do trabalho em quantidade e qualidade / existência de fundamento razoável e racional para a diferenciação.
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Quanto à factualidade:

Quanto ao ponto N da matéria de facto.
Refere a recorrente que deve considerar-se não escritos e eliminados da matéria de facto, por se integre no thema decidendum e ser conclusivo.
Conquanto a recorrente apenas conteste a alegação de forma genérica, aludindo no seu artigo 34º da sua contestação a “impugnam-se igualmente, por se tratar de matéria de Direito ou meramente conclusiva, os factos alegados na Petição Inicial constantes dos artigos não expressamente impugnados no presente articulado, bem como os factos que estiverem em oposição com a presente defesa considerada no seu conjunto”, centrando a sua defesa na circunstância de alegadamente existir fundamento razoável e lógico para a diferença ocorrida, o ponto deve ser eliminado por ser conclusivo.
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Pretende ainda que sejam considerados provados os pontos 1 a 4 não provados, aditando-se:

1. A remuneração adicional de 100% por trabalho prestado aos fins-de-semana pelo trabalhador CC foi acordado há mais de 17 anos (em 2002) entre a “EMP02..., S.A.” com um grupo muito restrito de trabalhadores, que não recebiam subsídio de turno.
2. A razão de ser de tal acordo prendia-se com o facto de, à data, se verificar uma enorme dificuldade em encontrar trabalhadores que estivessem dispostos a laborar durante os fins-de-semana.
3. O pagamento do acréscimo de 100% por trabalho prestado ao sábado e ao Domingo foi um mecanismo gizado pela EMP02... e S.A. para motivar os trabalhadores a prestar trabalho normal nesses dias.
4. O trabalhador CC tem antiguidade superior à dos Autores, tendo sido admitido em 2002.

Quanto à antiguidade, invoca o depoimento do próprio CC.
Relativamente ao momento em que foi instituída a remuneração adicional de 100% por trabalho prestado aos fins-de-semana, com que trabalhadores foi acordada e respetiva justificação (factos não provados 1 a 3), refere que também estão em causa factos pacíficos, de conhecimento geral na empresa, e que resultaram inclusivamente confirmados por todas as testemunhas indicadas pelos autores, concretizando alguns depoimentos.
Vejamos.
O CC referiu foi admitido em 2002, depôs de forma credível e demonstrando fazê-lo com verdade, tanto que já não trabalha na empresa. Assim e embora desacompanhado de prova documental, é de aditar o seguinte facto:
- O trabalhador CC foi admitido em 2002.
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Quanto ao mais refere o mesmo depoente, que os autores são manobradores de máquina, no armazém a distribuir de um lado para o outro, a arrumar, carregar e descarregar camiões, tal como o depoente. Trabalham ao fim de semana e mais dois dias na semana. Explicou o tipo de turnos. Referiu saber que não eram pagos como o depoente. “Eu era já só desses contratos antigos”, pagavam a 100% as horas de fim de semana, mais prémio de produtividade. As funções eram iguais, “era tudo igual”. Confirmou que os mais velhos recebiam a majoração, todos de 2002. Confirmou que todos faziam o mesmo, perguntado “se não eram melhores nem piores que o senhor”, respondeu, “nada”.
O depoente DD, foi contratado em 2012 como temporário. Teve uma ação que terminou em acordo. Descreveu as funções, era serviço de armazém com empilhador, referindo que os que trabalham ao fim de semana “fazem todos a mesma coisa”. Refere que os autores recebiam subsídio de turno. O depoente teve majoração na sequência de ação em tribunal. Referiu que a majoração foi dada há 20 anos atrás a meia dúzia de trabalhadores. Os antigos sempre receberam. Tinham, a majoração e premio de produtividade. Referem que todos “fazem exatamente a mesma coisa no mesmo período de tempo”. Refere que os contratos foram com a “EMP02...”, aludindo a que, “ninguém queria trabalhar aos fis-de semana… e então eles derem as horas a 100%”
O depoente EE, admitido em 2002, referiu que os autores faziam mesmo trabalho que depoente. Descreveu as respetivas funções. Os Horários e trabalho eram os mesmos. Confirmou que nada distinguia as prestações laborais. Depoente recebia a majoração. Havia oito pessoas a receber a majoração. Eram mais ou menos de há 20 anos, e não recebiam o subsídio de turno.
O depoente FF, e manobrador de máquinas, mas trabalha durante a semana. Refere que trabalha desde 2007. Refere a majoração dos mais antigos, do trabalho aos fins de semana, referindo que se trata das mesmas funções. “Os mais antigos foi por acordo com a empresa EMP02...”, “os mais novas a empresa já não lhes cedeu a mesma condição”.
A atividade começou com a EMP02... em 2000 ou 2002. No início eram oito trabalhadores com majoração. Foi acordo, porque na altura era difícil convencer os trabalhadores para fim de semana, sabe porque lhe foi relatado assim.
Resulta da factualidade, designadamente do depoimento de FF e DD, que a majoração foi acordada com os trabalhadores que no iniciaram a atividade em causa aos fins de semana, um grupo de oito, o necessário para preenchimento de dois turnos de quatro elementos cada.
Já quanto à razão de ser dessa atribuição, nenhum dos intervenientes ou beneficiários diretos referiram a mesma. O DD referiu a circunstância, mas apenas entrou em 2012, e o FF referiu a questão porque ouviu dizer, foi-lhe transmitido. Que ocorreu acordo ocorreu, contudo da prova não resultam dados claros sobre o concreto circunstancialismo desse acordo e suas razões ou motivações, nem que tivesse sido um mecanismo criado pela EMP02... para motivar os trabalhadores, antes resultando que houve acordo com os trabalhadores, a apenas isso. Conforme resulta do depoimento do FF, quem fizesse horas nos períodos indicados, receberia igualmente a corresponde majoração.
Assim é de aditar o seguinte facto:
1. A remuneração adicional de 100% por trabalho prestado aos fins-de-semana pelo trabalhador CC foi acordado há mais de 17 anos (em 2002) entre a “EMP02..., S.A.” com o grupo inicial de trabalhadores, que passaram a exercer funções aos fins de semana, designadamente no horário referido em “I”.
Quanto ao mais mantém-se o decidido.
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- Não demonstração da natureza igual do trabalho em quantidade e qualidade / existência de fundamento razoável e racional para a diferenciação.
Os autores invocam descriminação salarial, por exercerem as mesmas funções de outros trabalhadores e no mesmo horário, recebendo de forma diferente com resultado em prejuízo monetário. Enquanto os autores recebem subsídio de turno, os trabalhadores que indicam recebem uma majoração de 100% por cada hora trabalhada ao fim de semana. Processo: 5088/23.3T8VNF.G1 Referência: ...72 ... - Tribunal da Relação Secção Social Largo João Franco ... ...: ...00 Fax: ...99 Mail: ..........@..... Apelações em processo comum e especial (2013)

O artigo 59º da CRP dispõe:
(Direitos dos trabalhadores)
1. Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito:
a) À retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna;

O princípio “trabalho igual salário igual”, constitui a concretização nesta sede do princípio da igualdade consagrado no artigo 13º da CRP, e encontra eco nos artigos 23º ss. e 270º do CT.
O normativo faz apelo a uma igualdade material, devendo tratar-se de igual modo o que é essencialmente igual e de forma desigual o que é desigual.
O que se pretende é impedir o abuso, o arbítrio, proibindo diferenciações sem justificação razoável e objetiva. Proíbe-se a discriminação.
Pode ocorrer diferenciação por exemplo baseada na produtividade e eficiência, nas habilitações, na antiguidade, de acordo com critérios objetivos controláveis.
Proíbe-se se retribua de maneira diferente trabalhadores nas mesmas condições, que com as mesmas habilitações, prestem trabalho da mesma natureza, com a mesma qualidade, quantidade, intensidade, dificuldade, penosidade e perigosidade.
Não se verificando no caso a inversão do ónus de prova, no quadro do disposto artigo 25º, 5 do CT, com referência ao artigo 24º, 1 do mesmo diploma. Compete ao autor, nos termos do artigo 342º, 1 do CC a prova dos factos constitutivos do seu direito.
No concreto caso, não se colocando o principio do tratamento igual para trabalho de igual valor (trabalho equivalente) – al. d) do artigo 23º do CT, mas para trabalho igual - al. c) do mesmo normativo, competia aos autores demonstrar a prestação do trabalho de manobradores de máquinas, em condições de igualdade com outros trabalhadores com igual “trabalho/funções”, nas três dimensões referenciadas na norma, “natureza, qualidade e quantidade”.
A recorrente refere que sobre a qualidade e quantidade nada foi referenciado em termos de factualidade pelos autores, mas não é assim.
Importa ter um critério interpretativo são, que não impeça e perturbe a realização da justiça material, importa evitar o refúgio em interpretações limitadoras, tento mais tratando-se de realidades que sendo embora apreensíveis pela observação não são de simples transcrição em factualidade. Tenha-se em linha de conta que em processo laboral, a matéria de facto relevante para a decisão da causa, ainda que não alegada, deve ser considerada, nos termos do art.º 72.º, ns.º 1 e 2, do CPT.
Volvendo à questão da invocada falta de alegação, importa que do alegado, tendo em conta a natureza especifica das tarefas e dos concretos postos de trabalho, e as regras normais da vida; que, “grosso modo”, se possa concluir, que o trabalho executado por uns e outros é igual na sua natureza qualidade e quantidade.
Relativamente aos conceitos de “natureza, qualidade e quantidade, referem Gomes Canotilho e Vital Moreira, “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Vol. I, Coimbra Editora 2007, pág. 772 referem que a norma:
“estabelece os princípios fundamentais a que deve obedecer o direito a uma justa retribuição do trabalho: (a) ela deve ser conforme à quantidade de trabalho (i. é, à sua duração e intensidade), à natureza do trabalho (i. é, tendo em conta a sua dificuldade, penosidade ou perigosidade) e à qualidade do trabalho (i. é, de acordo com as exigências em conhecimentos, prática e capacidade)”
Referenciando que, “pretendendo o trabalhador que seja reconhecida a violação do princípio “para trabalho igual, salário igual”, cabe-lhe alegar e provar que a diferenciação existente é injustificada em virtude de o trabalho por si prestado ser igual aos dos demais trabalhadores quanto à natureza, abrangendo esta a perigosidade, penosidade ou dificuldade; quanto à quantidade, aqui cabendo o volume, a intensidade e a duração; e, quanto à qualidade, compreendendo-se nesta os conhecimentos dos trabalhadores, a capacidade e a experiência que o trabalho exige, mas também, o zelo, a eficiência e produtividade do trabalhador”, Ac. RP de 13-02-2017, processo nº 10879/15.6T8VNG.P1, em DGSI.
Ora, os autores referem que cumpriam determinado horário, referenciando-o, igual ao dos trabalhado com que se comparam, descrevem as concretas tarefas que uns e outros faziam, o local onde uns e outros prestam a atividade, que é o mesmo, as instalações da EMP03... para quem a ré presta serviços de transporte e logística.
Tendo em conta a natureza das tarefas executadas, as concretas circunstâncias da sua execução alegadas e nos mesmos tempos horários, tem que concluir-se encontrar-se alegada factualidade suficiente.
E passando à verificação da existência ou não de descriminação, diga-se que da prova produzida se mostra demonstrado que o trabalho executado pelos autores é igual ao dos trabalhadores referenciados no ponto “J” da factualidade, em natureza qualidade e quantidade.
Assim, resulta que a prestação é efetuada no mesmo local e sob as mesmas condições, com os mesmos meios de trabalho, consistindo nas mesmíssimas tarefas, pelo que resulta que a perigosidade, penosidade ou dificuldade é a mesma.
Resulta igualmente e quanto à quantidade, que o trabalho é executado nos mesmos períodos horários, sujeito às mesmas condições. Nos respetivos turnos os autores prestam os serviços reclamados, desempenhando as funções “mediante as necessidades da ré empregadora, conforme factos “H” e “I”, decorrendo que, tendo em conta as regras normais de vida, é prestado em igualdade quanto ao volume e intensidade.
Quanto à qualidade, compreende-se nesta os conhecimentos dos trabalhadores, a capacidade e a experiência que o trabalho exige. Apela o requisito à formação do trabalhador, e ao zelo, eficiência e produtividade do mesmo.
Os autores invocaram ser “manobradores de máquinas” tal como os trabalhadores relativamente aos quais referem a ocorrência de descriminação salarial, tendo-se demostrado que cumprem as mesmas tarefas que aqueles, de acordo com as necessidades da empresa. No caso concreto e tendo em conta o tipo de funções e seu modo de execução – desempenho das tarefas solicitadas durante o tempo de serviço nas instalações da empresa para a qual a ré presta serviços (que resulta da factualidade “H” e “I”), tem que concluir-se que a eficiência e produtividade de uns e outros é semelhante.
Demonstrado que se mostra a ocorrência de trabalho igual e a existência de uma diferenciação salarial, competiria à ré demonstrar a verificação de uma circunstância racional e razoável justificativa da mesma.
Refere a ré a diferente antiguidade. Ora esta apenas pode fundar uma diferença salarial se efetivamente o for, passe a redundância. A antiguidade será fator legitimo se e na medida em que constitua medida vigente na empregadora, de aplicação universal devidamente parametrizada e conhecida. Sobre o assunto vd. Ac. do TRP de 19.12.2023, Processo nº 3715/21.6T8MTS.P1; RC de 10-03-2023, processo 229/21.8T8CLD.C1, RP de 22-03-2021, processo 2274/19.4T8VFR.P1 e RG de 16-04-2015, processo nº 103/14.4TTVCT.G1, onde se refere, “pode ocorrer diferenciação por exemplo baseada na produtividade e eficiência, nas habilitações, na antiguidade, de acordo com critérios objetivos controláveis.
Sabemos, até pelo teor da contestação, que não foram razões de antiguidade que determinaram a diferenciação em causa, pelo que a invocação improcede.
Quanto à motivação invocada refere-se na decisão recorrida:
“Acresce que, a justificação dada pela Ré para o tratamento discriminatório não foi dada como provada.
Porém, ainda que assim fosse, … o facto de, na data de admissão dos Autores, não existir a dificuldade em encontrar trabalhadores dispostos a laborar durante os fins de semana, não se afigura ser bastante para se poder concluir pela não violação da igualdade de retribuição, pois que a organização dos turnos (de fins de semana) afeta todos os trabalhadores, quer tenham sido abrangidos pelo referido acordo, quer tenham iniciado o trabalho posteriormente, incorrendo-se numa verdadeira discriminação salarial relativamente a trabalhadores colocados nos mesmos turnos, embora em momentos temporais distintos.”
O raciocínio efetuado na primeira instância surpreende e descarta a possibilidade de constituir fundamento de descriminação salarial, circunstância decorrente das meras condições e flutuações do mercado de trabalho – maior ou menor dificuldade em determinado momento, em arranjar determinados profissionais e para determinados horários ou locais de trabalho -. E, sem relevo embora ao caso, dada a não demonstração do motivo invocado, sempre se dirá que a permitir-se uma diferenciação decorrente das condições do mercado de trabalho em cada momento, abrir-se-ia uma caixa de pandora, que inutilizaria ou restringiria grandemente o sentido da norma constitucional. Isto sem embargo da eventual possibilidade de consideração, em caso da ocorrência de circunstâncias anómalas excecionais e imprevisíveis.
Consequentemente é de confirmar o decidido.
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DECISÃO:

Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente a apelação, confirmado a decisão.
Custas pela recorrente.
9-1-2025

Antero Veiga
Vera Sottomayor
Francisco Pereira