Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | JOSÉ CARLOS PEREIRA DUARTE | ||
Descritores: | PROCESSO DE REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS DECISÃO PROVISÓRIA NULIDADE DE SENTENÇA ANULAÇÃO DA DECISÃO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 01/09/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | APELAÇÃO PROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 1ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | I – Muito embora a adopção ou alteração de uma medida provisória (art.º 28º do RGPTC) tenha por base uma averiguação sumária e se guie por critérios de conveniência e oportunidade (cfr. art.º 987º do CPC), isso não significa qualquer possibilidade de arbitrariedade. II - Em primeiro lugar, o juiz deverá justificar a razão ou as razões pelas quais entende ser oportuno adoptar ou alterar uma decisão provisória (a menos que se trate de uma situação em que a adopção da decisão provisória seja obrigatória, como sucede com o disposto no art.º 38º do RGPTC). III - Em segundo lugar, a decisão substantiva deverá ser fundamentada, de facto e de direito (art.º 607 n.ºs 3 e 4, aplicável ex vi art.º 295º, 986º n.º 1, ambos do CPC e 12º do RGPTC). IV - A decisão provisória proferida ao abrigo do disposto no artigo 28º do RGPTC que não: (i) - enuncia os factos provados e os factos não provados; (ii) - a motivação do julgamento de facto mediante a análise crítica das provas e a especificação dos fatores que foram decisivos para a convicção sobre cada facto, com a indicação dos concretos meios de prova convocados para tal efeito é nula, nos termos do disposto no artigo 615º, nº 1, alínea b), CPC. V - Sendo a decisão recorrida nula por falta absoluta de especificação dos factos, não está estabelecida a plataforma necessária para a integração jurídica do caso pela Relação, ou seja, não estão reunidos os elementos essenciais para a Relação conhecer do objecto da apelação. VI – E sob pena de violação do duplo grau de jurisdição em matéria de facto, não pode a Relação substituir-se à 1ª instância na fixação integral da plataforma de facto necessária à integração jurídica, justificando-se aqui uma interpretação e aplicação restritiva do art.º 665º, n.º 1 do CPC e em consequência, devem os autos ser devolvidos ao Tribunal a quo, para que o mesmo, profira nova decisão, devidamente fundamentada de facto (com discriminação dos factos provados e não provados e apreciação crítica da prova produzida) e de direito (indicando, interpretando e aplicando as normas jurídicas pertinentes). | ||
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Decisão Texto Integral: | Recorrente AA Recorrido BB * ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES1. Relatório[1] A 21/10/2020 AA intentou processo especial de Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais e Fixação Provisória do seu regime contra BB, quanto ao filho menor de ambos, CC, nascido a ../../2020. Foi designada data para a conferência a que se refere o art.º 35º, n.º 1 do RGPTC, a qual, após adiamento, veio a realizar-se a 15/12/2020: - tendo sido consignado em Ata Acordo de Regulação das Responsabilidades Parentais, em que consta, nomeadamente, que o pai podia conviver uma vez por semana com o CC, em convívios supervisionados pelo CAFAP de ... e determinado que no final do período de 30 dias o mesmo juntasse relatório; - declarada suspensa a conferência e os pais remetidos para Audição Técnica Especializada nos termos do art.º 38º do RGPTC (do que se extrai que os pais não alcançaram um acordo quanto à regulação definitiva das responsabilidades parentais e que o “Acordo” referido é provisório). A 05/02/2021 foi junta informação do Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento “...“, sediado na Fundação ..., em .... A 19/03/2021 foi junta informação sobre Audição Técnica Especializada do ISS de .... A 28/04/2021 foi designada data para continuação da conferência nos termos do art.º 39º, n.º 1 do RGPTC, a qual se realizou a 10/05/2021, em que não houve acordo dos pais, tendo sido ordenada a sua notificação e do Ministério Público para, querendo, apresentarem alegações e/ou requererem prova e foi alterado o regime provisório estabelecido a 15/12/2020. A 17/09/2021 foi designada data para audiência de julgamento, a qual veio a ter lugar nos dias 18/03/2022, 22/04/2022 e 17/05/2022. A 18/08/2022 o requerido apresentou requerimento pedindo seja atribuído carácter urgente aos autos. A 19/08/2022 foi proferido despacho a determinar a notificação das partes para alegar por escrito em 10 dias e quanto ao mais foi determinado que os autos fossem com vista ao MP. O MP, invocando que já houve audiência final e os autos aguardam, por dez dias, as alegações por escrito das partes e após do Ministério Público, para tomada de decisão final, considerou inútil o deferimento de qualquer requerimento anterior e promove que os autos aguardem o decurso de tal prazo. Não foi proferido despacho quanto ao requerimento apresentado pelo pai a 18/08/2022. Os pais e o MP apresentaram alegações. Por decisão de 29/11/2022 foi deferido o pedido de escusa da Exm.ª Sra. Juiz titular do processo (cfr. apenso L)). A 20/12/2022, no apenso J, foi proferida decisão de alteração do regime provisório fixado a 15/12/2020. Remetidos aos autos ao J ... do Juízo Local Cível de ..., a 16/01/2023 o Sr. Juiz substituto determinou a repetição da audiência de julgamento no que toca à prova oral. A 27/03/2023 teve lugar audiência de julgamento, na qual os pais declararam ter obtido um acordo provisório e transitório quanto à Regulação das Responsabilidades Parentais quanto ao filho CC, para vigorar até o dia 10 de Julho de 2023, tendo ainda declarado desistir de todos os incidentes de incumprimento. O referido acordo foi homologado e agendada a sua revisão para o dia 10/07/2023. A 10/07/2023 realizou-se a diligência agendada, tendo sido obtido acordo dos pais quanto à regulação provisória do exercício das responsabilidades parentais quanto às férias do verão em relação ao filho CC, para vigorar até ao dia 25/09/2023, data em que voltaria a vigorar o acordo transitório alcançado a 27/03/2023. O referido acordo foi homologado e designado o dia 25/09/2023 para aferir da possibilidade de obtenção de acordo quanto à regulação definitiva das responsabilidades parentais relativamente ao CC e, desde logo, para o caso de tal acordo não ser alcançado, foram designadas datas para audiência de julgamento. A 25/09/2023 teve lugar a diligência agendada, na qual foi ordenado se solicitasse, com caráter de urgência, uma avaliação em contexto de Pedopsiquiatria, junto do Instituto de Medicina Legal, à criança CC, com o fito de averiguar quais os benefícios e malefícios da aplicação de um regime de residência alternada, por períodos de duas semanas, nesta faixa etária, sendo que, de acordo com o proposto pelo progenitor, a criança passaria a frequentar duas creches, atenta a distância geográfica existente entre a residência dos progenitores, tendo ainda os pais declarado ter estabelecido um acordo provisório, o qual foi homologado. A 22/04/2024 o IML juntou Relatório. A 07/05/2024 o requerido apresentou um extenso requerimento pedindo que a Sra. Perita preste um esclarecimento e que seja determinada a comparência da mesma na audiência de julgamento. A17/05/2024 o MP promove seja designada data para audiência de julgamento. A 20/05/2024 a requerente responde ao requerimento do requerido de 07/05/2024. A 22/05/2024 e com referência aos requerimentos do requerido de 07/05/2024 e da requerente de 20/05/2024 é designada data para a realização da conferência a que alude o artigo 35º do RGPTC. A 19/06/2024 teve lugar a diligência agendada, constando da Ata que: a) - se encontravam presentes a requerente e o requerido; b) - foram tomadas declarações aos mesmos, os quais, em súmula, declararam: a requerente que “Reforça o que consta já dos autos, quer a guarda da criança, não concordando com a guarda partilhada devido à idade da criança“ e o requerido que “Reforça o que já consta dos autos, quer a guarda partilhada, 15 dias com cada progenitor, até o filho entrar para a escola primária”; c) - o MP promoveu que: “Verifica-se, não obstante os esforços entabulados pelo Tribunal, se mantêm o impasse quanto ao acordo da Regulação das Responsabilidades Parentais, mormente, no que se refere à guarda partilhada do CC com 4 anos de idade. Nesta conformidade e dado que se impõe que o mesmo passe tempo de qualidade com o pai, coisa que já não acontece há mais de 1 ano, se regule provisoriamente tal situação, mormente quanto à residência da criança, estabelecendo-se de imediato, que o mesmo passe 2 semanas do mês junto da mãe e de seguida passe 2 semanas com o pai, regime que deverá ser alternado e começando desde já, o que se promove.” d) - a Ilustre mandatária da Requerente declarou opor-se à douta promoção; e) - o Ilustre Mandatário do Requerido declarou que concorda com a promoção do Digno Procurador. f) - o Sr. Juiz a quo proferiu o seguinte despacho: “ Uma vez que não há acordo nos presentes autos, e concordando-se com a promoção que antecede e de forma a evitar um desequilíbrio na relação entre os progenitores e o menor, podendo o regime em vigor, residência junto da progenitora, condicionar a futura decisão sobre esse mesmo item, e uma vez que o relatório da Senhora Perita refere que a residência alternada, a existir, dever ser mitigada, não tendo sido obstaculizada atento que o menor ainda não se encontra a frequentar o ensino obrigatório, o Tribunal Regula as Responsabilidades Parentais DE FORMA PROVISORIA do menor CC nos seguintes termos: I - RESIDÊNCIA - A partir do dia 2 de Setembro de 2024, a guarda do menor CC será fixada 2 semanas junto da mãe e 1 semana junto do pai, alternadamente; - A mudança de semana ocorrerá ao domingo, sendo que o pai irá buscar a criança a casa da mãe no domingo da sua semana e a mãe irá buscar a criança a casa do pai no respetivo domingo seguinte. II - QUESTÕES DE PARTICULAR IMPORTÂNCIA: Todas as decisões de maior relevo para a vida do menor serão tomadas conjuntamente pelo pai e pela mãe., considerando questões de particular importância, entre outras as seguintes: - Decisão sobre melindrosas intervenções cirúrgicas no filho, incluindo as estéticas; - Saída do filho para o estrangeiro, não em turismo mas em mudança de residência, com algum carácter duradouro; - Saída do filho para países em conflito armado que possa fazer perigar a sua vida;- - Escolha do ensino particular ou oficial para a escolaridade do filho - Decisões de administração que envolvam oneração; - Obtenção de licença de condução de ciclomotores; - Participação em programas de televisão que possam ter consequências negativas para a criança; - Práticas de actividades desportivas que representem um risco para a saúde do filho; - Autorização paternal para o filho contrair casamento; - Aceitação ou repúdio de heranças; - Administração de bens recebidos por herança, doação ou jogo; - Orientação profissional do filho; - Propositura de acção - ou queixa - em representação processual do filho. III - VISITAS - Na semana em que o progenitor que não tiver a criança poderá contactar o menor à segunda, quarta e sexta-feira, entre as 18:30 e as 19:00 horas, de modo a não perturbar o descanso da criança, comprometendo-se cada progenitor a efetuar as video-chamadas que serão efetuadas pelo progenitor que não estiver com a criança; - Cada progenitor poderá estar com o filho, quando se proporcionar, desde que avise o outro progenitor com 24 horas de antecedência. - No período que o menor ficar com a mãe este frequentará a creche que já frequenta; - No período em que o menor estiver com o pai frequentará as atividades curriculares que o pai considere convenientes. IV - FÉRIAS As férias do menor serão repartidas em partes iguais, sendo que nestas férias de verão de 2024, serão repartidas da seguinte forma: - A mãe terá consigo o menor do dia 30 de Junho a 21 de Julho; - O pai terá consigo o menor do dia 21 de Julho a 11 de Agosto; - A mãe terá consigo o menor do dia 11 de Agosto a 25 de Agosto; - O pai terá consigo o menor do dia 25 de Agosto a 1 de Setembro. - Como exceção, e para compensar o próximo fim de semana que seria com o pai e ficará com a mãe por ser a festinha de fim de ano do CC, o pai virá buscar o filho no dia 10 de Julho, pelas 10:00 horas e trazer à mãe no dia 12 de Julho, pelas 19:00 horas. V - FESTIVIDAES - O menor passará o Natal e o Fim de Ano, alternadamente com a mãe e com o pai sendo que neste ano de 2024 o menor passará o Natal dia 24 e dia 25 com a mãe e o fim de Ano dia 31 e dia 1 com o pai, alternando nos anos seguintes, em horários a combinar entre ambos; - Na Páscoa o menor fará uma refeição cada um dos progenitores, sempre que possível; - No dia de aniversário da mãe, no Dia da Mãe, no dia de aniversário do Pai e Dia do Pai, o menor tomará, se possível, pelo menos, uma refeição com o progenitor a que respeitar a festividade, sempre com respeito pelos horários e rotinas da criança. - No dia de aniversário do menor, e sempre que possível, este tomará pelo menos uma refeição com cada progenitor, de forma alternada, em moldes e termos a combinar entre os progenitores. VI – ALIMENTOS E FORMA DE OS PRESTAR - O pai pagará a título de pensão de alimentos, a quantia mensal de € 160,00 (cento e sessenta euros), até ao dia 08 de cada mês, por transferência bancária para o IBAN da conta da progenitora, quantia esta, que será atualizada, anualmente, com base no índice de inflação publicado pelo INE (Instituto Nacional de Estatística) e referente ao ano civil anterior. - À referida prestação de alimentos de 160,00 euros, acrescem as despesas extraordinárias, designadamente as escolares, médicas e medicamentosas, não comparticipadas, que serão suportadas em partes iguais por ambos os progenitores, tendo o progenitor que efetuar a despesa de entregar as faturas com o NIF do CC ao outro progenitor até ao dia 8 de cada mês, vencendo-se a obrigação do outro progenitor, no prazo de 30 (trinta) dias, ou seja, as faturas do mês anterior vencem-se até ao dia 8 do mês seguinte. VII – OUTRAS QUESTÕES Qualquer alteração aos períodos, datas e horários previstos no presente acordo deverá ser decidida por mútuo acordo dos progenitores. Os pais comprometem-se a resolver, por mútuo consenso, todas as questões pontuais e as demais não previstas no presente acordo provisório, bem como no acordo provisório datado de 25-09-2023. Os pais comprometem-se mutuamente, a comunicar ao outro, com uma antecedência de 24 horas, sobre eventos escolares, sociais ou desportivos, referentes ao menor, para o outro progenitor, querendo, estar presente. Dada a palavra aos progenitores pelos mesmos foi dito concordarem com a proposta provisória de Regulação das Responsabilidades Parentais do seu filho CC. Após o Mm.º Juiz proferiu o seguinte DESPACHO HOMOLOGATÓRIO Em face das posições que acabamos de ouvir inexiste acordo quanto à regulação definitiva do Exercício das Responsabilidades Parentais. Contudo, nos presentes autos de Regulação das Responsabilidades Parentais, celebraram estes o antecedente acordo provisório. O Ministério Público não se opôs aos termos sugeridos e acordados. Assim, após audição dos progenitores, por entender que o acordado, cujo teor dou por reproduzido para todos os efeitos legais, por ora, acautela e defende cabalmente os superiores interesses do filho de ambos CC, nos termos dos artigos 1906º e 1912º, do Código Civil, 34º e 37º, n.º 2, do RGPTC, julgo-o válido e relevante e, em consequência, homologo-o, condenando os progenitores a cumpri-lo nos seus precisos termos. Notifique. Determina-se que o menor CC seja tenha acompanhamento Psicológico regular, que deve envolver o treino de competências parentais de ambos os progenitores para que possam apoiar o CC nas situações de maior sofrimento emocional associadas ao contexto vivenciado. Mais se determina que a Perita subscritora do Relatório Pericial junto aos autos a folhas 275 a 288, no mês de Novembro, ou seja, passados 3 meses de cumprimento deste acordo provisório, junte aos autos novo Relatório Pericial, referindo-se às contingências que este Regime Provisório teve no desenvolvimento psicossomático da criança. Notifique e D.N.” A requerente interpôs recurso do citado despacho, pedindo a sua revogação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. O artigo 32.º n.º 4 do RGPTC dispõe que os recursos “têm efeito meramente devolutivo, exceto se o tribunal lhes fixar outro efeito”. Sucede que, caso seja atribuído um efeito devolutivo ao presente recurso, tal situação colocará em causa o superior interesse do menor, já que a alteração ao regime provisório existente implica que o menor esteja três semanas seguidas afastado da sua residência habitual e do seu progenitor de referência sem qualquer apoio psicológico e afastado da sua rotina diária, já a partir do próximo dia 21/07/2024. 2. Este menor tem três anos e nunca passou mais de uma semana seguida com o progenitor, até à presente data, nem nunca com ele coabitou, conforme é perceptível nos presentes autos atentas as regulações provisórias que têm vindo a vigorar, cfr Atas nos autos com as referências Citius 23079127, 23401047, 23641460, 24128011, 24215551, 24277949, 25034897, 25297224, 25413646. 3. Por essa razão, o estabelecimento de um convívio de três semanas com o pai poderá trazer consequências a nível emocional, criando stress e ansiedade, circunstâncias que se encontram devidamente explicadas e fundamentadas no Relatório Pericial de Pedopsiquiatria junto aos autos, cfr página 24 do relatório. 4. A decisão provisória contraria as conclusões do referido Relatório e, por conseguinte, deve ser admitido o presente recurso com efeito suspensivo, de forma a salvaguardar o interesse do menor, evitando-se assim que o mesmo possa sofrer consequências emocionais, com a separação do progenitor de referência de forma tão brusca, com claras repercussões negativas para o seu desenvolvimento cognitivo e emocional, até que seja o Tribunal Superior a avaliar a decisão recorrida. 5. Com todo o respeito, mas a decisão do tribunal a quo, ainda que provisória, foi precipitada e claramente violadora do superior interesse do menor, em detrimento dos anseios do pai. 6. A decisão recorrida padece de nulidade nos termos do art. 615.º n.º 1 al. c) do CPC na medida em que os fundamentos estão em clara oposição com a decisão. 7. Salvo o devido respeito ao Tribunal recorrido, impõe-se esclarecer que a requerente não aceitou a celebração de acordo provisório nos presentes autos, tendo manifestado a sua oposição à alteração do regime provisório, conforme ficou a constar em ata e é bem audível na gravação da sessão, com a referência Diligencia_1082-20.4T8BGC_2024-06-19, minutos 12:37 a 12:38. 8. Não houve acordo entre as partes, a regulação provisória resultou de decisão judicial na sequência da promoção do Ministério Público, o que aliás consigna o despacho que consta da Ata de 19/06/2024 e se pode concluir pela gravação da sessão, com a referência Diligencia_1082-20.4T8BGC_2024-06-19 minutos 11:41 a 12:37 e 12:38 a 12:55. 9. Deste modo, a decisão ao mencionar a homologação de um alegado acordo provisório está em clara contradição com os fundamentos da decisão e não corresponde de todo ao que aconteceu em sede de conferência de pais, e como tal, padece assim da nulidade prevista no art. 615.º n.º 1 al. c) do CPC. 10. Salvo o devido respeito, a decisão recorrida padece também de nulidade por falta de fundamentação nos termos do preceituado no art. 615.º n.º 1 al. b) do CPC, porque pese embora o Meritíssimo Juiz a quo tenha avançado com alguns fundamentos para alterar a regulação das responsabilidades parentais provisória em vigor, fá-lo de forma incipiente e de forma incoerente. 11. Desde logo, se atentarmos no douto Despacho proferido não se consegue perceber em que medida existe desequilíbrio entre os progenitores nem de que forma essa situação pode condicionar uma futura decisão do Tribunal nem quais as razões que justificam a sua alteração para proteção do superior interesse deste menor de 3 anos de idade. 12. A douta decisão menciona o relatório médico legal de pedopsiquiatria mas fá-lo, com todo o respeito, sem raciocínio lógico e contrariando as conclusões do referido Relatório Pericial de Pedopsiquiatria constante dos autos e toda a jurisprudência maioritária quanto à fixação de um regime de guarda partilhada. 13. O relatório pericial é claro quando menciona que o contexto da criança, e quando fala na ideia de mitigar refere-se à mitigação dos factores de risco que envolvem a atribuição da residência alternada e que se verificam quanto a esta criança, para tal regime ser adequado ao menor. 14. Na decisão recorrida não se enuncia com clareza o substrato factual que a suportou, omitindo-se outrossim a respetiva fundamentação jurídica e denotando-se clara falta de lógica a suportar a alteração do regime provisório, pelo que tal decisão está inquinada de vício de nulidade também nos termos do art. 615º, nº 1, al. b) do Cód. Processo Civil. 15. Neste sentido vide Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 07/11/2013, do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 15/01/2013., todos em www.dgsi.pt 16. Importa ainda alerta o Tribunal ad quem para o facto de que nenhuma alteração da regulação provisória foi solicitada pelas partes (excepto quanto à marcação de férias de Verão) e, em momento algum, ficou demonstrada qualquer necessidade de alterar o regime provisório em vigor não havendo assim razões de facto ou de direito para alterar o regime provisório existente. 17. Os presentes autos visam a regulação definitiva das responsabilidades parentais em relação ao menor CC, estando por isso em análise a aplicação de uma guarda partilhada com residência alternada, a requerimento do progenitor, para a qual não havia ainda elementos suficientes, pelo que não tem qualquer fundamento legal o estabelecimento daquele regime a título provisório. 18. A decisão proferida não tem em consideração o superior interesse da criança enquanto critério legal orientador mas sim o interesse egoístico do pai em obter uma guarda partilhada a todo o custo, ignorando as repercussões que uma alteração para uma residência alternada e o estabelecimento de férias de três semanas seguidas com o pai podem ter no menor. 19. Com todo o respeito, mas a douta decisão recorrida em nenhum momento procedeu à avaliação casuística do caso em apreço, ignorou os factores de risco enumerados no Relatório Pericial junto aos autos, designadamente a distância entre as residências dos progenitores (300km), a existência de conflito parental e a dificuldade de conciliação de rotinas entre ambos os progenitores. 20. Um dos fatores a ter em conta é o da continuidade das relações afetivas da criança e este factor foi completamente ignorado e afastado pelo douto Tribunal recorrido no regime que estabeleceu, não tendo existido a exigência que se impõe nestas situações. 21. A fixação da guarda conjunta (de exercício das responsabilidades parentais) com residências alternadas só é admissível desde que se faça um juízo de prognose favorável quanto ao que será a vida do menor, suportada em elementos de facto evidenciados no processo, o que não ocorre no caso em apreço. 22. A fixação do regime de residência, visitas e férias estabelecido na decisão recorrida é incompatível com a situação que se verifica nos autos, grande distância entre os locais em que os progenitores habitam, dificuldade de interacção entre os progenitores e a idade da criança. 23. A solução da guarda alternada (o CC ficará a residir alternadamente em períodos de duas semanas com a mãe e uma com o pai, alternadamente, e transposta também para as férias, vide ponto I residência e IV Férias da Ata do dia 19/06/2024) apresenta claros inconvenientes relacionados com a instabilidade que cria nas condições de vida do menor, motivadas pelas constantes mudanças a que o sujeitará. 24. Como é reconhecido no Relatório de Pedopsiquiatria junto aos autos, as crianças da idade do CC necessitam de estrutura, regras e previsibilidade, o direito dos pais ao gozo de férias com os filhos não se pode sobrepor à necessidade de estabilidade da criança nem ao laço afectivo com o progenitor de referência. 25. E de resto, uma solução da natureza da decisão tomada pelo Tribunal recorrido, guarda partilhada com residência alternada, não pode prescindir da capacidade de diálogo e da partilha de um projecto de vida entre os progenitores, o que não ocorre no caso em apreço, o qual se pautam por um constante conflito parental, visível nas dezenas de requerimentos apresentados pelo pai, onde as acusações à mãe são uma constante e onde as necessidades do menor são sempre ignoradas. 26. A decisão recorrida põe em causa a estabilidade do menor, implica sujeitá-lo a mudanças repentinas, num espaço curto de tempo, sem apoio psicológico, e até porque a guarda partilhada com residência alternada será impraticável assim que a criança entrar para o 1.º ciclo. 27. O CC sempre viveu com a mãe, que a zela, cuida, educa e dela toma totalmente existindo laços afetivos fortes entre ambos, e que é manifesto a elevada animosidade existente entre os progenitores, bem retratada nos presentes autos, nada, mas mesmo nada aconselha ou recomenda que se altere a residência atual e habitual do menor. 28. A alteração do regime provisório fixada nos presentes autos, e da qual se recorre, não olha às particularidades do caso concreto, acredita numa capacidade de adaptação que só o caso concreto poderia fundamentar (e não o faz), sujeitando o menor a uma mudança desnecessária. 29. Neste sentido vide Acórdãos STJ de 17/12/2019, de 27/01/2022, Acórdão da Relação do Porto de 10/02/2022, Acórdãos da Relação de Coimbra de 10/07/2019, 08-07-2021, Acórdão da Relação de Évora de 07/11/2023, Acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães de 02/12/2021, de 17/1272018, todos em www.dgsi.pt 30. A decisão decretada, ainda que provisória, foi prolatada de surpresa, de forma excessiva e não teve em consideração o superior interesse do menor, violando assim o disposto o douto Tribunal recorrido violou os artigos 154.º, 1878º, 1906º n.º 5 e n.º 7 todos do Código Civil, 607.º do CPC, art. 32. n.º 4 do RGPTC e artigos 36.º n.º 5 e 69.º n.º 1 e 205.º da CRP. O recorrido contra-alegou, pugnando pelo indeferimento da requerida atribuição ao recurso do efeito suspensivo e pela improcedência do recurso, tendo terminado as suas contra-alegações com as seguintes conclusões: A) Nos presentes autos, veio a Recorrente apresentar recurso da decisão recorrida, datada de 19/06/2024, decisão essa que constitui uma alteração ao regime de regulação provisória fixado na ata de 10/07/2023. B) A Recorrente peticiona, ainda, atribuição de efeito suspensivo ao recurso, alegando que a não suspensão da eficácia da decisão recorrida é violadora dos interesses do menor. C) Salvo o devido respeito por opinião diversa não só a decisão recorrida não padece de qualquer censura como motivo algum existe para que seja atribuído efeito suspensivo ao recurso. D) A decisão recorrida, na parte que motivou a apresentação da peça recursiva, determinou que: a.O menor passe três semanas de férias seguidas com o progenitor, com início a 21 de julho; b.A partir de setembro de 2024 o menor passa a residir uma semana com o progenitor (Recorrido) e duas com a progenitora (Recorrente), com início ao Domingo, possibilitando-se a realização de videochamadas do menor com o progenitor não residente às segundas, quartas e sextas-feiras; c.O regime referido em b) será objeto de avaliação pedopsiquiátrica em novembro de 2024, destinado a avaliação do impacto de tal alteração provisória na vida do CC. E) Ora, a atribuição de efeito suspensivo ao presente recurso o que provocaria é que o menor ficasse – injustamente – impossibilitado/privado de gozar férias de verão com o progenitor e com ele passar tempo de qualidade, uma vez que, até ao momento, não existe, nos autos, regulação definitiva quanto às responsabilidades parentais do menor CC; F) Razão pela qual aspetos como a passagem de períodos de férias de verão e períodos festivos como o Natal, Páscoa e passagem de ano têm sido objeto de decisões provisórias singulares, sem regulação futura. G) O menor ficaria impedido de ir à praia, à piscina e fazer o que é habitual em período de férias com um dos Pais. H)Por outro lado, o facto de ter sido estabelecido que, a partir de setembro de 2024, o menor passaria a residir uma semana com o progenitor e duas com a progenitora, alternadamente, não é uma decisão que não acautela os interesses do menor e que não possa ser já executada. I) O menor está habituado à presença do progenitor com quem, para além e fins de semana alternados, mantém contacto por videochamadas, nos tempos permitidos pela Recorrente e com quem já passou férias durante uma semana seguida no verão de 2023 sem que qualquer intercorrência se verificasse. J) A convivência que, desde bebé, o menor foi mantendo com o Pai - e que foi aumentada, de forma gradual, consoante o passar do tempo – fez com que o menor tenha vindo a criar uma relação afetuosa com o Pai e o reconheça como figura igualmente primordial na sua vida. K) Para além de pernoitar com o Recorrido em fins de semana alternados, de sexta feira a domingo, o CC passou férias de verão com o Pai, em 2023, sem que tivesse existido qualquer intercorrência ou estranheza da parte do mesmo; L) E passou o período de Natal com o Pai, durante 5 dias – de 22 a 26 de dezembro de 2023 – sem qualquer intercorrência ou estranheza. M) O CC está perfeitamente integrado na vida do progenitor razão pela qual, ainda que se sinta algo que ansioso nos momentos em que pressente a “separação” ou afastamento da zona de conforto materno rapidamente se adapta ao ambiente em que se integra de tal forma que não estranha qualquer tipo de convívio com o Pai ou avós ou restante família parental. N) Por conseguinte, não deve ser atribuído efeito suspensivo ao recurso interposto pela Recorrente. O) E também não deve ser alterada a decisão recorrida já que a mesma não padece de qualquer vício dos apontados pela Recorrente nem viola o superior interesse do menor; pelo contrário, acautela, em concreto, o atual superior interesse do CC. P) A decisão recorrida não é uma decisão definitiva – sequer existe regulação definitiva quanto às responsabilidades parentais - mas sim uma decisão que, provisoriamente, decidiu aumentar os períodos de convívio do menor com o progenitor, passando os mesmos a decorrer durante uma semana consecutiva – alternada com duas semanas consecutivas com a progenitora, mantendo-se a realização de videochamadas com o progenitor com quem não esteja a residir, naquela semana. Q) Tal regime será objeto de avaliação decorrido um período de três meses tendo sido desde logo notificada a técnica competente pela elaboração do relatório de pedopsiquiatria de fls… para encetar diligencias adequadas nesse sentido e comunicar aos autos o resultado dessa avaliação, no próximo mês de novembro. R) A decisão recorrida não foi tomada de ânimo leve, ao contrário daquilo que parece resultar das alegações recursivas da Recorrente. S) O Recorrido não caiu de paraquedas na vida do CC para que seja estranho ou desconfortável, para o menor, passar uma semana consecutiva com o mesmo (e duas com a Mãe), num regime que foi fixado de forma temporária e a ser objeto de avaliação ao final de três meses. T) A decisão recorrida analisou, atentamente, o relatório de pedopsiquiatria de fls.. que, no que respeita àquilo que, de concreto, a técnica apreciou, na interação do menor com os Pais, apurou que o menor é próximo de ambos e sente-se confortável com ambos. U) Os autos não revelam qualquer sinal rejeição do menor com o progenitor ou com a família paterna e o progenitor dispõe de condições económicas, habitacionais e sociológicas para que o menor possa conviver consigo durante um período mais alargado do que os fins de semana alternados e passar tempo de qualidade com o progenitor. V) E essa ligação afetiva do menor com o progenitor foi-se desenvolvendo desde quando o menor ainda era bebé, conforme se constata dos relatórios elaborados pelo CAFAP em fevereiro de 2021 e janeiro de 2023. W) O aumento gradual de convívios do menor com o progenitor que foi fixado na decisão recorrida permitirá não só fortalecer os laços do menor com o progenitor como perceber – pois tal decisão será objeto de acompanhamento – se uma mitigação de eventual guarda alternada será benéfico ou não para o menor. X) O facto do menor ter 3 anos e 9 meses – não frequentando o ensino pré escolar ou primário mas, ainda, o infantário - não constituiu impedimento para que, a partir de setembro de 2023, possa passar uma semana consecutiva com o progenitor, regime esse que será monitorizado e avaliado ao final de três meses. Y) O CC já passou períodos de uma semana consecutiva com o Pai – nomeadamente, nas Férias de verão de 2023 – sem ter estranhado ou reagido mal a um afastamento da mãe durante uma semana. Z) À data da apresentação das presentes contra alegações recursivas o menor está no quarto dia de férias com o Pai e a desenvolver brincadeiras e atividades habituais próprias à sua idade, passando momentos felizes e divertidos na companhia do Pai, avós e primos sem estranhar a presença dessas pessoas na sua vida. AA) Ao contrário do alegado pela Recorrente a decisão recorrida não deu primazia ao interesse do Recorrido mas sim ao bem estar do CC, possibilitando-se de, ainda na fase de tenra idade, fortalecer vínculos com o pai num regime de convívios/residência equilibrada; BB) Regime esse que será monitorizado e avaliado ao final de três meses. CC) Como documentos que poderão comprovar a boa justiça da decisão provisória de 19/06/2024, atente-se na decisão provisória de 15/12/2020 – ata com referencia citius 23079127; - decisão provisória de 10/05/2021 – ata com a referência citius 23401047; - decisão provisória de 20/12/2022 – ata com referencia citius 24775236 - decisão provisória de 10/07/2023 – ata com referencia citius 25297224 - relatório do CAFAP datado de 04/02/2021 – referencia citius 1726992 - relatório do CAFAP datado de 20/01/2023 – referencia citius 2160771 – apenso j. A 14/09/2024, a agora Sra. Juiz titular do J ..., proferiu o seguinte despacho: “A requerente, no seu recurso, vem invocar a nulidade da douta decisão prevista no artigo 615.º, alínea c), porquanto entende que não aceitou a celebração de acordo provisório nos presentes autos, tendo manifestado a sua oposição à alteração do regime provisório. Lida a integralmente a decisão prolatada nos autos, é manifesto que ocorreu um erro material que (…) ficou a dever-se a uma desatenção ou um engano ocorrido na operação de redação da ata, porquanto só há a uma regulação em termos provisórios quando os progenitores não chegaram a um acordo. Assim no caso há mais propriamente um lapso manifesto (a retificar por via do artigo 614.º do Código de Processo Civil) e não um vício intrínseco ao silogismo lógico que deve operar entre a fundamentação e a decisão determinante da nulidade da sentença artigo 615.º, n.º 1, al. c), do Código de Processo Civil. Pelo exposto, nos termos do artigo 613.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, determino a retificação da ata datada 19 de junho de 2024, devendo de deixar de constar da mesma o despacho homologatório bem como o texto que o antecede « Dada a palavra aos progenitores pelos mesmos foi dito concordarem com a proposta provisória de Regulação das Responsabilidades Parentais do seu filho CC». * A requerente invoca ainda a nulidade por falta de fundamentação nos termos do preceituado no artigo 615.º n.º 1 al. b) do Código de Processo Civil. O dever de fundamentação das decisões impõe-se ao juiz, nos termos do artigo 154.º, do Código de Processo Civil e corresponde a uma exigência constitucional, prevendo o artigo 205.º n.º 1 da CRP que “as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.” O artigo 154.º, do Código de Processo Civil sob a epígrafe “dever de fundamentar a decisão”, estabelece: “1. As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas. 2.A justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade.” As partes têm o direito de saber as razões da decisão do tribunal, pois só assim podem avaliar a bondade da mesma e, se for caso disso, ponderar a sua impugnação. O dever de fundamentação assenta na necessidade das partes serem esclarecidas e constitui uma fonte de legitimação da decisão judicial. O grau de fundamentação exigível dependerá tanto da complexidade da questão sobre a qual incide a decisão, como da controvérsia revelada pelas partes sobre a situação a decidir. Tem vindo também a ser entendido de forma pacífica, que só a absoluta falta de fundamentação pode determinar a nulidade da decisão, não se bastando tal vício com uma fundamentação menos exaustiva ou deficiente, vide neste sentido, a título de exemplo, o Acórdão do STJ de 10 de julho de 2008, no proc. 08A2179, in www.dgsi.pt. Ora da leitura da decisão que se recorre verifica-se que dela transparecem os factos, as provas e as razões da decisão. Contrariamente ao sustentado pelo requerente, a decisão que encontra-se fundamentada, não padecendo do vício que aquele lhe atribui, podendo, eventualmente, padecer de erro, seja de facto seja de direito, a levar à revogação, caso a solução de mérito nela sufragada não colha fundamento legal, sendo tal error in iudicando, atacável e a ser apreciado em via de recurso, e sendo até, que, como vimos, de acordo com o entendimento doutrinal e jurisprudencial uniforme, apenas o vício da absoluta falta fundamentação é suscetível de determinar a invalidade da decisão, nos termos da al. b) do n.º 1 do artigo 615.º, do Código de Processo Civil, o que, evidentemente, não é o caso. Pelo exposto, julgo totalmente improcedentes as arguidas nulidade da sentença. E proferiu despacho de admissão do recurso, com efeito meramente devolutivo, não alterado por esta Relação. 2. Questões a apreciar O objecto do recurso é balizado pelo teor do requerimento de interposição (artº 635º nº 2 do CPC), pelas conclusões (art.ºs 608º n.º 2, 609º, 635º n.º 4, 637º n.º 2 e 639º n.ºs 1 e 2 do CPC), pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (art.º 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (art.º 633º CPC) e ainda pelas questões de conhecimento oficioso, cuja apreciação ainda não se mostre precludida. O Tribunal ad quem não pode conhecer de questões novas (isto é, questões que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que “os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando… estas sejam do conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha elementos imprescindíveis” (cfr. António Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, 7ª edição, Almedina, p. 139). Pela sua própria natureza, os recursos destinam-se à reapreciação de decisões judiciais prévias e à consequente alteração e/ou revogação, pelo que não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objecto de apreciação da decisão recorrida. As questões que cumpre apreciar de acordo com a sua precedência lógica, são: - a decisão recorrida padece da nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do art.º 615º do CPC? - a decisão recorrida padece da nulidade prevista na alínea c) do n.º 1 do art.º 615º do CPC? - a decisão recorrida viola o superior interesse do menor? 3. Das nulidades da sentença 3.1. Enquadramento jurídico Dispõe o art.º 615º do CPC: 1. É nula a sentença quando: (…) b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; (…)” Este normativo também é aplicável aos despachos como decorre do disposto no art.º 613º n.º 3 do CPC. A sentença pode ser vista como trâmite ou como acto: no primeiro caso, atende-se à sentença no quadro da tramitação da causa; no segundo, considera-se o conteúdo admissível ou necessário da sentença. As nulidades da sentença e dos acórdãos referem-se ao conteúdo destes actos, ou seja, estas decisões não têm o conteúdo que deviam ter ou têm um conteúdo que não podiam ter (cfr. Miguel Teixeira de Sousa, in O que é uma nulidade processual? in Blog do IPPC, 18-04-2018, disponível em https://blogippc.blogspot.com/search?q=nulidade+processual). A alínea b) está relacionada com o disposto: - no art.º 205º n.º 1 da CRP, que dispõe que as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei; - no art.º 154º do CPC, que dispõe, no n.º 1, que as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas e no n.º 2 que a justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo, quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade; - e especificamente, no que respeita à sentença, com o disposto no art.º 607º do CPC, cujo n.º 3 dispõe que nos fundamentos, deve o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes; - e ainda com o disposto no n.º 4, o qual dispõe que na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência. Em síntese e como refere Manuel Tomé Soares Gomes in Da Sentença Cível, CEJ, 2014, https://elearning.cej.mj.pt/mod/folder/view.php?id=6202, pág. 9-10: “A fundamentação de facto e de direito, que compreende: (i) - em primeira linha, a enunciação dos factos provados e dos factos não provados; (ii) - seguidamente, a motivação do julgamento de facto mediante a análise crítica das provas e a especificação dos fatores que foram decisivos para a convicção sobre cada facto, com a indicação dos concretos meios de prova convocados para tal efeito; (iii) – e a rematar com a fundamentação de direito, indicando, interpretando e aplicando as normas jurídicas correspondentes.” (para uma análise desenvolvida, o mesmo aut. e ob. cit., pág.s 13-33) De referir que a situação prevista nesta alínea b) só se verifica quando exista falta absoluta: - da enunciação dos factos provados e dos factos não provados (art.º 607º, n.º 3); - da motivação do julgamento de facto (art.º 607º n.º 4); - ou da fundamentação de direito (art.º 607º, n.º 3). Assim e utilizando a expressão “motivação” no sentido de “fundamentos de facto e de direito”, a qual restringimos à justificação da decisão da matéria de facto, afirmava Alberto dos Reis, in CPC Anotado, V, 140: “Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação, da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade”. Na jurisprudência e a título meramente exemplificativo, o Ac. do STJ de 02/03/2021, processo 835/15.0T8LRA.C3.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj - “Só a absoluta falta de fundamentação - e não a errada, incompleta ou insuficiente fundamentação - integra a previsão da nulidade do artigo 615.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil”. Algumas notas de precisão. O n.º 4 tem em vista a motivação da decisão de facto, que tem de ser incluída na sentença e tem em vista permitir o controlo dessa decisão, dada a possibilidade que as partes têm de recorrer da matéria de facto, cumpridos que sejam os requisitos do art.º 640º do Código de Processo Civil. Como referem Lebre de Freitas e Isabel Alexandre in Código de Processo Civil Anotado”, vol. 2º, 3ª edição, pág. 707 “A fundamentação [da decisão de facto] passou a exercer, pois, a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo tribunal superior e de reforçar o autocontrolo do julgador, sendo um elemento fundamental na transparência da Justiça, inerente ao ato jurisdicional.” Não há falta absoluta de motivação do julgamento de facto, quando se trate de: a) fundamentação deficiente, no sentido de não estar devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, situação que segue o regime do art.º 662º n.º 2, alínea d) do CPC; b) fundamentação medíocre, insuficiente, incompleta, não convincente ou contrária à lei, em que poderá haver erro de julgamento de facto, a constituir, por isso, objecto de recurso de impugnação da matéria de facto, salvo as situações em que esteja pura e simplesmente em causa a aplicação de normas de direito probatório material. Quanto à fundamentação de direito, a medida da mesma dependerá da complexidade da questão objecto da decisão, do grau e natureza da controvérsia entre as partes e, até, eventualmente, da controvérsia doutrinal e jurisprudencial quanto à mesma. Como referem Jorge Miranda e Rui Medeiros, in Constituição da República Portuguesa Anotada, Tomo III, Coimbra, 2007, págs. 72 e 73, a fundamentação das decisões judiciais, além de ser expressa, clara, coerente e suficiente, deve também ser adequada à importância e circunstância da decisão. Quer isto dizer que as decisões judiciais, ainda que tenham que ser sempre fundamentadas, podem sê-lo de forma mais ou menos exigente (de acordo com critérios de razoabilidade) consoante a função dessa mesma decisão. A alínea c) tem dois fundamentos - a contradição e a ininteligibilidade. À economia do recurso apenas releva a primeira. A contradição verifica-se quando ocorre incompatibilidade entre os fundamentos e a decisão, ou seja, em que a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado final (Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, CPC Anotado, I, 2ª edição, pág. 763). A contradição entre fundamentos e a decisão é estritamente no plano lógico da construção da decisão. Coisa diversa é o próprio silogismo estar errado no seu mérito, por conter uma contradição com os factos ou com o direito: trata-se, então, de erro de julgamento, por o juiz decidir contra os factos ou contra “lei” que lhe impunha uma decisão diversa (Rui Pinto, Manual do Recurso Civil, AAFDL Editora, pág. 83). Se a decisão sobre determinados pontos da matéria de facto for contraditória, a solução passa pela aplicação do disposto na alínea c) do n.º 1 do art.º 662º do CPC. A este respeito afirmam Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in CPC Anotado, Vol. 2, 3ª edição, pág. 736-737; “Entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgado seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correcta, a nulidade verifica-se.” 3.2. Da decisão provisória no RGPTC – O n.º 1 do art.º 28º do RGPTC, que constitui uma disposição processual comum aos procedimentos tutelares cíveis, dispõe que em qualquer estado da causa e sempre que o entenda conveniente, a requerimento ou oficiosamente, o tribunal pode decidir provisoriamente questões que devam ser apreciadas a final, bem como ordenar as diligências que se tornem indispensáveis para assegurar a execução efetiva da decisão. (sublinhado nosso). Trata-se de possibilitar ao tribunal adoptar uma decisão que vigorará enquanto a questão objecto do processo – no caso, a regulação das responsabilidades parentais - não for objecto de decisão final transitada em julgado e, ainda, de acautelar o efeito prático das suas decisões (provisórias ou definitivas), ordenando as diligências necessárias a assegurar a sua efectividade. Na impossibilidade ou dificuldade de reunir, em curto prazo, todos os elementos probatórios necessários para a prolação de uma decisão tendencialmente definitiva, o legislador previu a possibilidade de serem adotadas decisões provisórias, até que aquela seja proferida, com base nos elementos constantes do processo - às vezes escassos – e, nessa medida, impondo que o juiz se conduza por um critério de razoabilidade, bom senso e prudência. E porque tais decisões são proferidas com base nos elementos disponíveis, as mesmas (assim como as decisões tendencialmente definitivas) são alteráveis logo que tal se justifique, nomeadamente quando a prova posteriormente recolhida permita infirmar a essência das bases de facto em que aquela decisão assentou, dada a natureza de jurisdição voluntária típica destes procedimentos e de acordo com as condições previstas na lei - art.º 12º do RGPTC e art.ºs 986º e 988º do Código de Processo Civil. O que importa é que, em face dos elementos constantes do processo, se assegure transitoriamente o bem-estar físico, emocional e afetivo da criança, proporcionando-lhe, tanto quanto possível e em essência, um ambiente feliz e estabilidade relacional com os progenitores, assegurando, na possível medida, a manutenção da respetiva relação afetiva e uma presença ativa de ambos os progenitores nas suas vidas sempre que nada o desaconselhe. Os pressupostos das medidas provisórias são: a) a existência de um processo tutelar cível (em qualquer estado da causa); b) a formulação de um juízo de conveniência (sempre que o entenda conveniente), juízo este que tem uma dupla vertente: quanto ao momento da prolação da decisão provisória, que está presente nesta norma, e quanto à solução substantiva a adoptar, embora no âmbito das providências tutelares cíveis e como decorre do disposto na alínea a) do art.º 4º da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, aplicável ex vi n.º 1 do art.º 4º do RGPTC, tal solução haja de ter, primacialmente em consideração, o interesse superior da criança ou jovem; c) que a mesma tenha por objecto questão que se integre no âmbito do processo (decidir provisoriamente questões que devam ser apreciadas a final). Tendo em vista a prolação da decisão provisória o tribunal procede às averiguações sumárias que tiver por convenientes (n.º 3 do art.º 28º), tendo-se em consideração que, como dispõe o art.º 12º do RGPTC, os processos tutelares cíveis têm a natureza de jurisdição voluntária, o que significa que, além do mais, o tribunal dispõe do poder-dever de investigar livremente os factos, coligir provas e indeferir, por despacho fundamentado, as provas que considere desnecessárias (cfr. art.º 986, n.º 2 do CPC). Além disso, ouve as partes, exceto quando a audiência puser em risco sério o fim ou a eficácia da providência (n.º 4 do art.º 28º). Apesar de a celeridade constituir uma nota característica da decisão provisória ou cautelar, o art.º 28º não confere natureza urgente a tal decisão, na medida em que vale a regra geral do art.º 13º do RGPTC. Neste ponto impõe-se distinguir celeridade e urgência. Nos termos do art.º 2º do CPC a proteção jurídica através dos tribunais implica o direito de obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado, a pretensão regularmente deduzida em juízo, bem como a possibilidade de a fazer executar. O “respeito pela razoabilidade dos prazos (…) dependerá de diversos fatores ligados à complexidade dos litígios ou ao comportamento das partes, mas legitima que o juiz, no uso do poder de gestão processual, adote as medidas que se mostrem concretamente necessárias para a salvaguarda desse direito fundamental [obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie a pretensão regularmente deduzida em juízo]: assegurando o processo equitativo, mas agindo no sentido de, com razoabilidade e proporcionalidade, eliminar ou atenuar fatores que determinam o arrastamento excessivo ou injustificado da tramitação processual.” (cfr. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa in CPC Anotado, 2ª edição pág. 16-18). Esta é uma realidade. Outra, bem diferente, é os autos terem juridicamente natureza urgente, ou seja, não estarem sujeitos à suspensão dos prazos processuais durante as férias judiciais (cfr. art.º 138º, n.º 1 do CPC, parte final). A natureza urgente depende da previsão prévia, geral e abstrata efectuada pelo legislador e não da concreta tramitação processual adoptada No caso, dispõe o art.º 13º do RGPTC que correm durante as férias judiciais os processos tutelares cíveis cuja demora possa causar prejuízo aos interesses da criança. Decorre deste normativo que os processos tutelares cíveis – em que se inclui a regulação das responsabilidades parentais – não são urgentes, ou seja, ao contrário do que sucede no nosso sistema jurídico com outros processos (procedimentos cautelares e processos de insolvência, por exemplo), em que a lei lhes atribuiu natureza urgente, isso não sucede com os processos em referência. Para que tenham natureza urgente é necessário que o juiz da causa, mediante despacho, reconheça fundamentadamente que a demora na tramitação pode causar prejuízo aos interesses da criança e atribua aquela natureza. Assim celeridade e urgência não se confundem. E se é certo que é patente e manifesto que os autos carecem de desenvolvimento célere – o processo foi instaurado em 2020 e ainda não tem decisão definitiva –, a verdade é que nunca foi proferido despacho a atribuir aos autos natureza urgente (pese embora o requerido tenha apresentado a 18/02/2022 requerimento nesse sentido, que, salvo algum lapso de consulta emergente da extensão dos autos, não foi objecto de apreciação). Muito embora a adopção ou alteração de uma medida provisória tenha por base uma averiguação sumária e se guie por critérios de conveniência e oportunidade (cfr. art.º 987º do CPC), isso não significa qualquer possibilidade de arbitrariedade. Em primeiro lugar, o juiz deverá justificar a razão ou as razões pelas quais entende ser oportuno adoptar ou alterar uma decisão provisória (a menos que se trate de uma situação em que, ab initio, a adopção da decisão provisória seja obrigatória, como sucede com o disposto no art.º 38º do RGPTC). Em segundo lugar, a decisão substantiva deverá ser fundamentada, de facto e de direito (art.º 607 n.ºs 3 e 4, aplicável ex vi art.º 295º, 986º n.º 1, ambos do CPC e 12º do RGPTC). No sentido do exposto: - na doutrina Pedro Raposo de Figueiredo in RGPTC Anotado, pág. 248, 251 – onde refere que “na decisão haverão de ser discriminados os factos que se consideram provados e não provados e a respectiva fundamentação (art.º 607/3 e 4 CPC aplicável por força do art.º 295º do CPC).” – e 255. - na jurisprudência (consideraremos apenas a mais recente pese embora já no âmbito da OTM assim fosse entendido, de que são exemplos os Ac.s da RP de 16/11/2010, processo 2861/09.9TBVCD-B.P1, consultável in www.dgsi.pt/jtrp, da Rc de 15/01/2013, proc. 718/11.2TMCBR-A.C1 e da RL de 07/11/2013, proc. 7598/12.9TBCSC-A.L1-6, consultável in www.dgsi.pt/jtrl): - Ac. da RL de 25/01/2018, processo 17627/17.4T8LSB.L1-6, consultável in www.dgsi.pt/jtrl; - Ac. da RE de 27/02/2020, proc. 2069/19.5T8PTM-A.E1, consultável in www.dgsi.pt/jtre em cujo sumário consta: i) no âmbito de uma providência tutelar cível, na qual o citério da oportunidade ou conveniência dá azo à prolação de uma decisão provisória, tal não implica que o Julgador esteja dispensado de cumprir o ritualismo mínimo inerente à decisão, designadamente a discriminação dos factos que considera provados e relevantes para sustentar a sua posição aplicando-lhe o direito que tiver por adequado; iii) as decisões judiciais, sejam elas sentenças ou simples despachos, carecem de ser fundamentadas, excluindo-se apenas o dever de fundamentação das decisões de mero expediente. iv) a não discriminação de factos, bem como de qualquer norma legal que sustente a decisão, conduz necessariamente à nulidade da sentença. - Ac. da RC de 02/06/2020, processo 184/15.3T8CBR-G.C1, consultável in www.dgsi.pt/jtrc, em cujo sumário se afirma: I – Uma decisão provisória proferida no âmbito de providência tutelar cível de Alteração da Regulação das Responsabilidades Parentais instaurada no âmbito do RGPTC, sendo processo de “jurisdição voluntária” (cf. art. 12º do RGPTC), deve ser fundamentada, por lhe serem aplicáveis as disposições que constam dos arts. 154º e 607º do n.C.P.Civil, este último por força das remissões que resultam da conjugação do disposto nos arts. 295º e 986º, nº 1, do mesmo diploma legal. II – Assim, o julgador, em consonância com o preceituado no art. 607º, nº4 do n.C.P.Civil, ainda que em medida devidamente adaptada ao caso, deve fundamentar tanto no plano fáctico, como no plano jurídico, a decisão por si proferida. - Ac. da RE de 11/02/2021, proc. 1433/20.1T8FAR-A.E1, consultável in www.dgsi.pt/jtre; - Ac. da RP de 08/02/2024, proc. 3032/22.4T8FNC-E.P1, consultável in ww.dgsi.pt/jtrp em cujo sumário consta: II - A menor exigência no cumprimento do dever de fundamentação na prolação de decisão cautelar e provisória no âmbito de um processo de promoção e proteção não se confunde nem permite a total omissão de fundamentação. III - Tal absoluta falta de fundamentação verifica-se quando a decisão se restringe ao dispositivo, e – não obstante a natureza do processo e o caráter cautelar e provisório da decisão – determina nulidade da decisão assim proferida. - Ac. da RL de 09/04/2024, proc. 903/23.4T8CSC-F.L1-7, consultável in www.dgsi.pt/jtrl em cujo sumário consta: I - Para que se possa proferir decisão, mesmo que provisória, acerca da regulação do exercício das responsabilidades parentais é mister que o tribunal fixe, ainda que sumariamente, os factos provados e não provados que se mostrem relevantes, que faça a análise crítica da prova e que proceda ao enquadramento jurídico dos factos. II - Havendo absoluta falta de fundamentação de facto e de direito, a decisão é nula, por violação do disposto no art. 615º nº1 b) do Código de Processo Civil. - Ac. da RL de 06/06/2024, proc. 1056/22.0T8VFX-G.L1-2, consultável in www.dgsi.pt/jtrl, em cujo sumário consta: II–A decisão provisória proferida ao abrigo do disposto no artigo 28º R.G.P.T.C. que altera o regime de contactos entre a menor e a mãe, omitindo quer o enquadramento factual que justifica tal alteração, quer a respetiva fundamentação jurídica, é nula, nos termos do disposto no artigo 615º, nº 1, alínea b), CPC. - Ac. da RE de 10/10/2024, proc. 448/24.7T8STB-B.E1, consultável in www.dgsi.pt/jtre em cujo sumário consta: 1. Padece de nulidade, por absoluta falta de fundamentação, a decisão de fixação de regime provisório proferida em ação de regulação das responsabilidades parentais que contém apenas o dispositivo, pois dessa decisão deve também constar a indicação dos factos indiciariamente provados e não provados e respetiva motivação, bem como do enquadramento jurídico que sustentam o regime estabelecido, ainda que de forma sucinta. - Ac da RL de 10/10/2024, proc. 2335/23.5T8LSB-B.L1-2, consultável in www.dgsi.pt/jtrl e em cujo sumário consta: I. Para que se possa proferir decisão, ainda que provisória, sobre a regulação do exercício das responsabilidades parentais, é necessário que o Tribunal fixe os factos provados e não provados, ainda que a título indiciário, que se mostrem relevantes para esse efeito. II. Havendo falta de fundamentação de facto, a decisão é nula por violação do disposto no art.º 615º, n.º 1, b), do CPC. III. Não tendo sido fixados quaisquer factos provados, devem os autos ser remetidos à primeira instância, para prolação de nova decisão, devidamente fundamentada, não havendo em tal caso lugar à regra da substituição prevista no art.º 655º, n.º 1, do CPC, a fim de se garantir o duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto. - Ac. da RC de 12/11/2024, proc. 474/19.6T8FIG-H.C1, consultável in www.dgsi.pt/jtrc II – A fixação de um regime provisório não tem que ter o mesmo grau de fundamentação que se exige a uma sentença, mas também não pode olimpicamente ignorá-la, de facto ou de direito – arts. 607.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi art. 33.º, n.º 1, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível. III – Uma decisão provisória totalmente omissa na especificação dos factos, provados e não provados, meios probatórios e respectiva subsunção jurídico-tutelar, é nula à luz do art. 615.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil. 3.3. Em concreto Em primeiro lugar impõe-se verificar que a 15/12/2020 foi estabelecido um regime provisório nos termos do art.º 38º do RGPTC, o qual foi alterado a 10/05/2021, a 20/12/2022 (apenso J)), 27/03/2023, 10/07/2023 e, finalmente, pela decisão recorrida. Destarte a decisão recorrida é uma decisão de alteração da regulação provisória das responsabilidades parentais. Analisando a decisão recorrida não podemos deixar de concluir que a mesma carece, patente e manifestamente, de fundamentação de facto e, consequentemente, de motivação da mesma, pois não: (i) - enuncia os factos provados e os factos não provados; (ii) - a motivação do julgamento de facto mediante a análise crítica das provas e a especificação dos fatores que foram decisivos para a convicção sobre cada facto, com a indicação dos concretos meios de prova convocados para tal efeito; Quanto à fundamentação de direito (em que se incluem as razões da alteração do regime provisório em vigor), apenas se considera que a mesma não é completa pois a decisão recorrida ponderou: “Uma vez que não há acordo nos presentes autos, e concordando-se com a promoção que antecede e de forma a evitar um desequilíbrio na relação entre os progenitores e o menor, podendo o regime em vigor, residência junto da progenitora, condicionar a futura decisão sobre esse mesmo item, e uma vez que o relatório da Senhora Perita refere que a residência alternada, a existir, dever ser mitigada, não tendo sido obstaculizada atento que o menor ainda não se encontra a frequentar o ensino obrigatório, o Tribunal Regula as Responsabilidades Parentais DE FORMA PROVISORIA do menor CC nos seguintes termos:…” Sendo assim, impõe-se concluir que a decisão recorrida é nula à luz do disposto no art.º 615º, n.º 1 alínea b) do CPC. Resta agora estabelecer as consequências. O art.º 665º n.º 1 do CPC dispõe: “Ainda que se declare nula a decisão que põe termo ao processo, o tribunal de recurso deve conhecer do objecto da apelação”. Sucede que estamos perante uma absoluta falta de fundamentação de facto. Assim e desde logo, não está estabelecida a plataforma necessária para a integração jurídica do caso pela Relação e, nesta medida, não estão reunidos os elementos essenciais para a Relação apreciar e decidir se o regime provisório atenta contra o interesse superior do menor. Além disso, não deverá esta Relação substituir-se à 1ª instância na integral fixação dos factos, não só porque formaria uma dada convicção, quando, como se salientou no Acórdão desta RG, de 03/03/2016, processo 130/14.1T8VRL.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg, “A livre convicção do julgador de 1ª instância só a ele compete e não pode ser confundida e/ou suprida pela convicção do julgador de 2ª instância” e, assim, seria violado o duplo grau de jurisdição em matéria de facto. Por outro lado e como já ficou referido no ponto 2, a Relação não pode conhecer de questões novas (isto é, questões que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que “os recursos constituem mecanismo destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando… estas sejam do conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha elementos imprescindíveis” (cfr. António Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, 7ª edição, Almedina, p. 139). Pela sua própria natureza, os recursos destinam-se à reapreciação de decisões judiciais prévias e à consequente alteração e/ou revogação, pelo que não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida. Sendo assim, o art.º 665.º, n.º 1 do CPC não pode ser interpretado e aplicado de forma tão ampla, ao ponto de nele se considerar incluída a situação em que a decisão é nula por falta absoluta de fundamentação de facto. Neste sentido a Decisão sumária desta RG de 03/11/2022, processo 2000/22.0T8VCT-A.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg (bold nosso): “Importa, porém, ter igualmente presente que «os Recursos destinam-se à apreciação de questões já antes levantadas e decididas no processo e não a provocar decisões sobre questões que não foram ainda submetidas ao contraditório e decididas pelo Tribunal Recorrido, a menos que se trate de questões de conhecimento oficioso» (António Santos Abrantes Geraldes, op. cit., págs. 98 e 99). Por outras palavras, «o regime consagrado entre nós para os recursos ordinários é de (…) reponderação e não de reexame, visto que o tribunal superior não é chamado a apreciar de novo a acção e a julgá-la como se fosse pela primeira vez, indo antes controlar a correcção da decisão proferida pelo tribunal recorrido, face aos elementos averiguados por este último» (Ac. da RC, de 27.05.2015, Isabel Silva, Processo n.º 416/13.2TBCBR.C1). Defende-se, assim, que a consideração e aplicação do disposto no art. 665.º, do CPC, não pode ser feita de forma tão ampla que pretira a garantia, legal e constitucional, do duplo grau de jurisdição na apreciação, julgamento e decisão da matéria de facto; e, assim, será inaplicável quando tenha ocorrido omissão absoluta de fundamentação de facto (13), ou de conhecimento de qualquer das questões de mérito submetidas à apreciação do Tribunal a quo (14).” E nas referidas notas (13) e (14), consta: “13. Neste sentido, Ac. da RG, de 18.12.2017, Helena Melo, Processo n.º 1099/17.6T8VNF.G1, onde se lê que a «regra da substituição do Tribunal de recurso ao tribunal recorrido não pode ser entendida como tendo aplicação nos casos em que o tribunal recorrido simplesmente não se pronuncia sobre nenhuma das questões suscitadas e de que devia conhecer. Pretendeu-se que o tribunal de recurso supra alguma nulidade pontual que possa ter ocorrido, mas não que seja ele a proferir totalmente a decisão, deste modo suprimindo totalmente um grau de jurisdição. A intenção subjacente à regra da substituição que tem como fundamento a celeridade não se aplica aos casos de total ausência de pronúncia, devendo, nesses casos, a decisão ser anulada». (…) 14. Neste sentido, Ac. da RL, de 19.05.2016, Maria Teresa Pardal, Processo n.º 478-14.5TBCSC.L1-6, onde se lê que, tendo «a decisão recorrida conhecido de um pressuposto processual e não do fundo da causa, não deverá operar a regra da substituição ao tribunal recorrido prevista no artigo 665º nº2, que só deverá aplicar-se nas situações em que o tribunal recorrido já apreciou o fundo da causa, não se pronunciando sobre questões que ficaram prejudicadas (artigo 608º nº2 do CPC), como parece indicar a expressão “por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio”. Já não será assim quando, como é o caso, a decisão recorrida se limitou a conhecer de um pressuposto processual e a absolver da instância, sob pena de a Relação poder eventualmente decidir a causa em 1ª instância, com a consequente supressão de um grau de jurisdição». Destarte, perante uma decisão nula por absoluta falta de fundamentação de facto, o n.º 1 do art.º 665º do CPC deve ser objecto de uma interpretação e aplicação restritiva. No mesmo sentido, mas aplicado ao processo tutelar cível: - Ac. da RL de 22/03/2022, proc. 2274/19.4T8LSB-A.L1-7, consultável in www.dgsi.pt/jtrl, em cujo sumário consta: I.– Justifica-se uma interpretação restritiva do Artigo 665º, nº1, do Código de Processo Civil, nos termos da qual em situações em que ocorra uma total ausência de fundamentação de facto da decisão impugnada, deve ser anulada a decisão impugnada, ordenando-se ao tribunal a quo que a fundamente, garantindo-se efetivamente o duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto. II.– O dever de substituição previsto no Artigo 665º, nº1, visa, em primeira linha, conduzir a uma resolução célere do litígio, no pressuposto de que o Tribunal da Relação disponha dos elementos necessários para tal. Todavia, a esse valor da celeridade há que contrapor o da garantia do duplo grau de jurisdição em matéria de facto, afigurando-se que este valor é mais garantístico e proeminente para a realização de um processo equitativo, na vertente de um processo que permita, num prazo razoável, a descoberta da verdade material e a prolação de uma decisão ponderada. - Ac. da RL de 09/04/2024, proc. 903/23.4T8CSC-F.L1-7, consultável in www.dgsi.pt/jtrl em cujo sumário consta: III - Não tendo sido fixados quaisquer factos provados, devem os autos ser remetidos à primeira instância, para prolação de nova decisão, devidamente fundamentada, interpretando-se restritivamente a regra da substituição prevista no art. 665º nº1 do Código de Processo Civil, a fim de se garantir o duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto. - Ac. da RE de 10/10/2024, proc. 448/24.7T8STB-B.E1, consultável in www.dgsi.pt/jtre em cujo sumário consta: 2. Neste caso não deve o Tribunal da Relação substituir-se ao Tribunal recorrido, nos termos do artigo 665.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, mas antes deve ser o Tribunal recorrido a suprir a falta de fundamentação de facto e de direito, sob pena de supressão de um grau de jurisdição na apreciação e julgamento da matéria de facto. - Ac da RL de 10/10/2024, proc. 2335/23.5T8LSB-B.L1-2, consultável in www.dgsi.pt/jtrl e em cujo sumário consta: III. Não tendo sido fixados quaisquer factos provados, devem os autos ser remetidos à primeira instância, para prolação de nova decisão, devidamente fundamentada, não havendo em tal caso lugar à regra da substituição prevista no art.º 655º, n.º 1, do CPC, a fim de se garantir o duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto. Em face do exposto, impõe-se julgar procedente o recurso e em consequência, declarar a nulidade da decisão recorrida por absoluta falta de fundamentação e determinar a devolução dos autos à 1ª instância a fim de proferir nova decisão que altera o regime provisório de exercício das responsabilidades parentais, devidamente fundamentada de facto (com discriminação dos factos provados e não provados e apreciação crítica da prova produzida) e de direito (indicando, interpretando e aplicando as normas jurídicas pertinentes). Em consequência ficam prejudicadas as demais questões suscitadas no recurso. 3.4. Custas As custas da apelação são a cargo da recorrente que, sem qualquer oposição quanto à questão da nulidade, tirou proveito do recurso por si interposto (art.º 527º, do CPC). 4. Decisão Em face do exposto, acordam os juízes que compõem a 1ª Secção da Relação de Guimarães em julgar procedente o recurso e em consequência: - Declara-se nula a decisão recorrida, por absoluta falta de fundamentação de facto e de direito; - Ordena-se a devolução dos autos ao Tribunal a quo para que profira nova decisão, que altera o regime provisório de exercício das responsabilidades parentais, devidamente fundamentada de facto (com discriminação dos factos provados e não provados e apreciação crítica da prova produzida) e de direito (indicando, interpretando e aplicando as normas jurídicas pertinentes). - Declara-se prejudicado o conhecimento do restante objecto da apelação. Custas pela Recorrente. Notifique-se * Guimarães, 09/01/2025 (O presente acórdão é assinado electronicamente) Relator: José Carlos Pereira Duarte Adjuntos: Lígia Paula Ferreira de Sousa Santos Venade José Alberto Martins Moreira Dias [1] Apenas contemplaremos neste Relatório as incidências processuais relevantes para contextualizar o recurso, pois as vicissitudes processuais sem que tenha sido proferida decisão definitiva, ao fim de mais de quatro anos, são inúmeras, como são já inúmeros os incidentes de incumprimento das decisões provisórias. |