Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
6555/19.9T8BRG.G1
Relator: ANTERO VEIGA
Descritores: DOENÇA PROFISSIONAL
DIAGNÓSTICO INEQUÍVOCO
FACTOR DE BONIFICAÇÃO 1.5 – IDADE
PENSÃO PROVISÓRIA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/10/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
A data da certificação deve corresponder à data do primeiro diagnóstico inequívoco da doença, um diagnostico que se apresente como certo e definitivo, baseado em critérios clínicos e de acordo com a Legis artis”. O diagnóstico deve, pois, resultar fundamentado, designadamente em exames e observações, detalhando-se o estado clínico.
O fator de bonificação de 1,5 referenciado nº 5 al. a) das Instruções Gerais da TNI, enquanto critério das bases de avaliação do ano corporal e do prejuízo funcional, visa ajudar a surpreender a real incapacidade do sinistrado/doente; encontrando a sua razão de ser no impacto que o decurso da idade tem sobre o corpo humano, em termos de capacidades de recuperação quer físicas quer profissionais.
O artigo 135º do CPT consagra um regime especial de juros, que são devidos independentemente de interpelação ou culpa, pretendendo-se ressarcir o retardamento no pagamento, de quantia que o sinistrado/doente, necessita para prover às necessidades do seu dia a dia.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

AA, idf. nos autos, iniciou a presente ação, com processo especial, para efetivação de direitos resultantes de doença profissional, contra:

- o “Instituto da Segurança Social, IP” (Departamento de Proteção contra os Riscos Profissionais), idf. nos autos, pedindo, a final, que a ré reconheça que é portadora de doença profissional, ao nível do aparelho auditivo – surdez bilateral associada a acufenos – pelo menos desde 28.10.2016, com a incapacidade permanente parcial que lhe vier a ser fixada em junta médica, bem ainda seja aquela condenada a pagar-lhe as prestações em espécie de que careça e a correspondente pensão anual e vitalícia, nos termos e fundamentos expostos na petição de fls. 2 a 7.
- O réu contestou a 6.01.2020 (cfr. fls. 35 a 40), alegando, em síntese, que:
- não está comprovado que a autora esteve exposta a ruído no período em que trabalhou no sector têxtil, nem tão-pouco mais recentemente como auxiliar da creche .... A 28.10.2016 a autora foi sujeita a intervenção cirúrgica, por lhe ter sido diagnosticada patologia auditiva. A hipoacusia de que a autora padece deve-se a doença natural. À cautela, caso seja fixada alguma incapacidade, sempre aquela terá de ser fixada tendo em conta o disposto no art. 113.º da Lei n.º 98/2009.
- A 16.04.2020 a autora requereu a fixação de pensão provisória, o que foi deferido a 30.04.2020, atenta a não oposição do réu. – cfr. fls. 62 a 65 e fls. 71 dos autos.
A 25.06.2024 o réu apresentou requerimento a solicitar que, caso seja fixada pensão, por verificação de doença profissional, por ter aquela ter estado com baixa entre 24.02.2017 e 1.08.2019 – 900 dias – que seja descontado ao valor devido por ITs o subsídio de doença, bem como seja considerado o valor das pensões provisórias.
- A autora foi sujeita a exame, através de Junta Médica, conforme auto junto de fls. 97 a 100 do apenso.
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Após julgamento foi proferida decisão nos seguintes termos:
“Pelo exposto, o Tribunal julga a presente ação totalmente procedente, por provada, e em consequência, decide-se:
a) declarar que a autora padece de doença profissional – surdez neuro sensorial bilateral – a que corresponde uma incapacidade permanente parcial global de 28%;
b) condenar o réu Instituto da Segurança Social, I.P. (Departamento de Proteção Contra os Riscos Profissionais):
b.1) a pagar à autora a pensão anual e vitalícia, devida desde 1.10.2017, no valor de 1.808,30 Eur. (mil, oitocentos e oito euros trinta cêntimos), atualizável anualmente, com exceção das devidas no período de outubro de 2017 a 1.08.2019 (porque não cumuláveis com subsídio de doença já pago) e ainda deduzindo o valor já adiantado a título de pensões provisórias;
b.2) a pagar à autora as despesas correspondentes às prestações em espécie que venham a ser prescritas à autora, e que comprove por prescrição médica e recibo de pagamento correspondente terem sido feitas.
(…)”

Inconformada a autora apresentou recurso com as seguintes conclusões:
A. Reconhecer que houve omissão de pronúncia por não se decidir sobre o pedido de condenação da Ré no pagamento de juros de mora; em consequência, condenar a Ré a Pagar à Autora a indemnização em capital de remição da pensão anual e Juros de mora à taxa legal, a apurar em sede de execução de sentença, desde o dia seguinte ao da data em que as prestações passariam a ser devidas isto é, in casu, desde o dia 15-02-2017, e até integral pagamento – arts.135º do Código de Processo do Trabalho, 806º nº 1 do Código Civil e Portaria 291/2003 e na jurisprudência cuja posição é maioritária, entre outros, vide, os Acórdãos do STJ de14/04/1999, CJ, STJ, 1999, 2.º, 262; do STJ de 09/06/1999, BMJ, 488.º,334; do STJ de 03/03/1999, BMJ,485º, 216; os acórdãos da RL de 24/05/2006, da RP de 14/07/2008; da RP de 13/11/2008; da RP de 18/10/2010; da RP de 04/06/2012; da RP de 12/11/2012 e da RC de 23/04/2009 – todos disponíveis na base de dados da DGSI em www.dgsi.pt
B. 1 – Declarar que a pensão vitalícia é devida à Autora desde outubro 2016 nos termos do o art.º 128º, nº 1 da Lei nº 98/2009 de 04-09, que diz: “a pensão por incapacidade permanente é devida a partir da data a que se reporta a certificação da respetiva situação, não podendo ser anterior à data do requerimento ou da participação obrigatória, salvo se, comprovadamente, se confirmar que a doença se reporta a data anterior. Considerando que pelos documentos juntos aos autos, e pelo reconhecimento em sede de fundamentação da sentença está dado como provado o facto de os que os Srs. Peritos em resposta ao quesito al. c) da ré afirmaram que a surdez está diagnosticada desde a 1.ª consulta de ORL em 2016, embora não tenham fixado essa data como a de certificação da doença, caso assim se não entenda.
2 – Declarar que a pensão vitalícia por incapacidade permanente é devida à Autora desde 15.02.2017, nos termos do nº 3 do art.º 128º da Lei nº 98/2009 de 04-09, no caso da referida alínea a) do nº 2, porquanto a incapacidade é considerada a partira da data da participação obrigatória, se anterior ao Requerimento.
C. Declarar, nos termos do disposto no Anexo I, nº 5 Decreto Lei nº 352/2007 de 23 – 10, que aprova a tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho, que os coeficientes de incapacidade atribuídos à Autora devem ser bonificados pela aplicação até o limite da unidade, com uma multiplicação pelo fator 1.5 segundo a fórmula:
IG+(IGx0.5), atenta a idade da Autora (58 anos) à data da Participação Obrigatória.
D. Declarar que os montantes pagos à Autora a título de pensão provisória não são devolvidos à Ré nem deduzidos na pensão anual e vitalícia atribuída, conforme acórdão da Relação de Coimbra de 27.03.2014 e como dispõe o nº 2 do art.º 123º da Lei nº 98/2009, de 4-9.

Caso assim não se entenda,
E. Declarar que, nos termos solicitados pela Ré, no requerimento que apresentou em 25.06.2024, Ref.ª ...30, a Autora não poderá receber o valor da IPP durante o período em que esteve protegida tanto pelo subsídio de incapacidade temporária, bem como pela pensão Provisória.

NESTES TERMOS, NOS MELHORES DE DIREITO E COM O SEMPRE MUI DOUTO SUPRIMENTO DE V. EX.AS, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROVADO, REVOGANDO-SE A SENTENÇA RECORRIDA E SUBSTITUINDO-SE POR OUTRA QUE:

a) CONDENE O RÉU a pagar os juros de mora à taxa legal sobre o capital de remissão da pensão anual fixada;
b) Fixe da data a partir da qual é devida a pensão fixada e na respetiva aplicação pelo Tribunal a quo da norma do art.º 128º da Lei nº 98 de 2009 de 04.09, nomeadamente os seus nº 1, nº 2 alínea a), e nº 3.
c) aplique a bonificação do fator 1,5 prevista no n.º 5 das Instruções Gerais da TNI.
d) julgue pela não restituição das pensões provisórias.
No seu parecer a Exmª PGA refere dever ser tomada posição quanto aos juros, ocorrer lapso quanto data da alta, seria outubro de 2016, e omissão e pronúncia quanto à bonificação. Quanto ao mais deve improceder.
***
A factualidade com interesse é a que resulta do precedente relatório.

Da sentença fez-se constar a seguinte factualidade:
1. A autora começou a trabalhar aos catorze anos de idade.
2. Entre os anos de 1973 a 1995, a autora trabalhou como operária fabril têxtil em diversas empresas deste sector.
3. A partir de 2000 até ao final do mês de outubro de 2016, a autora trabalhou como auxiliar numa creche, cuidando de crianças dos 6 meses aos 6 anos de idade.
4. A autora auferia a retribuição mensal de 530,00 Eur., acrescida de 63,00 Eur. de diuturnidades e 66,00 Eur. de subsídio de refeição.
5. A autora recebeu subsídio provisório de doença profissional desde o dia 13 de fevereiro de 2017 até ao dia 1 de agosto de 2019.
6. A autora nasceu no dia 30 de março de 1958. (alíneas A) a F) da matéria de facto considerada assente no saneador)
7. No período referido em 2., a autora esteve exposta a ruído intenso provocado pelas máquinas, que em determinadas alturas eram mais de duzentas.
8. A autora trabalhava oito horas diárias.
9. A autora exercia a sua atividade sem qualquer proteção para o ruído.
10. No período referido em 3. a autora trabalhava oito horas diárias.
11. E exercia também esta atividade sem qualquer proteção para o ruído.
12. A autora sofre de surdez bilateral associada a acufenos, com perdas médias auditivas de 61,5 dB no ouvido direito e 50 Db no ouvido esquerdo.
13. Para esta doença contribuiu a exposição da autora a ruído intenso enquanto trabalhou como operária têxtil.
14. Alterado:
À surdez neuro sensorial bilateral de que padece corresponde uma incapacidade permanente parcial global de 28% acrescida do fator de bonificação de 1,5.
(resposta aos temas de prova)

b) Factos Não Provados
1. No período referido em 3. dos provados, a autora esteve exposta a ruído intenso.
2. A surdez neuro sensorial bilateral é ainda consequência do ruído a que autora esteve exposta na creche.
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Conhecendo do recurso:
Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente.

Questões colocadas:
- Nulidade da sentença por omissão de pronúncia (art. 615º nº 1 al. d) CPP), por não ter condenado em juros de mora.
- Data a partir da qual é devida a pensão fixada.
- Não aplicação da bonificação do fator 1,5 prevista no n.º 5 das Instruções Gerais da TNI.
- Restituição das pensões provisórias.
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Comecemos pela questão do grau de incapacidade e data de início.
O recorrente refere a data de outubro de 2016, por a tal data se reportar a certificação da situação. Refere os documentos juntos aos autos e que os Srs. Peritos em resposta ao quesito al. c) da ré afirmaram que a surdez está diagnosticada desde a 1.ª consulta de ORL em 2016.
Refere o  nº 1 do art. 128º da Lei nº 98/2009:
“ A pensão por incapacidade permanente é devida a partir da data a que se reporta a certificação da respetiva situação, não podendo ser anterior à data do requerimento ou da participação obrigatória, salvo se, comprovadamente, se confirmar que a doença se reporta a data anterior.”
A participação obrigatória ocorreu a 15.2.2017.
Refere Carlos Alegre, Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, 2ª ed. Almedina, pág. 145, que “a data do primeiro diagnóstico inequívoco da doença equivale, para os vários efeitos de reparação à data do acidente de trabalho. Dada a característica normalmente lenta e insidiosa da contração da doença, aquela data é a única segura para os referidos efeitos. Esse diagnóstico, não tem que resultar feito perante ou por entidades oficiais (tribunais ou serviços públicos de saúde) mas pode ser feito e registado por qualquer pessoa ou entidade qualificada para um diagnóstico médico legalmente válido.” Veja-se Ac. STJ de 9-10-2022, processo nº 5133/19.7T8SNT.S1.
A data da certificação deve corresponder à data do diagnóstico inequívoco da doença, um diagnostico que se apresente como certo e definitivo, baseado em critérios clínicos e de acordo com a Legis artis”. O diagnóstico deve, pois, resultar fundamentado, designadamente em exames e observações, detalhando-se o estado clínico.
No caso, ocorre lapso na sentença de primeira instância, pretendendo-se considerar a certificação a outubro de 2016, como se alerta no douto parecer, nos seguintes termos:
“Resulta da sentença que para efeitos de calculo da retribuição de referencia, ter-se-á de atender ao ano de 2016, data em que a doença foi certificada, “sendo que os Srs. Peritos em resposta ao quesito al. c) da ré afirmaram que a surdez está diagnosticada desde a 1.ª consulta de ORL em 2016, embora não tenham fixado essa data como a de certificação da doença”, constando ainda que “a autora trabalhou, entre os anos de 1973 a 1995, como operária fabril têxtil, período em que esteve exposta ao risco, e desde o ano de 2000 até ao final do mês de Outubro de 2016, trabalhou como auxiliar numa creche, cuidando de crianças dos seis meses aos seis anos de idade, sendo que desde aí tem estado de baixa médica.”
Assim, parece existir lapso na sentença quando depois refere que “a pensão é devida desde o mês de outubro de 2017, por ser essa a data da certificação da doença – art.º 128.º, n.º 1 da Lei n.º 98/2009, de 04 de setembro” e na decisão fixa 01/10/2017 como a data a partir da qual é devida a pensão.
Parece que o Tribunal queria referir-se a outubro de 2016, data da certificação da doença e não a outubro de 2017, pelo que haverá lapso.”
Resulta patente que se quis considerar outubro de 2016. Nesse sentido aponta não apenas o referenciado pela Exmª PGA mas ainda o valor dado à ação, que apenas se compagina com a consideração do ano de 2016.
Assim e nesta parte procede a apelação, considerando-se, em correção, a certificação a outubro de 2016.
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Quanto à aplicação do fator de bonificação de 1,5 referenciado nº 5 al. a) das Instruções Gerais da TNI.
À data da certificação da doença a requerente tinha já 50 anos de idade, completados a 30-3-2008. O fator de bonificação, tem em vista, enquanto critério, e tal como os restantes critérios, ajudar a surpreender a real incapacidade do sinistrado/doente.
Assim, o nº 1 das instruções logo refere, “a presente Tabela Nacional de Incapacidades (TNI) tem por objetivo fornecer as bases de avaliação do dano corporal ou prejuízo funcional sofrido em consequência de acidente de trabalho ou de doença profissional, com redução da capacidade de ganho”; referindo o corpo da instrução nº 5:
“ Na determinação do valor da incapacidade a atribuir devem ser observadas as seguintes normas, para além e sem prejuízo das que são específicas de cada capítulo ou número:
a) Os coeficientes de incapacidade previstos são bonificados, até ao limite da unidade, com uma multiplicação pelo fator 1.5, segundo a fórmula:  IG + (IG x 0.5), se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho ou tiver 50 anos ou mais quando não tiver beneficiado da aplicação desse fator.
(…)”
Nos termos da instrução 7, “Sempre que circunstâncias excecionais o justifiquem, pode ainda o perito afastar-se dos valores dos coeficientes previstos, inclusive nos valores iguais a 0.00 expondo claramente e fundamentando as razões que a tal o conduzem e indicando o sentido e a medida do desvio em relação ao coeficiente em princípio aplicável à situação concreta em avaliação.”
O fator de bonificação com base na idade, tem a ver com o impacto real que o simples facto da idade implica relativamente às capacidades de recuperação quer físicas quer profissionais.
Idade mais avançada implica uma menor capacidade de recuperação, devido às mudanças que ocorrem no corpo decorrentes da idade, e com repercussão destas na capacidade de recuperação. Estão normalmente associadas a uma idade mais avançada, perda de massa muscular, perda de elasticidade – pele, vasos sanguíneos, etc…-, diminuições ao nível respiratório e cardíaco, sistema hormonal, sistema nervoso, menor coordenação, menores reflexos, menor capacidade de regeneração…, maiores probabilidades de evoluções para cronicidade, designadamente de sintomatologias dolorosas.
Algumas destas alterações intensificam-se sobremaneira a partir dos 50 anos. Trata-se no envelhecimento normal, envolvendo as mais diversas órgãos e funções do corpo – Veja-se,  Richard G. Stefanacci,  Mudanças no corpo com o envelhecimento, disponível em https://www.msdmanuals.com/pt/casa/quest%C3%B5es-sobre-a-sa%C3%BAde-de-pessoas-idosas/o-envelhecimento-corporal/mudan%C3%A7as-no-corpo-com-o-envelhecimento.
Estas condições implicam com a capacidade de recuperação e adaptação de uma lesão. Um sinistrado jovem recuperará ao longo dos anos, de forma mais visível que um sinistrado com 50 anos ou mais, e a sua capacidade de readaptação ao trabalho será mais conseguida, e de forma mais patente se se tornar necessárias algumas alterações no quadro de tarefas desempenhar. Já um sinistrado mais idoso poderá ao invés, ter uma evolução menos favorável e contrária, podendo em certas sequelas evoluir para situações de cronicidade - designadamente dolorosas.
Não constando da junta qualquer razão para a desconsideração desta instrução constante da TNI, importa, e porque não ocorreu pronúncia quanto à aplicação do mesmo, aplicá-lo, atribuindo-se a IPP final de 42%.
Assim, considerando a alteração, a pensão devida monta a 2.712,44€.
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Em face da alteração da incapacidade, a pensão não é obrigatoriamente remível, conforme artigo 135.º da LAT.
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Quanto aos juros de mora:

A autora na petição formula pedido quanto a juros de mora. Ainda que o não tivesse feito haveria que ter em consideração o disposto no artigo 135º do CPT, que refere; “na sentença final o juiz considera definitivamente assentes as questões que não tenham sido discutidas na fase contenciosa, integra as decisões proferidas no processo principal e no apenso, cuja parte decisória deve reproduzir, e fixa também, se forem devidos, juros de mora pelas prestações pecuniárias em atraso.”
A decisão não se pronunciou quanto a juros, pelo que nos termos do artigo 665º do CPC, importa condenar no pagamento de juros.
Consagra o artigo 135º do CPT um regime especial de juros, que são devidos independentemente de interpelação ou culpa, o que segundo cremos é entendimento pacífico. Pretende-se ressarcir o retardamento no pagamento, de quantia que o sinistrado/doente, necessita para prover às necessidades do seu dia a dia.
Assim veja-se o Ac. STJ de 10-07-2013, Proc. n.º 941/08.7TTGMR.PR.S1, no sentido de que, «[o]s regimes substantivo e processual respeitantes às prestações devidas por incapacidade emergente de acidente de trabalho constituem, pois, um todo harmónico e especial em relação ao regime geral dos juros moratórios previsto nos artigos 804.º e 805.º do Código Civil, prevalecendo, consequentemente, sobre este.
Não fora assim, e não se anteveria razão válida para a previsão acolhida no artigo 135.º do Código de Processo do Trabalho, quanto à condenação em juros.
Efetivamente, o citado artigo 135.º consubstancia uma norma especial que não só impõe ao juiz o dever de fixar juros moratórios, ainda que não peticionados, como o dever de os fixar independentemente da verificação do circunstancialismo previsto nos artigos 804.º e 805.º do Código Civil, como sejam a culpa do devedor e a interpelação deste para cumprir. A letra da lei e a razão de ser daquela norma (ratio legis) apontam no sentido de se pretender conceder a devida proteção ao trabalhador sinistrado, que vive, em regra, da retribuição e deixa de a receber devido ao acidente, devendo contar-se os juros desde a data do vencimento das indemnizações e pensões a atribuir ao sinistrado, pois nesta data o devedor fica constituído em mora.».
Ms, RE de 9-3-2016, processo nº, 354/15.4T8BJA.E1; RP de 20-3-2023, processo nº 479/12.8TTVNG.P1; RG de 29-6-2017, processo nº 59/10.2TTMTS.4.G1; RC de 2-5-2014, processo nº 121/12.7TTFIG-A.C1; RL de 26-6-2019, processo nº 180/08.7TTSNT.L1-4.
Assim são devidos juros de mora desde a data de vencimento de cada uma das prestações relativas à pensão.
Naturalmente os juros não serão devidos relativamente às prestações que se mostrem atempadamente pagas como pensão provisória, e relativamente ao montante pago, pois quanto a essas, e na medida do pagamento efetuado, não ocorreu qualquer retardamento no pagamento.
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- Restituição das pensões provisórias.
Sustenta a recorrente que não deve ser descontado o valor que recebeu de pensão provisória. Ora, se assim fosse, estaria a receber em duplicado, relativamente ao período em causa. A pensão provisória tem uma função cautelar, dada a dependência do trabalhador da sua remuneração para prover ao sustento do dia a dia, conforme resulta do artigo 52º, nº 2 da LAT.
Logo o nº 5 deste normativo refere que, “os montantes pagos nos termos dos números anteriores são considerados aquando da fixação final dos respetivos direitos”. Quanto à pensão provisória por morte, no mesmo sentido o artigo 118º, 2 da LAT.
Tais pensões provisórias cessam no momento da fixação definitiva da pensão – artigo 133º -. Veja-se ainda o direito a reembolso, por parte de entidade que tenha suportado tais pensões ou indemnizações provisórias, por parte da entidade responsável.
Assim e nesta parte improcede o alegado.
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DECISÃO:

Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julga parcialmente procedente o recurso, condenando-se a recorrida nos seguintes termos:

b.1) a pagar à autora a pensão anual e vitalícia, devida desde 1.10.2016, no valor de 2.712,44 Eur. (dois mil, setecentos e doze euros e quarenta e quatro cêntimos), atualizável anualmente, com exceção das devidas no período de 13 de fevereiro de 2017 até ao dia 1 de agosto de 2019 (porque não cumuláveis com subsídio de doença já pago) e ainda deduzindo o valor já adiantado a título de pensões provisórias;
b.1.1) Acrescem juros de mora à taxa legal, a contar da data de vencimento de cada uma das prestações, com a limitação referenciada na fundamentação relativamente aos valores pagos como pensão provisória.
No mais mantêm-se a decisão.
Valor da causa – 31.241,88 €
Custas em primeira instância nos termos aí referenciados.
Custa nesta instância pela recorrida na proporção de metade do despendido, dada a isenção da recorrente.
10-7-25

Antero Veiga
Vera Sottomayor
Francisco Pereira