Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
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| Relator: | MARIA DE FÁTIMA ANDRADE | ||
| Descritores: | INVENTÁRIO DIVÓRCIO | ||
| Nº do Documento: | RG | ||
| Data do Acordão: | 10/13/2016 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | PROCEDENTE | ||
| Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO CÍVEL | ||
| Sumário: | 1- A decisão de facto deve ser expurgada de conceitos normativo-jurídicos não factualizados e cujo sentido não seja apreensível pelo cidadão comum, bem como de juízos conclusivos. 2- Tendo corrido seus termos processo de inventário para partilha de bens comuns subsequente a ação de divórcio, o meio próprio para partilhar bem comum não incluído naquele é a partilha adicional. 3- O recurso ao instituto do enriquecimento sem causa, por violação do princípio da subsidiariedade, está vedado ao cônjuge que invoca a existência de bem comum ainda não partilhado e tem ao seu dispor o regime da partilha adicional. | ||
| Decisão Texto Integral: | Relatora: Maria de Fátima Almeida Andrade 1ª Adjunta: Alexandra Rolim Mendes 2ª Adjunta: Maria Purificação Carvalho Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório Manuel A, melhor id. a fls. 5, instaurou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra Helena J, igualmente melhor id. a fls. 5. Pela procedência da ação peticionou o A. a condenação da R. a: a) Pagar ao Autor a quantia indemnizatória de € 34.950,36 (trinta e quatro mil, novecentos e cinquenta euros e trinta e seis cêntimos) a título de perdas, correspondente a metade do montante transferido para a conta pessoal da ora Ré em França e que esta indevidamente guardou para si na totalidade; b) Pagar ao Autor a quantia indemnizatória de € 11.766,60 (onze mil, setecentos e sessenta e seis euros e sessenta cêntimos) a título de danos, correspondente a metade do montante dos juros a que se faz referência em 21.º e 22.º desta petição; c) Pagar ao Autor os juros vincendos, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento. Para o efeito alegou o A. em suma ter, na sequência da venda de um apartamento na constância do matrimónio com a aqui R. com quem foi casado desde 1969 sem convenção antenupcial, transferido em 03/05/2005 parte do valor da venda – no montante de € 70.000,00 - para conta pessoal exclusiva da R. em França, com vista a liquidar empréstimo bancário contraído pelo casal em França e da responsabilidade de ambos, conforme acordo entre os mesmos estabelecido. Tendo entretanto sido liquidado o empréstimo em causa com o produto da venda do bem imóvel também pertença do casal que por via de tal empréstimo estava onerado com hipoteca a favor do credor, não devolveu a R. ao A., apesar de para tal solicitado, ½ da quantia que para a sua conta fora transferida para os fins já referidos. Desde o dia 04/05/2005 passou a R. a administrar bem comum do casal, uma vez que então ainda estavam casados. Pelo que tem a mesma a obrigação de prestar contas ao outro cônjuge, ora A. [o casamento foi dissolvido por sentença de 16/07/2009]. A não devolução da ½ da quantia transferida ao A., causou-lhe perdas e danos face ao comportamento da R., pelo que a título de perdas exige desta o montante de € 34.950,36 – correspondente a ½ do valor transferido (após dedução da comissão bancária cobrada pela transferência) que a R. para si guardou na totalidade e a título de danos o montante de € 11.766,00 correspondente a ½ do total dos juros vencidos calculados à taxa diária de 4% ao ano. Sem prescindir, mais alegou o A. que a atuação da R. de quem agora se encontra divorciado, configura enriquecimento sem causa à custa alheia. * Devidamente citada a R., contestou a fls. 47 e segs., onde invocou: - A prescrição do pedido formulado pelo autor quer a título principal – indemnização por perdas e danos; quer a título subsidiário por enriquecimento sem causa – por terem já decorrido 3 anos quer desde a data da transferência; quer desde a data em que transitou em julgado a sentença que decretou o divórcio; quer a partir da data a que os efeitos do divórcio foram reportados; - A prescrição dos juros peticionados para lá dos últimos 5 anos; - A propriedade da quantia em questão na sequência das partilhas que A. e R. fizeram em França, aceitando o A. que a quantia em questão – o total transferido – ficasse para a R.; - A afirmação do aqui A. no processo de divórcio que decorreu em França de que a R. tinha já recebido € 70.000,00 o que foi levado em consideração para condenar o A. ao pagamento de uma prestação compensatória de apenas € 20.000,00 a favor da R.. Criando na R. a convicção de que aquele dinheiro ficaria para si, tanto mais que fizeram as partilhas do que havia em frança e aí acertaram todas as contas em 2006, constitui abuso de direito vir agora o A., passados 7 anos após as partilhas pedir que a R. entregue o valor peticionado. - Para o caso de ser condenada, declarou ainda a R. pretender a compensação do crédito do A. com os créditos que na contestação invocou. Concluiu pela improcedência da ação. O A. replicou impugnando a factualidade alegada pela R. (fls. 75 e segs.), pronunciando-se pela improcedência das exceções da prescrição (para tanto alegando o que consta em 12º a 18º) e da compensação (por impugnação da existências dos créditos) no mais concluindo como na p.i.. Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador relegando o conhecimento da exceção de prescrição para final. Foi identificado o objeto do litígio e elencados os temas da prova. * Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença que julgando a ação parcialmente procedente decidiu: “a) Condenar a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 31.635,37 (trinta e um mil seiscentos e trinta e cinco euros e trinta e sete cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor, contados desde 10.04.2013 até integral e efetivo pagamento; b) Absolver a Ré do demais contra si peticionado pelo Autor”. Do assim decidido apelou a R., oferecendo alegações e formulando as seguintes Conclusões: I- Ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 627° nº 1, 629° nº 1, 631°, nº 1 e 644° nº 1 aI. a) do C.P.C., vem a Ré apelar da douta sentença de 18/12/2015, proferida nos autos à margem melhor identificados que condenou a Ré a pagar ao A. a quantia de € 31.635,37 (Trinta e Um Mil Seiscentos e Trinta e Cindo Euros e Trinta e Sete Cêntimos) acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor, contados desde 10/04/2013 até integral pagamento. II- A recorrente impugna a decisão da matéria de facto dada como provada no ponto 4. os factos provados, por o segmento "numa altura em que se encontravam separados de facto" encerrar um conceito normativo (técnico jurídico), traduzido numa conclusão jurídica a retirar de factos concretos que permitam ao intérprete inferir: i) que foi interrompida a comunhão de vida entre os cônjuges; ii) que existe da parte de, pelo menos um deles, o propósito de não restabelecer tal comunhão. III- Por não se tratar de um facto, deve tal segmento ser eliminado daquele ponto 4. dos factos provados. IV- O tribunal a quo não pode entender que a partilha desencadeou-se, pelo menos, entre o ano de 2005 e o ano de 2013, se o divórcio só foi decretado em 2010 com o trânsito em julgado da decisão do tribunal de Versailles, pois só após o divórcio é que é possível proceder-se à partilha. V- No caso em apreço a sentença do tribunal de Grande Instância de Pontoise, confirmada pelo tribunal da Relação de Versailles reportou os efeitos do divórcio entre os cônjuges relativamente aos bens a 23.10.2006. VI- Sendo assim, o Autor tinha direito a metade do acervo que compunha o dissolvido casal à data de 23.10.2006, sendo que anteriormente a essa data nada havia ainda a partilhar. VII- Diz a sentença recorrida que a mencionada quantia de € 69.900,73 é um bem comum do casal, precisamente porque é produto da venda de um bem comum. VIII- Os bens comuns do dissolvido casal dividem-se através da partilha, partilha essa que pode ser extra judicial, se houver acordo entre as partes, ou judicial/notarial (desde 02/09/2013 é da competência dos Notários), não havendo acordo entre as partes, sendo que neste último caso, a partilha faz-se por meio de processo de inventário. IX- O Tribunal a quo, embora não o diga expressamente, parece ter entendido que tendo findado o processo de partilhas entre o Autor e a Ré em consequência do divórcio com a partilha da casa de Vinhais em 10.04.2013 no âmbito do processo de inventário nº 120/12.9TBVNH sem recuperar metade da quantia em causa, não teve outra alternativa senão recorrer à presente ação, justificando assim o recurso ao instituto do enriquecimento sem causa. Todavia, X- O Instituto do enriquecimento sem causa não é convocável no caso em apreço. XI- A ação baseada nas regras do enriquecimento sem causa tem natureza subsidiária, só podendo recorrer-se a ela quando a lei não faculte ao empobrecido outros meios de reação, ou seja, o empobrecido apenas poderá recorrer à ação de enriquecimento quando a lei não lhe faculte outro meio para cobrir os seus prejuízos (Mário Júlio Almeida Costa, Direito das Obrigações, 5ª edição, p. 402). Ora, XII- Apesar do trânsito em julgado da sentença homologatória da partilha, se esta lesar os interessados, estes para se ressarcirem dos prejuízos que, por ventura, sofreram, para além do recurso extraordinário de revisão, dispõem de três meios específicos: a) A emenda da partilha por acordo de todos eles; b) Na falta de tal acordo, a ação para emenda da partilha proposta dentro de um ano a contar do conhecimento do erro; c) A ação para anulação de partilha judicial. XIII- As normas constantes do Código de Processo Civil referentes ao processo de inventário foram revogadas pela Lei nº 23/2013 de 05.03 que aprovou o Regime Jurídico do Processo de Inventário e entrou em vigor em 2 de Setembro de 2013. Todavia, o novo regime em nada alterou aquelas possibilidades, pois as mesmas continuam a constar dos artigos 70°, 71° e 72° do referido regime. XIV- Conforme referido na douta sentença aqui em apreço, a partilha no âmbito do processo de inventário nº 120/12.9TBVHN terminou a 10.04.2013, sendo que a presente ação foi proposta a 04.11.2013, ou seja menos de um ano após o término do referido processo, pelo que o Autor podia ainda pedir a emenda da partilha. XV- Para além dos três meios referidos supra, o Autor podia ainda requerer a partilha de bens adicional que é permitida quando houve omissão de bens na partilha, conforme refere o artigo 2122° do Código Civil: "a omissão de bens da herança não determina a nulidade da partilha, mas apenas a partilha adicional dos bens omitidos". XVI- A partilha adicional encontra-se ainda no artigo 1395° do C.P.C. e atualmente no artigo 75° do Regime Jurídico do Processo de inventário: "Quando se reconheça, depois de feita a partilha, que houve omissão de alguns bens, procede-se no mesmo processo à partilha adicional.com observância, na parte aplicável, do que se acha disposto nesta subsecção e nas anteriores", XVII- Mal andou assim o Tribunal a quo ao aplicar no presente caso o instituto do enriquecimento sem causa, tendo violado assim o princípio da subsidiariedade daquele instituto - o Autor tinha ao seu dispor outro meio jurídico para o seu ressarcimento. XVIII- Verifica-se portanto a exceção perentória da violação do princípio da subsidiariedade do instituto do enriquecimento sem causa, inscrito no artigo 4740 do Código Civil, que deve conduzir à procedência do presente recurso e à absolvição da Ré/recorrente do pedido. Sem prescindir, caso assim não se entenda, XIX- Mal andou o Tribunal a quo ao consentir tão só na compensação de metade do valor dos € 6.630,00 pagos pela recorrente no âmbito da execução que correu termos pelo extinto 10 Juízo do Tribunal Judicial de Bragança sob o nº 2078/05.1TBBGC-A em que era executado o Autor. XX- A respeito do pagamento efetuado pela Ré, diz a sentença em apreço que "Sabemos que a alienação de imóveis comuns carece do consentimento de ambos os cônjuges, salvo se entre eles vigorar o regime da separação de bens (cfr. artigo 1682°-A, nº 1, alínea a) do Código Civil) e que a alienação da casa de morada de família carece sempre do consentimento de ambos os cônjuges (cfr. artigo 1682°-A, nº 2, do Código Civil). Também sabemos que são da responsabilidade de ambos os cônjuges as dívidas contraídas na constância do matrimónio pelo cônjuge administrador, em proveito comum do casal e nos limites dos seus poderes de administração (cfr. artigo 1691°, nº 1 alínea c) do Código Civil) - veja-se que o artigo 1692°, alínea b), do Código Civil prevê que são da exclusiva responsabilidade do cônjuge a que respeitam as dívidas provenientes de indemnizações, restituições, custas judiciais ou multas devidas por factos imputáveis a cada um dos cônjuges, "salvo se esses factos, implicando responsabilidade meramente civil, estiverem abrangidos pelo disposto nos nºs 1 ou 2 do artigo anterior. Tratando-se de dívida claramente contraída na constância do casamento pelo Autor no âmbito dos seus poderes de administração dos bens comuns e em claro proveito comum do casal, respondem ambos os cônjuges pelo pagamento da mesma, na proporção de metade". "Então, tendo a Ré procedido ao pagamento da totalidade da quantia de € 6.630,00 e sendo-lhe devido o reembolso, por parte do Autor, de metade dessa importância, ou seja € 3.315,00, fica aquela adstrita à obrigação de restituir ao Autor apenas a quantia de € 31.635,37 (€ 34.950,37- € 3.315,00), acrescida de juros de mora". XXI- A dívida do Autor era da sua única responsabilidade e não da do casal. XXII- Conforme referiu o Tribunal a quo, "Resultou provado que, por decisão proferida em 28.03.2008 no âmbito da ação nº 2078/05.1 TBBGC do extinto 1° Juízo de Bragança, o ora Autor foi condenado a pagar a Bruno J e esposa Teresa C a quantia de € 5.000,00 a título de devolução em falta do reforço do sinal, acrescida de juros vencidos". XXII 1- Ou seja, a dívida do Autor resultou da sua condenação no processo nº 2078/0S.1TBBGC que correu termos pelo extinto 1° Juízo de Bragança, processo em que o Autor foi o único demandado e não a Ré. XXIV- A própria execução que correu por apenso àquele processo foi intentada, e de outro modo não poderia ser, única e exclusivamente contra o Autor e não, também, contra a Ré. XXV- É hoje sobejamente consabido que não basta alegar que as dívidas foram contraídas em proveito comum do casal para poder ser responsabilizado o cônjuge não diretamente contraente. Tal conceito é um conceito de direito que importa factualizar e, para poder cumprir a sua função de extensão da responsabilidade, tem ainda de ser complementado com a prova de que a dívida foi contraída pelo cônjuge administrador e dentro dos seus poderes de administração (aI. c) do nº 1 do art. 1692° do C.Civ). Tal factualização e alegação tem a sua sede própria em ação declarativa. XXVI- O Tribunal a quo, baseando-se erradamente no disposto no artigo 1691° do Código Civil, conseguiu pôr a cargo da Ré uma dívida que a sentença proferida no processo 2078/05.1TBBGC nunca pôs a seu cargo. XXVII- O Tribunal a quo violou, por errada interpretação, o disposto no artigo 1691° do Código Civil e modificou uma sentença que já havia transitado em julgado, violando ainda o caso julgado. XXVIII- O presente segmento desta sentença deve assim ser revogado e substituído por outro que reconheça que a Ré procedeu ao pagamento de uma dívida da única e exclusiva responsabilidade do Autor no valor de € 6.630,00, devendo tal valor ser abatido à quantia de € 34.950,37 caso se entenda dever a Ré pagar tal quantia ao Autor, o que só por mera hipótese se concede. Ainda sem prescindir, XXIX- Apesar de terem sido peticionados pela Ré juros de mora desde o pagamento dos € 6.630,00, ou seja desde 4.12.2008, o Tribunal a quo não se pronunciou sobre tal pedido, nem sequer com referência a metade do valor. XXX- A Ré pagou uma dívida que era da exclusiva responsabilidade do Autor, devendo por isso, serem computados os juros de mora à taxa legal desde o pagamento da mesma, que nesta data se computam em € 1.901,45, quantia esta que também deverá ser abatido ao valor € 34.950,37 caso se entenda que a Ré o deve pagar ao Autor, o que só por mera hipótese se concede. Termos em que, concedendo provimento à presente apelação, deve ser proferido douto acórdão, que revogando a sentença recorrida, julgue a ação improcedente nos termos sobreditos, com as legais consequências. Caso assim não se entenda o que por mera hipótese se concede, deve à quantia a pagar pela Ré ao Autor ser abatida a quantia de € 6.630,00 paga pela Ré, acrescida dos juros de mora vencidos.”. Respondeu o A. em contra-alegações concluindo: “1ª O Douto Tribunal Recorrido ao dar como provados os factos descritos em A. dos Factos Provados, (III. Fundamentação de Facto), pontos 1. a 17., e como não provados os factos referidos em B. dos Factos não Provados, (III. Fundamentação de Facto), e consequentemente julgando parcialmente procedente a pretensão deduzida pelo autor, aqui apelado, formou a sua convicção, nos depoimentos em conjunto prestados pelas testemunhas inquiridas, em conjugação com a prova documental junta aos autos. 2ª Dúvidas não existem, de que a Recorrente faz uma apreciação diferente, por vezes em desacordo com a prova efetivamente produzida em sede de audiência de julgamento, faz uma interpretação e uma apreciação da prova produzida, consoante melhor lhe convém. 3.a Face a este circunstancialismo, o Douto Tribunal "A Quo" decidiu bem, pois contrariamente ao alegado pela Recorrente a prova constante dos autos, designadamente a documental conjugada com a testemunhal produzida em sede de audiência e julgamento impõe decisão absolutamente igual à que foi proferida. 4.a Não errou o Tribunal A Quo, não existe, pois qualquer erro de julgamento por insuficiência de prova ou incorreta valoração desta para a decisão de facto proferida; Não decidiu o Tribunal Recorrido de forma a provocar uma ofensa violenta aos interesses da Recorrente, nem a apreciação da prova produzida traduz qualquer obscuridade ou deficiência. 5.ª Por isso, pode a Meritíssima Juiz do Tribunal Recorrido retirar a conclusão de que com um elevadíssimo grau de certeza que, apurados aqueles factos, e fazendo a sua apreciação à luz do enquadramento jurídico-legal aplicável, a decisão a proferir só podia ser aquela que efetivamente foi proferida, ou que viesse a determinar procedente a pretensão do Autor. Por outro lado e sem conceder, 6.a Caso assim não seja, o que só por mera hipótese académica se admite, tem vindo a entender-se, desde há muito, que as nulidades da decisão, cujas causas estão taxativamente enunciadas no artigo 668.0, do C. P. C., não incluem o erro de julgamento seja de facto ou de direito (cfr. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol., V, pág. 137, Antunes Varela e outros, em Manual de Processo Civil, 2.a ed., pág. 686; acórdãos do STJ, de 13/02/1997 e de 21/05/1998, na CJ, ano V, tomo I, pág. 104 e ano VI, tomo II, pág. 95, da RC de 18/01/2005 e da RL de 16/01/2007, proferidos nos processos n.ºs 2545/2004 e 8942/2006-1, disponíveis em www.dgsi.pt. Assim sendo, como nos parece, não vislumbramos onde possam existir as "invocadas" causas para a revogação da sentença recorrida. Quanto muito, tratar-se-ia de um vício estrutural da sentença, pelo que jamais poderia integrar aquela "causa de nulidade", muito embora a recorrente não o diga expressamente. A Recorrente fundamenta "tal nulidade" em erro de julgamento, de facto e de direito, pelo que, como vimos, não podem integrar os mencionados vícios da sentença, jamais podendo ser reconhecida a sua existência. 7ª Neste pressuposto, deve pois, improceder a arguição do referido erro de interpretação e aplicação deficiente do direito aos factos invocados pela Apelante, pelo que, se não impõe, decisão diversa da que foi proferida sobre a matéria de facto e aplicação do direito. 8.a Perante tal factualidade, dúvidas não restam, de que não assiste qualquer razão à Recorrente, pois que, o Douto Tribunal "A Quo" decidiu bem, devendo impor-se decisão absolutamente igual à que foi proferida. 9.a Sendo perfeita e rigorosamente correta a apreciação ou interpretação que a Meritíssima Juiz do Tribunal Recorrido faz na apreciação da prova, que fez acerca do depoimento das diversas testemunhas inquiridas e da apreciação que a mesma exerceu na análise aos documentos juntos ao processo, bem como da aplicação do direito. 10ª As razões em que se fundamenta o presente recurso, a nosso ver, como dissemos, não têm qualquer correspondência com a verdade dos factos, nem fundamento real e sério, nem sequer base legal que o justifique, por isso, bem decidiu o Tribunal "A Quo " ao concluir pela procedência (embora parcial) da ação nos moldes em que o fez. Na verdade, 11ª - Não decidiu, o Tribunal "A Quo" de forma aligeirada materializando uma ofensa violenta aos interesses da aqui apelante, como esta parece fazer crer, nem a apreciação da prova produzida traduz qualquer obscuridade, deficiência ou erro notório. 12.a - A Sentença da qual a ré recorre, não enferma de vícios que impliquem a sua nulidade, (ainda que não tendo sido arguida), nem sequer razões ou fundamentos existem para ser revogada. 13.a - Os fundamentos alegados pela recorrente não inquinam a Sentença proferida por erro de interpretação e aplicação do direito aos factos ou de insuficiência de fundamentação, ou obscuridade, está em plena e manifesta consonância com a prova produzida e com as normas legais aplicadas. Numa palavra: 14.a O Autor, aqui Recorrido, mais uma vez, pugna pois, pela manutenção da decisão proferida. Nestes termos, e nos melhores de Direito que V. Ex.as Mui Doutamente suprirão, julgando totalmente improcedente o recurso apresentado, devendo ser mantida a Douta Decisão de 1ª Instância, sendo o autor/recorrido absolvido do pedido contra si deduzido. Assim se fazendo Justiça.”. *** O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo. Foram colhidos os vistos legais. *** II- Âmbito do recurso. Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de e em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC – resulta das formuladas pela apelante serem as seguintes as questões a apreciar: 1- Eliminação do segmento do ponto 4 da matéria de facto dada como provada por encerrar um conceito normativo traduzido numa conclusão jurídica a retirar de factos concretos (conclusões II e III); 2- Erro na forma do processo (apesar de não diretamente qualificado nestes termos pela recorrente) – por estar em causa a divisão de bem comum do dissolvido casal e 3- Verificação dos requisitos do enriquecimento sem causa, nomeadamente o requisito da subsidiariedade (conclusões IV a XVIII); 4- Responsabilidade exclusiva do A. pela dívida apurada e referida em 12) a 15) dos factos provados e montante a compensar com o crédito do A. juros incluídos (conclusões XIX a XXX); *** III- Fundamentação Foram dados como provados os seguintes factos: 1) Autor e Ré casaram entre si, sem convenção antenupcial, no dia 15.02.1969. 2) O casamento foi dissolvido por divórcio decretado por sentença de 16.07.2009, proferida pelo Tribunal de Grande Instância de Pontoise, em França, e confirmada por decisão do Tribunal da Relação de Versailles proferida em 14.10.2010, tendo sido integrado e averbado no assento de casamento n." 28 de 1969 na Conservatória do Registo Predial de Vinhais, relativo ao casamento de ambos. 3) Tal sentença reportou os efeitos do divórcio entre os cônjuges relativamente aos bens a 23.10.2006. 4) Em 2005, numa fase em que se encontravam separados de facto, o Autor vendeu a José M pelo valor do € 75.000,00 o último dos apartamentos que havia construído em Bragança. 5) Por acordo de Autor e Ré, do valor da venda foi transferida, através do Banco S, a importância de € 70.000,00 para uma conta pessoal exclusivamente da Ré domiciliada em França com vista ao pagamento de um empréstimo contraído nesse País pelo casal junto do Banco B Paris, no valor de € 92.900,00, e da responsabilidade de ambos, referente à compra da casa em Osny - França. 6) Para o efeito, o Banco emissor descontou ao ordenador José M uma comissão pela transferência no valor de € 99,27, pelo que o montante exato transferido para a conta pessoal da Ré em França foi de € 69.900,73. 7) O casal, no âmbito das partilhas levadas a efeito em França, venderam a referida casa de habitação sita em Osny - França pelo valor de € 380.000,00. 8) No ato da celebração da respetiva escritura, ocorrida em 27.10.2006, o Banco B Paris fez-se representar, tendo recebido de imediato o total do capital em dívida, relativamente ao crédito hipotecário, ou seja, € 92.900,00, tendo recebido cada um dos membros do casal dissolvido, após descontados os respetivos emolumentos do ato notarial, a importância de € 136.749,74. 9) Porque o referido empréstimo fosse integralmente pago com o produto da venda da própria moradia sita em Osny - França, na referida data de 27.10.2006, o Autor solicitou à Ré, sem sucesso, a devolução de metade da quantia referida em 5. deduzida da comissão cobrada pela transferência. 10) No âmbito do divórcio, o Autor foi condenado a pagar à Ré uma prestação compensatória no montante de € 20.000,00. 11) O Autor pagou à Ré tal quantia em 15.05.2014. 12) No processo n.º 2078/05.1 TBBGC do extinto 1.º Juízo do Tribunal de Bragança, o Autor foi condenado, por sentença de 28.03.2008 junta a fls. 63-68, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, a pagar a Bruno J e esposa a quantia global de € 5.513,30, acrescida de juros vincendos. 13) Como o Autor não pagou, foi intentada execução que correu termos pelo extinto 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Bragança sob o n.º 2078/05.1 TBBGC-A em que era executado o Autor. 14) A Ré pagou em 04.12.2008 a quantia de € 6.630,00 à Agente de Execução Carla P para pôr termo a tal processo. 15) O Autor ainda não devolveu à Ré nem a totalidade nem parte da quantia referida em 14. 16) O Autor enviou à Ré em Março de 2011 uma carta registada com aviso de receção solicitando a entrega da quantia que lhe era devida. 17) O processo de partilhas entre o Autor e a Ré em consequência do divórcio só terminou com a partilha da casa de Vinhais em 10.04.2013 no âmbito do processo de inventário n.º 120/12.9TBVNH. * Conhecendo. Em função do supra enunciado, cumpre em primeiro lugar apreciar da pretendida eliminação de parte do ponto 4 da matéria de facto dada como provada por encerrar um conceito normativo, traduzido numa conclusão jurídica – nomeadamente o segmento “…numa fase em que se encontravam separados de facto…”. Resulta do disposto no artigo 607º n.º 4 do CPC que na sentença o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que não julga provados. A contrario se extraindo que da sentença e nomeadamente da decisão de facto não devem constar nem juízos conclusivos nem conceitos normativo-jurídicos. A separação de facto é na verdade conceito jurídico-normativo que se preenche, tal como ressalta do artigo 1782º do CC (Código Civil), pela verificação da inexistência de “comunhão de vida entre os cônjuges”, havendo “da parte de ambos, ou de um deles, o propósito de não a restabelecer”. Inexistência de comunhão que por sua vez tem implícito o conceito de separação de “habitação, mesa e leito” por parte dos cônjuges. É certo que tem vindo a ser entendido jurisprudencialmente ser admissível incluir na factualidade provada conceitos que podem ser tidos como de direito quando simultaneamente os mesmos “forem factualizados e usualmente utilizados na linguagem comum, possuindo um sentido apreensível”. [vide nesse sentido Ac. STJ de 28/05/2015, Relator Granja da Fonseca in http://www.dgsi.pt/jstj ]. Não se nos afigura ser todavia o caso. O conceito “separados de facto” pressupõe na realidade a verificação de um conjunto de circunstâncias – as acima referidas (vide artigo 1782º do CC) – que carecem de concretização factual, sem que se possa afirmar existir coincidência entre o sentido usual com que tal termo é utilizado pelo cidadão comum e o sentido normativo-jurídico relevante. Por tal e por se não poder afirmar que a apreensão do sentido da expressão em causa – abrangendo todos os requisitos legais mencionados - incluída no ponto 4) dos factos provados é generalizada, temos de concluir pela necessidade da sua eliminação. Procedendo assim a 1ª questão suscitada pela apelante, determina-se a eliminação do segmento pela mesma apontado. Consequentemente o ponto 4 dos factos provados passará a ter a seguinte redação: “4) Em 2005 o Autor vendeu a José M pelo valor do € 75.000,00 o último dos apartamentos que havia construído em Bragança.”. No que à decisão de facto concerne importa ainda analisar o que consta em 17) factos provados. Embora a apelante não tenha de forma expressa requerido a alteração da sua redação, não deixou de aludir – na conclusão IX - à interpretação que o tribunal a quo fez do seu teor. Tendo presente que a decisão da matéria de facto deve ser expurgada de conceitos de direito [salvo se “forem factualizados e usualmente utilizados na linguagem comum” conforme já supra referido] bem como de asserções de natureza conclusiva, na medida em que estas devem resultar do raciocínio lógico dedutivo baseado nos concretos pontos de facto dados como provados, [cfr. Ac. STJ de 14/05/2014, Relator Melo Lima in http://www.dgsi.pt/jstj ], justifica-se na verdade a apreciação da redação dada a este ponto dos factos provados. Com efeito no mesmo está contida um acontecimento da vida real –o fim do processo de inventário ali identificado e uma conclusão que permite – nos termos invocados pela apelante e por referência ao raciocínio expendido pelo tribunal a quo para justificar o momento em que a R. teve “conhecimento da falta de causa do seu enriquecimento” – a interpretação de que com o fim de tal processo ocorreu o “termo definitivo da partilha do património comum” tal como referido na sentença recorrida. Ora esta conclusão não só não deveria constar deste ponto dos factos provados por dever ser extraída de factos concretos, como inclusive e a ser interpretada no sentido pela apelante invocado por referência ao que decidido foi pelo tribunal a quo, implica na aplicação do direito contradição com a demais realidade factual apurada – vide 4 a 6 dos factos provados. Termos em que se decide oficiosamente alterar a redação dada ao ponto 17) dos factos provados por forma a dele expurgar o juízo conclusivo relativo ao termo “do processo de partilhas entre Autor e Ré”. Passando assim a ter a seguinte redação: “17) Correu termos sob o n.º 120/12.9TBVNH processo de inventário para partilha dos bens comuns móveis e imóveis do dissolvido casal Helena J e Manuel A, o qual terminou por sentença de homologação da partilha proferida em 10/04/2013, conforme doc. de fls. 84 a 88 dos autos”. * Analisemos agora a 2ª questão suscitada pela apelante e que reconduzimos à nulidade principal de erro na forma do processo (apesar de não diretamente qualificado nestes termos pela recorrente) – por segundo alega estar em causa a divisão de bem comum do dissolvido casal. Na verdade os considerandos deduzidos pela apelante nas conclusões IV e seguintes questionam a adequação da forma do processo de ação declarativa de condenação utilizada pelo autor à pretensão pelo mesmo deduzida nestes autos. Invoca em suma que o autor deveria ter recorrido a outros meios jurídicos ao seu dispor, nomeadamente os indicados em XII a XV, por referência à partilha de bens comuns do casal que em processo de partilhas já foi operada. Esta questão apenas foi pela R. suscitada em sede de recurso pelo que é questão nova, cujo conhecimento está vedado a este tribunal na medida em que o recurso ordinário visa a reapreciação dos fundamentos de facto e/ou de direito da decisão proferida pelo tribunal a quo e dentro dos mesmos condicionalismos, salvo se em causa estiver nulidade de conhecimento oficioso [vide Ac. TRC de 08/11/2011, Relator Henrique Antunes in http://www.dgsi.pt/jtrc ]. A verificar-se esta nulidade, a mesma seria de conhecimento oficioso (vide artigos 5º n.º 3, 193º, 196º, 200º e 608º n.º 2 do CPC) até ao despacho saneador quando o processo o comporte ou em caso negativo até à sentença final. Da sua procedência resultando a absolvição da instância no caso de inadequação total da forma processual utilizada vide artigos 193º, 196º, 200º, 278º n.º 1 al. b), 576º n.º 2 e 577º al. b e 578º do CPC. Ocorre que no caso dos autos tal nulidade não foi nos articulados invocada pela R. e no despacho saneador não foi a mesma apreciada, pelo que e caso esta se verificasse se consideraria a mesma sanada. Esclarece-se, não obstante, que se diz “caso se verificasse”, porquanto e tendo presente que o erro na forma do processo depende da desadequação do pedido formulado à forma de processo empregue, se entende inexistir qualquer desadequação, na medida em que o pedido condenatório formulado está conforme com a forma de processo comum empregue. Questão diferente é apreciar se a pretensão deduzida pelo autor pode proceder em face da causa de pedir delineada pelo autor. Mas tal é questão de mérito que se prende com a 3ª questão a apreciar e supra elencada. * Da factualidade provada resulta que A. e R. foram casados sob o regime de comunhão de adquiridos [vide 1) dos factos provados em conjugação com o disposto no artigo 1717º do CC]. Casamento este dissolvido por sentença de 16/07/2009 com efeitos reportados a 23/10/2006 [vide 2) e 3) dos factos provados]. Em 2005 – estando ainda casados – vendeu o A. um apartamento, tendo do produto da venda transferido para uma conta exclusiva da R. a quantia de € 70.000,00 com o objetivo de ser esta utilizada na liquidação parcial de dívida da responsabilidade de ambos [vide 4) a 6) dos factos provados]. Bem este que se presume comum atenta a factualidade provada em conjugação com o disposto nos artigos 1724º e 1725º do CC e 1722º a contrario, do CC todos. Diga-se aliás que a natureza comum da verba em questão não foi colocada em crise pelas partes. A R. apenas alegou acordo com o A. no sentido de entretanto tal quantia ficar de sua única e exclusiva pertença. Neste ponto nada tendo provado. Alegou o A. em 1º lugar que a quantia mencionada não foi utilizada para o fim previsto, tendo por tal a R. passado a administrar esse bem comum do casal. Administração esta da qual estava obrigada a prestar contas, tendo a sua atuação resultado em prejuízo para o A.. Motivo porque e face à não devolução da quantia em questão apesar de solicitação para o efeito, causou a atuação da R. ao A. uma “perda” equivalente ao valor de ½ da quantia transferida para a R. e um dano correspondente ao valor dos juros legais vencidos sobre essa mesma ½ da quantia transferida. Primeiro fundamento do pedido deduzido pelo autor foi assim a má administração do bem comum por parte da R., causa de prejuízo para si e fundamento de pedido indemnizatório ao abrigo do disposto no artigo 1681º do CC.. Resulta deste preceito legal que a violação dolosa – “intencional” – dos deveres de administração do cônjuge administrador, fazem incorrer o mesmo em responsabilidade perante o outro cônjuge, pelos prejuízos que tal atuação lhe cause. Da factualidade provada nenhuma atuação dolosa se pode todavia imputar à R., a implicar a manifesta improcedência do pedido do A. com base neste fundamento. O que assim expressamente se declara, sanando a omissão de pronúncia do tribunal a quo sobre este fundamento do pedido ao abrigo do disposto no artigo 665º n.º 2 do CPC. Não sendo in casu de cumprir o contraditório na medida em que a apelação não procede com base neste fundamento [vide sobre o conhecimento oficioso em caso de omissão de pronúncia sobre um dos fundamentos do pedido formulado Abrantes Geraldes em anotação ao art.º 665º in " Recursos no Novo Código de Processo Civil, ed. 20014, p. 278]. Subsidiariamente alegou ainda o A. constituir a não devolução de tal quantia um enriquecimento sem causa da R. à custa do seu próprio (A.) empobrecimento. O tribunal a quo no pressuposto de que através do processo de inventário mencionado em 17) dos factos provados foi feita a partilha do “último bem integrante do património comum do extinto casal” entendeu estar a R. obrigada a restituir a quantia em questão ao abrigo do regime do enriquecimento sem causa. Invocou a R. não estar preenchido um dos requisitos deste instituto – nomeadamente o da subsidiariedade - na medida em que findo processo de partilhas referido em 17) dos factos provados e verificado existir ainda um bem a partilhar, podia e devia o autor ter recorrido nomeadamente (e no que ora releva) ao regime de partilha adicional. Regime este previsto no artigo 1395º do CPC em vigor à data em que foi instaurado o processo referido em 17) dos factos provados [cfr. sobre a aplicação da redação deste artigo a situação de partilha adicional em processo de inventário instaurado em data anterior à entrada em vigor do NCPC, Ac. RP de 13/03/2014, Relator Leonel Serôdio in http://www.dgsi.pt/jtrp em cujo sumário se pode ler “II - A partilha adicional, ainda que requerida após a entrada em vigor da Lei n.º 23/2013 de 05.03, que aprovou o Regime Jurídico do Processo de Inventário, é tramitada no mesmo processo de inventário e consequentemente no Tribunal onde este correu termos e não no Cartório Notarial.”]. Dispõe o art.º 473º do C.C. "1. Aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustificadamente se locupletou. 2. A obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objeto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou". Tem este instituto natureza subsidiária, conforme decorre do art.º 474º do C.C., ou seja “Não há lugar à restituição por enriquecimento, quando a lei facultar ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído, negar o direito à restituição ou atribuir outros efeitos ao enriquecimento.”. Dissolvido o casamento por via do divórcio cessam as relações patrimoniais entre os cônjuges, produzindo-se os seus efeitos quanto às relações patrimoniais entre eles a partir do trânsito em julgado da respetiva sentença, retroagindo-se à data da propositura da ação (art.ºs 1688º e 1789º nº 1 do C.C.). Decretado o divórcio – art.º 1404º do C.P.C. em vigor à data em que foi instaurado o processo de inventário para partilha de bens referido em 17) dos factos provados - qualquer um dos cônjuges podia requerer inventário para partilha do património comum do casal. Como o fizeram, quanto aos bens sobre que não houve acordo. O processo de inventário visa pôr fim à comunhão de bens entre os cônjuges que extrajudicialmente o não lograram fazer, sendo este o meio processual adequado para tal à data. “O inventário é caracterizado pelo princípio da universalidade, sendo o seu objetivo a partilha de todos os bens e direitos que integram essa comunhão, seja hereditária ou conjugal, de uma só vez, visando-se, desse modo, uma partilha igualitá¬ria. Com este processo, pretende-se colocar termo a uma comunhão que engloba todos os bens que dela fazem parte, independentemente do local onde se situem.” (cfr. Ac RLX de 03/11/09 in http://www.dgsi.pt/jtrl). Nessa partilha do património comum há que conferir por cada cônjuge o que cada um deles dever ao património comum. E havendo créditos de cada um dos cônjuges sobre o outro, serão pagos pela meação do cônjuge devedor no património comum – tal como resulta do disposto no artigo 1689º do CC. Ou seja é em sede de liquidação da comunhão que cada um dos cônjuges deve conferir ao património comum tudo o que lhe deve. Devendo nomeadamente e nessa altura o cônjuge devedor compensar o património comum pelo enriquecimento do seu património próprio à custa do património comum ou e em situação inversa o património comum compensar o cônjuge credor quando o património próprio deste respondeu por dívida comum [cfr. sobre o direito de compensação e o seu modo de exercício Ac. TRG de 17/12/2014, Relator Filipe Caroço in http://www.dgsi.pt/jtrg]. No caso dos autos e no que ao pedido do autor concerne, temos que em causa está, de acordo com o por si alegado e aliás provado, um bem comum ainda não partilhado. Não havendo entre os ex-cônjuges acordo quanto à sua partilha e porque já correu entre os mesmos processo de inventário para partilha de bens comuns [vide 17) dos factos provados] há pois previamente que recorrer ao regime da partilha adicional. Do exposto se conclui pela improcedência do pedido do autor com fundamento no instituto do enriquecimento sem causa, por não verificado o requisito da subsidiariedade. Improcedendo o pedido nos termos supra expostos, fica prejudicado o pedido de compensação deduzido pela R. do qual era pressuposto o reconhecimento do crédito do A. nesta ação e que pelos motivos expostos improcede. Prejudicado ficando consequentemente o conhecimento da 4ª questão no início elencada como parte do objeto do recurso. Sumário (artigo 663º n.º 7 do CPC). 1- A decisão de facto deve ser expurgada de conceitos normativo-jurídicos não factualizados e cujo sentido não seja apreensível pelo cidadão comum, bem como de juízos conclusivos. 2- Tendo corrido seus termos processo de inventário para partilha de bens comuns subsequente a ação de divórcio, o meio próprio para partilhar bem comum não incluído naquele é a partilha adicional. 3- O recurso ao instituto do enriquecimento sem causa, por violação do princípio da subsidiariedade, está vedado ao cônjuge que invoca a existência de bem comum ainda não partilhado e tem ao seu dispor o regime da partilha adicional. III. Decisão. Em face do exposto, julga-se o recurso procedente e consequentemente: - Revoga-se a sentença recorrida e julga-se a ação improcedente, absolvendo-se a R. apelante do pedido contra a mesma formulado. Custas da ação e da apelação pelo recorrido. Notifique. *** Guimarães, 13 de setembro de 2016. (Maria de Fátima Almeida Andrade) (Alexandra Maria Rolim Mendes) (Maria Purificação Carvalho) |