Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1027/22.7T8VCT.G1
Relator: FERNANDA PROENÇA FERNANDES
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
DANO PATRIMONIAL FUTURO
DANO BIOLÓGICO
DANO NÃO PATRIMONIAL
EQUIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/28/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO SUBORDINADO DO AUTOR IMPROCEDENTE E APELAÇÃO DA RÉ PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I. Ao lesado que não exerça actividade remunerada (aposentado) assistirá o direito ao ressarcimento pelo dano biológico na vertente patrimonial (em resultado da afectação da sua capacidade geral ou funcional), apesar de não haver perda da capacidade de ganho.
II. O critério fundamental para a fixação, tanto das indemnizações atribuídas por danos patrimoniais futuros (vertente patrimonial do chamado dano biológico) como por danos não patrimoniais, é a equidade.
III. A utilização de critérios de equidade não deve impedir que se tenham em consideração as exigências do princípio da igualdade, no sentido de uma tendencial uniformização de parâmetros na fixação judicial das indemnizações, como também deverá ser dada a devida atenção às circunstâncias do caso concreto.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório (feito com base no da sentença).

AA veio propor contra EMP01..., S.A. a presente acção declarativa de condenação, peticionando que a ré seja condenada a pagar-lhe (i) a indemnização global líquida de € 87.322,74, acrescida de juros de mora vincendos, contados à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da propositura da presente acção, até efectivo pagamento, e (ii) a indemnização que, por força dos factos alegados nos artigos 287º a 296º da petição, vier a ser fixada em decisão ulterior (cfr. artigo 564º, nº 2, do Código Civil) ou, segundo outro entendimento, a indemnização que vier a ser relegada para incidente de liquidação (cfr. artigos 358º, nºs. 1 e 2, e 609º, nº 2, do Código de Processo Civil).
Regularmente citada, contestou a ré, aceitando parte dos factos relativos à dinâmica do acidente de trânsito alegado, aceitando a sua responsabilidade civil, e impugnando os demais.
Foi proferido despacho saneador, definiu-se o objecto do processo e procedeu-se à selecção dos Temas de Prova.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
“III - Decisão
Em face do exposto, julgo a acção proposta por AA contra EMP01..., S.A., parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente, condeno a Ré a pagar ao Autor a quantia global líquida de € 49.727,23, acrescida de juros contados desde data da citação sobre a quantia de € 25.727,23, e desde a data da prolação da presente decisão sobre a quantia de € 24.000,00, à taxa legal de 4%, até integral e efectivo pagamento, e, ainda, a quantia cuja fixação se remete para decisão ulterior, nos termos do disposto no artigo 564º, nº 2, do Código Civil, e que corresponder ao valor que o Autor comprovar ter despendido em medicamentos analgésicos e anti-inflamatórios tópicos, numa média de um creme analgésico por mês e vinte comprimidos por mês, até ao fim da vida, para atenuar ou debelar as dores no ombro esquerdo.
Custas na proporção do decaimento.
Registe e notifique.”.
*
Inconformada com esta decisão, a ré, dela interpôs recurso e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem):

“CONCLUSÕES
Do dano patrimonial futuro
1. Da matéria de facto provada não resulta ter o recorrido sofrido qualquer incapacidade que lhe tenha especificamente afectado a sua actividade laboral.
2. O recorrido encontra-se na situação de reforma desde o ano de 2022.
3. O calculo da indemnização pelo dano futuro tem assim de ser analisado à luz do dano biológico na sua vertente patrimonial extra-laboral.
4. Não pode ocorrer que, partindo-se da não existência efectiva de perda de rendimentos, se venha a atribuir indemnização que ultrapassa a que seria devida caso essa perda de rendimentos existisse de facto.
5. Seguindo os critérios que lançam mão das fórmulas e tabelas que os nossos tribunais habitualmente utilizam para o cálculo de indemnização por perda efectiva de capacidade de ganho decorrente de incapacidade permanente (de que é exemplo o Acórdão do STJ de 04.12.2007, no qual foi Relator o Exmo Senhor Juiz Conselheiro Mário Cruz, disponível em www.dgsi.pt), se essa perda de capacidade de ganho se verificasse no caso em análise, considerando a idade do recorrido de quase 69 anos à data da consolidação médico-legal das lesões, a sua incapacidade de 8 pontos, o seu rendimento líquido de € 33.382,10 (rendimento anterior ao ano em que ocorreu o acidente) a indemnização a atribuir seria de € 2.590,45 para um período de vida activa de 70 anos.
6. Pelo recurso a critérios de equidade e tomando em consideração a vertente patrimonial do dano, enquanto dano biológico mas fora do âmbito da actividade laboral, será ajustado fazer acrescer àquele valor quantia não superior a € 10.000,00, perfazendo assim o total indemnizatório cumulado o valor global de cerca de € 12.590,00.
7. A indemnização a atribuir ao recorrido, a este título, não deve ser superior a € 12.590,00, até porque se trata de uma quantia a entregar imediatamente e de uma só vez mas que se destina a ressarcir um dano patrimonial futuro.
Do dano não patrimonial
8. Analisado o caso dos autos, as decisões jurisprudenciais mais recentes e lançando mão dos preceitos legais para o efeito referidos no corpo destas alegações, considera a recorrente como justo, equilibrado e adequado o arbitramento ao recorrido da quantia de € 15.000,00 a título de compensação pelo dano não patrimonial.
9. Na douta sentença recorrida fez-se menos acertada interpretação dos factos e menos correcta aplicação da Lei, designadamente dos art.ºs 496º, 562º, 564º e 566º, todos do CCivil.
Pelo exposto,
Na procedência das conclusões do recurso da recorrente, deve a douta sentença ora recorrida ser revogada nos termos supra descritos, assim se fazendo J U S T I Ç A.”.
*
Igualmente inconformado com a decisão, dela interpôs recurso subordinado o autor, que a terminar as suas alegações, apresentou as seguintes conclusões (que igualmente se transcrevem):
“CONCLUSÕES:

1. A douta sentença recorrida não merece o reparo que lhe é apontado pela Ré.
2. Não merece qualquer censura a factualidade dada como provada pela douta sentença recorrida, pelo que não se impõe qualquer revogação, a este título, da douta sentença de primeira instância.
3. Apenas se visará sindicar, nesta sede, o quantum indemnizatório fixado pelo Tribunal a quo, nas suas diversas vertentes.

I – Do Dano Patrimonial Futuro

4. Com pertinência para esta parte do recurso subordinado, provou-se nomeadamente que:
- O Autor tinha apenas 68 (sessenta e oito) anos de idade aquando da eclosão do acidente;
- Em consequência do acidente, ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 8 (oito) pontos, considerando como danos permanentes severas queixas álgicas e limitação funcional ao nível dos ombros e membros superiores.
- As sequelas de que ficou a padecer são compatíveis com a sua profissão habitual, mas implicam esforços suplementares – melhor descritos em tttt);
- O A., à data do acidente, exercia a actividade profissional de professor de Educação Visual e Tecnológica;
- Em consequência das lesões sofridas e das sequelas delas resultantes, a A. passou a necessitar de recorrer a ajuda de terceiras pessoas para o desempenho das tarefas profissionais; passou a ter severas dificuldades no desempenho de muitas das suas actividades diárias, domésticas e pessoais (incluindo higiene); cessou absolutamente a prática desportiva de ciclismo e motociclismo, que lhe traziam grande prazer, saúde, qualidade de vida e realização pessoal;
5. A indemnização fixada pela sentença recorrida para ressarcimento dos danos futuros/perda da capacidade de ganho – ou “dano biológico”, de 24.308,49 € - afigura-se insuficiente.
6. Pese embora se subscreva as considerações que na douta sentença que expõem sobre as limitações fisiológicas de que o Autor ficou a padecer, inclusive na sua capacidade laboral, deve ser fixada a este título quantia não inferior a 38.000,00 €.
7. Entende o Autor que não foi devidamente ponderado – ponderação essa que deve ser casuística – o especial grau de limitação funcional que resulta do confronto entre os factores determinantes: a idade do Autor, ainda em período activo; a sua profissão habitual; os contornos concretos das sequelas de que ficou a padecer, mormente as consequências concretas no desempenho das suas funções habituais severamente afectadas; a penosidade que a diminuição da sua capacidade física representa e representará, até ao final de vida, no conjunto da actividades que compõem toda a vivência do Autor, no plno mais estrito do conceito de “dano biológico”.
8. A situação ocupacional e pessoal do Autor exige (e exigiu especialmente, nos anos remanescesnte de vida activa que ainda desempenhou), sob pena de total inadequação, uma preparação e disponibilidade física de grau elevado, quer ao nível do sopesar de cargas, elevação de membros superiores, e assunção de posturas de esforço e movimentos repetitivos.
9. As sequelas traduzem-se numa afectação directa, diária e constantemente presente em todas as tarefas da Autor na sua profissão habitual (enquanto a desempenhou) e far-se-á sentir também ao longo de toda a vida da Autor de forma diária e permanente em qualquer uma das actividades descritas,
10. Sem deprezar aquelas que se inscrevem no capítulo desportivo e de lazer, do qual o Autor se viu absoluta e permanentemente privado.
11. Há portanto um sacrifício físico diário, definitivo e permanente com que a Autor terá de viver, e não um mero esforço suplementar que pontual ou residualmente lhe seja exigido, tudo como consequência do acidente de viação em apreço nos autos.
12. Tendo em conta os relevantes argumentos ora expostos, era imperativo fixar valor superior ao arbitrado, o que se requer venha ser rectificado nesta sede, fixando-se a indemnização a atribuir ao Autor, a este título na ordem dos € 38.000,00 (trinta e oito mil euros).
II – Dos Danos Não Patrimoniais
13. O Autor acompanha, na sua generalidade, os factos destacados pela sentença de primeira instância, bem como o enquadramento jurídico que na mesma se leva a cabo para determinação da compensação fixada para ressarcimento dos danos de cariz não patrimonial pela mesma sofrido.
14. No entanto, entende, como todo o respeito, que se provaram na demanda factos suficientes para a condenação da Ré, a este título, pela totalidade do montante peticionado pelo Autor - € 40.000,00 – ao invés dos € 24.000,00 arbitrados.
15. Destaca-se aqui o grau de sofrimento, incómodo, dores e privações que o Autor sofreu e de que ficou permanentemente a padecer, incluindo as múltiplas lesões sofridas, as várias assistências hospitalares, consultas, internamentos, o penoso período de recobro domiciliário em que necessitava de ajuda de terceiros para toda e qualquer função básica (incluindo deslocações ao WC e higiene pessoal), as limitações permanentes a nível de actividade pessoal e profissional, o quantum doloris acima da média da escala respectiva, bem como o impacto emocional que o susto e o choque do próprio momento do acidente (embate violento), com receio pela própria vida.
16. Tudo sopesado, afigura-se ainda assim insuficiente a quantia de € 24.000,00 aribtrada pelo Tribunal a quo, reputando-se como mais adequada a indemnização de tais danos pelo valor dos € 45.000,00 (dez mil euros), não actualizados mas antes reportando-se à data da instauração da acção.
17. Ao decidir como decidiu, o Tribunal violou as normas substantivas contidas nos artigos 483º e 496º do Código Civil, sem prejuízo do douto suprimento.
18. Requerendo-se assim a revogação da sentença recorrida nesta parte e condenação da Ré em tal medida.
19. Com o que se fará Justiça.
Termos em que:
deve ser dado provimento ao presente recurso, que é subordinado à apelação da Ré, revogando-se a sentença recorrida e proferindo-se, em sua substituição, Douto Acórdão, que esteja em conformidade com as conclusões supra-formuladas, com o que se fará, J U S T I Ç A.”.
*
Contra-alegou a ré, pugnando pela improcedência do recurso subordinado, terminando com as seguintes conclusões:
CONCLUSÕES

1. A douta sentença recorrida não merece a censura que o autor vem alegar.
2. As indemnizações pelos danos objecto de ambos os recursos interpostos, principal e subordinado, devem ser fixados nos montantes que a aqui recorrida, em sede do recurso por si interposto, defende serem os adequados.
Pelo exposto,
Julgando-se improcedente o recurso subordinado interposto pelo autor, far-se-á inteira J U S T I Ç A.”.
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Os recursos foram admitidos como de apelação, a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Questões a decidir.

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, a questão que se coloca à apreciação deste Tribunal consiste em saber da adequação das indemnizações fixadas.
*
III. Fundamentação de facto.

Os factos que foram dados como provados na sentença sob recurso são os seguintes:

“a) Em 20 de Junho de 2020, a aquisição da propriedade do veículo automóvel com a matrícula ..-NE-.. estava inscrita na Conservatória do Registo Automóvel a favor do Autor, conforme se retira da cópia da certidão junta aos autos a fl. 45v e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
b) No dia 20 de Junho de 2020, pelas 19,00 horas, ocorreu um acidente de trânsito, na Estrada ..., ..., na freguesia ..., concelho ...; c) Nesse acidente, foram intervenientes os seguintes veículos automóveis: 1º. – o motociclo de matrícula ..-NE-..; 2º. – veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-JT; 3º. – o motociclo de matrícula ..-NZ-..;
d) Na altura da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, o NE era conduzido pelo Autor;
e) O veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-JT era propriedade de BB;
f) E, na altura da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, era conduzido por CC;
g) O motociclo de matrícula ..-NZ-.. era propriedade de DD e, na altura da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, era, também, por ele próprio conduzido;
h) A Estrada ..., no local do sinistro que deu origem à presente acção, configura uma curva, descrita para o lado esquerdo, tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...;
i) A faixa de rodagem da Estrada ... tem uma largura de 05,50 metros;
j) O seu piso era, como é, pavimentado a asfalto;
k) O tempo estava bom e seco;
l) E o pavimento asfáltico da faixa de rodagem da Estrada ... encontra-se limpo, seco e em bom estado de conservação, pois não apresentava quaisquer ondulações, fissuras, soluções de continuidade ou buracos;
m) Pelas suas duas margens, a faixa de rodagem da Estrada ... apresentava, como apresenta, bermas, também pavimentadas a asfalto, com uma largura de: (i) 0,10 metros, a situada na margem esquerda da referida via, tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...; (ii) 0,10 metros, a situada do lado direito, tendo em conta o mesmo indicado sentido de marcha:..., ou seja, ...;
n) Essas duas referidas bermas encontram-se e encontram-se separadas em relação ao pavimento asfáltico da faixa de rodagem da Estrada ..., através de linhas contínuas, pintadas a cor ...;
o) O plano configurado pelo pavimento asfáltico das duas referidas bermas encontra-se situado ao mesmo nível do plano configurado pelo pavimento asfáltico da faixa de rodagem da Estrada ...;
p) Pelo lado exterior da berma asfáltica situada na margem do lado direito da Estrada ..., tendo em conta o sentido ..., ou seja, ..., existia e existe, ainda, uma segunda (2ª.) berma térrea, sobre a qual cresciam ervas de nascimento espontâneo, com a largura de 1,20 metros;
q) Pelo lado exterior da berma térrea, situada na margem direita da Estrada ..., tendo em conta o sentido ..., ou seja, ..., existia e existe, ainda, um muro, construído em estrutura de cimento;
r) De vedação do logradouro de uma casa de habitação, ali existente – na margem direita da Estrada ..., tendo em conta o sentido ..., ou seja, ..., com a altura de 0,70 metros
s) A visibilidade, no local do sinistro que deu origem à presente acção, é muito má;
t) Pois, para quem se encontra situado no preciso local da deflagração do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, apenas consegue avistar-se a faixa de rodagem da Estrada ..., as suas bermas asfálticas – e a sua supra-referida berma térrea -, em toda a sua largura (i) no sentido Poente, ou seja, em direcção a ..., ao longo de uma distância não superior a quarenta (40,00) metros, (ii) no sentido Nascente, em direcção a ..., ao longo de uma distância não superior a vinte e cinco (25,00) metros;
u) A distância referida no ponto (i) da precedente alínea, desta petição inicial, é ditada pela existência da curva, que a Estrada ... configura, a essa distância, não superior a quarenta (40,00) metros, a Poente – do lado de ... – , em relação ao preciso local onde deflagrou o acidente de trânsito que deu origem à presente acção, descrita para o lado direito, tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...
v) A distância referida no ponto (ii) da precedente alínea, desta petição inicial, é ditada pela própria da curva, que a Estrada ... configura, no preciso local da deflagração do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, descrita para o lado esquerdo, tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...;
w) De resto, para quem circula pela Estrada ... no sentido ..., ou seja, ..., apenas consegue avistar-se a faixa de rodagem da Estrada ..., as suas duas bermas e a sua berma térrea, em toda a sua largura, em direcção ao preciso local da deflagração do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, em toda a sua largura, numa altura em que se encontra a uma distância não superior a quarenta metros antes de lá chegar;
x) Por via da supra-referida curva, descrita para o lado esquerdo, tendo em conta o sentido ..., ou seja, ..., situada que a Estrada ... configura no preciso local onde deflagrou o acidente de trânsito que está na origem da presente acção;
y) No local do sinistro que está na génese da presente acção e antes de lá chegar, para quem circula em qualquer dos seus dois (02,00) sentidos de marcha, a Estrada ... apresentava e apresenta, pelas suas duas (02,00) margens, casas de habitação, todas elas com os seus respectivos acessos a deitar directamente para a faixa de rodagem da referida via: Estrada ...;
z) O local onde eclodiu o acidente de trânsito que está na génese da presente acção situa-se numa zona da Estrada ..., que se situa entre as placas, fixas em suporte vertical, que avisam e assinalam e existência e a presença do núcleo urbano, comercial, habitacional, freguesia e localidade de ..., concelho ...;
aa) No preciso local da deflagração do acidente de trânsito que deu origem à presente acção e antes de lá chegar, para quem circula em qualquer dos sentidos de marcha, existia e existe, sobre o eixo divisório da faixa de rodagem da Estrada ..., pintada a cor ..., uma linha contínua;
bb) Essa linha contínua prolongava-se e prolonga-se, do local do sinistro, no sentido Poente, em direcção a ..., ao longo de uma distância de mais 300 metros;
cc) E prolongava-se, como se prolonga, do local do sinistro, no sentido Nascente, em direcção a ..., ao longo de uma distância superior a trezentos (300,00) metros;
dd) Para quem circula pela Estrada ..., no sentido ..., ou seja, ..., deparava, à data do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, como depara, ainda, na presente data, antes de chegar ao preciso local do embate, fixos em suporte vertical, com os seguintes sinais de trânsito:
ee) 1º. – a uma distância de duzentos (200,00) metros, com um sinal, de forma circular, com a sua orla pintada a cor vermelha, com o seu fundo branco, sobre o qual se encontravam, como se encontram, pintadas duas (02,00) silhuetas de veículos automóveis, sendo a do lado direito pintada a cor preta e doa lado esquerdo pintada a cor vermelha;
ff) 2º. – a uma distância de cento e cinquenta (150,00) metros, com um sinal, de forma circular, com a sua orla pintada a cor vermelha, com o seu fundo branco, sobre o qual se encontrava, como se encontra, pintada a cor preta, a inscrição “50”;
gg) 3º. – a uma distância de trinta (30,00) metros, com um sinal, de forma quadrangular, fixo em suporte vertical, com o seu fundo azul, sobre o qual se encontrava, como se encontra, inscrita, a caracteres de cor ..., a inscrição “40”;
hh) 4º. – a essa mesma distância de trinta (30,00) metros, com um sinal, de forma triangular, fixo em suporte vertical – sobre o sinal anterior -, com a orla vermelha e com o seu fundo branco, sobre o qual se encontravam, como se encontram, pintadas a cor preta, em posição vertical, duas barras paralelas, com o espaço entre elas mais largo na sua parte inferior e mais estreito na sua parte superior;
ii) A Estrada ... encontrava-se, à data do sinistro que está na origem da presente acção e apresenta-se, na presente data, aberta aos dois sentidos de trânsito;
jj) Para o efeito, a faixa de rodagem da Estrada ... apresentava-se e apresenta-se subdividida em duas hemifaixas de rodagem, com uma largura de (05,50 : 2) 02,75 metros, cada uma, divididas e separadas entre si através de uma linha contínua, pintada a cor ...; kk) A hemifaixa de rodagem, resultante da supra-referido subdivisão, situada do lado Norte, destina-se ao trânsito automóvel que desenvolve a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...; ll) A hemifaixa de rodagem, resultante da supra-referido subdivisão, situada do lado Sul, destina-se ao trânsito automóvel que desenvolve a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...;
mm) No dia 20 de Junho de 2020, pelas 19,00 horas, o Autor – AA – conduzia o seu referido motociclo de matrícula ..-NE-.., pela Estrada ...;
nn) O motociclo de matrícula ..-NE-.. desenvolvia a sua marcha, no sentido ..., ou seja, ...;
oo) O motociclo de matrícula ..-NE-.. – propriedade do Autor AA - circulava rigorosamente pela metade direita da faixa de rodagem da Estrada ..., tendo em conta o seu indicado sentido de marcha: ..., ou seja, ...;
pp) Com os seus rodados a uma distância não superior a 0,20 metros da linha delimitativa da berma do mesmo lado: do lado direito da faixa de rodagem da Estrada ..., tendo em conta o seu indicado sentido de marcha: ..., ou seja, ...;
qq) Animado de uma velocidade não superior a quarenta (40,00) quilómetros, por hora;
rr) À retaguarda do motociclo de matrícula ..-NE-.. – propriedade do Autor AA – transitava, também, pela Estrada ..., o motociclo de matrícula ..-NZ-.., tripulado pelo seu proprietário DD;
ss) O qual – motociclo de matrícula ..-NZ-.., tripulado pelo DD – transitava a uma distância de quinze (15,00) metros à retaguarda do motociclo de matrícula ..-NE-.., propriedade do Autor AA;
tt) Sendo certo que o motociclo de matrícula ..-NZ-.. - tripulado pelo DD – circulava, também ele, rigorosamente pela metade direita da faixa de rodagem da Estrada ..., tendo em conta o seu indicado sentido de marcha: ..., ou seja, ...;
uu) ; Com os seus rodados a uma distância não superior a 0,20 metros da linha delimitativa da berma do mesmo lado: do lado direito da faixa de rodagem da Estrada ..., tendo em conta o seu indicado sentido de marcha: ..., ou seja, ...
vv) Animado de uma velocidade não superior a 40 quilómetros por hora;
ww) Quando rodava rigorosamente nas circunstâncias referidas nas precedentes alíneas e, quando o motociclo de matrícula ..-NE-.. – propriedade do Autor AA - se encontrava a descrever a curva que a Estrada ... configura no preciso local da deflagração do acidente de trânsito que deu origem à presente acção – descrita para o lado esquerdo, tendo em conta o sentido ..., ou seja, ... -, o Autor – AA - surgiu um veículo automóvel ligeiro de passageiros, de matrícula ..-..-JT, conduzido por CC, a circular no sentido ... (...), de forma completamente desgovernada e descontrolada;
xx) Tendo o NE sido violentamente embatido pelo JT;
yy) Nas referidas circunstâncias temporais, o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-JT transitava, também, pela Estrada ...;
zz) O veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-JT desenvolvia a sua marcha, em sentido inverso ao seguido pelo motociclo de matrícula ..-NE-..;
aaa) Ou seja, o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-JT desenvolvia a sua marcha, no sentido ...: ...;
bbb) Inicialmente, o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-JT transitava pela metade direita da faixa de rodagem da Estrada ..., tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...;
ccc) O condutor do veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-JT – CC -, porém, conduzia de forma completamente distraída, pois não prestava qualquer atenção à actividade – condução – que executava, nem aos restantes veículos automóveis e motociclos que, na altura, transitavam pela Estrada ...;
ddd) O CC perdeu, completamente, o controlo do veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-JT;
eee) O CC saiu, com veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-JT da metade direita da faixa de rodagem da Estrada ..., tendo em conta o sentido ..., ou seja, ..., para o seu lado esquerdo;
fff) Transpôs, para o seu lado esquerdo, o eixo divisório da faixa de rodagem da Estrada ...;
ggg) Onde, nesse preciso local – eixo divisório da via/Estrada ... -, existia, como existe, pintada, a cor ..., uma linha contínua;
hhh) Sempre de forma completamente desgovernada e totalmente descontrolado, o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-JT invadiu, completamente, a metade esquerda da faixa de rodagem da Estrada ..., tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...: a metade direita da faixa de rodagem da Estrada ..., tendo em conta o sentido ..., ou seja, ..., que estava reservada à circulação do motociclo de matrícula ..-NE-.. (e do motociclo de matrícula ..-NZ-.., tripulado pelo DD), propriedade do Autor AA;
iii) O embate ocorreu, assim, totalmente sobre a metade direita da faixa de rodagem da Estrada ..., tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...;
jjj) Essa colisão verificou-se entre a parte frontal, mais para a esquerda, do veículo automóvel ligeiro de mercadorias de matrícula ..-..-JT – conduzido pelo EE - e a parte frontal – roda da frente – do motociclo de matrícula ..-NE-.., propriedade do Autor AA e, na altura, por ele próprio conduzido;
kkk) Após a supra-referida colisão – contra o motociclo de matrícula ..-NE-.., propriedade do Autor AA -, o veículo automóvel ligeiro de mercadorias de matrícula ..-..-JT, conduzido pelo EE, prosseguiu, sempre, a sua marcha;
lll) Sempre por forma a circular, como circulou, de forma desgovernada e descontrolada, totalmente sobre a metade esquerda da faixa de rodagem da Estrada ..., tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...;
mmm) O motociclo de matrícula ..-NZ-.. – propriedade do DD – foi violentamente embatido pelo veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-JT, conduzido pelo CC;
nnn) Este embate ocorreu, também ele, totalmente sobre a metade esquerda da faixa de rodagem da Estrada ..., tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...: sobre a metade direita da faixa de rodagem da Estrada ..., tendo em conta o sentido ..., ou seja, ..., que estava reservada à circulação do motociclo de matrícula ..-NZ-.., propriedade do DD e, na altura, por ele próprio conduzido;
ooo) E esta colisão verificou-se entre a parte frontal esquerda, ao nível do canto do mesmo lado, do veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-JT – conduzido pelo EE – e a parte lateral esquerda, sensivelmente ao meio, do motociclo de matrícula ..-NZ-.., propriedade do DD (e, na altura, por ele próprio conduzido);
ppp) Em consequência deste embate – perpetrado pelo veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-JT – conduzido pelo EE -, o motociclo de matrícula ..-NZ-.. partiu-se ao meio, em duas (02,00) metades separadas uma da outra;
qqq) Após este segundo embate, o EE prosseguiu a sua marcha no sentido ..., ou seja, ..., ao longo de uma distância superior a cinquenta metros, em direcção a ...;
rrr) Deslocou-se até ao local do sinistro;
sss) No entanto, de imediato, pôs-se em fuga, abandonou o local do sinistro e não mais voltou;
ttt) E não prestou qualquer auxílio ou socorro, tanto ao Autor AA, como ao DD;
uuu) O EE, porém, deixou, no local do sinistro, caído no solo, o pára-choques da frente do veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-JT, com a sua chapa (de matrícula) de identificação e foi, também, identificado por testemunhas que presenciaram o acidente;
vvv) Após as supra-referidas colisões, quer o motociclo de matrícula ..-NE-.. – propriedade do Autor AA -, quer o motociclo de matrícula ..-NZ-.. – propriedade de DD – ficaram, imobilizados, no solo, totalmente sobre a metade direita da faixa de rodagem da Estrada ..., tendo em conta o sentido ..., ou seja, ..., junto à linha delimitativa da berma asfáltica situada do mesmo lado da referida via;
www) A Ré pagou ao Autor a quantia de € 1.600,00;
xxx) Em consequência do embate supradescrito, o Autor sofreu lesões corporais várias, nomeadamente, traumatismo importante do ombro esquerdo, traumatismo da omoplata esquerda, traumatismo da mão esquerda, traumatismo do dedo polegar esquerdo, luxação do ombro esquerdo, luxação da omoplata esquerda, luxação do dedo polegar esquerdo, luxação da articulação escapulo umeral esquerda, com fractura do troquiter, com desvio mínimo, luxação da articulação interfalângica do dedo polegar esquerdo. traumatismo do joelho direito, traumatismo do joelho esquerdo, traumatismo do cotovelo esquerdo, ferida (de exposição) do dedo polegar da mão esquerdo, escoriações e hematomas espalhados pelo corpo;
yyy) Foi transportado, na ambulância do I.N.E.M. para o Hospital ..., de ..., EPE, onde lhe foram prestados os primeiros socorros, no respectivo Serviço de Urgência;
zzz) Foram-lhe, aí, efectuados exames radiológicos – R.X. -, às regiões do seu corpo atingidas, prescritos medicamentos vários, nomeadamente analgésicos e anti-inflamatórios;
aaaa) Do Serviço de Urgência, o Autor foi transferido para o Bloco Operatório do Hospital de ..., de ...;
bbbb) Em virtude de resultados infrutíferos – impossibilidade - na tentativa da redução, no Serviço de Urgência, das luxações em ambas as articulações – ombro e dedo polegar esquerdos;
cccc) Fez análises clínicas, foi-lhe administrada uma anestesia geral e foi submetido a uma intervenção cirúrgica;
dddd) Consubstanciada na redução das luxações do ombro esquerdo e do dedo polegar da mão esquerda;
eeee) Foi-lhe, aí, efectuada limpeza cirúrgica à ferida de exposição do dedo polegar da mão esquerda, efectuada estabilização IF do dedo polegar da mão esquerda, com a aplicação de uma tala de Zimmer;
ffff) E foi-lhe, aí, prescrito um Aparelho de Imobilização do membro superior esquerdo – MSI – contra o tronco;
gggg) O Autor viu-se na necessidade de usar, como usou a Tala de Zimmer, no dedo polegar da mão esquerda, ao longo de um período de tempo de quarenta dias;
hhhh) E viu-se na necessidade de usar o Aparelho de Imobilização do membro superior esquerdo (MSE), ao longo de um período de tempo de vinte e sete dias;
iiii) No dia seguinte ao da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, o Autor obteve alta do Hospital ..., e regressou à sua casa de habitação;
jjjj) E continuou a ser seguido no Hospital Particular ..., onde lhe foi prescrito tratamento de fisioterapia, que o Autor cumpriu ao longo de 60 sessões, consubstanciadas em: (i) massagens com técnicas especiais; (ii) banhos de remoinho ou turbilhão; (iii) fortalecimento muscular manual; (iv) técnicas especiais de cinesiterapia; e (v) treino em actividades de vida diária e que incidiram nas regiões do ombro esquerdo, da mão esquerda e do dedo polegar da mão esquerda;
kkkk) Foi, igualmente, o Autor assistido no Centro de Saúde ..., onde foi submetido à extracção dos pontos de sutura, a lavagens, desinfecções, curativos e mudança e substituição de pensos ao dedo polegar da mão esquerda;
llll) Tendo, ainda, acorrido a duas consultas da especialidade de ortopedia, na Policlínica ...;
mmmm) No momento do embate e nos instantes que o precederam, o Autor assustou-se;
nnnn) Em consequência do embate supradescrito, o Autor ficou, no membro superior esquerdo, com (i) amiotrofia da região escapular e braquial, esta última mais ligeira, medida a 16 centímetros do olecrano (com 28,5 centímetros à esquerda e 29 centímetros à direita), (ii) limitação da mobilidade do ombro, realizando de forma passiva um arco de flexão e abdução de 0º a 150º, com rotação externa dentro dos parâmetros da normalidade e rotação interna dolorosa de 0º a 150º; (iii) dificuldade em posicionar a mão na nuca;
oooo) Em consequência do embate supradescrito, o Autor ficou, no primeiro dedo do membro superior esquerdo, com (i) cicatriz nacarada, irregular, com vestígios de pontos de sutura, não hipertrófica e não aderente aos planos profundos, na articulação interfalângica do polegar, na face palmar, com 4 centímetros; (ii) apagamento das pregas da referida articulação na face dorsal; e (iii) quase anquilose da articulação interfalângica;
pppp) Em consequência as lesões e sequelas sofridas, o Autor ficou com dificuldade em estender a roupa num estendal elevado, em tratar da sua higiene pessoal na parte posterior do tronco e da cabeça com a mão esquerda e tem tendência para adormecer sobre o lado direito do corpo por sentir dor no ombro esquerdo;
qqqq) Em consequência as lesões e sequelas sofridas, o Autor deixou de fazer ciclismo de montanha, bem como de conduzir motociclos, por receio de cair;
rrrr) O Autor é professor, actualmente aposentado;
ssss) Frequentava o ginásio e praticava ciclismo e motociclismo;
tttt) Em consequência as lesões e sequelas sofridas, o Autor, quando leccionava, deixou de fazer trabalhos com régua e esquadro, deixou de manipular o x-acto e a régua no quadro e sempre que tivesse de manter os membros superiores elevados, tendo, por causa disso e no âmbito escolar, beneficiado da coadjuvância (auxílio de um outro professor), em face das suas limitações;
uuuu) As lesões sofridas pela Autora determinaram-lhe:
 Um Período de Défice Funcional Temporário Total de 2 dias;
 Um Período de Défice Funcional Temporário Parcial de 225 dias;
 Um período de Repercussão Temporária na Actividade Profissional Total de 227 dias;
 Um quantum doloris fixável no grau 4, numa escala de 1 a 7;
 Um Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 8 pontos;
 Um Dano Estético Permanente fixável no grau 1, numa escala de 1 a 7;
 Uma repercussão permanente nas Actividades Desportivas e de Lazer fixável no grau 1, numa escala de 1 a 7;
vvvv) O Autor obteve a consolidação médico-legal definitiva no dia 01.02.2021;
wwww) As lesões e sequelas de que ficou a padecer desgostam o Autor;
xxxx) O Autor passou a depender de ajudas medicamentosas, sem as quais, por causa das dores, não conseguirá ultrapassar as suas dificuldades em termos funcionais e nas situações de vida diária, que no caso se consubstanciam na toma de analgésicos, em SOS, e anti-inflamatórios tópicos, numa média de um creme analgésico por mês e vinte comprimidos por mês, até ao fim da vida;
yyyy) O Autor nasceu no dia ../../1952, conforme cópia da certidão junta aos autos a fl. 171 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
zzzz) À data da deflagração do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, o Autor desempenhava as funções docentes no Agrupamento de Escolas ..., em ...;
aaaaa) Pertencendo ao Quadro de Agrupamento, do Grupo de EV – Educação Visual – e ET – Educação Tecnológica;
bbbbb) E desempenhava os cargos de Director de Turma, Subcoordenador de Grupo, e Presidente do Conselho Geral no referido Agrupamento de Escolas ..., em ...;
ccccc) Auferindo, por mês, a quantia de € 3.191,10, sendo que em 2021 auferiu o valor, global e líquido de impostos, de € 35.472,28;
ddddd) Durante o período de Repercussão na Actividade Profissional Total, o Autor não recebeu a quantia global de € 403,12;
eeeee) O Autor efectuou as seguintes despesas, como consequência do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, das lesões sofridas e das sequelas delas resultantes: (i) obtenção do Relatório Médico, junto com a petição inicial, € 610,00; (ii) consultas médicas, € 31,92; (iii) medicamentos, € 7,14; (iv) taxas moderadoras, € 23,10; (v) tratamentos de fisioterapia, € 126,60; (vi) exames complementares de diagnóstico, € 54,00; (vii) 1 suporte do ombro esquerdo/imobilização, € 55,41; (viii) 1 deslocação de táxi, € 58,45; (ix) custo de 1 certidão de nascimento/registo Civil € 10,00; (x) custo de 2 certidões da Cons. Registo Automóvel, € 34,00;
fffff) E o Autor viu danificadas e inutilizadas as seguintes peças de vestuário e calçado: (i) 1 casaco € 50,00; (ii) 1 par de calças € 75,00; (iii) 1 camisola (polo) € 35,00;
ggggg) E viu danificados e inutilizados os seguintes objectos de uso pessoal: (i) 1 telemóvel ... € 249,00; (ii) 1 relógio de pulso desportivo – ... € 195,00 ; (iii) 1 capacete de prptecção/motociclista € 55,00;
hhhhh) Para a Ré estava transferida, à data do embate, a responsabilidade civil por danos causados a terceiros pelo veículo de matrícula ..-..-JT, através de contrato de seguro titulado pela apólice nº ...00.”.
*
Foram dados como não provados os seguintes factos:
“Factos não provados
Da petição inicial: artigos 8º a 10º, 64º e 65º, 69º a 73º, 82º a 85º, 91º, 94º e 95º, 99º a 104º, 108º, 122º e 123º, 158º e 159º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea uuuu), 171º, 173º e 174º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea mmmm), 175º a 195º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas gggg), hhhh) e uuuu), 196º e 197º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas nnnn) a uuuu), 200º a 204º, 207º a 225º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas nnnn) a uuuu), 236º e 237º, 242º a 250º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas nnnn), rrrr) e tttt), 251º a 255º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea qqqq), 256º a 269º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas rrrr) e tttt), 270º a 278º, 283º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea eeeee), e 287º a 298º.
Da contestação da Ré: inexiste, neste âmbito, factualidade a que cumpra responder.”.
*
IV. Do objecto do recurso. 

Discordam apelante e apelante subordinado do montante de indemnização fixado na sentença a título de dano patrimonial futuro, entendendo a ré que a mesma deve ser fixada no valor global de cerca de € 12.590,00, e o autor em quantia não inferior a 38.000,00 €.
Mais discordam ambos do montante fixado a título de indemnização por danos não patrimoniais, entendendo a ré que o mesmo deve ser fixado em € 15.000,00, e o autor em € 40.000,00 não actualizados mas antes reportando-se à data da instauração da acção.
Na sentença apelada foi fixado o valor de € 24.308,49 a título de dano patrimonial futuro e a quantia de € 24.000,00, a título de danos não patrimoniais, actualizados à data da sentença.
Vejamos.
Tem sido entendido pelo STJ que a lesão corporal sofrida em consequência de um acidente de viação constitui em si um dano real ou dano-evento, designado por dano biológico, na medida em que afecta a integridade físico-psíquica do lesado, traduzindo-se em ofensa do seu bem “saúde”.
Trata-se de um “dano primário”, do qual podem derivar, além das incidências negativas não susceptíveis de avaliação pecuniária, a perda ou diminuição da capacidade do lesado para o exercício de atividades económicas, como tais susceptíveis de avaliação pecuniária.
Trata-se, assim, neste âmbito, de ressarcir danos que ainda não se concretizaram, mas que, de acordo com o curso normal das coisas, de acordo com o que é previsível em face das circunstâncias, sempre virão a concretizar-se no futuro (cfr., entre outros, o Ac. do STJ de 02.06.2016, relator Tomé Gomes, in www.dgsi.pt).
Como se afirma no Ac. da Relação de Lisboa de 22.11.2016, relator Luís Filipe Pires de Sousa, in www.dgsi.pt, tal dano consiste numa “incapacidade funcional ou fisiológica que se centra, em primeira linha, na diminuição da condição física, resistência e capacidade de esforços, por parte do lesado, o que se traduz numa deficiente ou imperfeita capacidade de utilização do corpo, no desenvolvimento das atividades pessoais, em geral, e numa consequente e, igualmente, previsível maior penosidade, dispêndio e desgaste físico na execução das tarefas que, no antecedente, vinha desempenhando, com regularidade”.
No caso dos autos, as sequelas com que o autor ficou afectado constituem uma limitação relativamente à situação anterior ao acidente. Aquelas sequelas, constituem uma fonte de limitações na actividade profissional do autor e nas suas actividades correntes.
Ora, a compensação do dano biológico tem como base e fundamento a perda ou diminuição de capacidades funcionais que, mesmo não importando perda ou redução da capacidade para o exercício profissional da actividade habitual do lesado, impliquem ainda assim um maior esforço no exercício dessa actividade e/ou a supressão ou restrição de outras oportunidades profissionais ou de índole pessoal, no decurso do tempo de vida expectável, mesmo fora do quadro da sua profissão habitual.
Como se defende no Acórdão deste Tribunal da Relação de Guimarães de 03.05.2018, disponível em www.dgsi.pt, e com o qual concordamos: “Neste âmbito, considera-se hoje lição pacífica da jurisprudência que se deverá distinguir entre a incapacidade fisiológica ou funcional, por um lado, e a estrita incapacidade para o trabalho ou incapacidade laboral por outro.
Quanto à primeira, a repercussão negativa da respetiva incapacidade permanente centra-se na diminuição da condição física, da resistência e da capacidade de esforços por parte do lesado, o que se traduzirá numa deficiente ou imperfeita capacidade de utilização do corpo no desenvolvimento das atividades pessoais em geral e numa consequente e igualmente previsível maior penosidade, dispêndio e desgaste físico na execução das atividades diárias, incluindo, eventualmente, se for o caso, as suas tarefas profissionais.
É precisamente neste agravamento da penosidade (de carácter fisiológico ou físico-psíquico) e consequente maior esforço, maior sacrifício/penosidade no desempenho das atividades profissionais e, ainda, uma menor qualidade/conforto de vida em geral, decorrente da afetação da saúde, que deve radicar-se o arbitramento da indemnização pelo dano biológico.
Nesta perspetiva, e como já antes se referiu, há, pois, lugar ao arbitramento de indemnização por danos patrimoniais, mesmo que se não haja feito prova de que o lesado, por força de uma incapacidade, venha a sofrer de qualquer diminuição dos seus proventos conjeturais futuros (diminuição da capacidade geral de ganho) ou, ainda, mesmo que não haja prova de uma estrita incapacidade para o desempenho da atividade profissional habitual, bastando, antes, que se tenha por demonstrado que o desempenho profissional (e a consequente manutenção do mesmo nível de rendimentos) obriga a maiores esforços, a maior penosidade no desempenho de tais atividades, sendo indiscutível o ressarcimento deste dano.
Trata-se, no fundo, de indemnizar a se o dano corporal sofrido, quantificado por referência a um índice 100 (integridade psicossomática plena), e não qualquer perda efetiva de rendimento ou de concreta privação da capacidade de angariação de réditos, que pode não existir ou não ficar comprovada.
Tal entendimento, que vem sendo acolhido pela jurisprudência, ao nível das Relações e do Supremo Tribunal de Justiça, tem na sua base a ideia de que a existência de uma incapacidade física, em consequência de lesões provocadas no corpo e na saúde do lesado, afeta, necessariamente, a sua capacidade funcional, pois que este verá afetadas as condições normais de saúde necessárias ao desenvolvimento adequado e normal daquela, sempre lhe exigindo um esforço ou transtorno acrescido, independentemente da sua repercussão negativa a nível salarial”.
Diz-se ainda nesse acórdão que, por não se considerar o dano biológico ou dano na saúde apenas na sua vertente laboral, mas também na sua vertente pessoal, das actividades diárias e correntes, que não cessam com o termo da vida activa ou idade da reforma, o horizonte temporal a considerar para efeitos do cálculo do dano patrimonial futuro, como tem sido também perfilhado pelo STJ (por todos, cfr. Ac. STJ de 26.01.2016, Ac. STJ de 07.04.2016 e Ac. STJ de 10.11.2016), não pode ser apenas aferido em função da idade da reforma, mas sim pelo termo expectável da vida do lesado, segundo os dados oficiais.
Assim, deve ter-se em conta a esperança média de vida do lesado, uma vez que as suas necessidades básicas não cessam no dia em que deixar de trabalhar por virtude da reforma, sendo manifesto que será nesse período temporal da sua vida que as suas limitações e situações de dependência, ligadas às sequelas permanentes das lesões sofridas, com toda a probabilidade mais se acentuarão.
A afectação da integridade físico-psíquica, designada como dano biológico, pode ter como consequência danos de natureza patrimonial e de natureza não patrimonial.
Como se afirma no Ac. desta Relação de Guimarães, de 11.01.2024, relator Alcides Rodrigues, in www.dgsi.pt, “Na sua dimensão patrimonial o dano biológico tem sido perspetivado na vertente de lucros cessantes, enquanto perda de capacidade de ganho ou, como hoje se designa, défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, na medida em que respeita a incapacidade funcional
Afirma-se, repetidamente, que esta incapacidade funcional, mesmo que não impeça o lesado de continuar a trabalhar e que dela não resulte perda ou diminuição de vencimento, importa necessariamente dano patrimonial (futuro), que deve ser indemnizado, já que a força do trabalho do homem, porque lhe propicia fonte de rendimentos, é um bem patrimonial, sendo certo que essa incapacidade obriga o lesado a um maior esforço para manter o nível de rendimentos auferidos antes da lesão.
Aliás, atualmente não oferece controvérsia que o facto de o lesado não exercer, à data do facto lesivo, qualquer profissão remunerada não afasta a existência de dano patrimonial pela incapacidade funcional de que o mesmo ficou a padecer em consequência dessa lesão, compreendendo-se neste as utilidades futuras e as simples expectativas de aquisição de bens, sendo que a força de trabalho de uma pessoa é um bem, sem dúvida, capaz de propiciar rendimentos”
Como se salienta no Ac. do STJ de 25/11/2009 (relator Raúl Borges), in www.dgsi.pt.,neste leque, cingindo-nos agora à incapacitação para o trabalho, encontrar-se-ão os indivíduos lesados que se encontram fora do mercado do trabalho, da vida activa laboral, e considerando a duração cronológica de vida, seja a montante – caso das crianças e dos jovens, ainda estudantes, ou não, mas que ainda não ingressaram no mundo laboral –, seja, a juzante, com os reformados/aposentados, que dele já saíram, sem esquecer os que estando fora destes parâmetros temporais, situando-se pela sua idade no período de vida activa, estão porém fora daquele mercado, porque desempregados (…)”.
Como afirma Maria da Graça Trigo Cfr. O conceito de dano biológico (…), p. 262. «é possível formular a seguinte conclusão: se, ao longo da segunda metade do século XX, bem como dos primeiros anos do século XXI, a jurisprudência nacional foi aperfeiçoando os critérios a ponderar na fixação equitativa da indemnização por danos patrimoniais futuros (traduzidos em perda de rendimentos) causados pela incapacidade laboral específica, isto é, causada pela afectação da capacidade do lesado para o exercício da sua actividade profissional à data da ocorrência da lesão física, os procedimentos utilizados não tinham em conta – ao menos de forma sistemática – a circunstância de que a afectação, em maior ou menor grau, da capacidade laboral genérica das vítimas é, também ela, susceptível de determinar perdas de rendimentos e, portanto, danos patrimoniais futuros. Esta omissão mostrava-se especialmente evidente nas seguintes situações:
a) Situação de lesado menor de idade que, em razão da idade, não exerce qualquer profissão no momento do evento danoso;
b) Situação de lesado que, não sendo afectado na sua capacidade laboral específica, é, porém, afectado na sua capacidade laboral genérica;
c) Situação de lesado que, em razão de circunstâncias várias de idade, saúde, dedicação à família, etc., não exerce profissão à data de ocorrência da lesão, sendo, contudo, afectado na sua capacidade laboral genérica.
Na peculiar evolução que a utilização do conceito de dano biológico tem tido na jurisprudência nacional, pode, com segurança, afirmar-se que, com tal utilização, se pretendeu precisamente dar resposta a este tipo de situações».
Em idêntico sentido, propugnando que este dano tem expressão patrimonial, Rita Mota Soares considera que, nessa óptica, «também àqueles que não exerçam ainda atividade remunerada (v.g. estudantes), àqueles que dela estejam privados (vg., desempregados), àqueles que já não se encontram no período de vida ativa (vg. Reformados e pensionistas) e àqueles que, apesar da incapacidade, mantenham a mesma profissão e/ou logrem uma reconversão que lhes assegure idêntico rendimento, assistirá o direito ao ressarcimento pelo dano biológico na vertente patrimonial, apesar de não haver perda da capacidade de ganho».

Em suma, o dano biológico abrange um leque alargado de prejuízos incidentes na esfera patrimonial do lesado, desde a perda do rendimento total ou parcial auferido no exercício da sua atividade profissional habitual até à frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer outras atividades ou tarefas de cariz económico, compreendendo igualmente a perda ou diminuição de capacidades funcionais que, mesmo não importando uma repercussão negativa no salário ou na atividade profissional do lesado, impliquem ainda assim esforços suplementares no exercício dessa atividade e/ou a supressão ou restrição de outras oportunidades profissionais ou de índole pessoal, no decurso do tempo de vida expetável, mesmo fora do quadro da sua profissão habitual”.
Por outro lado, a jurisprudência emitida pelos nossos Tribunais Superiores, em sintonia de resto com o preâmbulo e com o disposto no art. 1.º, n.º 2, da Portaria n.º 377/2008, de 26-05, vem invariavelmente decidindo que as tabelas constantes da Portaria n.º 377/2008, de 26-05, alterada pela Portaria n.º 679/2009, de 25-06, apenas relevam no plano extrajudicial ou, quando muito, como critério orientador ou referencial, mas nunca vinculativo para os tribunais (arts. 564.º e 566.º, n.º 3, do CC).
E assim, no que ao dano biológico concerne, na medida em que o critério último, obrigatório e decisivo, é a equidade, tem, inclusive, a jurisprudência fixado, quase sem excepção, valores indemnizatórios excedentes aos que resultariam da simples e “automática” aplicação desses referentes da dita Portaria.
Seguindo tal jurisprudência, com a qual concordamos, entendemos assim que na fixação do montante indemnizatório, para alcançar a justa indemnização, o tribunal não deve estar limitado pelo uso de fórmulas matemáticas, sejam elas quais forem, nem limitado pelas tabelas da Portaria n.º 377/2008, de 26-05, revista pela Portaria n.º 679/2009, de 25-06, pois que as mesmas devem servir essencialmente como instrumento de trabalho e não como critérios de determinação rígidos.
Ora, impõe o n.º 2 do art. 564º do Código Civil que sejam tidos em conta os danos futuros desde que previsíveis. Ou seja, devem ser indemnizados os danos que ainda não se concretizaram, mas que, de acordo com o curso normal das coisas, sempre virão a concretizar-se no futuro.
Quanto ao cálculo indemnização a este título, entendemos assim que há que recorrer a juízos de equidade e verosimilhança, nos termos do n.º 3 do art. 566º do Código Civil, tendo por referência a obtenção de “um capital produtor do rendimento que o lesado não irá auferir, que se extinga no fim da sua vida provável e que seja susceptível de garantir, durante essa vida, o rendimento frustrado” (cfr. neste sentido Acs. STJ de 16.06.2016, de 21.01.2016, e de 07.06.2019, todos disponíveis em www.dgsi.pt).
Com efeito, o cálculo da indemnização em dinheiro deve ser feito segundo a denominada fórmula ou teoria da diferença, prevista no nº 2 do art. 566º do Código Civil. Se esta fórmula não puder ser aplicada por ser indeterminado o montante dos danos, o mesmo é dizer, se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (nº 3 do citado art. 566º); a equidade funcionará então como último recurso para permitir alcançar uma definição concreta do conteúdo de um direito subjectivo, designadamente do direito a uma indemnização, quando o valor exacto dos danos não foi apurado.
Visando os montantes indemnizatórios que são objecto do presente recurso reparar e compensar danos em que não é possível a reconstituição natural, a indemnização em dinheiro deve ser fixada segundo juízos de equidade (fixação equitativa da indemnização), visando a procura da mais justa das soluções.
E, como vem sendo pacificamente entendido na jurisprudência, a utilização de critérios de equidade não deve impedir que se tenham em consideração as exigências do princípio da igualdade, no sentido de uma tendencial uniformização de parâmetros na fixação judicial das indemnizações, como também deverá ser dada a devida atenção às circunstâncias do caso concreto (cfr. neste sentido Acs. do STJ de 04.06.2015 e de 06.12.2017, ambos disponíveis em www.dgsi.pt).
Com efeito, é hoje pacificamente entendido na jurisprudência que a utilização de critérios de equidade não pode deixar de considerar as exigências decorrentes do princípio da igualdade, no sentido de uma tendencial uniformização de parâmetros na fixação judicial das indemnizações, sem prejuízo de serem atendidas as especificidades de cada caso concreto (vide, por todos, o Ac. do STJ de 17.01.2023, relator António Barateiro Martins, in www.dgsi.pt).
Na jurisprudência do STJ, o cálculo dessa indemnização, segundo um juízo equitativo, tem variado, essencialmente, em função dos seguintes factores:
(i) a idade do lesado e a sua esperança média de vida;
(ii) o seu grau de incapacidade geral permanente (isto é, a percentagem do défice funcional permanente da integridade físico-psíquica);
(iii) as suas potencialidades de ganho e de aumento de ganho do lesado, anteriores à lesão, tanto na profissão habitual, como em profissão ou actividades económicas compatíveis com as suas qualificações e aquele défice;
(iv) conexão entre as lesões psicofísicas sofridas e as exigências próprias de actividades profissionais ou económicas do lesado, compatíveis com as suas habilitações e/ou formação; e
(v) jurisprudência anterior, por referência a decisões temporalmente próximas e nas quais estejam em causa situações fácticas essencialmente similares (cfr. neste sentido e por todos Ac. do STJ de 06.06.2023, relator Manuel Capelo, disponível in www.dgsi.pt.).
E, como se decidiu no Ac. do STJ de 25.05.2017, relatora Maria da Graça Trigo, in www.dgsi.pt., “o aumento da penosidade e esforço para realizar as tarefas diárias pode ser atendido no âmbito dos danos patrimoniais (e não apenas dos danos não patrimoniais), na medida em que se prove ter como consequência provável a redução da capacidade de obtenção de proventos, no exercício de actividade profissional ou de outras actividades económicas”.
No caso dos autos temos que:
i) o autor nasceu em ../../1952, tendo 68 anos à data do acidente;
ii) Em consequência das lesões sofridas, ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade física-psíquica de 8 pontos;
iii) A consolidação médico-legal definitiva das lesões sofridas pelo autor foi fixada no dia 1 de Fevereiro de 2021;
iv) O autor passou a depender de ajudas medicamentosas, sem as quais, por causa das dores, não conseguirá ultrapassar as suas dificuldades em termos funcionais e nas situações de vida diária, que no caso se consubstanciam na toma de analgésicos, em SOS, e anti-inflamatórios tópicos, numa média de um creme analgésico por mês e vinte comprimidos por mês, até ao fim da vida;
v) Em consequência as lesões e sequelas sofridas, o autor ficou com dificuldade em estender a roupa num estendal elevado, em tratar da sua higiene pessoal na parte posterior do tronco e da cabeça com a mão esquerda e tem tendência para adormecer sobre o lado direito do corpo por sentir dor no ombro esquerdo;
vi) Em consequência as lesões e sequelas sofridas, o autor, quando leccionava, deixou de fazer trabalhos com régua e esquadro, deixou de manipular o x-acto e a régua no quadro e sempre que tivesse de manter os membros superiores elevados, tendo, por causa disso e no âmbito escolar, beneficiado da coadjuvância (auxílio de um outro professor), em face das suas limitações;
vii) O autor é professor, actualmente aposentado;
viii) Não teve qualquer responsabilidade na eclosão do acidente, sendo esta da inteira responsabilidade do condutor do veículo automóvel segurado.
ix) A sua esperança média de vida (actualmente 78 anos).
Destes factores ressalta desde logo à vista o Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 8 pontos.
Para além disso, terá de ser considerada a acrescida penosidade e esforço no exercício da actividade diária e corrente do autor, de modo a compensar e ultrapassar as deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas.
Para aferir da adequação do valor a fixar, face aos valores das decisões mais actualistas, temos:
- Ac. do STJ de 03.12.2015, relator Tomé Gomes, in www.dgsi.pt. numa situação em que a autora, com quase 73 anos de idade à data do acidente, não exercia uma actividade profissional remunerada, ocupando-se das lides domésticas do seu agregado familiar e tendo ficado afectada nesta actividade com uma incapacidade de 10% resultante das sequelas sofridas, foi considerada ajustada uma indemnização de base no valor de € 15.000,00;
- Ac. do STJ de 06.02.2020, relatora Rosa Tching, in jurisprudencia.pt numa situação em que o autor com défice funcional de 19 pontos, implicando um acréscimo de esforço físico no desenvolvimento da sua actividade, de consultas médicas, tendo, praticamente, 63 anos de idade, sendo previsível que se mantivesse profissionalmente activo até atingir os 70 anos de idade, foi mantido o montante de € 40.000.00 arbitrado no acórdão recorrido.
– Ac. do STJ de 29.10.2020, relatora Maria da Graça Trigo, in www.dgsi.pt, em que foi fixada a indemnização relativa ao dano biológico no montante € 32 000,00 (trinta e dois mil euros), numa situação em que a lesada tinha 62 anos de idade, à data do acidente, foi atendida uma esperança média de vida até aos 83 anos de idade, auferia uma quantia mensal no montante de € 2230,94 e ficou a padecer de um défice funcional permanente quantificado em 9,71 pontos;
- Ac. da Relação do Porto de 09.12.2020, relatora Ana Paula Amorim, in www.dgsi.pt., julgou adequado e proporcional para ressarcir o dano biológico, na vertente de dano patrimonial, a quantia de € 22.000,00, quando a lesada, com 53 anos, atropelada na passadeira, sofreu traumatismo do ombro esquerdo, foi submetida a intervenções cirúrgicas, exercia a profissão de empregada doméstica, ficou com um défice funcional permanente de integridade físico-psíquica de 11 pontos, sem repercussão na atividade profissional habitual, mas que implica esforços suplementares;
- Ac. STJ de 12.01.2022, nº de processo 6158/18.5T8SNT.L1.S1, onde perante um circunstancialismo apurado de que “A A. ficou a padecer, consequência do acidente e lesões sofridas com o mesmo, de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 9 pontos de 100 [código Md803], sendo tais sequelas permanentes compatíveis com o exercício da atividade profissional de ... e exigem esforços suplementares no exercício da atividade profissional de”, tendo à data do acidente 59 anos se entendeu fixar em € 25.000,00 o valor indemnizatório para reparar o dano biológico;
- Ac. do STJ de 07.03.2023, relator João Capelo, in www.dgsi.pt, onde foi mantida a indemnização relativa ao dano biológico no montante € 24 171,91, numa situação em que o lesado tinha 71 anos de idade, à data do acidente, considerou-se uma esperança média de vida até aos 78 anos de idade, auferia uma pensão mensal no montante de € 400,00 e ficou a padecer de um défice funcional permanente quantificado em 37 pontos, abandonou a prática de karaté, adquiriu claudicação e dificuldade de utilização do pedal de embraiagem com a consequente dificuldade na atividade de condução;
- Ac. deste Tribunal da Relação de Guimarães de 24.10.2024, relatora Raquel Baptista Tavares, in www.dgsi.pt, onde se sumaria:
“...
II - Tendo a Autora, à data do acidente 70 anos de idade, mas vivendo sozinha, executando as lides domésticas sozinha, participando ainda em atividades da freguesia, frequentando a igreja e fazendo convívios, e tendo ficado afetada por Défice Funcional Permanente de Integridade Físico-Psíquica fixável em 20 pontos, sendo que as sequelas de que ficou a padecer a impossibilitam de carregar e/ou manipular objetos com o braço direito, não conseguindo efetuar tarefas que exijam movimentos do braço direito devido à rigidez muscular, ficando com limitação funcional na higiene e no vestuário, decorrente da incapacidade de movimentar o membro superior direito, sendo de prever, atendendo ao tipo e à gravidade das lesões um agravamento futuro do quadro clínico da Autora e das limitações físicas de que a mesma padece, tendo ficado, após o acidente e em consequência do mesmo, condicionada na execução das lides domésticas, como a limpeza da casa e a alimentação, bem como na sua higiene e vestuário, entende-se justa e adequada a indemnização de €30.000,00 a título de dano biológico”.
Tudo ponderado, tendo por base critérios equitativos, em conformidade com o disposto no citado n.º 3 do art. 566º do Cód. Civil, não se tem por desadequado o valor fixado pela 1ª instância pelas consequências patrimoniais da afectação da capacidade geral ou funcional do lesado (o denominado “dano biológico”), em virtude do acidente dos autos.
É que, o juízo prudencial e casuístico feito na sentença recorrida situa-se dentro da margem de discricionariedade que legitima o recurso à equidade e não colide com os padrões jurisprudenciais adotados pelos nossos Tribunais Superiores em casos análogos.
Não há assim, razões para dele discordar.
Nesta medida, improcede este fundamento da apelação (quer do recurso independente, quer do recurso subordinado).
*
Mais discordam ambos as apelantes do montante fixado a título de indemnização por danos não patrimoniais, entendendo a ré que o mesmo deve ser fixado em € 15.000,00, e o autor em € 40.000,00, ao invés dos € 24.000,00 arbitrados.
Vejamos.

A regra que fundamenta a indemnização dos danos não patrimoniais é o art. 496º do Código Civil, dispondo:
1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
2. (...)
3. O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º; (…)”.
Ensina-nos Antunes Varela que: “Danos não patrimoniais – são os prejuízos (…) que, sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a honra, o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização. (...) O montante da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais deve ser calculado em qualquer caso (haja dolo ou mera culpa do lesante) segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização, às flutuações do valor da moeda, etc. E deve ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida”. (“Das Obrigações em Geral”, 6ª edição, l°, pg. 571).
Com efeito, a fixação dos valores indemnizatórios por danos não patrimoniais ocorre segundo um juízo de equidade, tal como disposto no nº 4 do art. 496º do Código Civil, sendo, a esse propósito, paradigmática a afirmação constante do Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 17.07.2009 (proc. nº 1943/05.0TJVNF.P1, disponível em www.dgsi.pt): “O montante da indemnização por danos não patrimoniais deve ser proporcionado à gravidade dos danos, apreciados objectivamente, sem consideração de critérios meramente subjectivos, não sendo de acolher pretensões manifestamente excessivas, mas também excluindo tendências banalizadoras dos valores e interesses morais, como a saúde, a integridade física, o bem estar, etc., que se pretende defender.”
Como se esclarece no acórdão do STJ, de 21.4.2022 (processo nº 96/18.9T8PVZ.P1.S1 in www.dgsi.pt)o dano não patrimonial não se reconduz a uma única figura, tendo vários componentes e assumindo variados modos de expressão, abrangendo:
(i) o chamado quantum (pretium) doloris, que sintetiza as dores físicas e morais sofridas no período de doença e de incapacidade temporária, com tratamentos, intervenções cirúrgicas, internamentos, a analisar através da extensão e gravidade das lesões e da complexidade do seu tratamento clínico;
(ii) o “dano estético” (pretium pulchritudinis), que simboliza o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões que resistiram ao processo de tratamento e recuperação da vítima;
(iii) o “prejuízo de distracção ou passatempo”, caracterizado pela privação das satisfações e prazeres da vida, vg., com renúncia a actividades extra-profissionais, desportivas ou artísticas;
(iv) o “prejuízo de afirmação social”, dano indiferenciado, que respeita à inserção social do lesado, nas suas variadas vertentes (familiar, profissional, sexual, afectiva, recreativa, cultural, cívica), integrando este prejuízo a quebra na “alegria de viver”;
(v) o prejuízo da “saúde geral e da longevidade”, em que avultam o dano da dor e o défice de bem estar, e que valoriza as lesões muito graves, com funestas incidências na duração normal da vida;
(vi) os danos irreversíveis na saúde e bem estar da vítima e o corte na expectativa de vida;
(vii) o prejuízo juvenil “pretium juventutis”, que realça a especificidade da frustração do viver em pleno a chamada primavera da vida, privando a criança das alegrias próprias da sua idade;
(viii) o “prejuízo sexual”, consistente nas mutilações, impotência, resultantes de traumatismo nos órgãos sexuais;
(ix) o “prejuízo da auto-suficiência”, caracterizado pela necessidade de assistência duma terceira pessoa para os actos correntes da vida diária, decorrente da impossibilidade, de se vestir, de se alimentar”.
Ora, no caso dos autos temos que:
- Em consequência do embate o autor sofreu lesões corporais várias, nomeadamente, traumatismo importante do ombro esquerdo, traumatismo da omoplata esquerda, traumatismo da mão esquerda, traumatismo do dedo polegar esquerdo, luxação do ombro esquerdo, luxação da omoplata esquerda, luxação do dedo polegar esquerdo, luxação da articulação escapulo umeral esquerda, com fractura do troquiter, com desvio mínimo, luxação da articulação interfalângica do dedo polegar esquerdo, traumatismo do joelho direito, traumatismo do joelho esquerdo, traumatismo do cotovelo esquerdo, ferida (de exposição) do dedo polegar da mão esquerdo, escoriações e hematomas espalhados pelo corpo;
- Foi transportado, na ambulância do I.N.E.M. para o Hospital ..., de ..., EPE, onde lhe foram prestados os primeiros socorros, no respectivo Serviço de Urgência;
- Foram-lhe, aí, efectuados exames radiológicos – R.X. -, às regiões do seu corpo atingidas, prescritos medicamentos vários, nomeadamente analgésicos e anti-inflamatórios;
- Do Serviço de Urgência, o autor foi transferido para o Bloco Operatório do Hospital de ..., de ...;
- Em virtude de resultados infrutíferos – impossibilidade - na tentativa da redução, no Serviço de Urgência, das luxações em ambas as articulações – ombro e dedo polegar esquerdos, fez análises clínicas, foi-lhe administrada uma anestesia geral e foi submetido a uma intervenção cirúrgica consubstanciada na redução das luxações do ombro esquerdo e do dedo polegar da mão esquerda;
- Foi-lhe, aí, efectuada limpeza cirúrgica à ferida de exposição do dedo polegar da mão esquerda, efectuada estabilização IF do dedo polegar da mão esquerda, com a aplicação de uma tala de Zimmer;
- E foi-lhe, aí, prescrito um Aparelho de Imobilização do membro superior esquerdo – MSI – contra o tronco;
- O autor viu-se na necessidade de usar, como usou a Tala de Zimmer, no dedo polegar da mão esquerda, ao longo de um período de tempo de quarenta dias;
- E viu-se na necessidade de usar o Aparelho de Imobilização do membro superior esquerdo (MSE), ao longo de um período de tempo de vinte e sete dias;
- No dia seguinte ao da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, o Autor obteve alta do Hospital ..., e regressou à sua casa de habitação;
- E continuou a ser seguido no Hospital Particular ..., onde lhe foi prescrito tratamento de fisioterapia, que o autor cumpriu ao longo de 60 sessões, consubstanciadas em: (i) massagens com técnicas especiais; (ii) banhos de remoinho ou turbilhão; (iii) fortalecimento muscular manual; (iv) técnicas especiais de cinesiterapia; e (v) treino em actividades de vida diária e que incidiram nas regiões do ombro esquerdo, da mão esquerda e do dedo polegar da mão esquerda;
- Foi, igualmente, o autor assistido no Centro de Saúde ..., onde foi submetido à extracção dos pontos de sutura, a lavagens, desinfecções, curativos e mudança e substituição de pensos ao dedo polegar da mão esquerda;
- Tendo, ainda, acorrido a duas consultas da especialidade de ortopedia, na Policlínica ...;
- No momento do embate e nos instantes que o precederam, o autor assustou-se;
- Em consequência do embate supradescrito, o autor ficou, no membro superior esquerdo, com (i) amiotrofia da região escapular e braquial, esta última mais ligeira, medida a 16 centímetros do olecrano (com 28,5 centímetros à esquerda e 29 centímetros à direita), (ii) limitação da mobilidade do ombro, realizando de forma passiva um arco de flexão e abdução de 0º a 150º, com rotação externa dentro dos parâmetros da normalidade e rotação interna dolorosa de 0º a 150º; (iii) dificuldade em posicionar a mão na nuca;
- Em consequência do embate supradescrito, o autor ficou, no primeiro dedo do membro superior esquerdo, com (i) cicatriz nacarada, irregular, com vestígios de pontos de sutura, não hipertrófica e não aderente aos planos profundos, na articulação interfalângica do polegar, na face palmar, com 4 centímetros; (ii) apagamento das pregas da referida articulação na face dorsal; e (iii) quase anquilose da articulação interfalângica;
- Em consequência as lesões e sequelas sofridas, o autor ficou com dificuldade em estender a roupa num estendal elevado, em tratar da sua higiene pessoal na parte posterior do tronco e da cabeça com a mão esquerda e tem tendência para adormecer sobre o lado direito do corpo por sentir dor no ombro esquerdo;
- Em consequência as lesões e sequelas sofridas, o autor deixou de fazer ciclismo de montanha, bem como de conduzir motociclos, por receio de cair;
- O autor frequentava o ginásio e praticava ciclismo e motociclismo;
- As lesões sofridas pelo autor determinaram-lhe:
 Um Período de Défice Funcional Temporário Total de 2 dias;
 Um Período de Défice Funcional Temporário Parcial de 225 dias;
 Um período de Repercussão Temporária na Actividade Profissional Total de 227 dias;
 Um quantum doloris fixável no grau 4, numa escala de 1 a 7;
 Um Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 8 pontos;
 Um Dano Estético Permanente fixável no grau 1, numa escala de 1 a 7;
 Uma repercussão permanente nas Actividades Desportivas e de Lazer fixável no grau 1, numa escala de 1 a 7;
- O autor obteve a consolidação médico-legal definitiva no dia 01.02.2021;
- As lesões e sequelas de que ficou a padecer desgostam o autor;
- O autor passou a depender de ajudas medicamentosas, sem as quais, por causa das dores, não conseguirá ultrapassar as suas dificuldades em termos funcionais e nas situações de vida diária, que no caso se consubstanciam na toma de analgésicos, em SOS, e anti-inflamatórios tópicos, numa média de um creme analgésico por mês e vinte comprimidos por mês, até ao fim da vida;
- O autor nasceu no dia ../../1952.
Também quanto a estes danos (não patrimoniais), cabe agora verificar se o valor fixado na sentença apelada se mostra em sintonia com os critérios de avaliação previstos na lei e não se afasta dos padrões jurisprudenciais que, numa jurisprudência actualista, vêm sendo seguidos na concretização do casuístico juízo equitativo.
Atentemos nos seguintes arestos:
- Ac. do STJ, de 12.01.2017, relatora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, in www.dgsi.pt, que confirmou a atribuição de uma indemnização de € 15.000,00 a uma lesada de 60 anos, que: sofreu (para além de hematomas, escoriações várias no tronco e feridas superficiais em todo o corpo) traumatismo cranioencefálico (caracterizado por ferida do couro cabeludo - região parietal direita medindo 5 cm - e pequena hemorragia subaracnoídea), fractura da 11.ª costela direita, fractura das apófises transversais direitas de L.1, L.2 e L.3, luxação do ombro esquerdo, luxação do ombro direito, fractura da bacia (ramo isquiopúbico, com contusão da parede abdominal), cicatriz normocrónica medindo 10 cm na zona abdominal, paramediana esquerda, e traumatismo do joelho direito; foi submetida a intervenções e tratamentos agressivos, penosos e demorados (incluindo 113 sessões de fisioterapia); viu a sua autonomia e capacidade de desenvolver a sua vida habitual muito limitadas (não consegue dormir para o lado esquerdo devido às dores que sente ao nível do ombro e anca, não consegue fazer carga de sacos de compras ou de qualquer outros pesos, não as podendo arrumar nos veículos automóveis ou prateleiras da dispensa, devido às limitações de mobilidade do ombro e pernas e à dor desencadeada em esforço, não consegue andar de joelhos, aninhar-se, apertar os sapatos ou fazer quaisquer outros esforços que obriguem a curvar-se, devido às dores agudas que tais esforços lhe causam, deixou de poder fazer caminhadas, por pequenas que sejam, pois não consegue aguentar-se de pé por muito tempo, o que a obriga a sentar-se recorrentemente para recuperar das dores e para não cair, os primeiros movimentos ao sair da cama e ao iniciar a marcha tornam-se instáveis e dolorosos e só gradualmente e ao fim de algum tempo consegue recuperar a marcha, e cada gesto, cada movimento mais brusco transforma-se num verdadeiro calvário, sendo tais dores e mais limitações físicas impeditivas da realização, no quotidiano, das lides domésticas e de outras actividades que exijam mobilidade e disponibilidade física), o que muito a entristece e a faz temer o futuro; sofreu e sofre dores, medo (viu a morte à sua frente) e angústia (viu a sua qualidade de vida mudar para pior, tem ocasionalmente dificuldades em dormir e, por vezes, pesadelos relacionados com o acidente).
- Ac. desta Relação de Guimarães, de 30.05.2019, relatora Margaria Sousa, in www.dgsi.pt, que atribuiu uma indemnização de € 15.000,00 a um lesado de 48 anos de idade que, para além de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 4 pontos (compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicando esforços suplementares), sofreu luxação do ombro esquerdo e fractura de dois arcos costais; a cura das lesões demandou 205 dias no total, com imobilização do membro superior esquerdo durante um período de seis semanas e a inerente alteração da sua vida pessoal, familiar e profissional; o período de repercussão temporária na actividade profissional total foi de 150 dias; o quantum doloris situou-se acima da média (4 numa escala de 0 a 7); as dores e as dificuldades acrescidas na realização das tarefas quotidianas (traduzidas no défice funcional de 4 pontos) irão acompanhá-lo ao longo de toda a sua vida; e ficou a padecer de um dano estético permanente fixável no grau 2 (em 7).
- Ac. do STJ de 06.06.2019, relatora Maria do Rosário Morgado, in www.dgsi.pt onde se entendeu adequado o montante indemnizatório de € 22.000,00 pelos danos não patrimoniais sofridos, referente a lesada com 64 anos à data do acidente, com défice funcional de 10 pontos e resultando dos factos provados que: “(i) a recorrente foi sujeita a intervenções cirúrgicas; (ii) sofreu dores quantificáveis em 5 numa escala de 7 pontos; (iii) sofreu um dano estético quantificado em 2 pontos; (iv) e ficou a padecer de um quadro ango-depressivo; revela-se ajustado o montante de € 22 000 fixado pela Relação (em lugar do valor de € 30 000 achado em 1.ª instância) para compensar os danos não patrimoniais por aquela sofrido”.         
- Ac. do STJ, de 12.01.2022, relatora Maria da Graça Trigo, in www.dgsi.pt que fixou uma indemnização de € 25.000,00, a uma lesada que tinha 59 anos de idade, que: teve um período de défice funcional temporário total fixável em 3 dias, um período de défice funcional temporário parcial fixável em 5 dias e um período de incapacidade temporária profissional total de 108 dias; teve um sofrimento físico e psíquico vivenciado durante o período de danos temporários (considerando as lesões do mesmo resultantes, o período de recuperação funcional, o tipo de traumatismo e os tratamentos efetuados) quantificável num grau 4 numa escala de 7 de gravidade crescente; ficou com um dano estético fixado em termos médico-legais no grau 2, numa escala de 7 graus de gravidade crescente; mantém rigidez da coluna cervical, após subluxação de C5-C6 tratada cirurgicamente, com dores frequentes e limitação funcional, implicando terapêutica ocasional; ficou com um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 9 pontos, que lhe dificulta o exercício da respectiva actividade profissional, ainda que sem perda de rendimentos desta provenientes, considerando-se não ser provável, atenta a idade, que tenham sido afectadas potencialidades de aumento de ganho no exercício da profissão (ou profissões) habituais ou no exercício de outras actividades económicas; devido às sequelas, ficou com dificuldade na condução de veículos automóveis, em realizar grandes deslocações a pé, em elevar objectos acima do ombro, em passar a ferro, em usar uma mala a tiracolo e em encontrar posição confortável para dormir (por ter de mudar de posição muitas vezes durante a noite).
- Ac. da Relação de Coimbra, de 14.03.2023, relator Paulo Correia, in www.dgsi.pt, que atribuiu uma indemnização de € 18.000,00 a uma lesada de 62 anos de idade que: sofreu traumatismo do hemitorax direito com fratura de 5 arcos costais do lado direito e fratura não aguda de acordos costais do lado esquerdo; manteve-se hospitalizada durante 5 dias; efetuou, para a recuperação da sua situação clínica 11 sessões de fisioterapia, e bem assim tratamentos de medicina física e de reabilitação; ficou com as seguintes mazelas: “- Ráquis: escoliose acentuada dorso-lombar; Toráx: dor referida à palpação do hemitórax direito e com os movimentos respiratórios sem sequelas traumáticas objetiváveis. - Membro superior direito dor (referida ao hemitórax direito) à mobilização ativa do ombro, sem limitação da amplitude articular”; o tempo para a consolidação das lesões foi de 5 meses e 3 dias, com 6 dias de défice funcional temporário total e 159 dias de défice funcional temporário parcial; o quantum doloris foi de grau 4 (numa escala até 7); ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 8 pontos (numa escala até 100), com repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer de grau 4 (numa escala até 7); e que, em virtude do acidente, passou a ser uma pessoa mais reservada, que não convive do mesmo modo que antes o fazia.

- Ac. do STJ de 14.05.2024, relator Luís Espírito Santo, in www.dgsi.pt, onde se sumaria:
I – É equitativa a atribuição da compensação no montante de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) por danos não patrimoniais, nos termos do artigo 496º, nº 1, do Código Civil, ao A./lesado, de 72 anos de idade, que ao travessar na passadeira destinada aos peões foi colhido por uma viatura automóvel, sendo violentamente projectado no solo e sofrendo luxação do ombro direito, e que, em consequência das sequelas decorrentes das lesões sofridas, registou Défice Funcional Temporário Total de 19 dias; Défice Funcional Temporário Parcial de 948 dias; Repercussão Temporária na Actividade Profissional Total de 930 dias; Repercussão Temporária na Actividade Profissional Parcial de 37 dias; Quantum Doloris no grau 5/7; um Défice Funcional Permanente de Integridade Físico-Psíquica de 20 pontos em 100 (plexopatia braquial direita); Dano Estético Permanente no grau 3/7; e que, neste contexto, deixou de poder utilizar a mão direita para as mais elementares tarefas do dia a dia (escrever, comer, apertar os botões da camisa, apertar e desapertar as calças, lavar dos dentes, pentear-se, manusear o telemóvel ou o comando da televisão), necessitando da ajuda de terceiros para a realização das tarefas diárias básicas, o que acontecerá durante o resto da sua vida; de poder pescar ou caçar, conduzir o seu barco e frequentar actividades associativas e partidárias que antes desenvolvia com habitualidade e prazer; sentindo-se por tudo isto deprimido e muito triste, sem gosto e interesse pela vida, impotente e revoltado, com pesadelos e desânimo constantes, quando antes do atropelamento era uma pessoa activa e dinâmica.”
- Ac. desta Relação de Guimarães, de 11.07.2024, relator Fernando Cabanelas, in www.dgsi.pt, num caso em que a autora “realizou mais de 40 sessões de medicina física e de reabilitação, acompanhadas por tratamentos medicamentosos, realiza tratamentos de homeopatia com vista a aliviar a dor de que padece; que sofre de uma dor crónica na cervical e de limitações físicas relevantes, que condicionam a sua autonomia e independência; que antes do acidente, a autora era uma pessoa alegre e bem-disposta, extrovertida e com facilidade para as relações sociais e amante da vida ao ar livre; que em consequência do acidente tornou-se uma pessoa irritável, vive em estado de angústia e depressão, nunca mais fez caminhadas; não consegue cozinhar de forma autónoma e independente; que a autora sofreu um défice funcional temporário total de 1 dia, um défice funcional temporário parcial de 195 dias; um quantum doloris de 4, padecendo de um défice funcional permanente da integridade físico psíquica fixado em 5 pontos, tendo 41 anos à data do acidente, e sendo cozinheira independente com salário mensal declarado à segurança social de €628,83, afigura-se adequado manter as indemnizações fixadas pela 1ª instância de €18.000 a título de danos não patrimoniais”;
Ac. desta Relação de Guimarães de 11.07.2024, relatora Maria João Matos in www.dgsi.pt, onde se sumaria:
“V. Considera-se excessiva a quantia de € 25.000,00 para indemnizar lesado de 69 anos de idade, face ao número e à gravidade das lesões físicas registadas (traumatismo da coluna vertebral, traumatismo da coluna cervical, traumatismo do tórax, traumatismo do ombro esquerdo, traumatismo do membro inferior esquerdo, traumatismo do joelho esquerdo e contusão do joelho esquerdo), ao número e à gravidade das lesões psíquicas imediatamente registadas (dores muito intensas, resultantes do impacto causado pela colisão dos veículos automóveis, enorme susto e receio pela própria vida), ao número e à gravidade das lesões psíquicas que persistiram após o momento inicial do embate de veículos (dores e incómodos inerentes à deslocação do local do acidente até ao Hospital ..., onde foi prestada assistência ao Autor; dores e incómodos inerentes ao período de retenção na cama por uma semana; dores e incómodos inerentes às consultas e tratamentos a que teve de se submeter, nomeadamente às 35 sessões de fisioterapia; dores que se prolongaram por um período de tempo superior a 3 meses; e profundo desgosto pelas limitações físicas com que ficou), às sequelas advindas (dores recorrentes e agravadas pelos esforços e pelas mudanças climatéricas, limitação da mobilidade do joelho esquerdo, com dor terminal, claudicação da marcha à esquerda por gonalgia residual), ao nível global de dor sentida (fixável no grau 3, numa escala de 1 a 7), e ao período de afectação das suas actividades, tendo o acidente ocorrido em ../../2019 e a consolidação médico-legal definitiva sido obtida no dia 04 de Março de 2020 (tendo implicado período de défice funcional temporário total fixável em 1 dia, e um período de défice funcional temporário parcial fixável em 89 dias); e, por isso, deverá a dita indemnização ser reduzida à quantia de € 17.500,00, que se tem por adequada a reparar os danos não patrimoniais gerais em causa.
- Ac. deste Tribunal da Relação de Guimarães de 24.10.2024, relatora Raquel Baptista Tavares, in www.dgsi.pt, onde se sumaria:
“I - Tendo em atenção as lesões sofridas e os tratamentos a que a Autora foi sujeita, com particular destaque para o período temporal em que esteve afetada, bem como as sequelas de que ficou a padecer, tendo ainda em atenção que fruto dessas sequelas ficou com Incapacidade Permanente Geral de 20 pontos, que sofreu um quantum doloris de 4 pontos, numa escala de sete graus de gravidade crescente e ficou com um dano estético fixado num grau 3, numa escala de sete graus de gravidade crescente, julgamos adequado o montante de €20.000,00 para compensar os danos não patrimoniais sofridos, tal como pretendido pela Autora.”.

Tudo ponderado, considerando as circunstâncias dos autos, entendemos como algo excessiva, face à jurisprudência referida, a indemnização de € 24.000,00 que foi atribuída ao autor, a título de danos não patrimoniais, sendo antes mais adequada a indemnizar os danos não patrimoniais sofridos pelo autor a quantia de € 20.000,00, valor esse já actualizado.
Nestes termos, procede parcialmente a apelação da ré e improcede totalmente o recurso subordinado do autor.
*
Sumário (ao abrigo do disposto no art. 663º, n.º 7 do CPC):

I. Ao lesado que não exerça actividade remunerada (aposentado) assistirá o direito ao ressarcimento pelo dano biológico na vertente patrimonial (em resultado da afectação da sua capacidade geral ou funcional), apesar de não haver perda da capacidade de ganho.
II. O critério fundamental para a fixação, tanto das indemnizações atribuídas por danos patrimoniais futuros (vertente patrimonial do chamado dano biológico) como por danos não patrimoniais, é a equidade.
III. A utilização de critérios de equidade não deve impedir que se tenham em consideração as exigências do princípio da igualdade, no sentido de uma tendencial uniformização de parâmetros na fixação judicial das indemnizações, como também deverá ser dada a devida atenção às circunstâncias do caso concreto.
*
V. Decisão.

Perante o exposto, acordam as Juízes que compõem este Colectivo da 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar totalmente improcedente o recurso subordinado do autor e parcialmente procedente a apelação da ré, em consequência do que revogam parcialmente a sentença apelada, condenando a ré no pagamento à autora do montante de € 20.000,00 a título de danos não patrimoniais, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, contados desde a prolação da presente decisão e até efectivo e integral pagamento.
No mais, confirmam a decisão apelada.
Custas da acção e da apelação, por autor e ré, na proporção dos respectivos decaimentos.
Custas do recurso subordinado, pelo autor.
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Guimarães, 28 de Novembro de 2024

Assinado electronicamente por:
Fernanda Proença Fernandes
Maria Amália Santos
Anizabel Sousa Pereira



(O presente acórdão não segue na sua redacção as regras do novo acordo ortográfico, com excepção das “citações/transcrições” efectuadas que o sigam)