Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
| ||
Relator: | ALBERTO JOÃO BORGES | ||
Descritores: | INJÚRIA MOTIVAÇÃO DISPENSA DE PENA | ||
Data do Acordão: | 11/18/2014 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
Sumário: | I - Uma coisa é a razão ou motivo pelo qual o arguido pratica os factos e outra, diversa, é o fim visado com a sua atuação – consciente e voluntária – sabendo que a mesma é proibida por lei e, por isso, censurável. II - E no contexto em que o arguido atuou – de que a sentença recorrida nos dá conta – não pode deixar de se concluir que o arguido quis, efetivamente, fazendo apelo às regras da experiência comum, da lógica e aos critérios da normalidade da vida, denegrir a imagem e o bom nome da ofendida, conclusão que resulta como consequência lógica e necessária do modo como se lhe dirige, sendo que se trata de uma pessoa lúcida (com responsabilidades ao nível da prevenção e combate à criminalidade), com capacidade para avaliar a ilicitude dos seus atos e se determinar de acordo com essa avaliação. III – A utilização pelo arguido da expressão “idiota”, porque incorpora um juízo sobre a sanidade mental da assistente, que repete por diversas vezes, reforçando a intensidade do dolo, não pode deixar de se entender como ofensiva da honra e consideração devidas à assistente, na medida em que transmite um juízo negativo sobre a pessoa visada e sobre a sua reputação, como mãe, como pessoa e, até, como profissional. IV - Não se pode considerar diminuta a ilicitude do facto, atenta a gravidade do mesmo – que se revela pela repetição das afirmações injuriosas ao longo do tempo – assim como a culpa, pois que o arguido agiu de modo voluntário e consciente, querendo praticar os factos – com dolo direto – bem conhecedor da sua ilicitude e das consequências dos mesmos para a ofendida; | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a 1.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: 1.No Tribunal Judicial da Comarca do Entroncamento correu termos o Proc. Comum Singular n.º 32/12.6GEABT, no qual foi julgado o arguido A. - filho de …., natural do Crato, nascido em 06/02/1968, solteiro, agente da PSP, residente na …, Entroncamento – pela prática de um crime de injúria, na forma continuada, p. e p. pelos art.ºs 181 n.º 1 e 30, ambos do CP (acusação da assistente, acompanhada pelo Ministério Público a fls. 143), tendo, a final, sido decidido: - Absolver o arguido da prática de um crime de injúria, na forma continuada, p. e p. pelos art.ºs 181 n.º 1 e 30 do CP; - Condenar o arguido, pela prática de um crime de injúria, p. e p. pelo art.º 181 n.º 1 do CP, na pena de 50 (cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 10,00 (dez euros), o que perfaz o montante global de € 500,00 (quinhentos euros); - Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pela assistente e, em consequência, condenar o arguido no pagamento à demandante de uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 500,00 (quinhentos euros), absolvendo-a no demais peticionado, quantia acrescida de juros à taxa legal vencidos e vincendos vigente desde a data de notificação do pedido de indemnização civil, absolvendo-a do demais peticionado (a demandante havia pedido a condenação do arguido no pagamento da quantia de € 2.000,00, acrescidos de juros legais a contar da notificação do pedido, por danos não patrimoniais decorrentes dos factos constantes da acusação particular, sendo que relativamente à parte cível não foi o recurso admitido). 2. Recorreu o arguido daquela decisão, concluindo a motivação do recurso com as seguintes conclusões: 1.ª - O presente recurso vem interposto da parte da douta sentença que condenou o arguido pela prática de um crime de injúria, p. e p. pelo artigo 181 n.º 1 do Código Penal, na pena de 50 dias de multa e no pedido de indemnização cível deduzido pela assistente, no valor de 500 euros. 2.ª - A douta sentença em recurso está enfermada de nulidade insanável, por violação dos artigos 410 n.ºs 2 al.ªs b) e c) e 3 do CPP, 186 n.º 2 e 74 do CP e ainda 483 do CC. 3.ª - A sentença de que se recorre não valorou declarações prestadas em sede de audiência de discussão e julgamento, de molde a aplicar devidamente o direito aos factos. 4.ª - Da matéria de facto dada como provada foram incorretamente apreciados os factos 1.10 e 1.15 a 1.20 da matéria de facto dada como provada na sentença. 5.ª – Ora, as mensagens que fundamentaram a condenação de que se recorre são as constantes do ponto 1.6 A), B), D) e P), transcritas supra, que se dão por integralmente reproduzidas. 6.ª - O arguido é, assim, condenado por ter apelidado a assistente de idiota, incompetente e idiota frustrada. 8.ª - Era importantíssimo ter circunstanciado devidamente e daí ter concluído de direito, enquadrando tais expressões, pois tais expressões não surgem do nada, mas num quadro de agastamento do arguido, num quadro de conflito pelo cumprimento das responsabilidades parentais estatuído ao longo de 4 anos. 9.ª - Havendo uma atitude repreensível da assistente, quando se furtou ao cumprimento das visitas do pai ao menor, impedindo-o de poder ver e estar com o filho, prolongando tal facto no tempo. 10.ª - Tal troca de mensagens só terminou quando foi alterado o regime, o que a assistente confirma em depoimento (transcrito supra, no corpo desta motivação, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais), confirmando ainda que tais mensagens do arguido eram mensagens de respostas às suas mensagens. 11.ª – Ora, o tribunal não sopesou devidamente as declarações da assistente MF (depoimento prestado em 28.11.2013 das 10:08:40 às 11:16:12, nomeadamente, e entre o mais supra transcrito, quando a mesma refere “Sra. Dra. Juiz – Essas mensagens eram de resposta àquelas mensagens que a senhora enviava? É que há bocadinho a senhora disse que enviava mensagem para esse número. Assistente – Sim. Eram resposta”. 12.ª - Deviam ainda tais declarações ser confrontadas com as declarações que o arguido prestou, em depoimento prestado em 28.112013 das 11:16:14 às 12:16:45 (supra transcrito), nomeadamente, e entre o mais: “Sim, agora já está resolvido. Não porque haja consenso. Apenas porque eu decidi, apenas porque eu decidi durante muito tempo a criança não tinha conhecimento porque era um bebé. E eu sempre entendi e fui até ao fim. Aliás, se entendem que uma cruzada é ofensa, eu continuo a dizer, foi uma cruzada que eu levei até ao fim. Porque eu entendi que o meu filho, a criança não tem culpa… das brigas dos adultos… e ele devia de saber de quem era o pai e tinha de ter conhecimento de quem é o pai. Hoje o meu filho sabe quem é o pai. Já me conhece, sabe quem eu sou”; e ainda aquando das últimas declarações do arguido, prestadas em audiência final (depoimento prestado em 09.01.2014, das 15:08:01 às 16:25:31, supra transcrito). 13.ª - Face às declarações, transcritas no corpo deste recurso, denota-se um agastamento do arguido na situação que a assistente, mãe do seu filho, criou, privando-o de ver o filho, fugindo com ele, omitindo onde ele, sendo que as suas declarações transparecem mágoa, tristeza, revolta com a situação. Ao invés, basta ouvir as declarações prestadas pela assistente e nota-se a frieza, o jeito de graça com que presta declarações, a indiferença com que fala das supostas injúrias de que foi alvo, não próprias de uma pessoa que se mostra ofendida. 14.ª - A assistente esclarece em sede de depoimento supra transcrito, sem hesitações, que as mensagens são de resposta! Não são provocações gratuitas… A assistente é o elemento perturbador. 15.ª - E se lermos todas as mensagens constantes do ponto 1.6 da sentença, que se dão por integralmente reproduzidas, percebe-se que foram enviadas no contexto da regulação das responsabilidades parentais, sendo que o tribunal deveria ter sopesado a verdade das declarações do arguido, face às declarações da assistente, pelo facto de as mesmas suportarem as mensagens (prova documental junta aos autos), sem que a assistente tivesse dado qualquer explicação contrária à versão do arguido, apenas referindo que se sentiu ofendida. 16.ª - E neste sentido impunha-se dar como provado que havia uma conduta repreensível da assistente, no sentido de privar o assistente de ver o filho, para a qual o arguido deu explicações, ao contrário da assistente. 17.ª - Estas expressões não são passíveis de ser enquadradas como crime (ação ilícita típica culposa), pois, para que haja ilicitude de actuação do arguido, tem que haver factos ofensivos da honra e consideração. Chamar idiota, idiota frustrado, incompetente, pode ser considerado um ato de ataque, lesivo da dignidade, a seriedade, retidão, honestidade e probidade? Parece-nos no nosso entender que não. Hoje em dia muitas das vezes quando se chama alguém de idiota refere-se: “tem muitas ideias”; idiota poderá ser pateta, tonto, pessoa que tem muitas ideias… 18.ª - Circunstanciando os epítetos, trata-se de duas pessoas que viveram em relação análoga à dos cônjuges, com um filho em comum, ela militar da GNR e ele polícia. E se há coisa que resulta do senso comum é que neste tipo de forças militares o linguajar não é propriamente de conto de fadas. O uso de palavrões e de epítetos menos corretos é frequente, pelo que, nestes termos, era de impor a absolvição do arguido, tendo sido violado o artigo 181 do CP. 19.ª - Sem prescindir, como supra se referiu, devia ter sido dado como provado que tais mensagens foram enviadas num quadro de provocação ou socialmente reprovável e, assim sendo, a factualidade teria de se reconduzir a dispensa de pena, nos termos e para os efeitos do artigo 186 n.º 2 do CP, a saber… 20.ª - Ora, ficou demonstrado que o arguido se dirigiu à assistente num estado de ira ou descontrolo emocional gerado pelo comportamento da assistente. As expressões aqui em causa, pelo contexto, todas denotam que são de resposta. E neste sentido atente-se à fundamentação, a páginas 11 e 12 da sentença, em que se reconhece que se não houvesse um pano de verdade a saber: “Não obstante, sempre se diga que, tendo-se revelado o arguido como uma pessoa de normal discernimento, pouco normal se nos afigura que procedesse a tal envio de mensagens, se nenhum óbice fosse colocado ao contacto com o menor” – página 12 sentença; sendo que o tribunal esclarece ainda que as mensagens “foram praticadas no seio de um conflito mútuo entre arguido e assistente e no desenrolar de tal conflito” – página 30 da sentença - referindo ainda que “cabe também considerar a existência de um conflito sério entre a assistente e o arguido, numa área da vida particularmente sensível e que explica a conduta em causa”. 21.ª - Ainda que entendêssemos que não estamos perante um caso de dispensa de pena, nos termos e para os efeitos do artigo 186 n.º 2 do CP, ocorrem os requisitos gerais para a dispensa da pena, os quais estão enunciados nas três alíneas do artigo 74 n.º 1 do Código Penal. No caso dos autos a ilicitude e a culpa do arguido não são elevadas e no que toca ao dano não temos qualquer dúvida em concluir que não só foi a conduta da assistente que despoletou toda esta contenda; nesta conformidade, a culpa da assistente tem sempre um caráter mais gravoso do que a demonstrada pelo arguido, justificando-se plenamente que os eventuais danos não patrimoniais sofridos pela primeira não mereçam qualquer tipo de tutela cível, devendo, por isso, ser excluída a obrigação do segundo em indemnizar a demandante/assistente. Não havendo qualquer obrigação do arguido em indemnizar a assistente, também não existe, por parte do mesmo, nenhuma reparação a fazer a esta última, justificando-se que aquele seja dispensado da pena a que foi condenado. Pelo que, não havendo direito a reparação, está verificado em absoluto a alínea b). Por último, no que toca às necessidades de prevenção o próprio tribunal é peremptório ao afirmar que elas são residuais. Termos em que ainda que não se entendesse de aplicar a dispensa de pena prevista no n.º 2 do artigo 186 do CP, estariam reunidos todos os pressupostos para a aplicação da dispensa de pena, nos termos do artigo 74 do CP. 22.ª – Contudo, o tribunal recorrido não colocou sequer a hipótese da dispensa da pena, essencialmente, o que devia ter feito, tendo em consideração a mínima intervenção penal. Trata-se de um poder dever, não arbitrário ou discricionário, mas sempre vinculado ao dever de mínima intervenção penal, tendo violado, desta forma, os artigos 186 n.º 2 e 74 do Código Penal. 23.ª - Quanto ao dever de indemnizar, reitera-se tudo quanto se referiu na alínea Q) destas conclusões. 24.ª - Ao arbitrar um quantum indemnizatório o tribunal violou o artigo 483 do Código Civil. 25.ª - Porque assim não se decidiu, foi violado na douta sentença recorrida o disposto nos artigos 410 n.º 2 al.ªs b) e c) e 3 do CPP e 181, 186 e 74 do C P. 26.ª - O tribunal deveria ter dado como provados outros factos que determinariam a análise da prova de outra forma, o que não fez, havendo erro notório na apreciação da prova trazida a juízo – 410 n.º 2 al.ª b) e c) do CPP. 27.ª - Não se verificando os requisitos objetivos e subjetivos para a sua condenação, o tribunal recorrido violou o disposto no artigo 181 do CP, sendo que, sem prescindir, não absolvendo o arguido, estavam reunidos todos os pressupostos para a dispensa de pena (neste sentido, foram violados os artigos 186 n.º 2 e 74 do CP. 28.ª - Sempre com o devido respeito por mais douta opinião, deve a douta decisão recorrida ser revogada e, em consequência, ser a acusação julgada improcedente e o arguido absolvido do crime que lhe vinha assacado; se assim não se entender, sem prescindir de tudo quanto foi dito, deve, pelo menos, ser dispensado de pena. 29.ª - Face à improcedência da acusação, deve ainda o pedido de indemnização cível ser julgado improcedente, por não provado, decidindo-se de acordo com o alegado, suprindo, doutamente, o que há a suprir. 3. Responderam o Ministério Público e a assistente – MF - concluindo a sua resposta nos seguintes termos: 3.1. O Ministério Público 1 - Foi devidamente sopesado pelo tribunal a quo o clima de conflito entre o arguido e a assistente, no que concerne ao regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais do filho (menor) comum. 2 - Entendeu o tribunal a quo ser licita a crítica entre progenitores, no que concerne ao cumprimento do regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais, contudo, as expressões proferidas pelo arguido, e pelas quais foi o mesmo condenado, extravasam manifestamente o direito de crítica, ainda que contextualizado no seio de desentendimentos entre aquele e a assistente, por questões relacionadas com o cumprimento de tal regime. 3 - Resulta da prova produzida em audiência de julgamento a existência de tais conflitos, imputando cada um dos progenitores (o aqui arguido e a assistente) a origem de tais conflitos ao outro. 4 - Da prova produzida resulta ainda que tais mensagens enviadas o foram em contexto de diálogo, não resultando, contudo, provada qualquer conduta da assistente que de alguma forma justifique a prática de tais atos. 5 - As expressões que o arguido dirigiu à assistente, e pelas quais foi condenado, extravasam o direito de crítica, de demonstração de desagrado ou a mera utilização de expressões menos polidas. 6 - A palavra “idiota” assume contornos lesivos da honra e dignidade de uma pessoa, facto que é socialmente pacífico, porquanto, com tal expressão se quer significar que uma pessoa é burra, parva, imbecil ou ignorante. 7 - No contexto em que tais expressões foram proferidas outra não foi a intenção do arguido se não a de ofender a honra da assistente, como veio a suceder. 8 - Tal contexto não é o mesmo em que tal linguagem possa eventualmente ser utilizada pelas forças de segurança ou durante o período de vivência em comum. 9 - Não se mostram verificados os pressupostos do instituto da dispensa de pena, previsto no art.º 186 n.º 2 do CP, porquanto, não resultou provado que a conduta do arguido se tenha ficado a dever a qualquer conduta ilícita e repreensível da assistente. 10 - Por outro lado, não resultou provado o pressuposto enunciado no art.º 74 n.º 1 al.ª b) do CP, aplicável por força do disposto no n.º 3 do mesmo normativo legal, já que o dano (nomeadamente, danos não patrimoniais) não foram reparados. 11 - Não resultando provada a verificação dos pressupostos para a dispensa de pena, não tinha o tribunal a quo que se pronunciar quanto à mesma. 12 - A sentença sob recurso não padece de qualquer vício ou nulidade, por violação dos art.ºs 410 n.ºs 2 al.ª b) e c) e 3 do Código de Processo Penal. 13 - A sentença sob recurso não merece qualquer reparo e deve ser mantida na íntegra. 3.2. A assistente MF: 1 – Tendo presente a prova produzida sem sede de audiência de discussão e julgamento, conclui-se que o tribunal a quo fez uma correta aplicação da lei, não devendo merecer censura o sentido condenatório da douta sentença. 2 - A pedra basilar da análise a efetuar por parte deste tribunal de recurso centra-se no princípio da livre apreciação da prova, concedida ao julgador através do art.º 127 do CPP, que n o caso foi de observância escalpelizada das regras da prova vinculada e das legis artis. 3 – A matéria de facto dada como provada não deve sofrer qualquer alteração, sendo de per si suficiente, idónea e inequívoca, de forma a sustentar o sentido da douta decisão, que está correto, decisão essa que não padece de nenhum dos vícios apontados pelo recorrente. 4 – A pena plicada revela adequada ponderação dos critérios rigorosos do tipo objetivo e subjectivo, de forma a poder concluir-se com segurança que houve efetiva prática, pelo arguido, do crime pelo qual foi condenado. 5 – A gravidade dos atos praticados pelo arguido é manifesta, sendo certo que o mesmo tem discernimento suficiente e idóneo para retirar o exato sentido ofensivo das mensagens que escreveu, dirigidas à assistente, que as leu e se sentiu humilhada e ultrajada com o seu teor. 6 – Não se mostra verificado qualquer pressuposto para a aplicação da dispensa de pena ao arguido e a douta sentença não violou quaisquer normativos legais, pelo que deve ser mantida na íntegra, julgando-se improcedente o recurso. 4. O Ministério Público junto deste tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso (fol.ªs 441 a 445). 5. Cumprido o disposto no art.º 417 n.º 2 do CPP e colhidos os vistos legais, cumpre decidir, em conferência (art.º 419 n.º 3 al.ª c) do CPP). 6. Matéria de facto considerada como provada na sentença recorrida: 1.O arguido A. é possuidor de um telemóvel com o número 911…., com data de ativação de 02/01/2008. 2. A assistente MF é possuidora de um telemóvel com o número 919----- e um outro com o número 910. 3. O arguido e a assistente são pais de AB, nascido em 23 de setembro de 2009, cujo exercício das responsabilidades parentais se encontra regulado mediante processo judicial que correu termos no Tribunal Judicial do Entroncamento. 4. O arguido e a assistente viveram como marido e mulher entre 2007 e data não concretamente apurada de 2010, altura em que a assistente saiu da casa em que residiam, sita na Rua …, no Entroncamento. 5. Devido ao difícil relacionamento entre arguido e assistente a propósito da gestão das entregas e assuntos atinentes ao quotidiano da vida do filho de ambos, aqueles têm comunicado essencialmente por mensagens de telemóvel. 6. Desde setembro de 2011, e no contexto referido em 5, o arguido vem dirigindo à assistente mensagens escritas - do telefone com o número 911--- para os dois números da assistente 919…. e 910…. - as seguintes mensagens: a) em 12 de setembro de 2011, às 11h01m46s: “Oh idiota tu não precisas marcar, os dias sou eu quem marca pois tu é que ficas sempre que eu não possa. Mas claro isso já é pedir demasiado esforço para o teu cérebro”; b) em 18 de outubro de 2011, às 13h33m28s: “Eu nem sei como entraste na gnr pois es tão idiota e incompetente. Tu não fazes idéia dos erros processuais que cometes o que é óptimo LOL”; c) em 26 de outubro de 2011, às 13h49m42s: “Vai para o caralho”; d) em 26 de outubro de 2011, às 14h37m22s: “Nem sei se és mesmo idiota se fumas alguma droga ou se não tens mesmo nada para fazer. Quando estiveres a porta da casa da minha mãe faz como eu faço à porta da tua ou liga ou manda mensagem”; e) em 25 de novembro de 2011, às 10h53m36s: “Pois vindo de ti isto é um elogio pois tu já deu para entender que dizes tudo ao contrário mas isso tem um nome e regula-se com comprimidos. Por isso toma-os”; f) em 13 de dezembro de 2011, às 15h39m21s: “No resultado final se verá, agora tu sim como não tens utilidade nenhuma nem ninguém nem nada pare te ocupar. Brincas com a situação deste menino. Mas ele é meu filho como igualmente é teu e eu a minha parte não abdico e é isso que irá em frente, quanto às tuas opiniões eu nem ligo nem quero saber pois vindo de ti e tendo em conta o estado que apresentas vale mesmo o que vale. No que toca ao teu jogo de palavras para despistar tudo o que tens feito, tudo será visto e ponderado por quem de direito. Eu não quero mais qualquer conversa contigo nem me vou aborrecer com as tuas manobras para eu não ver o menino. O futuro dirá o que acontecer e eu tudo o que for do interesse do A. será aquilo que eu respeitarei e o que não for será por mim contestado e fundamentado pelo interesse do menino, mas só isso. De resto nada mais me interessa, e de ti distância e conversa o menos possível, excepto o que toca a coisas do interesse do A.”; g) em 31 de dezembro de 2011, às17h04m11s: “Eu não fui buscar o a porque à 2 anos e meio te ando aturar manobras de estupidez sem olhar a meios nem consequências para o menino que tem sido o mais prejudicado, e porque a minha situação de hoje é incerta e conhecendo-te bem não arrisquei a sujeitar-me a mim e ao menino a mais alguma situação originada por ti. Por isso é tua a culpa sim de eu não estar com ele mas por mim já não me importo e por ele ainda não entende, por isso mais uma vez prefiro ficar de fora a colocar o meu filho em mais uma situação ou vergonha habitualmente criada por ti. Como tal fica com ele que eu depois resolverei, e não preciso mentir, pois a verdade é a minha razão. Desejo-te um 2012 como realmente mereces são os meus votos para ti”; h) em 3 de janeiro de 2012, às 17h13m21s: “Pois se quiseres às 8 h00 passas na minha porta eu entrego-te, o menino vestido e comido pronto a ir. Se não quiseres paciência o tempo dos criados acabou”; i) em 3 de janeiro de 2012, às 17h44m11s: “Como sei que tens dificuldades em entender à primeira eu repito. Se quiseres amanhã de manhã dizes a hora e passas cá a apanha o teu filho para levares para tua cresce, à hora marcada ele estará pronto e te será entregue!”; j) em 5 de Janeiro de 2012, às 15h02m15s: “Sim, e tribunais vai acabar também pois eu cansei-me, e vai terminar tudo por aqui, pois eu desisto, queres ficar com ele fica, que é o que te resta. Mas só até às audiências marcadas pois dele não desisto, e lá apresentarei tudo o que tenho e pretendo, que aliás não é nada mais nada menos que poder estar e ver o meu filho em paz, sem estar sempre sem saber o que vais preparar a seguir fazendo-o sofrer somente a ele pois a mim não me atinges, mas se tiver que esperar que ele cresça para o poder ter, eu espero e depois falarei com ele e lhe mostrarei que tem pai, que gosta muito dele, que por mim teria tido sempre uma vida tranquila com pai e mãe que é o que tem direito, e pai esse que só não o acompanhou porque a mãe o usou como objecto de birra e o receberá sempre que ele queira, mas nessa altura já não vou precisar de ti nem da tua colaboração, e entretanto até lá livro-me de ti mesmo, que é o que pretendo pois estou farto de ti”; l) em 6 de fevereiro de 2012, às 10h50m35s: “Vai para o caralho! Não queres problema teu”; m) em 6 de fevereiro de 2012, às 11h16m54s: “Vai levar no cu. Se o quiseres vou leva-lo depois de jantar. E acabou a conversa”; n) em 27 de Fevereiro de 2012, às 20 h 13 m 43 s – “Mais uma vez depois vais informar qual é a doença infectocontangiosa que impede o menino de estar com o pai. No entanto eu até já imagino que seja febre ou gripe, também como ele é tratado não é para menos. E sábado estou de serviço no entanto vou tentar mudar o serviço e depois informo”; o) em 4 de março de 2012, às 12h45m44s: “Isso perguntas depois à ama que ficou com ele, depois de o teres abandonado para me prejudicares e me pores em dificuldades, mas ainda não conseguiste, pois eu felizmente tenho inteligência suficiente para resolver tudo e ainda me rir de ti, eu só vou busca-lo agora, e ainda não sei como passou a noite. Xau. E amanhã podes vir busca-lo há hora que quiseres para o levar para a cresce, marcas a hora e eu Digo-te onde o podes apanhar”; p) em 5 de março de 2012, às 11h54m51s: “Tu hoje de manhã foste buscar o menino? Claro que não! És uma pobre idiota que vive a vida a sonhar que me chateias, mas não consegues, muito pelo contrário és o maior filme cómico que tenho assistido, e este fim de semana fizes-te com que arranjasse outra solução, ou seja agora sempre que eu não possa ir levar o menino e tu não o venhas buscar, ele já tem onde ficar e gosta muito da ama, o que é óptimo, por isso deixa-me em paz e fica para aí a apodrecer até inventares outra parvoíce, que é a única coisa que te resta mesmo, idiota frustrada”; q) em 5 de março de 2012, às 13h00m26s: “A minha mãe telefonou agora, se voltas a ir a casa da minha mãe o assunto passa a ser comigo mesmo e vou saber quem veio aqui fardado e vou participar de ambas”; r) em 5 de março de 2012, às 13 h 01 m 41 s – “O teu filho está na ama por abandono da mãe”; s) em 5 de março de 2012, às 14h14m38s: “Agora não estou aí não posso ir busca-lo como tal nada mais digo pois fazes escândalos em todo o lado e eu estou cansado de passar vergonhas por tua causa. Além disso o menino a esta hora deve estar a dormir e vê se não incomodas, para mim o menino está em primeiro e não ao sabor de irresponsabilidades como é o teu caso”; t) em 5 de março de 2012, às 16h24m45s: “vai tomar os comprimidos”; u) em 5 de março de 2012, às 16h46m06s – “Vá toma lá mais um ou dois comprimidos e quando isso tiver a fazer efeito e estejas com os níveis mais normais voltamos a falar, até lá eu vou cuidando do menino”; v) em 14 de maio de 2012, às 10h00m43s: “Relativamente às férias ainda não marquei pois como é teu hábito sempre inventas algo o que me impediu os dois anos de ter férias com o menino. Além disso eu também ainda não sei qual o teu período de férias com o afonso. Se já sabes o teu período diz-me para eu depois marcar o meu período sem que coincida Com as tuas”; 7. A assistente é militar da GNR e exerce funções no Posto Territorial de ---, do Destacamento Territorial de Abrantes, Comando Territorial de Santarém, da Guarda Nacional Republicana. 8. Aquando do envio - de número não concretamente apurado - das mensagens indicadas em 6, a assistente encontrava-se ao serviço no seu posto de trabalho. 9. Na sequência de tais frases e expressões supra descritas, a assistente sentiu-se ultrajada e humilhada, pois que jamais se lhe haviam assim dirigido, sentindo-se ofendida na sua honra e consideração. 10. O arguido quis dirigir-se à assistente nos termos indicados em 6, utilizando as expressões aí referidas e agiu, ao remeter as mensagens indicadas em 6 a), b), d) e p), com intenção de ofender a honra e consideração da assistente, o que conseguiu. 11. O arguido é pessoa lúcida, é agente da PSP e conhece o teor das mensagens proferidas. 12. O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, bem conhecendo o teor e significado de tais expressões. 13. O arguido é Chefe da PSP, auferindo cerca de € 1.300,00 mensais. 14. Reside em casa própria com uma companheira, a qual não aufere quaisquer rendimentos, e com uma filha desta, de 7 anos de idade. 15. O agregado familiar do arguido despende o valor de €650,00/€700,00 com o pagamento da prestação para aquisição de habitação. 16. O arguido tem um filho comum com a assistente, que se encontra a residir com esta, e suporta uma prestação de alimentos fixada a favor do menor, no valor de € 124,84 mensais. 17. O arguido não tem antecedentes criminais. --- 18. No período referido em 3, o arguido coabitou com a assistente como se de marido e mulher se tratassem, conhecia e conhece bem a assistente, sabendo que a mesma não padece de qualquer problema de foro mental, psiquiátrico ou psicológico que ponham em causa o entendimento e o desempenho das suas funções, quer ao nível profissional, quer como mãe. 19. Com a conduta descrita em 6 o arguido transtornou a assistente. 20. A assistente é pessoa bem considerada por familiares e amigos, bem como no meio profissional. 21. O facto de ter tido conhecimento das mensagens descritas em 6 provocou-lhe vergonha, humilhação, transtorno, inquietação e consternação. 22. Quando recebia as mensagens descritas em 6, no seu local de trabalho, a assistente ficava transtornada. 23. Alguns dos colegas de trabalho da assistente, por constatarem o transtorno da assistente, tomaram conhecimento do teor de algumas das mensagens. 7. E não se provou, concretamente: 1.Que a assistente saiu de casa de forma abrupta e com a roupa que tinha no corpo, motivada pelas agressões e maus tratos de que foi vítima por parte do arguido, o que deu origem ao processo n.º ---/10.8PAENT; 2. Que o referido em 5 é imputável ao arguido; 3. Que, na sequência das mensagens referidas em 6, a assistente sentiu-se violenta e intensamente ultrajada e humilhada; 4. Que cada vez que a assistente solicita ao arguido que cumpra o estipulado no âmbito do processo judicial de regulação das responsabilidades parentais - em 50% das despesas de saúde do filho de ambos - o mesmo dirige-se à assistente, de forma reiterada, com a seguinte expressão: “se queres dinheiro vai para a recta da Atalaia”, local conhecido pela prática da prostituição; 5. Que o arguido sabia que a assistente não detém conduta semelhante à que descreveu nas mensagens; 6. Que o arguido abalou profundamente a assistente e tirou-lhe o sono; 7. Que a assistente é pessoa séria, honesta e trabalhadora; 8. Que, em consequência das mensagens referidas em 6, a assistente viu perturbada a serenidade com que tem de exercer as funções como militar da GNR; 9. Que a assistente foi assolada de vergonha e humilhação e tornou-se nervosa e ansiosa. 8. O tribunal formou a sua convicção – escreve-se na fundamentação – “no conjunto da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, em articulação com a demais prova produzida nos autos, em conformidade com o preceituado no art.º 127 do CPP, nos termos que de seguida se explicitarão. Ora, desde logo, as declarações do arguido e assistente são consonantes no que concerne à emissão das mensagens e ao contexto em que as mesmas ocorriam. O arguido admite o envio das mensagens que constam da acusação, confirmando o seu número de telefone. Numa sessão de julgamento veio prestar um esclarecimento quanto à origem das mensagens em causa, referindo-se concretamente a uma mensagem que aludia à recta da Atalaia – mensagem que nem consta da acusação - colocando a hipótese de ter sido enviada por uma pessoa com quem mantinha uma relação à data, sem que com isso coloque em causa o envio das demais mensagens. Caracteriza o contexto em que tais mensagens foram enviadas, no seio de uma relação conflituosa mantida entre o próprio e a assistente no que concerne ao regime de visitas fixado no âmbito da regulação do exercício das responsabilidades parentais relativas ao filho menor de ambos. Caracterizando as dificuldades de acesso ao filho menor, e imputando tais dificuldades à conduta da assistente, indica que tais mensagens eram resposta a mensagens para si remetidas pela assistente no âmbito desses contactos, referindo que as remetia sob o estado de alguma irritação à assistente. Nega, porém, que tivesse qualquer intenção de ofender a assistente, sendo que o tipo de linguagem utilizado naquelas mensagens correspondia até à linguagem que ambos utilizavam entre si no contexto da vivência comum, sendo até linguagem corrente no meio profissional do arguido e da assistente (ele membro da Polícia de Segurança Pública; ela membro da Guarda Nacional Republicana). A assistente caracteriza também aquela relação de ambos como conflituosa, imputando, porém, a origem de tais conflitos ao arguido. Refere que as mensagens eram emitidas a partir de número que conhecia ao arguido enquanto viveram em comum. Admite também ter enviado mensagens ao arguido naquele contexto do exercício das responsabilidades parentais – já que a única forma por que contactavam era através de mensagens de telemóvel, negando que o tratamento de ambos, em momento anterior à separação fosse similar ao que transparece de tais mensagens. Confrontada com o auto de transcrição de fls. 65 e ss., confirma o teor das mensagens, como sendo as que por si foram recebidas, após ter indicado algumas das mensagens que lhe foram dirigidas. Desde logo, quanto à origem das mensagens, data e hora de envio e teor das mesmas, sustentou-se o tribunal no teor do auto de transcrição de fls. 65 e ss., de consta o teor das mensagens, origem, data e hora de envio, em conjugação com a informação prestada pela Vodafone e que consta de fls. 107, e de que consta que o arguido é o titular do cartão com o número que naquele auto de transcrição figura como emissor das mensagens supra descritas. Em todo o caso, o arguido admite o seu envio, sendo certo que do próprio teor das mensagens em causa – com múltiplas referências a um menor, sendo que de algumas consta mesmo o nome de «afonso» (filho de ambos) – é possível extrair que está em causa questão comum a arguido e assistente. Do próprio teor das mensagens se depreende também que as mesmas não são episódios isolados, mas emitidas no contexto do “diálogo” de arguido e assistente mantido relativamente ao exercício das responsabilidades parentais referentes a um menor. O próprio teor de tais mensagens permite também extrair que tal «diálogo» não é pacífico. Não só pelas expressões com que a assistente é apelidada «oh idiota», «pobre idiota», «idiota frustrada», «não tens utilidade nenhuma», mas como pelas expressões de desagrado manifestadas pelo arguido nessas mensagens quanto à situação do menor, como por exemplo, «brincas com a situação deste menino», «mas ele é meu filho como igualmente é teu e eu a minha parte não abdico», «te ando a aturar manobras de estupidez sem olhar a meios nem consequências para o menino que tem sido o mais prejudicado», «não arrisquei a sujeitar-me a mim e ao menino a mais alguma situação originada por ti. Por isso é tua a culpa sim de eu não estar com ele», e muitas outras. O pano de fundo referente ao litígio nos presentes autos é, pois, manifesto – o exercício das responsabilidades parentais quanto ao menor filho de arguido e assistente e o respectivo regime de contactos. Da prova produzida não é possível aferir qual dos dois (arguido ou assistente) é o responsável por tal conflito, sendo certo que, o envio de tais mensagens é só por si sintomático de que de alguma forma o arguido se mostra desagradado com a forma de cumprimento de tal regime de visitas por parte da assistente. É certo que ambos imputam a responsabilidade ao outro por tal dificuldade no relacionamento, sendo que nenhum dos dois merece especial e maior credibilidade perante este tribunal. Não obstante, sempre se diga que, tendo-se revelado o arguido como pessoa de normal discernimento, pouco normal se nos afigura que procedesse a tal envio de mensagens se nenhum óbice lhe fosse colocado ao contacto com o menor. Num contexto de cordial e desembaraçado relacionamento quanto a tais questões, o tipo de mensagens em causa em nada se justificariam. Face a tais elementos, o depoimento das demais testemunhas em nada acrescenta quanto ao envio de tais mensagens e respectivo teor, além do que se reporta ao contexto após relação mantida entre arguido e assistente. Na verdade, as testemunhas ouvidas acabam por imputar os insucessos de tal relacionamento quer ao arguido (IF, mãe da assistente), apontando para uma conduta recta da filha), quer à assistente (LB,, irmã do arguido, indicando que é a assistente que priva o arguido de ver o filho menor de ambos e imputando-lhe mensagens dirigidas ao irmão indicando que o vai prejudicar. Ora, natural é que tais testemunhas adoptem o partido dos respectivos familiares nesta contenda em torno do menor, sendo que de tais depoimentos não se extrai minimamente qual dos dois (arguido ou assistente) terá responsabilidade por tais conflitos ou até se algum dos dois terá responsabilidade em tais conflitos. A testemunha LB vem ainda, no seu depoimento, apontar para um tratamento entre arguido e assistente, mesmo no período da coabitação, compatível com o teor de tais mensagens, referindo que era frequente os mesmos apelidarem-se com expressões como parvalhona», cabeça de atum», «vai para o caralho», «vai-te foder», num contexto de normal relacionamento, sendo que o arguido havia já efectuado tal referência. Aliás, o arguido referiu que inclusive tais expressões são comuns no meio profissional de ambos. Não obstante, refira-se que a testemunha LB se reporta a um contexto em que não existia conflito, sendo que tais expressões não eram proferidas em sede de discussões, mas sim no normal trato de ambos, sendo que nada via de ofensivo em tal trato. Por seu turno, a testemunha P, colega de trabalho da assistente, nega que a arguida em contexto de trabalho use aquele tipo de linguagem, reconhecendo, porém, que no meio tal é usual. Desconhece o tipo de tratamento entre assistente e arguido no contexto da respectiva relação, considerando até que só conhece a assistente desde 2011. A testemunha IF refere nunca ter presenciado tal tipo de expressões entre arguido e assistente na constância da relação de ambos, desconhecendo igualmente que tipo de palavreado é utilizado no contexto laboral da assistente. Ora, a prova não é pacífica no sentido de que assistente e arguido se apelidavam com o tipo de expressões constantes das mensagens em causa, e nenhuma das testemunhas ouvidas sobre tal matéria merece especial credibilidade – atendendo até à proximidade familiar com os dois intervenientes, sendo certo que, em todo o caso, ainda que tal se admitisse, a testemunha LB refere-se a tais expressões proferidas num contexto pacífico e não num contexto de conflito. Quanto ao efeito de tais mensagens na assistente, sustentou-se o tribunal nas declarações da própria, bem como nas da testemunha PF, colega de trabalho da assistente, e que se referiu ao estado em que esta ficava aquando da recepção das mensagens em causa, indicando que a mesma ficava perturbada e stressada, sendo que a assistente não lhe referiu dormir bem. A assistente, por seu turno, apela a um «terrorismo psicológico» por parte do arguido, referindo dificuldades de concentração no trabalho e a necessidade de ficar em casa a descansar por força de tal situação, sentindo-se stressada e angustiada. Ora, quanto ao estado da assistente, convém ter em conta o próprio teor das mensagens, bem como toda a sua envolvência – ou seja a situação de conflito existente entre a assistente e o arguido quanto às visitas do menor – sendo que a natureza pouco pacífica de tal relacionamento, o facto de haver desacordo quanto às visitas do menor é, por si só, susceptível de transtornar e causar desgaste. Nesta medida, ainda que se admita tal desgaste e transtorno, o que é difícil, em conformidade com as regras de experiência comum, é imputá-lo exclusivamente ao teor concreto das mensagens em causa, sendo que o seu teor passa mormente por questões de discordância quanto às marcações das visitas ou da forma como a assistente gere o contacto do menor com o progenitor. Existem expressões menos polidas, é certo, a assistente é apelidada de idiota, frustrada, sem utilidade, incompetente, no entanto, temos de ter. No que concerne ao vertido em 4 e 15, quanto à convivência marital entre arguido e assistente, resulta a convicção do tribunal das declarações de ambos, da caracterização da vivência comum – residiam na mesma habitação, tiveram um filho em comum, por um período já com algum relevo – sendo que tal aponta mais para uma relação marital do que apenas para um relacionamento ocasional, como pretendeu fazer crer o arguido. Nesta medida, e em conformidade com as regras de experiência comum, é natural que o arguido conheça a assistente e a existência ou não de problemas de foro psicológico ou psiquiátrico, sendo certo que nos autos nada foi apresentado que apontasse para a existência de tais problemas. Já não se deu como provado o referido em 4, desconhece-se em absoluto se a assistente assume ou não condutas tendentes a privar o arguido do convívio com o menor, sendo que ambos apresentam uma versão distinta imputando as responsabilidades pelo conflito ao outro. Quanto aos factos que se deram como não demonstrados nos pontos 1 a 9 resultam os mesmos de não se ter colhido prova suficiente para os fundamentar. De facto, quanto às características de personalidade da assistente, além da forma como é vista pela mãe e pela colega de trabalho, nada se demonstrou quanto às suas qualidades de seriedade e honestidade (o que não significa, obviamente, que as não tenha), na sua vida diária, sendo que o âmbito da prova assentou essencialmente no teor da relação com o arguido e no trato nas relações profissionais desta. Quanto ao vertido em 1, mormente pela leitura da decisão proferida nos autos com o nº --/10.8PAENT, que correu termos em juízo, e que consta dos autos, nada resulta quanto a eventuais actos de violência do arguido contra assistente, sendo que ambos aí foram absolvidos dos crimes que lhe vinham imputados. Manifestamente também não resulta que a arguida tenha saído de casa motivada por qualquer conduta do arguido. Também não se produziu prova suficiente que permita concluir por um abalo e humilhação do calibre do descrito na acusação particular. Note-se que a própria IP, mãe da assistente, refere que a assistente fazia a sua «vidinha normal, mas ficava muito perturbada». Ora, as mensagens em causa – dado o contexto de conflito – são passíveis de acordo com as regras de experiência comum, de transtornar, abalar, humilhar o visado, mas não resulta que tal transtorno tenha assumido consequências de maior ou afectado de forma relevante a capacidade de trabalho da assistente. Desconhece-se em que momentos a assistente teve de se ausentar do trabalho – como a mesma refere – ou se tais períodos coincidem com a recepção de mensagens. Mais, desconhece-se em absoluto se tais eventuais trocas referidas pela assistente são exclusivamente decorrentes de tais mensagens – o que nos parece manifestamente exagerado – ou do próprio conteúdo conflituoso das relações com o arguido por referência ao filho comum de ambos. Aliás, o próprio desgaste mencionado pela assistente parece em muito decorrer também da falta de entendimento do ex-casal quanto ao exercício das responsabilidades parentais. Quanto ao vertido em 3, pese embora a assistente tenha feito alusão a tanto, desconhece-se quando e em que circunstâncias de tempo e lugar tal teria sucedido, de forma a afirmar uma prática reiterada de tal conduta. Face a tanto se deu apenas como demonstrado o vertido nos pontos 16 a 20. Quanto à intenção do arguido, pese embora o mesmo tenha negado qualquer intenção de ofender ou injuriar, resulta a mesma da materialidade objectiva demonstrada, sendo que o arguido se mostra pessoa de normal discernimento e conhecimento e não desconhecedora do significado das mensagens que dirigiu à assistente. O conteúdo das expressões referidas em 6 a), b), d), p), considerando que aí o arguido apelida a assistente de idiota, idiota frustrada, pobre idiota ou tece considerações a propósito da capacidade intelectual e para o exercício das suas funções denota manifestamente, mais que expressar a sua opinião sobre a forma como a assistente tem vindo a gerir o seu contacto com o filho menor de ambos, denota uma vontade de atacar mais que tais questões indo até à própria personalidade e capacidade intelectual da arguida, em conduta em que não pode deixar de se discernir aquela intenção de ofender a honra da assistente. Note-se que ainda que fosse habitual tal trato entre arguido e assistente, como este pretendeu fazer crer, o que é certo é que o mesmo se reporta à constância da relação amorosa de ambos, num contexto pacífico, em que se pode apelar para um tom de brincadeira. As mensagens em causa são dirigidas em fase posterior, em situação de conflito aberto, e em que tais mensagens nada têm de amistoso ou de tom de brincadeira. Atendeu, ainda o tribunal ao teor de fls. 116 e 117 quanto aos elementos referentes à filiação e data de nascimento do menor AB.. No que tange aos antecedentes criminais do arguido atendeu-se ao teor do CRC junto aos autos. Quanto às condições económicas deste, sustentou-se o tribunal nas suas declarações que se revelaram credíveis nesta parte, não sendo também infirmadas por qualquer outra prova produzida”. 9. As conclusões do recurso delimitam o âmbito do conhecimento do mesmo e destinam-se a habilitar o tribunal superior a conhecer as pessoais razões de discordância do recorrente em relação à decisão recorrida (art.ºs 402, 403 e 412 n.º 1, todos do Código de Processo Penal, e, a título de exemplo, o acórdão do STJ de 13.03.91, in Proc. 416794, 3.ª Secção, citado por Maia Gonçalves, em anotação ao art.º 412 do Código de Processo Penal Anotado e Comentado, 12.ª edição). Elas devem conter, por isso, um resumo claro e preciso das questões que o recorrente pretende ver submetidas à apreciação do tribunal superior, sem perder de vista a natureza do recurso, que não se destina a um novo julgamento sobre o objecto do processo, mas a uma apreciação da decisão recorrida, por forma a corrigir os vícios ou erros de que a mesma enferme e que devem ser concretizados pelo recorrente. Como escreve Germano Marques da Silva, in Curso de Processo Penal, vol. III, 350, elas “são extraordinariamente importantes, exigindo muito cuidado... devem ser concisas, precisas e claras, porque são as questões nelas sumariadas que hão-de ser objecto de decisão”. Feitas estas considerações, e atentas as conclusões do recurso acima transcritas, são as seguintes a questões colocadas pelo recorrente à apreciação deste tribunal, anotando-se que, no que respeita à matéria cível, o recurso não foi admitido, pelo que, nessa parte, dele não cabe conhecer: 1.ª – Se a sentença enferma de nulidade insanável, por violação dos art.ºs 410 n.ºs 2 al.ª b) e c) e 3 do CPP, 186 n.º 2 e 74 do CP; 2.ª – Se, em face das provas produzidas, foram incorretamente apreciados os factos descritos nos pontos 10 e 15 a 20 da matéria de facto dada como provada; 3.ª - Se a palavras/expressões utilizadas (dadas como provadas), ou seja,“idiota”,“idiota frustrada”e “incompetente”–nas circunstâncias em que foram proferidas - preenchem o elemento objetivo do crime pelo qual o arguido foi condenado; 4.ª – Se o tribunal, em face dos fatos dados como provados, devia dispensar o arguido de pena, seja nos termos do disposto no art.º 186 n.º 2, seja nos termos do disposto no art.º 74, ambos do CP. 9.1. – 1.ª questão Alega o arguido (sic) que “não resultou demonstrada a prática dos factos ilícitos que vêm imputados ao arguido, mas ainda que assim fosse estariam reunidos todos os pressupostos para a aplicação da dispensa de pena, por resposta a ato repreensível da assistente…” e que – porque assim não se decidiu – foi violado “o disposto no art.º 410 n.ºs 2 al.ªs b) e c) e 3 do CPP…”. Ora, com tais argumentos – e nada mais se alega, seja na motivação do recurso propriamente dita, seja nas conclusões – não se vê como sustentar a invocada nulidade insanável. Deve dizer-se que é até contraditória tal alegação, pois que: - se não resultou demonstrada a prática dos ilícitos que vêm imputados ao arguido, como alega, a sua consequência seria a absolvição do arguido, por eventual erro de julgamento, questão que nada tem a ver com a invocada violação do disposto no art.º 410 n.ºs 2 al.ªs b) e c) e 3 do CPP; - se, a entender-se que estão reunidos todos os pressupostos para a aplicação de dispensa de pena e o tribunal assim não decidiu, então estaríamos também perante um erro de julgamento (o tribunal errou na determinação da medida da pena, por não ter, eventualmente, analisado todas as circunstâncias relevantes), questão que – também esta – nada tem a ver com a violação do disposto no art.º 410 n.ºs 2 al.ªs b) e c) e 3 do CPP. Carece de fundamento, pois, a invocada nulidade. Diga-se ainda que o art.º 410 n.º 2 al.ªs b e c) prevê como fundamento do recurso a contradição insanável da fundamentação e o erro notório na apreciação da prova. Lida e relida a motivação do recurso, dela não se descortina a alegação de qualquer contradição na fundamentação, como não se descortina qualquer erro – notório – na apreciação da prova, enquanto vícios da decisão, que terão de resultar do texto da mesma, tal como se dispõe no n.º 2 daquele preceito. Improcede, por isso, a 1.ª questão supra enunciada. 9.2. – 2.ª questão Entende o recorrente que o tribunal julgou incorretamente os factos dados como provados nos pontos 10 e 15 a 20, ou seja (tais factos correspondem neste acórdão aos pontos seguintes): 10. “O arguido quis dirigir-se à assistente nos termos indicados em 6, utilizando as expressões aí referidas e agiu, ao remeter as mensagens indicadas em 6 a), b), d) e p), com intenção de ofender a honra e consideração da assistente, o que conseguiu”. 18. “No período referido em 3, o arguido coabitou com a assistente como se de marido e mulher se tratassem, conhecia e conhece bem a assistente, sabendo que a mesma não padece de qualquer problema de foro mental, psiquiátrico ou psicológico que ponham em causa o entendimento e o desempenho das suas funções, quer ao nível profissional, quer como mãe”. 19. “Com a conduta descrita em 6 o arguido transtornou a assistente”. 20. “A assistente é pessoa bem considerada por familiares e amigos, bem como no meio profissional”. 21. “O facto de ter tido conhecimento das mensagens descritas em 6 provocou-lhe vergonha, humilhação, transtorno, inquietação e consternação”. 22. “Quando recebia as mensagens descritas em 6, no seu local de trabalho, a assistente ficava transtornada”. 23. “Alguns dos colegas de trabalho da assistente, por constatarem o transtorno da assistente, tomaram conhecimento do teor de algumas das mensagens”. E fundamenta a sua divergência quanto ao decidido: - relativamente às mensagens descritas nas al.ªs a), b) d) e p) – que fundamentam a condenação do recorrente – devem as mesmas ser enquadradas no contexto em que foram enviadas, pois que tais expressões (consideradas injuriosas) “não surgem do nada, mas num quadro de agastamento do arguido, num quadro de conflito pelo cumprimento das responsabilidades parentais instituído…”; - o depoimento da assistente confirma “que tais mensagens eram mensagens de resposta às suas mensagens”; - o tribunal “deveria ter suportado o entendimento da verdade das declarações do arguido face às declarações da assistente pelo facto de as mesmas suportarem as mensagens (prova documental junta aos autos) sem que a assistente tivesse dado qualquer explicação contrária à versão do arguido, apenas referindo que se sentiu ofendida…”. Desta argumentação, assim sintetizada, não se vê onde o recorrente baseia a sua divergência quanto à matéria de facto dada como provada nos pontos 18 a 23 (correspondentes aos n.ºs 15 a 20 da decisão recorrida). De facto, para além de não concretizar quaisquer provas concretas que imponham decisão diversa da recorrida, em suma, que demonstrem que o tribunal errou na análise que fez das provas para dar como provados tais factos, do alegado infere-se que a sua divergência assenta, basicamente, nas circunstâncias em que enviou tais mensagens – matéria a que se reporta o facto descrito no ponto 10 – circunstâncias que nada têm a ver com a restante factualidade vertida nos pontos 18 a 23, pelo que a impugnação da matéria de facto vertida nestes pontos carece de fundamento. Deve dizer-se que ao recorrente que impugne a matéria de facto não basta manifestar a sua divergência quanto ao decidido, impondo-lhe a lei que concretize as provas que impõem decisão diversa da recorrida (art.º 412 n.º 3 do CPP), não que permita decisão diversa, o que equivale a dizer que a simples divergência do recorrente quanto à convicção que o tribunal formou, se não se demonstra que essa convicção se baseou em juízos ilógicos, arbitrários, desconformes com as regras da experiência comum, não é fundamento bastante para questionar a bondade do decidido. A questão coloca-se, portanto – e só – no que respeita ao facto dado como provado no ponto 10, ou seja, saber se o arguido – atentas as circunstâncias em que enviou as ditas mensagens - quis dirigir-se à assistente “com intenção de ofender a honra e consideração da assistente, o que conseguiu”. A este propósito, consta da fundamentação da decisão recorrida: “Quanto à intenção do arguido, pese embora o mesmo tenha negado qualquer intenção de ofender ou injuriar, resulta a mesma da materialidade objetiva demonstrada, sendo que o arguido se mostra pessoa de normal discernimento e conhecimento e não desconhecedora do significado das mensagens que dirigiu à assistente. O conteúdo das expressões referidas em 6 a), b), d), p), considerando que aí o arguido apelida a assistente de idiota, idiota frustrada, pobre idiota ou tece considerações a propósito da capacidade intelectual e para o exercício das suas funções denota manifestamente, mais que expressar a sua opinião sobre a forma como a assistente tem vindo a gerir o seu contacto com o filho menor de ambos, denota uma vontade de atacar mais que tais questões indo até à própria personalidade e capacidade intelectual da arguida, em conduta em que não pode deixar de se discernir aquela intenção de ofender a honra da assistente. Note-se que ainda que fosse habitual tal trato entre arguido e assistente, como este pretendeu fazer crer, o que é certo é que o mesmo se reporta à constância da relação amorosa de ambos, num contexto pacífico, em que se pode apelar para um tom de brincadeira. As mensagens em causa são dirigidas em fase posterior, em situação de conflito aberto, e em que tais mensagens nada têm de amistoso ou de tom de brincadeira”. Ora, o contexto – invocado pelo arguido – em que tais mensagens foram enviadas (um contexto de conflito resultante de desentendimentos quanto ao exercício das responsabilidades parentais), e independentemente do desgaste que tal situação possa ter provocado no arguido (que, segundo alegou, enviara tais mensagens “sob o estado de alguma irritação” e em resposta à assistente) não é razão bastante para concluir que o arguido não quis ofender a honra e consideração da assistente. Uma coisa é a razão ou motivo pelo qual pratica os factos e outra, diversa, é o fim visado com a sua atuação – consciente e voluntária – sabendo que a mesma é proibida por lei e, por isso, censurável. E no contexto em que o arguido atuou – de que a sentença recorrida nos dá conta – não pode deixar de se concluir que o arguido quis, efetivamente, fazendo apelo às regras da experiência comum, da lógica e aos critérios da normalidade da vida, denegrir a imagem e o bom nome da ofendida, conclusão que resulta como consequência lógica e necessária do modo como se lhe dirige, sendo que se trata de uma pessoa lúcida (com responsabilidades ao nível da prevenção e combate à criminalidade), com capacidade para avaliar a ilicitude dos seus atos e se determinar de acordo com essa avaliação. Deve dizer-se que, não obstante o que se deixa dito, a consumação deste tipo de crime não se exige atualmente o chamado dolo específico – ou seja, a intenção de… - pois que basta uma atuação dolosa (voluntária e consciente), desde que se integre em qualquer das modalidades do dolo definidas no art.º 14 do CP. Improcede, por isso, a 2.ª questão supra enunciada. 9.3. – 3.ª questão Consta das mensagens enviadas pelo arguido à assistente, além do mais: - “Oh idiota, tua não precisas de marcar os dias… isso já é pedir demasiado esforço para o teu cérebro”; - “Eu nem sei como entraste na gnr, pois és tão idiota e incompetente…”; - “Nem sei se és mesmo idiota se fumas alguma droga”; - “… já deu para entender que dizes tudo ao contrário, mas isso… regula-se com comprimidos. Por isso toma-os”; - “És uma pobre idiota que vive a vida a sonhar… és o maior filme cómico que tenho assistido… fica para aí a apodrecer até inventares outra parvoíce… idiota frustrada”. Trazendo à colação os ensinamentos de Beleza dos Santos sobre o que deve entender-se por “honra” e “consideração”, escreve aquele autor que entende-se por honra “aquele mínimo de condições, especialmente de natureza moral, que são razoavelmente consideradas essenciais para que um indivíduo possa com legitimidade ter estima por si, pelo que é e vale; refere-se ao apreço de cada um por si, à auto-avaliação no sentido de não ser um valor negativo, particularmente do ponto de vista moral”, e por consideração “aquele conjunto de requisitos que razoavelmente se deve julgar necessário a qualquer pessoa, de tal modo que a falta de algum desses requisitos possa expor essa pessoa à falta de consideração ou ao desprezo público; refere-se ao juízo que forma ou pode formar o público no sentido de considerar alguém um bom elemento social, ou ao menos de não o julgar negativo” (Algumas considerações jurídicas sobre crimes de difamação e injúria, in Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 92, n.º 3152, pág. 167/168) E continua: “Nem tudo aquilo que alguém considere ofensa à dignidade ou uma desconsideração deverá considerar-se difamação ou injúria punível…Não deve considerar-se ofensivo da honra e consideração de outrem tudo aquilo que o queixoso entenda que o atinge, de certos pontos de vista, mas aquilo que razoavelmente, isto é, segundo a sã opinião da generalidade das pessoas de bem, deverá considerar-se ofensivo daqueles valores individuais e sociais”. Por outras palavras, o que é ofensivo da honra e consideração alheia não é aquilo que o é para o concreto ofendido, mas sim o que é considerado como tal pela generalidade das pessoas de bem de um certo país e no contexto sócio-cultural em que os factos se passaram, de forma a que a sociedade não lhe fique indiferente, reclamando a tutela penal de dissuasão e repressão desse comportamento. No caso em apreço, a imputação do arguido, no contexto em que foi feita, é objetivamente injuriosa, na medida em que transmite um juízo negativo – bem acentuado, aliás - sobre a pessoa da assistente e sobre a sua reputação, como mãe, como pessoa e, até, como profissional, evidenciando, em suma, a má reputação da assistente, a sua má imagem, enquanto elemento da sociedade e da instituição à qual pertence. De facto, idiota – deve acentuar-se – significa, em suma, estúpida, ignorante, maluca, pessoa que sofreu de paragem no seu desenvolvimento mental, por lesões cerebrais (ver António de Morais Silva, in Novo Dicionário Compacto da Língua Portuguesa, Horizonte Confluência), significado que o arguido – como se vê do contexto em que a utilizou - atribuiu a tal expressão quando a dirigiu à assistente, como se infere, designadamente, quando afirma que marcar os dias “é pedir demasiado esforço” para o cérebro da assistente, que não sabe como a assistente – por tão idiota e incompetente – entrou na GNR. Tal expressão, porque incorpora um juízo sobre a sanidade mental da assistente, que repete por diversas vezes, reforçando a intensidade do dolo, não pode deixar de se entender como ofensiva da honra e consideração devidas à assistente, entendidas estas nos termos supra expostos. --- 9.4. – 4.ª questão Dispõe o art.º 186 n.º 2 do CP que “o tribunal pode… dispensar de pena se a ofensa tiver sido provocada por uma conduta ilícita ou repreensível do ofendido”. Ora, o facto da expressão ter sido utilizada pelo arguido em mensagens de telemóvel afasta qualquer provocação, entendida esta como uma ofensa “consubstanciada em uma conduta ilícita ou repreensível que determina um estado psicológico de ira ou descontrolo emotivo que se concentra, impulsivamente, em uma imediata reacção àquela precisa ofensa primitiva” (José de Faria Costa, in Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, 671). De facto: - independentemente de essas mensagens aparecerem na sequência ou em resposta a mensagens da ofendida (o que não se questiona), não está demonstrado que sejam resposta a qualquer conduta ilícita ou repreensível da ofendida, pois que se desconhece, por um lado, quando, concretamente, foi enviada ao arguido a mensagem à qual responde – dado relevante para aferir da proximidade temporal e, portanto, de uma eventual provocação - por um lado, o seu teor e, portanto, o nexo de causalidade entre a conduta da ofendida (porquê ilícita? porquê repreensível?) e a do arguido, ou seja, que esta seja uma resposta imediata – devido a um estado psicológico de ira ou descontrolo emotivo provocado pela conduta da ofendida – a uma conduta ilícita ou repreensível daquela; - por outro lado, o art.º 74 do CP admite a dispensa de pena quando: - a ilicitude do facto e a culpa do agente forem diminutas; - o dano tiver sido reparado; - à dispensa da pena não se opuserem razões de prevenção. Nenhum destes pressupostos se verifica. 1)Não se pode considerar diminuta a ilicitude do facto, atenta a gravidade do mesmo – que se revela pela repetição das afirmações injuriosas ao longo do tempo – assim como a culpa, pois que o arguido agiu de modo voluntário e consciente, querendo praticar os factos – com dolo direto – bem conhecedor da sua ilicitude e das consequências dos mesmos para a ofendida; 2) O arguido não reparou o mal do crime e, por outro lado, não interiorizou a sua gravidade, que não reconhece – imputando à ofendida a responsabilidade dos seus atos - o que bem evidência revela a falta de preparação para manter uma conduta lícita e conformar o seu modo de vida – e, concretamente, o relacionamento com a mãe do seu filho, no âmbito das responsabilidades parentais – com as normas vigentes e o respeito por uma sã vivência social, o que tem reflexos ao nível da necessidade da pena, enquanto medida dissuasora de idênticos comportamentos no futuro; 3) Por outro lado, deve dizer-se, à isenção da pena opõem-se ainda as fortes exigências de prevenção geral que no caso se fazem sentir, atenta a frequência com que este tipo de crime ocorre nos nossos dias, muitas vezes em consequência da dificuldade dos progenitores em gerir os conflitos resultantes das responsabilidades parentais, exigências que ficariam claramente defraudadas se o arguido, perante as circunstâncias dadas como provadas, viesse a ser dispensado de pena, o que poderia ser encarado pela comunidade como uma forma mitigada de impunidade. Improcede, por isso, a pretendida dispensa de pena. 10. Assim, em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a 1.ª Subsecção Criminal deste tribunal em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido e, consequentemente, em confirmar a sentença recorrida. Custas pelo arguido, fixando-se a taxa de justiça em quatro UC (art.ºs 513 e 514 do CPP e 8 n.º 5 e tabela III anexa do RCP). (Este texto foi por mim, relator, elaborado e integralmente revisto antes de assinado) Évora, 2014/11/18/ Alberto João Borges Maria Fernanda Pereira Palma |