Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | MARGARIDA PINTO GOMES | ||
Descritores: | CRÉDITO DE ALIMENTOS INSOLVÊNCIA DO DEVEDOR EXONERAÇÃO DO PASSIVO RESTANTE | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 07/10/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | APELAÇÃO PROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 3.ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | Apesar da natureza universal do processo de insolvência, créditos há, como os alimentícios que, não só não tem de ser reclamados como não se encontram abrangidos pela exoneração do passivo restante, podendo ser reclamados em sede de execução. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 3ª Secção do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório: A 14 de junho de 2023, veio AA, melhor identificado nos autos, dar à execução contra BB, melhor identificado nos autos, sentença transitada em julgado, datada de 3 de maio de 2022 e proferida no processo de incumprimento das responsabilidades parentais com o nº 47/11.1TBMDR-B, que correu termos no Juízo Local Cível – J1 – do Tribunal Judicial de Bragança, na qual se declarou o aqui executado, “devedor da quantia de 200,00 (duzentos euros) mensais desde julho de 2017 até abril de 2022, perfazendo um total de € 11.600,00 (onze mil e seiscentos euros) relativos às mensalidades devidas e não pagas” ao filho, aqui exequente, quantia que, por que não foi paga até à data, vem reclamar, acrescida dos respetivos juros moratórios à taxa legal anual de 4% (artº 559º, nº 1 do Código Civil e Portaria nº 291/03, de 8/4), desde a data da sentença exequenda (3/5/2022) até integral e efetivo pagamento sendo os vencidos no montante de € 517,39. Reclama ainda, o exequente do executado, ao abrigo do art. 829º-A, nº 4, do Cód. Civil, o pagamento da sanção pecuniária compulsória correspondente ao valor dos juros à taxa anual de 5%, devidos automaticamente desde a data do trânsito em julgado da sentença exequenda (3/6/2022), até integral pagamento, sendo os juros compulsórios, vencidos até hoje, perfazem o total de € 597,48. Alega ter o executado sido declarado insolvente, por sentença transitada em julgado, proferida em 21 de julho de 2022 pelo Tribunal Judicial da Comarca do Porto, no Pº nº 6031/22.2T8VNG, que correu termos no Juízo de Comércio de Vila Nova de Gaia, Juiz 4, daquele Tribunal Judicial, tendo-lhe sido concedido o benefício de exoneração do passivo restante, encontrando-se totalmente excluídos do benefício da exoneração do passivo restante os créditos por alimentos – cfr. art. 245º, nº 2, al. a) do CIRE). Nestes autos e após diversas vicissitudes foi proferido a seguinte decisão: “Os presentes autos tiveram início a 14/06/2023, sendo que do Requerimento Executivo consta que o executado havia sido declarado insolvente. Ao longo dos autos, foram sendo juntos vários requerimentos (inclusive do Executado), donde resulta que o mesmo fora declarado insolvente a 21/07/2022, pelas 14h52 (veja-se, por exemplo, o ofício junto a 13/12/2023 [ref. ...48]). Mais resulta que no respectivo processo de insolvência foi, a 20/10/2022, proferido despacho de encerramento, por insuficiência da massa, e, ainda, o inicial de exoneração do passivo restante, estando, neste momento, o Executado sujeito aos deveres e benesses de tal incidente. É nesta fase que se encontram aqueles autos. Por outro lado, ao longo dos autos foi debatida a questão da possibilidade de instauração de acções de execução na pendencia do processo de insolvência supra referido, bem como da penhorabilidade (e extensão) do salário do executado, sendo que o Exequente já se pronunciou essas questões, dizendo que o crédito em causa não está abrangido pela exoneração do passivo restante. Nos termos do artigo 88.º, n.º 1, e 242.º, n.º 1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, não é possível, após a declaração de insolvência e com o início do período de cessão, instaurar acções executivas contra o insolvente/devedor (resulta do normativo referido em primeiro que “A declaração de insolvência (…) obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência”, e do segundo que “Não são permitidas quaisquer execuções sobre os bens do devedor destinadas à satisfação dos créditos sobre a insolvência, durante o período da cessão”). Ora, existem, assim, preceitos legais que proíbem a instauração de acções executivas contra quem se encontre insolvente ou em fase de cessão, o que não significa que, findo este período, tal não seja possível quanto aos créditos que não sejam abrangidos pela (eventual) exoneração do passivo restante. Será o caso dos créditos alimentícios, visto que estes não são abrangidos pela dita benesse, porém a sua satisfação durante a pendência de tal processo obedece às regras do regime de insolvência (sem prejuízo das especificidades que ao mesmo possam obedecer), sob pena de violação da igualdade dos credores - artigos 46.º e seguintes, 93.º, 194.º, n.º 1, 242.º e 245.º, n.º 1, alínea a), do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. Significa isto que não só não era possível intentar a presente acção de execução, como também não era possível proceder à penhora de bens (mormente, salário) do executado, visto estar a pendente tal processo de insolvência. Porém, tendo sido feito, cumpre agora reestabelecer a situação de facto criada, considerando-se ser de entregar tais quantias ao Administrador de Insolvência/Fiduciário, por forma a que o lhes dê destino, nos termos que tiver ser de Direito - artigos 149.º, 150.º e 239.º a 241.º-A do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. No mais, os direitos que o aqui Exequente procura fazer valer hão-de o ser junto daqueles autos ou posteriormente, aquando prolação e sedimentação do despacho final de exoneração do passivo restante, tudo sem prejuízo de, eventualmente (se legalmente admissível) e requerendo-o, no processo de incumprimento das responsabilidades parentais aquele procurar a activação do FGADM. Em todo o caso, dir-se-á que, à data em que a presente acção executiva foi intentada, existia (e ainda existe) uma proibição legal de intentar acções executivas contra o aqui Executado, norma que a Exequente ignorou, sendo que a sua verificação configura uma excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso e que determina a extinção dos presentes autos - artigos 277.º, alínea a), 278.º, n.º 1, alínea e), 576.º, n.ºs 1e 2, 578.º e 734.º, n.º 1, do Código de Processo Civil e 88.º, n.º 1, e 242.º, n.º 1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. Dito isto, decide-se o seguinte: absolver o executado da instância e, por conseguinte, determinar a extinção da mesma, por inadmissível; determinar que se proceda ao levantamento da penhora do salário do executado; determinar que se proceda à contabilização dos valores entregues e depositados à ordem destes autos e, após, que se notifique o Administrador de Insolvência para que, no prazo de 10 (dez) dias, informe/requeira o que tiver por conveniente, mormente, meio para que tais valores lhes sejam entregues. Custas a cargo do Exequente - artigo 527.º, n.º 1, do Código de Processo Civil. Registe-se e notifique-se. (…)”. Inconformado com a decisão veio o exequente da mesma recorrer formulando as seguintes conclusões: 1ª A presente execução por alimentos foi intentada contra o progenitor do Exequente com base em sentença condenatória judicial, proferida no Processo de Incumprimento das Responsabilidades Parentais. 2ª A referida sentença judicial, transitada em julgado, reconheceu a obrigação do progenitor de satisfazer a prestação de alimentos relativamente ao seu filho. 3ª Não restam dúvidas, portanto, quanto à natureza alimentícia do crédito do Exequente. 4ª O art. 88º, nº 1 do CIRE, respeita, conforme do próprio texto da norma se extrai, às diligências executivas, providências requeridas, instauração ou prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência. 5ª O Exequente não reclamou, nem tinha de reclamar, o seu crédito no processo de insolvência do Executado. 6ª Acresce que, o art. 88º do CIRE apenas rege até ao encerramento do processo de insolvência, após o qual os credores do insolvente podem reclamar do devedor os seus direitos não satisfeitos – cfr. art. 233º, nº 1, als. c) e d) do CIRE. 7ª Os créditos alimentícios não se encontram abrangidos pela benesse da exoneração do passivo restante, conforme resulta do art. 245º, nº 2, al. a) do CIRE. 8ª O crédito do Exequente encontra-se, portanto, totalmente excluído do âmbito da exoneração do passivo restante. 9ª O tribunal a quo não se pronunciou quanto às questões sucessivamente levantadas pelo Exequente nos autos. 10ª Ocorreu, por conseguinte, omissão de pronúncia quanto a questões que o tribunal a quo devia ter apreciado e decidido. 11ª Consequentemente, a sentença recorrida deve ser revogada ou anulada. 12ª Foram violados ou incorretamente interpretados os arts. 88º, nº 1, 233º, nº 1, als. c) e d), 242º, nº 1 e 245º, nº 2, al. a) do CIRE e 615º, nº 1, al. e) do C.P.C. Nestes termos, e nos mais de direito aplicáveis, devem Vas Exas, Meritíssimos Senhores Juízes Desembargadores, julgar o presente Recurso procedente e, em consequência, revogar a sentença recorrida, ordenando a sua substituição por outra que determine o prosseguimento dos autos; além disso, deve a sentença ser declarada nula, por omissão de pronúncia, devendo ser ordenada a apreciação e deferimento dos requerimentos apresentados nos autos, relativos ao montante de remuneração impenhorável do Executado e à adjudicação ao Exequente dos valores penhorados. Assim se fazendo, como sempre, JUSTIÇA. Aquando da admissão do recurso pronunciou-se o Tribunal a quo sobre a invocada nulidade, considerando não se verificar a mesma. Colhidos os vistos cumpre apreciar. * II. Objeto do recurso: O objeto do recurso é definido pelas conclusões das alegações, impondo-se conhecer das questões colocadas pelos recorrentes, bem como as que sejam de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas, cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, sendo certo que o tribunal não se encontra vinculado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e que visam sustentar os seus pontos de vista, isto atendendo à liberdade do julgador na interpretação e aplicação do direito. Assim sendo, tendo em atenção as alegações/conclusões apresentadas pelo recorrente importa aos autos aferir da nulidade da sentença por não se ter pronunciado sobre as sucessivas questões que foram suscitadas e sobre as quais deveria pronunciar-se e, a não se verificar esta, se, no caso sub judice, estando em causa quantia exequenda decorrente do não pagamento de alimentos ao filho, não está a mesma sujeita às consequências que advém da declaração de insolvência e exoneração do passivo restante. * III. Fundamentação de facto: Com relevo para a decisão mostram-se relevantes os seguintes factos: 1. Por sentença proferida a 9 de maio de 2022, nos autos de incumprimento das responsabilidades parentais, deduzido por AA e CC contra BB foi decidido: “(…) Em conformidade com as declarações ora prestadas, bem como o facto de AA se encontrar a estudar (cfr declaração junta), julgo procedente o presente incumprimento, em relação ao progenitor e declaro BB, devedor da quantia de 200,00 (duzentos euros) mensais desde Julho de 2017 até Abril de 2022, perfazendo um total de € 11.600,00 (onze mil e seiscentos euros) relativos às mensalidades devidas e não pagas. Mais determino que se oficie ao Instituto de Segurança Social, solicitando a elaboração de relatório social sobre o agregado familiar com vista a aferir se estão reunidos os pressupostos para eventual intervenção do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores. (…)" 2.No dia 21 de julho de 2022, pelas 14h52, nos autos que sob o nº 6031/22.2T8VNG correm termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo de Comércio de Vila Nova de Gaia - Juiz 4 de Vila Nova de Gaia, no foi proferida sentença de declaração de insolvência do devedor BB. 3.A 20 de outubro de 2022 foi proferido o despacho a admitir liminarmente o pedido de exoneração do passivo e restante e o encerramento nos termos do artº 230º do CIRE. 4.A 14 de junho de 2023, deduziu AA execução especial para pagamento de alimentos contra BB, peticionando o pagamento da quantia total de € 11.600,00 (onze mil e seiscentos euros) relativos às mensalidades a si devidas e não pagas, acrescida dos respetivos juros moratórios à taxa legal anual de 4% (artº 559º, nº 1 do Cód. Civil e Portaria nº 291/03, de 8/4), desde a data da sentença exequenda (3/5/2022) até integral e efetivo pagamento sendo os vencidos no montante de € 517,39 e ainda o pagamento da sanção pecuniária compulsória correspondente ao valor dos juros à taxa anual de 5%, devidos automaticamente desde a data do trânsito em julgado da sentença exequenda (3/6/2022), até integral pagamento, sendo os juros compulsórios, vencidos até hoje, perfazem o total de € 597,48. 5.A 22 de setembro de 2023, veio o exequente requerer a realização de buscas nos sistemas de bases de dados da Segurança Social e Serviços de Finanças a fim de se apurar o atual local de trabalho do Executado, devendo, após, a entidade empregadora ser logo notificada para penhorar de imediato o vencimento do Executado, com a informação de que apenas é impenhorável a quantia equivalente à totalidade da pensão social do regime não contributivo (€ 224,24), conforme consta do Requerimento Executivo. 6. A 17 de outubro de 2023 veio o exequente requerer que se ordenasse, sem mais delongas, a notificação da entidade empregadora para penhorar de imediato o vencimento do Executado, com a informação de que apenas é impenhorável a quantia equivalente à totalidade da pensão social do regime não contributivo (€ 224,24), o que se ordenou por carta remetida a 23 do mesmo mês e ano. 7.A 25 de outubro de 2023 veio o exequente requerer, uma vez que consta da notificação efetuada a informação errada de que o vencimento impenhorável do Executado não pode ser inferior ao salário mínimo nacional, se digne ordenar que a Secção de Processos efetue nova notificação ao aludido agrupamento de Escolas, para penhorar de imediato o vencimento do Executado, com a informação de que apenas é impenhorável a quantia equivalente à totalidade da pensão social do regime não contributivo (€ 224,24), conforme consta do Requerimento Executivo e dos Requerimentos do Exequente de 22/09/2023 e de 17/10/2023, e conforme prescrevem os arts. 738º, nº 4 e 933º, nº 1 do C.P.C. e decorre da Portaria nº 24- B/2023, de 9 de Janeiro. 8.A 27 de outubro de 2023 veio o Agrupamento de Escolas ..., Porto, em resposta ao ofício, com a referência ...24, informar que o executado, BB, aufere mensalmente o vencimento ilíquido de 1.456,18 €, sujeito aos descontos obrigatórios. O início dos descontos terá início no mês de novembro/2023. 9.A 13 de novembro de 2023 veio o executado informar que foi declarado Insolvente no âmbito do processo nº. 6031/22.2T8VNG, cujos termos correm no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Comércio de Vila Nova de Gaia – Juiz 4 e que nos termos do artigo 88.º, n.º 1, do CIRE “a declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência.” Informa ainda que lhe foi fixado como rendimento disponível o equivalente a um salário mínimo nacional, devendo assim, todo o remanescente, ser entregue à massa insolvente. Persistindo a presente ação executiva e, consequentemente, a penhora do vencimento do Requerente sem sua prévia audição, comprometido estará o cumprimento do seu dever perante o processo de Insolvência em curso e respetiva massa insolvente, o que não se deseja. 10.A 15 de novembro de 2023 veio o exequente requerer nova notificação ao aludido agrupamento de Escolas para entregar, mensalmente, diretamente ao Exequente, por transferência bancária para a conta com o IBAN ...06, a quantia penhorável do vencimento líquido auferido pelo Executado, ao abrigo dos arts. 933º, nº 1 e nº 2 do C.P.C., com a informação expressa de que a quantia em dívida pelo Executado ao Exequente ascende a € 12.714,87 (doze mil, setecentos e catorze euros e oitenta e sete cêntimos). 11. Na mesma data veio o exequente pronunciar-se sobre o requerimento apresentado pelo executado e referido em 9) requerendo que a execução prossiga os seus normais termos, o que se requer, devendo o executado aguardar lhe seja dirigida a respetiva citação para a presente ação executiva para, querendo, deduzir oposição à Execução, sendo certo, porém, que a sua eventual oposição não suspende a execução – cfr. art. 933º, nº5 do C.P.C. 12.A 13 de dezembro de 2023 foi junto aos autos certidão nos seguintes termos: “CERTIFICA que neste Tribunal e Juízo correm termos uns autos de Insolvência pessoa singular (Apresentação), com o n.º de Processo 6031/22.2T8VNG, em que são Insolvente: BB, estado civil: Divorciado, nascido em ../../1962, freguesia ... [...], NIF - ...20, BI - ...25, domicílio: Travessa ..., ..., ... ..., com o valor processual de €: 30 000,01, a qual foi apresentada em Juízo em 19-07-2022. MAIS CERTIFICA que as fotocópias juntas e que fazem parte integrante desta certidão, estão conforme os originais constantes dos autos, pelo que vão autenticadas com o selo branco em uso nesta secretaria. CERTIFICA-SE AINDA que a sentença transitou em julgado em 11-08-2022. QUE no referido despacho foi nomeado Administrador de Insolvência: DD, NIF - ...21, Endereço: AJ, Rua ..., ..., ...., ..., ... ... É quanto me cumpre certificar em face do que dos autos consta e aos quais me reporto em caso de dúvida. (…)” 13.A 25 de janeiro de 2024 veio o exequente insistir na apreciação dos Requerimentos apresentados pelo Exequente, de 25/10/2023 e de 15/11/2023, com as referências citius 2335263 e 2349553, respetivamente, atenta a manifesta a sua necessidade no recebimento direto das importâncias que lhe são devidas a título de alimentos. 14.A 10 de março de 2024 foi proferido o seguinte despacho: “Atento o teor do supra aludido ofício e, para os devidos efeitos, notifique exequente e executado e oficie solicitando que informe o estado do referido processo. D.N.” 15.A 21 de março de 2024 veio o exequente pronunciar-se requerendo nova notificação ao aludido agrupamento de Escolas, para que efetue de imediato a penhora do vencimento do Executado, pelo valor mensal de € 1.281,84, por ser apenas impenhorável a quantia equivalente à totalidade da pensão social do regime não contributivo (€ 224,24), e não o equivalente a 1/3 daquele vencimento e proceda à entrega, mensalmente, diretamente ao Exequente, por transferência bancária para a conta com o IBAN ...06, da quantia penhorável do vencimento líquido auferido pelo Executado, ao abrigo dos arts. 933º, nº 1 e nº 2 do C.P.C. 16.A 8 de abril de 2024 foi pedida informação ao processo 6031/22.2T8VNG, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Unidade Orgânica: V.N.Gaia - Juízo Comércio - Juiz 4 sobre o estado em que se encontram os autos, a fim de de instruir o/a Exec Especial p/ alimentos nos próprios autos (Of.Just) 47/11.1TBMDR.1. 17.A 9 de abril de 2024 foi junta aos autos informação segundo a qual em 20 de outubro de 2022 foi proferido o despacho a admitir liminarmente o pedido de exoneração do passivo e restante e o encerramento nos termos do art. 230º do CIRE, estando a decorrer o período de cessão do incidente de exoneração de passivo restante nos termos do art. 239 nº 2 do CIRE. 18.A 22 de abril de 2024 veio o exquente requerer nova notificação à entidade patronal do Executado, para que efetue de imediato a penhora do vencimento do Executado, pelo valor mensal de € 1.281,84, por ser apenas impenhorável a quantia equivalente à totalidade da pensão social do regime não contributivo (€ 224,24), e não o equivalente a 1/3 daquele vencimento e proceda à entrega, mensalmente, diretamente ao Exequente, por transfe-rência bancária para a conta com o IBAN ...06, da quantia penhorável do vencimento líquido auferido pelo Executado, ao abrigo dos arts. 933º, nº 1 e nº 2 do C.P.C. 19.A 26 de agosto de 2024 foi proferido o seguinte despacho: “Requerimentos com as referências ...97, ...55 e ...63 respectivamente - Visto. Compulsado o histórico do processo, os actos processuais constantes do mesmo e verificando-se resultar do mesmo, para além do mais, penhora de créditos e, para os devidos efeitos, e a fim de obstar a prática de actos inúteis, considerando o valor da quantia exequenda, notifique o Exmo. Sr. Agente de Execução para informar os autos precisamente qual o valor em dívida no âmbito dos presentes autos, juntando aos autos a nota discriminativa donde resulte de forma precisa o valor total do crédito penhorado e recuperado e respectivas datas, o valor pago ao exequente e o valor em dívida. D.N., notificando-se exequente e executado do presente despacho”. 20.A 13 de setembro de 2024 veio o exequente requerer nova notificação à entidade patronal do Executado, para que efetue de imediato a penhora do vencimento do Executado, pelo valor mensal de € 1.281,84, por ser apenas impenhorável a quantia equivalente à totalidade da pensão social do regime não contributivo (€ 224,24), e não o equivalente a 1/3 daquele vencimento e proceda à entrega, mensalmente, diretamente ao Exequente, por transferência bancária para a conta com o IBAN ...03 da quantia penhorável do vencimento liquido auferido pelo Executado, ao abrigo dos arts. 933º, nº1 e nº 2 do C.P.C. 21.A 23 de setembro de 2024 veio o executado pronunciar-se no sentido de a penhora em curso não ser alterada de 1/3 para o valor de € 1.281,84, conforme pretendido pelo Exequente, porquanto não consegue, de todo, o Executado, sobreviver com a quantia de € 224,24 mensal. 22.A 14 de outubro de 2024 foi proferida a decisão recorrida. * IV. Do direito: a) da nulidade da decisão, uma vez que não se pronunciou sobre sucessivos requerimentos apresentados pelo exequente – alínea d) do nº 1 do artº 615º do Código de Processo Civil. Como resulta das conclusões apresentadas veio o recorrente arguir a nulidade da decisão porquanto a mesma não se pronunciou sobre os diversos requerimentos por si apresentados nos autos de execução. Foi pela Mma Juiz a quo proferido despacho em que considerou não se verificar a nulidade apontada, tendo em atenção que, a obrigação de o Tribunal se pronunciar sobre os requerimentos apresentados se deve conjugar com a proibição da prática de actos inúteis, que inclui uma variante, que é a desnecessidade do Tribunal conhecer questões prejudicadas pelas soluções dadas a outras - artigos 130.º e 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil. Vejamos pois, se assiste razão ao recorrente. Decorre do nº 1 do artº 615º, do Código de Processo Civil que é nula a sentença quando: a) não contenha a assinatura do juiz; b) não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido. Assim, resulta do citado preceito serem as nulidades da sentença vícios formais e intrínsecos da mesma os que taxativamente se encontram previstos no citado preceito legal. Dos referidos vícios, designados como error in procedendo, são os previstos nas alíneas b) e c) os relativos à estrutura e os previstos sob as alíneas d) e e) os relativos aos limites da sentença, conforme referem os Drs José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 3ª Edição Almedina, pág 735. As nulidades da sentença, como seus vícios intrínsecos, são apreciadas em função do texto e do discurso lógico nela desenvolvidos, não se confundindo com erros de julgamento (error in judicando), que são erros quanto à decisão de mérito explanada na sentença, decorrentes de má perceção da realidade factual (error facti) e/ou na aplicação do direito (error juris), de forma que o decidido não corresponde à realidade ontológico ou normativa, com a errada aplicação das normas jurídicas aos factos, erros de julgamento estes a sindicar noutro âmbito (nestes termos, o Acórdão desta Relação de Guimarães de 4 de outubro de 2018 in www.dgsi.pt). Ora, será que a sentença em crise se encontra ferida da nulidade prevista na alínea d) do nº 1 do artº 615º do Código de Processo Civil, segundo a qual é nula a sentença quando “o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”, ou seja, não se pronunciou o julgador quanto às questões suscitadas ou de alguma das pretensões das partes? É que nas suas conclusões vem a recorrente arguir que é nula a decisão proferida, porquanto não se pronunciou o Tribunal sobre os diversos requerimentos por si apresentados. Nos termos da al. d) do nº1 do art. 615º do CPC é nula a sentença quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento, sendo pacífica a jurisprudência no sentido de que o dever de decidir tem por referência as questões suscitadas e bem assim as questões de conhecimento oficioso, mas que não obriga a que se incida sobre todos os argumentos, pois que os mesmos não se confundem com questões (neste sentido o Acordão do STJ de 27 de março de 2014, in proc 555/2002), sendo que, para determinar se se verifica a omissão de pronúncia há que interpretar a sentença na sua totalidade, articulando fundamentação e decisão (neste sentido Acordão do STJ de 23 de janeiro de 2019, processo 4568/13), seguindo-se aqui o referido em sede de Código de Processo Civil Anotado, Drs Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, Vol. I, 2ª Edição, Almedina, pág. 764. Ora, no caso sub judice, veio o exequente dar à execução sentença que condenava o executado a pagar-lhe quantia relativa a alimentos por este devidos, pretendendo com os seus requerimentos a imediata penhora do vencimento daquele, com a informação de que apenas ser impenhorável a quantia equivalente à totalidade da pensão social do regime não contributivo (€ 224,24), o que foi ordenado por carta remetida a 23 do mesmo mês e ano. Em consequência de tal veio a entidade obrigada a proceder à penhora do vencimento - Agrupamento de Escolas ..., Porto, em resposta ao ofício, com a referência ...24, informar que o executado, BB, aufere mensalmente o vencimento ilíquido de € 1.456,18, sujeito aos descontos obrigatórios, sendo que início dos descontos teria lugar no mês de novembro/2023. Porquanto não só o exequente no seu requerimento executivo mas também o executado vieram aos autos informar que este último havia sido declarado insolvente, o Tribunal a quo solicitou informações sobre o processo de insolvência tendo proferido o seguinte despacho: “Requerimentos com as referências ...97, ...55 e ...63 respectivamente - Visto. Compulsado o histórico do processo, os actos processuais constantes do mesmo e verificando-se resultar do mesmo, para além do mais, penhora de créditos e, para os devidos efeitos, e a fim de obstar a prática de actos inúteis, considerando o valor da quantia exequenda, notifique o Exmo. Sr. Agente de Execução para informar os autos precisamente qual o valor em dívida no âmbito dos presentes autos, juntando aos autos a nota discriminativa donde resulte de forma precisa o valor total do crédito penhorado e recuperado e respectivas datas, o valor pago ao exequente e o valor em dívida. D.N., notificando-se exequente e executado do presente despacho”. Ou seja, efetivamente, compulsados os autos, o Tribunal a quo não se pronunciou sobre cada requerimento apresentado pelo exequente aquando da sua apresentação mas diga-se que, ao contrário do alegado pelo ora recorrente, acabou por quanto aos mesmos se pronunciar através do despacho atrás referido. Efetivamente, lido tal despacho o Tribunal entende este que, face ao estado dos autos necessário se torna saber qual o valor total do crédito penhorado e recuperado, respetivas datas, valor pago ao exequente e valor em dívida, não se devendo pronunciar sobre o requerido, sob pena de praticar atos inúteis. E porque não se pôs em causa a bondade de tal despacho, a saber, do mesmo não se interpôs recurso, não cabe a este Tribunal pronunciar-se sobre o conteúdo do mesmo. Acresce que, atendendo à informação de que o executado havia sido declarado insolvente e ao teor do que veio a ser a decisão, esta sim em crise, efetivamente, seria praticar ato inútil insistir pela penhora requerida, e contrária à decisão que pôs fim à execução. Assim, diga-se que o Tribunal se pronunciou, por despacho não recorrido sobre os motivos que o levavam a não ordenar as diligências requeridas pelo exequente, acabando por extinguir a execução por a entender inadmissível, determinando que se procedesse ao levantamento da penhora do salário do executado e determinando que se procedesse à contabilização dos valores entregues e depositados à ordem destes autos e, após, que se notifique o Administrador de Insolvência para que, no prazo de 10 (dez) dias, informe/requeira o que tiver por conveniente, mormente, meio para que tais valores lhes sejam entregues. Ou seja, a decisão tomada e da qual veio o exequente recorrer é conforme, consentânea e concordante com a posição assumida nos autos de não insistir pela penhora do vencimento do executado/insolvente. Nestes termos, julga-se não verificada a nulidade invocada. b) da reapreciação do direito: Nas conclusões de recurso apresentadas pelo apelante insurge-se contra a decisão, por considerar que foram indevidamente aplicados e interpretados os artºs 88º, nº 1, 233º, nº 1, als. c) e d), 242º, nº 1 e 245º, nº 2, al. a) do CIRE no contexto dos factos que resultam dos autos face às informações obtidas junto do processo de insolvência do executado pretendendo a revogação da decisão. Ora, o despacho recorrido que extinguiu a execução é sustentado no argumento de que não se mostra possível após a declaração de insolvência e com o início do período de cessão, instaurar ações executivas contra o insolvente para obter o pagamento de quantias em dívida anteriores àquela declaração, não reclamadas na insolvência. Coloca-se pois a questão de saber se, uma vez encerrado o processo de insolvência e prosseguindo o processo com o incidente de exoneração do passivo restante pode o exequente promover a execução para obtenção do pagamento de quantia relativa a alimentos anteriores à declaração de insolvência e que ali não reclamou. Releva para a apreciação da questão colocada que em causa estão os alimentos relativos às mensalidades de julho de 2017 até abril de 2022, no total de € 11.600,00 (onze mil e seiscentos euros) devidas e não pagas pelo executado ao exequente, alimentos reconhecidos por sentença proferida a 9 de maio de 2022, nos autos de incumprimento das responsabilidades parentais, deduzido por AA e CC contra BB foi decidido: Ora, a 14 de junho de 2023, deduziu AA execução especial para pagamento de alimentos contra BB, peticionando o pagamento da quantia total de € 11.600,00 (onze mil e seiscentos euros) relativos às mensalidades a si devidas e não pagas, acrescida dos respetivos juros moratórios à taxa legal anual de 4% (artº 559º, nº 1 do Cód. Civil e Portaria nº 291/03, de 8/4), desde a data da sentença exequenda (3/5/2022) até integral e efetivo pagamento sendo os vencidos no montante de € 517,39 e ainda o pagamento da sanção pecuniária compulsória correspondente ao valor dos juros à taxa anual de 5%, devidos automaticamente desde a data do trânsito em julgado da sentença exequenda (3/6/2022), até integral pagamento, sendo os juros compulsórios, vencidos até hoje, perfazem o total de € 597,48. Ou seja, quando a presente execução foi instaurada, havia já sido declarada a insolvência do executado - dia 21 de julho de 2022, pelas 14h52, e proferido a 20 de outubro de 2022 o despacho a admitir liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante e o encerramento nos termos do artº 230º do CIRE, por insuficiência da massa insolvente para satisfazer as custas do processo e as restantes dívidas da massa insolvente. Ou seja, os créditos reclamados pelo exequente constituíram-se em data anterior à data em que foi proferida a sentença de insolvência, sendo, nos termos do disposto no nº 1 do artº 47º do CIRE, o recorrente credor da insolvência e sendo o crédito exequendo crédito sobre a insolvência. Vejamos. Resulta do nº 1 do artº 1º do CIRE que “O processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a satisfação dos credores pela forma prevista num plano de insolvência, baseado, nomeadamente, na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente, ou, quando tal não se afigure possível, na liquidação do património do devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores”. Sendo que de acordo com o disposto no artº 90º do referido diploma legal “Os credores da insolvência apenas poderão exercer os seus direitos em conformidade com os preceitos do presente Código, durante a pendência do processo de insolvência”, o que significa, como refere o Acordão da Relação de Lisboa, de 6 de julho de 2017, in www.dgsi.pt “(…)para obterem a satisfação dos seus direitos, terão de reclamar o seu crédito, nos termos do art. 128º ou, desde que verificados os necessários requisitos, através da ação sumária a que aludem os art.s 146º e segs, que corre por apenso ao processo de insolvência. 2.Sendo certo que, em conformidade com o disposto no art. 173º, o pagamento dos créditos sobre a insolvência apenas contempla os que estiverem verificados por sentença transitada em julgado. 3.As dívidas da massa insolvente deverão ser pagas nas datas dos respetivos vencimentos, qualquer que seja o estado do processo (artº 172º, nº 3) e, não sendo pagas, poderão ser objeto de ação declarativa ou executiva a instaurar, nos termos do art. 89º, nº 2, por apenso ao processo de insolvência.” Por outro lado, estabelece o artº 47º do CIRE quem pode ser considerado credor da insolvência: 1. Declarada a insolvência, todos os titulares de créditos de natureza patrimonial sobre o insolvente, ou garantidos por bens integrantes da massa insolvente, cujo fundamento seja anterior à data dessa declaração, são considerados credores da insolvência, qualquer que seja a sua nacionalidade e domicílio. 2. Os créditos referidos no número anterior, bem como os que lhes sejam equiparados, e as dividas que lhes correspondem, são neste Código denominados, respetivamente, créditos sobre a insolvência e dívidas da insolvência. 3. São equiparados aos titulares de créditos sobre a insolvência à data da declaração da insolvência aqueles que mostrem tê-los adquirido no decorrer do processo 4. […]”. Ou seja, como refere o Acordão da Relação do Porto de 23 de setembro de 2019, relatado pela Srª Desembargadora Ana Paula Amorim, in www.dgsi.pt, “De acordo com o citado preceito créditos da insolvência ou sobre a insolvência são os que, tendo natureza patrimonial ou tendo como garantia bens pertencentes à massa insolvente tenham fundamento anterior à data da declaração da insolvência. A natureza universal do processo de insolvência determina a impossibilidade de ser instaurada qualquer ação executiva após a declaração de insolvência contra o insolvente, tal como se prevê no nº 1 do artigo 88º do CIRE. A violação deste comando jurídico integra uma causa de impossibilidade legal originária da lide e é fundamento de extinção da lide executiva intentada com preterição da regra da universalidade do processo de insolvência (artigo 277º, alínea e), do Código de Processo Civil)[2]”. Assim, da leitura dos preceitos atrás citados, concluímos que a natureza universal do processo de insolvência conduz à impossibilidade de ser instaurada qualquer ação executiva após a declaração de insolvência contra o insolvente, por parte dos credores da insolvência, tal como estabelece no nº 1 do artº 88º do CIRE. Conforme refere o Acordão de 25 de janeiro de 2016, relatado pelo Sr Desembargador Carlos Gil, “A violação deste comando jurídico integra uma causa de impossibilidade legal originária da lide e é fundamento de extinção da lide executiva intentada com preterição da regra da universalidade do processo de insolvência (artigo 277º, alínea e), do Código de Processo Civil)”. Assim sendo deve a reclamação de créditos da insolvência efetuar-se dentro do prazo fixado na sentença de insolvência, nos termos do disposto no artº 128º do CIRE, podendo ainda ser efetuada, findo o prazo para as reclamações de créditos fixado na sentença, nos seis meses subsequentes ao trânsito em julgado da sentença de insolvência, ou nos três meses subsequentes à sua constituição, quando se constituam volvidos mais de seis meses sobre o trânsito em julgado da sentença de insolvência, conforme resulta do artº 146º do mesmo diploma legal. Ora, no caso sub judice, conforme já atrás salientamos, os créditos peticionados são anteriores à declaração de insolvência, sendo certo que, ao recorrido se concedeu inicialmente a exoneração do passivo restante, por decisão proferida a 20 de outubro de 2022, data em que também se proferiu despacho a decretar o encerramento nos termos do artº 230º do CIRE, por insuficiência da massa insolvente para satisfazer as custas do processo e as restantes dívidas da massa insolvente. Resulta ainda dos autos não haver qualquer elemento que permita concluir se foi ou não concedida a exoneração final do passivo restante. Ora, como refere o Acordão da Relação do Porto de 25 de janeiro de 2016, atrás citado “De acordo com o nº 1, do artº 245º do CIRE, a decisão final de exoneração do passivo restante importa a extinção de todos os créditos sobre a insolvência[9] que ainda subsistam à data em que é concedida, sem exceção dos que não tenham sido reclamados e verificados, não sendo contudo afetados os direitos dos credores da insolvência contra os condevedores ou os terceiros garantes da obrigação. Desta previsão legal resulta, diretamente, que a decisão final de exoneração do passivo restante implica a extinção de todos os créditos da insolvência que ainda não se mostrem satisfeitos, ainda que não tenham sido reclamados. Extrai-se também desta norma que os créditos da insolvência que não tenham sido reclamados não se extinguem por esse facto, pois que se assim não fosse, ficaria sem explicação a expressa referência a estes créditos. Porém, a exoneração final do passivo restante não abrange, entre outros, os créditos de alimentos, tenham ou não sido reclamados (artigo 245º, nº 2, alínea a) do CIRE)[10], porquanto a exigência da reclamação apenas está prevista para as indemnizações devidas por factos ilícitos dolosos praticados pelo devedor (artigo 245º, nº 2, alínea b) do CIRE) e, por outro lado, sendo esta previsão uma exceção à norma geral do nº 1, na falta de qualquer ressalva na norma definidora da exceção, deve concluir-se que se refere a todos os créditos de alimentos, tenham ou não sido reclamados. Não se perca de vista que determinado o encerramento do processo de insolvência, se acaso não houvesse sido deferido inicialmente o incidente de exoneração do passivo restante, os credores da insolvência poderiam exercer os seus direitos contra o devedor, sem outras restrições que não as derivadas do eventual plano de insolvência ou de um plano de pagamentos (artigo 233º, nº 1, alínea c), do CIRE)[11]”. Ou seja, apesar da natureza universal do processo de insolvência, créditos há, como os alimentícios que, não só não tem de ser reclamados como não se encontram abrangidos pela exoneração do passivo restante, podendo ser reclamados em sede de execução. Estamos perante um crédito de alimentos, sendo um crédito especial, decorrente das responsabilidades parentais, sujeito, também no âmbito da insolvência, a um regime especial. Nestes termos, procede o recurso e em consequência, revoga-se a decisão recorrida, devendo a execução prosseguir os seus termos. * V. Decisão: Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar procedente a apelação, revogando o despacho recorrido e consequentemente, prosseguindo a execução deduzida pelo recorrente contra o recorrido. Custas a cargo do recorrido. Guimarães, 10 de julho de 2025 Relatora: Margarida Pinto Gomes Adjuntas: Elisabete Alves Conceição Sampaio |