Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
38/13.8JACBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: OLGA MAURÍCIO
Descritores: OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Data do Acordão: 01/14/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COIMBRA (VARA MISTA)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: INDEFERIDA A ARGUIÇÃO DE NULIDADE
Legislação Nacional: ART. 379.º, N.º 1, AL. C), DO CPP
Sumário: I - A omissão de pronúncia significa ausência de decisão sobre questões que a lei impõe sejam conhecidas, que abrange quer as questões de conhecimento oficioso, quer as questões colocadas à apreciação do tribunal pelos sujeitos processuais.

II - A omissão de pronúncia geradora de nulidade é apenas aquela que não trata da questão colocada e não também a que não responde a cada um dos motivos, argumentos, usados pelo interveniente.

Decisão Texto Integral:
Acordam na 4ª secção do Tribunal da Relação de Coimbra:

RELATÓRIO


1.

Os arguidos A... e B... arguiram a nulidade do acórdão proferido por esta relação por várias razões.

Alegam que ocorreu erro na apreciação da prova, em sentido lato, porque a prova existente no processo não permite considerar provados os factos julgados como provados na decisão da matéria de facto, sendo que este tribunal não analisou a prova em que o acórdão proferido pela 1ª instância assentou a sua convicção, nomeadamente o depoimento do arguido C... perante o JIC e o depoimento das testemunhas D... e E... em julgamento.

            Depois, em desenvolvimento do alegado, especificam que relativamente à arguida não se indica nenhum indício, resultante das provas, que permita estabelecer ligação entre ela e a actividade ilícita eventualmente cometida pelos demais arguidos, sendo que quanto ao arguido nada se diz sobre o depoimento de F..., que afirmou que o arguido não tinha nenhuma responsabilidade e/ou conhecimento da actividade que ela desenvolveu, e sobre o depoimento de outra testemunha, que disse que não lhe comprou droga.

            Alegam também, ao que percebemos, que o tribunal não apreciou a conclusão de que o «tribunal a quo partiu de pressupostos errados e inaceitáveis …», que «o tribunal a quo esqueceu ou violou o princípio da presunção de inocência …», uma outra que diz que «o tribunal ignorou que as declarações de arguidos e testemunhas eventualmente contidas em tais registos não constituem os meios de prova por declarações de arguido ou por testemunhas legalmente admitidos …», que «ao valorar tais escutas em prejuízo da recorrente A..., com base em conversas tidas entre outros arguidos e entre arguidos e testemunhas … o tribunal a quo violou pelo menos essa proibição de valorar depoimentos indiretos, prevista no artigo 129 do C.P.P. …», tal como não se pronunciou, no sentido «jurídico e judicial», sobre as invocadas «contradições insanáveis entre os factos transcritos na motivação do recurso como nº I – XIV e XXIV e como nº XXX – XXXVIII dos factos provados na decisão da matéria de facto e “outros factos provados”», e quanto à conclusão de que o acórdão recorrido cometeu erro notório na apreciação da prova ao considerar que a natureza dos factos imputados implica, em regra, dificuldades na espontaneidade da prova testemunhal e determina a necessidade de recorrer a outros elementos e meios de prova e, por fim, que não apreciou a invocação de que interpretar o art. 187º, nº 8, do C.P.P. no sentido de que o mesmo amplia o elenco dos meios de prova admitidos, ou que as declarações de arguidos e testemunhas contidas em intercepções telefónicas não estariam sujeitas às regras de prestação de depoimento, violaria o princípio do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva e todas as garantias de defesa referidas no art. 32º da Constituição e, por via disso, feriria de inconstitucionalidade o art. 127º do C.P.P., pelas mesmas razões.

            O Ministério Público pronunciou-se sobre o pedido, alegando que houve pronúncia sobre todas as questões invocadas, embora as conclusões retiradas sejam contrárias às pretensões manifestadas. E é essa circunstância que motiva o requerimento apresentado que, pela sua insubsistência, deverá ser indeferido.


*

DECISÃO

Com o presente requerimento os arguidos pretendem, basicamente, que o tribunal se pronuncie sobre toda a prova produzida e sobre as questões de legalidade de prova invocadas e que, reparando a decisão, decida pela sua absolvição.

            Nos termos do art. 379º, nº 1, al. c), do C.P.P. é nula a sentença «quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar …» (aplicável aos acórdãos proferidos em recurso por via do nº 4 do art. 425º).

            A omissão de pronúncia significa ausência de decisão sobre questões que a lei impõe sejam conhecidas, que abrange quer as questões de conhecimento oficioso, quer as questões colocadas à apreciação do tribunal pelos sujeitos processuais.

            Portanto, a omissão de pronúncia equivale ao não conhecimento de questões, é o silêncio sobre questão que o tribunal devia conhecer.

            Questão bem diferente é a abordagem feita ao caso pela decisão ter que seguir, a par e passo, os termos em que os intervenientes colocam as questões.

Por isso se repete, a cada passo, que a omissão de pronúncia geradora de nulidade é apenas aquela que não trata da questão colocada e não também a que não responde a cada um dos motivos, argumentos, usados pelo interveniente.

Usando as palavras proferidas pelo S.T.J. no acórdão de 24-10-2012, processo 2965/06.0TBLLE, diremos que «a “pronúncia” cuja “omissão” determina a consequência prevista no artigo 379º, nº 1, alínea c) CPP – a nulidade da sentença – deve, pois, incidir sobre problemas e não sobre motivos ou argumentos; é referida ao concreto objecto que é submetido à cognição do tribunal e não aos motivos ou as razões alegadas».

Os arguidos alegam, em síntese, que este tribunal não conheceu a prova invocada no recurso e apontam vários exemplos ilustrativos do que, para eles, sucedeu.

            Diferentemente, entendemos que no acórdão reclamado a prova produzida foi conhecida, independentemente do percurso trilhado coincidir, ou não, com o seguido pelos arguidos na reclamação, e foi partindo desse conhecimento, exposto no acórdão, que concluímos que a convicção formulada pelo tribunal de 1ª instância respeitou essa mesma prova. Daí a manutenção da decisão de facto, precisamente porque as provas a suportavam.

            Do mesmo modo todas as questões jurídicas invocadas, e que os arguidos pretendem que sejam de novo abordadas, foram conhecidas.

É verdade que as conclusões a que o tribunal de recurso chegou são diferentes das conclusões avançadas pelos arguidos na reclamação, mas essas divergências são irrelevantes para os efeitos pretendidos.

Pelo exposto indefere-se o requerido.

Taxa de justiça mínima pelos arguidos.

Coimbra, 14 de Janeiro de 2015

           

(Olga Maurício - relatora)

(Luis Teixeira - adjunto)