Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | LUÍS RAMOS | ||
Descritores: | NOTIFICAÇÃO DO ARGUIDO | ||
Data do Acordão: | 03/12/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TORRES NOVAS – 1º J | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO CRIMINAL | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 113º,196 DO CPP | ||
Sumário: | Encontrando-se extinta a medida de coacção(TIR) e sendo a notificação efectuada ao arguido nos termos do n.º 1, alínea c., do n.º 1 do art.º 113º apenas permitida no âmbito do n.º 2, do art.º 196º, a notificação para comparecimento no IRS a fim de ser elaborado o PIR(Plano Individual de Readaptação) terá que se efectuar mediante uma das formas previstas nas alíneas a) e b), não sendo de aplicar o disposto no n.º 9, uma vez que estamos perante convocação para comparecimento em acto processual. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra. Por sentença de 29 de Setembro de 2006 foi o arguido N………… …. condenado, para do mais, como autor de um crime de desobediência qualificada na pena de seis meses de prisão cuja execução ficou suspensa por dois anos, condicionada à sujeição do arguido a regime de prova através do cumprimento de um plano de readaptação social, executado com vigilância e apoio durante o tempo de suspensão pelos serviços de reinserção social. Ainda na sentença, determinou o M.mo Juiz o seguinte: “Comunique a presente sentença ao IRS competente da área de residência do arguido. Deverá comunicar ao mesmo que no prazo de 15 (quinze) dias, deverá aquele apresentar nos autos o plano de readaptação a que o arguido ficará obrigado por força do regime de prova que lhe foi aplicado como condição de suspensão da execução da pena de prisão em que ele foi condenando. Comunique ainda ao IRS que o mesmo deverá efectuar a vigilância e apoio ao cumprimento pelo arguido do referido plano de readaptação.” Posteriormente o IRS veio informar o tribunal que o arguido não comparecera à entrevista e que o mesmo era desconhecido na morada que lhe fora fornecida. O tribunal ordenou que lhe fosse indicada a morada constante do termo de identidade e residência e o IRS voltou a informar que o arguido não comparecera e que na nova morada indicada, não só não encontrou o arguido, como não lhe foi possível “recolher informação objectiva acerca da sua morada”. Na sequência, o Ministério Público promoveu que se oficiasse à PSP do Entroncamento que averiguasse o paradeiro do arguido e que apurado o mesmo, aquele fosse notificado para em cinco dias contactar o IRS a fim se ser elaborado o PIR. Sobre esta promoção recaiu o seguinte despacho: “Fls. 52-A: Resulta do disposto nos artigos 58°, nº 2, e 61°, nº 3, alínea c), do Código de Processo Penal, que a constituição como arguido está intimamente conexionada com a prestação de termo de identidade e residência. Para além disso, a medida de coação de TIR é a única que deve ser aplicada ao arguido em todas as situações. As outras apenas serão aplicadas caso esteja preenchido algum dos fundamentos previstos no artigo 204°, do Código de Processo Penal. Consequentemente, o termo de identidade e residência mantém-se válido e eficaz no processo crime enquanto o agente mantiver a qualidade de arguido. O artigo 214°, do Código de Processo Penal apenas determina a extinção das restantes medidas de coação, para além o TIR. Consequentemente, o arguido continua a ser notificado por carta simples para a morada que consta do TIR, nos termos dos artigos 113°, nº 1, alínea c), e nº 3, e 196°, n.ºs 2 e 3, do Código de Processo Penal, ainda que a decisão proferida nos autos já tenha transitado em julgado. Ainda que assim não fosse, não se vislumbra a existência de qualquer norma que determine que a partir do momento em que transitar em julgado a decisão proferida nos autos, o arguido deixe de poder ser notificado através de carta simples, nos termos do artigo 113°, nº 1, alínea c), nº 3, do Código de Processo Penal. Se a notificação era feita nesses termos, não se vislumbra a razão para alterar os mesmos. Deste modo, o arguido continuará a ser notificado por carta simples para a morada que consta no TIR. Para além disso, considera-se a notificação efectuada ao arguido no 5° dia posterior à data da declaração lavrada pelo distribuidor do serviço postal, ou seja da data do depósito da carta na caixa do correio. Refira-se ainda que a Sra. Procuradora-adjunta vem solicitar na sua promoção que o arguido seja notificado pessoalmente através dos OPCs competentes. Contudo, não indica qual é a norma em que se funda para pedir a notificação pessoal do arguido. O Tribunal não vislumbra qual é a norma em que a Sra. Procuradora-adjunta se baseia para apresentar esse pedido. Por outro lado, ainda que se admitisse que o arguido deixava de poder ser notificado por carta simples para a morada que consta do TIR após ocorrer o trânsito em julgado da decisão condenatória proferida nos autos, a solução nunca passaria pela notificação pessoal daquele através de funcionário. Na verdade, caso fosse essa a conclusão, aplicar-se-ia o disposto no artigo 255°, nº 1, do Código de Processo Civil, aplicado por remissão sucessiva dos artigos 254°, nº 1, do Código de Processo Civil, e 4°, do Código de Processo Penal. Nesse caso a notificação seria sempre enviada por carta registada para a morada que consta nos autos, ou seja a que figura no TIR. E, nos termos dos artigos 254°, nº 2, e 255°, nº 1, do Código de Processo Civil, a notificação do arguido considera-se efectuada no 3° dia a contar da data do envio da carta para o seu domicílio. Em qualquer dos casos sempre se dirá que a notificação directamente ao arguido para efeito do mesmo contactar o IRS para efeito de elaboração do Plano de readaptação social não é obrigatória. Na verdade, nos termos do artigo 113°, nº 9, do Código de Processo Penal, o arguido deverá ser considerado notificado para vir esclarecer a razão do seu incumprimento da condição para a suspensão da execução da pena de prisão através do seu defensor. Resulta dessa norma que apenas será necessário notificar o defensor, na medida em que a situação em causa não se integra nas situações em que é obrigatória a notificação do arguido igualmente. Em conformidade, e pelo exposto, indefere-se a promoção do Ministério Público para que fosse solicitado à PSP que determinasse o paradeiro do arguido, e ainda que, quando tal ocorresse, o notificasse pessoalmente para contactar o IRS. Ao invés, determina-se que se proceda à notificação do arguido N…., por carta simples e para a morada que consta do TIR, para que o mesmo, no prazo de 5 dias, entre em contacto com o IRS, com vista a permitir que este proceda à elaboração cio plano de readaptação social que foi determinado como condição para a suspensão da pena de prisão que foi aplicada ao arguido nos presentes autos. Notifique igualmente o IRS para vir esclarecer se o arguido entrou em contacto com aquela entidade com vista à elaboração do plano de readaptação, conforme lhe foi determinado.” Inconformado com o decidido, vem o Ministério Público impugná-lo, concluindo assim a respectiva motivação: 1º O Mm.º juiz não fez uma correcta interpretação das disposições conjugadas dos arts 113.°, n.º 3, 196.º, n.ºs 2 e 3 als. c) e d), 214º, n.º 1 al. e) e 495º, n.º 2 todos do Código Processo Penal. 2.° Ao considerar o arguido devidamente notificado por via postal simples com prova de depósito, para a morada constante do Termo de Identidade e Residência, quando se visa a realização do Plano Individual de Readaptação pelo Instituto de Reinserção Social condição da suspensão da execução da pena de prisão e que, consequentemente, a referida medida de coacção se mantém mesmo após o trânsito em julgada de uma sentença condenatória, violou os artºs 113.º, n.º 3, 196º, n.º 2 e 3 al. c), 495º n.º 2 al. c) e 214º, al. e) do Código de Processo Penal. 3.° As aludidas disposições legais deveriam ler sido interpretadas no sentido de que o termo de identidade e residência é uma medida de coacção! E como tal, Extinguiu-se após o trânsito em julgado da sentença, deixando o arguido de se encontrar sujeito às obrigações decorrentes do termo de identidade e residência, pelo que, a notificação por via postal simples é neste caso inadmissível. – cfr. Art. 214º, al. e) do Código de Processo Penal. 4º De resto, se o legislador quisesse ter excepcionado o Termo de Identidade e Residência do art. 214º do Código de Processo Penal, tê-lo-ia feito, o que não sucedeu. 5º Por outro lado, também se não diga que o arguido se deverá considerar notificado na pessoa do seu defensor ao abrigo do art. 196º, n,.º 3 al. d) uma vez que o Termo de Identidade e Residência já se extinguiu, bem como as obrigações dele decorrentes, Violou assim o Mm.o Juiz a quo” o art. 196º, n.º 3, alínea j) do Código de Processo Penal. Pelo exposto, deverá o despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que proceda a diligências no se1tido de apurar o paradeiro do arguido ou proceda à sua notificação pessoal, assim se fazendo JUSTIÇA! O recurso foi admitido para subir imediatamente, em separado, com efeito meramente devolutivo. Nesta instância o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual se manifesta pela procedência do recurso. Os autos tiveram os legais vistos após o que se realizou a conferência. Cumpre conhecer do recurso. Constitui entendimento pacífico que é pelas conclusões das alegações dos recursos que se afere e delimita o objecto e o âmbito dos mesmos, excepto quanto àqueles casos que sejam de conhecimento oficioso. É dentro de tal âmbito que o tribunal deve resolver as questões que lhe sejam submetidas a apreciação (excepto aquelas cuja decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras). Cumpre ainda referir que é também entendimento pacífico que o termo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir. Questão a decidir: qual a forma que deve revestir a notificação do arguido para comparecer junto do IRS a fim de ser elaborado o PIR Apreciando: O arguido foi condenado, por sentença já transitada, em pena de prisão cuja execução ficou suspensa na condição de se sujeitar “a regime de prova através do cumprimento de um plano de readaptação social, executado com vigilância e apoio durante o tempo de suspensão pelos serviços de reinserção social”. O arguido não compareceu junto do IRS para que pudesse ser elaborado PIR e o seu paradeiro é desconhecido. O Ministério Público requereu que o mesmo fosse averiguado pelo OPC competente e o M.mo Juiz a quo considerou que a notificação deveria ser efectuada para a morada constante do termo de identidade e residência. O Ministério Público não concordou e recorreu com vista a que aquele despacho fosse revogado e substituído por outro que deferisse a sua promoção para averiguação de paradeiro pelo OPC. Vejamos: As medidas de coação, das quais o termo de identidade e residência faz parte (art.º 196º do Código de Processo Penal[ Diploma a que pertencerão todas as disposições sem indicação de origem ]), extinguem-se, sem qualquer excepção, com o trânsito em julgado da sentença condenatória (art.º 214º, n.º 1, alínea e.). Ora, uma vez que a sentença condenatória proferida nos autos já transitou, a medida de coacção em vigor, o TIR, extinguiu-se e consequentemente todas as obrigações dela decorrentes, nomeadamente as respeitantes à residência. Não estava assim o arguido obrigado a manter o domicílio que indicara aquando da prestação de T.I.R., nem a informar as suas ausências do mesmo. Por isso, não são legais as notificações que após trânsito da sentença lhe sejam feitas por via postal simples para a residência constante do T.I.R., pois que as mesmas apenas são permitidas nos casos expressamente previstos na lei (art.º 113º, n.º 1, alínea c.). O que não é o caso, visto a medida de coação T.I.R. já se encontrar extinta. Encontrando-se extinta a medida e sendo a notificação efectuada ao arguido nos termos do n.º 1, alínea c., do n.º 1 do art.º 113º apenas permitida no âmbito do n.º 2, do art.º 196º, parece-nos que a notificação para comparecimento no IRS a fim de ser elaborado o PIR terá que se efectuar mediante uma das formas previstas nas alíneas a. e b., não sendo de aplicar o disposto no n.º 9, uma vez que estamos perante convocação para comparecimento em acto processual. Assim sendo, há que apurar o paradeiro do arguido a fim de que o mesmo possa ser notificado mediante contacto pessoal ou via postal registada. Se não puder ser apurado o paradeiro e consequentemente notificar o arguido, o tribunal a quo terá que enquadrar juridicamente a situação e retirar daí os devidos efeitos. DECISÃO Em face do exposto, julga-se o recurso procedente e consequentemente determina-se que o tribunal a quo profira despacho onde seja determinada a indagação do paradeiro do arguido. * Sem tributação. * Coimbra, 12 de Março de 2008 |