Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | ESPINHEIRA BALTAR | ||
Descritores: | ACIDENTE DE VIAÇÃO DANO MORTE DANOS MORAIS ARTIGO 485º DO CÓDIGO CIVIL | ||
Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 09/30/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | APELAÇÃO INDEPENDENTE E SUBORDINADA. APELAÇÃO INDEPENDENTE IMPROCEDENTE. APELAÇÃO SUBORDINADA PARCIALMENTE PROCEDENTE. | ||
Indicações Eventuais: | 2.ª SECÇÃO CÍVEL | ||
Sumário: | 1. Considerou-se que os danos morais sofridos pelos autores com a morte das vítimas foram calculados de acordo com as regras da equidade seguindo a jurisprudência dos tribunais superiores. 2. Apenas julgamos que a compensação pelo dano da morte da L. F. excedeu o critério do STJ. pelo que a diminuímos de 90.000€ para 80.000€. 3. Os danos patrimoniais conexos com a perda de salários, despesas com a ida ao funeral e tratamentos de natureza psiquiatra e psicológica por parte dos autores, pais da L. F., são de natureza reflexa com o acidente e suas consequências, não sendo indemnizáveis pelo artigo 483 do C. Civil e 495 1 e 2 do mesmo diploma, este de carater excecional, aplicando-se aos casos aí previstos. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães (1) J. F., M. I. e M. F. intentaram a presente ação declarativa com processo comum contra: X – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., e peticionam: A) Deve a ré ser condenada a pagar à autora J. M. e ao autor M. I., a título de iure hereditário por óbito da filha L .F., e a dividir por ambos em partes iguais, o montante global de € 100.750,00 (cem mil, setecentos e cinquenta euros), (danos morais – artigo 38º: € 10.000,00 + óculos – artigo 39º: € 750,00 + perda do direito à vida – artigo 41º: € 90.000,00); B) Deve a ré ser condenada a pagar à autora J. M., a quantia global de € 104.620,72 (cento e quatro mil, seiscentos e vinte euros e setenta e dois cêntimos), (danos morais pela perda da filha – artigo 69º: € 100.000,00 + salários perdidos – artigo 75º: € 4.492,00 + despesas pessoais – artigo 101º: € 128,72), bem como os salários que a mesma vai deixar de auferir, contados desde esta data até àquela em que tenha condições para retomar o trabalho; C) Deve a ré ser condenada a pagar ao autor M. I., a quantia global de € 85.320,98 (oitenta e cinco mil, trezentos e vinte euros e noventa e oito cêntimos), (danos morais pela perda da filha – artigo 86º: € 80.000,00 + despesas com viagens – artigo 87º: € 128,98 + salários perdidos – artigo 89º: € 5.192,00); D) Deve a ré ser condenada a pagar à autora J. M. e ao autor M. F., a título de iure hereditário por óbito da mãe G. C., e a dividir por ambos em partes iguais, o montante global de € 100.750,00 (cem mil, setecentos e cinquenta euros), (danos morais – artigo38º: € 10.000,00 + óculos – artigo 40º: € 750,00 + perda do direito à vida – artigo 41º: € 90.000,00); E) Deve a ré ser condenada a pagar à autora J. M., a quantia de € 80.000,00 (oitenta mil euros), a título de danos morais pela perda da mãe (artigo 100º); F) Deve a ré ser condenada a pagar ao Autor M. F., a quantia de € 80.000,00 (oitenta mil euros), a título de danos morais pela perda da mãe (artigo 100º); G) Deve a ré ser condenada a pagar à autora J. M., a quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros), referente à importância que a sua entidade patronal lhe emprestou a fim de efetuar o pagamento das despesas com os funerais da sua filha L .F. e da sua mãe G. C. (artigo 102º); H) Deve a ré ser condenada nos juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, contados sobre as importâncias atrás referidas nas alíneas A) a G), desde a citação até efetivo e integral pagamento. Alegaram para o efeito em resumo que: - no dia 19 de junho de 2019, pelas 09:50 horas, na passagem de nível de caminhos-de-ferro existente na Estrada Nacional 204, km 18,500, na freguesia de ... - Barcelos, ocorreu um acidente de viação, envolvendo o veículo ligeiro, com matrícula EV, propriedade e conduzido por E. R., e o “comboio internacional 420”; - o condutor do veículo EV, ao chegar à interseção da Estrada Nacional por onde seguia, com a via-férrea, não respeitou a sinalização no local existente, e embateu nas cancelas que estão colocadas quer num, quer noutro lado da via-férrea, indo invadir os trilhos da linha férrea, por onde nesse preciso momento circulava o “comboio”; - o condutor do comboio ainda apita e trava, mas não consegue imobilizar a composição, e vai embater com a frente do comboio na parte lateral esquerda do EV; - no EV seguiam o condutor, e ao seu lado, com o cinto de segurança colocado seguia G. C., e no banco traseiro, sentada em local apropriado e com o cinto de segurança colocado, seguia a menor e inditosa L .F.; - como consequência do acidente descrito, resultou a morte do E. R., bem como resultaram lesões traumáticas graves na região occipital e torácica da menor L .F. e da G. C., que foram a causa das suas mortes; - a G. C. e a menor L .F. sentiram a eminência do embate; - na sequência do acidente, resultaram partidos os óculos graduados que a menor L .F. e a G. C. levavam; - a menor deixou como seus únicos e universais herdeiros os seus pais, aqui autores, J. M. e M. I., que sentiram profundamente a morte da sua única filha; - a autora J. M., devido à situação incapacitante causada pela morte da filha L. F., não tem capacidade de exercer a sua atividade profissional; - o autor M. I., da ré, despendeu com a deslocação de França a Portugal para comparecer ao funeral da sua filha, no montante de € 128,98; - devido ao seu estado de choque, o autor M. I. não pôde exercer a sua atividade laboral durante 30 dias; - os aqui autores J. M. e M. F., são filhos da falecida G. C.; - os autores J. M. e M. F. sentiram profundamente a morte da sua mãe; - a autora J. M. teve de efetuar em sequência do acidente descrito nos autos, despesas no montante global de € 128,72 em consultas médicas e medicação; - a entidade patronal emprestou à autora J. M. a importância de € 5.000,00 a fim de efetuar o pagamento das despesas com os funerais. A ré apresentou contestação, impugnando parcialmente o alegado, e invocando que: - com todas as probabilidades a cancela estaria aberta e se efetivamente estivesse encerrada, qualquer homem médio pararia perante este obstáculo; - quanto à atuação do maquinista, numa passagem de nível, este não pode simplesmente limitar-se a cumprir o limite de velocidade e a não falhar no horário do comboio; - o maquinista deveria circular com uma velocidade bem mais moderada de cerca 60 km/h, ou 70km/h, de forma a controlar o veículo e a sua paragem em todas as circunstâncias. Conclui que a ação deverá ser julgada improcedente, por não provada. Realizou-se audiência prévia, na qual foi requerida a suspensão da instância. Frustrada a conciliação, foi dispensada tal diligência e proferido despacho saneador, bem como despacho que identificou o objeto do litígio e enunciou os temas de prova. A audiência de julgamento realizou-se com observância do formalismo legal. Foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: “Julga-se parcialmente procedente a presente acção e, consequentemente, 4.1. Condena-se a ré a pagar aos autores J. M. e M. I., a dividir por ambos em partes iguais, a quantia de € 90.600,00 (noventa mil e seiscentos euros) a título de indemnização, sendo € 90.000,00 (noventa mil euros) pelo dano não patrimonial “perda da vida” da falecida L. F. e € 600,00 (seiscentos euros) por danos patrimoniais; 4.1.1. Condena-se a ré a pagar aos autores J. M. e M. I., juros à taxa legal sobre aquela quantia de € 90.000,00 (noventa mil euros) contados a partir da presente data, bem como juros de mora à taxa legal sobre a referida quantia de € 600,00 (seiscentos euros), contados desde a citação até efectivo pagamento; 4.2. Condena-se a ré a pagar à autora J. M., a quantia de € 40.000,00 (quarenta mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos pela perda da filha L. F., acrescida de juros à taxa legal, contados a partir da presente data sobre a tal quantia até efectivo pagamento; 4.3. Condena-se a ré a pagar ao autor M. I., a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos pela perda da filha L. F., acrescida de juros à taxa legal, contados a partir da presente data até efectivo pagamento; 4.4. Condena-se a ré a pagar aos autores J. M. e M. F., a dividir por ambos em partes iguais, a quantia de € 65.600,00 (sessenta e cinco mil e seiscentos euros) a título de indemnização, sendo € 65.000,00 (sessenta e cinco mil euros) pelo dano não patrimonial “perda da vida” da falecida G. C. e € 600,00 (seiscentos euros) por danos patrimoniais; 4.4.1. Condena-se a ré a pagar aos autores J. M. e M. F., juros à taxa legal sobre aquela quantia de € 65.000,00 (sessenta e cinco mil euros) contados a partir da presente data, bem como juros de mora à taxa legal sobre a referida quantia de € 600,00 (seiscentos euros), contados desde a citação até efectivo pagamento; 4.5. Condena-se a ré a pagar à autora J. M., a quantia de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais decorrentes da perda da mãe G. C., acrescida de juros à taxa legal, contados a partir da presente data até efectivo pagamento; 4.6. Condena-se a ré a pagar ao autor M. F., a quantia de € 25.000,00(vinte e cinco mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais decorrentes da perda da mãe G. C., acrescida de juros à taxa legal, contados a partir da presente data até efectivo pagamento; 4.7. Condena-se a ré a pagar à autora J. M., a quantia de € 3.600,00 (três mil e seiscentos euros) a título de indemnização por danos patrimoniais (despesas com os funerais das vítimas), acrescida de juros de mora calculados à taxa legal, devidos desde a citação, até efectivo pagamento; 4.8. As custas ficam a cargo dos autores e da ré, na proporção do respectivo decaimento, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário (art. 527º do Código de Processo Civil). Inconformados com o decidido, os autores interpuseram recurso de apelação formulando as seguintes conclusões: “1ª. Discorda a Recorrente J. M. no facto da douta sentença recorrida ter condenado a Ré no pagamento da quantia de € 40.000,00 (quarenta mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais pela perda da filha L. F., acrescida de juros à taxa legal, contados a partir da data da sentença até efectivo pagamento. Na realidade, resulta da matéria dada como provada: 2.18. A falecida L .F. contava 10 anos de idade à data do acidente e deixou como seus únicos e universais herdeiros os seus pais, aqui autores, J. M. e M. I.. 2.19. Os autores J. M. e M. I. sentiram profundamente a morte da sua única filha L .F.. 2.20. A autora J. M. contava, à data do óbito da filha L. F., 36 anos de idade. 2.22. A menor L .F. era uma jovem alegre e bem-disposta. 2.23. Amava sinceramente os seus pais e os pais amavam a sua filha. 2.24. A menor L .F. vivia com a autora J. M. e havia união e amor entre elas. 2.26. A morte precoce da filha causou trauma nos autores J. M. e M. I., que a choraram frequentemente. 2.27. A autora J. M., devido à morte da filha e da mãe, ficou totalmente abalada. 2.28. Por isso, a autora J. M. ficou de baixa médica pelo menos até Outubro de 2019, por não ter capacidade para exercer a sua actividade profissional, ficando então na sua residência, e só da mesma saindo para efectuar consultas médicas e tratamentos. 2.29. A autora J. M. teve de ser submetida a tratamentos psiquiátrico e psicológico, com toma diária de medicação. 2.30. Apresentava humor depressivo e debilidade, dificuldades em adormecer e em dormir, com ideação suicida, que aconselharam acompanhamento psicológico, continuando a ser seguida por psicólogo. 2.31. Antes do acidente, a autora J. M. era uma pessoa saudável, alegre. 2.33. À data do embate descrito, a autora trabalhava para a firma “Y – Distribuição Alimentar, S.A.”, auferindo a remuneração base mensal de € 650,00, acrescida de prémios e subsídio de alimentação. 2ª. Ora, atendendo que se tratava de uma menina de 10 anos de idade, boa aluna, bem-disposta, filha única e suporte do casal, a sua perda motiva trauma psicológico, o qual se mantem e manterá. Assim, entende que a douta sentença recorrida devia, nessa parte, ser revogada e substituída por outra que condene a Recorrida no pagamento da quantia de €80.000,00 (oitenta mil euros) como compensação por danos não patrimoniais sofridos pela perda da sua filha L. F.. 3ª. Igualmente a douta sentença merece reparo em não ter condenado a Recorrida no pagamento de uma indemnização por salários perdidos, despesas com consultas médicas e medicamentos, bem como os salários que vai deixar de auferir até à data que tenha condições para retomar o trabalho. 4ª. Na realidade, foi dado como provado: 2.33. À data do embate descrito, a autora trabalhava para a firma “Y – Distribuição Alimentar, S.A.”, auferindo a remuneração base mensal de € 650,00, acrescida de prémios e subsídio de alimentação. 2.28. Por isso, a autora J. M. ficou de baixa médica pelo menos até Outubro de 2019, por não ter capacidade para exercer a sua actividade profissional, ficando então na sua residência, e só da mesma saindo para efectuar consultas médicas e tratamentos. 5ª. Assim, devia a douta sentença recorrida ter condenado a Recorrida no montante de €2.600,00 (dois mil e seiscentos euros), (€ 650,00 x 4 meses), salários devidos desde o acidente até Outubro de 2019, e condenar em montante a liquidar em execução de sentença a partir dessa data. 6ª. A douta sentença fixou o montante de € 65.000,00 (sessenta e cinco mil euros) pelo dano da “perda da vida” da mãe G. C.. Entendem os Recorrentes J. M. e M. F. que o valor a fixar não devia ser inferior a € 80.000,00 (oitenta mil euros), devendo nessa parte igualmente a douta sentença ser alterada, atendendo que: 2.37. G. C. faleceu no estado de viúva, com 65 anos de idade, sem ter efectuado qualquer testamento ou disposição de última vontade, deixando como seus únicos e universais herdeiros os aqui autores J. M. e M. F., filhos da falecida G. C.. 2.38. Os autores J. M. e M. F. sentiram profundamente a morte da sua mãe, que choraram. 2.39. Os autores J. M. e M. F. amavam profundamente a sua mãe, bem como a falecida G. C. amava profundamente os seus filhos, aqui autores. 2.40. Em decorrência da morte de G. C., os autores J. M. choraram frequentemente e tiveram dificuldades em adormecer. 7ª. Quanto ao Recorrente M. I., as motivações e desgosto são os mesmos, com a perda da sua filha L .F.. Na realidade, foi dado como provado: 2.18. A falecida L .F. contava 10 anos de idade à data do acidente e deixou como seus únicos e universais herdeiros os seus pais, aqui autores, J. M. e M. I.. 2.19. Os autores J. M. e M. I. sentiram profundamente a morte da sua única filha L .F.. 2.21. O autor M. I. contava, à data do óbito da filha L. F., 39 anos de idade. 2.22. A menor L .F. era uma jovem alegre e bem-disposta. 2.23. Amava sinceramente os seus pais e os pais amavam a sua filha. 2.25. O autor M. I. trabalha em França, pelo menos três a quatro vezes por ano, vinha a Portugal para conviver com a sua filha. 2.26. A morte precoce da filha causou trauma nos autores J. M. e M. I., que a choraram frequentemente. 2.32. O autor M. I. como decorrência da morte da filha L. F., vive triste e amargurado. 2.34. À data do embate descrito, o autor M. I. trabalhava na firma “ML., SA”, sediada em …, França, e auferia a retribuição mensal de € 5.192,00 (cinco mil, cento e noventa e dois euros). 2.35. Com a deslocação de França a Portugal para comparecer ao funeral da sua filha L. F., o autor M. I. despendeu no montante de € 128,98. 2.36. Devido ao estado de choque em que ficou em virtude da morte de L. F., o autor M. I. não pôde exercer a sua actividade laboral durante pelo menos 10 dias. 8ª. Assim, os danos não patrimoniais sofridos pelo Recorrente pela perda da filha não deviam fixar abaixo de € 50.000,00 (cinquenta mil euros). Pelo que deve a douta sentença, nessa parte, ser revogada, e condenar na referida quantia 9ª. Valem igualmente em relação ao Recorrente M. I., as fundamentações apresentadas quanto à Recorrente J. M., pela não fixação do valor inerente à perda do salário que a morte dos seus entes queridos causou ou causará. Na realidade, foi dado como provado que: 2.34. À data do embate descrito, o autor M. I. trabalhava na firma “ML., SA”, sediada em ..., França, e auferia a retribuição mensal de € 5.192,00 (cinco mil, cento e noventa e dois euros). 2.35. Com a deslocação de França a Portugal para comparecer ao funeral da sua filha L. F., o autor M. I. despendeu no montante de € 128,98 2.36. Devido ao estado de choque em que ficou em virtude da morte de L. F., o autor M. I. não pôde exercer a sua actividade laboral durante pelo menos 10 dias. 10ª. Assim, e atendendo à matéria dada como provada, devia a douta sentença recorrida condenar a Recorrida, a título de salários perdidos pelo Recorrente, no montante de €1.730,67 (mil, setecentos e trinta euros e sessenta e sete cêntimos), (€ 5.192,00: 30 x 10). 11ª. Quanto aos valores fixados ao Recorrente M. F., valem igualmente os motivos que se apresentaram quanto à Recorrente J. M., isto atendendo que: 2.37. G. C. faleceu no estado de viúva, com 65 anos de idade, sem ter efectuado qualquer testamento ou disposição de última vontade, deixando como seus únicos e universais herdeiros os aqui autores J. M. e M. F., filhos da falecida G. C.. 2.38. Os autores J. M. e M. F. sentiram profundamente a morte da sua mãe, que choraram. 2.39. Os autores J. M. e M. F. amavam profundamente a sua mãe, bem como a falecida G. C. amava profundamente os seus filhos, aqui autores. 2.40. Em decorrência da morte de G. C., os autores J. M. choraram frequentemente e tiveram dificuldades em adormecer. 12ª. Assim, entende-se que os danos morais sofridos pelo Recorrente M. F. são graves e não deviam ser fixados em quantia inferior a € 60.000,00 (sessenta mil euros), pelo que nessa parte igualmente deve a douta sentença ser revogada. Ao não o entender assim violou a douta sentença recorrida, entre outros, o disposto nos artigos 483º, 494º, 495º e 496º do Código Civil. Pelo que deve ser revogada e substituída por outra nos termos supra referidos. Assim se fazendo JUSTIÇA!” Em função do recurso dos autores a ré X Companhia de Seguros SA. interpôs recurso subordinado formulando as seguintes conclusões: “1. Salvo o muito e merecido respeito, a douta sentença arbitrou valores superiores aos montantes seguidos pela nossa jurisprudência, no que concerne ao chamado direito à vida e aos danos morais sofridos pelos familiares das vítimas; 2. Não se olvida que a perda de um filho é uma dor para a vida, inultrapassável, contudo, o montante do direito à vida devido pela morte da malograda L. F. não devia ultrapassar os €70.0000,00, a repartir pelos pais; 3. Por sua vez, o montante do direito à vida devido pela morte da infeliz G. C., de 65 anos, viúva, reformada, não devia ultrapassar os €50.000,00, a repartir pelos dois identificados filhos; 4. O valor do dano moral sofrido pelos pais da menor, não devia ultrapassar €30.000,00 e €25.000,00, a favor da mãe e do pai, respectivamente; 5. O valor do dano moral sofrido pelos filhos da G. C., não devia ultrapassar €20.000,00, para cada um; 6. Como sustenta o saudoso Prof. Antunes Varela: “no cálculo da indemnização, nada obsta a que o tribunal tome em linha de conta, como parcela autónoma da soma a que haja de proceder, tanto a perda da vida da vítima, como os danos morais sofridos por aqueles familiares. Simplesmente, já não é o valor da vida, que está em causa, mas apenas a falta que a vítima representa para eles, «no plano afectivo»; 7. “Em resumo a lesão do direito à vida só pode ser encarada sob três pontos de vistas: a. enquanto vida que se perde, na função normal que desempenha na família e na sociedade, em geral; b. enquanto vida que se perde, no papel excepcional que desempenha na sociedade (um cientista, um escritor, um artista); c. enquanto vida que se perde, sem qualquer função específica na sociedade (uma criança, um doente ou um invalido), mas assinalada por um valor de afeição mais ou menos forte. A equidade passa então a exercer-se, na prática, a partir daqueles diferentes pontos de vista. Trata-se afinal de encontrar um mero expediente compensatório, porque a vida não tem sucedâneo, nem jamais será possível fixar-lhe um preço”. – (cfr. Exm.º Senhor Conselheiro Dario Martins de Almeida, in “Manual de Acidentes de Viação”, Almedina 1987, página 191). 8. No caso em foco, malogradamente, perdeu-se a vida de uma criança e de uma senhora de 65 anos, reformada, viúva, com filhos já independentes. 9. Pelo que, sempre com o devido respeito por melhor juízo, se nos afigura mais consentâneo com a realidade os valores alinhados na página 4 destas alegações. 10. Acima de tais valores, perpassará a ideia de benefício emergente de um acidente e não de compensação associada aos danos morais, avaliados «no plano afectivo». 11.Por todo o exposto, as compensações arbitradas pelo douto Tribunal a quo são exageradas. 12.As normas dos artºs 495º do C. Civil, quanto aos danos patrimoniais e 496º, no que concerne aos danos não patrimoniais, são normas excepcionais em relação à regra de que só os danos ligados à relação jurídica ilícitamente violada contam para a obrigação imposta ao lesante. 13.É obvio que os salários peticionados pelos Autores não são susceptíveis de subsunção na norma do art.º 495º. 14.A qual como norma excepcional que é não comporta aplicação analógica e, no caso em foco, nem interpretação extensiva como facilmente se vê. 15. Acresce que os peticionados salários também não constituíam uma causa adequada da conduta do lesante, de acordo com a norma prevista no art.º 563º do C. Civil. 16. No mais e porque de inteira justiça, importa fazer a devida vénia à douta sentença recorrida que contempla uma apreciação profunda e aturada da questão decidenda, evidenciando uma inegável qualidade técnica e lucidez científica. NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO QUE V.ªS EX.ªS DOUTAMENTE SUPRIRÃO deve ser dado provimento ao presente recurso subordinado e, em consequência, serem arbitradas compensações equitativas nos termos acima delineados, na página 4 das presentes alegações.” A. Recurso principal dos Autores Das suas conclusões ressaltam as seguintes questões: 1. Se deve ser fixado o montante de 80.000€ como compensação pelo sofrimento da autora J. M. pela morte da sua filha L. F.. 2. Se deve ser fixada uma indemnização por danos patrimoniais a favor da autora J. M. emergente de salários que deixou de auferir enquanto esteve de baixa, despesas com consultas médicas e medicamentos, por causa da morte da filha. 3. Se deve ser fixado o montante de 80.000€ pelo dano da morte da mãe dos aurores J. M. e M. F.. 4. Se deve ser fixado o montante de 50.000€ como compensação pelo sofrimento do autor M. I. emergente da morte da sua filha L. F.. 5. Se deve ser fixada a favor do autor M. I. uma indemnização por danos patrimoniais oriundos da perda de salários causada pela morte da filha. 6. Se dever ser fixada a favor do autor M. F. uma compensação por danos próprios emergentes da morte de sua mãe no montante de 60.000€. B. Recurso subordinado da ré X Companhia de Seguros SA. Das conclusões do recurso ressaltam as seguintes questões: 1.Se o dano pela morte da L. F. deve ser fixado em 70.000€ a repartir pelos pais. 2. Se o dano pela morte da G. C. deve ser fixado em 50.000€. 3. Se o dano moral sofrido pela morte da G. C., por parte dos seus filhos, não deve ultrapassar os 20.000€ para cada um. 4. Se o dano moral sofrido pelos pais da menor L. F. não deve ultrapassar os 30.000€ e 25.000€ para a mãe e pai, respetivamente. Não tendo sido impugnada a matéria de facto, damos como assente a que consta da decisão recorrida que transcrevemos. “2. Da instrução e discussão da causa resultaram provados os seguintes factos: 2.1. No dia 19 de Junho de 2019, pelas 09:50 horas, na passagem de nível de caminhos-de-ferro existente na Estrada Nacional 204, km 18,500, na freguesia de ..., Barcelos, ocorreu um acidente, envolvendo o veículo ligeiro, de serviço particular, com matrícula EV, propriedade e conduzido por E. R., e o “comboio internacional 420”. 2.2. O E. R. conduzia o EV pela Estrada Nacional 204 no sentido Ponte de Lima - Barcelos. 2.3. Ao chegar à intersecção da Estrada Nacional por onde seguia com a via-férrea, E. R., não deteve a marcha, indo invadir os trilhos da linha férrea, por onde nesse preciso momento circulava o “comboio internacional 420”, e embateu numa das cancelas que estão colocadas, quer num, quer noutro lado da via-férrea, no sentido Ponte de Lima – Barcelos, e Barcelos – Ponte de Lima. 2.4. Ao ver a via ocupada pelo EV, o condutor do comboio ainda apitou e travou, só que, atenta a proximidade do veículo, não conseguiu imobilizar a composição e foi embater violentamente com a frente do comboio na parte lateral esquerda do EV. 2.5. Nas descritas circunstâncias, as cancelas estavam fechadas, com a sinalização, colocada ao lado das mesmas, no vermelho. 2.6. O comboio circulava no sentido Vigo – Barcelos, a cerca de 95 km/hora. 2.7. No local onde se deu o embate, a EN 204 configura uma recta com cerca de 200 metros, atravessada perpendicularmente pela linha de comboio. 2.8. Na Estrada Nacional 204, existe uma recta com boa visibilidade, de cerca de 50 metros, antes da linha férrea, atento o sentido seguido pelo veículo EV, ou seja, Ponte de Lima - Barcelos. 2.9. Existe um sinal situado ao lado da Estrada Nacional a indicar passagem de nível com cancelas. 2.10. Trata-se de uma passagem de nível automatizada, caracterizada por uma faixa de rodagem com 5,60 metros de largura, com duas vias, uma em cada sentido, separadas por traço contínuo, ladeado com bermas, sensivelmente de 1metro do lado direito e 0,60 metros do lado esquerdo, atento o sentido Ponte de Lima -Barcelos. 2.11. O local do acidente é antecedido com a existência de sinalização alertando para a passagem de nível, desde sinalização vertical “Passagem de Nível com Guarda” – A26, sinais luminosos e “meias barreiras”. 2.12. O embate ocorreu em cima da linha férrea. 2.13. Nas circunstâncias descritas, além do seu condutor, E. R., seguiam no interior do veículo com a matrícula EV, G. C., esta ao lado do condutor, e no banco traseiro a menor L .F.. 2.14. Como consequência do acidente descrito resultou a morte do E. R.. 2.15. Nas referidas circunstâncias de tempo e de lugar, como consequência do embate, resultaram para G. C. as lesões descritas no relatório de autopsia de fls. 175 ss., nomeadamente lesões traumáticas torácicas, e para L .F. as lesões descritas no relatório de autópsia de fls. 180 ss., designadamente traumatismo crânio encefálico, lesões essas que foram a causa das suas mortes. 2.16. Como consequência do embate, resultaram partidos uns óculos graduados que a menor L .F. levava, no valor de pelo menos € 600,00 (seiscentos euros). 2.17. Como consequência do embate, resultaram partidos uns óculos graduados que G. C. era portadora, no valor de pelo menos € 600,00 (seiscentos euros). 2.18. A falecida L .F. contava 10 anos de idade à data do acidente e deixou como seus únicos e universais herdeiros os seus pais, aqui autores, J. M. e M. I.. 2.19. Os autores J. M. e M. I. sentiram profundamente a morte da sua única filha L .F.. 2.20. A autora J. M. contava, à data do óbito da filha L. F., 36 anos de idade. 2.21. O autor M. I. contava, à data do óbito da filha L. F., 39 anos de idade. 2.22. A menor L .F. era uma jovem alegre e bem-disposta. 2.23. Amava sinceramente os seus pais e os pais amavam a sua filha. 2.24. A menor L .F. vivia com a autora J. M. e havia união e amor entre elas. 2.25. O autor M. I. trabalha em França, pelo menos três a quatro vezes por ano, vinha a Portugal para conviver com a sua filha. 2.26. A morte precoce da filha causou trauma nos autores J. M. e M. I., que a choraram frequentemente. 2.27. A autora J. M., devido à morte da filha e da mãe, ficou totalmente abalada. 2.28. Por isso, a autora J. M. ficou de baixa médica pelo menos até Outubro de 2019, por não ter capacidade para exercer a sua actividade profissional, ficando então na sua residência, e só da mesma saindo para efectuar consultas médicas e tratamentos. 2.29. A autora J. M. teve de ser submetida a tratamentos psiquiátrico e psicológico, com toma diária de medicação. 2.30. Apresentava humor depressivo e debilidade, dificuldades em adormecer e em dormir, com ideação suicida, que aconselharam acompanhamento psicológico, continuando a ser seguida por psicólogo. 2.31. Antes do acidente, a autora J. M. era uma pessoa saudável, alegre. 2.32. O autor M. I. como decorrência da morte da filha L. F., vive triste e amargurado. 2.33. À data do embate descrito, a autora trabalhava para a firma “Y – Distribuição Alimentar, S.A.”, auferindo a remuneração base mensal de € 650,00, acrescida de prémios e subsídio de alimentação, conforme documentos 14 a 16 de fls. 30 verso a 31 verso, que aqui se dão por reproduzidos. 2.34. À data do embate descrito, o autor M. I. trabalhava na firma “ML., SA”, sediada em ..., França, e auferia a retribuição mensal de € 5.192,00 (cinco mil, cento e noventa e dois euros). 2.35. Com a deslocação de França a Portugal para comparecer ao funeral da sua filha L. F., o autor M. I. despendeu no montante de € 128,98. 2.36. Devido ao estado de choque em que ficou em virtude da morte de L. F., o autor M. I. não pôde exercer a sua actividade laboral durante pelo menos 10 dias. 2.37. G. C. faleceu no estado de viúva, com 65 anos de idade, sem ter efectuado qualquer testamento ou disposição de última vontade, deixando como seus únicos e universais herdeiros os aqui autores J. M. e M. F., filhos da falecida G. C.. 2.38. Os autores J. M. e M. F. sentiram profundamente a morte da sua mãe, que choraram. 2.39. Os autores J. M. e M. F. amavam profundamente a sua mãe, bem como a falecida G. C. amava profundamente os seus filhos, aqui autores. 2.40. Em decorrência da morte de G. C., os autores J. M. choraram frequentemente e tiveram dificuldades em adormecer. 2.41. Como consequência do embate a autora J. M. despendeu: - A quantia global de € 18,00 (dezoito euros), em consultas médicas no Centro de Saúde de Ponte de Lima; - A quantia global de € 40,72 (quarenta euros e setenta e dois cêntimos), com a aquisição de medicação; - A quantia de € 70,00 (setenta euros), despendida em consulta médica de Psiquiatria. 2.42. A autora J. M. suportou as despesas com os funerais da sua filha L .F. e da sua mãe G. C.. 2.43. Ao tempo do acidente, o proprietário do veículo com a matrícula EV havia transferido para a ré a responsabilidade civil pelos danos causados a terceiros pela circulação daquele veículo, através da apólice nº ..…..26, conforme documento de fls. 55 verso a 59, que aqui se dá por reproduzido.” Vamos conhecer das questões enunciadas. A1. Se deve ser fixado o montante de 80.000€ como compensação pelo sofrimento da autora J. M. pela morte da sua filha L. F.. A4. Se deve ser fixado o montante de 50.000€ como compensação pelo sofrimento do autor M. I. emergente da morte da sua filha L. F.. B4. Se o dano moral sofridos pelos pais da menor L. F. não deve ultrapassar os 30.000€ e 25.000€ para a mãe e pai, respetivamente O que está em discussão é a determinação do montante compensatório devido aos autores J. M. e M. I., pela morte da filha L. F.. O tribunal fixou a compensação em 40.000€ e 30.000€ a favor da mãe e do pai, respetivamente. Estes, no seu recurso, reclamam que sejam determinados os montantes de 80.000€ e 50.000€, respetivamente. Por sua vez, a ré seguradora X defende, no seu recurso subordinado, que os montantes não devem ultrapassar os 30.000€ e 25.000€, para cada um, respetivamente. O tribunal apoiou-se no sofrimento que os recorrentes passaram e passam resultante da análise da matéria de facto provada, (pontos de facto provados 2.018, 2.19, 2.20, 2.21, 2.22, 2.23, 2.24, 2.25, 2.26, 2.27, 2.28, 2.29, 2.30, 2.31 e 2.32) para além das decisões dos Tribunais da Relação e do Supremo Tribunal de Justiça. Estamos em presença de uma menina com 10 anos de idade, alegre, bem disposta, feliz com a vida, vivente com a mãe, nutrindo um amor profundo uma pela outra, e um pai que a visitava 3 a 4 vezes por ano, vindo de França, onde trabalhava, cuja morte precoce arrasou, psicologicamente, a mãe, que teve de se socorrer de tratamentos de psicologia e psiquiatria, para sobreviver, afetando-lhe a capacidade de trabalho e o seu humor, assim como o pai ficou amargurado e muito sofrido. Os pais tinham, à data do acidente, 36 anos (a mãe) e 39 (o pai), tendo ainda muitos anos para viverem com a sua filha, abrir-lhes horizontes e acompanhá-la no seu crescimento. Tudo isto se perdeu, o que provocou uma dor muito profunda, que irá permanecer para toda a vida, de modos diferentes para a mãe, mais próxima, e para o pai, mais distante. Daí que julgamos que os montantes fixados pelo tribunal são adequados para compensarem o sofrimento vivido e a viver pelos pais, enquadrando-se dentro das regras da equidade, e seguindo os critérios jurisprudenciais. Assim não há razões para serem alterados. A3. Se deve ser fixado o montante de 80.000€ pelo dano da morte da mãe dos aurores J. M. e M. F.. B2. Se o dano pela morte da G. C. deve ser fixado em 50.000€. O tribunal determinou o montante de 65.000€ pelo dano da morte da mãe dos autores, baseando-se nos princípios defendidos pelos tribunais superiores no sentido de que o valor da vida, apesar de ser absoluto e abstratamente igual para todos, deve ser calculado segundo as regras da equidade, atendendo a cada pessoa em si, citando excertos de vários acórdãos. E concluiu que, não havendo factos nos autos que caraterizem as condições da sua vida, do seu estado de saúde, eventuais ocupações, ficando-se apenas pela relação profunda de amor, considerou adequada a quantia de 65.000€. Os autores, filhos da G. C., defendem que o valor a fixar dever ser de 80.000€ e a ré X aponta a quantia de 50.000€. Julgamos que o valor determinado pelo tribunal recorrido se enquadra nos parâmetros acima aflorados, e tendo em conta que a jurisprudência maioritária do STJ. defende que o valor da vida deve ser calculado entre um mínimo de 50.000€ e 80.000€, conforme cada caso, podendo ir, excecionalmente, a 100.000€ (Ac. RG. 2732/17.5T8VCT.G1, por nós relatado). Daí que, estando perante uma situação de uma mãe, cujo amor filial e maternal, neste caso era profundo, mas não se evidencia como algo excecional, julgamos que o montante fixado pelo tribunal é o adequado. B1. Se o dano pela morte da L. F. deve ser fixado em 70.000€ a repartir pelos pais. O tribunal fixou em 90.000€ o dano da morte da L. F., filha dos autores, atendendo à sua idade, 10 anos, à sua jovialidade, alegria de viver e o amor que nutria pelos pais, para além dos longos anos que tinha para viver, podendo realizar-se, constituir família e ter filhos. A ré X considerou, no seu recurso subordinado, que a menor, ainda com 10 anos de idade, não manifestou ainda qualquer posição na sociedade, sendo um ser normal, como qualquer menina da sua idade, pelo que o montante a fixar não deveria ser superior a 70.000€. O que se discute neste ponto é saber se a vida da menor L. F. e as perspetivas de viver apontadas pelo tribunal e a sua posição atual na sociedade apontada pela recorrente, justificam a manutenção do decidido, ou a sua alteração. Apesar de se valorizar a infância, a adolescência e a juventude, suportes da dinâmica de uma sociedade, o certo é que a vivência da L. F., pela sua tenra idade, ainda não revelou um estado de vida social capaz de se apresentar como algo excecional. Mas atendendo a que estamos perante uma menina que poderá valorizar-se e afirmar-se na sociedade, deve o valor da perda da vida ser fixado no limite máximo do parâmetro dos 50.000€ aos 80.000€. Daí que o montante adequado seja 80.000€. A6. Se deve ser fixada a favor do autor M. F. uma compensação por danos próprios emergentes da morte de sua mãe no montante de 60.000€. B3. Se o dano moral sofrido pela morte da G. C., por parte dos seus filhos, não deve ultrapassar os 20.000€ para cada um. O tribunal determinou a favor do autor M. F., pelos danos morais próprios pela morte da sua mãe G. C., a quantia de 25.000€. O autor recorrente pede que lhe seja arbitrada uma compensação, por estes danos, a quantia de 60.000€. Por sua vez a ré seguradora defende no seu recurso subordinado que a quantia a fixar por estes danos não deve ser superior a 20.000€. Estamos perante a valorização dos danos morais próprios do autor M. F. pela morte da sua mãe G. C. cujo fundamento, essencial, se traduziu no sofrimento emergente pelo amor profundo que ambos nutriam um pelo outro. Este facto, em si, não é suficiente para alterar o decidido, uma vez que é comum à generalidade das relações familiares entre mãe e filho. Daí que é de manter o valor fixado em 25.000€. A2. Se deve ser fixada uma indemnização por danos patrimoniais a favor da autora J. M. emergente de salários que deixou de auferir enquanto esteve de baixa, despesas com consultas médicas e medicamentos, por causa da morte da filha. A5. Se deve ser fixada a favor do autor M. I. uma indemnização por danos patrimoniais oriundos da perda de salários causada pela morte da filha. A autora J. M. pediu que a ré fosse condenada a pagar-lhe a quantia de 4.492€ por salário perdidos e 128,72€ por despesas pessoais devida à morte da filha, e ainda os salários futuros que vai deixar de auferir desde a propositura da ação até tenha que condições para retomar o trabalho. Por sua vez o autor M. I. peticionou, a título de danos patrimoniais, a perda de salários no montante de 5.192€ e as despesas com viagens no montante de 128,98€, devido à morte da filha, tendo de se deslocar de França para o funeral e não teve condições de trabalhar durante um mês. O tribunal indeferiu estes pedidos por considerá-los danos reflexos com a morte da filha L. F., não se enquadrando nos artigos 495 e 496 do C. Civil, normativos de natureza excecional, que só se aplicam aos casos aí previstos, e ainda porque não se verifica a relação de causalidade adequada, entre os danos peticionados e o ato ilícito. O que está em discussão são danos de natureza patrimonial provocados, reflexamente, na esfera jurídica dos apelantes. Não têm uma ligação direta com o acidente. Daí que não se enquadrem no artigo 483 do C. Civil. O artigo 495 n.º 1 e 2 do C. Civil é uma norma excecional, que visa os casos aí previstos. Tem como finalidade essencial estimular as pessoas a socorrerem a vítima. Todos os danos patrimoniais que se não enquadrem nesse artigo, mesmo que oriundos, reflexamente, do facto gerador dos danos na vítima, não são indemnizáveis ao abrigo desta norma. O artigo 496 do mesmo diploma refere-se aos danos morais e à morte da vítima e não aos danos patrimoniais. E determina expressamente os titulares dos direitos compensatórios por esses danos morais emergentes da morte da vítima. Assim sendo, julgamos que a decisão recorrida não merece censura, pelo que é de manter neste ponto. (conferir – Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, 2ª edição, Livraria Almedina, pag. 498 e 499, 10ª Edição pag. 620 a 622, Anotação ao artigo 495 do C.Civil Anotado, Vol. I, 3ª Edição, pag. 471). Concluindo: 1. Considerou-se que os danos morais sofridos pelos autores com a morte das vítimas foram calculados de acordo com as regras da equidade seguindo a jurisprudência dos tribunais superiores. 2. Apenas julgamos que a compensação pelo dano da morte da L. F. excedeu o critério do STJ. pelo que a diminuímos de 90.000€ para 80.000€. 3. Os danos patrimoniais conexos com a perda de salários, despesas com a ida ao funeral e tratamentos de natureza psiquiatra e psicológica por parte dos autores, pais da L. F., são de natureza reflexa com o acidente e suas consequências, não sendo indemnizáveis pelo artigo 483 do C. Civil e 495 1 e 2 do mesmo diploma, este de carater excecional, aplicando-se aos casos aí previstos. Decisão Pelo exposto, acordam os juízes da Relação em julgar improcedente a apelação principal e parcialmente procedente a apelação subordinada e alteram o valor da compensação pelo dano da morte da L. F. de 90.000€ para 80.000€. No resto mantêm a decisão recorrida. Custas a cargo dos autores e ré na proporção de decaimento. Guimarães, 1 - Apelação 5872.19.2T8BRG.G1– 2ª Proc. Comum Tribunal Judicial Comarca Braga – Braga Relator Des. Espinheira Baltar Adjuntos Des. Eva Almeida e Luísa Ramos |