Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
762/21.1T8MGR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: ARRENDAMENTO NÃO HABITACIONAL
BENFEITORIAS
INTERPRETAÇÃO DO CONTRATO
COMPENSAÇÃO
EQUIDADE
Data do Acordão: 09/24/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DA MARINHA GRANDE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Legislação Nacional: ARTIGOS 216.º; 236.º, 1 E 2; 237.º; 238.º, 1 E 2; 473.º; 1031.º; 1069.º; 1074.º; 1108 E SEGS; 1111, 1 E 2 E 1273.º, 1 E 2, DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: 1. A Relação poderá/deverá alterar a decisão de facto se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa (art.º 662º, n.º 1 do CPC).

2. Se em contrato de arrendamento urbano para fim não habitacional se fez constar ser da responsabilidade do arrendatário a adaptação para a sua atividade e a obtenção das respetivas licenças e que passavam a fazer parte integrante do locado as obras de beneficiação que o mesmo viesse a efetuar, em princípio, o assim acordado não afastará o eventual direito a compensação/indemnização por benfeitorias necessárias ou úteis (que não podem ser removidas sem o detrimento da coisa) realizadas no prédio arrendado (art.ºs 216º, 1074º, n.º 5 e 1273º, do CC).

3. Já não assim se expressamente acordado, por exemplo: “a arrendatária (a expensas exclusivamente por sua conta) fica desde já autorizada pela senhoria, a fazer no local arrendado, as obras necessárias aos fins a que o mesmo se destina e, todas as benfeitorias que fizer ficarão a pertencer ao local arrendado, sem direito a qualquer indemnização ou direito de retenção”; “as benfeitorias realizadas pelo arrendatário não lhe dão direito a qualquer indemnização”.

4. A interpretação de tais cláusulas deverá ser efetuada de harmonia com o disposto nos art.ºs 236º e 238º do CC e de forma a permitir um maior equilíbrio contratual (art.º 237º do CC).

Decisão Texto Integral:
Relator: Fonte Ramos
Adjuntos: Fernando Monteiro
                  Luís Cravo

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                 (…)

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Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

           

           

            I. A..., Lda., intentou a presente ação declarativa comum contra AA e mulher BB, pedindo que sejam condenados a pagar-lhe a importância de € 40 000 a título de compensação/indemnização por benfeitorias.

           Alegou, em síntese: na sequência da celebração e execução de contrato de arrendamento industrial, a A., com a autorização dos Réus, realizou várias obras de adaptação/alteração das frações autónomas dadas em arrendamento - então, destinadas a armazém e garagem - para uma única fração destinada a indústria, com licenciamento promovido pela A. junto da Câmara Municipal ...; com as obras realizadas, mais que duplicaram a área coberta, valorizando o espaço propriedade dos Réus, passando a ter um valor muito superior (valor comercial de mercado e valor locatício), e que justifica a  requerida indemnização pelo não levantamento das benfeitorias úteis ali realizadas.

            Os Réus contestaram, admitindo que autorizaram a realização de obras de adaptação dos locais arrendados à atividade da A., mas fizeram constar do contrato que quaisquer obras realizadas passariam a fazer “parte integrante do locado”, pelo  que não é devida qualquer compensação pelas benfeitorias realizadas; impugnaram, ainda, o custo das obras e a valorização dos locais arrendados, alegando que, atualmente, ao invés de terem duas frações autónomas, têm uma fração que apenas pode ser arrendada para fim industrial.

            Foi proferido despacho saneador que firmou o objeto do litígio e enunciou os temas da prova.

           Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal a quo, por sentença de 06.4.2024, julgou a ação totalmente improcedente, absolvendo os Réus do pedido.

           Dizendo-se inconformada, a A. apelou formulando as seguintes conclusões:

           1ª - Com a apresentação da Petição Inicial e posteriormente com a apresentação da Petição Inicial Corrigida, a A./Apelante fez alusão à existência de 2 contratos de arrendamento, respeitantes 1 à fração à e outro à Fração B e, também, à existência de 1 contrato de cessão da posição contratual e de 3 aditamentos, 2 referentes à fração A e 1 respeitante à fração B.

           2ª - Nos pontos 7 e 8 de ambas as PI (inicial e corrigida) é identificado um contrato de Arrendamento de 17.5.2011, referente à fração A, celebrado com a A., ainda na sua designação inicial de B... UNIPESSOAL, LDA., tendo sido junto o competente documento como Doc. n.º 3 (PI corrigida).

           3ª - No ponto 11 de ambas as PI (inicial e corrigida) é identificado um contrato de Arrendamento de Julho de 2011, referente à fração B, celebrado com a C..., Lda., tendo sido junto o competente documento como Doc. n.º 4 (PI corrigida).

           4ª - Nos pontos 12 e 13 de ambas as PI (inicial e corrigida) é identificado um contrato de cessão da posição contratual, de 01.01.2012, por via do qual, o arrendamento da fração B (que havia sido celebrado com a C..., Lda.) passou para (na qualidade de Locatária) a A./Apelante, tendo sido junto o competente documento como Doc. n.º 5 (PI corrigida).

           5ª - No ponto 14 de ambas as PI (inicial e corrigida) é identificado um 1º Aditamento ao contrato de Arrendamento de 17.5.2011, referente à fração A, tendo sido junto o competente documento como Doc. n.º 6 (PI corrigida).

           6ª - No ponto 15 de ambas as PI (inicial e corrigida) é identificado um 2º Aditamento ao contrato de Arrendamento de 17.5.2011, referente à fração A, tendo sido junto o competente documento como Doc. n.º 7 (PI corrigida).

           7ª - No ponto 16 de ambas as PI (inicial e corrigida) é identificado um 1º Aditamento ao contrato de Arrendamento de julho de 2011, referente à fração B, tendo sido junto o competente documento como Doc. n.º 8 (PI corrigida).

            8ª - Os RR. e Apelados, em sede de Contestação à PI Inicial e na Contestação à PI Corrigida aceitaram todos os mencionados pontos de ambas as PI (pontos 7, 8, 11, 12, 13, 14, 15 e 16) e aceitaram os documentos em sede de contestação à PI Corrigida, pois não impugnou nenhum dos identificados docs. 3 a 8.

            9ª - Já da matéria de facto dada como provada o Tribunal, cf. factos provados 4 a 9, identifica: i) o contrato respeitante à fração B, de julho de 2011 – facto 11 da PI Inicial e da Corrigida a que respeita o Doc. n.º 4 (factos 4 e 5); ii) o acordo de cessão da posição contratual de 01.01.2012 – pontos 12 e 13 da PI Inicial e da Corrigida a que respeita o Doc. n.º 5 (facto 6); iii) os 3 aditamentos a que se faz alusão nos pontos 14, 15 e 16 da PI Inicial e Corrigida a respeitam os docs. 6, 7 e 8 (factos 7, 8 e 9).

            10ª - No facto dado como provado em 4. o Tribunal confunde a A. e Apelante, A... (e anteriormente B... Unipessoal) com o NIPC ...31 com a C... (NIPC-...69) cuja designação é (e sempre foi) D... LDA, bastante atentar no doc. n.º 4 e no doc. n.º 5 junto com a PI e PI corrigida, pelo que deverá considera-se, tal como se extrai do documento, que o contrato foi celebrado com a C..., Lda..

           11ª - No facto dado como provado em 7 o Tribunal identifica incorretamente a data do Aditamento. Com efeito, o Aditamento é de 01.10.2012 (e não de 17.5.2011 que corresponde à data do contrato que se estava a aditar) conforme se extrai dos articulados da Apelante e, sobretudo, do documento n.º 6 junto com a PI e com a PI Corrigida.

           12ª - No facto dado como provado em 9 o Tribunal identifica incorretamente a epígrafe do escrito particular, pois que da análise do documento 8 junto com a PI Inicial e com a PI Corrigida a designação que lhe foi conferida (ao documento) foi “Aditamento ao contrato de arrendamento para comércio de duração limitada outorgado em 20/7/2011”, devendo igualmente corrigir-se no corpo desse mesmo facto, a referência a “17.5.2011”, substituindo-se por “20.7.2011” e a referência a “01.6.2011” pois é “01.8.2011”.

           13ª - O Tribunal, não faz qualquer referência ao contrato de Arrendamento celebrado a 17.5.2011 e que constitui o documento n.º 3 junto com a PI Inicial e Corrigida, nem ao seu clausulado, designadamente as Cláusulas Oitava e Décima Segunda, o que se impõe que tenha de ser incluído e considerado atendendo a que o objeto dos presentes autos compreende a realização de benfeitorias – necessárias com se veio a concluir/decidir – em 2 espaços (2 frações autónomas), cada uma com contratos de arrendamento e aditamento(s) distintos.

           14ª - Somente após a conclusão das obras e do licenciamento das mesmas é que o imóvel passou a constituir uma realidade una na sequência da cessação da Propriedade horizontal - cf. factos provados 10 a 17.

           15ª - O Tribunal deveria ter fixado na matéria de facto dada como provada a seguinte factualidade:

           3-A. No dia 17.5.2011, por escrito particular epigrafado “contrato de arrendamento para comércio de duração limitada”, os Réus, como primeiros outorgantes, acordaram com a Autora, 2ª outorgante, quando a mesma ainda tinha a designação social de B... UNIPESSOAL, LDA. o gozo temporário do prédio urbano sito na Rua ..., ..., descrito na CRP ... sob o n.º ...03, inscrito na matriz sob o artigo ...89..., com licença de utilização n.º 310/2000, de 18.12.2000, com a duração de 5 anos, com renda anual de € 13 200, a pagar pela segunda outorgante em duodécimos de € 1 100;

            3-B. Consta do referido acordo, as seguintes cláusulas:

           - “Cláusula Oitava: O imóvel é entregue à segunda contraente com todas as suas partes integrantes no estado de funcionamento, sendo da responsabilidade da segunda contraente a adaptação para a sua actividade e a obtenção das respetivas licenças”;

           - “Cláusula Décima Segunda: Todas as obras indispensáveis à conservação e limpeza dos interiores do prédio ficam a cargo da segunda contraente, incluindo a colocação de vidros que se partirem. Passam a fazer parte integrante do locado as obras de beneficiação que possam ser realizadas pela segunda contraente”.

           16ª - Deverão ainda, nos termos acima referidos, corrigidos os factos 4, 7 e 9, de forma a que passem a constar:

           4. No dia 20.7.2011, por escrito particular epigrafado “contrato de arrendamento para comércio de duração limitada”, os Réus, como primeiros outorgantes, acordaram com a C..., LDA. o gozo temporário do prédio urbano sito na Rua ..., ..., descrito na CRP ... sob o n.º ...03, inscrito na matriz sob o artigo ...89..., com licença de utilização n.º 310/2000, de 18/12/2000, com a duração de 5 anos, com renda anual de € 3 600, a pagar pela segunda outorgante em duodécimos de € 300;

           7. Em 01.10.2012, por escrito particular epigrafado “Aditamento ao contrato de arrendamento para comércio de duração limitada, outorgado em 17.5.2011”, os Réus como primeiros outorgantes, acordaram com a A. “A..., LDA” aditar ao acordo previamente celebrado e tendo em consideração que a segunda contraente já se encontrava a arrendar a fração A e B, acordar na renda anual de € 12 000, a pagar pela segunda contraente em duodécimos de € 1 000 e “tendo em consideração as obras de adaptação que terão de ser efetuadas pela segunda, o valor da renda desde a data da celebração do presente contrato até ao final de 2011 será de mil euros mensais”;

           9. Em 26.12.2016, por escrito particular epigrafado “Aditamento ao contrato de arrendamento para comércio de duração limitada outorgado em 20/7/2011”, os Réus, como primeiros outorgantes e a Autora, como segunda outorgante, acordaram aditar ao acordo previamente celebrado em 20/7/2011, alterando as cláusulas segunda e terceira, acordando na cedência do gozo da fração B, por período de 5 anos, com início em 1/8/2011, renovando-se por igual período, se não for denunciado, correspondendo à renda anual o valor de €4 200, a pagar pela segunda outorgante em duodécimos de € 350, a manter até dezembro de 2021, data a partir da qual, por acordo, estabelecerão o novo valor da renda a vigorar;

            17ª - O Tribunal deveria ter considerado e fixado como provado a matéria respeitante ao contrato de arrendamento celebrado a 17.5.2011, conforme acima se destaca em 3-A e 3-B, impondo-se ainda que sejam os factos dados como provados em 4, 7 e 9 corrigidos nos termos acima expostos por o Tribunal ter errado na sua fixação, nas partes definidas, atendendo a que o que foi fixado não tem correspondência com a realidade e os documentos junto aos autos.

           18ª - Razão pela qual deverá ser determinado o aditamento desta nova factualidade supra nos exatos termos aqui expostos, ampliando-se a matéria de facto dada como provada e, também, as correções acima referidas, todas elas suportadas nos documentos identificados.

           19ª - No domínio da Fundamentação de Direito, o Tribunal, conclui – e bem – que as obras executadas pela Apelante, não obstante se poderem considerar como obras de adaptação do locado à atividade da A., constituem benfeitorias necessárias, realizadas com autorização dos Apelados, como se deduz do contrato mas, igualmente, da participação ativa destes na cessação da constituição do prédios descrito em 2., no regime da propriedade horizontal, essencial para que a A. pudesse prosseguir a sua atividade, numa área dimensionada ao seu volume de negócio.

           20ª - E igualmente bem, conclui também o Tribunal, que as benfeitorias não eram passíveis de levantamento sem prejuízo da coisa.

           21ª - O Tribunal também identifica corretamente a norma jurídica aplicável ao caso vertente – arrendamento/locação – destacando, pois, nesse seguimento, o previsto no n.º 5 do art.º 1074º do Código Civil/CC (na redação aplicável a data dos factos – contratos) onde se refere “5 - Salvo estipulação em contrário, o arrendatário tem direito, no final do contrato, a compensação pelas obras licitamente feitas, nos termos aplicáveis às benfeitorias realizadas por possuidor de boa fé.”

           22ª - Já erra de forma manifesta, ao entender que, por via do previsto na cláusula 8ª de cada um dos contratos de arrendamento (factos provados 4, 5 e 3-A e 3-B) objeto de aditamento reclamado supra em recurso da matéria de facto, conjugando com os aditamentos de 2016, não assiste à apelante o direito a ser compensada pelas obras – entenda-se benfeitorias necessárias – que realizou no locado.

           23ª - Não houve qualquer produção de prova testemunhal incidente sobre a matéria dada como provada relativa aos contratos de arrendamento e aos Aditamentos e cessão da posição contratual, aqui se incluindo, também, o contrato de arrendamento de 17.5.2011 cuja inclusão na matéria de facto se peticiona em sede recursiva.

            24ª - Atendendo ao facto de que não houve qualquer produção de prova incidente sobre o conteúdo dos contratos, concretamente sobre o seu clausulado, os factos concretos apurados no processo não permitem afirmar com certeza qual foi a comum vontade real das partes no que respeita aos citados pontos contratuais.

           25ª - Assim sendo, em ordem a determinar o sentido juridicamente relevante das declarações negociais que no caso ajuizado foram produzidas, ao Tribunal competia interpretar o clausulado, designadamente as cláusulas 8ª e 12ª de cada um dos contratos, obedecendo às diretrizes fixadas nos preceitos 236º e 238º do CC.

           26ª - E isto porque a função de tais diretrizes é, precisamente, a de vincular o intérprete a um dos sentidos propiciados pela atividade interpretativa.

           27ª - Os princípios essenciais a ter em consideração nesta matéria são os seguintes: - A declaração negocial valerá de acordo com a vontade real do declarante, se esta for conhecida do declaratário - artigo 236º, n.º 2, CC; - Não o sendo, valerá com o sentido que possa ser deduzido por um declaratário normal, colocado na posição do declaratário real, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele (teoria da impressão do destinatário) - artigo 236º, n.º 1; - Nos negócios formais, a declaração não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto - artigo 238º, n.º 1; dito doutra forma: para que possa valer, o sentido atribuído pelo “declaratário normal” deverá estar expresso, ainda que de forma imperfeita, no próprio texto do documento que corporiza a garantia prestada; - O sentido sem correspondência mínima no texto poderá ainda valer se traduzir a vontade real das partes e as razões determinantes da forma do negócio se não opuserem e essa validade - artigo 238º, n.º 2.

           28ª - Estas regras, no fundo, não são mais do que critérios interpretativos dirigidos ao juiz e às partes contratantes. E o que basicamente se retira do citado art.º 236º do CC é que, em homenagem aos princípios da proteção da confiança e da segurança do tráfico jurídico dá-se prioridade, em tese geral, ao ponto de vista do declaratário (recetor). A lei, no entanto, não se basta com o sentido compreendido realmente pelo declaratário (entendimento subjetivo deste) e, por isso, concede primazia àquele que um declaratário normal, típico, colocado na posição do real declaratário, depreenderia (sentido objetivo para o declaratário).

           29ª - Haverá, pois, que imaginar, uma pessoa com razoabilidade, sagacidade, conhecimento e diligência medianos, considerando as circunstâncias que ela teria conhecido e o modo como teria raciocinado a partir delas, mas figurando-a na posição do real declaratário, isto é, acrescentando as circunstâncias que este efetivamente conheceu (mesmo que um declaratário normal delas não tivesse sabido-por exemplo, devido ao facto de o real declaratário ser portador de uma cultura invulgarmente vasta e superior à média) e o modo como aquele concreto declaratário poderia a partir delas ter depreendido um sentido declarativo.

           30ª - A interpretação da declaração negocial não tem em vista apurar a vontade do declarante ou um sentido que este tenha querido declarar, estando antes em causa o sentido objetivo que se pode depreender do seu comportamento.

           31ª - Importa por fim acrescentar que estando-se no caso sub iudice em presença dum contrato tipicamente sinalagmático, há que atender, simultaneamente, às declarações de ambas as partes porque ambas são, também simultaneamente, declarante e declaratário.

           32ª - Tudo isto significa em termos práticos que o intérprete deve, relativamente a ambos os contraentes, tentar definir a posição em que se encontram perante a declaração da contraparte, e colocar um declaratário ideal (normal) na posição de declaratário real.

           33ª - Interessa indagar, tendo por base as cláusulas a que o Tribunal faz alusão na fundamentação de direito e/ou dá como provadas, se é possível (ou admissível) interpretar as mesmas da forma que aquele faz.

            34ª - Fizeram as partes constar – em cada um dos contratos (de 17.5.2011 e 20.7.2011) nas cláusula 8ª e 12ª - “Cláusula Oitava: O imóvel é entregue à segunda contraente com todas as suas partes integrantes no estado de funcionamento, sendo da responsabilidade da segunda contraente a adaptação para a sua actividade e a obtenção das respetivas licenças”; - “Cláusula Décima Segunda: Todas as obras indispensáveis à conservação e limpeza dos interiores do prédio ficam a cargo da segunda contraente, incluindo a colocação de vidros que se partirem. Passam a fazer parte integrante do locado as obras de beneficiação que possam ser realizadas pela segunda contraente”.

           35ª - Da análise das cláusulas extrai-se que o imóvel (ambas as frações A e B) foi entregue com todos os seus elementos integrantes a funcionar, sendo a A. e apelante responsável pela execução das obras de adaptação e obtenção das licenças para tal.

            36ª - Da cláusula – nada mais se extrai – somente resulta que as partes definiram que as obras de adaptação eram da responsabilidade da Apelante. Nada se extrai quanto ao direito – ou não – a ser compensada / indemnizada pela realização das mesmas.

           37ª - É óbvio que ser responsável por executar subentende ser responsável pelo seu pagamento. Mas NÃO SUBENTENDE, nem explicita nem implicitamente, qualquer renúncia ao direito de ser por tal compensado no final do contrato ou, qualquer acordo de que tais montantes não seriam reclamados.

            38ª - Nem sequer conjugando – como defende o Tribunal – com o teor dos aditamentos, pois que, TODOS são claros a identificar as razões da redução da renda (no 1º aditamento – doc. n.º 6 junto com a PI (e a PI Corrigida o motivo prendeu-se com o facto de estar reunida, na mesma entidade (a A.) a qualidade de arrendatária/locatárias de ambas as frações a e B, tendo, por isso, as partes definido um valor ajustado para os 2 espaços) e, aumento de rendas (nos 2 aditamentos de 2016) por já terem decorrido vários anos e estarem reunidas condições para AUMENTAR o valor da renda.

           39ª - Destaca-se, o que é muito importante e contraria – totalmente – a tese do Tribunal – o facto do grosso das obras (e do valor) terem sido efetuadas entre 2015 e 2017, ou seja, QUANDO O VALOR DA RENDA AUMENTOU.

           40ª - Note-se que, o Tribunal seguramente não compreendeu – o § único da cláusula 3ª identificado nos aditamentos É IGUAL (trata-se de mera reprodução) ao § único da cláusula 3ª do contrato inicial de 17.5.2011.Tal cláusula, JÁ EM MAIO DE 2011, definiu que as rendas – que no contrato inicial ascendiam ao valor anual de € 13 200, a pagar em duodécimos de € 1 100 e, porque havia necessidade de executar obras de beneficiação, até final de 2011, OU SEJA, DURANTE, APENAS, 7 MESES, iriam ser de € 1 000 cada (ao invés de 1 100). TRATA-SE DE REDUÇÃO DE € 700!

           41ª - Por sua vez, da cláusula 12ª o que se extrai é que as benfeitorias (obras de beneficiação) ficariam a fazer parte integrante do locado. Também não consta da cláusula qualquer referência ao direito a ser compensado / indemnização pelas obras, à renúncia a esse direito ou a um acordo das partes para que inexista compensação. SOMENTE se diz que as obras de beneficiação ficam a fazer parte integrante do locado.

           42ª - Diga-se ainda que se as obras de adaptação (ou a responsabilidade pela sua execução) fossem da responsabilidade do proprietário e locador (no caso vertente dos Apelados) sequer haveria necessidade de definir a cláusula 12ª no que tange às obras de beneficiação e ao facto de ficarem a pertencer ao locado. Pois se foram feitas pelo dono do locado a ele pertencem.

           43ª - Ora, perante a referida estipulação contratual e tendo presente tudo quanto se expôs, a conclusão que retiramos (e outra não pode haver) é a de que, colocado na posição das partes, um declaratário normal extrairia como sentido negocial a circunstância de ser da responsabilidade do arrendatário a execução das obras de adaptação e que as mesmas ficariam a pertencer ao locado. Também perceberia que para “compensar” o arrendatário por essas obras o senhorio aceitou prescindir de, durante o período de 7 meses, € 700, correspondentes a € 100 de redução no valor da renda por cada mês. Não se trata de carência do pagamento da renda durante determinado período. Trata-se de um valor insignificante!

           44ª - O mesmo declaratário normal, tendo por base o definido em cada um dos aditamentos (01.10.2012 e 26.12.2016 (2)) percebe que as partes, no primeiro, definiram reduzir o valor da renda (ainda que ajuste mínimo) atendendo a que era a mesma entidade que estava a arrendar as 2 frações e, nos demais, ambas as partes entenderam AUMENTAR o valor das rendas, em altura correspondente ao período em que estavam a ser efetuados os maiores (em valor) investimentos ao nível das obras.

           45ª - Sentido que, diga-se, tem perfeita correspondência no texto dos contratos em causa (cf. art.º 238º do CC). Aliás, importa enfatizar que a referida interpretação é a única que se acomoda a ratio que terá estado subjacente à sua estipulação contratual. 

           46ª - Destaca-se igualmente que as partes apenas estipularam que as obras de beneficiação ficariam a fazer parte integrante do locado. SEM ESTABELECER OU ACORDAR QUE TAL OCORRERIA SEM COMPENSAÇÃO OU INDEMNIZAÇÃO.

           47ª - Os contratos são totalmente omissos no tocante à existência (ou não) de compensação do locatário pelas obras realizadas, pelo que se deverá aplicar o regime geral previsto no Código Civil e já acima transcrito do n.º 5 do art.º 1074º do CC,

           48ª - Ou seja, as obras de beneficiação / adaptação, que o Tribunal considerou como benfeitorias necessárias – ficam a fazer parte integrante do espaço locado – devendo ser o locatário – no caso a Apelante – compensada por tal.

           49ª - No caso concreto, as benfeitorias são necessárias, contudo, mesmo que se entendesse que as benfeitorias realizadas, na sua globalidade, não se tratam de benfeitorias necessárias, sempre seriam, inquestionavelmente, benfeitorias úteis, já que aumentaram – sobremaneira – o valor do imóvel e não podem ser removidas sem detrimento do mesmo.

           50ª - É inquestionável - até pelo Tribunal - a existência de benfeitorias necessárias (até se admitiria de úteis) que não podem ser removidas sem o detrimento da coisa. É também inquestionável que, para afastar o direito a compensação / indemnização, as partes têm que EXPRESSAMENTE o convencionar.

           51ª - Não se extrai, nem implícita nem explicitamente, do conteúdo de nenhum dos contratos e dos seus aditamentos – na interpretação que possa ser feita nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 236º do CC (pois não há forma – não houve qualquer produção de prova sobre tal – de saber qual a vontade das partes) que o clausulado definido pelas partes afasta o direito a compensação /indemnização ou que traduz essa intenção. A Apelante fez investimentos – somente no período compreendido entre 2015 e 2017 – superiores a € 120 000, num espaço que lhe não pertencia (cf. factos provados 10 a 17) em período coincidente com o aumento das rendas decorrentes dos aditamentos de 26.12.2016.

           52ª - Entender que assumiu, em 2011, porque o senhorio lhe descontou o valor de € 700, executar as obras sem ter direito a reclamar compensação pelas mesmas – note-se que somente peticiona € 40 000 – é, salvo melhor opinião, extravasar por completo, sem qualquer sustentação documental ou interpretativa, o conteúdo / teor das cláusulas definidas, de boa fé e livremente, pelas partes.

           53ª - Impondo-se, pois, a revogação da decisão proferida pela 1ª instância e a sua substituição por outra que, reconhecendo procedência à pretensão da Apelante, condene os apelados no pedido.

            54ª - Com a decisão em crise o Tribunal violou, designadamente, o disposto nos art.ºs 236º, 238º e 1 074º, n.º 5, do CC.

           Rematou dizendo que deve “ser proferido Acórdão que, revogando a decisão em crise, determine a alteração da matéria de facto nos moldes peticionados e conclua pela procedência, por provada, da pretensão da Apelante.

           Os Réus responderam concluindo pela improcedência do recurso.

           Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objeto do recurso, importa conhecer e/ou reapreciar: a) impugnação da decisão sobre a matéria de facto (erro na apreciação da prova;       insuficiência da matéria de facto dada como provada); b) decisão de mérito (máxime, se e em que medida a A. tem direito a ser compensada pelas obras realizadas), para o que também releva a eventual alteração da decisão de facto.    


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            II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos:

            1) A A. é uma sociedade comercial por quotas que se dedica à Indústria de moldes.

            2) Os Réus são donos e legítimos possuidores do imóvel, com a composição atual de Edifício de dois pisos e logradouro, situado em ..., Rua ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob a ficha n.º ...03 da freguesia ... e inscrito na matriz predial urbana, da mesma freguesia, atualmente sob o art.º ...74, com a área total registada de 1320 m2, correspondendo 806 m2 a área coberta e 514 m2 a área descoberta.

           3) Até ao ano de 2019, o imóvel em causa encontrava-se constituído em propriedade horizontal, dispondo de 2 frações identificadas pelas letras “A” e “B” e com a composição de Edifício composto de 2 pavilhões, sendo um de rés do chão e 1º andar e outro de rés do chão, e possuía a área total registada de 1200 m2, correspondendo à área coberta de 410,13 m2 e descoberta de 789,87 m2.

            4) No dia 20.7.2011, por escrito particular epigrafado “contrato de arrendamento para comércio de duração limitada”, os Réus, como 1ºs outorgantes, acordaram com a A., 2ª outorgante, quando a mesma ainda tinha a designação social de C..., UNIPESSOAL, LDA. o gozo temporário do prédio urbano sito na Rua ..., ..., descrito na CRP ... sob o n.º ...03, inscrito na matriz sob o art.º ...89..., com licença de utilização n.º 310/2000, de 18/12/2000, com a duração de 5 anos, com renda anual de € 3 600, a pagar pela 2ª outorgante em duodécimos de € 300.

            5) Consta do referido acordo, as seguintes cláusulas:

           - “Cláusula Oitava: O imóvel é entregue à segunda contraente com todas as suas partes integrantes no estado de funcionamento, sendo da responsabilidade da segunda contraente a adaptação para a sua atividade e a obtenção das respetivas licenças”;

           - “Cláusula Décima Segunda: Todas as obras indispensáveis à conservação e limpeza dos interiores do prédio ficam a cargo da segunda contraente, incluindo a colocação de vidros que se partirem. Passam a fazer parte integrante do locado as obras de beneficiação que passam ser realizadas pela segunda contraente”.

            6) No dia 01.01.2012, por escrito particular epigrafado “Acordo de Cessão da posição contratual no Contrato de Arrendamento para Comércio de Duração Limitada outorgado em 20/7/2011”, os Réus como 1ºs outorgantes, acordaram com “D... Lda”, 2ª outorgante, e “A..., LDA”, 3ª outorgante, que a 2ª outorgante cedia à 3ª outorgante a sua posição como arrendatária, obrigando-se a 3ª outorgante, cessionária a assumir as responsabilidades contratuais assumidas pela 2ª outorgante.

            7) Em 17.5.2011, por escrito particular epigrafado “Aditamento ao contrato de arrendamento para comércio de duração limitada, outorgado em 17.5.2011”, os Réus como 1ºs outorgantes, acordaram com a A. aditar ao acordo previamente celebrado e tendo em consideração que a 2ª contraente já se encontrava a arrendar a fração A e B, acordar na renda anual de € 12 000, a pagar pela 2ª contraente em duodécimos de €1 000 e “tendo em consideração as obras de adaptação que terão de ser efetuadas pela segunda, o valor da renda desde a data da celebração do presente contrato até ao final de 2011 será de mil euros mensais”.

           8) Em 26.12.2016, por escrito particular epigrafado “Aditamento ao contrato de arrendamento para comércio de duração limitada outorgado em 17/5/2011”, os Réus, como 1ºs outorgantes e a A., como 2ª outorgante, acordaram aditar ao acordo previamente celebrado em 17.5.2011, alterando as cláusulas segunda e terceira, acordando na cedência do gozo da fração A por período de 5 anos, com início em 01.6.2011, renovando-se por igual período, se não for denunciado, correspondendo à renda anual o valor de € 12 600, a pagar pela 2ª outorgante em duodécimos de €1 050 e “tendo em consideração as obras de adaptação que terão de ser efetuadas pela segunda, o valor da renda desde a data da celebração do presente contrato até ao final de 2011, será de mil euros mensais”.

           9) Em 26.12.2016, por escrito particular epigrafado “Aditamento ao contrato de arrendamento para comércio de duração limitada outorgado em 17/5/2011”, os Réus, como 1ºs outorgantes e a A., como 2ª outorgante, acordaram aditar ao acordo previamente celebrado em 17.5.2011, alterando as cláusulas segunda e terceira, acordando na cedência do gozo da fração B, por período de 5 anos, com início em 01.6.2011, renovando-se por igual período, se não for denunciado, correspondendo à renda anual o valor de € 4 200, a pagar pela 2ª outorgante em duodécimos de € 350, a manter até dezembro/2021, data a partir da qual, por acordo, estabelecerão o novo valor da renda a vigorar.

           10) Foram faturados por CC, à A., em 10.11.2015, pela construção de anexo ao pavilhão de fabricação, refeitório sala de medição e wc, demolição do anterior refeitório, laje e WC, ampliação da zona de bancadas, abertura de vala e colocação de tubos de ligação do WC e refeitório ao coletor de saneamento, abertura e fornecimento de porta de acesso principal e aplicação e fornecimento de epoxy no pavimento, a quantia de € 26 500, que a A. pagou.

           11) Foram faturados por CC, à A., em 14.12.2015, pela construção de maciços para máquinas, demolição de paredes, edificação de novas paredes na zona de aspiradores, aplicação de tubagens para ar condicionado, aplicação e fornecimento de tinta epoxy no restante pavimento, construção de paredes na zona de entrada do pessoal, alteração de caleiras de alumínio, alteração de WC, aplicação e fornecimento de tubagens novas, bases de chuveiros, lavatórios e urinóis, a quantia de € 32 740, que a A. pagou.

            12) Foram faturados por CC, à A., em 15.6.2016, por trabalhos de demolição de paredes para passagem de máquina, remates de paredes e pavimento, abertura de valas para passagem de esgotos e águas fluviais, demolição de muros de estacionamento para alargamento do mesmo, pintura de toda a fábrica e pavimento, alcatroamento do estacionamento, fornecimento e montagem de ar condicionado e ventilações, fornecimento e montagem de cilindro para águas sanitárias, a quantia de € 47 800, que a A. pagou.

           13) Foram faturados por CC, à A., em 28.12.2016, por trabalhos de construção de divisórias de pladur, barramento e lixamento das mesmas, a quantia de € 5 280, que a A. pagou.

           14) Foram faturados por CC, à A., em 30.12.2016, por trabalhos de remoção de terras e alcatroamento para expansão do parque de estacionamento, a quantia de € 4 685, que a A. pagou.

           15) Foram faturados por CC, à A., em 30.11.2017, por fornecimento e montagem de dois aparelhos de ar condicionado na receção e na sala de desenho, a quantia de € 2 760, que a A. pagou.

           16) Foram faturados por CC, à A., em 04.12.2017, pela reparação e alteração do telhado, colocação de caleira em inox, alteração de descargas de água e drenagem de águas fluviais[1], a quantia de € 4 980, que a A. pagou.

           17) Em 03.5.2019, por documento particular autenticado, epigrafado “Cessação do Título Constitutivo de Propriedade Horizontal”, os Réus declararam pôr termo ao título de constituição de propriedade horizontal, pretendendo a legalização do prédio junto da Câmara Municipal ... como Edifício existente de uma unidade industrial tipo 3, com abolição de propriedade horizontal.

            18) Em 31.12.2017, o prédio identificado em 2), composto por duas frações independentes, “A” e “B”, a fração “A” composta por espaço amplo para armazém, receção, hall, duas instalações sanitárias, dois balneários no r/c e escritório e instalação sanitária no 1º andar e a fração “B” composta por espaço amplo para garagem e telheiro no r/c, rondava os € 177 000.

           19) Caso o prédio tivesse mantido as especificidades descritas em 18)[2], atualmente teria o valor comercial de € 202 000.

            20) Atualmente, o prédio descrito em 2) tem de valor comercial € 303 000.

           21) O prédio identificado em 2), tal como se encontrava em 31.12.2017 teria de valor locatício mensal de € 1 400.

            22) Atualmente, o valor locatício mensal é de € 2 397.

           23) Atualmente o prédio descrito em 2) tem instalações especializadas para empresas do sector de produção de moldes.

           24) Antes das obras realizadas pela A., no prédio descrito em 2), a fração “A” poderia ser utilizado para espaço de armazém e a fração “B”, para garagem e arrumos.

           25) Os trabalhos faturados à A. e discriminados de 10) a 16), não podem ser removidos, por integrados na estrutura pré-existentes.

            26) Atualmente o prédio descrito em 2) encontra-se arrendado a empresa do sector de produção de moldes.

            27) A A. nunca apresentou quaisquer despesas aos Réus.

            2. E deu como não provado:

           a) Que os Réus tenham sido prejudicados pelo facto de deixarem de ter duas frações autónomas, para terem um único prédio com instalações especializadas para empresas do sector de produção de moldes.

           3. a) A A. insurge-se, desde logo, contra a decisão sobre a matéria de facto, porquanto considera que se deverá aditar dois novos factos e retificar a matéria dos factos provados 4), 7) e 9).

            Importa assim averiguar se outra poderia/deveria ser a decisão do Tribunal a quo quanto à factualidade em causa e que interessa ao desfecho dos autos.

            Invoca-se a prova documental junta aos autos.

           b) Na motivação sobre a matéria de facto, o Tribunal a quo afirmou que teve em consideração a prova pessoal produzida em audiência de julgamento (“declarações de parte do Autor e depoimentos das testemunhas”), “o teor das alegações das partes nos respetivos articulados” e “os documentos juntos aos autos pelas partes”.

Mais referiu que “para a prova dos factos descritos em 1. a 17., foram relevados” «escritos particulares, subscritos pelo punho das partes contratantes, epigrafados “Contrato de Arrendamento para comércio de duração limitada”, “acordo de cessação da posição contratual no contrato de arrendamento para comércio de duração limitada outorgado em 20/7/2011”; “aditamento ao contrato de arrendamento para comércio de duração limitada outorgado em 17/5/2011” (...)».

c) Compulsados os autos, e atendendo, designadamente, ao teor dos documentos de fls. 11 verso/110 verso (referente ao contrato de arrendamento celebrado a 17.5.2011), 14/112 verso, 18 verso/115 verso, 20/117 e 21 verso/118 verso, é irrecusável que se verifica a apontada omissão relativa a factos (alegados) que resultam do dito documento de fls. 11 verso/110 verso, verificando-se, ainda, os (demais) lapsos e/ou incorreções invocados na impugnação.

d) Termos em que, na integral procedência da impugnação relativa à matéria de facto, se adita [sob os n.ºs 3-A) e 3-B)] e retifica (art.º 662º, n.º 1, do Código de Processo Civil/CPC):

           3-A) No dia 17.5.2011, por escrito particular epigrafado “contrato de arrendamento para comércio de duração limitada”, os Réus, como 1ºs outorgantes, acordaram com a A., 2ª outorgante, quando a mesma ainda tinha a designação social de B... UNIPESSOAL, LDA. o gozo temporário do prédio urbano sito na Rua ..., ..., descrito na CRP ... sob o n.º ...03, inscrito na matriz sob o artigo ...89..., com licença de utilização n.º 310/2000, de 18.12.2000, com a duração de 5 anos (de 01.6.2011 a 31.5.2016), com renda anual de € 13 200, a pagar pela segunda outorgante em duodécimos de € 1 100.

            3-B) Consta do referido acordo:

           - “Cláusula Oitava: O imóvel é entregue à segunda contraente com todas as suas partes integrantes no estado de funcionamento, sendo da responsabilidade da segunda contraente a adaptação para a sua atividade e a obtenção das respetivas licenças”;

            - “Cláusula Décima Segunda: Todas as obras indispensáveis à conservação e limpeza dos interiores do prédio ficam a cargo da segunda contraente, incluindo a colocação de vidros que se partirem. Passam a fazer parte integrante do locado as obras de beneficiação que possam ser realizadas pela segunda contraente”.

           4) No dia 20.7.2011, por escrito particular epigrafado “contrato de arrendamento para comércio de duração limitada”, os Réus, como 1ºs outorgantes, acordaram com a C..., Lda., o gozo temporário do prédio urbano sito na Rua ..., ..., descrito na CRP ... sob o n.º ...03, inscrito na matriz sob o artigo ...89..., com licença de utilização n.º 310/2000, de 18.12.2000, com a duração de 5 anos e a renda anual de € 3 600, a pagar pela 2ª outorgante em duodécimos de € 300.

           7) Em 01.10.2012, por escrito particular epigrafado “Aditamento ao contrato de arrendamento para comércio de duração limitada, outorgado em 17.5.2011”, os Réus e a A. acordaram aditar ao acordo previamente celebrado (tendo em consideração que a 2ª contraente já se encontrava a arrendar a fração A e B) que a renda anual era de € 12 000 (duodécimos de € 1 000) e que “tendo em consideração as obras de adaptação que terão de ser efetuadas pela segunda, o valor da renda desde a data da celebração do presente contrato até ao final de 2011 será de mil euros mensais”.

           9) Em 26.12.2016, por escrito particular epigrafado “Aditamento ao contrato de arrendamento para comércio de duração limitada outorgado em 20/7/2011”, os Réus, como 1ºs outorgantes e a A., como 2ª outorgante, acordaram alterar as cláusulas segunda e terceira do acordo celebrado em 20.7.2011, com a cedência do gozo da fração B, por período de 5 anos, com início em 01.8.2011, renovando-se por igual período, se não for denunciado, correspondendo à renda anual o valor de € 4 200, a pagar pela segunda outorgante em duodécimos de € 350, a manter até Dezembro de 2021, data a partir da qual, por acordo, estabelecerão o novo valor da renda a vigorar.

4. A Mm.ª Juíza do Tribunal a quo ponderou e decidiu (de mérito):

- Foi celebrado contrato de locação, na modalidade de arrendamento urbano para outros fins, com prazo certo (art.ºs 1022º, 1023º, 1027º e 1108º do CC[3]).

- No confronto com o disposto nos art.ºs 1074º, n.º 5 (na redação existente à data da celebração do contrato - Lei n.º 6/2006, de 27/02), 1273º e 216º, dúvidas inexistem que as obras tituladas pelas faturas discriminadas nos factos 10) a 16), apesar de obras de adaptação do locado à atividade da A., são benfeitorias necessárias, realizadas com autorização dos Réus (e não são passíveis de levantamento sem prejuízo da coisa), como se deduz do contrato, mas igualmente da participação ativa dos Réus na cessação da constituição do prédios descrito em 2), no regime da propriedade horizontal, essencial para que a A. pudesse prosseguir a sua atividade, numa área dimensionada ao seu volume de negócio.

- No que respeita à aplicação do art.º 1074º, n.º 5, verifica-se que em ambos os contratos de arrendamento celebrados, consta: “Cláusula Oitava: O imóvel é entregue à segunda contraente com todas as suas partes integrantes no estado de funcionamento, sendo da responsabilidade da segunda contraente a adaptação para a sua actividade e a obtenção das respetivas licenças”.

- A utilização do termo “responsabilidade” remete inequivocamente para a realização de obras de adaptação, mas igualmente para o seu pagamento, encontrando-se, ainda que implicitamente afastada a hipótese de, no termo da relação de locação, a arrendatária pedir compensação pelas obras realizadas.

- Outra interpretação não pensamos ser possível, até tendo em consideração a previsão expressa, em contrato de aditamento celebrado em 2016, da manutenção da renda de € 1 000 sobre o arrendamento da fração “A”, e de € 350 sobre o arrendamento da fração “B”, acordadas em 2011, até 2021, “tendo em consideração as obras de adaptação que terão de ser efetuadas pela segunda”.[4]

- Daí, a improcedência da compensação pedida, impondo-se absolver os Réus do pedido de pagamento de € 40 000.

5. Consideram-se benfeitorias todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa (art.º 216º, n.º 1). As benfeitorias são necessárias, úteis ou voluptuárias (n.º 2). São benfeitorias necessárias as que têm por fim evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa; úteis as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação, lhe aumentam, todavia, o valor; voluptuárias as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação nem lhe aumentando o valor, servem apenas para recreio do benfeitorizante (n.º 3).

Tanto o possuidor de boa fé como o de má fé têm direito a ser indemnizados das benfeitorias necessárias que hajam feito, e bem assim a levantar as benfeitorias úteis realizadas na coisa, desde que o possam fazer sem detrimento dela (art.º 1273º, n.º 1). Quando, para evitar o detrimento da coisa, não haja lugar ao levantamento das benfeitorias, satisfará o titular do direito ao possuidor o valor delas, calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa (n.º 2).

6. São obrigações do locador: a) Entregar ao locatário a coisa locada; b) Assegurar-lhe o gozo desta para os fins a que a coisa se destina (art.º 1031º).

            O contrato de arrendamento urbano deve ser celebrado por escrito desde que tenha duração superior a seis meses (art.º 1069º, na redação da Lei n.º 6/2006, de 27.02 – aqui aplicável).[5]

            Cabe ao senhorio executar todas as obras de conservação, ordinárias ou extraordinárias, requeridas pelas leis vigentes ou pelo fim do contrato, salvo estipulação em contrário (art.º 1074º, n.º 1). O arrendatário apenas pode executar quaisquer obras quando o contrato o faculte ou quando seja autorizado, por escrito, pelo senhorio (n.º 2). Salvo estipulação em contrário, o arrendatário tem direito, no final do contrato, a compensação pelas obras licitamente feitas, nos termos aplicáveis às benfeitorias realizadas por possuidor de boa fé (n.º 5).[6]

           7. Aos arrendamentos urbanos para fins não habitacionais aplicam-se as disposições especiais dos art.ºs 1108º e seguintes, bem como, com as necessárias adaptações e em conjunto com o regime geral da locação civil, aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regimes especiais (art.º 1108º).

           As regras relativas à responsabilidade pela realização das obras de conservação ordinária ou extraordinária, requeridas por lei ou pelo fim do contrato, são livremente estabelecidas pelas partes (art.º 1111º, n.º 1). Se as partes nada convencionarem, cabe ao senhorio executar as obras de conservação, considerando-se o arrendatário autorizado a realizar as obras exigidas por lei ou requeridas pelo fim do contrato (n.º 2).            

8. A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele (art.º 236º, n.º 1). Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida (n.º 2).

           Reportando-se a este artigo da lei civil substantiva a jurisprudência tem considerado que “na interpretação dos contratos, prevalecerá, em regra, ´a vontade real do declarante`, sempre que for conhecida do declaratário; faltando esse conhecimento, a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante (...)”.[7]

           E, na doutrina, Pires de Lima e Antunes Varela[8] ensinam: “A regra estabelecida no n.º l, para o problema básico da interpretação das declarações de vontade, é esta: o sentido decisivo da declaração negocial é aquele que seria apreendido por um declaratário normal, ou seja, medianamente instruído e diligente, colocado na posição do declaratário real, em face do comportamento do declarante. Excetuam-se apenas os casos de não poder ser imputado ao declarante, razoavelmente, aquele sentido (n.º 1), ou o de o declaratário conhecer a vontade real do declarante (n.º 2). (...) O objetivo da solução aceite na lei é o de proteger o declaratário, conferindo à declaração o sentido que seria razoável presumir em face do comportamento do declarante, e não o sentido que este lhe quis efectivamente atribuir. Consagra-se assim uma doutrina ´objetivista` da interpretação, em que o objetivismo é, no entanto, temperado por uma salutar restrição de inspiração subjetivista. (...) A normalidade do declaratário, que a lei toma como padrão, exprime-se não só na ´capacidade` para entender o texto ou conteúdo da declaração, mas também na ´diligência` para recolher todos os elementos que, coadjuvando a declaração, auxiliem a descoberta da vontade real do declarante.”

            Por seu lado, A. Ferrer Correia sustenta que as declarações de vontade valem com o sentido que for objetivo para as duas partes. Se o sentido que o declarante podia e devia imputar à declaração recebida (por ser aparentemente conforme às reais intenções do autor desta) coincidir com aquele que o declarante do mesmo modo podia e devia julgar acessível à compreensão da outra parte, será esse o sentido jurídico da declaração de vontade.[9]

           9. Em caso de dúvida sobre o sentido da declaração, prevalece, nos negócios gratuitos, o menos gravoso para o disponente e, nos onerosos, o que conduzir ao maior equilíbrio das prestações (art.º 237º).

            Nos negócios formais não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respetivo documento, ainda que imperfeitamente expresso (art.º 238º, n.º 1). Esse sentido pode, todavia, valer, se corresponder à vontade real das partes e as razões determinantes da forma do negócio se não opuserem a essa validade (n.º 2).

           10. Não se produziu prova pessoal sobre a matéria dada como provada relativa aos contratos de arrendamento (aditamentos e cessão da posição contratual), concretamente sobre o seu clausulado, pelo que, para determinar o sentido juridicamente relevante das declarações negociais produzidas, caberá ao Tribunal interpretar o clausulado, designadamente as cláusulas 8ª e 12ª de cada um dos contratos.

             Ficou a constar das referidas cláusulas (contratos de 17.5.2011 e 20.7.2011):

           - Cláusula Oitava: O imóvel é entregue à segunda contraente com todas as suas partes integrantes no estado de funcionamento, sendo da responsabilidade da segunda contraente a adaptação para a sua atividade e a obtenção das respetivas licenças.

           - Cláusula Décima Segunda: Todas as obras indispensáveis à conservação e limpeza dos interiores do prédio ficam a cargo da segunda contraente, incluindo a colocação de vidros que se partirem. Passam a fazer parte integrante do locado as obras de beneficiação que possam ser realizadas pela segunda contraente.

            Delas decorre:

           - A responsabilidade da A./apelante pela execução das obras de adaptação e a obtenção das respetivas licenças;

           - Mas nada se fez constar quanto ao direito – ou não – a ser compensada/indemnizada pela realização de tais obras (e pagamento do preço correspondente);

             -  As benfeitorias (“obras de beneficiação”, i. é, que dão valor acrescentado ao imóvel) ficariam a fazer parte integrante do prédio arrendado;

            - Não consta da cláusula 12ª qualquer referência ao direito a ser compensado/indemnizado pelas obras, à renúncia a esse direito ou a um acordo das partes para que inexista compensação.

           Ante o clausulado, resulta como conteúdo negocial ser da responsabilidade do arrendatário a execução das obras de adaptação e que as mesmas ficariam a fazer parte integrante do local arrendado[10].

           11. O valor pago a título de rendas foi sensivelmente o mesmo ao longo de toda a relação contratual (€ 1 300 a 1 400/mensais), ocorrendo a principal “diminuição” no valor da renda (€ 100/mensais), no tocante à denominada “fração A” e em razão das “obras de adaptação que terão de ser efetuadas”, apenas, durante os últimos 6 ou 7 meses do ano de 2011 – cf., sobretudo, II. 1. 4), 7), 8) e 9), supra, e 3-A) (facto aditado).

           12. Como bem refere a A./recorrente, não se extrai, nem implícita nem explicitamente, do conteúdo de nenhum dos contratos e respetivos aditamentos, que o clausulado definido pelas partes afasta o direito a compensação/indemnização ou que traduz essa intenção[11], interpretação que também levará a um maior equilíbrio contratual (cf. art.ºs 237º e 238º).[12]

           13. Nos anos de 2015 a 2017 a Ré pagou a quantia de € 124 745 com a realização de obras de beneficiação/investimentos num espaço que lhe não pertencia [cf. II. 1. 10) a 16), supra], período em que não terá havido decréscimo algum no valor das rendas [cf., sobretudo, II. 8) e 9), supra - levando em conta a  nova redação aludida em II. 3. d), supra].

            Daí, face, nomeadamente, ao preceituado nos art.ºs 216º, 1074º, n.º 5 e 1273º, a A. deverá ser compensada pelas benfeitorias necessárias (e/ou úteis, porquanto aumentaram significativamente o valor do imóvel) [cf. II. 1. 19), 20), 21) e 22), supra] que não podem ser removidas sem o detrimento da coisa [cf. II. 1. 25), supra], sendo que o direito a compensação apenas seria afastado se assim expressamente convencionado pelas partes, o que não sucedeu.

            14. As partes sempre convergiram quanto à natureza e objeto do contrato de arrendamento em análise.

           O despacho convite ao aperfeiçoamento da p. i. proferido a 31.3.2022 dirigiu-se, principalmente, à concretização das obras realizadas pela A. que não podiam ser levantadas (sem prejuízo para a coisa) e que beneficiaram o local arrendado, e bem assim a conferir um valor a cada um desses melhoramentos.

           Daí o articulado junto pela A. em 29.4.2022, no qual se reproduziu a p. i. (inicial), completada/integrada pelos elementos que considerou responderem àquele convite do Tribunal.

            Foram tais obras concretizadas e enumeradas sob os art.ºs 21º e seguintes, matéria que veio a integrar a factualidade provada descrita em II. 1. 10) a 16), supra.

           Decorre também dos autos e da factualidade provada que os Réus nunca se opuseram às transformações operadas no espaço arrendado e que, considerando, apenas, o período posterior a finais do ano de 2017, o prédio teve uma valorização de cerca de € 101 000 e um incremento do valor locatício de aproximadamente € 1 000/mensais – cf., sobretudo, factos 3-B), 5), 17), 18), 19), 20), 21), 22), 23) e 26), supra.

           15. Ou seja, a alegação contida nos art.ºs 38º a 40º da contestação não obteve a menor comprovação - utilizando expressão empregue pelos Réus, podemos dizer que se confirma “real e efetivo benefício para o imóvel” (cf., por exemplo, art.ºs 14º, 23º e 36º do articulado/resposta de 09.5.2022).

           16. Como vimos, a A. pretende que lhe seja atribuída uma compensação pelos valores despendidos com as obras de melhoramento ou beneficiação efetuadas no prédio dos Réus.

           Apontou para o valor de € 40 000, que diz ter quantificado parcimoniosamente “atendendo a que também beneficiou das obras que foram executadas e que as mesmas possibilitaram o seu crescimento e desenvolvimento” (art.º 68º da p. i.).

           Em contexto extrajudicial, os Réus reconheceram a existência das benfeitorias em causa e “consideraram poder atribuir alguma compensação por obras realizadas” (cf. art.ºs 66º da p. i. e 50º do articulado/resposta de 09.5.2022), questionando, agora, é certo: «(...) a autora não tem um critério definido, veja-se que alega que gastou mais de 120 000,00 euros, mas pede 40 000,00 euros! Baseia em quê?» (cf. art.º 46º da contestação)[13].

           17. Ora, atendendo à factualidade provada, às descritas posições das partes, à circunstância de também se poder concluir que a A. acabou por “beneficiar” de uma renda reduzida em cerca de € 1 000/mês durante os anos de 2018 a 2021, num total de € 45 000 a € 50 000 [cf. II. 1. 21) e 22), 11. e 14., supra] e, por último, perspetivando que relegar para eventual incidente de liquidação (art.º 609º, n.º 2, do CPC) um qualquer valor contido naquela importância pedida de € 40 000 redundaria, muito provavelmente, em prejuízo para todos!, entendemos que se poderá/deverá atribuir uma compensação no montante de € 20 000 (vinte mil euros), que se afigura adequada/razoável/equitativa e suficiente, inclusive, no sentido de afastar/remover o comprovado indevido enriquecimento dos Réus (por efetivo incremento patrimonial), à custa da A., transferindo-o para o património desta (art.º 473º).[14]

           18. Procedem, assim, parcialmente, as “conclusões” da alegação de recurso.


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           III. Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso, modificando-se a decisão de facto como se indica em II. 3. d), supra, e condenando-se os Réus a pagar à A. a quantia de € 20 000 (vinte mil euros), mantendo-se o demais decidido.

Custas, nas instâncias, em partes iguais, por A. e Réus.


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24.9.2024



[1] Existirá lapso, ainda que também assim designado nos articulados...
[2] Retificou-se lapso manifesto (na concordância), sem prejuízo do mais que constitui, em parte, objeto da impugnação da decisão de facto.
[3] Diploma a que pertencem as disposições doravante citadas sem menção da origem.
[4] Existem lapsos/erros quanto a datas e períodos de tempo, como decore da factualidade mencionada em II. 1. e II. 3. d), supra.
[5] Regra mantida nos diplomas ulteriores (Lei n.º 31/2012, de 14.8 e Lei n.º 13/2019, de 12.02), hoje, incluída no n.º 1 do mesmo artigo.
[6] Redação (conferida pela Lei n.º 6/2006, de 27.02) mantida (quanto aos referidos n.ºs 1, 2 e 5) pela Lei n.º 13/2019, de 12.02.

[7] Cf., de entre vários, os acórdãos do STJ de 14.01.1997 e de 20.10.2009-processo 1307/06.9TBPRD.S1, publicados na CJ-STJ, V, 1, 47 e no “site” da dgsi, respetivamente.

   Cf., ainda, acórdão da RP de 15.4.2008-processo 0820133 [com o sumário: «Segundo a teoria da impressão do destinatário, o alcance decisivo da declaração será aquele que em abstrato lhe atribuiria um declaratário razoável, medianamente inteligente, diligente e sagaz, colocado na posição concreta do declaratário real, em face dos termos da declaração, das circunstâncias que este efetivamente conheceu aquando da sua emissão, bem como das circunstâncias concomitantes, anteriores e posteriores que com ela se relacionem, dos interesses em jogo e do seu razoável tratamento, da finalidade prosseguida pelo declarante, dos usos, da prática e da lei.» ], publicado no “site” da dgsi.
[8] In CC Anotado, Vol. I, 3ª edição, Coimbra Editora, 1982, págs. 222 e seguinte.

   Vide ainda, entre outros, A. Pinto Monteiro, Negócio jurídico e contrato de sociedade comercial, in RLJ, 136º, págs. 96 e seguintes e Paulo Mota Pinto, Declaração Tácita e Comportamento Concludente no Negócio Jurídico, pág. 208, que refere: “A lei não se basta, contudo, com o sentido compreendido realmente pelo declaratário (entendimento subjetivo deste), concedendo primazia àquele que um declaratário normal colocado na posição do real declaratário depreenderia (sentido objetivo para o declaratário). Há que imaginar uma pessoa com razoabilidade, sagacidade, conhecimento e diligência medianos, considerando as circunstâncias que ela teria conhecido e o modo como teria raciocinado a partir delas, mas figurando-a na posição do real declaratário, isto é, acrescentando as circunstâncias que este concretamente conheceu, mesmo que um declaratário normal delas não tivesse sabido…”.
[9] Vide A. Ferrer Correia, Erro e Interpretação na Teoria do Negócio Jurídico, Almedina, 1985, págs. 200 e seguinte.
[10] Com o sentido objetivo expresso no art.º 43º da contestação: “Nos termos contratados passarem a ser do imóvel e não poderem ser removidas.”

[11] Sobre esta problemática, na jurisprudência, cf., de entre vários, acórdãos (sublinhado nosso) do STJ de 02.3.2021-processo 30412/15.9T8PRT.P1.S1 [no caso, fizera-se constar do contrato: “a arrendatária (a expensas exclusivamente por sua conta) fica desde já autorizada pela senhoria, a fazer no local arrendado, as obras necessárias aos fins a que o mesmo se destina e, todas as benfeitorias que fizer ficarão a pertencer ao local arrendado, sem direito a qualquer indemnização ou retenção”] e da RP de 28.11.2007-processo 0726218 [concluindo-se: «4. Sendo os contraentes inteiramente livres para fixar os termos do contrato a que se vinculam, desde que não exista lei imperativa ou ofensa dos bons costumes, nada obsta à validade da cláusula contida em contrato de arrendamento, segundo a qual as benfeitorias realizadas pelo arrendatário não lhe dão direito a qualquer indemnização.] e 11.9.2023-processo 1200/20.2T8PFR.P1 [sumariando-se: “II - Nos contratos de arrendamento para fins não habitacionais, face à previsão do n.º 1 do art.º 1111º Código Civil e tal como ocorre no regime do contrato de arrendamento para habitação, a responsabilidade pela realização das obras ordinárias ou extraordinárias requeridas por lei ou pelo fim do contrato, fica sujeita à livre estipulação das partes. III - Apenas na falta de estipulação das partes tem aplicação o regime supletivo previsto no n.º 2 do preceito. IV - Este regime tem de especifico “a dispensa de consentimento do senhorio para que o inquilino possa realizar as obras «exigidas por lei ou requeridas pelo fim do contrato»”; em causa um contrato misto de arrendamento para habitação e para fins não habitacionais, tendo ficado acordado que no final do arrendamento as obras (de manutenção) entretanto realizadas revertiam a favor do imóvel, sem direito a qualquer indemnização ou direito de retenção por parte dos arrendatários], RL de 18.01.2007-processo 8710/2006-2 [com o sumário: «(...) III – É válida a cláusula contratual inserta num contrato de arrendamento comercial segundo a qual as benfeitorias realizadas no locado não dão direito a indemnização do arrendatário pelo senhorio.»] e 06.5.2008-processo 10362/2007-1 [referindo o sumário: «IV - Em matéria de benfeitorias feitas no imóvel arrendado, o art.º 1046º, n.º 1, do Cód. Civil equipara o arrendatário, salvo estipulação em contrário, ao possuidor de má fé, regime aplicável se o não for a normatividade do art.º 1036º CC acerca de reparações ou outras despesas urgentes (cf. a ressalva contida na 1ª parte do cit. art.º 1043º/1). V - A referida equiparação do locatário ao possuidor de má fé, quanto às benfeitorias por si feitas no locado, consequência que, quando não conste do contrato (e geralmente consta) uma cláusula a declarar perdidas a favor do senhorio todas as benfeitorias realizadas pelo arrendatário durante a sua prudente utilização do prédio arrendado, terá este direito a ser indemnizado unicamente pelas benfeitorias necessárias, e a levantar as benfeitorias úteis, que o possam ser sem detrimento da coisa (art.º 1273º CC).»] e RC de 19.3.2024-processo 522/20.7T8LMG.C1 [assim sumariado: «(...) VIII - É válida a cláusula pela qual as benfeitorias realizadas pelo arrendatário não dão lugar a qualquer indemnização. IX - Esta convenção, mesmo concluída na sequência de um diálogo negocial, não é imune aos princípios gerais de controlo que decorrem da ponderação dos valores fundamentais do direito em face da situação considerada, dados pela ordem pública, na vertente, designadamente, do equilíbrio contratual, pelos bons costumes e pelo mandamento da boa fé ou pelo fim social ou económico do direito, mas para o exercício desse controlo é indispensável a aquisição dos factos materiais que consubstanciem a contravenção daqueles valores essenciais.»; referiu-se na fundamentação: «Consta ainda do contrato escrito a possibilidade do arrendatário realizar no local arrendado as obras necessárias à sua instalação mas, findo o contrato as mesmas fariam parte integrante do imóvel sem direito a indemnização ou retenção pelo arrendatário (...) (cláusula 6ª, nºs 1 e 2).»], publicados no “site” da dgsi. 

[12] Cf., por exemplo, acórdão do STJ de 07.3.2019-processo 189/13.9TBALQ.L1.S1, publicado no “site” da dgsi.

[13] Idêntica a posição expressa na resposta à alegação de recurso: «Aliás, é a própria recorrente que na sua petição lança para o ar um valor alegadamente a título de compensação por obras, sem que se compreenda porque motivo foi aquele o valor e não um qualquer outro.»

[14] Sobre a matéria, cf., nomeadamente, acórdãos do STJ de 28.4.1998-processo 98A371 [com o sumário: «I - A indemnização pelas benfeitorias efetuadas pelos arrendatários no prédio locado é calculada de harmonia com as regras do enriquecimento sem causa, o que significa que com essa indemnização quer a lei suprimir ou eliminar o enriquecimento injustificado do senhorio à custa do arrendatário. II - A medida desse enriquecimento não tem de corresponder ao custo das obras que os autores fizeram e com que beneficiaram os prédios o que só poderia verificar-se se se provasse que os réus efectivamente enriqueceram nessa medida; tão pouco se pode, sem mais, fazer corresponder a medida do empobrecimento dos autores ao custo despendido com e nas obras. III - Se dos autos não consta qual o valor dos prédios antes e depois das obras para se poder aferir o valor em que ficaram beneficiados, a fixação da indemnização deve ser relegada para momento posterior (liquidação em execução da sentença).https://www.dgsi.pt/icons/ecblank.gifhttps://www.dgsi.pt/icons/ecblank.gif»], 06.3.2007-processo 07A222 e 22.01.2008-processo 07A4154, publicados no “site” da dgsi.