Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
211/07.8TBSLV-E.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARVALHO MARTINS
Descritores: PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVA
PROVIDÊNCIA CAUTELAR
Data do Acordão: 10/16/2007
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: MIRA
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Área Temática:
Legislação Nacional: ARTIGOS 385.º; 520.º; 521.º; 568.º, N.º 1 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Sumário: 1. Não têm a natureza de processos conservatórios as diligências de produção antecipada de prova «porque não tendem a obter providências a fim de evitar prejuízos que se receiem; tendem a mera antecipação de termos de uma acção a propor ou já proposta, não supõem necessariamente uma outra acção principal, supõem necessariamente a própria acção, de cuja instrução fazem parte».
2. Segundo o artigo 520.° do Código de Processo Civil (âmbito de aplicação da providência) a providência da produção antecipada de provas abrange, inequivocamente, a inspecção (não sem olvidar que o, também referenciado, arbitramento pode consistir em exame, vistoria ou avaliação (C. P. C., art. 568.°, n.º 1).
3. A expressão inspecção, empregada, igualmente, «lato sensu», abrange não só a inspecção judicial propriamente dita, mas também a apreensão de objecto ou documento referente à prova. O fundamento legal da antecipação está assim designado: justo receio de que venha a tomar-se impossível ou muito difícil o depoimento de certas pessoas ou a verificação de certos factos por meio de inspecção ocular.
4. A justificação sumária da necessidade de antecipação há-de consistir, naturalmente, na alegação dos factos ou circunstâncias conducentes a mostrar que há justo receio de que venha a tomar-se impossível ou muito difícil a produção, no período normal da instrução do processo, da prova cuja antecipação se pretende obter.
5. Não havendo, ainda, nem questionário nem articulados, os factos a averiguar são os constantes do requerimento da produção antecipada de prova, muito embora possa suceder que tais factos não venham a ser objecto do questionário, caso em que a prova recolhida fica sem utilização.
6. Depoimentos (de parte ou de testemunha), arbitramentos (na nova terminologia: perícias) e inspecções podem ser, efectivamente, produzidos antecipadamente, isto é, antes do momento processual em que normalmente seriam produzidos, se estiver em risco a conservação da fonte de prova (impossibilidade) ou a facilidade de a produzir (grande dificuldade).
7. Sendo a produção de prova pedida antes de proposta a acção, deve o requerente indicar sucintamente o pedido (que vai deduzir, se for autor, ou que contra ele prevê que seja deduzido, se for réu) e os respectivos fundamentos (que tenciona invocar ou prevê que contra ele sejam invocados). Esta exigência denota que a produção antecipada de prova tem sempre em vista determinada acção
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência, na 2a Secção Cível no Tribunal da Relação de Coimbra:






A.., requerente, já melhor identificado nos presentes autos, não se conformando com o despacho de fls. - «manifestando séria distonia relativamente à decisão tomada pela instância inicial, concretamente no que concerne à questão de "saber se a produção antecipada de prova requerida era ou não falha de justificação que em concreto a sustentasse ou, se pelo contrário, deveria ser Iiminarmente admitida, face ao enquadramento factual que a rodeia", já que a mesma lavra em evidente contradição nos termos em que laborou a Mma Juiz a quo» - dele veio interpor o presente recurso de agravo, alegando e formulando as seguintes conclusões:


a) O despacho recorrido não poderá manter-se no que toca à denegação da possibilidade de ver produzida por antecipação a prova requerida conforme previsto nos art°s 5200 e 521 o, ambos do CPC;
b) O que, salvaguardado o merecido respeito, ficou a dever-se à circunstância de a Mm Juiz ter operado com manifesto vício lógico a subsunção dos factos apurados nos sobreditos incisos legais;
c) E assim, a despeito de ter enunciado correctamente os pressupostos que subjazem à aplicação das referidas normas, acabou, não obstante, por aplicar maio direito aos factos;
d) Os quais, se correctamente aplicados, conduziriam inexoravelmente a que fosse admitida a antecipação probatória, o que de algum modo cercearia direitos da parte requeri da;
e) Na procedência do presente agravo, deve o despacho recorrido ser revogado e, nos termos preconizados, ser lavrado um outro que admita a requeri da produção antecipada de prova.


B.. e marido C..., D... e marido IIídio E.. e ainda a Herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de F..., notificados das alegações dos recorrentes, vieram apresentar as suas contra-alegações, sem conclusões específicas, que pugnaram pela improcedência do recurso interposto.
II. Os Fundamentos
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:
São ocorrências materiais com interesse para a decisão da causa que:
Nos presentes autos veio o requerente A.. solicitar a produção antecipada de prova - realização de perícia no âmbito da tanatologia e antropologia forense, através da colheita de ADN -, a realizar por meio de exumação do cadáver de Mário Costa.
Alega receio de que a prova pretendida venha a ficar comprometida, bem como razões éticas, "( ...) atento o progressivo degradar do cadáver ( ... )", bem como em face do óbito ocorrido.
Notificados para se pronunciarem vieram os requeridos, entre o mais, sustentar a insuficiência da fundamentação do requerido.
A decisão proferida, no que importa fazer ressumar, na circunstância de “não alegar o requerente qualquer facto capaz de consubstanciar a probabilidade de que a prova pretendida venha a perder-se ou se torne muito difícil.
Assim sendo e, face ao supra exposto, atendendo aos dados constantes dos autos, temos forçosamente de concluir não se encontrarem reunidos os pressupostos exigidos por lei para admitir a requerida produção antecipada de prova, razão pela qual, se indefere a mesma, ao abrigo das citadas disposições legais" (arts. 520° , 521°,n.º1, 517°, CPC).

A fls. 70 dos autos a sra. Juíza manteve a decisão recorrida.


Nos termos do art. 684°, n.º3 e 690°, n.º1, do CPC, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas alegações do recorrente, sem prejuízo do disposto na última parte do n.º2 do art. 669°, do mesmo Código.

A questão suscitada consiste em apreciar se:


1. O despacho recorrido não poderá manter-se, no que toca à denegação da possibilidade de ver produzida, por antecipação, a prova requerida, conforme previsto nos ares 5200 e 521°, ambos do CPC?
Apreciando, dir-se-á, também, pressuponentemente, em termos de enquadramento e atendendo à relativamente diminuta elaboração da figura da "produção antecipada de provas", que, efectivamente (natureza do processado), à providência de produção antecipada de provas, também chamada prova “ad perpetuam rei memoriam” se referem os artigos 520.º e 521.º do nosso actual CPC.
Constituindo incidente as controvérsias acessórias que surgem no desenvolvimento do processo, ao lado ou no âmbito do litígio principal (Betti, Diritto processuale civile, págs. 260 e 261), não temos, também, qualquer dúvida em considerar como incidente a providência em epígrafe.
De Plácido e Silva (Comentários ao Código de Processo Civil, 111, pág. 1 216) e Alfredo de Araújo Lopes da Costa (A Administração Pública e a Ordem Jurídica Privada - Jurisdição Voluntária, pág. 113), co~sideram a providência como uma das medidas preventivas (providências cautelares) a que se refere o art. 682. ° do Código do Processo Civil brasileiro. E Manuel Rodrigues (Lições de processo preventivo e conservatório, coligidas por Adriano Borges Pires e Ernesto Pereira de Almeida, pág. 5) classifica a providência como acto preventivo sobre a prova, uma das espécies de acções conservatórias.
Todavia, contrariamente ao que sucede com os processos cautelares, que são verdadeiras acções (Alfredo de Araújo Lopes da Costa, Medidas preventivas - Medidas preparatórias Medidas de conservação, pág. 18; L. P. Moitinho de Almeida, Os processos cautelares em geral, in «Jornal do Foro», 1. 146-147, pág. 21), a providência de produção antecipada de provas é um mero incidente, sem características de acção. E tanto assim é que, salvos os casos de ter lugar anteriormente à propositura da acção ou em tribunal diferente, em que não pode deixar de ser processado para depois ser apensado à acção respectiva (C. P. C., art. 83.°, n. ° 2), se processa dentro dos próprios autos a que respeita, visto nem o art. 520.° nem os arts. 302.° a 304. ° do C. P. C. imporem que seja processado por apenso, contrariamente ao que sucede sempre aos processos cautelares, quer sejam requeridos antes de proposta a acção, quer o sejam no decurso dela (n.os 2 e 3 do art. 384.° do C. P. C.).
Esta providência é, por certo, «cousa semelhante» às providências
Cautelares, pois é necessária quando haja necessidade de verificar-se perante o juiz a existência de cousas ou o estado e que elas se encontram em determinado momento, assim como o seu valor” (Alfredo Araújo Lopes da Costa A Administração Publica e a Ordem Jurídica Privada­ Jurisdição Voluntária, pago 114)
Calamandrei (Introduzione alio studio sistematico dei provvedimenti cautelari, págs. 31 a 51), considera mesmo a produção antecipada de prova como um verdadeiro processo cautelar.
Todavia não se trata de um processo cautelar não só porque conforme dissemos, se trata de mero incidente que não reveste a categoria de acção, mas também porque o art. 83.°, n° 1 do C. P. C. distingue entre procedimentos cautelares e diligencias anteriores à proposição da acção ou diligencias antecipadas de produção de prova.
Se bem que a produção antecipada de prova tenha de comum, com os procedimentos cautelares, a característica da urgência («periculum in mora»), falta-lhe todavia o requisito da provisoriedade, que caracteriza aquelas providências, sujeitas a caducidade e destinadas a serem substituídas por outras garantias cujo material apenas preparam. E tanto o requisito da provisoriedade mingua na produção antecipada de prova, que esta é até tradicionalmente denominada prova «ad perpetuam rei memoriam», destinando-se, assim, a vigorar perpetuamente, sem nunca caducar.

Alberto dos Reis (Código de Processo Civil Anotado, 111, págs. 336 'e 337), que também entende que a produção antecipada de prova não pode, em rigor, classificar-se como providência cautelar, aponta ainda outra distinção, qual seja a falta de mais um requisito das providências cautelares na produção antecipada de prova: a aparência do direito (fumus boni juris), não carecendo o requerente de invocar qualquer direito que corra risco de insatisfação, bastando que diga que pretende recolher tal ou tais provas e que há justo receio de que, se houver demora na produção dela, a prova venha a perder ou a dificultar-se muito.
A «Revista de Legislação e de Jurisprudência» (77, pág. 278) também entende que os processos cautelares não compreendem as diligências antecipadas de prova, reguladas no artigo 520.º do actual C.P.C. nem mesmo por analogia, não só porque esta não existe, mas também porque nunca seria de admitir.
Barbosa de Magalhães (Natureza jurídica dos processos preventivas e seu sistema no Código de Processo Civil, in «Rev. Ord. Adv.», ano 5, n. Os 3 e 4, pág. 22) igualmente entende que não têm a natureza de processos conservatórios as diligências de produção antecipada de prova «porque não tendem a obter providências a fim de evitar prejuízos que se receiem; tendem a mera antecipação de termos de uma acção a propor ou já proposta, não supõem necessariamente uma outra acção principal, supõem necessariamente a própria acção, de cuja instrução fazem parte».


Segundo o art. 520.° do C. P. C., (âmbito de aplicação da providência) a providência da produção antecipada de provas abrange, inequivocamente, a inspecção (não sem olvidar que o, também referenciado, arbitramento pode consistir em exame, vistoria ou avaliação (C. P. C., art. 568.°, n.º 1).
A expressão inspecção, empregada, igualmente, «lato sensu», abrange não só a inspecção judicial propriamente dita, mas também a apreensão de objecto ou documento referente à prova (Neste sentido:
"-
Alberto dos Reis (Código de Processo Civil Anotado, 111, pags. 331 e 332);
Manuel Rodrigues (Lições de processo preventivo e conservatório, coligidas por Adriano Borges Pires e Ernesto Pereira de Almeida, pág. 5); De Plácido e Silva (Comentário ao Código de Processo Civil, 111, pág. 1216); L. P. Moitinho de Almeida (Os processos cautelares em geral, in «Jornal do Foro», tomos 146-147, pág. 21).


(Fundamentos da providência) «O fundamento legal da antecipação está assim designado: justo receio de que venha a tornar-se impossível ou muito difícil o depoimento de certas pessoas ou a verificação de certos factos por meio de inspecção ocular (Alberto dos Reis, Código de Processo Civil anotado, III, pag. 332)


«Tratando-se de prova por inspecção ocular (arbitramento ou inspecção judicial), o justo receio traduz-se no perigo de se apagarem vestígios dos factos que se pretendem verificar. Tratando de prova por depoimento, o justo receio pode resultar: a) da iminência do risco de morte da pessoa cujo depoimento se pretende obter; b) da idade avançada dessa pessoa; c) de doença grave que ela esteja sofrendo e que seja susceptível de a impossibilitar de depor; d) da previsão da ausência do depoente» (Alberto dos Reis, loc. cit., pág. 332).
Alberto dos Reis (Ioc. cit., pág. 333), oferece-nos os seguintes exemplos:
A) De justo receio de impossibilidade:
a) os vestígios dos factos que se pretendem fixar por inspecção ocular estão prestes a desaparecer;
b) a pessoa cujo depoimento se quer recolher corre risco de morte ou de ficar privada da fala.
B) De justo receio de grande dificuldade:
a) Os vestígios dos factos, posto que não se extingam de todo, tendem a perder o relevo e a significação característica;
b) a pessoa a ouvir está prestes a ausentar-se para lugar tão distante q\.Je o seu depoimento futuro não poderá alcançar-se senão à custa de grande demora, grande despesa e grande complicação.


(Processado - justificar sumariamente a necessidade da antecipação da diligência) «a justificação sumária da necessidade de antecipação há-de consistir, naturalmente, na alegação dos factos ou circunstâncias conducentes a mostrar que há justo receio de que venha a tornar-se impossível ou muito difícil a produção, no período normal da instrução do processo, da prova cuja antecipação se pretende obter» (Alberto dos Reis, loc. cit., pág. 336; S. T. J. de 22-3-1966, in B. M. J., n.º 155, pág. 372), isto é, o requerente tem de convencer o juiz de a se verificam os requisitos do artigo 520.º do C.PC.
Basta que o requerente diga que pretende recolher determinada prova e que há justo receio de que, se houver demora na produção dela, a prova venha a perder-se ou a dificultar-se muito (Alberto dos Reis, loc. cit., pág.337).
A justificação sumária da necessidade da diligência antecipada pode ser feita por documentos ou por testemunhas (Alberto dos Reis, loc. cit., pág. 340), sem que, todavia, possa ser dispensada a prova informatória (Rei, do Porto, 6-10-1965 ;Jur. ReI., 1965, pág. 767).
E, muito embora, como acabamos de dizer, o JUIZ possa vir a dispensar, até, a inquirição de testemunhas, deve o requerente, nos termos do art. 302.0 do C. P. C., oferecer logo, isto é, no requerimento em que deduz o incidente, o rol de testemunhas, bem como requerer os outros meios de prova (neste mesmo sentido: Alberto dos Reis (Ioc. cit., pág. 337).


(Mencionar com precisão os factos sobre que a diligência há-de recair) do art. 304 n. o 2 do C. P. C. resulta que, no caso de inquirição antecipada, a inquirição deve, em princípio, recair sobre matéria de questionário.
Se ainda não houver questionário, mas já houver articulados, os
,
factos a averiguar têm de ser dos que foram articulados (Alberto dos Reis,
loc. cit., pág. 337). Não havendo ainda nem questionário nem articulados, os factos a averiguar são os constantes do requerimento da produção antecipada de prova, muito embora possa suceder que tais factos não venham a ser objecto do questionário, caso em que a prova recolhida fica sem utilização (Alberto dos Reis, loc. cit., pág. 334; LP Moitinho de Almeida, Produção Antecipada de Provas, Scientia Jurídica, 90°, 277-286).


Quer isto dizer, pois, excurso feito, que depoimentos (de parte ou de testemunha), arbitramentos (na nova terminologia: perícias) e inspecções podem ser, efectiva mete produzidos antecipadamente, isto é, antes do momento processual em que normalmente seriam produzidos, se estiver em risco a conservação da fonte de prova (impossibilidade) ou facilidade de a produzir (grande dificuldade). Assim acontece quando se justifique o receio de se vir a tornar impossível ou muito difícil um depoimento (de pessoa que se vai ausentar, de pessoa doente, etc.) ou a verificação, pericial ou por inspecção, de factos relevantes (nomeadamente, por se tratar de meio de prova indiciária sujeito a desaparecer). Sendo caso disso, o acto de produção de prova pode mesmo ter lugar antes de proposta a acção (art. 521-2).

Tal como os procedimentos cautelares, a produção antfcipada de prova tem como requisito o periculum in mora, consistente no risco de desaparecer ou se tornar muito difícil a produção de certa prova, antes do momento normal em que ela seria produzida. Isso leva, em algumas legislações, a enquadrá-Ia entre os procedimentos cautelares (assim em França, Bélgica ou Itália). Não é assim no nosso direito, em que permanece como figura autónoma, como tal não sujeita, em princípio, ao respectivo regime.


Do mesmo modo, que sendo a produção de prova pedida antes de proposta a acção, deve o requerente indicar sucintamente o pedido (que vai deduzir, se for autor, ou que contra ele prevê que seja deduzido, se for réu)
"
e os respectivos fundamentos (que tenciona invocar ou prevê que contra ele
sejam invocados). Esta exigência denota que a produção antecipada de prova tem sempre em vista determinada acção, não podendo, como em outros sistemas jurídicos acontece (Alemanha, Suécia, Finlândia), ser requerida para ser utilizada em qualquer eventual futuro processo que corra entre o requerente e a contraparte por ele identificada (José Lebre de Freitas, CPC, Anotado, Vol. 2°, pp.414-416).


Tal tessitura institucional protectiva, do ponto de vista jurídico, valida - com outro tipo de integração - a diegese narrativa e, com ela, a récita judiciária utilizada no tribunal a quo que se convoca, por reenvio inter-textual expressivo, igualmente nos termos do que se consagra no artigo 713.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, segundo a qual:


Pretende o requerente intentar futura acção de investigação da paternidade requerendo, como vimos supra, e a título de produção antecipada da prova, a realização de perícia no âmbito da tanatologia e antropologia forense, através da colheita de ADN, a realizar por meio de exumação do cadáver de Mário costa.

Alega receio de que a prova pretendida venha a ficar comprometida ­atento o progressivo degradar do cadáver ( . .) ", bem como razões éticas.
Ora, efectivamente o teste de ADN (ácido desoxirribonucleico) permite estabelecer, num sistema de percentagens, qual a probabilidade de determinado individuo proceder biologicamente de outro - ou seja, permite estabelecer "a verdade biológica ", tomada esta no sentido da derivação biológica.
Contudo, e para tal, como aliás alegado pelos requeridos, o progressivo degradar do cadáver não é meio impeditivo da realização do mesmo, o que aliás é do conhecimento geral.
Por outro lado, invoca o requerente o "imperativo ético" subentendendo-­se que, com tal expressão, o requerente se pretenda reportar à dor da morte causada à família, bem como ao acto de exumação de cadáver.
Também, neste aspecto, sempre será de realçar que será menos intensa tal dor se a produção da prova pretendida tiver lugar no âmbito da existência de um
,
determinado processo, do que fora dele e na sua perspectiva.
Não alega o requerente qualquer facto capaz de consubstanciar a probabilidade de que a prova pretendida venha a perder-se ou se torne muito difícil.
Assim sendo e, face ao supra exposto, atendendo aos dados constantes dos autos, temos forçosamente de concluir não se encontrarem reunidos os pressupostos exigidos por lei para admitir a requerida produção antecipada de prova, razão pela qual, se indefere a mesma, ao abrigo das citadas disposições legais.



Colhe, por isso, resposta negativa a questão formulada.
Podendo concluir-se que:
1. Não têm a natureza de processos conservatórios as diligências de produção antecipada de prova «porque não tendem a obter providências a fim de evitar prejuízos que se receiem; tendem a mera antecipação de termos de uma acção a propor ou já proposta, não supõem necessariamente uma outra acção principal, supõem necessariamente a própria acção, de cuja instrução fazem parte».
2. Segundo o artigo 520.° do Código de Processo Civil (âmbito de aplicação da providência) a providência da produção antecipada de provas abrange, inequivocamente, a inspecção (não sem olvidar que o, também referenciado, arbitramento pode consistir em exame, vistoria ou avaliação (C. P. C., art. 568.°, n.º 1).
3. A expressão inspecção, empregada, igualmente, «lato sensu», abrange não só a inspecção judicial propriamente dita, mas também a apreensão de objecto ou documento referente à prova. O fundamento legal da antecipação está assim designado: justo receio de que venha a tomar-se impossível ou muito difícil o depoimento de certas pessoas ou a verificação de certos factos por meio de inspecção ocular.
4. A justificação sumária da necessidade de antecipação há-de consistir, naturalmente, na alegação dos factos ou circunstâncias conducentes a mostrar que há justo receio de que venha a tomar-se impossível ou muito difícil a produção, no período normal da instrução do processo, da prova cuja antecipação se pretende obter. O que ficou por acontecer.
5. Não havendo, ainda, nem questionário nem articulados, os factos a averiguar são os constantes do requerimento da produção antecipada de prova, muito embora possa suceder que tais factos não venham a ser objecto do questionário, caso em que a prova recolhida fica sem utilização.
6. Depoimentos (de parte ou de testemunha), arbitramentos (na nova terminologia: perícias) e inspecções podem ser, efectivamente, produzidos antecipadamente, isto é, antes do momento processual em que normalmente seriam produzidos, se estiver em risco a conservação da fonte de prova (impossibilidade) ou a facilidade de a produzir (grande dificuldade). O que se não demonstrou.
7. Sendo a produção de prova pedida antes de proposta a acção, deve o requerente indicar sucintamente o pedido (que vai deduzir, se for autor, ou que contra ele prevê que seja deduzido, se for réu) e os respectivos fundamentos (que tenciona invocar ou prevê que contra ele sejam invocados). Esta exigência denota que a produção antecipada de prova tem sempre em vista determinada acção.


8. Tal tessitura institucional protectiva, do ponto de vista jurídico, valida ­com outro tipo de integração - a diegese narrativa e, com ela, a récita judiciária ulilizada no tribunal a quo, que se convoca, por reenvio inter-textual expressivo, segundo a qual, no que se faz ressumar e se toma processualmente relevante - "não alegar o requerente qualquer facto capaz de consubstanciar a probabilidade de que a prova pretendida venha a perder-se ou se tome muito difícil. Assim sendo e, face ao supra exposto, atendendo aos dados constantes dos autos, terá, forçosamente, de concluir-se não se encontrarem reunidos os pressupostos exigidos por lei para admitir a requerida produção antecipada de prova, razão pela qual, se indefere a mesma, ao abrigo das citadas disposições legais" (arts. 5200 e 5210, CPC).




III. A Decisão


Nestes termos, nega-se provimento ao agravo, mantendo-se, por isso, o despacho recorrido.


Custas pelo recorrente