Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
4966/04.3TBLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ISABEL FONSECA
Descritores: RECURSO
MATÉRIA DE FACTO
APRECIAÇÃO DA PROVA
EMPREITADA
SUBEMPREITADA
Data do Acordão: 01/13/2009
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Legislação Nacional: ARTIGOS 690º, Nº1 E 690º A DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL; ARTIGOS 2.º E 3.º DO DEC. LEI N.º 59/99, DE 02/03
Sumário: 1. Não se justifica a prolação de despacho de rejeição do recurso quando o apelante, impugnando o julgamento da matéria de facto feito pelo tribunal ad quo, em cumprimento das exigências impostas pelo legislador (artigos 690º, nº1 e 690º A do Código de Processo Civil), enuncia os motivos/razões da sua discordância relativamente àquele julgamento de forma suficientemente perceptível ao tribunal ad quem (e, necessariamente, à parte contrária).
2. O recurso sobre a matéria de facto fixada pela 1ª instância destina-se a obviar a erros ou incorrecções eventualmente cometidas pelo julgador; Está em causa, portanto, aferir da existência de erros notórios na apreciação da prova.
3. Tendo-se as partes socorrido de determinada terminologia – subempreitada por “série de preços” – quando estipularam (livremente) as cláusulas contratuais, vertendo essa classificação no contrato, conclui-se que se apropriaram dos conceitos definidos no Dec. Lei 59/99 de 2 de Março, conceitos que têm um conteúdo muito preciso e que, com naturalidade, é adquirido pelos profissionais, nas respectivas áreas de actividade; Daí não resulta que seja aplicável o regime instituído no referido diploma, reservado às empreitadas de obras públicas e que tem o âmbito de aplicação que decorre do disposto nos artigos 2º e 3º.
4. No contrato de subempreitada tudo se passa como se o empreiteiro (aqui ré) assumisse perante o subempreiteiro (a autora) a qualidade de dono da obra; No entanto, quando a supressão de trabalhos ao subempreiteiro, decorrente de alteração do projecto, é consequência de uma decisão de terceiro, o dono da obra, decisão à qual foi alheia o empreiteiro e, na sequência dessa decisão, o subempreiteiro – que aceitou, sem reclamação, a alteração decidida – e o dono da obra contactam directamente um com o outro, encetando negociações, não é admissível a demanda do empreiteiro com vista ao ressarcimento dos prejuízos patrimoniais daí resultantes, maxime, pelos lucros que o subempreiteiro terá deixado de auferir.
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes da 1ª secção do Tribunal da Relação de Coimbra

(Relator: Isabel Fonseca; Adjuntos: Des. Távora Victor e Des. Nunes Ribeiro)

RELATÓRIO

A......, com sede em ……, intentou a presente acção com forma de processo suE...... contra B......, com sede em……. pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 54.303,07, acrescida dos respectivos juros de mora vencidos, à taxa de 12% e ainda os vincendos, até efectivo e integral pagamento.

Para fundamentar a sua pretensão invoca que:

Em 22.02.2002, celebrou com a ré um contrato de subempreitada para a execução de trabalhos constantes de uma proposta que a autora apresentara, tendo a ré adjudicado à autora trabalhos orçamentados em 1.198.671,12 €; Nessa proposta constavam vários preços unitários, tendo a autora estabelecido maiores margens de lucro para alguns e menores para outros, assim se compensando as margens de lucro reduzidas para alguns desses trabalhos.

Em Janeiro de 2003, a ré contratou outro empreiteiro para a execução de alguns trabalhos incluídos na proposta da autora e que se encontravam orçamentados em 89.038,42 € (artigo 2.3 da proposta) e 229.746,31 € (artigo 2.5 da proposta).

A autora nunca teria contratado com a ré a subempreitada caso estes trabalhos não estivessem incluídos, por serem aqueles que maior margem de lucro lhe ofereciam.

Assim, a autora deixou de auferir um benefício no montante total de 53.303,07 €, respeitante ao lucro que iria obter com o ponto 2.5 da proposta e com o ponto 2.3 da mesma, tendo a autora reclamado o pagamento desta quantia perante a ré, que nada pagou.

A ré contestou, impugnando os factos alegados pela autora e invocando, em síntese, que:

A ré não adjudicou à autora a obra por um “preço global”, tendo a adjudicação sido feita por série de preços unitários, pelo que apenas competia à ré pagar os trabalhos efectivamente realizados pela autora.

 Determinados trabalhos ficaram fora da empreitada por culpa exclusiva da autora que, relativamente aos mesmos e perante uma alteração ao “tipo de calçada dos passeios”, aceitou a alteração, não reclamou, e apresentou preço superior ao que foi apresentado por outra empresa, o que levou o dono da obra (e não a ré) a contratar com esta empresa e não com a autora.

Foi elaborado despacho saneador, com selecção da factualidade assente e elaboração de base instrutória.

Realizou-se audiência de julgamento.

Respondeu-se aos quesitos, sem reclamações, e proferiu-se sentença que concluiu da seguinte forma:

“Pelo exposto julgo a acção totalmente improcedente por não provada pelo que absolvo a ré do pedido.

Custas pela autora”

Não se conformando, a autora recorreu, peticionando a revogação da decisão com a consequente condenação da ré no pedido.

Formula as seguintes conclusões:

“1. O Meret.° Juiz do Tribunal a quo fez uma interpretação incorrecta das normas do Código Civil, nomeadamente dos artigos 1207.° e ss., do Código de Processo Civil, bem como do Decreto-Lei n.° 59/99 de 02 de Março, que estabelece o Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas;

2. A presente acção judicial tem como causa de pedir o contrato de subempreitada celebrado em 22 de Fevereiro de 2002, entre a Apelante e a Apelada, cujo objecto era a execução de todos os trabalhos de infra-estruturas referentes à obra da Apelada n.° 79 - Loteamento dos Covões, Portalegre -, devidamente discriminados nas paginas 3 a 19 da proposta da Apelante efectuada em 08 de Fevereiro de 2002;

3. Assim, os contraentes do contrato de subempreitada são duas entidades colectivas de direito privado, nomeadamente a Apelante e Apelada Aliás, a própria dona da obra - Figueiredo Neves e Marques, Lda. - é igualmente uma entidade colectiva de direito privado;

4. Por sua vez, o objecto do contrato de empreitada é uma obra privada;

5. Por conseguinte, in casu, são aplicáveis as normas referentes ao contrato de empreitada, previstas nos artigos 1207.° e ss. do Código Civil, e não o regime previsto no Decreto-Lei n.° 59/99 de 02 de Março;

6. Ainda que assim não se entendesse, e se considerasse que o Decreto-Lei n.° 59/99 de 02 de Março era aplicável ao caso dos autos, por mera cautela, estaríamos perante um contrato de subempreitada por preço global e não por série de preços, aliás, como decorre do citado diploma legal, bem como dos depoimentos prestados pelas testemunhas em sede de audiência de discussão e julgamento;

7. Como decorre do teor do contrato, bem como dos Factos Assentes, o contrato de subempreitada celebrado entre Apelante e Apelada, tem como objecto a execução de todos os trabalhos de infra-estruturas da obra denominada "Loteamento dos Covões", sita em Portalegre, devidamente discriminados na proposta da Apelante datada de 08 de Fevereiro de 2002 e que faz parte integrante do contrato.

8. O contrato de subempreitada celebrada por Apelante e Apelada, só podia ser alterado por acordo entre ambas. Sendo que, não havendo acordo, só o tribunal poderia determinar as alterações e fixar as correspondentes modificações, quanto ao preço e prazo de execução.

9. Ao decidir nos termos constantes na douta sentença, o Meret.° Juiz do Tribunal a quo violou o estatuído nos artigos 406.°, 1215.° e 1216.°, todos do Código Civil;

10. No caso sub judice, como resulta claramente do depoimento de todas as testemunhas, a Apelada alterou unilateralmente o contrato de subempreitada que celebrou com a Apelante.

11. A Apelante nunca aceitou as alterações contratuais que lhe foram impostas pela Apelada. Daí que nunca tenha assinado o livro de obra.

12. Os trabalhos cuja execução foi abusivamente retirada à Apelante, tinham sido determinantes na decisão desta de contratar com a Apelada ou, pelo menos, na determinação do preço acordado.

13. Assim que a Apelante foi contactada pela Apelada para efectuar uma proposta acerca do preço para a calçada em cubos de granito, de imediato, elaborou e enviou a mesma aquela. No entanto, até hoje, a Apelada não deu qualquer resposta à proposta que lhe foi enviada pela Apelante.

14. A dona de obra - entidade totalmente estranha ao relacionamento contratual existente entre Apelante e Apelada - não podia, nem pode, alterar, por qualquer forma, o contrato de subempreitada celebrado entre aquelas.

E, muito menos, pode a dona da obra restringir o objecto do contrato de subempreitada, retirando do seu âmbito alguns dos trabalhos aí contemplados - por coincidência, os que proporcionam uma maior margem de lucro - e adjudicar a execução dos mesmos a outra entidade.

15. A aceitar-se o entendimento vertido na douta sentença, acerca da licitude das alterações contratuais impostas pela Apelada e pela dona da obra, estaremos a subverter as mais elementares regras de direito, permitindo que uma entidade estranha a um relacionamento contratual estabelecido entre empreiteira e subempreiteira - no caso, a dona da obra — possa validamente interferir no mesmo, alargando ou restringindo o seu objecto”.

A ré apresentou contra alegações, formulando as seguintes conclusões:

“1) A apelante não impugnou a matéria de facto, nem pediu a sua reapreciação, pois das suas conclusões não resultam quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, nem quais os meios probatórios que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto diversa da recorrida, como é imposto obrigatoriamente pelo art.° 690 — A do CPC.

2) Não tendo impugnado a decisão de facto, e tendo apresentado as suas alegações ao 40º dia, devem ter-se estas por extemporâneas e os recurso ser julgado deserto com as legais consequências.

3) Tendo-se provado na alínea "L" da matéria de facto que a "adjudicação pela Ré da proposta da Autora foi feita por série de preços unitários, ou seja, a autora só executaria os trabalhos que, no decorrer da obra, viessem a mostrar-se necessários. E a Ré só lhe pagaria esses e não quaisquer outros", a acção só poderia improceder, como aconteceu.

4) A decisão recorrida não se fundou nas normas do Dec. Lei 59/99 de 2 de Março mas nas do Código Civil.

5) Provou-se que a apelante aceitou sem qualquer reclamação ou reserva a alteração da empreitada e apresentou um orçamento para a mesma, pelo que esta acção representa um "venine contra factum próprio" e como tal deve a apelante ser condenada como litigante de má fé.

6) A apelante não provou quaisquer prejuízos resultantes da alteração da empreitada, pelo que, também por esse lado a acção tinha de improceder”.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

II. FUNDAMENTOS DE FACTO

A 1ª instância deu por provada a seguinte factualidade, aditando esta Relação a respectiva proveniência com referência à base instrutória, rectificando-se ainda o lapso evidente que consta da matéria alusiva à resposta ao quesito 12º (remeteu-se aí para a alínea A) da factualidade assente, e não a alínea B), como se impunha atento o despacho de rectificação proferido em audiência de julgamento, a fls. 129 dos autos):

A) A autora dedica-se à actividade de construção civil e obras públicas.

B) No seguimento de solicitação da ré, a autora elaborou uma proposta orçamentada para uma subempreitada de trabalhos de infra-estruturas a desenvolver por si, numa obra localizada no loteamento dos Covões, em Portalegre (obras da Urbanização do Planalto).

C) Tal proposta foi enviada pela autora à ré em 08.02.2002.

D) A ré aceitou a proposta da autora relativamente aos trabalhos identificados na mesma.

E) Em consequência, em 22.02.2002, foi celebrado entre a autora e a ré, um contrato de subempreitada, para a execução dos trabalhos constantes da proposta da autora, conforme resulta da cláusula 2ª do referido contrato, onde se escreveu “os trabalhos a considerar serão: Os mencionados mas páginas 3 a 19 da nossa proposta, datada de 08.02.2002”. A proposta da autora é parte integrante do mesmo.

F) A autora executou os trabalhos contratados, os quais tiveram por base um estudo exaustivo dos preços unitários da proposta.

G) Os trabalhos referidos na dita proposta nos artigos 2.3 e 2.5 encontravam-se aí orçamentados em 89.038,42 € e 229.746,31 €, respectivamente.

H) A autora reclamou junto da ré o pagamento da quantia de 54.303,07 €, por carta datada de 29.03.2004.

I)  A ré declinou a sua responsabilidade pelo pagamento da quantia peticionada, por carta enviada à autora em 23.04.2002.

J) O valor acordado para a execução dos trabalhos contratados era de um milhão cento e noventa e oito mil, seiscentos e setenta e um euros e doze cêntimos (resultante da soma de todos os itens relativos a cada trabalho a efectuar) (resposta ao quesito 1º).

K) A proposta assim elaborada pela autora e aceite pela ré, considerada na sua globalidade, criava uma determinada expectativa de lucro para a primeira (resposta ao quesito 2º).

L) A adjudicação pela ré da proposta da autora a que se alude em D) e E) foi feita por série de preços unitários, ou seja, a autora só executaria os trabalhos que, no decorrer da obra, viessem a mostrar-se necessários. E a ré só lhe pagaria esses e não quaisquer outros (resposta aos quesitos 9º e 10º).

M) Como é normal em todas as obras, também nesta houve trabalhos a mais e trabalhos a menos, sendo o total facturado pela autora à ré de € 1.105.597,15 (resposta ao quesito 11º).

N) A dona das obras a que se alude em B), e que as deu de empreitada à ré, é a sociedade C......, com sede em Leiria, competindo à dona da obra definir os trabalhos a executar na Urbanização (resposta aos quesitos 12º e 13º).

O) Quando o projecto de tais obras foi aprovado pela Câmara Municipal, esta exigiu que os passeios fossem revestidos com mosaico cerâmico, do tipo designado por Calçada 2000 (resposta ao quesito 14º).

P) Após a aprovação do projecto, que ocorreu em Julho de 2001, houve eleições autárquicas e mudou o executivo camarário, e com ele mudos o corpo técnico da Câmara Municipal de Portalegre (resposta ao quesito 15º).

Q) A nova direcção do departamento de obras da Câmara entendeu que a calçada cerâmica oferecia desvantagens em relação à calçada em cubos de granito e sugeriu à dona da obra que fizesse a substituição de uns por outros, a qual aceitou a sugestão (resposta ao quesito 16º).

R) A dona da obra comunicou à autora e à ré a decisão de alterar o tipo de calçada dos passeios e solicitou à autora que apresentasse preço para a alteração, tendo este facto ficado registado no livro de obra respectivo (resposta ao quesito 17º).

S) A autora aceitou, sem qualquer reclamação ou reserva, a alteração decidida e apresentou no dia 20.2.2002, um orçamento para os trabalhos alterados (resposta ao quesito 18º).

T) Como o orçamento da autora era superior a outro obtido pela dona da obra, esta mandou executar essa parte da obra a outro empreiteiro, retirando-a da empreitada (resposta ao quesito 19º).

U) Em reunião onde esse assunto foi discutido, a ré aceitou a decisão do dono da obra e a autora, por seu turno, disse não poder acompanhar o orçamento apresentado por outra empresa (resposta ao quesito 20º).

V) E foi a dona da obra quem contratou tal empreiteiro e lhe pagou os trabalhos que realizou (resposta ao quesito 21º).

III. FUNDAMENTOS DE DIREITO

1. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pela apelante e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras – arts. 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do C.P.C. – salientando-se, no entanto, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito –  art.º 664 do mesmo diploma.

Considerando a delimitação que decorre das conclusões formuladas pela recorrente, e a posição da recorrida, assentamos que, no caso dos autos, está em causa apreciar:

- da tempestividade das alegações de recurso da autora

- do erro no julgamento da matéria de facto;

- da caracterização do contrato/regime aplicável;

- do direito de indemnização da autora.

2. Está em causa apreciar a resposta do tribunal a todos os quesitos da base instrutória, à excepção do 2º, sustentando a apelante que os depoimentos de algumas testemunhas justificaria decisão diferente, isto é, que se respondesse positivamente aos quesitos 1º (que mereceu resposta restritiva) e 3º a 8º, inclusive (que mereceram resposta negativa) e se respondesse não provado a todos os demais quesitos, que mereceram resposta positiva (9º a 19º e 21º) e restritiva (20º), sendo que se procedeu à gravação da prova produzida em audiência de julgamento. Os quesitos 1º a 8º correspondem à versão factual que a apelante fez constar na petição inicial e os quesitos 9º e seguintes traduzem a alegação da ré. 

A decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação nos casos especificados no art. 712º do C.P.C., a saber:

a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artº 690º-A, a decisão com base neles proferida;

b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas;

c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.

Por outro lado, e para além do que dispõe o art. 690º, nº1, releva o art. 690º-A do mesmo diploma, nos termos do qual:

 “1. Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”.

A recorrida sustenta que a autora/apelante não deu cumprimento ao disposto no referido preceito (art. 690ºA do C.P.C) porquanto, “lidas as conclusões, em nenhuma delas, a recorrente diz quais os pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados e muito menos quais os concretos meios probatórios constantes do processo que impunham decisão diversa da recorrida sobre os pontos da matéria de facto assente”. Acrescenta que nem é pedida a reapreciação da prova gravada pelo que não deve ter-se por impugnada a matéria de facto e, como tal, as alegações, não foram apresentadas no prazo legal (30 dias), devendo julgar-se deserto o recurso.

Não cremos que assim seja, como se passa a demonstrar.

Nas alegações de recurso a apelante indica, com toda a clareza, quais os quesitos cuja resposta entende incorrecta, identificando-os – aqueles que supra se enunciou. Em simultâneo e porque refere que “a resposta à matéria de facto é contrária à prova testemunhal produzida”, indica um conjunto de testemunhas cujo depoimento o tribunal a quo não relevou, por confronto com outros a que atendeu (indevidamente, no entender da apelante), efectuando a transcrição de partes substanciais desses depoimentos, exactamente aquelas passagens que entende relevantes, opinando sobre a credibilidade dessas testemunhas. Ou seja, lendo as alegações de recurso, é absolutamente perceptível a esta Relação – e, consequentemente, não pode deixar de o ser para a parte contrária, a ré – os motivos de discordância da apelante relativamente à decisão que a 1ª instância tomou em sede de julgamento da matéria de facto.

Como se referiu no Ac. STJ de 13/07/2006, “com as normas atinentes à interposição de recurso e apresentação de alegações, pretendeu o legislador criar um conjunto de regras de natureza prática, a observar pelos recorrentes, que permitam ao Tribunal “ad quem” apreender, de forma clara, as razões fácticas e jurídicas que corporizam a dissidência relativamente ao julgado, de modo a que o Tribunal as aprecie com rigor: nem mais nem menos, do que é pedido, com ressalva das matérias oficiosamente cognoscíveis.

A exigência da apresentação de “conclusões” insere-se neste mesmo propósito mas desta feita, tendo especificamente em vista a apresentação de um quadro sintético – em resumo – das questões que se pretende ver apreciadas, de modo a que o Tribunal percepcione, rápida e facilmente, o fundamento do recurso, assim se assegurando, em última instância, “... a defesa dos direitos e a objectividade da sua realização” (cfr. Ac. T.C. nº 715/96 in D.R. II Série, de 18/3/97)”.[[i]]

Assim sendo, a referência sucinta que é feita nas conclusões do recurso – cfr. as conclusões nºs 6 e 10º – é suficiente, quando devidamente enquadrada na restante alegação da apelante. Se não se entendesse assim, então teríamos que equacionar a prolação de despacho convidando a apelante ao aperfeiçoamento das conclusões de recurso, tendo em conta o princípio de cooperação consignado no art. 266º do C.P.C. e, por similitude de razões (art. 10º nº2 do Cód. Civil), o disposto no art. 690º, nº4 do C.P.C. – vide, ainda, o art. 265º do C.P.C. [ [ii] ]

Conclui-se, pois, que falecem os argumentos da recorrida/apelada.

                                             *   

Vejamos, então, em que termos se deve processar a reapreciação da prova produzida.

Na sequência do alargamento dos poderes de sindicância da decisão sobre a matéria de facto, por parte da Relação, tem a jurisprudência convergido em determinados parâmetros de intervenção.

Desde logo, e fazendo apelo ao preâmbulo do Dec. Lei 39/95 de 15 de Fevereiro, [ [iii]  ] o recurso não pode visar a obtenção de um segundo julgamento sobre a matéria de facto, mas tão só obviar a erros ou incorrecções eventualmente cometidas pelo julgador.

Depois, não pode o tribunal da Relação pôr em causa regras basilares do nosso sistema jurídico, o princípio da livre apreciação da prova – arts. 396º do C.C. e 655º, nº1 – e o princípio da imediação, sendo inequívoco que o tribunal de 1ª instância encontra-se em melhores condições para apreciar os depoimentos prestados em audiência. O registo da prova, pelo menos nos moldes em que é processado actualmente nos nossos tribunais – mero registo fonográfico –, “não garante a percepção do entusiasmo, das hesitações, do nervosismo, das reticências, das insinuações, da excessiva segurança ou da aparente imprecisão, em suma, de todos os factores coligidos pela psicologia judiciária e dos quais é legítimo ao tribunal retirar argumentos que permitam, com razoável segurança, credibilizar determinada informação ou deixar de lhe atribuir qualquer relevo”. [  [iv] ]

O que não obsta, necessariamente, à apreciação crítica da fundamentação da decisão de 1.ª instância, não bastando uma argumentação alicerçada em mero poder de autoridade.

                                             *                    

Depois de se proceder à audição dos depoimentos constantes do registo- áudio, entendemos que não se justifica qualquer alteração à resposta aos quesitos aludidos pela apelante, sendo que, no caso em apreço, a Sra. Juiz até fundamentou devidamente essa resposta, conjugando os vários depoimentos e analisando-os com recurso a regras de experiência comum, em suma, valorando, criticamente a prova produzida, como impõe o art.653º, nº2 e explicando o seu percurso de avaliação.
Pode ler-se no despacho de fundamentação:
“(… )As testemunhas da ré explicaram a diferença entre a empreitada por valor global e por série de preços, na qual apenas o que é verdadeiramente executado é pago, sendo descontados os itens que não são realizados. Que foi acordado entre autora e ré, com o conhecimento do dono da obra, e nos termos do contrato, que seria sempre por série de preços e que, a certa altura, tendo o dono da obra alterado determinadas espécies de trabalho e devido ao facto de a autora não acompanhar propostas de outras empresas foram tais trabalhos retirados à autora e como tal descontados no valor previsto. Para as respostas dadas aos pontos 12° a final foram fundamentais os esclarecimentos prestados pelo gerente da dona da obra (José Pereira dos Santos), que referiu o conhecimento que teve do contrato de subempreitada e a reunião havida entre todos (incluindo gerente da autora) conforme cópia de reunião de obra a fis 45 de onde consta no ponto 1: "Na sequência de conversas anteriores sobre a substituição do trabalho previsto inicialmente em "Calçada 2000" por calçada em granito de Alpalhão e, perante o preço proposto para execução do novo trabalho, o dono da obra decidiu retirar da empreitada este item e, por ter um preço inferior ao proposto, fazer toda a calçada previstas para a obra por administração directa, o que foi aceite pelo empreiteiro.

O dono da obra referiu mesmo que na reunião havida com o empreiteiro e o subempreiteiro onde foi referido a existência de proposta para a calçada inferior ao preço por estes proposto, o subempreiteiro (ora autora) terá dito não poder acompanhar a proposta. Que foram entregues à autora, posteriormente, outros trabalhos não constantes do contrato e que esta nada disse sobre os que lhe haviam sido retirados, tendo inclusive trabalhado na obra em conjunto com a empresa escolhida pelo dono da obra para fazer a calçada.

As testemunhas da ré demonstraram ter pleno conhecimento do contrato celebrado entre esta e a autora, vicissitudes que sofreu, intervenção da dona da obra.

Já as testemunhas da autora não mereceram qualquer credibilidade uma vez que depuseram contra o que se deduz e o que consta dos documentos juntos aos autos, nomeadamente o contrato de empreitada e a acta de reunião de obra e contra o depoimento de entidade isenta, que nenhuma interesse demonstrou ter na resolução do litígio, e que é o dono da obra (que tudo acompanhou e de tudo tinha conhecimento)”.

Vejamos, no entanto, com mais pormenor, os depoimentos das testemunhas a que a apelante alude, tendo por referência as questões que esta suscitou. Antes, porém, impõe-se breve abordagem de alguns dos factos considerados assentes na fase da condensação. 

                                             *         

Está em causa, fundamentalmente, na perspectiva dos apelantes, a averiguação, por um lado, da modalidade de fixação do preço – estamos perante uma “subempreitada por preço global” e “não por série de preços”, refere – e, por outro, das vicissitudes relacionadas com o facto da autora não ter efectuado os trabalhos identificados na respectiva proposta, sob os nºs 2.3 e 2.5, relativos ao fornecimento e assentimento de cubos de granito em estacionamentos e de pavimento cerâmico em passeios.

Adianta-se já que, no que a este segundo aspecto respeita, se impõe uma alteração – quase diríamos uma rectificação – à factualidade que se deu por assente e que se mostra consignada sob a alínea F).

É que, nos termos em que essa factualidade foi consignada – e independentemente de o ter sido nos precisos termos que foi invocada no art. 8º da petição inicial e que a ré expressamente aceitou no art. 1º da contestação –, parece resultar que a autora efectuou todos os trabalhos mencionados na proposta referida na alínea B).

Ora, do confronto dos articulados das partes e posição aí expressa resulta que é líquido que a autora não efectuou os trabalhos identificados nessa proposta, sob os nºs 2.3 e 2.5, relativos ao fornecimento e assentimento de cubos de granito em estacionamentos e de pavimento cerâmico em passeios, aludindo a ré (empreiteira) que esse facto se deu na sequência de uma alteração ao projecto por parte do dono da obra, explicitando e contextualizando esse circunstancialismo – cfr. o art. 12º, última parte, da petição inicial e arts. 16º a 23º da contestação. Aliás, o que está em causa no processo é, exactamente, aferir se a ré se constituiu na obrigação de indemnizar a autora “pelos prejuízos e lucros cessantes” que esta invoca ter sofrido e que imputa a conduta da ré.

Salienta-se que incumbe ao juiz interpretar e contextualizar a factualidade invocada pelas partes de forma a que, sem desvirtuar o sentido e alcance do que cada uma diz – preocupação de fidedignidade, portanto – ordenar a mesma de forma perceptível e estruturada. [ [v] ]

Por outro lado, impõe-se consignar especificamente na factualidade assente algumas cláusulas do contrato celebrado entre as partes, consubstanciado no documento junto a fls. 29 e 30, subscrito pela autora e ré, junto aos autos pela autora e que ninguém pôs em causa.

Trata-se de matéria em que as partes estão de acordo, foi invocada pela autora nos arts. 2º a 5º da petição inicial, remetendo a autora, expressamente, para determinados documentos, aceitando a ré essa factualidade.

A 1ª instância, vertendo esses factos nas alíneas B) a E) supra indicadas, fê-lo de forma incompleta, porquanto não fez referência específica aos documentos juntos aos autos nem consignou as respectivas cláusulas do contrato (ou remeteu para as mesmas).

Assim, ao abrigo do disposto no art. 659º, nº3 do C.P.C., aplicável ex vi do disposto no art. 713º, nº2 do mesmo diploma, alteram-se as alíneas B), E) e F) da factualidade assente na sentença, que passam a ter a seguinte redacção (sublinhando-se a parte objecto de aditamento):

B) No seguimento de solicitação da ré, a autora elaborou uma proposta orçamentada para uma subempreitada de trabalhos de infra-estruturas a desenvolver por si, numa obra localizada no loteamento dos Covões, em Portalegre (obras da Urbanização do Planalto), proposta constante do documento junto aos autos a fls. 8 a 28.

E) Em consequência, em 22.02.2002, foi celebrado entre a autora e a ré, um contrato de subempreitada, para a execução dos trabalhos constantes da proposta da autora, conforme resulta da cláusula 2ª do referido contrato, onde se escreveu “os trabalhos a considerar serão: Os mencionados mas páginas 3 a 19 da nossa proposta, datada de 08.02.2002”. A proposta da autora é parte integrante do mesmo.

Desse acordo, consubstanciado no documento junto a fls. 29 e 30, subscrito pela autora e ré, constam ainda, nomeadamente, as seguintes cláusulas:

“6. O valor acordado para a execução dos trabalhos é de: 1198671,12€ (um milhão cento e noventa e oito mil seiscentos setenta e um euros e doze cêntimos). São os valores unitários que constam na vossa proposta datada de 08/02/2002 nas páginas 23 a 19. (Esta proposta é por série de preços). Sobre estes valores incidirá o IVA à taxa legal em vigor na data de apresentação da factura.

7. Dos trabalhos realizados mensalmente, será elaborado o Auto de Medição e assinado pelos representantes das duas partes e a respectiva factura datada do último dia do mês em causa.

8. O SUB-EMPREITEIRO fará dar entrada das facturas no escritório até ao dia 05 do mês seguinte ao das medições e de acordo com estas.” 

F) A autora executou os trabalhos contratados, os quais tiveram por base um estudo exaustivo dos preços unitários da proposta, à excepção daqueles aí identificados sob os nºs 2.3 e 2.5, relativos ao fornecimento e assentimento de cubos de granito em estacionamentos e de pavimento cerâmico em passeios.

                                             *

A …….. [ [vi]  ]  – , pelas razões que enunciou e a que supra aludimos.

Tendemos a concordar com essa análise.

Não impressiona a circunstância das testemunhas trabalharem para a autora – o Carlos Simões, engenheiro civil, há mais de 10 anos, estando actualmente ligado à parte comercial da empresa, o …… é também engenheiro civil e é “funcionário” da ré desde 2002 –, mas sim, como a Sra. juiz referiu, o facto desses depoimentos serem infirmados por outros elementos de prova constantes do processo e que apontam, inequivocamente, noutro sentido.

Assim, relativamente à modalidade do preço/retribuição convencionada, não só o depoimento da testemunha ….. é em si mesmo contraditório em alguns aspectos, como a testemunha, manifestamente, não soube explicitar porque é que, tendo sido acordada uma “subempreitada por preço global”, segundo a testemunha referiu, as partes fizeram expressamente constar do contrato – que nunca foi posto em causa e que foi invocado pela própria autora –, a cláusula 6ª supra referida, em que se alude à proposta por série de preços.

Não admira, pois, que a Sra. juiz, perante um depoimento pouco esclarecedor, tenha dado relevância à prova documental, quando, como acontece no caso em apreço, estamos perante um documento particular cuja autoria está reconhecida e que faz prova plena quanto às declarações atribuídas às partes.

Em suma, a afirmação feita pela apelante no corpo das alegações –“Do depoimento desta testemunha extrai-se, de forma inequívoca, que a Apelante e Apelada acordaram a celebração de um contrato de subempreitada por preço global” – não tem elementos que a suportem.

Por outro lado, quanto a determinadas matérias, a testemunha ….. respondeu de forma absolutamente inverosímil. Por exemplo, quando inquirido pelo mandatário da autora sobre os “factores” que terão levado à “mudança na supressão de trabalhos e a entrega dos mesmos a outra empresa”, a testemunha respondeu da seguinte forma:

“Oiça, não sabemos. Não sabemos de nada, pelo menos preços não sabemos, foi-nos, a determinada altura, foi-nos dito verbalmente que os outros seriam mais baratos que os nossos mas nunca nos disseram, e qual era a diferença”. Ora, não é crível que, perante a alteração verificada, a autora não indagasse especificamente dos motivos respectivos (a esses motivos se refere a ré, factualidade que foi vertida nos nºs 14 a 17 da base instrutória), em ordem a aperceber-se do que se passava, tanto mais que a autora continuou a execução da subempreitada e, relativamente à alteração, até se prestou a efectuar nova proposta, especificamente sobre esses trabalhos.

Quanto a outros assuntos, a testemunha prestou um depoimento vago e genérico, como aconteceu, por exemplo, quando inquirida pelo mandatário da autora sobre se “eles (reporta-se à autora) aceitaram passivamente esta entrega de trabalhos a outra empresa ou sempre se mostraram inconformados com esta alteração”, tendo a testemunha respondido que a “administração não aceitou com agrado, até porque já tínhamos executado trabalhos muito difíceis”. Aliás, nessa altura, a testemunha já nem sequer acompanhava os trabalhos, como também referiu, expressamente, no seu depoimento, em passagem anterior.

Regista-se, por último, que a testemunha evidenciou nada saber, por exemplo, quanto ao quesito 5º, em que a testemunha, perante pergunta do mandatário da ré – “Diz-se aqui o seguinte: se não fosse aquela parte relativa aos estacionamentos e à calçada, em princípio, não teria sido aceite o orçamento. Compreende?” –, respondeu que “nós, eventualmente, teríamos sempre interesse em fazer a obra”.

Quanto à testemunha Paulo Neto, refere a apelante que a testemunha assumiu a direcção da obra e “revelou ter pleno conhecimento sobre o tipo de subempreitada em questão (preço global)”. Ora, a testemunha não participou nas negociações, nem na formulação da proposta. Atente-se no seguinte diálogo, que não consta da transcrição feita pela recorrente:

Mandatário da autora: (…) Em que termos esta adjudicação estava feita?

Testemunha: Tal como disse, quando cheguei a obra já estava a correr. No entanto, aquilo que fui informado pela minha empresa é que isto seria uma obra pelo valor global, ou seja, seria uma obra para fazer no seu total, pelo valor inicialmente contratado. E lendo a adjudicação da própria obra é pedido a contabilização dos erros e omissões, portanto só contabilizo erros e omissões quando estamos a falar de uma obra que pretende ser por um valor global: por este valor eu quero a obra toda feita. 

Acresce que, compulsando os documentos juntos aos autos, nomeadamente a proposta (fls. 8 a 28) e o texto que corporiza o contrato (fls. 29 e 30), verifica-se que em nenhum deles consta qualquer referência à aludida “contabilização dos erros e omissões”, sendo certo que a testemunha também não esclareceu a que “documento” se refere.

Quanto a esta testemunha, não pode deixar de salientar-se que presta um depoimento equívoco quanto ao circunstancialismo alusivo à alteração ao projecto, mesmo quando confrontado com o facto de ter estado presente na reunião ocorrida em 9 de Janeiro de 2003, a que se refere o documento de fls. 45 dos autos, documento que a autora não impugnou: “Eu não disse que desconhecia a eventual alteração do material” e, relativamente à sua presença na reunião, referiu que “supostamente”, “devo ter estado nesse dia” – mais uma vez, a apelante procede a uma transcrição truncada do depoimento da testemunha ao mandatário da ré.

Refira-se, ainda, que as duas testemunhas identificaram o Dec. Lei “59/99”, aludindo a esse diploma com notória e manifesta familiaridade.

Em suma, afigura-se-nos que os depoimentos das testemunhas da autora são insuficientes para responder afirmativamente aos quesitos 1º (que teve resposta restritiva) e 3º a 8º, inclusive, como a autora pretende, particularmente quando, como aconteceu no caso dos autos, algumas afirmações feitas pelas testemunhas são desconformes não só com elementos de prova documental constantes do processo e que nenhuma das partes questionou, como ainda com o depoimento da testemunha da ré José Pereira dos Santos.

Ouvido o depoimento desta testemunha, [ [vii] ] não podemos deixar de confirmar o juízo valorativo feito pela 1ª instância, nomeadamente quanto à essencialidade deste depoimento, sendo que as afirmações constantes das alegações de recurso, a propósito desta testemunha,  esbarram com o nível de conhecimentos evidenciado pela testemunha relativamente ao que se passou, a segurança com que prestou esse depoimento – no que é possível percepcionar pela gravação – e o distanciamento manifestado relativamente às partes, sendo que a testemunha conhece quer a autora – “A…..” ou “A…..” – quer a ré, que identifica por “o B….”. A testemunha é advogado, mas do seu depoimento resulta que está ligado à actividade de construção, sendo dono de uma empresa (com a sua esposa, sendo ambos sócios gerentes), a C…., que assumiu, no caso, a qualidade de dono da obra, tendo a testemunha explicitado não só procedimentos de ordem genérica associados à actividade de construção, como acontecimentos específicos ligados ao caso – a testemunha revelou pormenores da obra que evidenciam efectivo conhecimento da intervenção das várias empresas.

Atente-se, por exemplo, no seguinte diálogo a propósito da subempreitada em questão:

Testemunha: Eu paguei ao B...... em função de medições mensais. Isto é feito assim: Eu tenho um medidor orçamentista, um fiscal de obra, o B...... tem outro, a A...... tem outro. A A...... tem lá o D......, o B...... tinha o E......, eu tinha o F....... No fim de cada mês eles reúnem-se, frequentemente até com topógrafos das várias empresas, vão engenheiros também, reúnem-se em obra e dizem assim, vamos medir o que é que foi feito neste mês. Medem, e medem com recurso a aparelhos de topografia. Essa medição, é assinado o auto de medição, é assinado por cada um dos representantes de cada uma das empresas envolvidas e esses autos de medição são enviados para facturação. O A......s facturou ao B...... pelo preço que tinha no orçamento deles, o B...... facturou-me a mim pelo preço que tinha no meu.

Mandatário da ré: Preços unitários.

Test.: Sempre, preços unitários, porque é a única maneira, Sr. Dr., se não nós dizemos assim, se fosse por essa lógica, teremos de dizer: está executado 10% da obra, está executado 20% da obra, 50% da obra, não é assim, não é em percentagem de obra executada, não é como às vezes fazem nos prédios, que é com a 1ª placa paga x, com a 2ª placa paga x , não é.

Adv.: Isso significa que os valores que estão nas medições que estão no orçamento, se forem menores no terreno.

Test.: Paga-se menos.

Adv: Se forem mais…

Test.: Se forem mais paga-se mais, claro.

Ora, se atentarmos na cláusula 7ª do contrato em causa verifica-se que o procedimento descrito pela testemunha corresponde, exactamente, ao que aí foi estipulado pelas partes.

Salientam-se, ainda, as explicitações que a testemunha forneceu relativamente aos quesitos 14º a 21º, aludindo, nomeadamente, às vicissitudes relacionadas com a Câmara, às várias reuniões de obra efectuadas com vista realização da alteração sugerida pela Câmara e, especificamente, àquela em que esteve presente a testemunha, o “B...... Cristina” , o “E...... Sequeira” (encarregado da ré), o “F......” (“da minha fiscalização”), o “…. A......”, (“um dos administradores” da autora), e o “S. ….” (o director da obra), reunião em que a testemunha confrontou o Sr. …. A...... com o orçamento inferior àquele que foi apresentado pela autora – «o Sr. Carlos A...... disse-me: “eu não posso fazer por esse preço”; não faz por esse preço, entreguei à Multipedra. “Tudo bem, faça”. É assim, sem mais» rematou a testemunha – [ [viii]  ] e às relações estabelecidas entre as várias empresas – referindo, relativamente à autora, que “nós tivemos uma boa relação até ao final da obra”. A testemunha referiu que o fax junto a fls. 126 já surgiu depois dessa reunião na obra, ocorrida em 9 de Janeiro, reunião em que a autora tomou conhecimento do orçamento da outra empresa e que a adjudicação dos trabalhos a essa empresa, para além de que o Sr. …. A...... estava diariamente na obra, pelo que quando esse fax surgiu, “eles sabiam que a obra não era para eles!” – refira-se que o documento junto a fls. 45 refere-se exactamente a essa reunião, pese embora essa folha do livro de registo de obra não se mostre assinada por todos os presentes.     

Refira-se que a testemunha foi (insistentemente) inquirida pelo mandatário da autora sobre o conhecimento que esta teve sobre a alteração aludida e adjudicação à outra empresa, e sobre a “aceitação” desse facto por parte da autora, mantendo a testemunha o que já havia dito, aludindo ainda, por contraponto, a outros trabalhos (“a mais”) feitos pela autora e que não estavam previstos, referindo que por vezes e no dia a dia isso é “normal” numa obra.

Quanto às demais testemunhas arroladas pela ré:

O E...... é técnico da construção civil, trabalhou para a ré durante cerca de um ano e meio e foi o director da obra. A testemunha aludiu particularmente à reunião de obra do dia 9 de Janeiro, em que esteve presente, relatando o que aí se passou, confirmando o que já havia sido dito pela testemunha anterior – “na altura eles não levantaram obstáculos”, referiu a testemunha, referindo-se à posição da autora perante a decisão de adjudicação à outra empresa; A propósito do depoimento desta testemunha, não podemos deixar de assinalar a forma incorrecta como é feita a transcrição. Efectivamente, a fls. 234, a apelante interrompe a transcrição na parte em que a testemunha refere “Não, os A......s nunca aceitaram”, deixando subentender uma resposta que não foi, afinal, aquela que a testemunha deu. Efectivamente, se a apelante continuasse a transcrição verificar-se ia que a testemunha estava a referir-se tão somente ao facto da autora não ter aceite fazer os trabalhos pelo preço orçamentado pela outra empresa, como aliás respondeu depois à Sra. juiz e que foi objecto de transcrição.

O António Manuel dos Santos F...... trabalhou para o dono da obra, representando este na obra – “controlava a obra”, referiu a testemunha. O depoimento desta testemunha foi pouco relevante, porque referiu expressamente que não conhecia o contrato entre a autora e a ré e, quanto às vicissitudes posteriores, pouco adiantou relativamente ao que já havia sido dito.

O …… é engenheiro e funcionário da ré, referindo que “esta obra era por série de preços”, havendo depois que confirmar em obra os trabalhos e quantidades executadas, referindo a testemunha que toda a obra tinha “quantidades estimadas”. A instâncias do mandatário da autora a testemunha esclareceu, para além do mais, que os conceitos de empreitada por “preço global” e “por série de preços” são vulgares no âmbito da construção civil – e não apenas no âmbito das empreitadas de obras públicas.    

Em conclusão, não pode este Tribunal da Relação deixar de analisar criticamente, e numa perspectiva de razoabilidade, toda a prova produzida, nada havendo que apontar à ponderação feita na 1ª instância, relativamente aos termos em que apreciou os vários elementos probatórios.

Improcedem, pois, as conclusões de recurso, mantendo-se o julgamento de facto feito pela 1ª instância, sem prejuízo das alterações supra determinadas (que não se reportam à factualidade alusiva à resposta aos quesitos).

  

3. Passamos agora a analisar o contrato celebrado entre as partes em 22 de Fevereiro de 2002.

Desse acordo – reduzido a escrito – resulta, para a autora/recorrente, “subempreiteiro”, a obrigação de realizar os trabalhos de infra estruturas referentes à obra nº 79, loteamento dos Covões, Portalegre, mediante o pagamento, pela ré/recorrida, “empreiteiro”, dos valores unitários que constam da proposta apresentada pela autora, por “série de preços”. Para esse efeito mais clausularam as partes que, mensalmente, se procederia à medição dos trabalhos realizados, lavrando-se o auto respectivo, sendo a respectiva factura datada do último dia do mês em causa, devendo o subempreiteiro “dar entrada das facturas no escritório até ao dia 05 do mês seguinte ao das medições e de acordo com estas”. 

Estamos perante um contrato de subempreitada – contrato pelo qual um terceiro se obriga para com o empreiteiro a realizar a obra a que este se encontra vinculado, ou a uma parte dela, nos termos do art. 1213º do Código Civil, diploma a que aludiremos quando não se fizer menção de origem –, aplicando-se ao mesmo o regime previsto nos arts. 1207º e seguintes, como também as regras gerais relativas ao cumprimento e incumprimento das obrigações que com aquelas se não revelem incompatíveis. [ [ix] ]

Tem razão, pois, a recorrente quando entende inaplicável ao contrato em apreço o Dec. Lei 59/99 de 2 der Março (com as alterações resultantes da Lei 163/99 de 14/09 e do Dec. Lei 159/2000 de 27/07), que estabelece o regime jurídico das empreitadas de obras públicas. Mas também não se vê que na sentença recorrida o tribunal a quo tenha aplicado esse regime jurídico, nem expressa, nem implicitamente.

É certo que a Sr. Juiz refere, na sentença, que a empreitada contratada o foi não por um “preço global” mas por “série de preços unitários”, mas fá-lo num determinado contexto, explicitado na decisão. [ [x]

Efectivamente, tendo-se as partes socorrido dessa terminologia quando estipularam (livremente) as cláusulas contratuais, vertendo essa classificação no contrato, conclui-se que se apropriaram dos conceitos definidos no referido diploma, conceitos que têm um conteúdo muito preciso e que, com naturalidade, é adquirido pelos profissionais, nas respectivas áreas de actividade. É neste contexto que se compreende a fundamentação exposta na decisão, quando aí se refere:

“Ora, “ a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.”.

 Se o declaratário conhecer a vontade real do declarante é de acordo com esta que vale a declaração emitida. – art 236º do CC.

Ora, não podia a autora ignorar, como empresa dedicada à construção civil, o que significava a expressão “por série de preços unitários”, pelo que os alegados lucros “que deixou de auferir” em virtude de não ter realizado todos os trabalhos inicialmente previstos, não lhe devem ser pagos

Acrescentamos que se deve atender a todas as circunstâncias do caso concreto, como “os termos do negócio, os interesses nele compreendidos e o seu mais razoável tratamento, o objectivo do declarante, as negociações preliminares, as relações negociais precedentes das partes, os usos do declarante e os da prática que possam interessar”. [ [xi]  ]

Saliente-se que o facto de se ter acordado um valor para a execução dos trabalhos – no caso, €1.198671,12 –, não invalida que estejamos perante uma empreitada por série de preços, em que o preço é ajustado por unidades – “valores unitários” –, sendo devido após medição, em função do trabalho executado. Efectivamente, o preço global serve de parâmetro, modelando a vontade de contratar, não sendo viável pensar que as partes se vinculassem sem ter uma estimativa do custo/preço da obra. [ [xii]  ]       

No caso em apreço, o que as partes fizeram foi convencionar a forma de determinação do preço, tendo estabelecido um valor por medida dos trabalhos a efectuar, o que justifica, precisamente, que, posteriormente, fosse necessário apurar, por medição, os trabalhos realizados – daí a cláusula 7ª do contrato.

Em suma, considerando as cláusulas insertas no contrato, a tese da apelante – de que estaríamos perante um contrato de subempreitada por preço global – não tem suporte nem nos termos do contrato, nem em qualquer outro circunstancialismo que o rodeia.

 

4. A última questão suscitada pela apelante prende-se com a alegada alteração unilateral do contrato, da iniciativa da ré, empreiteira, argumentando a autora que os trabalhos que lhe foram “abusivamente retirados” tinham sido determinantes na decisão de contratar ou, pelo menos, na decisão de contratar pelo preço acordado e que a apelante nunca aceitou as alterações que lhe foram impostas.

Como resulta da resposta aos quesitos, a apelante não logrou satisfazer o ónus de prova que impende sobre si, nos termos do art. 342º, nº1.

Efectivamente, a autora não provou, desde logo:

- que tivesse sido a ré, empreiteira, “sem qualquer explicação prévia”, a contratar outra empresa para efectuar parte dos trabalhos incluídos na proposta;

- que a autora nunca teria contratado com a ré, nos termos em que contratou, ou seja, pelos preços indicados, se esses trabalhos não estivessem incluídos no contrato;

- e que a autora, em consequência da conduta da ré, deixou de auferir um lucro de €54.303,07, conforme resposta negativa aos quesitos 4º a 7º.

Ao invés, provou-se integralmente a tese da apelada, ou seja, que foi o dono da obra, a sociedade C......, a quem competia definir os trabalhos a executar na Urbanização, que decidiu alterar o tipo de calçada dos passeios, aceitando uma “sugestão” da Câmara Municipal, tendo comunicado essa decisão à autora e à ré, ou seja, ao empreiteiro e ao subempreiteiro, solicitando ainda à autora que apresentasse preço para a alteração.

Mais se provou que a autora aceitou, sem qualquer reclamação ou reserva, a alteração decidida e apresentou no dia 20.2.2002, um orçamento para os trabalhos alterados, orçamento que não foi aceite pelo dono da obra, que mandou executar esses trabalhos a outra empresa – cfr. a resposta aos quesitos 17º a 21º.

Neste contexto, não se vê que a Sra juiz tenha decidido com violação do “estatuído nos artigos 406º, 1215º e 1216º, todos do Código Civil”, como a recorrente invoca nas alegações de recurso.

Não há elementos no processo que permitam enquadrar a situação no disposto no art. 1215º, tendo em conta os pressupostos aí definidos. Assim, nada permite concluir que a alteração verificada consubstancie uma alteração necessária, feita em função de exigências de salvaguarda de direitos de terceiro ou de regras técnicas.

O mesmo se diga relativamente ao disposto no art. 1216º, nº3.

O que se verifica é que, relativamente à autora apelante, a empresa C….. dono da obra, decidiu, por sua conveniência, proceder a uma alteração ao projecto, daí resultando a supressão de parte dos trabalhos previstos no contrato de subempreitada como sendo realizados pela autora.

Sabe-se que o contrato de subempreitada é dependente do contrato de empreitada e que, na subempreitada, tudo se passa como se o empreiteiro (aqui ré) assumisse perante o subempreiteiro (a autora) a qualidade de dono da obra. No entanto, no caso em apreço, provou-se que se estabeleceram contactos directos entre a autora e a C….. pelo que não é aceitável que a autora, aceitando a decisão daquela empresa – decisão à qual a ré foi alheia – e encetando negociações com a mesma, gorando-se a concretização desse negócio, venha agora exigir da ré uma indemnização pelos lucros que alegadamente deixou de auferir em função da supressão de trabalhos e com base no contrato de subempreitada.

Daí não segue, obviamente, que a autora esteja a litigar com má fé, como pretende a ré, sem fundamentar essa afirmação, ponderando os requisitos a que alude o art. 456º do C.P.C..

Improcedem, pois, as conclusões de recurso.

                                             *           

Conclusões:

1. Não se justifica a prolação de despacho de rejeição do recurso quando o apelante, impugnando o julgamento da matéria de facto feito pelo tribunal ad quo, em cumprimento das exigências impostas pelo legislador (arts. 690º, nº1 e 690º A do Cód. do Processo Civil), enuncia os motivos/razões da sua discordância relativamente àquele julgamento de forma suficientemente perceptível ao tribunal ad quem (e, necessariamente, à parte contrária).

2. O recurso sobre a matéria de facto fixada pela 1ª instância destina-se a obviar a erros ou incorrecções eventualmente cometidas pelo julgador; Está em causa, portanto, aferir da existência de erros notórios na apreciação da prova.

3. Tendo-se as partes socorrido de determinada terminologia – subempreitada por “série de preços” – quando estipularam (livremente) as cláusulas contratuais, vertendo essa classificação no contrato, conclui-se que se apropriaram dos conceitos definidos no Dec. Lei 59/99 de 2 de Março, conceitos que têm um conteúdo muito preciso e que, com naturalidade, é adquirido pelos profissionais, nas respectivas áreas de actividade; Daí não resulta que seja aplicável o regime instituído no referido diploma, reservado às empreitadas de obras públicas e que tem o âmbito de aplicação que decorre do disposto nos arts. 2º e 3º.

4. No contrato de subempreitada tudo se passa como se o empreiteiro (aqui ré) assumisse perante o subempreiteiro (a autora) a qualidade de dono da obra; No entanto, quando a supressão de trabalhos ao subempreiteiro, decorrente de alteração do projecto, é consequência de uma decisão de terceiro, o dono da obra, decisão à qual foi alheia o empreiteiro e, na sequência dessa decisão, o subempreiteiro – que aceitou, sem reclamação, a alteração decidida – e o dono da obra contactam directamente um com o outro, encetando negociações, não é admissível a demanda do empreiteiro com vista ao ressarcimento dos prejuízos patrimoniais daí resultantes, maxime, pelos lucros que o subempreiteiro terá deixado de auferir.

                                             *           

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, mantendo-se a sentença recorrida.

Custas pela apelante.

Notifique.

[i] Proferido no processo 06S698 (Relator: Cons. Sousa Brandão), acessível in www.dgsi.pt

[ii] No sentido de que se trata de um poder-dever do julgador vide os Acs. do STJ de 20/03/2003, proferido no processo 02B2168 (Relator: Araújo de Barros) e de 06/07/2006, proferido no processo 06ª1838 (Relator: Sebastião Povoas), acessíveis in www.dgsi.pt; em sentido contrário, considerando que a não satisfação dos requisitos a que alude o art. 690ºA do C.P.C. justifica a imediata rejeição do recurso, vide, na doutrina, Lopes do Rego, Comentários ao Código do Processo Civil, Coimbra, 1099, p.466 e Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 7ª edição, Almedina, p. 176, nota 355.

[iii] Refere-se no preâmbulo: “A garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência - visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso.

Não poderá, deste modo, em nenhuma circunstância, admitir-se como sendo lícito ao recorrente que este se limitasse a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo, pura e simplesmente, a reapreciação de toda a prova produzida em 1.ª instância, manifestando genérica discordância com o decidido.

A consagração desta nova garantia das partes no processo civil implica naturalmente a criação de um específico ónus de alegação do recorrente, no que respeita à delimitação do objecto do recurso e à respectiva fundamentação”.

[iv] Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, vol. II, 1997, pág. 258. Cfr. ainda, o Ac. desta Relação de Coimbra de 11/03/2003, C.J., Ano XXVIII, T.V., pág. 63 e o Ac. do STJ de 20/09/2005, proferido no processo 05A2007, acessível in www.dgsi.pt, podendo ler-se, neste:«De salientar a este propósito, como se faz no acórdão recorrido, que o controlo de facto em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade.
Na verdade, a convicção do tribunal é construída dialecticamente, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, também pela análise conjugada das declarações e depoimentos, em função das razões de ciência, das certezas e ainda das lacunas, contradições, hesitações, inflexões de voz, (im) parcialidade, serenidade, "olhares de súplica" para alguns dos presentes, "linguagem silenciosa e do comportamento", coerência do raciocínio e de atitude, seriedade e sentido de responsabilidade manifestados, coincidências e inverosimilhanças que, por ventura transpareçam em audiência, das mesmas declarações e depoimentos (sobre a comunicação interpessoal, RICCI BOTTI/BRUNA ZANI, A Comunicação como Processo Social, Editorial Estampa, Lisboa, 1997)».

[v] No Ac. R.P. de 25/05/2001, proferido no processo nº 0150612 (Relator: Narciso Machado), acessível in www.dgsi.pt, referiu-se, muito sugestivamente, que “os quesitos devem entender-se na sua conexão, isto é, não como frases isoladas e destacadas do conjunto do texto, mas dentro da sua significação conjunta e não puramente isolada”, o que se aplica igualmente à ponderação da factualidade assente por acordo das partes.

[vi] O depoimento da testemunha também não é integralmente transcrito, sendo que se omitiu a transcrição de partes relevantes desse depoimento, tendo em conta as questões suscitadas.

[vii] A transcrição do apelante foi feita apenas relativamente a algumas (poucas) passagens do depoimento. 

[viii] Temos algumas dúvidas na percepção, pela gravação, do nome da empresa aludida, “Multipedra”.

[ix] Ac. STJ de 16/11/2008, proferido no processo 08B3213 (Relator: Salvador da Costa).

[x] O art. 8º do Dec.Lei 59/99 prevê três tipos de empreitadas, a saber: a) por preço global; b) por série de preços; c) por percentagem.  Nos termos do art. 9º, nº1, “Entende-se por preço global a empreitada cujo montante da remuneração, correspondente à realização de todos os trabalhos necessários para a execução da obra ou parte da obra objecto do contrato é previamente fixado”. Sobre o “conceito” de empreitada por série de preços, dispõe o art. 18º que a “empreitada é estipulada por série de preços quando a remuneração do empreiteiro resulta da aplicação dos preços unitários previstos no contrato para cada espécie de trabalho a realizar às quantidades desses trabalhos realmente executadas”.

[xi] Vaz Serra, R.L.J., Ano 111°, p. 220.

[xii] Pode ler-se no Ac. Tribunal de Contas de 4 de Julho de 2006, proferido no processo 538/06, acessível in www.tcontas.pt, que “a opção por um concurso por série de preços pressupõe isso mesmo, que o valor da adjudicação preveja um valor meramente indicativo daquilo que se crê que a obra venha a custar, nomeadamente tendo como referência trabalhos estimados com base nos elementos desenhados e escritos no projecto”.