Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
4797/05. 3TBLRA
Nº Convencional: JTRC
Relator: GRAÇA SANTOS SILVA
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
SEGURO AUTOMÓVEL
ALCOOLÉMIA
DIREITO DE REGRESSO
NEXO DE CAUSALIDADE
Data do Acordão: 04/15/2008
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Tribunal Recurso: LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Legislação Nacional: ARTIGO 21º - B1) DO D. REGULAMENTAR Nº 22-A/98, DE 1/10. ARTIGO 19º, AL. C), DO DL. Nº 522/85, DE 31/12
Sumário: 1. O direito de regresso da seguradora contra o condutor por ter agido sob influência do álcool, nos termos da alínea c) do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro, exige o ónus da prova pela seguradora do anexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente.
2. Havendo ou não concorrência de causas, haverá sempre que provar (ónus da seguradora) se, sem a efectiva TAS por parte do condutor, o sinistro nunca teria ocorrido, ou teria ocorrido com uma menor produção de danos.
Decisão Texto Integral: I- Relatório:
Companhia de Seguros …….. S.A., intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo sumário, contra A....., pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de € 5.193,31 (cinco mil, cento e noventa e três euros e trinta e um cêntimos), referente a danos patrimoniais por si sofridos, derivados de conduta sua, seu segurado, acrescida de juros vincendos, até efectivo e integral pagamento, contados desde a data da citação.
Fundamentou em que no âmbito da sua actividade de seguradora, celebrou com o R. um contrato de seguro do ramo automóvel, titulado pela apólice nº 60/5 587 054, destinado a garantir a responsabilidade civil emergente da condução do veículo automóvel de matrícula QE-41-05. Ao abrigo de tal contrato, foi participado à A. um acidente de viação envolvendo o veículo seguro e o veículo de matrícula 15-03-PN.
Mais referiu que, de facto, no dia 12/09/2002, cerca das 20h00m, o Réu tripulava a viatura segurada, advindo de Rua das Portelinhas, em Loureira, em direcção à Estrada do Fazarga, e pretendendo entrar nesta, assim o fez, sem imobilizar o seu veículo, sem atender ao sinal de cedência de passagem existente na estrada de onde era proveniente, e sem atentar no veículo de matrícula 15-03-PN que circulava no sentido Moita Redonda – EN 357, embatendo com a parte lateral esquerda na frente do PN. Alegou ainda que o embate ocorreu no lado direito da Estrada do Fazarga, atento o sentido de marcha do PN, dentro da zona do cruzamento, no lado direito da via, e que o condutor do PN não conseguiu reagir, face à entrada repentina do QE, não lhe sendo possível evitar o embate.
Alegou também que o Réu, nas circunstâncias de tempo e lugar descritas, conduzia com TAS de 1,42 gr/l, o que provocou a diminuição da acuidade visual e da percepção das distâncias, falta de destreza, aumento de tempo de reacção aos obstáculos sendo tal TAS causal do acidente ocorrido, bem como a inobservância do disposto no art. 21º - B1) do D. Regulamentar nº 22-A/98, de 1/10.
Alegou ainda que, em por força do acidente, custeou a reparação do veículo PN, no montante de € 5.193,31. Entende ter direito de regresso contra o Réu, nos termos do art. 19º, al. c), do DL. Nº 522/85, de 31/12. Juntou um documento do qual resulta que o valor supra mencionado foi pago a 22/10/202.
O R. contestou dizendo que a A. não alegou nem demonstrou o nexo de causalidade entre a TAS e o acidente, e ainda que, mesmo que fosse procedente a acção, nunca tivera oportunidade de se pronunciar sobre os danos. Mais disse que o PN circulava a velocidade superior a 50 km/h, que era a permitida no local, o que levou à ocorrência do acidente e contribuiu para os estragos provocados em tal veículo.
Efectuado julgamento, foi proferida sentença pela qual se julgou totalmente improcedente a acção, e se absolveu o R. do pedido contra si formulado.
Inconformada, recorreu a A, apresentando as seguintes conclusões de recurso:
“1ª Foi o próprio R. quem deu causa ao acidente ao entrar repentinamente no cruzamento.
2ª A dificuldade de visão que se verifica nesse cruzamento não atenua a sua culpa, antes pelo contrário. Com efeito, quanto maior é a dificuldade de visão nos cruzamentos, maiores deverão ser os cuidados a ter para entrar nos mesmos.
3ª E que o R. não tomou as necessárias cautelas antes de entrar no cruzamento ressalta à evidência do facto de ter entrado repentinamente no mesmo.
4ª E ainda por cima pelo lado esquerdo da via, dificultando ainda mais a sua visibilidade ao condutor do PN.
5ª Por sua vez o condutor do PN não infringiu qualquer norma estradal que possa ser considerada como causal do acidente.
6ª Na verdade, atenta a curta distância a que o mesmo se encontrava do cruzamento e a rapidez da entrada do R. no cruzamento, sempre o acidente ocorreria, mesmo que a sua velocidade fosse menor.
7ª A imprevidência do R. ao entrar repentinamente no cruzamento é tal ordem de grandeza que nos leva a pensar que o mesmo não se apercebeu sequer da existência do sinal de aproximação de estrada com prioridade, o que se explica pela diminuição do seu campo de visão provocado pela elevada taxa de alcoolemia que apresentava — 1,42 g/1.
8ª Acresce que tal comportamento, por temerário, roçando mesmo o dolo eventual, não é compatível com uma condução normal.
9ª E por isso se afirma que a alcoolemia que o R. apresentava foi determinante para a ocorrência do acidente em causa.
10ª Como se diz e bem no douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, (www.dgsi.pt, processo n.°2284/2006-8) “III- No caso de o condutor do veículo ter uma elevadíssima TAS, de 1,90g/l, o que o faz incorrer em pena de prisão (artigo 292. " do Código Penal) a presunção judicial de que agiu sob influência os álcool tem todo o cabimento, não só porque um tal grau de etilização impõe o entendimento, para além de qualquer dúvida razoável, de que o condutor em tais condições age sob influência os álcool, consolidando-se a presunção quando, pelas condições em que o acidente ocorreu, se verifica que só por causa da influência do álcool se deu despiste do veículo e o violento embate nos veículos estacionados".
11ª Ao decidir-se, em contrário, violou-se por erro de interpretação e aplicação, a norma prevista na al. c) do artigo 19° do Dec. 522/85, de 31 de Dezembro.”
Apresentou o Recorrido contra alegações, pugnando pela manutenção da sentença.
II- Questões a decidir:
Como é sabido, e constitui hoje entendimento pacífico, é pelas conclusões das alegações dos recursos que se afere e delimita o objecto dos mesmos (cfr. artºs e 684, nº 3, e 690, nº 1, do CPC, na versão anterior ao D.L. nº 303/07, de 24/8), exceptuando aquelas questões que sejam de conhecimento oficioso (cfr. artº 660º, nº2, do CPC).
O tribunal deve resolver todas que as questões que lhe sejam submetidas a apreciação (a não ser aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras). Todavia, como vem sendo dominantemente entendido, o vocábulo “questões” (referido naquele normativo) não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir (vide, por todos, Acs. do STJ, de 02/10/2003, in “Rec. Rev. nº 2585/03 – 2ª sec.”, e de 02/10/2003, in “Rec. Agravo nº 480/03 – 7ª sec.”).
Face às conclusões da alegação da recorrente, verifica-se que não está em causa no recurso a dinâmica do acidente em causa, nem a culpa exclusiva do recorrido na sua produção, nem o montante pago pela recorrente a título indemnizatório aos lesados em causa. As questões que importa apreciar são:
1. Aferir se houve violação de regras estradais por parte do R., ao entrar no cruzamento, que tenham determinado a produção do acidente;
2. Aferir da influência da taxa de alcoolemia apresentada pelo R. na produção do acidente, designadamente, determinação da existência ou inexistência do nexo de causalidade adequada entre o acto de condução automóvel do recorrido sob o efeito do álcool e o deflagrar do acidente, e da violação da norma contida no artº 19º do DL 522/85, de 31/12.
III- Factos considerados assentes, na sentença recorrida:
Foram estes os factos considerados assentes nos autos, e feitos constar da sentença recorrida, se bem que por ordem diversa da agora fixada.
A) No âmbito da sua actividade a Autora celebrou com o Réu um contrato de seguro do ramo automóvel titulado pela apólice nº 60/5587054, destinado a garantir a responsabilidade civil decorrente da circulação do automóvel de matrícula QE-41-05 (alínea A) dos Factos Assentes).
B) Ao abrigo de tal contrato foi participada à ora Autora a ocorrência de um acidente de viação, envolvendo o veículo seguro e o veículo de matrícula 15-03-PN, o qual se verificou do seguinte modo e circunstâncias (alínea B) dos Factos Assentes).
C) No dia 12/09/2002, pelas 20 horas, o Réu conduzia o veículo automóvel, ligeiro de passageiros, de matrícula QE-41-05 pela Rua Portelinhas, Loureira, em direcção à Estrada do Fazarga (resposta ao art. 1º da Base Instrutória).
D) Na entrada no cruzamento formado pelas duas vias referidas em 1), o QE-41-05 e o veículo 15-03-PN, que circulava pela Estrada do Fazarga, no sentido Moita Redonda/EN 357 embateram (resposta ao art. 2º da Base Instrutória).
E) Embate esse que ocorreu dentro do referido cruzamento, no lado direito da via, atento o sentido de marcha do PN (art. 3º da Base Instrutória).
F) A entrada dentro do cruzamento pelo QE foi repentina (resposta ao art. 4º da Base Instrutória).
G) O QE apresentava-se pela direita do PN, mas, na Rua de Portelinhas, antes do referido cruzamento, estava colocado, à data referida em E), um sinal vertical B1 (aproximação de estrada com prioridade) (resposta ao art. 5º da Base Instrutória).
H) Após o descrito acidente, foi efectuado ao Réu, um teste de alcoolemia, por recolha de sangue efectuada no Hospital de Leiria, tendo o mesmo acusado uma TAS de 1,42 gr/l (alínea C) dos Factos Assentes).
I) A TAS referida em C) provocava ao Réu falta de destreza, bem como aumento do tempo de reacção aos obstáculos habituais de circulação automóvel (resposta ao art. 6º da Base Instrutória).
J) O veículo 15-03-PN circulava pelo menos a 70 km/h (resposta ao art. 7º da Base Instrutória).
L) No seguimento da aludida participação, a Autora custeou a reparação do veículo terceiro pelo montante de € 5.193,31 (alínea D) dos Factos Assentes).

IV- Fundamentos:
A) Conhecimento sobre se houve violação de regras estradais por parte do R., ao entrar no cruzamento, que tenham determinado a produção do acidente:
Esta é a primeira das questões colocadas em sede de conclusões de recurso, se bem que, perfeitamente inócua ao pretendido exercício de direito de regresso da A. perante o R.
O direito de regresso em causa, atenta a data da produção do acidente, e o disposto no artº 12º do CC, terá que ser apreciado face ao disposto no DL 522/85, de 31/12, com as alterações que lhe foram introduzidas, sucessivamente, até ao DL 301/2001, de 23/11. Nos termos do artº 19º desse diploma apenas existe direito de regresso, por parte da seguradora, nas condições aí previstas, ou seja:
a) contra o causador do acidente que o tenha provocado dolosamente;
b) contra os autores e cúmplices de roubo, furto, ou furto de uso do veículo causador do acidente;
c) contra o condutor, se este não estiver legalmente habilitado ou tiver agido sob influência do álcool, estupefacientes ou outras drogas ou produtos tóxicos, ou quando haja abandonado o sinistrado;
d) contra o responsável civil por danos causados a terceiros em virtude de queda de carga decorrente de deficiência de acondicionamento;
e) contra o tomador de seguro, nos termos do nº 2 do artigo 6º do Decreto-Lei nº 162/84, de 18 de Maio;
f) contra o responsável pela apresentação do veículo a inspecção obrigatória que não tenha cumprido a obrigação decorrente do disposto no nº 2 do artº 36º do Código da Estrada e diplomas que o regulamentam, excepto se o mesmo provar que o sinistro não foi provocado ou agravado pelo mau funcionamento do veículo.
Ora, a falta de cumprimento do artº 21º (B1) do Decreto Regulamentar nº 22-A/98, de 1/10, não integra nenhuma das previsões normativas acima citadas, pelo que não há lugar a qualquer direito de regresso, com tal fundamento.
B) Apreciação da questão da influência da taxa de alcoolemia apresentada pelo R, na produção do acidente, designadamente, determinação da existência ou inexistência do nexo de causalidade adequada entre o acto de condução automóvel do recorrido sob o efeito do álcool e o deflagrar do acidente e da violação da norma contida no artº 19º do DL 522/85, de 31/12.
A questão colocada pela recorrente implica uma dupla apreciação, de facto e de direito. Por outro lado, foi objecto de Assento, tirado pelo STJ no processo 3470/2001- 2ª secção, a 28/05/2002, publicado no DR, 1ª série, A, de 18/07/2002, com a rectificação da ordem das declarações de voto publicadas no DR, mesma série, a 05/09/2002.
Levanta várias sub-questões, a primeira das quais a destrinça entre a natureza dos assentos e da jurisprudência uniforme, e a razão de ser da alteração legislativa que revogou a disposição relativa aos primeiros e impôs a norma vigente, relativa aos segundos.
Na altura ( 2002) os assentos tinham força obrigatória geral - artº 2º do CC, na redacção anterior ao DL 329-A/95, de 12/12 - o que significava que lhes era devida aplicação, nos mesmos termos da devida às leis vigentes.
Revogado o supra mencionado dispositivo, dispôs o artº 17º, nº 2, do DL 329-A/95 que “os assentos já proferidos têm o valor dos acórdãos proferidos nos termos dos artºs 372º-A e 732º-B, ou seja, de mera uniformização de jurisprudência”.
Reconhecendo-se, muito embora, as vantagens da estabilização das orientações jurisprudenciais, na manutenção das legitimas expectativas de os cidadãos verem seguidas as directrizes já uniformizadas, ao dirigirem-se aos Tribunais, tentou obviar-se à cristalização temporal da evolução jurisprudencial, permitindo que esta se adeqúe às novas solicitações sociais, ao espírito da época, caso se venha, a demonstrar, mais tarde, a inadequação da solução acolhida.
Sobre o assunto escreveu Castanheira Neves, em “O Instituto dos “Assentos” e a Função Jurídica dos Supremos Tribunais”, 1983, dizendo que a uniformização de Jurisprudência não busca “a radical eliminação das divergências, de todas e quaisquer discordâncias jurídico – jurisprudenciais e do mesmo modo a exclusão das necessárias mudanças de orientação, da mutabilidade das posições jurídicas em superação normativa” , sem prejuízo de pressupor uma certa estabilidade, inidentificável esta com “imutabilidade, impeditiva de uma evolutiva e histórico - problemática superação, quando exigível, de anteriores posições jurídicas” – transcrição feita em “Manual Dos Recursos em Processo Civil”, 7ª edição, pág 298, de Fernando Amâncio Ferreira. Calamandrei em tradução do trabalho “Cassazione Civil”, 1959, refere que Uniformização de Jurisprudência significa tendência à uniformidade da interpretação judicial no espaço (de modo que e, certo momento a mesma norma jurídica seja interpretada do mesmo modo em todo o território do Estado), mas não no tempo ( de maneira a que não se exclua a evolução jurisprudencial do direito, isto é, a possibilidade de a substituir num momento posterior, desde que o seja de maneira uniforme para todo o Estado, por uma interpretação, socialmente mais adequada ao espírito da época do que a precedentemente acolhida e que se revela superada)”. Sobre o assunto pode-se ler, ainda, Teixeira de Sousa, a pag. 653 de “Estudos sobre o Novo Código de Processo Civil”, 1997, e Freitas do Amaral em “Manual de Introdução ao Direito” I, pág 465.
Fernando Amâncio Ferreira em “Manual Dos Recursos em Processo Civil”, 7ª edição, pág 299, refere que “se bem que não exista um direito dos cidadãos à manutenção da jurisprudência do STJ, esta deve contudo manter uma certa estabilidade quando proferida em vista à sua uniformização, com intervenção do plenário das secções cíveis ou da secção social daquele Alto Tribunal, sob pena de a certeza do direito e a máxima constitucional da igualdade perante a lei serem fortemente abaladas. A independência e a liberdade de julgamento por parte dos juízes do Supremo tem de ajustar-se à doutrina do Tribunal a que pertencem sempre que esta tinha sido produzida há relativamente pouco tempo, em sede de recurso ampliado, e nenhumas alterações importantes tenham ocorrido na realidade jurídico – social”.
Uma outra sub-questão que urge analisar é saber se a condição para que a seguradora tenha direito de regresso de quem tenha conduzido sob o efeito do álcool é questão de apreciação de facto e de direito, ou apenas de direito.
Começando pela última teoria, defendem os seus seguidores, que o nexo de causalidade entre o estado de alcoolemia na condução automóvel e o acidente, tem que ser analisado sob o ponto de vista abstracto, e consequentemente, fica provado, bastando para tanto a aplicação das regras da experiência e dedução lógica a determinados factos assentes. Prescindem da averiguação, in concreto, da efectiva causa do acidente, e com base nos mesmos fundamentos que levam à determinação de que a condução sob o efeito do álcool é conduta anti-social, não resultando do processo outra causa de produção do acidente, imputam-no, de forma quase automática à TAS. Ou seja, com os mesmos fundamentos que caracterizam a natureza anti-social da conduta, determinam o preenchimento da previsão normativa do direito de regresso.
Veja-se o seguinte trecho do ac. desta Relação, tirado no processo 2705/03, de 2/12/2003, in www.dgsi.pt: “Evidentemente que a taxa de alcoolemia que apresentava, explica cientificamente, a respectiva ineficiência e esta falta de destreza. É impossível que a condução de um condutor com uma tal taxa alcoólica não seja afectada, pois como se sabe e como se refere no Ac. da Relação de Coimbra de 31-10-90 ( Col. Jur. 1990, tomo IV, pág. 102 ) “ o álcool começa por afectar a coordenação das funções de sensação e de percepção ( córtex cerebral ), atinge depois a coordenação motora e o equilíbrio e por fim, ataca a memória ( sistema límbico)”, isto é, uma tal taxa de álcool no sangue não pôde ter deixado de condicionar negativamente a condução automóvel do R.. Um condutor alcoolizado ( v.g. com uma taxa de 1,10 g/l. ou superior ), está impedido de reagir, com o mínimo de eficácia a qualquer situação de perigo que lhe surja, não podendo adequar outrossim a condução automóvel às condicionantes de cada momento, conforme está cientificamente provado. Como se refere no Ac. da Relação de Lisboa de 19-10-95, Col. Jur.1995, tomo IV, pág. 124 “a taxa de álcool no sangue ... afecta o nível de concentração exigível no acto da condução; afecta o comportamento, ou pode afectar, do condutor, negativamente, com referência aos riscos específicos próprios da condução de veículos automóveis”.
Para os defensores de que a questão é de apreciação de facto, mas também de direito, importa ter em consideração que não é suficiente que o estado de alcoolemia do réu tenha sido conditio sine qua non do acidente, exigindo-se que ela seja adequada, em abstracto, a causá-lo. Deste modo, pressuposto do direito de regresso é que a condução sob o efeito do álcool possa ser considerada uma das condições concretas do acidente e que, segundo as regras da experiência comum, seja adequada ou apropriada ao seu desencadeamento.
A propósito veja-se a mais recente jurisprudência do STJ:
- “É facto constitutivo do direito de regresso exercido na presente acção pela seguradora o nexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente, como, de resto, foi decidido no acórdão de uniformização de jurisprudência 6/2002, de 28.5.02. Está claro que a doutrina fixada por este acórdão deve ser acatada e enquanto a disposição interpretada subsistir inalterada no ordenamento jurídico e aquele acórdão uniformizador não for substituído por outro, a interpretação que se fixou para o art.º 19°, c), do DL 522/85 mantém a sua força vinculativa na ordem jurisdicional.”- Processo nº 07B1753, de 10/7/2007, in www.djsi;
- “Pretende a recorrente exercer contra o recorrido o direito de regresso a que se reporta o artigo 19º, proémio, e alínea c), do Decreto-Lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro.
Prescreve o referido normativo, além do mais que aqui não releva, que, satisfeita a indemnização, a seguradora apenas tem direito de regresso contra o condutor se este tiver agido sob a influência do álcool. Assim, são pressupostos do referido direito de regresso a que se reporta o mencionado normativo, além do mais, o pagamento pela seguradora de indemnização ao lesado no acidente de viação e a acção de condução sob a influência do álcool por quem o causou. Por via dele, a seguradora pode haver de outrem o que prestou a terceiro a título de cumprimento de obrigação de indemnização assumida por via do contrato de seguro, sendo que a estrutura do seu direito se configura como atípica.
De qualquer modo, trata-se de um direito novo derivado da lei por referência intrínseca a uma situação de responsabilidade civil extracontratual assumida por via contratual.
É, pois, grosso modo, um direito de regresso atípico, intrinsecamente conexionado com uma situação de responsabilidade extracontratual assumida por via contratual.
A ideia geral de influência reporta-se à acção que uma pessoa exerce sobre outra, ou que uma pessoa exerce sobre uma coisa, ou que uma coisa exerce sobre outra coisa ou que uma coisa exerce sobre uma pessoa.
É o sentido de acção exercida pelo álcool ingerido sobre uma pessoa, na espécie condutor de um veículo automóvel, e sabe-se, pela experiência comum, que a ingestão de álcool para além de determinado limite começa por afectar a coordenação das funções de sensação e de percepção, atinge depois a coordenação motora e o equilíbrio e, por fim, enfraquece a memória. (…) Tendo em conta a conclusão do referido acórdão de fixação de jurisprudência, importa verificar o conceito legal de nexo de causalidade, a propósito do qual a lei expressa que, quem estiver obrigado a reparar um dano, deve restituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (artigo 563º do Código Civil).
Reportando-se a indemnização aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão, mas aplicável em geral, reconduz a lei a causalidade à probabilidade, ou seja, afasta-se da ideia de que qualquer condição é causa do dano, consagrando a concepção da causalidade adequada.
Dir-se-á, assim, decorrer do artigo 563º do Código Civil não bastar que o evento tenha produzido certo efeito para que, de um ponto de vista jurídico, se possa considerar causado ou provocado por ele, antes sendo necessário que o primeiro seja uma causa provável ou adequada do segundo.
Aplicando as referidas normas ao caso vertente, dir-se-á, por um lado, que no processo causal conducente a um acidente concorrem múltiplas circunstancias, umas que se não tivessem ocorrido ele não teria eclodido, e outras que, mesmo não verificadas, não excluiriam a sua ocorrência. E, por outro, não ser suficiente que o estado de alcoolemia do recorrido tenha sido conditio sine qua non do acidente, exigindo-se que ela seja adequada em abstracto a causá-lo.
Assim, pressuposto do direito de regresso em causa é que a condução sob o efeito do álcool possa ser considerada uma das condições concretas do acidente e que, segundo as regras da experiência comum, seja adequada ou apropriada ao seu desencadeamento.
Em consequência, o juízo sobre a causalidade integra, por um lado, matéria de facto, certo que se trata de saber se na sequência de determinada dinâmica factual um ou outro facto funcionou efectivamente como condição desencadeadora de determinado efeito.
E, por outro, matéria de direito, designadamente a determinação, no plano geral e abstracto, se aquela condição foi ou não causa adequada do evento, ou seja, dada a sua natureza, se era ou não indiferente para a sua verificação.”- Processo nº 06B2247, de 06/07/2006, relatado por Salvador da Costa, in www.dgsi.pt.
- “Para apurar o nexo de causalidade entre a condução sobre o efeito do álcool e o acidente teremos de partir desde logo de um dado objectivo: ao recorrente foi detectada a taxa de alcoolemia de 0, 64 g/l e a taxa permitida por lei era e é de 0, 50 g/l.
A partir deste dado objectivo é óbvio que a presunção da Mma. Juiz a quo não pode proceder, isto é que a taxa de alcoolemia de 0,64 g/l não fornece margem de segurança bastante para fundamentar a presunção de que a acção lesiva foi determinada pelo álcool.” - Processo nº 3 B644, relatado por Araújo de Barros in www.dgsi.pt;
- “I- A ré Seguradora tem de provar o nexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente, para obter vencimento na acção de regresso.
III- Se não provar que foi o grau de alcoolemia que determinou o eclodir do acidente, a indemnização que pagou derivou da celebração do contrato de seguro e não, ou não também, do excesso de álcool no sangue do condutor, situação esta que, a ter-se provado, justificaria então o direito de regresso, por não estar coberta pelo contrato de seguro, não cobertura esta que subjaz à atribuição desse direito.” - Processo nº 06A2334, relatado por Faria Antunes in www.dgsi.pt.
Em suma, a condução sob o efeito do álcool tem de ser causa concreta e abstracta do acidente – vide, neste sentido, os ac.s. do STJ, de 01/07/2004, e processo nº 03B2757, in www.dgsi.pt.
Representativos da jurisprudência deste Tribunal vejam-se, entre outros, os ac.s tirados nos processos com os nºs 1065/05.4TBVNO.C1, de 10/7/2007, 380/04.9TBANS.C1, de 15/5/2007, 2261/05 de 4/10/2005, 3315/04, de 5/4/05, 4316/04, de 1/3/05, 3260/03, de 9/12/03, etc, todos pubicados in www.dgsi.pt.
Este é o entendimento que perfilhamos.
***
Tal entendimento aliás, parece ser o único compatível com a forma como se vem desenvolvendo a crescente protecção, a nível comunitário, da questão da cobertura dos danos do lesado ou dos transportados, discutindo-se, inclusivamente, se o conhecimento por parte destes da condução em estado de embriaguês é ou não determinante da exclusão do respectivo direito a reparação. A este propósito escreveu Santos Bernardino, em Ac do STJ, de 4/10/07, publicado no sitio acima mencionado: “Já acima se aludiu à influência das directivas comunitárias no domínio do seguro obrigatório automóvel e no direito da responsabilidade civil, defendendo-se que a interpretação das suas disposições ou o seu efeito útil geram soluções que penetram (ou devem penetrar) as legislações nacionais nessas matérias Cfr. a propósito desta temática, o importante estudo do Conselheiro José Carlos Moitinho de Almeida, “Seguro obrigatório automóvel: o direito português face à jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias”, acessível em www.stj.pt (link Estudos Jurídicos). Explicitando melhor o sentido dessa afirmação, diremos que as soluções que, no âmbito da aplicação das cinco directivas comunitárias existentes em matéria de seguro obrigatório automóvel, têm sido afirmadas pelo Tribunal de Justiça, não podem deixar de ser tidas em conta na interpretação do direito nacional. Entende o Tribunal de Justiça (TJ) que, salvo no tocante à situação prevista no art. 2º, n.º 1 da 2ª Directiva – pessoas que se encontrem no veículo causador do acidente e que tenham conhecimento de que este era roubado – não são admissíveis disposições legais ou cláusulas contratuais que excluam, em determinadas circunstâncias, a responsabilidade da seguradora. Assim, v.g., não pode excluir-se a cobertura do seguro quando o condutor se encontre sob a influência do álcool.”
Ora, não sendo tal exclusão admitida, a tese que defende o direito de regresso como uma consequência automática da condução com álcool no sangue, desde que abstractamente defensável, está precisamente a deixar entrar pela janela aquilo que não se permite que entre pela porta: a irresponsabilidade da seguradora sempre que haja condução com álcool, independentemente de se aferir da sua causalidade concreta na produção do sinistro.
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O Assento n.º 6/2002, de 18 de Julho, declarou, então com força obrigatória geral, a seguinte doutrina “a alínea c) do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro, exige para a procedência do direito de regresso contra o condutor por ter agido sob influência do álcool o ónus da prova pela seguradora do anexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente”.
Desnecessário se torna aqui repetir a fundamentação do Assento, para a qual se remete, quer no que concerne à apreciação jurídica da figura do direito de regresso, quer no que respeita à aplicação dessa doutrina face ao DL 522/85.
A evolução da jurisprudência mais elucidativa, posterior ao Assento, que não se desvia da orientação perfilhada, até porque nada ocorreu em termos sociais, históricos, ou legislativos, que permita considerar desactualizada ou desadequada a solução encontrada, ou as motivações do mesmo.
A redacção do preceito ( artº 19º do mencionado DL) não se alterou, continuando a exigir, como fundamento do direito de regresso, um nexo causal entre a TAS e a acção lesiva. Isto significa que não se alterou a exigência de que quem invoca em seu beneficio o direito de regresso alegue e prove esse nexo causal, que na prática, longe da previsão da declaração de voto do Cons. Francisco Ferreira de Almeida, se revelou sem anormais dificuldades.
Nada, na matéria de facto provada, permite a conclusão da existência desse nexo causal, (que aliás não foi alegado pela A., se não na perspectiva de que, sendo o álcool uma causa de diminuição de capacidades intelectuais e de reacção motora, então é causal), sob pena de se ter que entender que sempre que ocorre uma situação de condução com álcool estão verificados os legais pressupostos de que depende o direito de regresso. Tal acepção é inaceitável, como resulta da fundamentação do Assento e da jurisprudência perfilhada.
A sentença recorrida exprime, com clareza, desenvolvimento adequado e suficiente, a fundamentação do Assento. Também da mesma se retiram os seguintes excertos, no que concerne à aplicação do mesmo ao caso dos autos, com o sentido dos quais se concorda:
“ Ficou provado que a TAS provocava ao réu diminuição da acuidade visual e da percepção das distâncias, falta de destreza e o aumento do tempo de reacção aos obstáculos habituais da condução automóvel.
Contudo, importa agora analisar se da factualidade dada como provada resulta que a condução sob influência do álcool foi a causa concreta do acidente, isto é a causa sem a qual este não teria ocorrido.
Ora ficou provado que o réu ao conduzir a viatura nas circunstâncias de tempo e de lugar supra referidas entrou na hemifaixa de rodagem da Estrada da Fazarga destinada ao trânsito no sentido Moita Redonda – E.N. n.º 357, e que aquele e o veículo de matrícula 15-03-PN embateram, circulando este na Estrada da Fazarga, sendo que à data do sinistro, existia um sinal de cedência de passagem (sinal b1) colocado na Rua das Portelinhas, a poucos metros de distância da entrada na Estrada da Fazarga.
Mais se provou que a entrada na Estrada da Fazarga por parte do QE foi repentina e que o PN circulava pelo menos a 70 km/h.
Mais se observou no local que junto ao sinal de “cedência de passagem” e junto à linha imaginária onde termina a estrada vinda de Rua das Portelinhas com a perpendicular direita da Estrada da Fazarga não se consegue avistar o trânsito no sentido tomado pelo PN. O réu pretendia tomar a direcção da Estrada da Fazarga, no sentido oposto ao PN. Assim, o facto de a entrada do QE ser repentina, por si só, não pode considerar-se causa concreta do acidente dos autos, a que não terá sido igualmente alheia a velocidade do PN, tanto mais que se trata de localidade que obrigava a velocidade mais moderada. E, perante esta factualidade não é possível afirmar que o acidente ocorreu em virtude de o réu conduzir com uma T.A.S de 1,42 gr/l”.
Na realidade, dos factos dados como provados, resulta que qualquer pessoa, ainda que não alcoolizada, naquelas circunstâncias teria de entrar na via para avistar o trânsito proveniente do sentido que tomava o PN, e que a entrada repentina e desregrada do QE na via se pode ter devido a qualquer facto externo à TAS detectada no seu condutor. Não resultou provado que o réu fez isso por estar ( ou por também estar) influenciado pelo álcool.
Acrescente-se: a condução do R., determinante e/ou concorrente da produção do acidente, foi efectivamente devida a pura desconsideração das regras estradais a que devia obediência na manobra de mudança de direcção que pretendia levar a cabo. Daí não se pode concluir, sem mais, que se não fora a alteração de tempos de reacção e falta de destreza que o álcool lhe determinava no momento do acidente, nunca teria praticado uma condução imprudente e causadora do acidente. A elevada taxa de alcoolemia no sangue é uma das maiores causas de sinistralidade nas nossas estradas, e a elevada sinistralidade é sério flagelo da sociedade portuguesa actual. Mas infelizmente não é a única. O excesso de velocidade e a efectuação de manobras perigosas, por si, são igualmente fonte de elevada sinistralidade.
Por outra parte há que considerar que a viatura PN circulava dentro de uma localidade a uma velocidade de, pelo menos, 70 km/h, o que configura a conduta contra-ordenacional ( e igualmente anti-social) de excesso de velocidade.
Havendo ou não concorrência de causas, haverá sempre que provar (ónus da seguradora) se, sem aquela efectiva TAS por parte do R., o sinistro nunca teria ocorrido, ou teria ocorrido com uma menor produção de danos: esta conclusão não se pode, com segurança, retirar da matéria provada, e considerar tal circunstância assente no caso dos autos. Desconhecem-se, tão pouco, as normais características do R. enquanto condutor: se condutor zeloso, cumpridor das normas estradais e das regras de bom senso, que permitem uma condução normalmente segura ( o que não significa permanentemente isenta de reparos), se condutor destemido, eufórico e temerário, mais confiante na destreza alheia e na sorte própria do que no bom resultado do cumprimento das regras impostas à actividade - porque destes também os há.
Não resta pois senão a manutenção da absolvição, por falta de prova de efectivo nexo causal entre a taxa de alcoolémia e a produção do acidente.
V- Decisão:
Acorda-se, pois, em manter a decisão recorrida, absolvendo o R. do pedido contra si formulado nesta acção.
Custas da acção e do recurso pela A.


Tem voto de vencido do Sr. Desmbargador Costa Fernandes
Segue o voto de vencido

Apelação nº 4797/05.3TBLRA
(Tribunal Judicial de Leira – 3ª Juízo da Competência Cível)

Votei vencido, por entender que a apelação deveria ser julgada procedente.
Na verdade, a meu ver, a autora alegou que a condução sob o efeito do álcool foi causal do sinistro (cfr. o 4º § do relatório) e a factualidade provada permite concluir isso mesmo, basta atentar na alíneas H), i) e J) do elenco de factos provados. É que, se, existindo um sinal a indicar que se ia aproximar de uma estrada com prioridade, o réu acabou por entrar de modo repentino na zona de intersecção das duas vias, isso comprova que agiu com temeridade (negligência grosseira), sem avaliar sequer os perigos que corria e fazia correr a terceiros, tratando-se de um comportamento que a experiência comum ensina ser próprio da destemia provocada pelo álcool. Por outro lado, está assente que a taxa alcoolemia de 1,42 g/l «provocava no réu falta de destreza, bem como aumento do tempo de reacção aos obstáculos habituais de circulação automóvel». Mesmo que tivesse pouca visibilidade e, sobretudo por isso, o réu, em condições normais, teria avançado lentamente e acabaria por parar o veículo que tripulava, antes de entrar na zona de intersecção das duas vias.
A meu ver, tal como se refere no Ac. do STJ, de 01-07-2004, Proc. 04B1536, in www. dgsi.pt, face às regras da experiência comum e aos ensinamentos científicos, a condução com uma taxa de alcoolemia de 1,42 g/l foi idónea a provocar no réu uma diminuição acentuada das suas capacidades sensitiva e neuromotora, diminuindo-lhe a acuidade de percepção e de reacção, para além de lhe induzir um estado de euforia/ /destemia que o levou a subestimar o perigo e a empreender um comportamento temerário. Ora, conjugando isso com a referida factualidade, impõe-se concluir que o facto de conduzir com a indicada taxa de alcoolemia esteve na génese do sinistro.
Exigir mais, será tornar o art. 19º, 1, c), do Decreto-Lei nº 522/85, de 31/XII, letra morta e premiar a condução sob a influência do álcool, sendo certo que a tanto o Assento referido não obriga. Com efeito, se a factualidade que a seguradora logrou provar, «in casu», não puder ser considerada suficiente para estabelecer o nexo causal entre a condução sob a influência do álcool por parte do réu e o sinistro, muito dificilmente ser encontrarão situações em que isso seja possível.
O entendimento que perfilho não põe em crise qualquer das directivas comunitárias sobre o seguro de responsabilidade civil automóvel. Na verdade, a seguradora responderá sempre perante o lesado, ficando salvaguardada a protecção que o Direito Comunitário quer garantir-lhe, enquanto vítima de um sinistro rodoviário. O direito de regresso funciona apenas nas relações entre a seguradora e o condutor etilizado.
Importa ainda vincar que a seguradora, quando celebrou o contrato de seguro não contou com o risco acrescido decorrente da condução sob a influência do álcool, donde, é da mais elementar justiça que beneficie do direito de regresso.
Coimbra,

/António da Costa Fernandes/