Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3897/04
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE ARCANJO
Descritores: FALÊNCIA
DESPACHO DE ARQUIVAMENTO - FUNDAMENTAÇÃO
Data do Acordão: 03/08/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA GUARDA - 3º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTº 25º, Nº 2, DO CPEREF E ARTº 205º, Nº 1, DA C.R. PORTUGUESA.
Sumário: I – O despacho de arquivamento em processo de falência contende directamente com o mérito da acção, ao pressupor a valoração e exame crítico sobre a prova dos pressupostos legais e dada a fase intermédia em que está inserido, pelo que carece de ser fundamentado de facto e de direito .
II – O dever geral de fundamentação justifica-se pela necessidade de que a parte vencida conheça as razões por que o foi, para que possa atacá-lo no recurso que interpuser .
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra
I – RELATÓRIO

A requerente - “ A... “, pessoa colectiva nº502812494, com sede em Pêro Neto, Marinha Grande – requereu, ao abrigo dos arts.6º, 8º e 15º do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e da Falência ( CPEREF ), a declaração de falência da - requerida – “ B... “, pessoa colectiva nº502965851, com sede no Loteamento Industrial da Lapa, Manteigas.
Alegou, em resumo, ser credora da requerida do montante global de € 4.796.994,31, encontrando-se esta em situação de falência, dado que apenas tem um activo de cerca de € 3.990.038 e um passivo que já ronda os € 10.000.000, tem dívidas para com a CGD, o BCP e o BES, encontrando-se as suas instalações hipotecadas, a maioria dos equipamentos foram adquiridos no sistema de leasing, cujas prestações não estão a ser pagas, pelo que a empresa não tem qualquer viabilidade económica.

1.2. - Foram ordenadas e efectuadas as legais citações, notificada a comissão de trabalhadores e dada vista ao Ministério Público ( arts.20°, 21º e 22º do CPEREF ).

1.3. - Foram justificados os seguintes créditos:
- Banco Comercial Português, S.A. no montante de € 1.049.860,11.
- Caixa Geral de Depósitos S.A, no montante de E 5.069.588,03;
- Banco Espírito Santo, S.A., no montante de € 86.435,16;
- O IGFSS- Delegação da Guarda, no montante de E 229.862,85;
- O BANIF, S.A., no montante de € 12.794,60;
- A INFOFIL, S.A., no montante de € 3.970,77;
- A Transportes Luís Simões, S.A., no montante de E 56.520,69.
- A EDP, no montante de E 53.704,50;
- FINIBANCO, S.A., no montante de € 12.026,35;
- VODAFONE PORTUGAL - Comunicações, S.A., no montante de € 1941,08;
- ERNEST & YOUNG Lda, no montante de € 16.179,24.

1.4. - A requerida deduziu oposição, defendendo-se, em síntese:
Impugnou o crédito da requerente e alegou um contra-crédito, bem assim questões susceptíveis de obstarem ao prosseguimento da acção, como a ausência de factos que permitam concluir pela situação de insolvência, a falta de liquidez do crédito da requerente e a incompatibilidade do pedido com as características do processo de falência, para além de, por virtude da compensação de créditos que deverá operar, nem sequer ter a requerente qualquer crédito sobre a requerida.
Concluiu pelo arquivamento do processo, nos termos do artigo 25° n°2 do CPEREF, ou, caso assim não se entenda, deverá sempre seguir a via da recuperação de empresa, já que a requerida é uma empresa claramente viável.

1.5. – A requerente ( fls.556 ), alterou o seu pedido de falência para recuperação de empresa, nos termos dos arts.273º do CPC e 8º e 23º do CPEREF, referindo que posteriormente à instauração da presente acção, as circunstâncias se alteraram, designadamente com a redução dos créditos por parte dos maiores credores, estando a CGD disponível para viabilizar a empresa, reduzindo o seu créditos sob condições, sendo essencial que a requerente não pare de laborar.

1.6. – Respondeu a requerida, no sentido do arquivamento do processo, e subsidiariamente a conversão em recuperação de empresa.

1.7. - Por despacho de fls. 2000 e dada a oposição da requerida ao prosseguimento dos autos, foi determinada a inquirição das testemunhas, tendo sido a mesma realizada, conforme actas de fls. 2007-2008; 2010-2045 e 2096-2099.

1.8. - Por decisão 30 de Julho de 2004 ( cf. fls.2100 a 2111 ) foi determinado o arquivamento dos autos, nos termos do art.25º nº2 do CPEREF.

1.9. – Inconformada, a requerente recorreu de apelação, formulando as seguintes conclusões:
1º) - Um pedido de falência convertido em recuperação, entrado em tribunal em 20.10.03 que só é decidido e mal em 30.7.2004, viola claramente o artigo 10° do CREREF e artigo 6° da convenção para Protecção dos Direitos do Homem, tornando o Estado Português responsável pelos prejuízos causados.
2º) - Os documentos particulares assinados pela requerida e não impugnados fazem prova plena quanto ao seu conteúdo, conforme o artigo 376° do CC.
3º) - E assim, os documentos n° 2,3, 6 e 8 juntos com a petição terão de ser dados como reproduzidos e provados.
4º) - O alegado pela requerida nos artigos 5°, 174°, 226°, 277°, 279°, 284° e 290° da oposição são factos confessados e como tal devem ser considerados.
5º) - Uma sentença que não descrimina os factos que considera provados é nula e viola o artigo 659° do CPC.
6º) - Sendo a sentença nula por não descriminar os factos provados, mas existindo nos autos factos abundantes que permitam ao tribunal de 2ª instância considerar essa matéria de facto, pode, deve este refundir a decisão, conforme o artigo 712° do CPC.
7º) - Mostrando-se como se mostra que a requerente é credora e a requerida se encontra impossibilitada de cumprir pontualmente as suas obrigações, é considerada em situação económica difícil e, no mínimo, deve requerer a providencia de recuperação, podendo qualquer credor faze-lo, conforme resulta dos artigos 3° n° 2, 5° e 8° do CPEREF.
8º) - A decisão recorrida violou, nomeadamente, os artigos 6° da Convenção dos Direitos do Homem, 3°, n° 2, 5°, 8°, 10°, 23°, do CREREF, 273° e 659° do CPC.

Respondeu a requerida, preconizando a improcedência do recurso.


II – FUNDAMENTAÇÃO

2.1. – Delimitação do objecto do recurso:
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões dos recorrentes ( arts.684 nº3 e 690 nº1 do CPC ), impondo-se decidir as questões nelas colocadas, bem como as que forem de conhecimento oficioso, exceptuando-se aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras ( art.660 nº2 do CPC ).
Considerando as conclusões que a apelante extraiu da respectiva motivação, as questões essenciais que importa decidir são as seguintes:
a) - Nulidade do despacho recorrido;
b) – Sendo nulo o despacho, se o processo contem todos os elementos para conhecer da pretensão requerida.

2.2. – 1ª QUESTÃO:

Instaurado o processo de falência em 20/10/2003, é aplicável o Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência ( CPEREF ), aprovado pelo Dec. Lei nº123/93 de 23/4, com as alterações legislativas subsequentes.
Muito embora o CPEREF tenha sido revogado pelo Dec. Lei nº53/2004 de 18/3 ( art.10º ), que aprovou o novo Código da Insolvência e Recuperação de Empresas ( CIRE ), por força do regime transitório contido no art.12º continua a ser aplicável o diploma anterior aos processos de recuperação de empresas e de falências pendentes à data da entrada em vigor do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas.
Deduzida a oposição pela requerida e analisada a prova documental e testemunhal, foi proferido despacho de arquivamento, nos termos do art.25 nº2 do CPEREF.
O arquivamento fundamentou-se em dois tópicos argumentativos:
a) - A requerente não demonstrou a sua qualidade de credora relativamente à requerida, visto não ser possível apurar, em virtude da compensação de créditos, se subsiste algum crédito e respectivo montante, estando pendente uma acção declarativa;
b) - Mesmo a provar-se a existência do crédito alegado, não ficou demonstrada que a requerida se encontre impossibilitada de cumprir as suas obrigações e qualquer das situações previstas no art.8º nº1 do CPEREF, de forma a ser declarada falida ou a adoptar-se qualquer medida de recuperação de empresa.

Não tendo, porém, os despacho impugnado discriminado os factos provados, coloca-se a questão de saber se enferma de nulidade por falta de fundamentação.

Para tanto, impõe-se, antes de mais, abordar a natureza do despacho de arquivamento.
Nos termos do art.1º do CPEREF toda a empresa em situação de insolvência pode ser objecto de uma ou mais providências de recuperação ou ser declarada em regime de falência.
Na fase preliminar ou introdutória do processo, a lei consagra uma tramitação comum ou uniforme tanto para o processo de falência, como para o de recuperação, pois ambas as pretensões assentam no mesmo pressuposto básico, a insolvência do devedor ( art.1º nº2 ).
A diferença dos dois os regimes decorre do facto da empresa ser ou não economicamente viável, mas ambos exigem a verificação dos requisitos postulados nas alíneas a), b) e c) do nº1 do art.8º.
Qualquer credor, independentemente da natureza do seu crédito, tem legitimidade para requerer tanto a falência, como a recuperação da empresa, cuja instância se inicia com o pedido, adrede formulado, nos termos dos arts.8º e 15º, devendo, designadamente, expor os factos que integram os pressupostos da providência ou da declaração de falência.
Perante a petição inicial, segue-se despacho liminar, que pode ser de indeferimento ou de citação ( art.20 ).
Ordenada a citação e findo o prazo da oposição, o tribunal examina as provas, realiza as diligências necessárias à averiguação dos pressupostos invocados e recolhe os elementos que o habilitem a decidir sobre o prosseguimento da acção ( art.24 nº1 ).
Depois dos articulados, em face dos elementos probatórios, o art.25º contem uma fase intermédia, na qual o tribunal emite um juízo de viabilidade sobre o mérito da pretensão requerida, ou seja, se a acção deve ou não prosseguir, podendo tomar uma das seguintes decisões:
a) - Se o tribunal verificar que estão comprovados, segundo um juízo de probabilidade séria, enquanto probabilidade razoavelmente sustentada, os pressupostos de facto e de direito, seja da recuperação, seja da falência, ordenará o prosseguimento da acção.
No caso da recuperação de empresa, convocará a assembleia de credores, nos termos e para os efeitos do art.28º, e prosseguindo o processo para declaração de falência, designará a audiência de discussão e julgamento ( art.123º ).
b) – Não havendo prova dos pressupostos legalmente exigidos, independentemente de oposição, ordenará o arquivamento do processo ( art.25º nº2 ).
Por conseguinte, o despacho de arquivamento contende já directamente com o mérito da acção, ao pressupor a valoração e exame crítico sobre a prova dos pressupostos legais, e dada a fase intermédia em que está inserido, não se reconduz a um mero despacho de indeferimento liminar, apresentando antes alguma similitude com a finalidade do despacho saneador no âmbito do processo comum declarativo, prescrita no art.510 nº1 alínea b) do CPC.
Caracterizada, desta forma, o despacho de arquivamento, a imperativa necessidade de fundamentação factual deriva, não só da sua natureza, como sobretudo dos princípios gerais.
A exigência de fundamentação das decisões judiciais é imposta pelo art.205 nº1 da CRP – “ As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei “.
Segundo a doutrina constitucionalista, ao remeter para a lei ordinária, não implica uma discricionariedade legislativa total, havendo que interpretá-la como uma garantia integrante do próprio conceito de Estado de Direito Democrático ( artigo 2º da Constituição), ao menos quanto às decisões judiciais que tenham por objecto a solução da causa em juízo, como instrumento de ponderação e de legitimação da própria decisão judicial e de garantia do direito ao recurso ( cf. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., 1993, pág. 798/799 ).
Nestes casos, impõe-se a fundamentação ou motivação fáctica dos actos decisórios através da exposição concisa e completa dos motivos de facto bem como das razões de direito que justificam a decisão.
O dever de fundamentação decorre ainda do direito a um processo equitativo, consagrado no art.6º § 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, tal como tem sido entendido pela jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, reportando-se também ao processo civil.
Este dever geral de fundamentação, que goza de tutela constitucional, embora remetido “à forma prevista na lei", justifica-se pela necessidade de que "a parte vencida conheça as razões por que o foi, para que possa atacá-las no recurso que interpuser" ou seja convencida "de que a decisão é conforme à justiça" (cf. Alberto dos Reis, Comentário, vol.2º pág. 172), ou mesmo pela necessidade de controlo do princípio da livre convicção do juiz, constituindo ainda um verdadeiro factor de legitimação do poder jurisdicional, enquanto garantia de respeito pelos princípios da legalidade, da independência do juiz e da imparcialidade das suas decisões (cf. Michele Taruffo, «Note sulla garanzia costituzionale de motivazione» in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, vol. LV (1979), pág.31 e 32 ) e “ La Prueba De Los Hechos “, Editorial Trotta, 2002, pág.400 e segs. )
No âmbito do processo civil, tal dever está expressamente previsto no art.158 do CPC, embora particularmente especificado em relação à sentença, no artigo 659, o que se compreende pelo especial relevo desse acto judicial, mas também para os despachos.
Tanto assim que a nulidade cominada para a sua violação, no artigo 668 nº 1 alínea b), é extensiva aos próprios despachos, por força do disposto no artigo 666 nº 3 do CPC.
A aplicação das regras da sentença aos despachos “ até onde seja possível “ significa, desde logo, a extensibilidade como princípio geral, ou seja, em tudo quanto se lhes puder aplicar, mas tal segmento normativo não legitima a ausência total de fundamentação e o sancionamento do respectivo vício, pois a fundamentação não só é possível, como se torna imperativa.
Conforme orientação jurisprudencial e doutrinária, só releva, para o efeito, a falta absoluta de fundamentação de facto ou de direito, reconduzindo-se a simples deficiência de motivação a afectação do valor doutrinal da sentença ou despacho ( cf., Alberto dos Reis, no Código de Processo Civil Anot., V, pág. 140, e Antunes Varela, na RLJ ano 121, pág. 311; Ac do STJ de 22/1/04 ( relator Salvador da Costa ), de 27/4/04 ( relator Ponce Leão), de 16/12/04 ( relator Ferreira de Almeida ), in www dgsi.pt/jstj ).
Daqui resulta que decidindo-se pelo arquivamento do processo, nos termos do art.25 nº2 do CPEREF, impunha-se uma clara fundamentação de facto, com discriminação dos factos provados, como determina o art.659 nº2, ex vi art.666 nº3 do CPC ).
O despacho impugnado, embora fazendo apelo ao conjunto da prova, não individualizou os factos provados, sendo por isso totalmente omisso quanto à fundamentação de facto, o que implica a nulidade cominada no arts.668 nº1 b) do CPC, aplicável aos despachos.
Noutra perspectiva, a falta dos factos provados sempre importaria, por aplicação do art.712 nº4 do CPC, a nulidade da decisão, por consubstanciar o grau máximo do vício da deficiência.

2.3. - 2º QUESTÃO:

Afirmada a nulidade do despacho, considera a apelante que o processo contém todos os elementos para a Relação conhecer do mérito.
O art.715 nº1 do CPC postula o princípio da substituição, pois embora o tribunal de recurso declare nula a sentença ou o despacho proferidos na 1ª instância, não deixará de conhecer do objecto da apelação, cuja supressão de um grau de jurisdição é compensada pelos ganhos em termos de celeridade, conforme se justifica no preâmbulo do Dec.Lei nº329-A/95 de 12/12.
O sistema da substituição que, já constava no Processo Civil de 1939, funcionando, nestes casos a apelação como “ novo exame da matéria da causa “ ( Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol.V, pág.489 e 490 ), não deixa de estar isento de críticas, sendo “aberrativa “ tal solução, pelo menos quando ocorra as nulidades cominadas nas alíneas b) a e) do nº1 do art.668 do CPC, visto não haver uma verdadeira decisão da 1ª instância sobre o fundo da causa, sacrificando-se a garantia do duplo grau de jurisdição ( cf. Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, vol.III, pág.341 ).
Pode até defender-se que tal solução legislativa, na medida em que posterga o duplo grau de jurisdição, é materialmente inconstitucional, por violação do art.20 nº1 da CRP.
Também na perspectiva do art.712 nº4 do CPC, a Relação só anulará a decisão se do processo não constarem todos os elementos probatórios.
Acontece que, contrariamente ao alegado pela apelante, a Relação não dispõe de todos os elementos de facto que habilitem a conhecer do objecto da apelação, já que apesar de estar junta ao processo um manancial de prova documental, a verdade é que não tem sequer acesso à prova testemunhal.
É certo que houve registo da prova testemunhal, mas tais registos não constam do processo, e, por outro lado, à Relação só compete a audição dos depoimentos gravados quando haja lugar à impugnação da matéria de facto, com os pressupostos adrede estatuídos nos arts.690-A e 712 nº1 a) do CPC, o que não sucede, tanto mais que, dada a omissão total dos factos, a apelante estava impedida de o fazer.
Acresce que, face ao conteúdo da oposição, os documentos nº2, 3, 6 e 8 juntos com a petição, não são suficientes, por si só, para se aferir do crédito alegado.
Por seu turno, e contrariamente ao proposto pela apelante, os factos alegados nos artigos 5°, 174°, 226°, 277°, 279°, 284° e 290° da oposição não estão provados por confissão.
Em primeiro lugar, porque a confissão não faz prova contra o confitente se recair sobre factos relativos a direitos indisponíveis ( art.354 alínea b) do CC ), como parece ser o caso da falência ( cf., por ex., Sousa Macedo, Manual do Direito das Falências, vol.II, pág.22, Ac do STJ de 2/10/2002 ( relator Garcia Marques ), www dgsi.pt/jstj ).
Mas mesmo que assim não seja, tais factos inserem-se na parte em que a requerida impugnou o crédito da requerente, fazendo um historial das relações estabelecidas entre ambas, até à resolução do contrato de fornecimento, logo, por força da indivisibilidade da confissão, não adquirem força probatória plena, valendo apenas como elemento probatório que o tribunal apreciará livremente ( arts.358, 360 e 361 do CC ).
Síntese conclusiva:
a) - É nulo o despacho de arquivamento, proferido nos termos do art.25 nº2 do CPEREF, que careça de fundamentação factual, por não discriminar os factos provados ( arts.158 nº1 e 2, 659 nº2, 668 nº1 b) e 666 nº3 do CPC );
b) - A declaração de nulidade pela Relação não impõe a observância do princípio da substituição ( art.715 nº2 do CPC ) quando não constem do processo todos os elementos necessários para a decisão de mérito.
Como nota final, dir-se-á que a decisão recorrida pode até ser eventualmente justa, por inexistir erro de julgamento, mas, com o devido respeito, houve erro de actividade ( erro de construção ou formação do despacho ) por omissão dos fundamentos.
Procede consequentemente a apelação, devendo o processo baixar à 1ª instância para ser suprida a nulidade do despacho.
III – DECISÃO

Pelo exposto, decidem:
1)
Julgar procedente a apelação e anular o despacho recorrido, que deve ser substituído por outro a suprir a nulidade, se possível pelo mesmo Excelentíssimo Juiz, em conformidade com o referido.

2)
Sem custas.
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Coimbra, 8 de Março de 2005.