Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
96/04.6JABRG.G1
Relator: ANTÓNIO RIBEIRO
Descritores: SEPARAÇÃO DE PROCESSOS
TITULAR DE CARGO POLÍTICO
ART. 42º DA LEI Nº 34/87
DE 16 DE JULHO
RETENÇÃO DO RECURSO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/22/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECLAMAÇÃO PENAL
Decisão: CONSIDERADA PROCEDENTE
Sumário: I – Nos termos do art. 42º da Lei nº 34/87, de 16.07, «a instrução e o julgamento de processos relativos a crime de responsabilidade de titular de cargo político, cometido no exercício das suas funções, far-se-ão, por razões de celeridade, em separado dos relativos a outros co-responsáveis que não sejam titulares de cargos políticos».
II – A redacção de tal norma não deixa margem para tergiversões, impondo-se ao Julgador sem que a este se consinta qualquer juízo acerca da verificação, em concreto, das razões de celeridade, que o legislador tem por objectiva e abstractamente justificativas do regime que assim consagrou, sobrepondo-o ao quadro geral do art. 30º do CPP.
III - Naturalmente que, estando em causa a separação de processos na fase da instrução e como afirma o Reclamante, a retenção do recurso – nesta parte, que não quanto às demais questões suscitadas no requerimento de abertura de instrução – levaria a que a execução do despacho recorrido, com a consequente realização da instrução sem separação dos processos, redundasse na absoluta inutilidade daquele mesmo recurso, por entretanto já estar concluída a fase instrutória aquando da sua apreciação pela Relação.
Decisão Texto Integral: Reclamação – art. 405º do Código de Processo Penal.
Reclamante (Arguido): António C.
3º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Guimarães.

*****

No processo a que se refere apresente reclamação foram constituídos arguidos e acusados da autoria material de um crime previsto e punido pelo art. 23º, nº 1 da Lei nº 34/87, de 16 de Julho, o ora Reclamante, na qualidade de Vereador da Câmara Municipal de …, António M., Presidente da mesma Câmara, e ainda Armando O. e Fernando M., estes enquanto gerentes em exercício da sociedade por quotas “Invest., Lda.”, como autores materiais, cada um deles, de um crime previsto e punido pelos arts. 28º, nº 1 e 377º, nº1 do Código Penal.

Por despacho de fls. 1482 foi admitida a abertura de instrução, requerida pelo aqui Reclamante a fls. 1395, aí pedindo este, por ordem de precedência:
a) Fosse ordenada a separação de processos, para que a instrução, relativamente aos arguidos Armando O. e Fernando M., se processasse em separado da dos demais arguidos;
b) Fosse declarado nulo o laudo de peritagem de fls. 818 a 824;
c) Fossem declarados nulos os autos de inquirição que especificou;

Tais pedidos foram indeferidos pelo despacho de fls. 1499-1500, sendo que, no que respeita ao primeiro deles, o Mmº Juiz a quo fundou a sua decisão em não vislumbrar «quaisquer razões de celeridade processual no pedido formulado», pois, tendo os arguidos titulares de cargos políticos requerido a abertura da instrução, «mesmo com a separação de processos, «sempre estes arguidos estariam em fase de instrução, não passando da fase de inquérito para a fase de julgamento».

O Reclamante interpôs recurso do despacho de fls. 1499-1500, o qual foi admitido como agravo, com subida a final e efeito meramente devolutivo, conforme despacho certificado a fls. 102 destes autos.

É desse despacho que vem a presente reclamação, alegando o Reclamante, em síntese:

1) O recurso interposto pelo reclamante, do despacho que indeferiu a realização da instrução em separado, teve por exclusiva finalidade conseguir que a instrução fosse feita em separado;
2) A retenção do recurso, emergente do regime de subida e efeito que lhe foi fixado no despacho reclamado (a subir a final e com efeito meramente devolutivo), torna o recurso absolutamente inútil;
3) O despacho reclamado infringiu o disposto no nº 1 do art. 407º e no nº 3 do art. 408º, ambos do CPP.

II – Fundamentos;

Atenta a delimitação do objecto da presente reclamação, feita pelo Reclamante, apenas está aqui em causa o regime de subida e o efeito do recurso interposto quanto ao indeferimento do pedido de separação de processos.

Nos termos do art. 42º da Lei nº 34/87, de 16.07, «a instrução e o julgamento de processos relativos a crime de responsabilidade de titular de cargo político, cometido no exercício das suas funções, far-se-ão, por razões de celeridade, em separado dos relativos a outros co-responsáveis que não sejam titulares de cargos políticos».

Sem poder, nem pretender, entrar na apreciação da matéria do próprio recurso, sempre se dirá que a redacção de tal norma não deixa margem para tergiversões, impondo-se ao Julgador sem que a este se consinta qualquer juízo acerca da verificação, em concreto, das razões de celeridade, que o legislador tem por objectiva e abstractamente justificativas do regime que assim consagrou, sobrepondo-o ao quadro geral do art. 30º do CPP.

Naturalmente que, estando em causa a separação de processos na fase da instrução e como afirma o Reclamante, a retenção do recurso – nesta parte, que não quanto às demais questões suscitadas no requerimento de abertura de instrução – levaria a que a execução do despacho recorrido, com a consequente realização da instrução sem separação dos processos, redundasse na absoluta inutilidade daquele mesmo recurso, por entretanto já estar concluída a fase instrutória aquando da sua apreciação pela Relação.

III – Decisão;

Em face do exposto, nos termos do artigo 405º do CPP, decide-se pela procedência da reclamação, suprindo-se o lapso quanto à qualificação do recurso como sendo de agravo e determinando-se que o mesmo suba imediatamente, em separado e com efeito suspensivo do processo, nos termos dos arts. 406º, nº 2, 407º, nº 1 e 408º, nº 3, do CPP.

Não são devidas custas.

Guimarães, 2009.12.22