Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
121/20.3T8BCL.G1
Relator: ANTERO VEIGA
Descritores: FALTA INJUSTIFICADA
FALSAS DECLARAÇÕES
CERTIFICADO DE INCAPACIDADE TEMPORÁRIA
ATESTADO MÉDICO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/04/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
Para se concluir pelas falsas declarações sobre a justificação de faltas por motivo de incapacidade por doença, é necessário demonstrar a falsidade das declarações constantes do certificado de incapacidade e que o trabalhador falseou conscientemente a verdade dos factos tendo em vista iludir a empregadora.
A circunstância de o trabalhador incumprir os condicionamentos relativos à possibilidade de se ausentar do domicílio, constantes dos certificados de incapacidade, não implica por si só que o mesmo já esteja apto para o trabalho.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

J. L. intentou a presente especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, prevista no artigo 98º-B a 98º-P do Código de Processo de Trabalho, face ao despedimento de que foi alvo por parte da empregadora X – Correios, S.A..
Dado não ter sido possível obter a conciliação das partes foi então a empregadora notificada para apresentar articulado a motivar o despedimento.
A entidade empregadora veio apresentar o seu articulado a motivar o despedimento, pugnando pela licitude e regularidade do mesmo, juntando o procedimento disciplinar.
O trabalhador contestou, negando ter prestado falsas declarações e ter violado o dever de lealdade para com a ré, alegando que o seu comportamento, que parcialmente e objetivamente admite, não foi doloso, nem grave por si, nem nas suas consequências, nem suscetível de quebrar a confiança da ré, não se verificando uma impossibilidade da subsistência da relação laboral, pedindo que seja declarada a ilicitude do despedimento, com a condenação da ré na reintegração no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade e no pagamento do valor das retribuições que deixou de auferir desde 12/12/2019 até ao trânsito em julgado da decisão final; e deduziu pedido reconvencional pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de €6.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais causados pela ré, decorrentes da suspensão preventiva de que o autor foi alvo por parte da ré, violando a ré, dessa forma, o direito do autor à ocupação efetiva; e da sanção de despedimento que lhe foi aplicada.
A ré respondeu, nos termos de fls. 95-98 verso, pugnando pela regularidade e licitude do despedimento e pela improcedência do pedido reconvencional.
*
Realizado o julgamento foi proferida a seguinte sentença:
“Pelo exposto, julgo parcialmente procedente o pedido formulado e, consequentemente,
a. declaro ilícito o despedimento do autor promovido pela ré;
b. condeno a ré a reintegrar o autor sem prejuízo da sua categoria profissional e antiguidade;
c. condeno a ré a pagar ao autor o valor das retribuições vencidas desde 12/12/2019 até ao presente e, ainda, as vincendas até ao trânsito em julgado da decisão final, tendo por referência a retribuição de €1.060,07 (mil e sessenta euros e sete cêntimos), nos termos do artº 390º, nº 1 e 2 do Cód. Trabalho;
d. condeno a ré no pagamento de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, a contar da data do respetivo vencimento de cada uma das prestações até efetivo e integral pagamento (artigo 559.º, 804.º, 805.º e 806.º do Código Civil); e no mais, absolvo a ré do pedido.
Custas, na proporção do decaimento.
(…)
*
Inconformada a ré interpôs recurso apresentando as seguintes conclusões:

B- Com o presente recurso submete-se à apreciação de V. Exas, Venerandos Desembargadores a;
A. Impugnação da matéria de facto fixada na sentença, como provada, em II, ZZ, BBB, CCC, DDD, EEE, FFF, HHH, III, JJJ e NNN, por erro na apreciação da prova, com recurso à reapreciação da prova gravada.
B. Impugnação da matéria de facto não provada nos números 1),2),3),4),5) e 6), por erro na apreciação da prova, com recurso à reapreciação da prova gravada.
C. Apreciação de Direito, quanto à Justa Causa de Despedimento.

F- Impugnação do facto provado em II. No percurso aludido em HH, o autor tinha o carro de apoio para quando se sentisse cansado.
G- Na douta sentença “a quo”, para considerar tal matéria como provada foram os seguintes fundamentos:
“(…) A matéria apurada em HH, II e JJ – deslocação a Santiago de Compostela de bicicleta - resulta da expressa confissão do autor no seu articulado de contestação/reconvenção…
I- Não obstante os factos confessados, a referida matéria, ora impugnada, é controvertida, não cabendo no âmbito dos factos parcialmente confessados.

K- Quanto ao demais, tratando-se de matéria controvertida, necessariamente não lhe bastaria alegar que existia um carro de apoio para quando se sentisse cansado, termos em que erradamente ocorreu na sentença “a quo”.

M- Impugnação dos factos provado em ZZ e BBB
• ZZ. Em consequência do colapso pulmonar, o A. tinha dificuldades em respirar e necessitava de desenvolver a parte respiratória, sendo aconselhável a prática de exercício físico ao ar livre, para evitar uma embolia pulmonar e reforçar a sua recuperação.
• “BBB. Para a recuperação da parte pulmonar respiratória e psicológica era de extrema importância a atividade ao ar livre”.

O- Sempre se dirá que a douta fundamentação, lavrou em erro, porquanto apesar de ter ao seu alcance diversos elementos de prova, optou por não imprimir rigor ao decidido, ignorando elementos de prova para dar como provados os factos agora impugnados, em termos que não poderia fazer, porquanto inexistem elementos que possam levar às referidas conclusões.

R- A recuperação da parte pulmonar e respiratória tinham um plano delineado de cinesioterapia respiratória, feito numa fase inicial conforme explicado pelas Senhoras Enfermeiras, terapia que poderia ser realizada no exterior, sempre dependente das condições climatéricas, exercícios acompanhados pela Sra. Enfermeira C. C..

U- Impugnação dos Factos provados em CCC; DDD; EEE FFF e HHH,


X- Quanto aos factos provados em CCC e DDD, da prova testemunhal produzida não resulta que o Apelado não se sentisse bem por estar em casa incapacitado para o trabalho, ao contrário e como a própria fundamentação refere o que parece indubitável é que sendo o Autor sendo atleta de alta competição BTT, tendo sofrido um acidente que o afastou da prática desportiva, não se sentisse bem por estar incapacitado para a prática de BTT e quisesse voltar o mais rapidamente possível a estar nas mesmas condições físicas que tinha antes do acidente.

Z- Se na realidade fosse pretensão do Autor voltar rapidamente ao trabalho, em junho não faltaria aos tratamentos com a Enfermeira C. C., pelo que se faltava aos tratamentos para usufruir de momentos de lazer com os amigos, não se afigura razoável que ainda assim, que em erro a douta sentença tenha considerado nos referidos factos provados que tais saídas faziam parte dum plano de recuperação.

BB- Contrariamente ao decidido em EEE não foi com vista à manutenção da sua sanidade mental, nem para voltar mais rapidamente ao trabalho que se deslocou a Santiago de Compostela ou que fez a voltinha com os amigos a Espanha no dia 21 de junho, a sua amiga Enfermeira C. C., referiu o Autor que todos os anos se deslocava a Santiago de Compostela, com os seus amigos, o próprio declarou também que era a sua 10ª viagem, e que estava inserido num convívio …

FF- Os referidos depoimentos não foram convenientemente valorados, resultando dos mesmos contrariamente ao decidido, que o trabalhador se sentindo em condições físicas para fazer as deslocações imputadas e provadas, que envolviam grande esforço físico, as fez, não estando tais exercícios ou atividades integradas num plano de tratamentos físicos nem psicológicos.
GG- Pelo que, também com base na correta valoração das declarações prestadas pelo Dr. J. T. se terá de alcançar decisão contrária ao facto provado em HHH… porquanto não existe nenhum elemento de prova que permita concluir que no dia 16 de agosto o trabalhador se deslocou à praia próximo de sua casa para “respirar ar livre e dessa forma recuperar da parte pulmonar”, pelo contrário, a conclusão a que se pode chegar de acordo com prova já mencionada é que o trabalhador à semelhança dos demais dias, se deslocou à praia no âmbito das suas atividades de lazer, aproveitando-se do facto das suas ausências ao trabalho estarem justificadas pelos CIT emitidos.

II- Conforme declarações do médico ortopedista R. C., confirmadas por exame de 6 de julho, àquela data não existiam queixas nem lesões de assinalar, tendo alta formal de ortopedia em julho depois do resultado do referido exame, circunstância corroborada pela Enfermeira P. X. que declarou que em junho deixou de acompanhar o Autor que já se encontrava autónomo, e pela enfermeira C. C. que referiu ter-lhe dado alta dos tratamentos no fim de julho.
JJ- Forçoso será concluir que a 16 de agosto 2019, há muito tinham deixado de existir os pressupostos que deram origem à emissão dos Certificados de Incapacidade para o Trabalho, dos quais o trabalhador se aproveitou para usufruir de momentos de lazer e estender no tempo a sua ausência no Centro de Distribuição Postal de Chaves.
KK- Verificam-se incoerências na própria fundamentação ao considerar por um lado que tais “atividades” eram adequadas à sua recuperação, por outro, que “ o autor extravasou o âmbito das recomendações médicas, para a prática da atividade física em questão”, afirmando ainda que atendendo ao facto do Autor ser praticante desportivo de BTT, tais atividades foram afinal “realizadas no âmbito da vida privada e até de lazer (sem qualquer vínculo ou subordinação hierárquica, nem horários a cumprir- se o autor sentisse ter esgotado a sua resistência física, tinha o carro de apoio para descansar), concluindo: “se tais atividades extravasaram as prescrições médicas, não foram ainda assim prejudiciais ao processo de recuperação do autor, nem são demonstrativas que o autor se encontrava já nas datas indicadas, apto para o exercício da sua atividade profissional perante a ré”.
LL- Refere ainda a douta fundamentação certamente por lapso que o Dr. J. T., “ele próprio teria concedido autorização para o autor praticar exercício físico, dados os benefícios daí decorrentes para a sua recuperação funcional e para a parte psicológica.”
MM- Não obstante, do referido depoimento não se mostra possível retirar tal conclusão, pelo contrário, o mesmo refuta a pratica de exercício físico para as lesões do autor e quanto ao aspeto psicológico refere várias vezes, que nada havia a assinalar.
NN- Com este raciocínio, ao tentar estabelecer um nexo entre aquelas saídas não autorizadas do trabalhador e um plano de recuperação físico e psicológico a douta sentença lavrou em erro, não conseguindo retirar apoio para referida matéria provada, termos em que deverá a mesma ser anulada dos factos provados, nos termos já requeridos…
- Impugnação da matéria provada em III e JJJ

PP- Como fundamentação da referida matéria de facto provada, na sentença recorrida consta que: “A testemunha R. C., médico ortopedista aludiu ao rápido processo de recuperação do autor e ao período normal de cura para casos idênticos (por norma sempre superiores a 6 meses), às exigências e impacto que ocasiona para a consolidação óssea e risco de novas fraturas a condução de veículos motorizados (factos apurados em FFF, GGG,
III).”
QQ- Laborou em erro a douta sentença ao decidir conforme decidido quanto aos factos que se impugnam em III e JJJ, porquanto o referido médico ortopedista R. C. em nenhum momento das suas declarações referiu que o processo de recuperação em casos idênticos é superior a seis meses.
RR- Bem pelo contrário, nas suas declarações (transcritas dos minutos 00:03:13 a 00:04:29) resulta que a recuperação e consolidação óssea em média acontece em 6 a 8 semanas, explicando ainda que em julho, mais concretamente no dia 6, de acordo com o resultado de ressonância magnética prescrita no seguimento de queixas apresentadas pelo trabalhador em maio, já só havia lesões minor sem queixas de assinalar, podendo estar apto ao serviço, tendo alta médica e não hospitalar apenas por razões práticas de eventual necessidade de reabertura do processo.

UU- Impugnação da matéria de facto provada em NNN e não provada em 1)

XX- Não foram corretamente valoradas as declarações das Testemunhas P. L. …
NNN. porquanto é inquestionável que nem sempre é possível colmatar as ausências dos trabalhadores apenas com recurso a dobras dos giros, ou seja, dividindo o trabalho pelos demais trabalhadores, circunstância que apenas se poderia manter numa fase inicial, mas que em situações de ausência prolongada como as em apreço, necessariamente teriam de dar origem à realização de contrato a termo, conforme se demonstrou.

ZZ- O depoimento da testemunha P. F., responsável de área e responsável pela validação e pedido de contratos para colmatar situações de absentismo, foi bem claro e pormenorizado nas suas declarações, não só quanto aos problemas de gestão causados, mas também quanto ao tipo de contratos e ao número de contratos a termo realizados naquele período.

BBB- Assim, nos termos invocados, requer-se a V. Exas Venerandos Desembargadores a reapreciação da prova gravada da referida prova testemunhal com vista á sua correta valoração, declarações que aditadas ao provado em OO. deverá dar lugar ao constante da acusação, facto provado com a seguinte redação:
 Pelo menos no período assinalado, a ausência do trabalhador provocou problemas de gestão no CDP, implicando para a Ré necessidade de recorrer a dobras nos giros e ainda à contratação de um trabalhador (cujo conhecimento dos giros é inferior ao de um carteiro mais experiente)”
CCC- Impugnação da matéria de facto não provada nos números 2),3),4),5) e 6), por erro na apreciação da prova, com recurso à reapreciação da prova gravada. “Não resultaram provados os seguintes factos:

5) O trabalhador não podia deixar de conhecer o carater ilícito da sua conduta, assim como não podia deixar de desconhecer a falsidade das declarações que prestava, tendo a consciência de que ao encontrar-se em condições de fazer uma viagem de bicicleta de vários dias até Santiago de Compostela, com o inerente esforço físico que representa, também teria condições de retomar o serviço e retomar o serviço no Centro de Distribuição Postal onde estava afeto.
6) O trabalhador aproveitou-se dos certificados de incapacidade temporária para o trabalho que iam sendo emitidos para conseguir a satisfação dos seus próprios interesses pessoais, fazendo crer ao Empregador que se mantinha numa situação de incapacidade para o trabalho, que na realidade não existia.”

FFF- Relativamente aos factos não provados em 4), ignora factos que o próprio trabalhador confessa no seu articulado de contestação onde confessa o seguinte…

HHH- No próprio articulado de contestação, o trabalhador admite que sabia que os Certificados de Incapacidade para o Trabalho apenas lhe permitiam sair para consultas e tratamentos das 11h às 15h e das 18h às 21h, factos provados em FF e GG, mas não cumpriu por entender que não haviam razões que justificassem a sua permanência no domicílio nos períodos assinalados nos CIts.

JJJ- Quanto aos factos não provados em 3) e 6), conforme já aduzido na impugnação da matéria de facto provada em DDD, EEE e HHH, reiteram-se na sua totalidade os fundamentos e pedido de reapreciação da prova testemunhal, que não foi valorada para prova daqueles, tendo em conta que a contrario se debatem as mesmas questões, que respeitam concretamente às atividades provadas em HH, KK e MM, não estarem enquadradas no âmbito de nenhum tratamento físico ou psíquico do trabalhador.

NNN- Os fundamentos aduzidos na sentença entram em contradição com os factos não provados em 3) e 6), porquanto considera que tais atividades foram realizadas no âmbito da sua vida privada e de lazer, mas considera não provado que o trabalhador tenha agido de forma dolosa para obter para si próprio “momentos de lazer e satisfação pessoais, que incluem passeios de bicicleta e pelo menos uma ida à praia”.

PPP- Assim, tendo o trabalhador consciência que se encontrava apto a fazer viagens de bicicleta de vários dias até Santiago de Compostela, com o inerente esforço físico que isso representa, tinha consciência que também estava apto para retomar as suas funções no Centro de Distribuição Postal onde estava afeto, intenção chegou a demonstrar, tendo optado a final, por continuar ausente do centro de distribuição postal, pedindo ao seu médico de família a renovação dos certificados de incapacidade para o trabalho.

TTT- De 6 a 9 de junho ao encontrar-se em condições de fazer uma viagem de bicicleta de vários dias até Santiago de Compostela, e logo de seguida no dia 21 junho fazer mais um circuito de 174 quilómetros de bicicleta a Espanha com o inerente esforço físico que representa tal atividade desportiva, também teria condições de retomar o serviço o serviço no Centro de Distribuição Postal, mas ao invés disso, manteve-se ausente do Centro de Distribuição Postal, demonstrando plena consciência das falsas declarações que prestava quanto ao seu estado de saúde, porquanto deixaram de verificar-se os pressupostos que deram início á sua situação de baixa médica.

WWW- Nestes termos, demonstra-se que o trabalhador agia de forma livre e esclarecida não podendo deixar de conhecer o carater ilícito da sua conduta, assim como não podia deixar de desconhecer a falsidade das declarações que prestava.

YYY- As regras de experiência comum, impunham um processo cognitivo lógico, que conduzisse à extração de factos desconhecidos dos factos conhecidos, que não deixam lugar a qualquer tipo de dúvida relativa à atuação do Apelado.

AAAA- Sempre sem prescindir da requerida alteração da matéria de facto, a conclusão que se retira da prova constante dos autos é que o comportamento do Autor, de extrema gravidade, integra o conceito de infração disciplinar, objetiva e subjetiva (dolo direto), e compromete de forma irreversível a subsistência da relação laboral, constituindo justa causa de despedimento, nos termos do número 1, do artigo 351º do Código do Trabalho, pelo que se submete à apreciação de V. Exas, Venerandos Desembargadores, a verificação dos pressupostos necessários à verificação de justa causa de despedimento, consequentemente à declaração da licitude do despedimento, porquanto a conduta do Autor provada nos autos constitui a quebra irremediável da confiança da Ré naquele.
BBBB- De acordo com o preceituado no art.º 351º, n.º 1, do Código do Trabalho, constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.

DDDD- Nos autos, verifica-se comportamento imputável ao trabalhador, que atendendo à censurabilidade dos factos praticados e ao grau de culpa no seu cometimento – dolo direto - infração disciplinar, que pela sua gravidade e consequências, comprometeram de forma irreversível a subsistência da relação laboral constituindo justa causa de despedimento.
EEEE- O trabalhador entrega vários Certificados de Incapacidade Temporária para o Trabalho, fazendo crer ao seu Empregador- X- Correios S.A- Sociedade Aberta, que estava impossibilitado de prestar trabalho no Centro de Distribuição Postal de Chaves - ....
FFFF- Não obstante, de acordo com os factos publicados pelo próprio trabalhador nas redes sociais e provados nos presentes autos em HH; JJ; KK; LL; MM; NN, de 6 a 9 e 21 de junho e 16 de agosto de 2019, esteve ausente do seu domicílio naquelas datas e em algumas delas, para fora do próprio país.
GGGG- O comportamento provado, integra o conceito de infração disciplinar, nos termos retratados na doutrina e jurisprudência, encontrando-se presente o elemento objetivo porquanto o trabalhador presta falsas declarações ao Empregador sobre o seu estado de saúde e o elemento subjetivo, agindo de forma livre e esclarecida, com o intuito de justificar as faltas ao serviço ao abrigo duma justificação falsa, pelo menos no que concerne às datas assinaladas de 6 a 9; 21 de junho e 16 de agosto.

JJJJ- Fez uso dos referidos Certificados de Incapacidade Temporária para o Trabalho, que o consideram na situação de doença e incapaz para prestar trabalho no CDP ..., porquanto consciente das limitações que os mesmos continham quanto à autorização para saída do domicílio, ainda assim se ausentou fora dos horários e recomendações de tratamentos e consultas aí previstos, de forma a obter para si próprio momentos de lazer e satisfação pessoais.
KKKK- Agiu de forma dolosa porquanto, sendo praticante de bicicleta ao nível de competição- BTT – facto provado em YY., retomou a sua atividade desportiva, tendo a consciência de que ao encontrar-se em condições de fazer atividades de lazer exigentes, com percursos de vários quilómetros, com os inerentes riscos e esforços físicos que isso representa, também teria condições de retomar o serviço no Centro de Distribuição Postal de Chaves.
LLLL- O trabalhador conhecia o carater ilícito da sua conduta, uma vez que deixando de se verificar os pressupostos iniciais da emissão dos certificados de incapacidade para o trabalho, ainda assim optou por se manter ausente, comportamento violador o dever de assiduidade e o dever de lealdade por falsas declarações relativas à justificação de faltas.
MMMM- …violou, com dolo direto, o dever de comparecer ao serviço com assiduidade e o dever de lealdade por falsas declarações relativas à justificação de faltas, o que é gerador da quebra de confiança da Empresa no trabalhador, conforme disposto consignado na 1ª parte da alínea b) do nº 1 do art.º 128º e ainda na 1ª parte da alínea f) do n. º1 do art.º 128º do Código do Trabalho.


UUUU- Nos termos descritos e provados, está ferida a confiança naquele trabalhador, que encontrando-se ausente do Centro de Distribuição Postal, em alegada situação de doença, promove diversas atividades de lazer, publicando-as nas redes sociais, comportamento que prejudicou a gestão do Centro de Distribuição Postal, os próprios trabalhadores seus colegas que se viram sobrecarregados de trabalho, a qualidade do serviço prestado, consequentemente prejudicou os clientes e a própria empresa.
VVVV- Apesar da consequência daí resultante não ter necessariamente de se traduzir num prejuízo material, no caso em apreço a violação dos deveres apontados pôs em crise a constância da confiança enquanto elemento estruturante do contrato de trabalho, inquinando fatalmente o suporte psicológico em que assentava a relação com o Empregador, pelo que seria incomportável manter a continuidade do vínculo contratual.

YYYY- Face às circunstâncias do presente caso, perante a matéria de facto provada, o abalo da confiança naquele trabalhador, e a evidente dúvida sobre a sua idoneidade futura, não seria razoável exigir do empregador a subsistência da relação contratual, porquanto a continuidade da vinculação representaria (objetivamente) uma injusta imposição ao empregador.
*
O Exmº PGA deu parecer no sentido da improcedência.
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Factualidade:
A. O autor foi admitido nos quadros da ré com efeitos a 17 de novembro de 1999, tendo permanecido ao seu serviço até ao dia 12 de dezembro de 2019, data em que foi notificado da deliberação da Comissão Executiva DE109842019CE de 05-12-2019, que lhe aplicou a sanção disciplinar de despedimento sem indemnização ou compensação.
B. À data do despedimento, o trabalhador auferia as seguintes remunerações:
a) Vencimento base, €894,11;
b) Diuturnidades, €152,85
c) Diuturnidade especial, €13,11;
d) Subsídio de refeição por cada dia de trabalho, €9,01.
C. No âmbito da sua categoria de carteiro (CRT), o trabalhador desenvolvia a sua atividade no Centro de Distribuição Postal (…) Chaves.
D. Ao trabalhador, foi instaurado pela ré, processo disciplinar nº 20190351/AJD (doravante designado por PD), que culminou com seu despedimento, pelos factos constantes da nota de culpa a fls. 125 a 132 do Processo Disciplinar, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
E. O processo disciplinar aludido em D., teve origem num e-mail, datado de 26
de julho de 2019, remetido por P. F. - Diretor da Área de Operações Norte 6, dirigido à Assessoria Jurídico-Disciplinar, junto a fls. 2 e anexos de fls. 3 a 8 do PD, cujo teor se dá por reproduzido e que a seguir se transcreve:
“Boa tarde, O CRT J. L., Mec. ... do CDP ... Chaves está ausente por doença desde 18 de março de 2019 após ter sofrido uma queda de bicicleta num passeio. Sucede que o mesmo ainda se encontra de baixa conforme certificado de incapacidade presente em anexo. Solicito a vossa intervenção no seguimento de fotografias que o mesmo colocou no seu perfil do Facebook (Presente em anexo). O mesmo efetuou uma viagem a Santiago de Compostela no decorrer desta incapacidade para o trabalho.”
F. Considerando o descrito no e-mail referido em D., nos termos melhor descritos no Despacho de fls. 10 do PD de 05 de agosto de 2019, que se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais, a ré, através da Doutora L. T. – Diretora dos Serviços Jurídicos Laborais, determinou a abertura de procedimento disciplinar ao autor.
G. Foi nomeada Instrutora do processo a inspetora Dra. A. N..
H. No dia 19 de agosto de 2019, foi elaborado Relatório Preliminar, e proposta para apreciação deliberação e decisão da Comissão Executiva dos X - fls. 103 a 121 do PD, cujo teor se dá por reproduzido.
I. Por Despacho - DE06002019JL dos Serviços Jurídico Laborais de 27 de agosto de 2019, o trabalhador foi suspenso preventivamente de funções de carteiro no CDP ... Chaves, nos termos do disposto no nº 5, do artigo 329º do Código do Trabalho, por existirem indícios da pratica de factos ilícitos graves, tudo conforme fundamentos melhor constantes da proposta da RH/JL/AJD, que se dá por reproduzida para todos os efeitos legais, constante de fls. 147 do PD.
J. Suspensão da qual o trabalhador tomou conhecimento no dia 28 de agosto de 2019 (Cfr. fls. 147 do PD).
K. No dia 22 de agosto de 2019, por Despacho n.º DE07102019CE, a Comissão Executiva dos X, nos termos do disposto no nº1 e alínea f) do nº 2 do artº 351º do Código do Trabalho, em concordância com os fundamentos de facto e de direito da proposta dos Serviços Jurídico-Laborais-RH/JL, que considerou integralmente reproduzida, “deliberou manifestar a intenção de proceder ao despedimento do CRT (Carteiro) J. L., (nº mec....), colocado no Centro de Distribuição Postal ... Chaves, caso se confirmem os factos que lhe são imputados na competente Nota de Culpa que, de acordo com a sua descrição, constituem infração disciplinar grave, integrando o conceito de justa causa para despedimento nos termos do disposto no nº1 e alínea f) do nº 2 do artº 351º do Código do Trabalho.”.
L. No dia 27 de agosto de 2019, foi deduzia Nota de Culpa, contra o trabalhador, constante de fls. 125 a 131, com o teor que se transcreve:
“NOTA DE CULPA
A. N., inspetora, mandatada pelos X - Correios, SA – Sociedade Aberta, conforme Despacho de nomeação de 05.08.2019 da RH/JL-Serviços Jurídico-Laborais, Dr.ª L. T., deduz contra CRT J. L., nº mec. 0..., colocado no Centro de Distribuição Postal (CDP) ... chaves, a seguinte Nota de Culpa:
“ÚNICO
1. O arguido encontra-se afeto ao CDP ... Chaves com a função de carteiro e o horário de trabalho das 07:40 às 12:40 e das 13:40 às 16:28.
2. O arguido encontra-se ausente ao serviço, ininterruptamente, desde o dia 18.03.2019 até à presente data (2ª feira).
Para justificar a sua ausência ao serviço entregou diversos Certificados de Incapacidade Temporária para o Trabalho (adiante designado por CITT) por motivo de doença, conforme docs. que a seguir se discriminam:
· CITT com data de início de 16.03.2019 e data do termo 27.03.2019, emitido em 27.03.2019, pelo Dr. J. T., por motivo de doença natural incapacitante para a sua atividade profissional (conforme doc. a fls. 24 que se considera como integralmente reproduzido);
· CITT com data de início de 28.03.2019 e data do termo 26.04.2019, emitido em 01.04.2019, pela Dr.ª. S. P., a prorrogar o período de doença natural incapacitante para a sua atividade profissional (conforme doc. a fls. 25 que se considera como integralmente reproduzido);
· CITT com data de início de 27.04.2019 e data do termo 26.05.2019, emitido em 26.04.2019, pelo Dr. J. T., a prorrogar o período de doença natural incapacitante para a sua atividade profissional (conforme doc. a fls. 26 que se considera como integralmente reproduzido);
· CITT com data de início de 27.05.2019 e data do termo 25.06.2019, emitido em 27.05.2019, pelo Dr. J. T., a prorrogar o período de doença natural incapacitante para a sua atividade profissional (conforme doc. a fls. 27 que se considera como integralmente reproduzido);
· CITT com data de início de 26.06.2019 e data do termo 25.07.2019, emitido em 25.06.2019, pelo Dr. J. T., a prorrogar o período de doença natural incapacitante para a sua atividade profissional (conforme doc. a fls. 28 que se considera como integralmente reproduzido);
· CITT com data de início de 26.07.2019 e data do termo 24.08.2019, emitido em 25.07.2019, pelo Dr. J. T., a prorrogar o período de doença natural incapacitante para a sua atividade profissional (conforme doc. a fls. 29 que se considera como integralmente reproduzido).
3. Em todos os CITT supramencionados no campo destinado à permanência no domicílio consta o seguinte “O doente só pode ausentar-se do domicílio para tratamento. Em casos devidamente fundamentos o médico pode autorizar a ausentar-se no período das 11 às 15H e das 18 às 21H.”
E no campo destinado à Autorização de saída do domicílio, nos referidos CITT consta o seguinte:
· CITT com data de início de 16.03.2019 e data do termo 27.03.2019:
Autorização: tratamento (conforme doc. a fls. 24 que se considera como integralmente reproduzido);
· CITT com data de início de 28.03.2019 e data do termo 26.04.2019:
Autorização: consultas e tratamentos (conforme doc. a fls. 25 que se considera como integralmente reproduzido);
· CITT com data de início de 27.04.2019 e data do termo 26.05.2019:
Autorização: tratamento (conforme doc. a fls. 26 que se considera como integralmente reproduzido);
· CITT com data de início de 27.05.2019 e data do termo 25.06.2019:
Autorização: tratamento (conforme doc. a fls. 27 que se considera como integralmente reproduzido);
· CITT com data de início de 26.06.2019 e data do termo 25.07.2019:
Autorização: tratamento (conforme doc. a fls. 28 que se considera como integralmente reproduzido);
· CITT com data de início de 26.07.2019 e data do termo 24.08.2019:
Autorização: tratamento (conforme doc. a fls. 29 que se considera como integralmente reproduzido).
4. Não obstante o arguido se encontrar na alegada situação de doença e, por esse motivo, incapacitado de prestar a sua atividade profissional no CDP ... Chaves, só podendo ausentar-se do domicílio para tratamentos nos termos e horários supramencionados, sem estar autorizado para tal, pelo menos de 6 a 9 de junho de 2019, deslocou-se até Santiago de Compostela de bicicleta pelo caminho Francês, percorrendo no mínimo, cerca de 206 quilómetros de Fonferrada a Santiago de Compostela passando por diversas localidades como ... e ..., conforme documento sobre o caminho francês que consta nos autos e fotos inframencionadas.
5. No percurso foram tiradas diversas fotografias, publicadas na sua página da rede social Facebook – com perfil público, em nome de J. L., e em algumas delas, é possível ver o arguido, nos vários dias e etapas do percurso, conforme infra se passará a descrever e consta dos Printscreens anexos ao processo (conforme docs. de fls. 32 a 54 que se consideram como integralmente reproduzidos):
· No dia 7.06.2019 na sua página do facebook consta o post com o título “Ponferrada 06/06/2019” (fls. 32);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 7.06.2019 com “Ponferrada 06/06/2019”, na qual é possível visualizar na foto a data de 06.06.2019 (fls. 33);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 07.06.2019 com o título “De novo no caminho” (fls. 34);
· No dia 8.06.2019 na sua página do Facebook consta o post com o título “Pás do rei” (fls. 35);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 08.06.2019 com “Pás do rei”, na qual é possível visualizar na foto a data de 08.06.2019 (fls. 36);
· No dia 08.06.2019 na sua página do facebook consta o post com o título “Caminho Francês. Santiago 2019”, onde constam publicadas várias fotografias (fls. 37);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 09.06.2019, sendo possível visualizar na foto a data de 09.06.2019 (fls. 38);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 09.06.2019, sendo possível visualizar na foto a data de 09.06.2019 (fls. 39);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 08.06.2019, sendo possível visualizar na foto a data de 07.06.2019 (fls. 40);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 08.06.2019, sendo possível visualizar na foto a data de 08.06.2019 (fls. 41);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 09.06.2019, sendo possível visualizar na foto a data de 07.06.2019 (fls. 42);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 08.06.2019, sendo possível visualizar na foto a data de 07.06.2019 (fls. 43);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 08.06.2019, sendo possível visualizar na foto a data de 06.06.2019 (fls. 44);
· No dia 09.06.2019 na sua página do Facebook consta o post com o título “O destino onde todos querem chegar (de quem se mete a caminho) Na procura do que nunca se lá perdeu. Santiago 2019” (fls. 46);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 09.06.2019 com o título “O destino onde todos querem chegar (de quem se mete a caminho) Na procura do que nunca se lá perdeu. Santiago 2019”, sendo possível visualizar na foto a data de 09.06.2019 (fls. 47);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 09.06.2019 com o título “Não podia faltar a foto de grupo — com M. F..”, sendo possível visualizar na foto a data de 08.06.2019 e o arguido consta em segundo lugar conforme indica a seta a identificá-lo (fls. 48);
· No dia 09.06.2019 consta o post com o título “Caminhos de Santiago. um pouquinho do caminho Francês”, sendo possível visualizar o passaporte do caminho de Santiago (fls. 49);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 09.06.2019 com o título “Caminhos de Santiago. um pouquinho do caminho Francês”, sendo possível visualizar na foto a data de 09.06.2019 e nos comentários consta uma foto de grupo (fls. 50);
· No dia 09.06.2019 consta o post com o título “Prova evidente que chegamos todos a Catedral...”, onde consta um grupo de pessoas entre os quais consta o arguido na segunda posição da esquerda para a direita, conforme indica a seta a identificá-lo (fls. 51);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 09.06.2019 com o título “Prova evidente que chegamos todos a Catedral...”, onde é possível visualizar o arguido na segunda posição da esquerda para a direita, conforme indica a seta a identificá-lo (fls. 52);
. No dia 11.06.2019 consta o post com o título “A bici.. e apenas um meio de compartilhar o Caminho com os Amigos”, onde é possível visualizar um grupo de pessoas (fls. 53);
· Printscreen pormenorizado da fotografia publicada a 11.06.2019 com o título título “A bici.. e apenas um meio de compartilhar o Caminho com os Amigos”, sendo possível visualizar na foto a data de 08.06.2019 (fls. 54).
6. Ainda durante o período de doença, e por esse motivo, incapacitado de prestar a sua atividade profissional no CDP ... Chaves, sem estar autorizado para tal, no dia 21.06.2019 o arguido efetuou um passeio de bicicleta, tendo publicado na sua página da rede social Facebook (J. L.), cujo conteúdo é partilhado com: público, o seguinte:
a) No dia 21.06.2019 consta o post com o título “Voltinha com os amigos”, onde é possível visualizar o arguido na terceira posição da esquerda para a direita, conforme indica a seta a identificá-lo (fls. 55 que se considera como integralmente reproduzida);
b) Printscreen pormenorizado da foto publicada por C. R. a 21.06.2019 com o título “Voltinha com os amigos”, onde é possível visualizar o arguido na terceira posição da esquerda para a direita, conforme indica a seta a identificá-lo (fls. 56 que se considera como integralmente reproduzida);
7. No decurso do mesmo período de doença, e por esse motivo, incapacitado de prestar a sua atividade profissional no CDP ... Chaves, sem estar autorizado para tal, no dia 16.08.2019 o arguido publicou na sua página da rede social Facebook (J. L.), cujo conteúdo é partilhado com:
público, o seguinte:
No dia 16.08.2019 às 17:47 consta o post com o título “Vitamina D ”, onde é possível visualizar o arguido na praia e a data de 16.08.2019 e consta a mesma foto pormenorizada onde se visualiza a data de 16.08.2019 (fls. 98 e 99 que se consideram como integralmente reproduzidas).
8. O arguido apresentou os referidos CITT para fazer crer aos X que se encontrava na situação de doença, incapacitado para a realização do seu trabalho no CDP ... Chaves.
Mas, durante este período, em que a incapacidade lhe estava atribuída pelos diversos CITT só tendo autorização para sair do domicílio para tratamentos, nos termos assinalados das 11h às 15h e das 18h às 21h, assim não procedeu e deslocou-se de bicicleta para fazer o caminho até Santiago de Compostela (pelos menos de 6 a 9 de junho), efetuou uma volta de bicicleta (no dia 21.06.2019) e foi à praia (no dia 16.08.2019).
Deste modo, o arguido prestou falsas declarações relativamente à justificação da sua ausência nos dias supramencionados.
9. Pelo menos no período assinalado, a ausência do arguido provocou problemas de gestão no CDP, tendo havido necessidade de recorrer a dobras de giros e ainda à contratação de um trabalhador (cujo conhecimento dos giros é inferior ao de um carteiro mais experiente).
10. O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que este seu comportamento lhe estava vedado e que ao atuar nos moldes descritos, violava culposamente o dever de comparecer ao serviço com assiduidade e o dever de lealdade por falsas declarações relativas à justificação de faltas, consignados, respetivamente, na 1ª parte alínea b) do nº 1 do artº 128º e ainda na 1ª parte da alínea f) do nº 1 do artº 128º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 7/2009 de 12 de Fevereiro, tendo o trabalhador praticado infração disciplinar, que pela sua gravidade e consequências, compromete de forma irreversível a relação laboral constituindo justa causa de despedimento nos termos e ao abrigo do nº 1 e da alínea f) do nº 2 do art. 351º do mesmo Código do Trabalho.
11. Assim, dando cumprimento ao disposto no nº 1 do art.º 353º do Código do Trabalho e com os fundamentos invocados, se comunica que é intenção da Comissão Executiva dos X aplicar-lhe pena de despedimento, conforme DE07102019CE de 22-08-2019, porquanto se quebrou de forma irremediável a confiança necessária à subsistência da relação laboral.
12. Fixo ao arguido o prazo de 10 (dez) dias úteis, a contar da data em que receber cópia desta Nota de Culpa para, querendo, examinar o processo, deduzir a sua defesa e indicar prova, nos termos do disposto no nº 1 do art.º 355º do já citado Código do Trabalho.
Lisboa, 27 de agosto de 2019
A Instrutora A. N.”
M. No dia 27 de agosto de 2019, foi remetida ao trabalhador por meio de carta registada com aviso de receção - Registo Pessoal - ……….., Nota de Culpa, juntamente com o despacho da Comissão Executiva, - DE007102019CE de 22-08-2019, (Vd. fls.124 e 124v do Processo Disciplinar).
N. Nessa mesma data, a Nota de culpa deduzida contra o trabalhador e respetivo Despacho, foi igualmente remetida à Comissão de Trabalhadores, por carta registada com aviso de receção - ………….., em cumprimento com o disposto no nº 2 do artigo 353º do CT (Vd. fls. 133 e 133v do Processo Disciplinar).
O. O trabalhador foi regularmente notificado da Nota de Culpa no dia 28 de agosto de 2019.
P. A Nota de Culpa e respetivo Despacho, foi notificado à Comissão de Trabalhadores, no dia 28 de agosto de 2019 (Vd. fls. 152 do PD).
Q. Regularmente notificado o trabalhador, apresentou defesa, que deu entrada na Assessoria Jurídico-Laboral no dia, no dia 19 de setembro de 2019 (Vd. fls. 159 a 173 do PD).
R. Foram realizadas todas as diligências probatórias requeridas pelo trabalhador na Resposta à Nota de Culpa (Vd.fls.191 a 200 do PD).
S. Findas as diligências probatórias requeridas pelo trabalhador, a Sra. Inspetora, Dra. A. N., elaborou Relatório, no qual considerou provados os factos da acusação e propôs a aplicação ao trabalhador CRT J. L., nº mecanográfico ..., da sanção disciplinar de despedimento sem indemnização ou compensação (vd. fls. 202 a 244 do Processo Disciplinar).
T. No dia 18 de novembro de 2019, depois de realizado o competente contraditório e respetivo Relatório supramencionado, foi entregue à Comissão de trabalhadores, cópia integral do PD, para cumprimento do disposto no nº5 do artigo 356º do CT (Vd. fls.246 e 247 do PD).
U. A Comissão de Trabalhadores não decidiu não emitiu parecer (vd. fls.248 do PD).
V. A Comissão Executiva dos X, em concordância com os fundamentos de facto e direito contidos na proposta da RH/JL Serviços Jurídico Laborais, que considerou integralmente reproduzidos, deliberou por DE09842019CE de 5 de dezembro de 2019, aplicar ao trabalhador J. L. - CRT (carteiro) - nº mec.0... colocado no Centro de Distribuição Postal (CDP) ... Chaves, a sanção disciplinar de despedimento sem indemnização ou compensação, nos termos e ao abrigo do nº1 e alínea f) do nº 2 do art.351º do Código do Trabalho (Vd. Fls.262 do PD).
W. Foi comunicado ao trabalhador pelo DE09842019CE de 5 de dezembro de 2019, em concordância dos fundamentos de facto e de direito constantes da proposta da RH/JL Serviços Jurídico-Laborais, que lhe foi aplicada a sanção disciplinar de despedimento sem indemnização ou compensação, nos termos do nº1 e alínea f) do nº 2 do art.351º do CT.
X. Foi enviada ao trabalhador respetiva comunicação, Despacho e fundamentação (Fotocópia do relatório do Processo Disciplinar, do Parecer da Comissão de Trabalhadores Notificação e DE) remetida a 10 de dezembro de 2019, por meio de carta registada com aviso de receção (Registo Pessoal) com o nº ………, (Vd. fls. 270 do PD).
Y. O trabalhador foi notificado da aplicação da sanção disciplinar de despedimento no dia 12 de dezembro de 2019 (Vd. fls.271 do PD).
Z. A referida comunicação, foi igualmente remetida à Comissão de Trabalhadores dos X, no dia 10 de dezembro de 2019, por meio de carta registada com aviso de receção nº …….., por aquela recebida no dia 12 de dezembro de 2019 (Vd. Fls. 267, 267v e 268 do PD).
AA. A sanção de despedimento aplicada, respetivo Despacho e fundamentação, foi também comunicada à ilustre mandatária do trabalhador, Ex.ma Sra. Dra. A. O., remetida no dia 10 de dezembro de 2019, por carta registada com aviso de receção nº …….., (Vd. fls. 265, 265v e 266 do PD).
BB. Comunicação recebida por aquela, no dia 12 de dezembro de 2019, (Vd. fls. 266 do PD).
CC. O trabalhador J. L., à data dos factos apurados no âmbito do processo disciplinar encontrava-se afeto ao CDP ... Chaves, com a função de carteiro com horário de trabalho das 07:40 às 12:40 e das 13:40 às 16:28.
DD. O trabalhador esteve ausente ao serviço, ininterruptamente, desde o dia 18.03.2019, até ao dia 27 de agosto de 2019, conforme consta no mapa de assiduidade de fls. 15 a 18 do PD.
EE. Para justificar a sua ausência ao serviço entregou ao Empregador, diversos Certificados de Incapacidade Temporária para o Trabalho (adiante designado por CITT) por motivo de doença, conforme docs. que a seguir se discriminam:
· CITT com data de início de 16.03.2019 e data do termo 27.03.2019, emitido em 27.03.2019, pelo Dr. J. T., por motivo de doença natural incapacitante para a sua atividade profissional (Cfr. doc. a fls. 24 do PD);
· CITT com data de início de 28.03.2019 e data do termo 26.04.2019, emitido em 01.04.2019, pela Dr.ª. S. P., a prorrogar o período de doença natural incapacitante para a sua atividade profissional (Cfr. doc. a fls. 25 do PD);
· CITT com data de início de 27.04.2019 e data do termo 26.05.2019, emitido em 26.04.2019, pelo Dr. J. T., a prorrogar o período de doença natural incapacitante para a sua atividade profissional (Cfr. doc. a fls. 26 do PD);
· CITT com data de início de 27.05.2019 e data do termo 25.06.2019, emitido em 27.05.2019, pelo Dr. J. T., a prorrogar o período de doença natural incapacitante para a sua atividade profissional (Cfr. doc. a fls. 27 do PD);
· CITT com data de início de 26.06.2019 e data do termo 25.07.2019, emitido em 25.06.2019, pelo Dr. J. T., a prorrogar o período de doença natural incapacitante para a sua atividade profissional (Cfr. doc. a fls. 28 do PD);
· CITT com data de início de 26.07.2019 e data do termo 24.08.2019, emitido em 25.07.2019, pelo Dr. J. T., a prorrogar o período de doença natural incapacitante para a sua atividade profissional (Cfr. doc. a fls. 29 do PD), documentos que se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.
FF. Nos documentos - Certificados de Incapacidade Temporária para o Trabalho, CITT – aludidos em EE., no campo destinado à PERMANÊNCIA NO DOMICÍLIO, consta o seguinte:
“(Em caso de incapacidade por doença do beneficiário)
“O doente só pode ausentar-se do domicílio para tratamento. Em casos devidamente fundamentados o médico pode autorizar a ausência no período das 11 às 15H e das 18 às 21H.”.
GG. E no campo destinado à AUTORIZAÇÃO, consta o seguinte:
· CITT com data de início de 16.03.2019 e data do termo 27.03.2019: AUTORIZAÇÃO: tratamento (Cfr. doc. de fls. 24 do PD);
· CITT com data de início de 28.03.2019 e data do termo 26.04.2019: AUTORIZAÇÃO: consultas e tratamentos (Cfr.doc de fls. 25 do PD);
· CITT com data de início de 27.04.2019 e data do termo 26.05.2019: AUTORIZAÇÃO: tratamento (Cfr.doc de fls. 26 do PD);
· CITT com data de início de 27.05.2019 e data do termo 25.06.2019: AUTORIZAÇÃO: tratamento (Cfr.doc de fls. 27 do PD);
· CITT com data de início de 26.06.2019 e data do termo 25.07.2019: AUTORIZAÇÃO: tratamento (Cfr.doc de fls. 28 do PD);
· CITT com data de início de 26.07.2019 e data do termo 24.08.2019: AUTORIZAÇÃO: tratamento (Cfr.doc de fls. 29 do PD);
HH. Pelo menos de 6 a 9 de junho de 2019, o trabalhador deslocou-se de bicicleta até Santiago de Compostela, pelo caminho Francês, com cerca de 206 quilómetros, de Ponferrada a Santiago de Compostela, passando por diversas localidades como ... e ....
II. No percurso aludido em HH., o autor tinha o carro de apoio para quando se sentisse cansado.
JJ. No percurso aludido em HH., o trabalhador fez o registo fotográfico e postou algumas dessas fotos na sua página da rede social Facebook - com perfil público, em nome do trabalhador J. L..
KK. No dia 21/06/2019, o trabalhador CRT J. L., realizou um passeio de bicicleta, LL. e publicou na sua página da rede social Facebook - com perfil público (J. L.), o post com o título “Voltinha com os amigos” e foto publicada por C. R. a 21/06/2019.
MM. No dia 16/08/2019, o trabalhador J. L. foi à praia,
NN. E publicou na sua página da rede social Facebook (J. L.), cujo conteúdo é partilhado com: público, a publicação constante de fls 98 do PD, cujo teor se dá por reproduzido, cujo teor se dá por reproduzido, intitulada “Vitamina D …”
OO. A ausência do trabalhador implicou para a ré necessidade de recorrer a dobras de giros.
PP. O autor sofreu um acidente no dia 16/03/2019, tendo sido atendido no Serviço de Urgência pela especialidade de cirurgia geral, no Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro, E.P.E./Hospital Distrital de …, tendo realizado diversos exames médicos.
QQ. Em consequência do acidente aludido em PP, o autor sofreu múltiplos traumas, nomeadamente fraturou várias costelas, omoplata e clavícula,
RR. Sofreu ainda colapso pulmonar – hemopneumotórax – tendo estado em risco de vida.
SS. O A. esteve internado naquele Centro Hospitalar entre 16/03/2019 a 27/03/2019.
TT. Vários amigos e inclusivamente colegas de trabalho do A. visitaram-no durante o período de internamento.
UU. O A. foi acompanhado no Centro Hospitalar pelo médico ortopedista, Dr. R. C., e pelo médico Cirurgião Dr. J. N., inclusivamente, nas várias consultas externas que tinha após o internamento.
VV. O A. realizou diversos exames médicos e consultas externas durante todo o período de incapacidade para o trabalho.
WW. Aquando da alta do internamento (em 27/03/2019), o A. regressou a casa, com indicações de tratamentos e exercício físico que deveria realizar para a sua recuperação.
XX. Durante o período de recuperação, em casa, o A. foi acompanhado pelas enfermeiras de reabilitação C. C. e P. X., que prescreveram ao autor a prática de exercício físico.
YY. O A. pratica bicicleta a nível de competição – BTT.
ZZ. Alterado.
Em consequência do colapso pulmonar, o A. tinha dificuldades em respirar e necessitava de desenvolver a parte respiratória, sendo aconselhável para a sua recuperação a prática de exercício físico ao ar livre.
AAA. O A. apresentava lesões apenas nos membros superiores e não inferiores e não estava numa situação de imobilidade.
BBB. Alterado.
Para a recuperação da parte pulmonar, respiratória e psicológica era importante a atividade ao ar livre.
CCC. O A. não se sentia psicologicamente bem, pelo facto de estar em casa e incapacitado para o trabalho.
DDD. e pretendia recuperar o mais rapidamente possível.
EEE. Com esse objetivo e para manter a sua sanidade mental, realizou a deslocação até Santiago de Compostela.
FFF. Eliminado.
GGG. A condução de um motociclo, sobretudo devido ao seu peso, implica um risco para a consolidação óssea ou até o risco de novas fraturas.
HHH. No dia 16/08/2019 o autor deslocou-se à praia próximo da sua casa na perspetiva de respirar ao ar livre e assim ajudar à recuperação da parte pulmonar.
III. Alterado.
Atendendo ao acidente que o A. sofreu e ao seu estado de saúde, com as sequelas que daí advieram, a recuperação do A. e o seu regresso ao trabalho em menos de 6 meses, foi rápida.
JJJ. Em casos médicos do tipo do sofrido pelo autor, é normal a recuperação demorar mais de 6 meses.
KKK. O A. foi submetido a 2 comissões de verificação de incapacidades, por iniciativa da segurança social, em 15/04/2019 e 09/07/2019 (esta última após a deslocação a Santiago de Compostela) tendo as mesmas determinado a subsistência da capacidade temporária para o trabalho do A.
LLL. Em 26 de agosto de 2019, o A. apresentou-se ao trabalho,
MMM. antes de ter alta médica da especialidade de ortopedia.
NNN. Na situação de ausência de trabalhadores da ré, outros trabalhadores asseguram o trabalho daquele, fazendo-se dobras dos giros, ou seja, dividindo trabalho em causa pelos restantes trabalhadores.
OOO. O A. tem um percurso profissional marcado pelo zelo e diligência ao longo de 25 anos de serviço.
PPP. O A. é assíduo e pontual.
QQQ. O trabalhador é dedicado e empenhado no seu trabalho.
RRR. A suspensão preventiva e o despedimento provocaram sofrimento e angústia ao A.
SSS. Sentindo-se humilhado e incompreendido.
TTT. O que lhe causou ansiedade e nervosismo.
*
Não resultaram provados os seguintes factos:
1) Devido à ausência do trabalhador a ré teve necessidade de recorrer à contratação de um trabalhador.
2) O trabalhador atuou de forma voluntária, livre e esclarecida, sob a forma culposa, bem sabendo que o seu comportamento era ilícito e que violava o dever de comparecer ao serviço com assiduidade e o dever de lealdade por falsas declarações relativas à justificação das faltas a que estava vinculado no âmbito do seu contrato de trabalho.
3) Agiu de forma dolosa para obter para si próprio momentos de lazer e satisfação pessoais, que incluem passeios de bicicleta e pelo menos uma ida à praia, fazendo uso dos Certificados de Incapacidade Temporária para o Trabalho que o consideram na situação de doença e incapaz para prestar trabalho no CDP ....
4) O trabalhador não podia deixar de ter a necessária consciência de que os CITs só lhe permitiam sair de casa para efetuar tratamentos e consultas, nos períodos horários devidamente assinalados, não obstante, não só saiu de casa, com se ausentou do país durante vários dias, comportamento que não tem qualquer enquadramento na referida autorização.
5) O trabalhador não podia deixar de conhecer o carater ilícito da sua conduta, assim como não podia deixar de desconhecer a falsidade das declarações que prestava, tendo a consciência de que ao encontrar-se em condições de fazer uma viagem de bicicleta de vários dias até Santiago de Compostela, com o inerente esforço físico que representa, também teria condições de retomar o serviço e retomar o serviço no Centro de Distribuição Postal onde estava afeto.
6) O trabalhador aproveitou-se dos certificados de incapacidade temporária para o trabalho que iam sendo emitidos para conseguir a satisfação dos seus próprios interesses pessoais, fazendo crer ao Empregador que se mantinha numa situação de incapacidade para o trabalho, que na realidade não existia.
***
Conhecendo do recurso:
Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente.
- Impugnação da matéria de facto fixada na sentença, como provada, em II, ZZ, BBB, CCC, DDD, EEE, FFF, HHH, III, JJJ NNN, por erro na apreciação da prova, com recurso à reapreciação da prova gravada.
- Impugnação da matéria de facto não provada nos números 1),2),3),4),5) e 6).
- Justa causa de despedimento.
***
Factos questionados:
(…)
***
Quanto à justa causa de despedimento:
Nos termos do artigo 351º do Cód. do Trabalho, "1- Constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.”
O nº 2 do mesmo artigo enumera alguns dos comportamentos que poderão ser tidos como justa causa de despedimento. Tal enumeração é exemplificativa, não dispensando a prova dos requisitos consagrados no nº 1 do normativo.
O comportamento deve assumir uma gravidada tal que seja impossível a manutenção da relação de trabalho, e é, que, segundo as regras da boa-fé, não seja exigível do empregador a manutenção da relação de trabalho, só devendo aplicar-se a pena máxima quando outra não baste para "sanar a crise contratual aberta pelo comportamento desviante do trabalhador".
A impossibilidade de subsistência da relação laboral há de resultar da repercussão do comportamento do trabalhador no futuro da relação.
Na apreciação da inexigibilidade da manutenção do vínculo laboral, deve atender-se ao comando do nº 3 do artigo 351º.
Apenas deve optar-se pelo despedimento quando num juízo de prognose sobre a viabilidade da manutenção do vínculo, ponderando-se todas as circunstâncias envolventes e os interesses em jogo, se concluir que a permanência do contrato constitui, de um ponto de vista objetivo, uma insuportável e injusta imposição ao empregador. Tal ocorrerá quando a manutenção do vínculo fere de forma inaceitável a sensibilidade e liberdade psicológica do empregador, não considerando a especial sensibilidade do concreto empregador, mas sim a de uma pessoa normal colocada na posição deste.
No PD a ré sustentou o despedimento no incumprimento do dever de comparecer ao serviço, falsas declarações, violação do dever de lealdade por falsas declarações relativas à justificação das faltas – 1ª parta da al. b) do nº 1 do artº 128º do CT e 1ªparte da al. f) do nº 1 do mesmo artigo e 351, nº 1, e al. f) do nº 2 -.

Referem os artigos 248º e 249º do CT:

Artigo 248.º
Noção de falta
1 - Considera-se falta a ausência de trabalhador do local em que devia desempenhar a atividade durante o período normal de trabalho diário.


Artigo 249.º
Tipos de falta
1 - A falta pode ser justificada ou injustificada.
2 - São consideradas faltas justificadas:

d) A motivada por impossibilidade de prestar trabalho devido a facto não imputável ao trabalhador, nomeadamente observância de prescrição médica no seguimento de recurso a técnica de procriação medicamente assistida, doença, acidente ou cumprimento de obrigação legal;

3 - É considerada injustificada qualquer falta não prevista no número anterior.

Por sua vez o artigo 254º do CT refere:
Prova de motivo justificativo de falta

2 ‐ A prova da situação de doença do trabalhador é feita por declaração de estabelecimento hospitalar, ou centro de saúde ou ainda por atestado médico.
3 ‐ A situação de doença referida no número anterior pode ser verificada por médico, nos termos previstos em legislação específica.
4 ‐ A apresentação ao empregador de declaração médica com intuito fraudulento constitui falsa declaração para efeitos de justa causa de despedimento.
5 ‐ O incumprimento de obrigação prevista nos n.ºs 1 ou 2, ou a oposição, sem motivo atendível, à verificação da doença a que se refere o n.º 3 determina que a ausência seja considerada injustificada.

No caso não vem provado que o autor não estivesse efetivamente incapacitado, antes resultando que se encontrava ainda em fase de recuperação. Não vem demonstrado intuito fraudulento por parte do autor.
Não resulta dos factos que o autor tenha faltado ao trabalho por razões não legalmente invocáveis (no caso, doença); que tenha justificado as faltas com recurso a provas que sabia serem falsas; e que tudo tenha perpetrado com consciência e com o objetivo de enganar a empregadora levando-a a justificar as faltas. Os documentos apresentados são os que nos termos legais são aptos a demonstrar a incapacidade, não resultando da prova a falsidade do seu conteúdo.
A ré, se tinha dúvidas quanto à incapacidade do autor, tanto mais tendo em conta a gravidade do sinistro por este sofrido, sempre poderia nos termos do nº 3 do artigo 254º do CT mandar verificar a situação – conforme Lei 105/2009 de 14/9, artigos 17ss.

Em tal caso, a deliberação da comissão de verificação de incapacidade temporária (CVIT) da segurança social produziria efeitos no âmbito da relação laboral, conforme artigo 17º, nº 3, que refere:

“A deliberação da CVIT realizada a requerimento do empregador produz efeitos no âmbito da relação jurídica prestacional do sistema de segurança social de que o trabalhador é titular”.

Assim, e porque não está em causa o incumprimento por parte do autor dos condicionamentos médicos impostos nos CITTs, questão que escapa à relação laboral, estando em causa tão só saber se o trabalhador estava apto a trabalhar ou não, e se consequentemente se aproveitou dos CITTs para prolongar as suas faltas, prestando falsas declarações, em face da prova não pode senão proceder a ação. O incumprimento dos condicionalismos referidos nos CITTs poderia revestir interesse se demonstrado que do incumprimento culposo resultou agravamento da situação e prolongamento da situação de incapacidade, o que não resultou da prova.
Diferente seria se o trabalhador tivesse por exemplo desempenhado funções para outra entidade, já que de tal facto resultaria claro que o trabalhador se considera apto para o trabalho, o que, ainda que tal não correspondesse à realidade, e a incapacidade persistisse, sempre constituiria uma falta de lealdade para com a sua entidade empregadora. Consequentemente, por estas e demais razões constantes da decisão recorrida é de confirmar a mesma.

DECISÃO:

Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão.
Custas pela recorrente
4/11/21

Antero Veiga
Alda Martins
Vera Sottomayor