Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | ELISABETE VALENTE | ||
Descritores: | DECISÃO ARBITRAL ANULAÇÃO ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA | ||
Data do Acordão: | 06/30/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Sumário: | I - Que só a falta absoluta da fundamentação, por omissão total dos factos ou total omissão do direito, ou a existência de erro lógico formal patente que não permita descortinar o raciocínio seguido ou que inelutavelmente o inquine, acarreta a nulidade / anulação da sentença arbitral. II – A eventual contradição entre os fundamentos e a decisão não é admissível como causa de nulidade no âmbito da acção de anulação porque a Lei, ao contrário do CPC, não previu expressamente essa nulidade, já que, sendo o vício da contradição entre os fundamentos e a decisão diferente do da falta de fundamentação, é de concluir, analisando o artigo 27.º, alínea d), conjugado com o artigo 23.º da Lei n.º 31/86, que se trata de matéria que não pode incluir-se na causa de pedir da acção de anulação. III- Quando decorre necessariamente do raciocínio da sentença o afastamento da existência de abuso de direito, resultando, de forma implícita, que esse conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio, não há omissão de pronúncia. (Sumário da Relatora) | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora: 1 – Relatório. Após ter sido proferida decisão Arbitral que julgou parcialmente procedente por provada e em consequência: a) Condenou a requerida a restituir ao requerente o valor de 595,81 euros referente ao período em que o requerente esteve privado de usufruir dos campos de golfe de 20.03.2020 a 05.05.2020 e de 15.01.2021 a 05.04.2021. b) Absolveu a reclamada do restante pedido de condenação formulado pelo reclamante. Veio (…), Golfe, S.A., com sede no Empreendimento do (…), Lote 4, Edifícios de Escritórios, Apartado …, 8401-980 Carvoeiro, Lagoa, propor contra AA, residente na Urbanização ..., ..., Apartamento ..., em ... ..., acção de Anulação de Sentença Arbitral, invocando que a sentença em crise violou os princípios fundamentais referidos acima, dir-se-á, por todos, violou o princípio do Estado de Direito: − Omitiu factos alegados por uma parte, provados ou não, que podiam alterar o sentido da decisão. − Competia ao tribunal enumerá-los, apreciá-los, fundamentar e dar a conhecer porque os considera provados ou não provados. − Omitiu ponderação e decisão sobre questão levada ao seu conhecimento. − Condenou segundo instituto do direito sem ponderar nem fundamentar os seus princípios e requisitos. Não houve contestação. Estão assim findos os articulados. Não é necessária a produção de qualquer meio de prova. Dispensados os vistos legais cumpre apreciar e decidir. 2 – Objecto do recurso. Questões a decidir: 1ª Questão - Saber se a sentença arbitral é nula por não especificar os factos não provados. 2ª Questão - Saber se se a sentença arbitral é nula por contradição. 3ª Questão - Saber se se a sentença arbitral é nula por omissão de pronúncia. 3 - Análise do recurso. 1ª Questão -Saber se a sentença arbitral é nula por não especificar os factos não provados. A impugnação da decisão arbitral apenas se pode fazer através do pedido da sua anulação, e nos estritos e taxativos termos e fundamentos do artº 46º, a que correspondem vícios formais alheios ao objecto/mérito do processo, ou seja, os fundamentos de anulação da decisão arbitral assumem-se como nulidades de natureza processual – neste sentido, Paula Costa e Silva, “Anulação e Recursos da Decisão Arbitral, in Revista da Ordem dos Advogados”, Ano 52, Lisboa, Dezembro de 1992, páginas 946-947. Assim, a decisão da impugnação pelo Tribunal de 2ª Instância é puramente cassatória e não permite que o Tribunal estadual conheça do mérito das questões decididas pela sentença arbitral, conforme decorre do estatuído no artigo 46.º, n.º 9, da Lei da Arbitragem Voluntária (LAV), anexa à Lei n.º 63/2011, de 14 de Dezembro, pelo que, as sentenças arbitrais só podem ser anuladas nos casos referidos no n.º 3 do artigo 46.º da Lei n.º 63/2011, de 14/12: «3 - A sentença arbitral só pode ser anulada pelo tribunal estadual competente se: a) A parte que faz o pedido demonstrar que: i) Uma das partes da convenção de arbitragem estava afectada por uma incapacidade; ou que essa convenção não é válida nos termos da lei a que as partes a sujeitaram ou, na falta de qualquer indicação a este respeito, nos termos da presente lei; ou ii) Houve no processo violação de alguns dos princípios fundamentais referidos no n.º 1 do artigo 30.º com influência decisiva na resolução do litígio; ou iii) A sentença se pronunciou sobre um litígio não abrangido pela convenção de arbitragem ou contém decisões que ultrapassam o âmbito desta; ou iv) A composição do tribunal arbitral ou o processo arbitral não foram conformes com a convenção das partes, a menos que esta convenção contrarie uma disposição da presente lei que as partes não possam derrogar ou, na falta de uma tal convenção, que não foram conformes com a presente lei e, em qualquer dos casos, que essa desconformidade teve influência decisiva na resolução do litígio; ou v) O tribunal arbitral condenou em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido, conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento ou deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar; ou vi) A sentença foi proferida com violação dos requisitos estabelecidos nos n. os 1 e 3 do artigo 42.º; ou vii) A sentença foi notificada às partes depois de decorrido o prazo máximo para o efeito fixado de acordo com ao artigo 43.º; ou b) O tribunal verificar que: i) O objecto do litígio não é susceptível de ser decidido por arbitragem nos termos do direito português; ii) O conteúdo da sentença ofende os princípios da ordem pública internacional do Estado português. Sendo que é o seguinte o teor do artigo 42.º. Forma, conteúdo e eficácia da sentença 1 - A sentença deve ser reduzida a escrito e assinada pelo árbitro ou árbitros. Em processo arbitral com mais de um árbitro, são suficientes as assinaturas da maioria dos membros do tribunal arbitral ou só a do presidente, caso por este deva ser proferida a sentença, desde que seja mencionada na sentença a razão da omissão das restantes assinaturas. (…) 3 - A sentença deve ser fundamentada, salvo se as partes tiverem dispensado tal exigência ou se trate de sentença proferida com base em acordo das partes, nos termos do artigo 41.º» Em suma: A acção de anulação não comporta reapreciação da prova produzida, nem a apreciação de eventual erro de julgamento ou na aplicação do direito – não permite a pronúncia/reapreciação sobre o mérito da decisão, mas apenas sobre as eventuais nulidades da sentença, contempladas no n.º 3 do citado artigo 46.º da LAV. Nos termos da Lei da Arbitragem Voluntária/LAV, a sentença deve ser fundamentada, salvo se as partes tiverem dispensado tal exigência ou se trate de sentença proferida com base em acordo das partes, nos termos do artigo 41.º (n.º 3 do mesmo artigo). Como sabemos, a Constituição da República Portuguesa consagra no artigo 205.º, n.º 1, o dever de fundamentação das decisões decorre ao estabelecer que «as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei». Gomes Canotilho, in Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Coimbra, Almedina, 4.ª Edição, 2000, pág. 651, afirma que esta exigência constitucional é justificada pela necessidade de exercer o controlo da administração da justiça, excluir o carácter voluntarístico e subjectivo do exercício da actividade jurisdicional, permitir o conhecimento da racionalidade e da coerência argumentativa dos juízes, permitir o melhor exercício do direito ao recurso ao dar às partes um recorte mais preciso e rigoroso dos vícios das decisões judiciais recorridas. Concordamos inteiramente com a posição expressa no Ac. RP de 28 de Janeiro de 2021, Proc. n.º 298/20.8YRPRT, Relator: Aristides Rodrigues de Almeida, que, por exaustiva, aqui reproduzimos: «É discutível se o dever de fundamentação deve ter a mesma densidade na sentença arbitral que na sentença de um tribunal estadual. Podemos ser levados a pensar que a densidade deve ser igual por maioria de razão, isto é, se é exigido de juízes togados que fundamentem a determinado nível as suas decisões apesar das habilitações e do treino que possuem para avaliar os meios de prova, por maioria isso deve ser exigido de que não possui essas habilitações e experiência não obstante esteja dotado de competência para proferir decisões que irão produzir os mesmos efeitos de uma sentença de um tribunal estadual e submeter as partes às mesmas consequências, sendo certo que as regras de escolha dos árbitros e de organização e funcionamento dos tribunais arbitrais transportam para o julgamento arbitral menor credibilidade, confiança e imparcialidade. Todavia, importa ter presente que os peritos não têm de ser licenciados em direito e em determinadas situações há mesmo o interesse legítimo que a sua habilitação académica e formação profissional esteja ligada a áreas de conhecimento não jurídicas, mas requeridas pela questão submetida a julgamento. Nesse contexto, cremos, não é curial impor-lhe exigências que demandam conhecimento jurídico e para as quais eles não estão manifestamente preparados. Em tais situações exigir aos árbitros que motivem a sua decisão sobre a matéria de facto como o faria ou deveria fazer um juiz togado seria abrir o caminho à inutilidade da arbitragem tantas seriam as possibilidades de obter a anulação da decisão arbitral. Por isso, cremos, a definição da amplitude do dever de fundamentação das decisões arbitrais não pode ser feita de modo absolutamente decalcado do dever sinónimo aplicável às sentenças dos tribunais estaduais; importa ter em conta as especificidades do processo arbitral e os seus objectivos de celeridade, simplicidade e informalidade. Onde essas ideias nos conduzem é algo que deve ser visto caso a caso, verificando se a fundamentação tem no caso o conteúdo mínimo exigível aferido em função da necessidade de apreensão do sentido, das razões e do percurso racional seguido pelo árbitro na interpretação dos meios de prova, mas também da complexidade dos factos em discussão e do volume de prova produzida. (…) A acção de anulação da sentença arbitral não pode converter-se num modo de contornar a impossibilidade de recurso da mesma, numa via alternativa para prosseguir o objecto próprio deste. A inadmissibilidade do recurso não deve levar a que os pressupostos da anulação da sentença arbitral se adaptem e se tornem mais exigentes para permitir um novo julgamento arbitral apenas porque a parte entende que à formação da convicção dos árbitros devia ter presidido a prova que produziu e não a prova que o árbitro decidiu acolher. Se só a absoluta falta de fundamentação determina a nulidade da sentença proferida por um tribunal estadual, por maioria de razão não pode justificar a anulação de uma sentença arbitral a apresentação de uma motivação que é perfeitamente suficiente para justificar a convicção probatória do árbitro e a que apenas falha a indicação dos motivos pelos quais outros meios de prova produzidos não influenciaram essa convicção.». Considera Paula Costa Silva, ob. cit. págs. 938-939 que se impõe aos árbitros que demonstrem que «a solução dada ao caso é legal e justa…, que é a emanação correcta da lei», podendo dizer-se que «uma sentença é provida de fundamentos sempre que seja possível compreender a motivação do árbitro. Assim, mesmo que a motivação seja deficiente, medíocre ou errada, estaremos perante uma sentença motivada, devendo as deficiências da sua fundamentação, que não geram nulidade, ser arguidas em via de recurso. Só a falta absoluta de motivação implicará uma nulidade da sentença arbitral, invocável através da acção de anulação. Sempre que a motivação seja deficiente e não havendo lugar a anulação, deve essa deficiência ser suprida através de recurso interposto contra a sentença arbitral.» Em suma: A maioria da doutrina e jurisprudência têm entendido que só a falta absoluta da fundamentação, por omissão dos factos ou total omissão do direito, ou a existência de erro lógico formal patente, que não permita descortinar o raciocínio seguido ou que inelutavelmente o inquine, acarreta a nulidade/anulação da sentença arbitral – cfr. entre outros, Acs. STJ de 17.5.2001; de 05.05.2005 Rel. Araújo de Barros, de 15.5.2007, Proc. n.º 07A924, Ac. da RL de 16.05.2019, p. 2470/18.1YRLSB.L1-8, da RP de 09.11.2000, da RL de 02.10.2006, Proc. n.º 1465/2006-2 publicados na CJ-STJ, IX, 2, 89 e da RC de 09.01.2018, Proc. n.º 191/17.1YRCBR, publicado na CJ, XXV, 5, 87. No caso dos autos, a critica efectuada a sentença da qual se pretende invocar a nulidade é a de que: “Quanto aos factos não provados a Sra. Árbitro apenas fez consideração geral tendo em conta o que entendeu ser o “objecto do litígio”, não permitindo a imediata e exigível compreensão dos factos não provados que se encontram em contradição ou estão prejudicados com e pelos factos provados, o que, salvo melhor opinião, é determinante para a compreensão e convencimento da A. da decisão final.” “45º A sentença notificada padece de fundamentação deficiente, sendo ininteligíveis as concretas razões de facto e de direito que levaram à condenação, não permitindo à A., invocado que foi o artigo 795.º do Código Civil, a percepção do raciocínio que conduziu à condenação no pagamento de quantia diária sem análise dos princípios e requisitos do enriquecimento sem causa.” Não cremos que a requerente tenha razão. Não há omissão de pronúncia, a sentença considera é que, inexistem factos não provados relevantes para a decisão. Assim, pode ler-se na sentença: «tendo em consideração o objecto do litígio, para além dos factos que se encontram em contradição com os julgados provados e dos prejudicados por estes excluindo-se aqueles que são meramente conclusivos, inexistem quaisquer factos alegados e não provados com pertinência para a boa decisão da causa» Por outro lado, no caso vertente, verifica-se que foram indicados os factos dados como provados e a respectiva fundamentação, ainda que sumária, com a indicação dos correspondentes meios de prova: documentais e testemunhais. Seguidamente operou-se a subsunção de tais factos ao direito tido por adequado. Entendemos que a fundamentação da sentença em causa é absolutamente suficiente para preencher o requisito da fundamentação da sentença arbitral. De resto, não devem confundir-se a fundamentação de facto e a motivação da decisão sobre a matéria de facto, sendo que a eventual deficiência desta última que só é sindicável através do recurso, nos casos em que ele seja admissível, não através da arguição da nulidade da sentença de que essa motivação faz parte. Improcede a arguição da nulidade da sentença arbitral por falta de fundamentação. 2ª Questão - Saber se se a sentença arbitral é nula por contradição. A requerente alega que, “a sentença no seu todo, face aos factos alegados nos escritos da A. e relatados na decisão, contém contradições que tornam a apreciação e conclusão omissa numa parte e ininteligível noutra (docs. 2 e 3)”. Vejamos: Quanto às contradições alegadamente existentes no “Sumário”, no “Relatório” e na parte das “questões a resolver” cabe referir que, não integram a parte substancial da sentença, não impedindo assim que, nessa parte substancial, se apreenda o sentido da mesma. Mas, mais do que isso, esta causa invocada para a nulidade - contradição entre os fundamentos e a decisão – não é admissível no âmbito da acção de anulação porque a Lei, ao contrário do CPC, não previu expressamente essa nulidade, já que, sendo o vício da contradição entre os fundamentos e a decisão diferente do da falta de fundamentação, é de concluir, analisando o artigo 27.º, alínea d), conjugado com o artigo 23.º da Lei n.º 31/86, que se trata de matéria que não pode incluir-se na causa de pedir da acção de anulação – neste sentido, Paula Costa, ob. Cit., p. 939, que refere o seguinte: «nos casos em que se verifica uma contradição entre os fundamentos e a decisão não nos parece caber acção de anulação. Se bem que nestas hipóteses se possa considerar que a fundamentação não preenche nenhuma das suas finalidades ou funções, certo é que a Lei n.º 31/86, ao contrário daquilo que estabelece o C.P.C., no seu artigo 668.º, n.º 1, alínea c), não previu expressamente esta causa de nulidade. Deste modo, e apesar de existir uma contradição lógica insanável na sentença, deve esta contradição ser ultrapassada através de recurso da decisão arbitral». Consideramos, assim, que não há que conhecer desta matéria. 3ª Questão - Saber se se a sentença arbitral é nula por omissão de pronúncia. Finalmente, invoca a requerente que o tribunal, não se pronunciou sobre questão que devia apreciar, nomeadamente sobre a questão do abuso do direito invocado pela aqui A., omitindo os próprios factos a ele relativos. Está em causa o fundamento previsto no artigo 27.º, n.º 1, alínea e), da LAV: o tribunal deixou de se pronunciar sobre questões que devia apreciar. Como também refere Paula Costa e Silva, in «Os meios de impugnação de decisões proferidas em arbitragem voluntária no direito interno português», ROA, ano 56.º, I, pg. 185, «à problemática da omissão de pronúncia da decisão arbitral aplicam-se as orientações doutrinárias e jurisprudenciais desenvolvidas acerca do artigo 668.º, n.º 1, alínea d), CPC, normativo que claramente inspirou o preceito em análise (actual artigo 615.º)». A nulidade por omissão de pronúncia prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º CPC, ocorre quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questão que devesse conhecer. Por «questões» entende-se «os pedidos deduzidos, toda as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cumpre [ao juiz] conhecer (artigo 660.º-2)» (Lebre de Freitas, Montalvão Machado, e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, vol. II, pág. 670). Como sabemos esta nulidade só ocorrerá, então, quando não haja pronúncia sobre pontos fáctico-jurídicos estruturantes da posição dos pleiteantes, nomeadamente os que se prendem com a causa de pedir, o pedido e as excepções, e não quando tão só ocorre mera ausência de discussão das “razões” ou dos “argumentos” invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas, deixando o juiz de os apreciar, conhecendo contudo da questão. Há, assim, que distinguir entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos pelas partes (para sustentar a solução que defendem a propósito de cada questão a resolver): “São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, página 143). As “questões” a apreciar reportam-se aos assuntos juridicamente relevantes, pontos essenciais, de facto ou direito, em que as partes fundamentam as suas pretensões (Acórdão do STJ de 16.04.2013 proferido no proc. n.º 2449/08.1TBFAF.G1.S1 e disponível em www.dgsi.pt) e não se confundem com considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes (a estes não tem o tribunal que dar resposta especificada ou individualizada, mas apenas aos que directamente contendam com a substanciação da causa de pedir e do pedido). Ora, assim sendo, concluímos em primeiro lugar que, a alegada omissão de factos não integra esta eventual situação de “omissão de pronúncia”, por estar em causa a matéria de facto e as vicissitudes inerentes à matéria de facto. Ou seja, a omissão da apreciação de algum aspecto susceptível de influenciar o acervo dos factos provados, não integra nulidade da sentença por omissão de pronúncia. Da mesma forma, inexiste omissão de pronúncia quanto à questão de abuso de direito. Da consulta da contestação, consta que a Ré invocou na sua contestação o abuso de direito, alegando em síntese que, o comportamento da A. traduziu uma tentativa de aproveitamento das circunstâncias excepcionais decorrentes da pandemia, pois mesmo que os campos de golfe estivessem abertos no período da pandemia o A. não poderia utilizá-los, pois, vigorava no mesmo período o dever de recolhimento domiciliário e que, apesar desse período de encerramento, o A. utilizou os campos 135 vezes em 2020 (sendo que em 2019 – sem restrições legais – jogara só 127 vezes). Ora, da decisão consta a análise dessa questão. Foi entendido que o A. tinha o direito à restituição do valor das mensalidades correspondentes ao período de encerramento dos campos de golfe, por imposição da pandemia, em que o A. esteve privado de usufruir da actividade, mas não das mensalidades do período de encerramento para manutenção, por continuar a poder frequentar os campos que ficam abertos, pois não encerram em simultâneo. Assim sendo, houve pronúncia, embora não tenha sido feita referência a estas razões concretas, decorre da decisão que a questão do abuso de direito está implicitamente afastada, por ficar prejudicada pela argumentação quanto à existência do direito do R. decidido na sentença. É que, na sentença arbitral considera-se que por a Ré ter deixado de poder cumprir a sua prestação, não podia cobrar o serviço sob pena de enriquecimento sem causa, donde decorre necessariamente o afastamento da existência de abuso de direito (aliás considera-se até que se assim não fosse haveria enriquecimento sem causa), ou seja, da decisão resulta, de forma implícita, que esse conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio. Nestas condições, conclui-se que a decisão arbitral não enferma de nulidade por omissão de pronúncia. Improcede assim a acção. Sumário: (…) 4 – Dispositivo. Pelo exposto, acordam os juízes da secção cível deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a acção e absolver a Ré do pedido de anulação da sentença arbitral. Custas pela A. Évora, 30.06.2022 Elisabete Valente Cristina Dá Mesquita José António Moita |