Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | PAULA RIBAS | ||
Descritores: | ANULAÇÃO DE SENTENÇA ARBITRAL CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM TARIFA DE DRENAGEM DE ÁGUAS RESIDUAIS CONFLITO DE CONSUMO | ||
Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 09/19/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | ANULAÇÃO DE SENTENÇA ARBITRAL | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO CÍVEL | ||
Sumário: | 1 – Saber se é ou não devido o pagamento de tarifa de drenagem de águas residuais constitui um conflito de consumo. 2 – Estando em causa um serviço público essencial, a natureza jurídica da tarifa não afasta a aplicação da lei dos Serviços Públicos Essenciais. 3 - Não se mostrando violadas as normas da Lei da Arbitragem Voluntária, o mérito da decisão arbitral não é sindicável na ação de anulação de decisão arbitral. | ||
Decisão Texto Integral: | Relatora: Paula Ribas 1.ª Adjunta: Anizabel de Sousa Pereira 2.ª Adjunta: Elisabete Coelho de Moura Alves Proc. 98/24.6YRGMR Anulação de decisão arbitral I – Relatório: EMP01... – Empresa de Água, Efluentes e Resíduos de ... veio formular pedido de anulação de sentença arbitral contra AA, com fundamento no disposto no art.º 46.º, n.º 3, alínea a), iii) e v) da Lei de Arbitragem Voluntária. A requerente alega, para fundamentar o pedido de anulação, que a decisão arbitral se pronunciou sobe litígio que não estava abrangido pela convenção de arbitragem, tendo as tarifas de saneamento natureza tributária, e não tendo o Tribunal Arbitral apreciado a questão suscitada e relativa à aplicação do art.º 78.º da LGT. Devidamente citado, o requerido não apresentou contestação. Na sentença arbitral proferida a aqui requerente foi condenada a indemnizar o requerido no valor de 1.028,75 euros, relativamente aos valores cobrados a título de tarifas de saneamento, desde 2006 até março de 2019. Assim, colhidos os vistos, nada obsta a que se apreciem os fundamentos do pedido de anulação. ** II – Questões a decidir:1 – Saber se a sentença se pronunciou sobre litígio não abrangido pela convenção de arbitragem. 2 – Saber se o Tribunal Arbitral deixou de se pronunciar sobre questão que lhe foi suscitada. ** III – Fundamentação de facto:Está provado, de forma que, aqui, não foi colocada em causa: 1 – Em 2006, entre o requerente e a requerida foi celebrado um contrato de fornecimento de água para a morada sita na Avenida ..., ..., ... .... 2 – Desde o início da vigência do contrato, a requerida cobrou tarifas de saneamento. 3 – A habitação do requerente não dispõe de ligação à rede geral de saneamento. 4 – Em 30/03/2023, o requerente apresentou junto dos serviços da requerida uma reclamação na qual requereu a isenção de tarifas de saneamento e o reembolso das quantias faturadas até então. 5 – Após a receção da reclamação, um dos técnicos da requerida deslocou-se ao local para apurar se a habitação em questão possuía ligação à rede geral de saneamento, o que confirmou. 6 – Em 21/07/2023, a requerida emitiu uma nota de crédito no valor de 437,00 euros para devolução das tarifas de saneamento respeitantes ao período de agosto de 2019 a julho de 2023. 7 – Em 19/09/2023, a requerida emitiu nova nota de crédito, em complemento da anterior, no valor de 35,96 euros, para devolução das tarifas respeitantes ao período de abril a julho de 2019. 8 – Entre 2006 e março de 2019, o requerente pagou, pelo menos, o valor de 1.084,96 euros a título de tarifas de saneamento. ** IV – Fundamentação de Direito:A decisão arbitral só pode ser anulada nos casos referidos no n.º 3 do art.º 46.º da Lei da Arbitragem Voluntária, designadamente, no que importa a estes autos, quando: “iii) A sentença se pronunciou sobre um litígio não abrangido pela convenção de arbitragem ou contém decisões que ultrapassam o âmbito desta; ou (…) v) O tribunal arbitral condenou em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido, conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento ou deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar”. Foram estes os fundamentos invocados pela requerente tendo em vista a anulação da decisão arbitral. Não lhe assiste razão. Começa por evidenciar-se que na contestação que apresentou perante o Tribunal Arbitral nunca a agora requerente referiu que o litígio em causa não estava submetido à convenção de arbitragem. Só depois de ser notificado da decisão desfavorável, que a condena nos exatos termos reclamados pelo aqui requerido, tal argumento foi utilizado tendo em vista a anulação a decisão. Na sua contestação, o único argumento apresentado pela requerente foi a impossibilidade de restituição da quantia peticionada, atento o disposto no art.º 78.º da Lei Geral Tributária, que entendia ser aplicável, embora aceitasse que a quantia paga pelo requerido não era devida, por facto de que tomou conhecimento em momento posterior ao seu pagamento. A requerente defende agora que este litígio não está abrangido pela convenção de arbitragem porque não é um conflito de consumo e apenas estes constituem a competência do CIAB, nos termos do art.º 4.º, n.º 1, do seu Regulamento. Entende a requerente que não está em causa um conflito de consumo porque se refere ao pagamento de tarifa de drenagem de águas residuais (TDAR) e que esta tem natureza de taxa, citando jurisprudência que atribui esta natureza à tarifa em questão, entendendo que, por estar em causa uma taxa, não está abrangida pela Lei dos Serviços Públicos Essenciais. Alega ainda que é dotada de ius imperii, como resulta do art.º 17.º dos seus Estatutos, sendo uma empresa local, que recebeu poderes do Município ..., seu acionista maioritário. Estabelece este art.º 4º, nº1, que: “1 – O Centro promove a resolução de conflitos de consumo, conflitos decorrentes do Projeto “Casa Pronta” e de outros para os quais venha a ser autorizado. 2 - Consideram-se conflitos de consumo os que decorrem da aquisição de bens, da prestação de serviços ou da transmissão de quaisquer direitos destinados a uso não profissional e fornecidos por pessoa singular ou coletiva, que exerça com caráter profissional uma atividade económica que visa a obtenção de benefícios. 3 - Consideram-se incluídos no âmbito do número anterior o fornecimento de bens, prestação de serviços ou transmissão e direitos por organismos da Administração Pública, pessoas coletivas públicas, empresas de capitais públicos ou detidas maioritariamente pelo Estado ou pelas autarquias locais, e por empresas concessionárias de serviços públicos essenciais. 4 - O Centro não pode aceitar nem decidir litígios em que estejam indiciados delitos de natureza criminal ou que estejam excluídos do âmbito de aplicação da Lei RAL. (…)” Não vemos como, atenta a natureza jurídica da requerente, considerando o que na convenção de arbitragem é definido como estando incluído no litígio de consumo, em particular a abrangência do seu n.º 3, se pode defender que o litígio entre o particular e a requerente não esteja incluído na convenção de arbitragem. Mas vejamos se está ou não em causa a aplicação da Lei dos Serviços Públicos Essenciais. A Lei 23/96, de 26/07, cria alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais, como consta do seu preâmbulo e qualifica como tal, nos termos do art.º1, o serviço de recolha e tratamento de águas residuais (n.º2, alínea f)). Considera-se prestador deste serviço qualquer entidade pública ou privada que preste ao utente qualquer dos serviços referidos no n.º2 deste art.º1.º, independentemente da sua natureza jurídica, do título a que o faça ou da existência ou não de contrato de concessão. Sobre a natureza deste diploma, escreve-se no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 06/12/2014, do Juiz Desembargador Aristides Rodrigues de Almeida, proc. 65542/12.0YIPRT.P1, in www.dgsi.pt, “é assim manifesto que as disposições deste diploma, mais do que serem imperativas, têm em vista a proteção do utente ou consumidor e são aplicáveis independentemente da natureza e da qualidade jurídicas de quem presta o serviço, da qualificação jurídica do contrato no âmbito do qual o serviço é prestado. Não estamos, portanto, perante normas que regulem a relação entre a administração e os cidadãos, entre a função administrativa – na dimensão da prestação de serviços – e a posição de administrados, que definam os direitos e deveres dos cidadãos enquanto tais, isto é, enquanto subordinados ao poder – impositivo – regulatório da administração. Estamos sim e apenas perante normas legais imperativas que regulam o consumo de um determinado bem ou serviço e definem determinados conteúdos mínimos para a sua prestação, não em ordem a definir coletivamente o modo como esse serviço chega à comunidade, mas em definir como cada consumidor em particular dele acaba por beneficiar. Que isto é assim, resulta desde logo da circunstância de as mesmas disposições da Lei n.º 23/96, de 26 de julho, se aplicarem ao fornecimento de outros bens cuja essencialidade ninguém questiona, como o gás e as telecomunicações, mas relativamente aos quais ninguém defende que os respetivos contratos se rejam pelo direito administrativo ou público. Esta posição é defendida por Carlos Ferreira de Almeida, in Serviços Públicos. Contratos Privados, Estudos em Homenagem à Professora Doutora Isabel de Magalhães Collaço, volume II, Almedina, Coimbra, 2002, págs. 122 e123, o qual sustenta que o contrato entre os utentes e os prestadores de serviços públicos essenciais não são contratos administrativos, desde logo, porque a Lei n.º 23/96 “eliminou todos os vestígios de poderes autoritários do fornecedor, substituindo-os por regras de proteção do utente”. Acrescenta que “a natureza administrativa dos contratos não seria compatível com o princípio da neutralidade, que, admitindo embora a natureza pública de alguns fornecedores, não pode conviver com certos princípios da atividade administrativa,.... Se alguns contratos de prestação de serviços públicos não podem deixar de ter natureza privada, o princípio da neutralidade impõe que a natureza privada do contrato não seja afetada pela natureza pública da entidade prestadora.” Mais adiante afirma que “(...) todas as entidades prestadoras dos serviços públicos regulados pela Lei nº 23/96 são fornecedores para o efeito de tais serviços serem considerados de consumo (…) quando o utente deles faça uso não profissional” e conclui que “os contratos de fornecimento a consumidores de serviços públicos essenciais são contratos de consumo”. A natureza da tarifa em causa – relativa à drenagem de água residual e, portanto, a um serviço público essencial -, e ainda que possa estar em causa uma taxa, não afasta a aplicação do diploma referido e do regime nele instituído. Por outro lado, estabelece o art.º 15.º do mesmo diploma que “os litígios de consumo no âmbito dos serviços públicos essenciais estão sujeitos a arbitragem necessária quando, por opção expressa dos utentes que sejam pessoas singulares, sejam submetidos à apreciação do tribunal arbitral dos centros de arbitragem de conflitos de consumo legalmente autorizados”. Decorre claramente do exposto que a prestação deste serviço pela requerente está incluída na Lei dos Serviços Públicos Essenciais e é um litígio de consumo, estando, assim, incluído na competência da convenção de arbitragem. Assim, como se conclui no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 26/03/2015, do Juiz Desembargador Mário Serrano, proc. 38/15.3YREVR.E1, in www.dgsi.pt, estando em causa um serviço público essencial, “dessa caracterização decorre a sujeição de qualquer litígio respeitante à prestação de tal serviço público essencial a um regime de arbitragem necessária, admitida pelo artº 1º, nº 1, da LAV, e desde que o utente pessoa singular opte por recorrer a mecanismo de resolução extrajudicial de conflitos, conforme o disposto no artº 15º, nº 1, da Lei nº 23/96, na redação conferida pela Lei nº 6/2011, de 10/3”. Nas palavras do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 01/07/2019, do Juiz Desembargador Miguel Baldaia de Morais, proc. 201/18.0YRPRT, com as citações dele constantes, in www.dgsi.pt, “a decisão sobre a aplicabilidade, ao caso em apreço, da norma que instituiu a arbitragem necessária passará, antes do mais, pela delimitação do conceito de “litígio de consumo no âmbito dos serviços públicos essenciais”. Na densificação desse conceito indeterminado haverá que recorrer ao regime vertido na LSPE, na qual se definem as regras a que deve obedecer a prestação de serviços públicos essenciais em ordem à proteção do utente, onde se inclui, nos serviços públicos por ela abrangidos, entre outros e no que ao caso interessa, o serviço de fornecimento de água e o serviço de recolha e tratamento de águas residuais (alíneas a) e f), do nº2, do art. 1º). Esta norma, nos seus nºs 3 e 4, considera como utente “a pessoa singular ou coletiva a quem o prestador de serviço se obriga a prestá-lo” e como prestador dos serviços “toda a entidade pública ou privada que preste ao utente qualquer dos serviços referidos no n.º 2, independentemente da sua natureza jurídica, do título a que o faça ou da existência ou não de contrato de concessão”. Como, a este propósito, salienta PINTO MONTEIRO[3], a consideração da boa-fé e dos interesses dos utentes, bem como o caráter essencial dos serviços concretamente em causa, inspiram uma série de princípios analisáveis numa série de obrigações por parte do prestador de serviço, como seja o princípio da universalidade – segundo o qual o serviço é acessível a todos os interessados, parecendo resultar deste princípio o dever de contratar imposto ao prestador do serviço –, do princípio da igualdade – que prevalecerá sobre o da liberdade contratual –, do princípio da continuidade – a fim de assegurar um funcionamento regular do serviço – e o princípio do bom funcionamento (com tudo o que isso implica em termos de qualidade do serviço, designadamente, da sua adequação, eficiência e segurança). É certo que todo o acesso ao gozo do serviço público é estruturado por lei sob a forma de contrato, entendendo-se que o direito do utente à prestação do serviço consiste num direito à celebração do contrato de prestação de serviço, como forma de assegurar que todos os utentes terão a possibilidade de aceder ao gozo de coisas, que são bens ou serviços essenciais, de utilidade pública e de interesse geral. A proteção do utente ou utilizador visada pela LSPE não se restringe, contudo, à fase do fornecimento propriamente dita, que supõe a prévia celebração de um contrato entre o utente e a concessionária, mas a toda a relação que se estabelece entre aquele e a concessionária com vista à prestação do serviço público em causa, abrangendo a fase pré-negocial e o estabelecimento das condições necessárias à celebração do contrato e à prestação do serviço. Isso mesmo é especialmente enfatizado - no que respeita ao serviço de fornecimento de água - por JORGE MORAIS CARVALHO, quando refere que o contrato em causa não consiste num simples fornecimento de uma quantidade determinada, mas na disponibilização de um sistema de abastecimento que permite ao utente a utilização do bem com as características acordadas sempre que entenda adequado: “estes contratos envolvem mais do que o simples fornecimento do bem, implicando um serviço correspondente ao acesso a uma determinada rede, pelo que existe uma duração duradoura unitária” . Como se deu nota, o objeto do litígio que motivou a apresentação da reclamação pela identificada utente, corporizou-se na questão de saber se é, ou não, devido o valor discriminado na fatura emitida pela aqui autora, isto é, se esta pode exigir daquela o preço fixado no tarifário respeitante ao serviço de drenagem de águas residuais para a rede pública de saneamento referente ao imóvel para o qual se pretende também o abastecimento de água. Trata-se, pois, de um conflito relacionado com a cobrança do custo/preço de serviço prestado pela autora concessionária que – embora prévio à celebração de um contrato de fornecimento de água e de saneamento de águas urbanas e indispensável à sua celebração - se insere no âmbito da prestação do referido serviço público essencial, integrando um verdadeiro conflito de consumo entre um utente/consumidor e um prestador de serviços públicos essenciais”. É esta também a situação destes autos e, como tal, estando em causa um serviço público essencial, o presente litígio é de consumo e estava, assim, abrangido pela convenção de arbitragem, contendo a decisão arbitral correta fundamentação que sustente a aplicabilidade da convenção. Improcede, assim, o fundamento de anulação da decisão arbitral. Quanto ao segundo fundamento invocado, alega a requerente que, mesmo considerando aplicável a convenção de arbitragem, ainda assim a TDAR tem natureza tributária e, como tal é aplicável o art.º 78.º da Lei Geral Tributária (arts.º 17.º a 31.º do articulado inicial). Na decisão arbitral proferida, como bem refere a requerente no art.º 18.º do seu articulado, a Árbitra afastou a aplicabilidade do art.º 78.º da Lei Geral Tributária que a requerente havia invocado na sua contestação e que, segundo o seu entendimento, impedia de devolver o que foi indevidamente cobrado. Não há que cuidar aqui se a decisão está ou não correta. O fundamento da anulação da decisão arbitral pode apenas ser o de não ter havido pronúncia sobre questão suscitada e não a sua errada decisão, como acaba por alegar a requerente, pois que, de facto, não compete a este Tribunal da Relação decidir do mérito da questão tratada pelo Tribunal Arbitral. Decorre do exposto que, não tendo havido omissão de pronúncia pelo Tribunal Arbitral, nenhum fundamento existe para que seja declarada anulada a decisão arbitral com fundamento na alínea v) do n.º 3 do art.º 46.º da Lei de Arbitragem Voluntária. Quanto aos fundamentos alegados nos arts.º 32.º a 45.º do requerimento inicial – mais uma vez, o entendimento defendido pela requerente quanto à aplicabilidade do art.º 78.º da Lei Geral Tributária -, não podem os mesmos ser apreciados nesta sede – de pedido de anulação da decisão proferida -, pois que, como se disse, não compete a este Tribunal da Relação reapreciar, de mérito, a questão decidida pelo Tribunal Arbitral. Como se refere exemplarmente no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16/03/2017, do Juiz Conselheiro Lopes do Rego, proc.º nº 1052/14.1TBBCL.P1.S1, disponível in www.gdsi.pt, “como é sabido, a LAV atualmente vigente apenas permite a impugnação da sentença arbitral pela via do pedido de anulação dirigido ao competente tribunal estadual – só prevendo, como forma de reação à dita sentença, a via do recurso nos casos em que as partes tiverem acordado na recorribilidade da decisão dos árbitros para os tribunais estaduais; o pedido de anulação – que origina uma forma procedimental autónoma, moldada pelas regras da apelação no que se não mostre especialmente previsto no nº2 do art. 46º da LAV – pressupõe a verificação de algum ou alguns dos fundamentos taxativamente previstos na lei, cumprindo, em regra, à parte que faz o pedido o ónus de demonstrar a respetiva verificação; e tal pretensão não envolve um amplo conhecimento do mérito da decisão que se pretende anular, estando a competência do tribunal estadual circunscrita à matéria da verificação do específico fundamento da pretendida anulação, cabendo, mesmo nos casos em que proceda a pretensão anulatória, a reapreciação do mérito a outro tribunal arbitral, nos termos do nº9 do citado art. 46º. … como é típico da ação de anulação da decisão arbitral, o seu objeto não traduz qualquer reapreciação do mérito da causa, vedado aos Tribunais estaduais pelo art. 46º, nº9, da LAV, consistindo, apenas e estritamente, em apurar da verificação ou inverificação dos específicos fundamentos de anulação da sentença arbitral, invocados pela A. na ação que propôs …”. A decisão da impugnação pelo Tribunal de 2ª Instância é puramente cassatória e não permite que o Tribunal estadual conheça do mérito das questões decididas pela sentença arbitral, conforme decorre do art.º 46º, nº. 9, da Lei da Arbitragem Voluntária. A ação de anulação de sentença arbitral, que segue a forma de processo especial previsto no art.º 46º da Lei da Arbitragem Voluntária, não comporta reapreciação da prova produzida, nem a apreciação de eventual erro de julgamento ou na aplicação do direito. Ou seja, o mérito da decisão arbitral não é sindicável na ação de anulação de decisão arbitral, e, no fundo, é isso que a requerente pretende. E, não se mostrando violadas as normas da Lei da Arbitragem Voluntária, especificadas pela requerente como fundamento da pretensão anulatória, tem de improceder a peticionada anulação da decisão arbitral. Sumário (ao abrigo do disposto no art.º 663º, n.º 7, do C. P. Civil): 1 – Saber se é ou não devido o pagamento de tarifa de drenagem de águas residuais constitui um conflito de consumo. 2 – Estando em causa um serviço público essencial, a natureza jurídica da tarifa não afasta a aplicação da lei dos Serviços Públicos Essenciais. 3 - Não se mostrando violadas as normas da Lei da Arbitragem Voluntária, o mérito da decisão arbitral não é sindicável na ação de anulação de decisão arbitral. V - Decisão: Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a presente ação de anulação de decisão arbitral. Custas da ação pela requerente, nos termos do art.º 527.º do C. P. Civil. ** Guimarães, 19/09/2024 (elaborado, revisto e assinado eletronicamente) |