Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | SUSANA RAQUEL SOUSA PEREIRA | ||
Descritores: | CONTRATO DE MANDATO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 01/23/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | APELAÇÃO IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 1ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | I- Para que a prova produzida num processo possa ser valorada em processo distinto daquele em que foi produzida, torna-se necessário que naquele primeiro processo a prova tenha sido produzida com audiência contraditória, ou seja, que tenha sido concedido à parte adversa daquela que propôs o meio de prova, a possibilidade de intervir nos atos de preparação e produção de prova, por si ou representada por advogado, mediante a sua convocação para esses atos instrutórios. II- Se dos autos de inquirição e de interrogatório extraídos de um processo de inquérito não resulta que aos ora réus, contra quem essa mesma prova é indicada, tenha sido dada a faculdade de exercerem o respetivo contraditório quanto à admissão e produção de tais atos instrutórios e probatórios, não podem os depoimentos constantes daqueles autos ser valorados para efeitos de prova, no presente processo. III- Já as cartas escritas inseridas naquela certidão judicial, cuja cópia (particular) se encontra junta aos autos, têm a força probatória dos documentos originais, por não ter sido deduzida a desconformidade das fotocópias com os respetivos originais (cf. artigo 368.º do Código Civil e artigos 444.º e 445.º do Código de Processo Civil). IV- Em sede de julgamento de facto o juiz apenas se deve pronunciar (julgando-a como provado ou não provada) quanto à matéria de facto, e dentro desta apenas deve julgar provados ou não provados os factos essenciais integrativos da causa de pedir que tenham sido alegados pelo autor na petição inicial e das exceções que tenham sido alegadas pelas partes na contestação, na réplica, no início da audiência prévia ou no início da audiência final (consoante o momento temporal acima já enunciado em que ocorra a sua alegação), assim como os factos complementares que, ainda que não alegados, resultem da instrução da causa e em relação aos quais as partes tenha tido oportunidade de se pronunciar. V- Apenas os factos concretos podem integrar o elenco dos factos provados, devendo considerar-se como não escritas as respostas do julgador que não consubstanciem factos materiais, mas que versem sobre matéria qualificada como de direito (com exceção dos conceitos jurídicos geralmente conhecidos e utilizados na linguagem comum, desde que não integrem o objeto do processo); sendo de equiparar às conclusões de direito, por analogia, as conclusões de facto, isto é, os juízos de valor, em si não jurídicos, emitidos a partir dos factos provados. VI- A Relação só deve alterar a matéria de facto, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, nos casos em que os elementos constantes dos autos imponham inequivocamente (em termos de convicção autónoma) uma decisão diversa da que foi dada pela 1ª instância. VII- Impugnada a decisão relativa à matéria de facto, o Tribunal da Relação, se for esse o sentido da sua reapreciação/convicção, deve alterar os pontos da matéria de facto indicados como incorretamente julgados e, deparando-se com contradições factuais produzidas pelas alterações por si introduzidas, deve alterar os pontos da matéria de facto (cuja reapreciação não foi requerida) que retratem tais contradições factuais. VIII- Não deve considerar-se como mandato o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar atos materiais, por não estar em causa a prática de atos jurídicos, estando-se perante uma prestação de serviços atípica (art.º 1154.º do Código Civil), à qual são extensivas, com as necessárias adaptações, as disposições sobre o mandato (art.º 1156.º do mesmo diploma). | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães no seguinte: I- RELATÓRIO BB, residente na Avenida ..., freguesia ..., concelho ..., intentou ação declarativa comum contra CC, residente no Lugar ..., ... ... – ..., DD, residente na rua ..., ... ... - ..., EE e mulher FF, residentes na Travessa ..., Lugar ..., ... ..., ... e GG, residente no Lugar ..., ... ..., ..., pedindo que se condenem os réus CC e DD a pagarem a quantia de € 90.000,00 ao autor, acrescida de juros vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento, ou que se condenem os réus HH e esposa FF a pagarem a quantia de € 90.000,00 ao autor, acrescida de juros vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento, ou que se condene o réu GG a pagar a quantia de € 90.000,00 ao autor, acrescida de juros vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento ou, ainda, que se condenem todos os réus, solidariamente, a pagarem a quantia de € 90.000,00 ao autor, acrescida de juros vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento. Alega o autor, em síntese, que, em 1995, adquiriu aos 3.ºs réus, por 3.920.000$00, um prédio composto por dois artigos urbanos e um rústico, situado em ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...17, prédio esse que pagou na totalidade aos 3.ºs réus, em prestações, e do qual passou a usufruir logo após o pagamento da 1ª prestação; não realizou a escritura pública do dito prédio; em ../../2002, foi detido no âmbito do processo n.º 225/02...., e pediu ao 1.º réu que colocasse o prédio à venda, dando-lhe indicações de como deveria realizar a venda do imóvel; a venda, pelo valor de € 90.000,00, foi realizada por escritura pública em 26 de abril de 2004, e o imóvel, que ainda se encontrava registado no nome dos 3.º réus, passou diretamente para o nome do novo comprador, o 4.º réu; pediu ao 1.º réu que guardasse o dinheiro com ele, até o autor sair em liberdade; quando saiu em liberdade, ficou a saber que o 1.º réu tinha entregue o dinheiro ao 2.º réu; após várias tentativas junto dos 1.º e 2.º réus, sem êxito, no sentido de recuperar o dinheiro, apresentou queixa contra os mesmos, que deu origem ao processo n.º 737/09...., que correu termos no Tribunal Judicial de Ponte de Lima, processo que foi arquivado por o tribunal entender tratar-se de uma desavença que deverá ser dirimida no foro civil; intentou uma ação especial de prestação de contas contra os 1.º e 2º réus, que deu origem ao processo n.º 406/16...., que correu termos no Tribunal Judicial de Ponte de Lima; em sede de recurso, o Tribunal da Relação de Guimarães entendeu que o processo especial de prestação de contas não é o adequado ao fim pretendido pelo autor. Conclui o autor que existiu um conluio entre os réus, que se aproveitaram das fragilidades daquele, por se encontrar detido, para dissiparem e se apoderarem do seu património. O 1.º réu contestou, por exceção, invocando a prescrição, o caso julgado e a ilegitimidade ativa e passiva, e por impugnação, concluindo pela procedência das exceções dilatórias invocadas e pela improcedência da ação. O 2.º réu contestou por exceção, invocando a ineptidão da petição inicial, a ilegitimidade ativa e passiva, o caso julgado, a prescrição do direito invocado pelo autor e a prescrição dos juros, e por impugnação, concluindo pela sua absolvição da instância e, subsidiariamente, pela improcedência da ação. Os 3.ºs réus contestaram por exceção, invocando e ineptidão da petição inicial, a ilegitimidade ativa e passiva, e a prescrição dos juros, e por impugnação, concluindo pela procedência das exceções invocadas e, caso assim não se entenda, pela improcedência da ação. O 4.º réu contestou, por exceção, invocando o incumprimento dos requisitos previstos nos artigos 2.º, n.º 2 e 5.º do Código de Processo Civil, e por impugnação, concluindo pela improcedência da ação quanto à sua pessoa. O autor pronunciou-se sobre a matéria excecional suscitada pelos réus, concluindo pela improcedência das exceções invocadas. Foi proferido despacho saneador no qual se julgou procedente a exceção dilatória de ineptidão suscitada pelos réus, por falta de causa de pedir, declarando-se nulo todo o processo e absolvendo-se os réus da instância – cf. artigos 186.º n.ºs 1 e 2, alínea a), 200.º, n.º 2, 577.º, al. b), 576.º, n.º 2, 578.º, 595.º, n.º 1, a), do Código de Processo Civil. Inconformado, o autor interpôs recurso do despacho saneador Por acórdão de 27.05.2021, o Tribunal da Relação de Guimarães revogou a decisão recorrida na parte em que julgou procedente a exceção de ineptidão da petição inicial relativamente aos 1.º e 2.º réus e os absolveu da instância; determinou o prosseguimento dos trâmites normais da ação, quanto aos 1.º e 2.º réus, mais determinando que fosse proferido despacho que convidasse o autor, entre o mais, a suprir as deficiências na exposição da matéria de facto quanto aos 1.º e 2.º réus, incluindo a delimitação do período temporal dos juros de mora reclamados e indicação da taxa aplicável, bem como a enunciação das razões de direito que servem de fundamento à ação. No mais, confirmou o despacho saneador recorrido (na parte em que julgou procedente a exceção de ineptidão da petição inicial relativamente aos 3.ºs e 4.º réus e os absolveu da instância). O Tribunal a quo, no que concerne aos factos imputados aos 1.º e 2.º réus, convidou o autor a sanar as insuficiências e imprecisões na exposição/concretização da matéria de facto alegada, ao abrigo do disposto no art.º 590.º, n.ºs 2, al. b) e 4, do Código de Processo Civil, incluindo a delimitação do período temporal dos reclamados juros de mora e indicação da taxa aplicável, bem como a suprir a deficiência do articulado da petição, no tocante à enunciação das razões de direito que servem de fundamento à ação. O autor respondeu ao convite que lhe foi dirigido, fundamentando a sua pretensão na celebração, com o 1.º réu, de um contrato de mandato e no seu incumprimento por parte do réu, bem como no enriquecimento sem causa dos 1.º e 2.º réus, à custa do autor, com a consequente obrigação de restituírem o montante indevidamente recebido, de € 90.000,00, concluindo o autor com o pedido de condenação dos 1.º e 2.º réus a pagarem-lhe a quantia de € 90.000,00, acrescidos de juros vencidos e vincendos, contados à taxa legal de 4 % desde a citação até integral e efetivo pagamento. O 1.º réu contestou excecionando a ineptidão da petição inicial, a prescrição, o caso julgado, a ilegitimidade ativa e passiva, e apresentando defesa por impugnação, concluindo pela procedência das exceções invocadas e pela improcedência da ação. O 2.º réu contestou excecionando a ineptidão da petição inicial, a ilegitimidade ativa e passiva, o caso julgado e a prescrição, e apresentou defesa por impugnação, concluindo pela sua absolvição da instância e, subsidiariamente, pela improcedência da ação. O autor pronunciou-se sobre a matéria excecional suscitada pelos réus, concluindo pela improcedência das exceções invocadas. Foi proferido despacho saneador no qual se julgou procedente a exceção dilatória de ineptidão suscitada pelos réus, por falta de causa de pedir, declarando-se nulo todo o processo e absolvendo-se os réus da instância – cf. artigos 186.º n.ºs 1 e 2, alínea a), 200.º, n.º 2, 577.º, al. b), 576.º, n.º 2, 578.º, 595.º, n.º 1, a), do Código de Processo Civil. Inconformado, o autor interpôs recurso, e por acórdão de 13.07.2022, o Tribunal da Relação de Guimarães revogou a decisão e determinou que os autos prosseguissem os seus regulares termos. Foi proferido saneador, que julgou improcedentes as exceções de prescrição e caso julgado, e de ilegitimidade ativa e passiva, fixou o objeto do litígio e elencou os temas de prova. Inconformados, os réus interpuseram recurso, o 1.º réu, na parte em que o Tribunal a quo julgou improcedente as exceções de prescrição e de ilegitimidade ativa, e o 2.º réu, na parte que o Tribunal a quo julgou improcedente a exceção de prescrição. Por acórdão de 30.03.2023, o Tribunal da Relação de Guimarães manteve a decisão recorrida quanto à arguição da exceção dilatória da ilegitimidade ativa do autor, que considerou parte legítima e revogou o despacho recorrido, no que diz respeito à exceção da prescrição, determinando que o conhecimento de tal questão fosse relegado para a sentença final. Realizou-se audiência final, e veio a ser proferida sentença que julgou a ação improcedente, por não provada, e absolveu os réus CC e DD dos pedidos contra os mesmos deduzidos. Não se conformando com o assim decidido, o autor interpôs o presente recurso, que foi admitido como apelação, a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes CONCLUSÕES: I. A sentença ora em recurso, enferma de erro na apreciação da prova produzida em audiência de julgamento e prova documental, nomeadamente a todos os factos dados como Não Provados, elencados nos números I a XIV e XXIII e XXIV e aos factos assentes dados como provados numerados pelo número 3), 13), 15), 30) e 31). II. Com efeito, os meios probatórios constantes do processo e da gravação dos depoimentos das testemunhas, impunham ao julgador decisão diversa da recorrida. III. A prova testemunhal e documental não permitia, como não permite, que o M.m Juiz recorrido dê como Não Provados os factos supra elencados. IV. Analisando as testemunhas e a certidão judicial, verifica-se que as cartas entregues nos autos no âmbito do processo crime foram entregues pelos Réus, logo os mesmos tiveram conhecimento das cartas, assim como do seu conteúdo. V. O Réu CC, cumpriu com o mencionado nas cartas, com a exceção de guardar o dinheiro, para quando o Autor saísse em liberdade, ou seja, colocou a placa no terreno, arranjou o vendedor e vendeu o terreno. VI. Pelo que dúvidas não restam que as cartas existem e forem entregues aos Réus e que algumas solicitações foram cumpridas na integra. VII. As testemunhas arroladas pelos Réus, e os próprios Réus vêm continuadamente em cada processo distinto trazerem sempre uma nova historia, não merecendo qualquer credibilidade e contrariando-se no que dizem nos processos. VIII. Foi feita prova suficiente que os Réus venderam o terreno, nomeadamente o “...”, referindo-se ao Réu o CC e que este iria guardar o dinheiro, conforme solicitado pelo Autor. IX. E mais o Réu CC no seu interrogatório no âmbito do processo crime esclareceu que recebia a correspondência do seu irmão e que se prontificou a ajudar na venda do terreno. X. O M.mo. Juiz recorrido deu como não provado os factos números em I a XIV e XXIII e XXIV, quando na nossa modesta opinião impunha resposta diferente, ou seja, ser considerado como Provado. XI. E deu como Provado os factos numerados pelo número 3), 13), 15), 30) e 31), quando na nossa modesta opinião deveriam ser dados como não provados. XII. o M.mo Juiz recorrido simplesmente ignorou os depoimentos das testemunhas arroladas, e a certidão judicial junto aos autos que contêm as cartas e os depoimentos no âmbito do processo crime. XIII. Na nossa modesta opinião, há um manifesto equívoco do M.mo Juiz recorrido na apreciação da prova acima relatada! XIV. Foi violado o art. º 1157 e 798º do Código Civil, ao não reconhecer o mandato por parte do Réu CC. XV. O mandato, é quando o mandatário fica constituído num dever, na obrigação de praticar um ato ou mais por conta do mandante. XVI. O Autor solicitou por cartas escritas, ao Réu CC que o mesmo vendesse o terreno em questão nos autos, mencionou como Réu havia de efetuar o negócio, por sua vez o Réu colocou uma placa no terreno, o Réu prontificou-se a ajudar o Autor na venda do terreno, o Réu compareceu no ato da escritura do terreno, segundo o depoimento de II, comprador do terreno no âmbito do processo crime, o montante de 50.000 EUR foi entregue ao Réu CC. XVII. A eventual falta de cumprimento do mandato, por parte do mandatário, quer seja com representação quer seja sem representação, gera responsabilidade civil contratual nos termos do artigo 798º e seguintes do Código Civil. “O devedor que falte culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor.” XVIII. Pelo que, a ação deveria ter sido procedente Assim decidindo, Exmos. Senhores Juízes Desembargadores, farão Vossas Excelências a devida JUSTIÇA!!! Foram apresentadas contra-alegações, formulando o réu CC, a final, as seguintes CONCLUSÕES A. Inconformado com a douta sentença veio o Autor recorrer do aresto da primeira instância, defendendo nas suas alegações de recurso, o que citamos: “(…) que foi violado o art. º 1157 e 798º do Código Civil, ao não reconhecer o mandato por parte do Réu CC.” B. O Autor, nas suas alegações, abandonou o pedido de enriquecimento sem causa que se encontra prescrito, pelo que, sobre o mesmo não incidirão as presentes contra-alegações. C. As alegações de recurso constituem mais uma tentativa por parte do Autor de procurar, a todo o custo e após vários processos não procedentes, extorquir ao seu irmão, 1º Réu, o único que tem património em seu nome, D. A este propósito, consideremos o testemunho: JJ, casado, Jubilado, Juiz Desembargador do Tribunal da Relação do Porto – Secção Cível, depoimento de 20/05/2024 que se encontra gravado no sistema de gravação digital – H@bilus Media Studio - das 15:13:37 às 15:53:16, mais concretamente dos 00:14m aos 00:16m e dos 00:38m aos 00:39m. e # KK, casada, médica, depoimento de 20/05/2024 que se encontra gravado no sistema de gravação digital – H@bilus Media Studio -, das 14:22:52 às 15:12:34, mais concretamente de 00:09m a 00:10m a 00:11m. E. Ademais, não é claro o que pretende o Autor das suas Alegações de recurso, dado que, em rigor para além de pugnar pela alteração da matéria de fato, não elabora um pedido propriamente dito, e as alegações não apresentam um pedido concreto dirigido ao Tribunal ad quem acerca do que deverá vir a ser a decisão do Tribunal Superior, independentemente de darem como provada ou não provada determinada matéria de fato e de que valor. Por isso, deverão as presentes alegações serem consideradas improcedentes por violarem o disposto no art. 639º, nº 2 al. a) do CPC dado que não é explícito o sentido em que, o recorrente, entende deveriam as normas jurídicas que constituem fundamento da decisão, deveriam ter sido interpretadas e aplicadas. F. O Autor parece pugnar pela condenação dos réus ao pagamento de € 90.000,00, sendo que este sequer é o valor da escritura do terreno que alega ser seu e pede a condenação ao pagamento de juros de 4% não mencionado, sequer, de quando a quando deverão ser contabilizados caso fossem devidos. G. O Autor pretende que se dê como provados os fatos de I a XIV e XXIII a XXIV da douta sentença e o réu CC considera que tais fatos devem ser dados não como provados, pelo que a douta sentença não merece censura. H. O Autor remete-se para os documentos juntos aos Autos, que foram impugnados pelos réus, designadamente, uma certidão judicial (DOC.4 da PI) que contém testemunhos prestados no âmbito de um outro processo, um processo crime, todos, sem que tenha ocorrido o devido contraditório. I. O documento 4 junto com a PI enquadra-se no âmbito do artigo 421º do CPC que diz respeito ao valor extraprocessual da prova, cabendo ao Autor que dela se pretende aproveitar, a quem incumbe o ónus de indicação da produção da prova extraprocessual, na parte que se pretende invocar no processo, e, de forma especificada, relativamente, aos Temas de Prova enunciados, ou na falta destes, aos factos fundamentos da acção, com indicação precisa dos depoimentos ou parte dos depoimentos e testemunhas que os produziram, à parte, ainda, incumbindo “formalizar” a apresentação da prova extraprocessual, nomeadamente, por via da junção de cópia certificada ou gravação das declarações em causa. J. O Autor não cumpriu os formalismos exigidos por lei para que seja admitido o valor extraprocessual da prova previsto no artigo 421º do CPC, devendo tais documentos serem desconsiderados. Aliás, em sede de produção de prova testemunhal sequer confrontou as testemunhas e as partes com tais documentos. K. Na verdade, sequer o Autor requereu certidão de documento autêntico das declarações que pretende ver transpostas para nova apreciação numa segunda ação (ALBERTO DOS REIS, CPCanot III cit., 345), apenas junta umas aparentes cópias não certificadas que seguem impugnadas e que não cumprem o formalismo exigido para que o Autor possa beneficiar do valor extraprocessual da prova. – Ac. TRP 15-Jul-2009/3981/07.0TVPRT.P1 (ANABELA SILVA DIAS). L. Quanto aos fatos não provados I, XII, XIII se o Autor pretendia lançar mão de um determinado valor quando saísse em liberdade, não venderia património no ano de 2004, antes, procuraria vendê-lo na data (ou próximo da data) em que fosse liberto – altura em que certamente os valores imobiliários estariam mais consentâneos com a realidade económico-financeira do país e mais próximo da sua liberdade, pelo que, é ilógica e inverosímil esta teria do Autor. A este propósito, vide o testemunho: # JJ, casado, Jubilado, Juiz Desembargador do Tribunal da Relação do Porto – Secção Cível, depoimento a 20/05/2024 que se encontra gravado no sistema de gravação digital – H@bilus Media Studio - das 15:13:37 às 15:53:16, mais concretamente de 00:11m a 00:13m e de 00:24m a 00:27m. M. O Autor nas suas alegações refere que esta testemunha afirmou que o dinheiro foi entregue pelo CC ao DD, o que não é consentâneo com o testemunho prestado pelo Sr. Desembargador. Esta referência na apelação do Autor é errónea, pelo que, deverá ser ouvido todo o testemunho do Sr. Desembargador de modo a comprovar que tal afirmação nunca foi proferida. N. Além disso, convém ter presente a matéria confessada pelo Autor em sede de julgamento na primeira sessão de julgamento: “Magistrada Judicial: [00:00:01] No que respeita, no que respeita à matéria da Contestação à PI aperfeiçoada, apresentada pelo Réu CC, o Autor, admitido apenas, vírgula, no que respeita ao artigo 117º, que o Réu DD geriu uma empresa da qual o Autor era sócio, vírgula, a partir do momento em que o mesmo foi detido, vírgula, o que foi feito por indicação da sua esposa, que, vírgula, à data, vírgula, representava os seus filhos, vírgula, também sócios da dita empresa, ponto. Relativamente ao teor do artigo 118º (Impercetível) que o seu irmão antes referido foi seu empregado até 1993 ou 1994, ponto. No que respeita à matéria da Contestação à PI aperfeiçoada apresentada pelo Réu DD, vírgula, o Autor referiu no que respeita ao artigo 56º que teve conhecimento em 2004 da celebração da escritura de compra e venda do prédio em causa, ponto. No que respeita ao artigo 72º voltou a referir a nomeação do Réu DD como gerente da sociedade nos termos acima já explicados. Ponto, parágrafo. Confessou ainda ao teor do artigo 86º precisando que, vírgula, em 2005, vírgula, veio para .... Ponto, parágrafo. Relativamente ao artigo 87º disse que o Réu (DD) apenas visitou regularmente em ..., ponto. No que concerne ao artigo 89º admitiu o seu teor embora precisando que tal não ocorria em todas as visitas, ponto. No que respeita ao artigo 92º referiu o Autor que as despesas eram pagas com dinheiro da empresa que era gerida pelo Réu (DD). Pronto, isto foi o que ele confessou. Agora temos que… (Impercetível).” – parênteses nosso. O. Acerca dos pontos I a XIV que o Autor pretende que se deem como provados, seria profícuo ouvirem-se integralmente os testemunhos de todas as testemunhas (quer do Autor, quer dos Réus) e as declarações de partes. Porém, mais concretamente: # KK, casada, médica, reside em ... – .... Prestou depoimento em 20/05/2024 que se encontra gravado no sistema de gravação digital – H@bilus Media Studio -, das 14:22:52 às 15:12:34, a ouvir de 00:06m a 00:7m e .# JJ, casado, Jubilado, Juiz Desembargador do Tribunal da Relação do Porto – Secção Cível depoimento a 20/05/2024 que se encontra gravado no sistema de gravação digital – H@bilus Media Studio - das 15:13:37 às 15:53:16, de 00:04m a 00:05m e as declarações de # CC, casado, funcionário público (é administrativo no Hospital ...), de 17/06/2024 que se encontram gravadas no sistema "Habilus Media Studio". das 14h.53.41 às 15h.18:23, mais concretamente de 00:12m a 00:13m. P. Os fatos dados como não provados de II a XI dizem respeito a todo o tema do Mandato que o Autor, a todo o custo pretende que seja dado como provado e o réu considera que não merecem censura. Q. Antes de mais, cumpre pautar que, ainda que exista uma ordem, um mandato, ainda assim, é necessário que haja a aceitação do mesmo, dado que não é uma declaração unilateral que produz efeitos, é antes um negócio bilateral receptício. R. Ora, como veremos, o réu CC, nunca aceitou praticar nenhum negócio jurídico em nome e representação do Autor nem nunca o praticou e ainda que o Autor queira provar que deu ordens expressas ao réu CC para vender um terreno em seu nome, o que o faz através de cartas que junta sem qualquer prova de envio e que foram oportunamente impugnadas, essas cartas apenas provam a ordem, não provam que o eventual destinatário dessas cartas tenha cumprido essas ordens. S. E mais inverosímil se torna a versão do Autor quanto à figura do mandato, se tivermos em linha de conta que, a proceder a versão do Autor, sequer foi realizado qualquer acto jurídico em nome e representação do mesmo. Isto porque, de acordo com a escritura pública realizada a 26/04/2004 as partes envolvidas no negócio jurídico em discussão nos presentes autos foram: o comprador, GG e os vendedores, EE e FF. Ora, o Autor não figurou nesse ato nem como vendedor, nem como comprador. T. Até porque, como já vimos, não tinha essa necessidade dado que um notário poderia ter ido ao estabelecimento prisional celebrar a escritura pública. U. Aquando da prisão do Autor em 2002, foi o Réu, DD, quem sempre apoiou o Autor nas suas questões patrimoniais e que assumiu a gestão dos negócios deste, com quem trabalhou durante 18 anos. V. Foi o Réu DD quem sempre tratou, sob instruções dadas pelo Autor em visitas ao estabelecimento prisional, da gestão da vida corrente empresarial que o Autor deixou em aberto quando foi preso e foi este Réu DD quem sempre recebeu o produto de vendas e outras receitas, da venda alegada pelo Autor, aplicando-o de acordo com os pedidos expressos do Autor. W. Sendo que, in casu, o réu CC limitou-se a pedido do seu irmão DD a colocar uma placa no terreno em questão a dizer: “VENDE-SE” e fê-lo, porque ao contrário do irmão co-réu, vivia mesmo perto do terreno em .... X. A este propósito leiam-se os testemunhas, # JJ, casado, Jubilado, Juiz Desembargador do Tribunal da Relação do Porto – Secção Cível, depoimento a 20/05/2024 que se encontra gravado no sistema de gravação digital – H@bilus Media Studio - das 15:13:37 às 15:53:16, mais concretamente, de 00:10m a 00:11m e de 00:16m a 00H18m e # KK, casada, médica, depoimento em 20/05/2024 que se encontra gravado no sistema de gravação digital – H@bilus Media Studio -, das 14:22:52 às 15:12:34, mais concretamente de 00:40:29m a 00:40:52 e de 00:08:00m a 00:08:46 e declarações do réu # CC, casado, funcionário público (é administrativo no Hospital ...), declarações em 17/06/2024 que se encontram gravadas no sistema "Habilus Media Studio". das 14h.53.41 às 15h.18:23, dos 00:02:55m a 00:03:17m e de 00:04:46m a 00:05:18m, 00:07:15m, 00:09:16m a 00:09:29m, de 00:10:20m a 00:11:43m, de 00:15:12m a 00:22:11m e # KK, casada, médica, reside em ... – .... Prestou depoimento em 20/05/2024 que se encontra gravado no sistema de gravação digital – H@bilus Media Studio -, das 00:03:01m a 00:09:22m. Atenção, Y. O co-réu, DD, veio exatamente corroborar o que havia sido pelo co-réu e todas as demais antecedentes testemunhas. Veio, aliás, CONFESSAR. Conforme declarações do co-réu : # DD, casado, motorista, declarações que se encontram gravadas no sistema "Habilus Media Studio". das 15h.19.25 às 15h.54:59 e que devem ser ouvidas de 00:03:00 a 00:11:43m e de 00:25:08m a 00:29:54m e de 00:36:10m a 00:36:31m. Z. As declarações de parte do co-réu DD, em confissão, não poderão jamais colidir e entrar em contradição com um aresto que determine exatamente o oposto do que foi expressa e conscientemente confessado pelo réu DD e que obriga a uma total absolvição do réu CC, porquanto, inexistiu mandato a este réu e a ter havido, foi exatamente ao irmão DD que confessa ter pedido ao CC para colocar a placa e que apenas foi esta a intervenção deste réu no negócio em discussão. AA. Também uma outra testemunha veio aos autos afirmar que na escritura de compra e venda do imóvel em discussão nunca esteve presente o réu CC e que nunca este o contatou no âmbito deste negócio, a ver: # LL, casado, mediador Imobiliário na reforma, depoimento em 20/05/2024 que se encontra gravado no sistema de gravação digital – H@bilus Media Studio -, das 10:34:59 às 10:50:25, a ouvir de 00:05:07m a 00:05:55m e de 00:06:34m a 00:07:47m. BB. Relativamente à testemunha arrolada pelo Autora, MM, divorciada, que prestou depoimento em 17/06/2024 que se encontra gravado no sistema de gravação digital – H@bilus Media Studio -, das 14:14:08 às 14:52:22 a mesma deverá ser totalmente desconsiderada para efeitos probatórios atentas as suas respostas altamente programadas e incoerentes e nesse sentido se pronunciou, aquando das instâncias, a M. Juiz do tribunal a quo. Sendo que, para tal, convida-se à audição integral do seu testemunho, dado que só a ouvindo será possível perceber a metalinguagem, as incoerências e o não-verbal utilizado que, não resulta suficientemente esclarecida numa mera transcrição. CC. Relativamente ao ponto 3 que deve ser mantido como provado, dir-se-á que, para além de todo o rol de testemunhas, foi o Autor quem acabou por reconhecer que foi com dinheiro da empresa que se comprou o terreno. Quanto aos fatos 13, 15, 19, 30 e 3, estes resultam provados, além do mais, como resultado da própria confissão do réu DD, pelo que, não merecem censura. DD. Outra decisão não poderá resultar senão a de que não houve mandato nem incumprimento do mesmo, devendo as alegações de recurso improcederem e o réu CC ser absolvido. Desde logo porque: a) sequer é perceptível qual o sentido da apelação do recorrente, b) a prova documental junta pelo Autor foi impugnada por não preencher os requisitos formais, designadamente, o art. 421º CPC quanto ao valor extraprocessual das provas e as cartas não têm registo de envio, c) o Autor não teve a virtualidade de fazer prova da propriedade do terreno; d) não teve a virtualidade de fazer prova do mandato sem representação ao réu CC; e) não teve a virtualidade de fazer prova de que o réu CC aceitou tal mandato; f) não teve a virtualidade de fazer prova de que o réu CC tinha obrigação de praticar um negócio jurídico em seu nome e representação, g) não teve a virtualidade de fazer prova de que o réu CC interveio no negócio jurídico em seu nome e representação; h) não teve a virtualidade de fazer prova de que o réu CC guardou o produto da venda; i) não teve a virtualidade de fazer prova de que tenha ficado empobrecido, j) não teve a virtualidade de fazer prova de que o réu CC ficou enriquecido; k) no negócio jurídico em causa o Autor sequer figura como representado em mandato; l) o réu CC não pode incumprir um mandato que não existe, desse alegado incumprimento, não poderá emergir qualquer responsabilidade civil contratual, m) o co-réu DD confessou expressamente que foi quem mediou o negócio e utilizou o produto da venda para fazer face a despesas segundo ordens do Autor, n) o co-réu DD declarou expressamente que o réu CC não interveio no negócio em discussão. Nestes termos, e demais de Direito que V. Exas., Ilustres Juízes Desembargadores, não deixaram de suprir, deve ser julgado totalmente improcedente o recurso interposto pelo Recorrente BB e, consequentemente, ser mantida a douta sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância que julgou totalmente improcedente a ação. E assim se faça justiça! * Formulando igualmente o réu DD, a final, as seguintes CONCLUSÕES 1 – É consabido que as conclusões que delimitam o objeto do recurso. 2 - O A., entende que se deverá dar por provado o mandato alegado, mandato esse que apenas diz hipoteticamente respeito ao 1º R. e não ao 2º R. ora Recorrido. 3 – À cautela, sempre se dirá que, em relação ao 2º R., bem andou o tribunal a quo quando sustenta não ter o A. feito prova dos requisitos relativos ao enriquecimento sem causa, nomeadamente que não resultou provado que o A. viu o seu património diminuído. 4 - Tal facto, absolutamente crucial, cremos, é retirado da própria boca do A., que na sessão de julgamento datada de 26 de junho de 2023 (ata com ref citius 50666769), confessou que o dinheiro usado para a compra do prédio não era seu, mas de uma empresa, denominada EMP01.... 5 - Por tal razão, fez a M. Juiz à quo consignar nessa mesma ata o seguinte: “O art. 466º do CPC determina que o Tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão. Cumpre assim consignar em acta que o autor referiu, no decurso das suas declarações, que o dinheiro da compra do terreno em discussão nos autos era da empresa que depois identificou como sendo a EMP01....” 6 - Razão pela qual nunca poderá ser feita prova, como não foi, de que o A. viu o seu património diminuído, assim impedindo a possibilidade de proceder qualquer pedido com fundamento no instituto do enriquecimento sem causa. Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis, que V. Exas., Venerandos Desembargadores, doutamente suprirão, deve o Recurso ser julgado improcedente e, em consequência, ser mantida a decisão proferida, assim se fazendo a já acostumada JUSTIÇA. *** Após os vistos legais cumpre decidir.*** II- DO MÉRITO DO RECURSO1. Definição do objeto do recurso O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cf. artigos 635.º, n.º 4, 637.º, n.º 2, 1ª parte e 639.º, n.ºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil[1] – sendo que o Tribunal de recurso não tem que responder ou rebater todos os argumentos invocados, tendo apenas de apreciar as “questões” suscitadas que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respetivo objeto, excetuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras. Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pelo Apelante, são as seguintes as questões solvendas: . Impugnação da decisão de facto; . Do mérito da sentença em função da alteração ou não da decisão de facto. *** 2. Recurso da matéria de facto2.1. Factualidade considerada provada na sentença […] *** 2.3. Apreciação da impugnação da matéria de facto […] *** 3. FUNDAMENTOS DE FACTO3.1. Factualidade provada Face à decisão que antecede, passa a ser a seguinte a factualidade relevante provada, devidamente ordenada segundo uma sequência logica e cronológica dos factos: 1) O prédio sito em Sub-casa, freguesia ..., composto por eido de cultivo com ramadas e oliveiras e casa de rés-de-chão e ... andar, inscrito na matriz rústica sob o art. ...70 e na matriz urbana sob os artigos ...3 e ...4, encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...90, em nome de GG. 2) GG comprou o prédio em causa a EE, casado com FF, em 26 de abril de 2004, pelo valor “declarado” de 50.000 €. 3) Em 1995, o A., com dinheiro da empresa EMP01..., tinha comprado esse prédio descrito em 1) a EE e FF, por 3.920.000,00 escudos. 4) O prédio foi pago em prestações. 5) Dito prédio pertencia a uma herança aberta por óbito dos pais do Réu NN. 6) O Autor solicitou a EE e FF que licitassem na herança o prédio supra descrito em 1), sendo que, após a licitação, lhes compraria o imóvel. 7) EE e FF licitaram o imóvel com a ajuda de um advogado pago pelo Autor. 8) Posteriormente, o Autor pagou o imóvel em prestações, a EE e FF. 9) A compra e venda nunca chegou a ser formalizada através de escritura pública. 10) O prédio em causa foi usado pela empresa EMP01..., da qual o A. era gerente, para secar madeiras. 11) O Autor, em ../../2002, foi detido no âmbito do processo n.º 225/02..... 12) A esposa do Autor faleceu em ../../2003. 13) O Autor, que se encontrava detido, pediu ao 1º Réu CC, por carta datada de ../../2003, que o mesmo colocasse uma placa no «terreno do EE» com um anúncio para venda do prédio. 14) Na mesma carta, o Autor pediu ao Réu CC que aguardasse por ofertas. 15) Por carta datada de 10 de outubro de 2003, o autor dirigiu-se ao réu CC nos seguintes termos: “Quero falar-te sobre o Eido dos EE e de como se deve fazer a operação… Como te disse (…) eu quero 18.000 contos pelo terreno…”,“Depois combinas com o EE e a FF para eles irem assinar a escritura quando for a altura.” 16) Cartas essas que o Autor entregou ao irmão DD quando o mesmo o ia visitar, e que este entregou ao irmão CC. 17) Foi o 1º Réu CC que colocou uma placa no imóvel a anunciar a venda. 18) O A. disse ao 2º Réu DD como deveria realizar a venda do imóvel. 19) O prédio referido em 1) dos factos provados foi vendido por 90.000 €. 20) Uma vez que o imóvel ainda se encontrava registado em nome de EE e FF, aquele passou diretamente para o nome do novo comprador, GG, sem necessitar de uma procuração do Autor. 21) O A. teve conhecimento da realização da venda em 2004. 22) O Autor informou o Réu DD, por carta, que não queria o dinheiro da venda do prédio investido nem gasto, que o queria disponível quando saísse em liberdade. 23) O R. DD visitava o A. regularmente no estabelecimento prisional. 24) O Réu DD levava ao A., a seu pedido, 50,00 € em dinheiro em algumas visitas. 25) O A. saiu em liberdade em 26 de junho de 2009. 26) O A. apresentou queixa crime contra os RR. CC e DD. 27) Nessa queixa pode ler-se: ”…Tal negócio, ao que lhe foi dito na altura da sua realização, concretizou-se com o pagamento do seu valor total de noventa mil euros (90.000,00 €) em duas prestações. A primeira no valor de cinquenta mil euros (50.000,00 €) em Dezembro de 2003 e a segunda no valor de quarenta mil euros (40.000,00 €) por altura da Páscoa, contra a realização da escritura pública de venda.” 28) A dita queixa apresentada pelo Autor deu origem ao processo n.º 737/09...., que correu termos no Tribunal Judicial de Ponte de Lima. 29) Dito processo crime foi arquivado por se entender que estaríamos perante uma questão cível de prestação de contas. 30) Dito despacho foi confirmado por Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães em 25 de janeiro de 2016. 31) Em 25 de maio de 2016, o A. intentou uma ação especial de prestação de contas contra o Réu CC e contra o Réu DD, que correu termos sob o n.º 406/16...., no Tribunal Judicial de Ponte de Lima. 32) Dita ação foi julgada improcedente. 33) O Venerando Tribunal da Relação de Guimarães entendeu, por decisão proferida em 9 de maio de 2019, que o processo especial de prestação de contas não era o adequado ao fim pretendido pelo A., quando este não necessitava de qualquer informação sobre o seu direito, e não tinha qualquer dúvida fundada acerca da sua existência ou do seu conteúdo. 34) O Autor, em 7 de novembro de 2019, deu entrada da presente ação. 35) O R. DD foi quem sempre apoiou o A. nas suas questões patrimoniais e quem assumiu a gestão dos negócios deste após ser preso. *** 3.2. Factualidade não provadaI. O Autor passou a usufruir do prédio que adquiriu, logo após o primeiro pagamento, ou seja, a primeira prestação paga aos Réus EE e FF, na primavera de 1995. II. O Autor, como se encontrava preso, pediu ao 2º Réu DD, que colocasse à venda o prédio descrito em 1) dos factos provados. III. O R. CC encontrou um comprador para o prédio. IV. Em outubro de 2003, e porque já havia ofertas para a compra do imóvel, o Autor deu indicações ao Réu CC, por telefone, sobre o modo como deveria ser realizado o negócio. V. O Autor pediu ao Réu CC que guardasse o dinheiro da venda do prédio com ele, até que saísse em liberdade. VI. Quando o Autor saiu em liberdade e se dirigiu ao Réu CC para o mesmo lhe devolver o dinheiro no valor de € 90.000,00, fica a saber que o Réu CC entregou o dinheiro ao 2º Réu DD. VII. O A. apenas obteve o conhecimento que o seu irmão CC, ora Réu, não guardou o produto da venda do imóvel, conforme lhe tinha solicitado, tendo lesado o seu direito, durante uma saída precária em junho de 2009. VIII. O Réu DD, por ordem expressa do A., fez os seguintes pagamentos em dinheiro, entre outros que não recorda: a) Entregou a quantia de € 15.000,00 à irmã do Sr. OO. b) € 5.000,00 para pagamento de parte dos honorários pelos serviços de advocacia prestados pelo Dr. PP, como mandatário do A. c) € 5.000,00 ao Dr. QQ (mandatário do Sr. OO) pelos serviços de advocacia prestados, como mandatário do Sr. OO. d) € 7.000,00 à esposa do Sr. OO. e) Entre outubro de 2002 e outubro de 2004 (25 meses), € 1.000,00 por mês (€ 25.000,00 no total), à esposa do Sr. OO. IX. Ainda e sempre por ordem expressa do A., o R. DD efetuou os seguintes pagamentos: a) Entre outubro de 2002 e outubro de 2004 (durante 25 meses), efetuou o pagamento mensal de um leasing de um veículo ... (do qual não se recorda a matrícula), que era do A., no valor mensal de € 600,00, o que perfaz um total de € 15.000,00. b) Entre outubro de 2002 e fevereiro de 2004 (durante 17 meses), efetuou o pagamento mensal de um leasing de um veículo ... (do qual não se recorda a matrícula), que era da esposa do A., no valor mensal de € 280,00, o que perfaz um total de € 4.760,00. c) Efetuou o pagamento no valor de € 7.500,00 pela utilização de máquinas de limpeza e manutenção dos terrenos numa quinta que à data era propriedade do A., na freguesia ..., lugar das .... d) Efetuou, entre outubro de 2002 e outubro de 2004 (durante € 25 meses), o pagamento mensal de € 50,00, a um senhor que cuidava da manutenção de uma casa do A. sita em ... (efetuava o pagamento das despesas de água, luz e limpeza), num total de € 1.250,00. X. Ainda e sempre por ordem expressa do A., o R. adquiriu para a empresa um camião, pelo qual entregou a quantia de € 50.000,00 de entrada para a sua compra. XI. Em cada visita, o R. DD levava ao A. 6 maços de tabaco (para o Sr. OO, colega de cela do A.) ... (€ 5,00 cada maço de tabaco). XII. E ainda cartões telefónicos para efetuar chamadas em cabine, normalmente 9 cartões de € 6,00 cada, o que perfazia o montante semanal de € 134,00. XIII. A partir do momento em que foi transferido para o estabelecimento prisional ..., o R. continuou a levar tabaco (€ 30,00) e cartões telefónicos (€ 54,00). XIV. As despesas com as deslocações do R. DD ao estabelecimento prisional eram pagas com o dinheiro do A. em poder do R. XV. Por ordem do A. e no seu interesse, o Réu despendeu um total de € 145.304,00 (cento e quarenta e cinco mil, trezentos e quatro euros). XVI. Existiu claramente um conluio entre CC, DD, EE e esposa FF e também GG, aproveitando-se das fragilidades do Autor, por se encontrar detido, para atingirem os seus objetivos: dissiparem e apoderarem-se do património do Autor. XVII. Aproveitaram-se os Réus do facto do Autor nutrir confiança e um carinho especial por eles, para o enganarem. XVIII. O A. alterou conscientemente a verdade dos factos. *** 4. FUNDAMENTOS DE DIREITOAlega o recorrente, nas conclusões de recurso, que o autor solicitou ao réu CC, por cartas escritas, que o mesmo vendesse o terreno em questão nos autos e mencionou como o réu havia de efetuar o negócio; que o réu colocou uma placa no terreno e prontificou-se a ajudar o autor na venda do terreno, compareceu no ato da escritura do terreno e foi-lhe entregue o montante de 50.000 €. Conclui o recorrente que a eventual falta de cumprimento do mandato, por parte do mandatário, quer seja com representação, quer seja sem representação, gera responsabilidade civil contratual nos termos do art.º 798.º do Código Civil, pelo que a ação deveria ter sido procedente. Contrapõe o recorrido CC, além do mais, que as alegações do recorrente devem ser consideradas improcedentes por violarem o disposto no art.º 639.º, n.º 2, al. a), dado que não é explícito o sentido em que o recorrente entende que deveriam ter sido interpretadas e aplicadas as normas jurídicas que constituem fundamento da decisão. De acordo com o mencionado preceito, versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar as normas jurídicas violadas. Lidas as conclusões de recurso, constata-se que o recorrente indica as normas jurídicas, no seu entender, violadas pelo Tribunal a quo, ao não reconhecer o mandato por parte do réu CC, por o autor ter solicitado ao réu que o mesmo vendesse o terreno em questão, mencionando como o réu havia de efetuar o negócio, e por o réu ter colocado uma placa no terreno, e se ter prontificado a ajudar o autor na venda do terreno, tendo comparecido no ato da escritura do terreno, tendo-lhe sido entregue o montante de € 50.000,00. Conclui-se, assim, que o recorrente deu cumprimento ao imposto no mencionado preceito, pretendendo o recorrente a responsabilização do recorrido CC no pagamento do peticionado nos autos, ou seja, no pagamento da quantia de € 90.000,00, acrescida de juros vencidos e vincendos, contados à taxa legal de 4% desde a citação até integral e efetivo pagamento, à luz do disposto no art.º 798.º do Código Civil. Vejamos, então, se existe fundamento para alterar a decisão recorrida. O mandato, cuja noção nos é dada pelo art.º 1157.º do Código Civil, é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais atos jurídicos por conta da outra. Resulta, assim, da noção de mandato, que o mesmo tem sempre por objeto a prática de um ou mais atos jurídicos. Por esse motivo, não deve considerar-se como mandato o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar atos materiais ou intelectuais, ou quando uma das partes se obriga a transmitir a terceiro uma declaração negocial elaborada por outrem, por não estar em causa, em qualquer uma das referidas situações, a prática de atos jurídicos, estando-se, em ambos os casos, perante uma prestação de serviços atípica (art.º 1154.º do Código Civil), à qual são extensivas, com as necessárias adaptações, as disposições sobre o mandato (art.º 1156.º do mesmo diploma). Os atos jurídicos objeto do mandato são normalmente negócios jurídicos, mas podem igualmente ser simples atos jurídicos. O mandato forma-se nos termos gerais dos contratos mediante a proposta do mandante e a aceitação do mandatário, as quais podem ser expressas ou tácitas (art.º 217.º, n.º 1, do Código Civil)[2]. No caso que nos ocupa, o autor/recorrente fundamenta a sua pretensão indemnizatória no incumprimento pelo réu/recorrido CC de um contrato de mandato, nos termos do qual o autor incumbiu o réu de vender o terreno melhor identificado no ponto 1 do elenco dos factos provados, dando-lhe indicações sobre o modo como deveria ser realizado o negócio. Não obstante, não logrou o autor demonstrar, como lhe competia, enquanto facto constitutivo do direito que invoca (art.º 342.º do Código Civil), que tivesse incumbido o réu CC de vender o terreno em questão. Tal incumbência não resulta, sem mais, do teor das cartas datadas de 3 de maio[3] e 10 de outubro de 2003[4], juntas no processo crime n.º 737/09...., nas quais o autor se limita a solicitar ao réu que proceda à colocação de um anúncio para venda do terreno e que aguarde por ofertas, e a manifestar a sua intenção de falar com o réu sobre o “Eido dos EE” e de como se deveria fazer a operação. Caso se entendesse que as referidas cartas continham as instruções dadas pelo autor sobre o modo como o réu deveria realizar o negócio, não se compreenderia porque razão o autor não se insurgiu contra o facto de ter ficado a constar do teor da escritura de compra e venda junta com a petição inicial como documento n.º 8, o preço de venda do prédio em questão de € 50.000,00, e não o preço pretendido e indicado pelo autor na sua carta de 10 de outubro de 2003. Acresce referir que, sendo o mandato um contrato consensual, dependente da aceitação do mandatário, a qual pode ser expressa ou tácita, também não resultou demonstrado que o réu tivesse aceitado praticar e, menos ainda, que tivesse praticado, qualquer ato jurídico por conta do autor, tendente à venda do terreno em questão, limitando-se a sua intervenção à prática do ato material de colocação de uma placa no imóvel a anunciar a venda Assim sendo, e apesar das alterações introduzidas na decisão de facto, improcede o recurso, mantendo-se a decisão recorrida, por não se vislumbrar fundamento para a pretendida alteração. *** III- DISPOSITIVOPelos fundamentos acima expostos, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sem prejuízo das alterações acima identificadas que introduzem ao julgamento da matéria de facto realizado pela 1.ª Instância, acordam em julgar o recurso improcedente e, em consequência, confirmam a decisão de mérito constante da sentença recorrida. *** Custas do recurso pelo recorrente uma vez que nele ficou “vencido” (art.º 527.º, n.ºs 1 e 2), sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.Guimarães, 23 de janeiro de 2025 Susana Raquel Sousa Pereira – Relatora Lígia Paula Ferreira de Sousa Santos Venade – 1ª Adjunta José Alberto Martins Moreira Dias – 2º Adjunto [1] Diploma a atender sempre que se citar disposição legal sem menção de origem. [2] Assim, LUÍS MANUEL TELES DE MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações Volume III Contratos em Especial, 6.ª Edição, Almedina, p. 438. [3] Na qual pode ler-se o seguinte: «Também te peço que ponhas anúncio para a venda do terreno do EE. Uma placa no sítio já é suficiente. Arranja alguém de confiança que te avalie aquilo e entretanto espera ofertas.» [4] Na qual pode ler-se o seguinte: «Quero falar-te sobre o Eido dos EE e de como se deve fazer a operação… Como te disse eu quero 18.000 contos pelo terreno…», «Depois combinas com o EE e a FF para eles irem assinar a escritura quando for a altura.» |