Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | JOÃO TRINDADE | ||
Descritores: | LIVRO DE RECLAMAÇÕES COIMA INCONSTITUCIONALIDADE | ||
Data do Acordão: | 12/09/2009 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | COMARCA DE COIMBRA – 4º J | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | REVOGADA | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 18º CRP, 2º, Nº 1, 3º, Nº 1, AL. ), Nº 4 E 9º, Nº 1 AL. A) E Nº 3 D.L. 156/05 DE 15/9 | ||
Sumário: | É inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade, o nº 3 do art.º 9º do D.L. 156/05 de 15/9 | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Criminal desta Relação:
O Ministério da Economia e da Inovação condenou a arguida BB..., melhor identificada nos autos, pela prática de uma contra-ordenação p. e p. nos artigos 2º, nº 1, 3º, nº 1, al. ), nº 4 e 9º, nº 1 al. a) e nº 3 todos do D.L. 156/05 de 15/9 na coima no montante de 15.000,00 € .
Não de conformando com a decisão impugnou-a judicialmente pedindo a sua absolvição ou a aplicação de uma admoestação, tendo o tribunal mantido a decisão administrativa.
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Inconformada, recorreu a arguida, concluindo a sua motivação do seguinte modo:
O Mº Pº na comarca respondeu pugnando pela improcedência do recurso.
Nesta Relação o Exmo. Procurador – Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.
Parecer que notificado não mereceu resposta.
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Colhidos os vistos legais e efectuada a conferência há que decidir: O âmbito dos recursos afere-se e delimita-se através das conclusões formuladas na respectiva motivação conforme jurisprudência constante e pacífica desta Relação, bem como dos demais tribunais superiores, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
As questões a resolver são as seguintes:
Factos dados como provados:
Motivação: - A recorrente não apresentou prova testemunhal para corroborar a sua versão dos factos. Assim, considerando que apenas ouvimos o comprador a quem foi negado o livro de reclamações – V… – e o agente da PSP que o acompanhou – F... – que descreveram os factos, de forma isenta e credível, como os considerados provados, é manifesto que a versão dos factos trazida pela recorrente teve de ser dada como não provada e como provados os factos que constavam na decisão administrativa. Consideramos provado o facto descrito em 5 tendo em consideração o documento junto pela recorrente a fls. 64 e seguintes.
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A- Erro notório na apreciação da prova Antes de mais se dirá que nos termos do art.º 75º, nº do RGCOC este Tribunal da Relação apenas conhecerá da matéria de direito. Tal não invalida que se conheça de eventuais vícios da sentença previstos no art.º 410º do CPP. No caso a recorrente invoca a vício do erro notório na apreciação da prova, mas, como facilmente se constata da motivação e conclusões, confunde este vício com a livre apreciação da prova. Na verdade qualquer um dos vícios previstos nas alíneas a) a c) do nº 2 do artº 410º do CPP, como decorre da letra da lei só se poderá ter por verificado se resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, isto é, com exclusão de exame e consulta de quaisquer outros elementos do processo( -Cfr. entre outros os acs. do STJ de 90-01-10 e de 94-07-13, o primeiro publicado na AJ, 5, 3 e o segundo na CJ(STJ)II,III,197), pelo que a actividade de fiscalização e de controlo do tribunal superior neste particular, conquanto incida sobre toda a decisão, com destaque para a proferida sobre a matéria de facto, não constitui actividade de apreciação e julgamento da prova, sendo que ao exercê-la se limita a verificar se a mesma contém algum ou alguns dos mencionados vícios, sendo que no caso de aquela deles enfermar e, em face disso, se tornar impossível decidir a causa, deverá o processo ser reenviado para novo julgamento, tendo em vista a sua sanação( artº 426º, nº 1 do CPP). Para sustentar a invocação deste vício a recorrente limita-se a afirmar que não se devia ter dado “como não provado que a recorrente desconhecia as regras aplicáveis ao Livro de Reclamações, sustentada tão só no facto de esta última não ter apresentado testemunhas.” Trata-se de uma questão de apreciação da prova.
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B- Pena – Admoestação Defende a recorrente que a coima mínima estipulada por lei é exagerada face aos resultados líquidos anuais de exercido da arguida, dado que foi dado como provado que o seu resultado liquido anual foi, no ano de 2008, de €7.800,00 , pelo que se mostra adequada a aplicação de uma pena de admoestação. Vejamos: O art.º 51º,1 do D.L. 433/8 de 27/10 estabelece que “ quando a reduzida gravidade infracção e da culpa do agente o justifique pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação.” Com vem salientado na 1ª instância a recusa da entrega do livro de reclamações, mesmo após a intervenção da autoridade policial, não nos permite concluir que é reduzida a culpa. Logo esta pretensão da recorrente não pode proceder.
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C- Pena – Montante mínimo - Constitucionalidade Nos termos artigos 2º, nº 1, 3º, nº 1, al. b) , nº 4 e 9º, nº 1, al. a) e nº 3 do D. L. nº156/05de 15/9 a coima mínima é no montante de 15.000 €. Perante tal montante mínimo a primeira coisa que queremos registar é a de que o legislador está desfasado da realidade, quando é certo que se impõe que ele tenha um conhecimento prático da vida. O legislador não pode sensibilizar, educar, prevenir, mesmo punir, impondo um tal regime. Como se diz no preambulo do D.L. 156/05 o livro de reclamações constitui um dos instrumentos que tornam mais acessível o exercício do direito de queixa ao proporcionar ao consumidor a possibilidade de reclamar no local onde o conflito ocorreu. Consideramos esta medida de primordial importância para a defesa dos direitos do consumidor, já não consideramos que, com coimas deste montante, se possa “incentivar e encorajar a sua utilização”(preambulo do diploma). Diremos mais, se o consumidor tiver consciência destes montantes que pendem sobre a “cabeça” das entidades e estabelecimentos obviamente que se retrairá no exercício do direito que a lei lhe confere. No caso o legislador olvidou princípios constitucionais. Ao legislador são cometidos limites que deverão ser observados, ao mesmo tempo que outros limites decorrem da própria Constituição e do Direito em geral. Por conseguinte, o poder discricionário nunca poderá ser entendido como uma carta em branco, mas como uma ordem para a realização da justiça na situação concreta. É necessário respeitar o princípio constitucional da proporcionalidade. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, já exigia expressamente que se observasse a proporcionalidade entre a gravidade do crime praticado e a sanção a ser aplicada. “a lei só deve cominar penas estritamente necessárias e proporcionais ao delito” (art.15). No entanto, o princípio da proporcionalidade é uma consagração do constitucionalismo moderno. A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos. (art.º 18º, 2 CRP) . “Admitido que um meio seja ajustado e necessário para alcançar determinado fim, mesmo neste caso dever perguntar-se se o resultado obtido com a intervenção é proporcional à “carga coactiva” da mesma. Meios e fim são colocados em equação mediante um juízo de ponderação, a fim de se avaliar se o meio utilizado é ou não desproporcionado em relação ao fim. Trata-se, pois, de uma questão de “medida” ou “desmedida” para se alcançar um fim: pesar as desvantagens dos meios em relação às vantagens do fim.”( -Gomes Canotilho, Direito Constitucional,4ª Edição pag.316) A primeira das “entidades públicas” subordinadas aos direitos liberdades e garantias é o Estado (em sentido estrito),quer enquanto legislador, quer enquanto administração, quer enquanto juiz. O primeiro não pode emitir normas incompatíveis com os direitos fundamentais, sob pena de inconstitucionalidade……O terceiro está obrigado a decidir o direito para o caso em conformidade com as normas garantidoras de direitos, liberdades e garantias e a contribuir para o desenvolvimento judicial do direito privado através da aplicação directa dessas mesmas normas.”( -Gomes Canotilho e Vital Moreira , Constituição da República Portuguesa Anotada,pag. 383 ) Não conhecemos na legislação rodoviária , cuja violação dá origem a centenas de morte anualmente, sanção que se aproxime do referido limite mínimo. Não conhecemos na pequena e média criminalidade em que são postas em causa a integridade física, a honra, a propriedade etc. decisões condenatórias que se aproximem do referido limite mínimo. É irrelevante nos termos que deixamos expostos a chamada á colação do preceituado no nº 3 do D.L. 433/82 (atenuação especial mínimo 7.500 €)ou o preceituado no art.º 88º do mesmo diploma(pagamento em prestações). Concluímos, assim, pela inconstitucionalidade do normativo citado pela ofensa do princípio da proporcionalidade. # Nestes termos se decide: Sem tributação. (Consigna-se que o acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo primeiro signatário – artigo 94.º, n.º2, do C.P.P.) Coimbra, 2009-12-09 ______________________________________ ______________________________________ (João Trindade) _______________________________________ (Barreto do Carmo)
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