Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | MARIA EUGÉNIA PEDRO | ||
Descritores: | VERIFICAÇÃO ULTERIOR CRÉDITOS (CIRE) EFEITO DO RECURSO APOIO JUDICIÁRIO DESERÇÃO DA INSTÂNCIA | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 02/16/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | APELAÇÃO IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 1ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | Numa acção com pluralidade de autores, caso um deles, após o indeferimento do pedido de apoio judiciário, não proceda ao pagamento da taxa de justiça devida, decorrido o prazo legal de 6 meses, há lugar à deserção da instância em relação ao mesmo. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório Em 16.7.2020, AA e BB, intentaram acção para verificação ulterior de créditos/ direitos por apenso ( a que corresponde a letra ...) aos autos principais de insolvência de CC, peticionando que “ fosse declarado o direito de retenção sobre o prédio misto identificado no art. 3º da petição inicial.” Com a petição inicial apresentaram ambos os autores cópia do requerimento de apoio judiciário , na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e os autos seguiram os seus termos. - Em 1.12.2020, no que concerne ao autor BB, que é o que aqui interessa, face à informação da secretaria de que o respectivo pedido de apoio judiciário havia sido objecto de indeferimento no Apenso “E”, foi proferido despacho ordenando a sua notificação para diligenciar pelo pagamento da taxa de justiça. - Tendo na sequência de tal despacho sido efectuado o pagamento de apenas € 51,00, em 20.1.2021, foi proferido despacho a ordenar a notificação do Autor BB, para no prazo de 10 dias proceder ao pagamento da taxa de justiça em falta, acrescida de multa de igual valor, sob pena de ser ordenada a suspensão da instância quanto ao mesmo por falta de impulso processual- cfr. arts 552º, 6 e 145º, nº3, ambos do CPCivil. - Notificado de tal despacho e da guia para pagamento da quantia de €357,00 de taxa de justiça em dívida e igual valor de multa, o A. BB não efectuou qualquer pagamento. - Em 15.2.2021, foi proferido o seguinte Despacho: “Visto. Aguardem os autos o necessário impulso processual do A. BB. Notifique, sendo os demais Autores para requererem o que tiverem por conveniente, tudo sem prejuízo do decurso do prazo previsto pelo art. 281º do CPC.” Este despacho foi notificado à mandatária do A. BB em 16.2.2021. - Em 26.7.2021, o co-autor AA, ao qual foi concedido o apoio judiciário nas modalidades de dispensa de pagamento da taxa de justiça e demais encargos como o processo e nomeação de patrono oficioso, através do respectivo patrono, Dr. DD, nomeado em substituição da patrona inicial que pediu escusa, requereu o prosseguimento dos autos, sustentando que a inércia do A. BB não o podia prejudicar. - Notificado de tal requerimento o A. BB, em 15.8.2021, veio requerer a junção aos autos de cópia incompleta de um novo pedido de apoio judiciário, com carimbo de entrada no Serviço de Atendimento de ... da Segurança Social em 13.8.2021. - Tal requerimento mereceu em 16.8.2021, o seguinte Despacho: “Tendo em conta que o pedido de apoio judiciário oportunamente requerido pelo Autor BB fora já objecto de decisão final de indeferimento (cfr. ofício junto em 09.11.2020 ao apenso E), constata-se ademais que o comprovativo de novo pedido alegadamente deduzido no mesmo sentido não atesta efectivamente que o mesmo diga respeito aos presentes autos, nem sequer a que modalidade diz concretamente respeito.- Por outra via, resulta da própria LAJ, que a formulação de vários pedidos judiciários no mesmo processo só poderá ocorrer em situações excepcionais, como, nos casos de superveniência de insuficiência económica e ocorrência no decurso dos autos de um encargo excepcional, o que não é (sequer) alegado nos autos. Sucede, entretanto, que o referido Autor, notificado em 20.01.2021, não liquidou o remanescente da taxa de justiça nem pagou a multa então devidas, tendo entretanto, por despacho de 15.02.2021, ficado os autos a aguardar o necessário impulso processual daquele Autor, com a subsequente notificação dos para requererem o que tiverem por conveniente, tudo sem prejuízo do decurso do prazo previsto pelo art.º 281.º do CPC.--- Desta feita, entendendo-se nos autos não resultar causa de suspensão/interrupção do prazo em sujeito com vista à deserção – no que respeita ao Autor BB – aguardarão os autos apenas o decurso do referido prazo. Notifique.---“ O A. BB notificado de tal despacho, em 18.8.2021, juntou aos autos cópia integral do requerimento de apoio judiciário enviado à Segurança Social em 13.8.2021, verificando-se que no ponto 4.2.2, onde é perguntado se o requerimento é apresentado antes da primeira intervenção processual do requerente foi assinalada a resposta “sim”. Em 19.8.2021, foi proferido o seguinte Despacho: “Requerimento de 18.08.2021 [...93]: Do documento comprovativo agora remetido na sua versão íntegra, resulta que pelo aqui Autor BB foi solicitado o benefício do apoio judiciário por requerimento datado de 13.08.2021, tendo em vista a modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, sendo então identificados os autos que constituem o apenso D (e não os presentes, pese embora de qualquer forma se entenda que o apoio judiciário, a ser concedido, sempre se estenderia a todos os apensos), ainda tendo sido assinalado que o requerimento é apresentado antes da primeira intervenção do requerente (o que, efectivamente, não sucede). Vejamos. Resulta do n.º 2 do art.º 18.º da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, que o apoio judiciário deve ser requerido antes da primeira intervenção processual, salvo se a situação de insuficiência económica for superveniente ou se, em virtude do decurso do processo, ocorrer um encargo excepcional, suspendendo-se, nestes casos, o prazo para pagamento da taxa de justiça e demais encargos com o processo até à decisão definitiva do pedido de apoio judiciário, aplicando-se o disposto nos nºs 4 e 5 do art.º 24.º. Ora, tendo então em conta que o pedido de apoio judiciário oportunamente requerido pelo Autor BB fora já objecto de decisão final de indeferimento(cfr. ofício junto em 09.11.2020 ao apenso E), não pode senão concluir-se que o pedido agora formulado não o foi, nem antes, nem à data da primeira intervenção daquele nos autos, e, resultando que o pedido de apoio judiciário formulado no presente processo foi apresentado em data posterior ao comportamento processual originador da liquidação das custas e multa devidas (para o que o Autor havia sido notificado em 20.01.2021), não poderá a sua eventual concessão abarcar tal conduta processual, dado que a concessão de apoio judiciário apenas têm efeitos para o futuro, nos casos em que o respectivo pedido é formulado na pendência de acção judicial, assim não abarcando conduta processual pretérita, não pode haver lugar a efeito retroactivo. Assim sendo, entende-se, como já decidido no despacho anterior, não resultar causa de suspensão/interrupção do prazo com vista à deserção – no que respeita ao Autor BB – continuando os autos a aguardar o decurso do referido prazo. Notifique.” Notificado do antecedente despacho, em 23.8.2021, o A. BB, juntou aos autos cópia de um requerimento dirigido à segurança social, informando que o pedido de apoio judiciário se destinava ao Apenso F. * Em 12.10.2021. o A. BB, apresentou novo requerimento, com o seguinte teor :” Vem requerer a V. Exa. a junção aos autos de documento comprovativo de pagamento de taxa de justiça relativamente ao apenso F do processo de declaração de insolvência nº 3840/17...., embora se encontre junto aos autos requerimento de apoio judiciário, efectuado pelo autor junto da segurança social portuguesa e do qual se encontra a aguardar despacho, mas em virtude de em despacho anterior se entender que esse requerimento de apoio judiciário não interrompe o prazo com vista a deserção da instância relativamente ao autor BB, continuando os autos a aguardar o decurso do referido prazo, pretende assim o autor dar impulso aos presentes autos”Juntou DUC no valor €102,00 e comprovativo do respectivo pagamento. * Em 13.10.2021, foi proferido o seguinte Despacho:“Visto.--- Não obstante o pretendido impulso processual por parte do co-autor BB, o certo é que, atendendo à data do despacho em que expressamente ficaram os autos a aguardar tal impulso (15.02.2021), há muito que se mostra ultrapassado o prazo previsto pelo art.º 281.º do Cód. Proc. Civil.--- Assim sendo, tendo o processo aguardado o impulso processual do co-autor BB durante mais de seis meses, declara-se deserta a presente instância quanto àquele – cfr. art.º 281.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil.--- Notifique.--- * Prosseguindo os autos, entretanto, quanto ao co-autor AA, por o considerar oportuno, para a realização de uma tentativa de conciliação designa-se o dia 26.10.2021, pelas 11h00m, neste tribunal.---Notifique, acautelando a previsão do art.º 151.º, n.º 2 do Cód. Proc. Civil, sendo que as partes deverão sê-lo a fim de comparecerem pessoalmente.” * O A. BB, inconformado com o segmento do despacho que declarou a deserção da instância em relação a ele, interpôs o presente recurso terminando as suas alegações, com as seguintes Conclusões( transcrição) A – O douto despacho não valorou e considerou erradamente a suspensão dos prazos dos tribunais. B – Perante a situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV2 e da doença do Covid 19, tornou-se imperativo estabelecer medidas excecionais e temporárias a adotar para dar resposta às dificuldades, nomeadamente no acesso aos tribunais e ao cumprimento dos prazos. C - Surgiu a Lei 1-A/2020 de 19 de março que estabeleceu um conjunto de medidas de caráter urgente, nomeadamente e no que respeita à suspensão dos prazos de prescrição e caducidade, previu o artigo 7º n.º 3 que “A situação excecional constitui igualmente causa de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos.” D - Posteriormente a essa data e devido ao agravamento da situação epidemiológica, os prazos de prescrição e caducidade vieram a ser, uma vez mais, suspensos no presente ano através da Lei n.º 4-B/2021 de 01 de fevereiro, sobretudo no seu artigo 6º-B n.º 3, E – Decretando-se que “São igualmente suspensos os prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os processos e procedimentos”, revogado, posteriormente, pela Lei n.º 13-B/2021 de 5 de abril. Pelo que, os prazos foram suspensos de 01 de fevereiro a 05 de abril de 2021. F -Nomeadamente no que concerne a deserção da instância, cite-se a referência, do Acórdão da Relação de Évora, no processo n.º114/19.3T8RMR.E1 de 25 de março de 2021 determinou que – “A suspensão de prazos processuais, a que se reporta o n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19/3, alterado pela Lei n.º 4-A/2020, de 6/4, aplica-se ao prazo de deserção da instância.” G – Ora, e face ao exposto em 15.02.2021, os prazos encontravam-se suspensos pela publicação da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, que estabelece um regime de suspensão de prazos processuais e procedimentais decorrente das medidas adotadas no âmbito da pandemia da doença COVID-19. H – A data de 15 de Fevereiro de 2021, foi a data do despacho que determinou que os autos ficavam a aguardar o impulso processual. I – Embora em 15 de agosto de 2021, fosse dado impulso processual nos presentes autos, com a junção aos autos do pedido de apoio judiciário realizado junto da Segurança Social Portuguesa, pelo ora recorrente. J - Apesar desse impulso o ora recorrente deu entrada em 12 de outubro de 2021 de um requerimento a juntar aos autos documento comprovativo de pagamento de taxa de justiça pretendendo e dando o recorrente impulso aos presentes autos. K - Requerimento que foi alvo da douta decisão aqui recorrida, decretando a deserção da instância, com a fundamentação no prazo previsto pelo artigo 281º do CPC. se encontrar ultrapassado, sem qualquer referência a suspensão dos prazos no contexto da pandemia. L - No nosso entender indevidamente devido ao acima referido, ou seja, à suspensão dos prazos no âmbito das medidas devido a pandemia, suspenderam os prazos de caducidade e prescrição, assim como, a deserção da instância, como foi decidido pelo tribunal da Relação de Évora, M - Pelo que, o prazo previsto pelo artigo 281º do CPC não se encontra ultrapassado, na data em que foi dado o respectivo impulso processual, dando sem efeito a deserção da presente instância quanto ao autor nos termos do artigo 281º nº 1 do C.P.C. N - A Lei é clara assim como, a Jurisprudência existente. O - Pelo que, se solicita a aceitação do impulso processual, dando sem efeito a deserção da instância e prosseguindo os autos relativamente ao autor suprarreferido. P - Pois perante a decisão aqui recorrida o ora recorrente fica privado de exercer os seus direitos, nomeadamente o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos Nestes termos, e nos mais de direito, que V. Exas. Doutamente suprirão, deve ser proferido acórdão que julgue o Recurso procedente e, em consequência, ser aceite o impulso processual, dando sem efeito a deserção da instância, revogando-se o despacho recorrido do Tribunal Judicial da Comarca ..., Assim se fazendo serena, sã e objectiva Justiça. * Não houve contra-alegações.* O recurso foi admitido como apelação, com subida imediata, em separado, e com efeito meramente devolutivo, o que foi mantido por despacho da relatora, indeferindo o requerimento do recorrente a solicitar a atribuição de efeito suspensivo.O recorrente reclamou para a conferência de tal despacho, pelo que, como questão prévia se fixará o efeito do recurso. * Foram colhidos os vistos legais.* Nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre decidir.* II. Delimitação do objecto do recursoFace ao disposto nos artºs 608º, nº2, 609º, nº1, 635º, nº4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo das questões que o tribunal deva conhecer oficiosamente. Assim, a questão a decidir consiste em saber se se verificam ou não os pressupostos da deserção da instância. * - Questão prévia/ Efeito do recursoO recorrente reclama do despacho que, nos termos do nº5 do art. 14ºdo CIRE atribuiu efeito devolutivo ao recurso, alegando que lhe deve ser fixado efeito suspensivo com base no nº6 deste mesmo normativo e no art. 647º, nº 3, alínea c) do CPCivil. Em primeiro lugar importa referir que o art.14º, nº5 do CIRE se aplica ao processo de insolvência e a todos os seus apensos. No entanto, o despacho objecto de recurso não foi proferido em qualquer incidente do processo de insolvência, como sustenta o recorrente, mas sim numa acção de verificação ulterior de créditos/direitos que corre por apenso ao mesmo. E o nº 6 do art. 14º nada determina quanto aos efeito dos recursos apenas indica os que sobem nos próprios autos. Por outro lado, o despacho objecto de recurso é o despacho que declarou deserta a instância da referida acção de verificação ulterior de créditos apenas em relação ao recorrente e não um despacho de indeferimento de incidente processado por apenso, pelo que não cai na previsão da al. c) do nº3 o art. 647º do CPCivil, nem das demais alíneas desse mesmo número. Destarte, não vemos qualquer arrimo legal para a atribuição de efeito suspensivo ao recurso, fixando-se-lhe, nos termos do nº5 do art. 14º do CIRE, efeito meramente devolutivo. III. Fundamentação de facto As incidências fáctico- processuais que relevantes para a decisão são as contantes do antecedente relatório que, por brevidade, se dão aqui por reproduzidas. IV. Fundamentação de direito O recorrente sustenta que à data do despacho não se mostrava decorrido o prazo de 6 meses sem impulso processual da sua parte, porquanto, em 15.02.2021, os prazos se encontravam suspensos pela publicação da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, que estabeleceu um regime de suspensão de prazos processuais e procedimentais decorrente das medidas adoptadas no âmbito da pandemia da doença COVID-19, defendendo que devem ser considerados os períodos de interrupção dos prazos decorrentes dessa lei. Na verdade, a situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, conduziu à publicação de sucessivas leis que estabeleceram medidas excepcionais também para o funcionamento dos tribunais e nesse âmbito houve dois períodos de suspensão dos prazos processuais, de 9 de março a 3 de junho de 2020( 87 dias) e de 2 de fevereiro a 6 de abril de 2021 ( 63 dias), cujo regime foi sofrendo alterações. No presente caso, datando de 15.2.2021, o despacho que determinou que os autos ficavam a aguardar o impulso processual do A., sem prejuízo do disposto no nº1 do art. 281º do CPCivil, importa apenas analisar o regime do 2º período que foi regulado pela Lei 4-B/2021 de 1 de fevereiro, a qual, aditou novos artigos à Lei 1-A/2020, designadamente o artº 6º B que no seu nº 1 determinou a suspensão de todas as diligências e todos os prazos para a prática de atos processuais, procedimentais e administrativos que devessem ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos que corressem termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional e entidades que junto dele funcionem, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal, sem prejuízo do disposto nos números seguintes. Porém, relativamente aos processos, atos e diligências considerados urgentes por lei ou por decisão da autoridade judicial determinou que continuavam a ser tramitados, sem suspensão ou interrupção de prazos, observando-se o disposto nas alíneas a) e b) (cfr. artº 6ºB, nº 7, alíneas a) e b). E para o efeito referido no nº 7 consideraram-se também urgentes, para além daqueles que por lei ou por decisão da autoridade judicial fossem considerados como tal, também, designadamente, os processos, procedimentos, atos e diligências que se revelassem necessários a evitar dano irreparável ou de difícil reparação, os processos relativamente a menores em perigo ou a processos tutelares educativos de natureza urgente e as diligências e julgamentos de arguidos presos (alínea b) do nº 10). Esta Lei 4-B/2021 entrou em vigor no dia a seguir ao da sua publicação (artº 5º), em 2 de fevereiro e veio retroagir a produção de efeitos a data anterior, determinando a produção de efeitos a 22 de janeiro de 2021, sem prejuízo das diligências e atos processuais entretanto realizados e praticados (artº 4.º). E o artº 6º B pela mesma aditado à Lei 1-A/2020 foi depois revogado pela Lei 13-B/2021, de 05/04 (artº 6º) que entrou em vigor em 06.04.2021 (artº 7º). Ora, segundo o artº 9º, nº1 do CIRE, o processo de insolvência, incluindo todos os seus incidentes, apensos e recursos, tem carácter urgente e gozam de precedência sobre o serviço ordinário do tribunal. Por conseguinte, constituindo a presente acção de verificação ulterior de créditos /direitos um apenso do processo de insolvência, tem natureza urgente e, como tal, ficou excluída da suspensão de diligências e prazos decorrentes da referida Lei, não havendo, por este motivo qualquer interrupção do prazo de 6 meses decorrente do nº1 do art. 281º do CPCivil, ao invés do que sustenta o recorrente. Em arrimo da sua posição invocou o Ac. da RE de 25-03-2021, proc. nº 114/19.3.T8RMR.E1, no qual se decidiu que a suspensão dos prazos processuais , a que se reporta o nº1 do art. 7º da Lei nº 1-A/2020 de 19.3, alterado pela Lei nº4 –A/2020 de 6/4, se aplica ao prazo de deserção da instância, Porém, nesse aresto estava em causa um processo não urgente e do mesmo resulta claramente que tal suspensão não é aplicável aos processos urgentes. Por outro lado, sustenta o recorrente que com junção aos autos em 15.8.2021 de novo requerimento de apoio judiciário deu impulso aos autos, interrompendo o prazo de deserção da instância. Ora, sobre tal junção recaíram os despachos de 16 e 19 de agosto, nos quais explicitando-se as ilegalidades de tal requerimento se decidiu que não se verificava qualquer causa de suspensão/ interrupção do prazo de deserção da instância em curso. E tendo-se verificado que o autor assinalara que o requerimento era apresentado antes da primeira intervenção processual o que não correspondia à verdade, tal facto devia ter sido comunicado desde logo aos serviços da segurança social para ser considerado na decisão. Acresce que, tais despachos não foram impugnados pelo recorrente pelo que tendo transitado formou-se caso julgado formal relativamente à questão decidida, nos termos do art. 620º do C.P.Civil, não podendo ser postos em causa no presente recurso que tem como objecto o despacho de 13.10.2021. No despacho de 13.10. 2021, declarou-se a deserção da instância, considerando-se intempestivo, o requerimento apresentado pelo A. BB no dia anterior, no qual alegando juntar documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça, dizia pretender dar impulso aos autos. Vejamos, pois, se se verificam os pressupostos da deserção da instância. Preceitua o art. 281º do CPCivil: “1-Sem prejuízo do disposto no nº 5, considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses. 2-O recurso considera-se deserto quando, por negligência do recorrente, esteja a aguardar impulso processual há mais de seis meses. 3-Tendo surgido algum incidente com efeito suspensivo, a instância ou o recurso consideram-se desertos quando, por negligência das partes, o incidente se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses. 4-A deserção é julgada no tribunal onde se verifique a falta, por simples despacho do juiz ou do relator. 5-No processo de execução, considera-se deserta a instância, independentemente de qualquer decisão judicial, quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses.”. As várias situações de deserção previstas neste normativo exigem cumulativamente o nexo entre a paragem do processo e a não atuação da parte sobre a qual recai o ónus de impulso processual e a negligência desta no que a tal omissão respeita. Tem-se discutido se o art. 281.ºdo CPC exige que as partes sejam previamente notificadas para praticarem os actos necessários ao andamento do processo, com a advertência de que a sua omissão determinará a deserção. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in Código de Processo Civil Anotado, Vol I, 4ª edição, Almedina , 2018, págs 570 a 573, fazendo uma análise comparativa do regime actual com o regime anterior, anotam que deixou de existir a interrupção da instância e o prazo da deserção foi encurtado, correspondendo a norma do n.º 4 do art.º 281º do novo Código de Processo Civil, corresponde, ipsis verbis, à do n.º 4 do referido art.º 291º, do Código de Processo Civil de 1961 e defendem que tal como anteriormente sucedia na interrupção da instância :“ O prazo de seis meses conta-se, pois, não a partir do dia em que a parte deixou de praticar o ato que condicionava o andamento do processo, isto é, a partir do dia em que se lhe tornou possível praticá-lo ou, se para o efeito tinha um prazo (não perentório), a partir do dia em que ele terminou, mas a partir do dia em que lhe é notificado o despacho que alerte a parte para a necessidade do seu impulso processual. Segue-se assim o regime que anteriormente se aplicava, pelo menos, quando, não obstante a parte não tivesse o ónus de impulso subsequente, o juiz ordenasse que o processo aguardaria o requerimento das partes, sem prejuízo do disposto no art. 29-3-a Reg Custas: o prazo conta-se a partir da notificação do despacho judicial e a deserção produz-se automaticamente com o seu decurso, o que o juiz ou relator se limitará a verificar no despacho do nº4.” Por seu turno, Abrantes Geraldes e outros, in Código de Processo Civil Anotado, Vol.I, 2ª Edição, Almedina, pág.348 e 349 escrevem : “A conduta negligente conducente à deserção da instância consubstancia-se numa situação de inércia imputável à parte, ou seja, em que esteja em causa um ato ou actividade unicamente dependente da sua iniciativa, sendo o caso mais flagrante o da suspensão da instância por óbito de alguma das partes, a aguardar a habilitação dos sucessores. (…) Atenta a diversidade dos factos que colidem com o regular andamento da causa, na apreciação do condicionalismo da deserção da instância é importante que se ponderem globalmente as diversas circunstâncias, quer as de ordem legal, quer as que se ligam ao comportamento da parte onerada com a iniciativa de dinamizar a instância. Daqui pode resultar que, antes de declarar o efeito extintivo da instância decorrente da deserção, se mostre necessário que o juiz sinalize, por despacho, ser aquela a consequência da omissão de um ato processual. (…) O resultado já poderá ser diverso quando se mostrem evidentes, quer a necessidade de impulso a cargo da parte, quer o efeito extinto da instância decorrente da inércia prolongada.”E a título exemplificativo referem os casos de suspensão da instância por falecimento de alguma das partes e de renúncia ao mandato conferido pelo autor em que os respectivos dos preceito legais determinam a suspensão da instância e não há duvida de que o prosseguimento do processo depende do impulso da parte. Nestes casos não é necessária qualquer notificação, com a advertência de que a omissão da prática do acto decorrido o prazo legal determina a deserção . Partilhamos esta posição. Entendemos que apenas nas situações em que face às vicissitudes do processo possam existir dúvidas sobre a necessidade do impulso processual das partes, deve o juiz ordenar a sua notificação, com a advertência de que a sua inércia terá como consequência a deserção da instância, nos termos do art. 281º,/1 do CPCivil. No caso em análise, depois de conhecida no apenso E a decisão de indeferimento do respectivo pedido de apoio judiciário, foi o A. BB notificado para diligenciar pelo pagamento da taxa de justiça devida; tendo o mesmo procedido ao pagamento de apenas, € 51,00, foi novamente notificado para proceder ao pagamento da taxa de justiça em falta( € 357,00) e de multa de igual valor no prazo de 10 dias; quedando-se inerte foi, em 15.2.2021, proferido novo despacho onde se determinou que os autos ficavam a aguardar o respectivo impulso processual , sem prejuízo do prazo previsto no art. 281º do CPCivil, despacho que foi notificado via electrónica à sua mandatária em 16.2.2021, presumindo-se a notificação efectuada, nos termos do art. 248º,n º1 do CPC, no terceiro dia posterior ao envio, ou seja, em 19.2.2021. Por conseguinte, na vertente situação, é indubitável que o A foi alertado para as consequências da falta de pagamento da taxa de justiça devida, começando o prazo para a deserção da instância a correr em 20.2.2021. Face à notificação recebida, o recorrente apresentou novo requerimento de apoio judiciário em 13.8.2021, no qual faltou à verdade, declarando que tal requerimento era apresentado antes da primeira intervenção processual. E tendo-lhe sido indeferida pelos despachos de 16 e 19 de agosto de 2021, a suspensão/ interrupção do prazo de deserção em curso, nada fez até 12.10.2021, data em que apresentou requerimento em que afirma pretender impulsionar os autos, juntando DUC comprovativo não do pagamento da taxa de justiça em devida ( € 357,00) e multa de igual valor, mas de apenas € 120. Ora, não tendo ocorrido desde 20.2.2021 ocorrido qualquer facto que determinasse a suspensão ou interrupção do prazo de 6 meses de deserção da instância, tal deserção ocorreu no termo do mesmo, ou seja, 20.8.2021. O despacho de 13.10. 2021 limitou-se, nos termos do nº 4 do art. 281º do CPC a julgar verificada tal deserção, pois a mesma produz-se automaticamente com o decurso do prazo( cfr. Lebre Freitas e Isabel Alexandre, op. cit. p.573). O requerimento apresentado pelo recorrente em 12.10.2021, não obsta à declaração da deserção já ocorrida. Alguns autores defendem que praticando o parte o acto omitido necessário ao prosseguimento da instância após o decurso dos seis meses mas antes de declarada a deserção, a instância deve prosseguir, dada a função compulsória das normas dos nº 1, 2,e 3 do art. 281ºdo CPC- Neste sentido, vide Lebre Freitas e Isabel Alexandre op. cit, p.573. Porém, mesmo seguindo este entendimento menos rigoroso, no presente caso, tendo o recorrente procedido ao pagamento de apenas €120,00 e não da totalidade da taxa de justiça e da multa em dívida, não podia ser determinado o prosseguimento dos autos relativamente ao mesmo, nem se justificava, face às notificações anteriormente efetuadas, nova notificação para proceder pagamento integral. Em suma, nenhuma censura merece a decisão recorrida, improcedendo a apelação. * V. DecisãoPelo exposto, os Juízes desta 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam que o presente recurso, cujo efeito é meramente devolutivo, não merece provimento, e julgando o mesmo improcedente, mantém-se a decisão recorrida. Custas pelo recorrente, nos termos do art 527º, nº 1 e 2 do CPCivil. Notifique Remetendo-se cópia do requerimento de apoio judiciário junto aos Apenso F em 13.8.2021, comunique-se aos serviços competentes da segurança social que tal requerimento foi apresentado na pendência da acção e não antes da primeira intervenção do requerente. * Guimarães, 16 de Fevereiro de 2023 Os Juízes Desembargadores Relatora: Maria Eugénia Pedro 1º Adjunto: Pedro Maurício 2º Adjunto: José Carlos Duarte |