Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2339/16.4T8LRA.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA JOÃO AREIAS
Descritores: CONTRATO DE INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
VALORES MOBILIÁRIOS
DEVER DE INFORMAÇÃO
RESPONSABILIDADE CIVIL
BANCO
Data do Acordão: 05/15/2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - LEIRIA - JC CÍVEL - JUIZ 4
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS.1, 7, 304, 309, 312, 314, 322 CVM
Sumário:
1. A atividade do intermediário financeiro é norteada, entre outros, pelo princípio da proteção dos interesses do cliente, pelo princípio de agir de boa-fé e pelo princípio de conhecimento do cliente.
2. A extensão e a profundidade da informação a prestar pelo intermediário ao cliente devem ser tanto maiores quanto menor for o seu grau de conhecimento e experiência, de modo a permitir-lhe uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada.
3. O titular de “Obrigações SLN 2006”, por se tratar de obrigações subordinadas, apenas pode ser pago pelo património da entidade emitente, em caso de insolvência desta, depois de pagos os credores comuns e, tratando-se de obrigações a 10 anos, o reembolso do capital só seria possível ao fim de 10 anos.
5. Apresentando as obrigações “SLN 2006” como sendo “equivalentes a um depósito a prazo”, em que “o reembolso do capital era garantido, por não se tratar de um produto de risco” e que “o cliente poderia dispor do respetivo capital quando assim o entendesse”, omitindo informação indispensável à avaliação dos riscos relacionados com o reembolso do capital e respetivos juros, a Ré violou de forma grave o dever de informação constante do art. 312º do CVM.
6. O nº2 do artigo 314º do CVM consagra uma presunção de culpa e também de nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação pelo intermediário financeiro e os danos sofridos pelo cliente.
Decisão Texto Integral:
Processo nº 2339/16.4T8LRA.C1 – Apelação

Relator: Maria João Areias
1º Adjunto: Alberto Ruço
2º Adjunto: Vítor Amaral
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2ª Secção):

I – RELATÓRIO

A (…) e mulher, M (…) intentam a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra Banco (…), S.A.,
pedindo, a título principal:
a) – A condenação da ré a pagar aos autores o capital e juros vencidos e garantidos que, à data da entrada da petição inicial, perfaziam a quantia de €115.000,00, bem com os juros vincendos desde a citação até efetivo e integral pagamento.
ou, subsidiariamente:
b) – A declaração de nulidade de qualquer eventual contrato de adesão que a ré invoque para ter aplicado os €100.000,00 que os autores lhe entregaram;
c) – A declaração de ineficácia em relação aos autores da aplicação que a ré tenha feito daquele montante;
d) – A condenação da ré a restituir aos autores €115.000,00 que ainda não receberam dos montantes que lhe entregaram e de juros vencidos à taxa contratada, acrescida de juros legais vincendos, desde a data da citação até efetivo e integral cumprimento.
E sempre:
e) - A condenação da ré a pagar aos autores a quantia de €5.000,00 a título de danos não patrimoniais.
Alegando, para tal e em síntese:

sendo clientes da ré (então BPN) na sua agência de Pombal, com uma conta de depósitos à ordem, em dia que desconhecem e sem que tivessem dado qualquer ordem escrita, o gerente da ré aplicou o montante de €100.000,00, pertencente àqueles, em obrigações SLN 2006;
os autores não souberam e muito menos consentiram em tal aplicação e disso só tiveram conhecimento após maio de 2015;
os autores estavam absolutamente convictos que tinham o seu dinheiro aplicado num depósito a prazo, como sempre sucedeu.
os juros foram sendo semestralmente pagos, até maio de 2015;
nunca foi intenção dos autores investir em produtos de risco, como era do conhecimento do gerente e dos funcionários da ré;
os autores não sabiam o que era a SLN, pensando que era uma mera denominação de conta a prazo, que a ré utilizava, pelo que desconheciam e nem podiam conhecer que o seu dinheiro tinha sido aplicado em aplicações com características diferentes de um depósito a prazo;
nem sequer foram informados sobre a compra das obrigações subordinadas SLN 2006, pelo que a ré é depositária dos €100.000,00 que mantém aplicados naquelas obrigações;
os autores sempre quiseram efetuar um depósito a prazo e nunca subscreveram qualquer documento de aquisição daquele produto;
nunca qualquer contrato lhes foi lido ou explicado e tais documentos, a existirem, só podem ser contrato de cláusulas contratuais gerais, que não foram assinados pelos autores ou que, se o foram, forram-no de forma inconsciente, pelo que não têm validade, sendo nulos;
não tem sido cumprido o pagamento dos juros acordados, uma vez que contrataram uma taxa de 4,5% ao ano ilíquida e estão a ser pagos juros na ordem de 1%;
em virtude da atuação da ré, os autores ficaram impedidos de usar o seu dinheiro como bem entendessem e tem-lhes provocado ansiedade, tristeza e dificuldades financeiras para gerir a sua vida, computando o respetivo dano não patrimonial “num mínimo de €5.000,00”.

Ré apresentou contestação, excecionando a ineptidão da petição inicial, a incompetência em razão do território, a exceção perentória da prescrição, pelo facto de, constituindo a atuação da Ré um ato de intermediação mobiliária, terem decorrido mais de dois anos a contar do conhecimento, pelos autores, da subscrição do produto em apreço.
Alegando, ainda o seguinte:
desde sempre os autores mostraram apetência por investimentos em aplicações financeiras, ainda que de baixo risco, nomeadamente em valores mobiliários, o que demonstra que, não tendo formação específica em área financeira, tinham conhecimentos e experiência suficientes para um tal tipo de investimento, com conhecimento da respetiva natureza, riscos e maior rentabilidade relativamente a um vulgar depósito a prazo;
as Obrigações SLN 2006 foram emitidas, como o próprio nome indica, pela SLN, SGPS, S.A., sociedade titular de 100% do capital social do Banco réu. Qualquer obrigação é tendencialmente um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente; no caso concreto, o facto de a entidade emitente ser “mãe” do Banco, sendo este necessariamente, um garante da solvibilidade daquela, por ser o principal ativo do seu património, do que concluiu que “dificilmente haveria um produto financeiro tão seguro com a subscrição daquelas obrigações” e que o risco de um depósito a prazo seria, então, semelhante a uma tal subscrição por o risco da SLN ser indexado ao risco do próprio Banco, isto sem prejuízo do Fundo de Garantia de Depósitos, à data, garantindo o valor máximo de €25.000,00 por conta bancária;
o produto dado à subscrição dos autores era efetivamente seguro, acabando o seu incumprimento por ser determinado “por circunstâncias completamente imprevisíveis e anormais”;
foram explicadas aos autores as condições do produto, acompanhadas com a respetiva nota técnica;
a subscrição de Obrigações SLN não foi sujeita a qualquer tipo de contrato de adesão, ou qualquer tipo de formulário de cláusulas contratuais gerais, sendo, antes de mais, um contrato entre os autores e a SLN (não o Banco), que não se corporizou, que a ré saiba, num qualquer escrito, mas apenas e tão-só numa proposta da SLN, veiculada pelo Banco réu e uma aceitação dos autores, corporizada numa ordem de subscrição de títulos.
Os autores apresentaram articulado de resposta, pugnando pela improcedência de todas as exceções invocadas pela ré e, no seguimento daquela ter defendido haver atuado como intermediária financeira, vieram os autores invocar a nulidade do contrato de intermediação financeira por vício de forma, como um dos fundamentos em que sustentam o seu entendimento de o prazo prescricional ser de vinte anos e não de dois anos; ainda à luz do regime próprio da intermediação financeira, mais defenderam que a ré atuou, no mínimo, com culpa grosseira e muito grave, pelo que, também por esse fundamento, é aplicável aquele prazo prescricional mais longo consagrado no artigo 324º, nº2, do CVM.
Também no sentido de concluírem ser esse o prazo prescricional, mais reiteraram que o Banco atuou, in casu, como um garante da solvabilidade do produto e não como mero intermediário financeiro e defenderam a sua responsabilidade advinda, também, da violação do seu dever de prestação de conselho e informação, tendo incumprido os ditames da boa-fé negocial, pelo que ocorre responsabilidade quer na formação do contrato, quer contratual.


*

Foi proferido despacho saneador, julgando improcedente a arguição da ineptidão da petição inicial, relegando para final a apreciação da exceção perentória da prescrição.

Realizada a audiência de julgamento, o juiz a quo proferiu sentença a julgar a ação improcedente, absolvendo a ré do pedido.


*

Inconformados com tal decisão, os autores dela interpõem recurso de apelação, concluindo a sua motivação com as seguintes conclusões Face ao incumprimento do dever de nelas sintetizar os fundamentos do recurso, nos termos do artigo 639º, nº1 do CPC.:

(…)


*

A Ré apresentou contra-alegações no sentido da inadmissibilidade da impugnação da decisão sobre a matéria de facto e pela improcedência da apelação da autora.

*
Cumpridos os vistos legais nos termos previstos no nº2, in fine, do artigo 657º do CPC, cumpre decidir do objeto do recurso.

II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., arts. 635º, e 639, do Novo Código de Processo Civil –, as questões a decidir são as seguintes:

1. Impugnação da matéria de facto.

2. Responsabilidade civil da Ré por violação do dever de informação.

3. Nulidade do contrato respeitante à subscrição das obrigações SLN 2006.

4. Prescrição do direito dos autores.

III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

1. Impugnação da matéria de facto.

(…)


*

A. Matéria de Facto

São os seguintes os factos dados como provados na sentença recorrida, com as alterações aqui introduzidas:

1. Os autores foram clientes da aqui ré (à data B (…)), na sua agência de Pombal, com a conta à ordem nº…, onde movimentavam parte do seu dinheiro, realizavam pagamentos e efetuavam poupanças.

2. Em 8 de maio de 2006, a autora mulher subscreveu, junto dessa agência, duas obrigações SLN 2006, cada uma no valor de €50.000,00.

3. Aquando do referido em 2., a autora mulher assinou o boletim de subscrição respetivo.

4. Desse documento, assinado também por funcionário do Banco, na parte respeitante ao seu recebimento, referente a “SLN 2006 Boletim de Subscrição”, datados de 8 de maio de 2006, consta o seguinte:
«Natureza da Emissão
Emissão até 1.000 obrigações subordinadas, ao portador e sob a escritural, com o valor nominal de €50.000,00 cada uma, oferecidas diretamente ao público, ao preço unitário igual ao valor nominal.» (…)
«Prazo e reembolso
O prazo de emissão é de dez anos, sendo o reembolso do capital efetuado em 09 de maior de 2016. O reembolso antecipado da emissão só é possível por iniciativa da S (…), S.A., a partir do 5º ano, e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal.
Remuneração
Juros pagos semestral e postecipadamente, às seguintes taxas:
Cupões Taxa anual nominal bruta
1º semestres 4,5%*
9 cupões seguintes Euribor a 6 meses + 1,15%
Restantes 10 semestres Euribor a 6 meses + 1,50%
*Taxa anual efetiva líquida: 3,632%

5. As Obrigações SLN 2006 foram emitidas (como o próprio nome indica) pela SLN, SGPS, S.A., que era, à data, titular de 100% do capital social do Banco réu (então BPN), participação que deteve de forma permanente até novembro de 2008, altura em que foi legislada a nacionalização de todas as ações integradoras do capital social daquele.

6. A circunstância de a emitente do produto referido em 2. ser a empresa que detinha o BPN, sendo este, necessariamente, um garante da solvibilidade daquela, por ser o principal ativo do seu património, aliada às características específicas das obrigação – que são, tendencialmente, um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente – levavam a que o mencionado produto financeiro fosse, à data da sua emissão, apresentado pelo Banco Réu como seguro, com um risco semelhante ao risco de um depósito a prazo no próprio Banco.

7. As orientações e comunicações internas existentes no BPN e que este transmitia aos seus comerciais nos respetivos balcões consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade e assegurar que tinha um risco semelhante ao de um depósito a prazo junto do próprio Banco. Para tanto, era argumentado que a SLN Valor era a maior acionista da SLN SGPS, sendo que esta detinha 100% do BPN, pelo que não era vista qualquer diferença entre o risco BPN e o risco daquelas aplicações SLN.

8. A ré pretendia, à data, que os seus funcionários tivessem especial empenho na colocação destes produtos e passassem a ideia de que aos mesmos não estavam associados quaisquer riscos quanto ao reembolso do capital e juros.

9. Foi transmitido à autora, por funcionário da ré que lhes sugeriu esse produto, a informação de que o reembolso do capital aplicado era garantido (porquanto não era produto de risco), que tinha uma rentabilidade assegurada, com juros semestrais e que poderia dispor do capital investido quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de alguns dias.

10. À data, era extremamente fácil e rápido conseguir a transmissão das obrigações por via do endosso, porquanto a procura superava inúmeras vezes a oferta.

11. A autora subscreveu as mencionadas obrigações no convencimento de que o dinheiro tinha sido investido numa aplicação segura (no sentido de ser de baixo risco), cujo reembolso do capital era garantido e que lhe seriam pagos os juros.

12. A autora não pretendia aplicar o seu dinheiro em produtos de risco, como era do conhecimento dos funcionários da ré que com ela contactavam, sendo por eles percetível que não possuía qualificação específica ou formação técnica que lhe permitisse, à data, conhecer cabalmente os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente e que, por isso, tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro.

13. A 16-06-2013, os autores haveriam já efetuado uma “compra PTBPNCXE000 TIT203/2003061601245”, no valor de 20.000,00 €.

14. Os autores têm estado impedidos de usar o dinheiro aplicado nas obrigações referidas em 2.

15. Os AA. não sabiam e nem sabem o que são obrigações.

16. O Banco Réu não explicou aos AA. o que eram obrigações.

17. Os autores não possuíam conhecimentos e nem experiência suficientes para compreenderem o tipo de investimento que fizeram e ninguém lho explicou corretamente.

18. Ninguém explicou aos AA. que BPN e SLN eram duas entidades distintas e que investir em SLN, era diferente de aplicar dinheiro no BPN.

19. Ninguém explicou aos autores que o BPN não tinha nenhuma responsabilidade pelo pagamento deste produto e que não o garantia.


*
B. Subsunção dos factos ao direito

Os autores fundamentam o seu pedido de reembolso do valor investido nas “Obrigações SLN 2006” e respetivos juros, bem como o seu pedido de indemnização por danos não patrimoniais, em duas distintas causas de pedir:

- a título principal, na responsabilidade civil do Banco Réu, alegando nunca se terem apercebido de que o seu dinheiro tinha sido aplicado em algo diferente de um depósito a prazo, quer porque nunca subscreveram qualquer documento de aquisição de Obrigações SLN 2006, quer porque se as quisessem ter adquirido teriam de ter sido informados sobre as respetivas condições de aquisição, quanto à liquidez do capital, vencimento da retribuição, prazos de reembolso, o que não sucedeu.

- a título subsidiário, na nulidade de um eventual contrato respeitante à aquisição de obrigações subordinadas SLN 2006, nomeadamente, por não lhe ter sido entregue qualquer cópia que contivesse as respetivas clausulas gerais.

A sentença recorrida negou a pretensão dos autores à nulidade do contrato, não reconhecendo a existência de qualquer contrato entre a autora e a Ré que se regesse por cláusulas gerais, bem como a verificação de qualquer responsabilidade civil por parte da Ré.

Os Apelantes insurgem-se contra o decidido pelo tribunal recorrido relativamente a cada um dos fundamentos em que fizeram apoiar a sua pretensão ao reembolso do montante investido nas “obrigações SLN 2006”.

Quanto à invocação da nulidade do contrato, por ter sido levantada unicamente a título subsidiário, diremos, por agora, tão só, que os autores invocaram, não a nulidade de um eventual contrato celebrado entre eles e a aqui Ré, mas, de um eventual contrato por si assinado relativamente à subscrição das Obrigações SLN 2006, quer por, a ter ocorrido, não lhe ter sido entregue uma cópia das respetivas cláusulas gerais, quer por as mesmas não lhe terem sido explicadas.
Relativamente à questão de a subscrição de tais obrigações ter sido efetuada mediante a celebração de um contrato com recurso a cláusulas contratuais gerais, o Boletim de Inscrição junto pela Ré com a sua contestação (fls. 20 do processo físico) – previamente subscrito na íntegra, deixando-se nele apenas espaço para preenchimento dos dados respeitantes à identificação do subscritor, data número de obrigações prescritas –, não deixa margem a dúvidas quanto à margem de negociação dada aos subscritores relativamente às clausulas a que se acharia submetido tal contrato, sendo o mesmo, na sua íntegra, celebrado única e exclusivamente com recurso a cláusulas contratuais gerais.

Começaremos, assim, a apreciação do presente recurso pela análise do pedido e causa de pedir formulados a título principal, sendo que, só no caso de confirmação do juízo de improcedência formulado pelo tribunal recorrido relativamente à responsabilidade civil da Ré, se manterá o interesse e utilidade na apreciação do pedido formulado nos autos a título subsidiário relativamente à nulidade do contrato.

2. Responsabilidade civil do Banco Réu por violação dos deveres de informação

A sentença recorrida, aderindo à posição assumida pela Ré nos respetivos articulados, veio a considerar que “se extrai dos factos assentes que estavam reunidos todos os pressupostos para que a informação prestada pela Ré fosse, à data, a correta e correspondesse à realidade, na medida em que, efetivamente a entidade emitente era tão ou mais segura do que o próprio Banco, uma vez que era a empresa que detinha 100% do capital deste”. Segundo o raciocínio aí exposto, “as únicas diferenças, em termos práticos e objetivos” entre um depósito a prazo e as obrigações subscritas pelos autores, seriam os seguintes:
- por um lado, e em sentido que lhes era favorável, aquele produto financeiro oferecia-lhes uma rentabilidade bem mais vantajosa;
- por outro lado, no caso de o grupo financeiro (aqui incluído o Banco) colapsar, não beneficiava do Fundo de Garantia de Depósitos (o qual, à data tinha como limite 25.000,00 € e, portanto, sempre seira insuficiente para garantir o valor investido).

Segundo a sentença recorrida, não sendo exigível que a Ré, intermediária financeira, em 2006 previsse o colapso financeiro da SLN, não se lhe poderia assacar qualquer responsabilidade no incumprimento em causa:
Independentemente de lhes ter sido ou não explicado (a ambos ou à autora mulher, que foi a contraente), com todo o pormenor, em que consistia o produto financeiro, o certo é que – à data, no cenário então existente – estavam reunidas as condições objetivas para acreditar, sem margem para dúvida, que o Banco estava a propor um produto de capital garantido e sem risco para o seu cliente, pelo que a ligação da emitente ao próprio Banco sempre seria argumento sustentador da veracidade da informação que era prestada.

Conclui a sentença recorrida não se estar perante uma situação que permita responsabilizar a ré ao abrigo do instituto da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, nos termos do artigo 483º, por não se verificar a ilicitude no comportamento da ré, nem qualquer forma de responsabilidade pelo risco.

Não podíamos estar mais em desacordo com a argumentação e resposta dada pela sentença recorrida à pretensão dos autores e, isto, mesmo sem contar com as pequenas alterações aqui introduzidas à matéria de facto na sequência da impugnação deduzida pelos Apelantes.

Com efeito, em nosso entender (e, nesta parte, dando razão aos apelantes), a matéria dada como provada na sentença recorrida era, por si só, mais do que suficiente para responsabilizar a Ré, enquanto intermediária financeira, por violação, de forma grave, dos mais elementares deveres de informação previstos no Código de Valores Mobiliários (aprovado pelo Decreto-Lei nº 486/99 de 13 de novembro, com as alterações que lhe foram sendo sucessivamente introduzidas até ao DL 219/2006, de 2 de novembro).

A comercialização de obrigações – uma das categorias de valores mobiliários previsto na al. b), do artigo 1º do CVM – integra-se na atividade de intermediação mobiliária a exercer pelas instituições de crédito.

Consagrando o artigo 304º do CVM os princípios norteadores da atividade dos intermediários financeiros – verdadeiros deveres gerais de conduta, que se sobrepõem ao dever de prestação objeto do negócio existente entre o intermediário financeiro Filipe Canabarro Teixeira, “Os Deveres de Informação dos Intermediários Financeiros em Relação a seus Clientes e sua Responsabilidade Civil”, Caderno de Mercado Mobiliário, nº31, Dez. 2008, p.51. –, salientamos, pelo relevo que apresentam para a situação em apreço:
i) o princípio da proteção dos interesses dos seus clientes,
ii) o princípio de agir de boa-fé;
iii) o princípio de conhecer o cliente.

Como sustenta Margarida Azevedo Almeida A Responsabilidade Civil de Intermediários Financeiros por Informação Deficitária ou Falta de Adequação dos Instrumentos Financeiros”, in “O Novo Direito dos Valores Mobiliários – I Congresso Sobre Valores Mobiliários e Mercados Financeiros”, Coleção Governance Lab, Almedina, pp.411-412., as obrigações de conduta dos intermediários financeiros perante o cliente testemunham a circunstância de a atividade de intermediação financeira ir muito além de um rigoroso cumprimento da vontade cliente, representando verdadeiras obrigações de assistência – basta ter presente, em matéria de conflitos de interesse, o principio da prevalência dos interesses dos investidores sobre os interesses do intermediário financeiro (art. 309º CVM), bem como a amplitude das obrigações de informação (artigo 312º) e a obrigação de adequação do investimento ao perfil do cliente (artigo 314º).

O princípio de que a atividade do intermediário financeiro deve ser pautada pelo sentido de proteger os interesses legítimos dos seus clientes assume uma especial relevância em relação aos clientes não qualificados, face à falta de conhecimento que normalmente os acompanha Filipe Canabarro Teixeira, “Os Deveres de Informação dos Intermediários Financeiros em Relação a seus Clientes e sua Responsabilidade Civil”, Caderno de Mercado Mobiliário, nº31, Dez. 2008, pp.54-55. (o que veio a ser expressamente reconhecido pelo legislador com as previsões específicas dos arts. 322º, 312º-A, 312º-B, 312º-C, 312º-F e 312º-C, aditados ao CVM pelo DL 357-A/2007, de 31.10).

Os deveres genéricos contidos no artigo 304º terão de ser articulados com os deveres específicos de informação previstos no Artigo 312.º do CVM, na redação do DL 486/99, em vigor à data da subscrição do “produto” em causa:

Deveres de informação
1 - O intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efetivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, incluindo nomeadamente as respeitantes a:
a) Riscos especiais envolvidos pelas operações a realizar;
b) Qualquer interesse que o intermediário financeiro ou as pessoas que em nome dele agem tenham no serviço prestado ou a prestar;
c) Existência ou inexistência de qualquer fundo de garantia ou de proteção equivalente que abranja os serviços a prestar;
d) Custo do serviço a prestar.
2 - A extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente.
3 - A circunstância de os elementos informativos serem inseridos na prestação de conselho, dado a qualquer título, ou em mensagem promocional ou publicitária não exime o intermediário financeiro da observância dos requisitos e do regime aplicáveis à informação em geral.”

E, dispunha ainda o Artigo 7.º do CVM, quanto à “Qualidade da informação
1 - Deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita a informação respeitante a valores mobiliários, a ofertas públicas, a mercados de valores mobiliários, a atividades de intermediação e a emitentes que seja suscetível de influenciar as decisões dos investidores ou que seja prestada às entidades de supervisão e às entidades gestoras de mercados, de sistemas de liquidação e de sistemas centralizados de valores mobiliários.
2 - O disposto no número anterior aplica-se seja qual for o meio de divulgação e ainda que a informação seja inserida em conselho, recomendação, mensagem publicitária ou relatório de notação de risco.
3 - O requisito da completude da informação é aferido em função do meio utilizado, podendo, nas mensagens publicitárias, ser substituído por remissão para documento acessível aos destinatários.

Dispõe igualmente a tal respeito o nº1, do artigo 77º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras:
As instituições de crédito devem informar com clareza os clientes sobre a remuneração que oferecem pelos fundos recebidos e os elementos caraterizadores dos produtos oferecidos, bem como sobre o preço dos serviços prestados e outros encargos a suportar pelos clientes”.

Como salienta Gonçalo André Castilho dos Santos “A Responsabilidade Civil do Intermediário Financeiro Perante o Cliente”, CMVM, Almedina, pp. 82-83., o volume crescente do investimento em valores mobiliários, tendo por base mandados genéricos de gestão de carteiras, aliado à complexidade dos mercados de valores – especialização do investimento imobiliário a abertura do mercado ao grande público –, tem levado, em nome da primazia do interesse do cliente, a que se tenha transitado de um principio de neutralidade do intermediário financeiro para uma obrigação de colaboração com o seu cliente, designadamente alertando-o para os riscos inerentes à operação em causa, bem como recomendando-lhe determinadas estratégias de investimento.

O dever de informação que impende sobre o intermediário financeiro há de ser adequado ao nível de conhecimentos de cada cliente – “Na medida do que for necessário para o cumprimento dos seus deveres, o intermediário financeiro deve informar-se sobre a situação financeira dos clientes, a sua experiência em matéria de investimentos e os objetivos que prosseguem através dos serviços a prestar.” (nº3, art. 304º) – a fim de facultar a este uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada (nº1 do art. 312º).

É dever do intermediário financeiro buscar informações acerca do cliente, com o objetivo de possibilitar efetivamente a avaliação de que o cliente compreende os riscos envolvidos, para então formar o seu juízo acerca da adequação do investimento, ou não, e o informar. Filipe Carrabarro Teixeira “Os Deveres de Informação (…), p. 61. considera haver aqui “uma obrigação de resultado, onde tem de ser alcançado um objetivo específico, não bastando o seu mero cumprimento.

Este dever de conhecimento do cliente encontra-se relacionado com o denominado princípio da proporcionalidade inversa consagrado no nº2 do artigo 312º CMV relativamente aos deveres de informação, segundo o qual a extensão e a profundidade da informação a prestar pelo intermediário ao cliente devem ser tanto maiores quanto menor for o seu grau de conhecimento e experiência Sofia Nascimento Rodrigues faz radicar tal princípio na necessidade de tratamento diferenciado entre investidores com vista à superação de inevitáveis desigualdades informativas e à possível reposição de uma tendencial igualdade – obra citada, p.46. Em igual sentido, Margarida Azevedo Almeida, “A Responsabilidade Civil de Intermediários Financeiros por Informação Deficitária ou Falta de Adequação dos Instrumentos Financeiros”, citado, pp.412-413..

No caso em apreço, o subscritor do produto “SLN 2006” era uma mulher, doméstica, possuindo, pelo menos 100.000,00 €, aplicados num depósito a prazo. Trata-se de um cliente conservador não disposto a apostar em produtos de risco.

É certo que, ao contrário do alegado pelos autores na P.I., a autora terá aposto a sua assinatura num “Boletim de Subscrição” que lhe terá sido disponibilizado para o efeito, com o título “Emissão de Obrigações Subordinadas”.
De qualquer modo, a única informação contida em tal Boletim relativamente às caraterísticas do produto (para quem saiba lê-las), encontra-se no canto superior direito doBoletim de Subscrição SLN 2006” Cuja cópia foi junta aos autos pela Ré com a sua contestação e que pode ser consultada a fls. 20 do processo físico.:
Prazo e reembolso
O prazo de emissão é de 10 anos sendo o reembolso do capital sido efetuado em 9 de Maio de 2016. O reembolso antecipado da emissão só é possível por iniciativa da S (…), S.A., a partir do 5º ano e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal.
REMUNERAÇÃO
Juros pagos semestralmente e postecipadamente, às seguintes taxas: (…)”

Os autores não sabiam, nem sabem o que são obrigações, nem tal lhe foi explicado pelos funcionários da Ré.
Relativamente aos conhecimentos que os autores possuíam sobre produtos financeiros O capital investido proveio de uma conta titulada por ambos, como se extrai do extrato junto aos autos pela Ré com a sua contestação como doc. 3., as informações prestadas à autora mulher relativamente às “Obrigações Subordinadas SLN 2006”, e objetivos visados pelos autores, encontram-se, ainda, provados os seguintes factos:
9. Foi transmitido à autora, por funcionário da ré que lhes sugeriu esse produto, a informação de que o reembolso do capital aplicado era garantido (porquanto não era produto de risco), que tinha uma rentabilidade assegurada, com juros semestrais e que poderia dispor do capital investido quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de alguns dias.

11. A autora subscreveu as mencionadas obrigações no convencimento de que o dinheiro tinha sido investido numa aplicação segura (no sentido de ser de baixo risco), cujo reembolso do capital era garantido e que lhe seriam pagos os juros.

12. A autora não pretendia aplicar o seu dinheiro em produtos de risco, como era do conhecimento dos funcionários da ré que com ela contactavam, sendo por eles percetível que não possuía qualificação específica ou formação técnica que lhe permitisse, à data, conhecer cabalmente os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente e que, por isso, tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro.

17. Os autores não possuíam conhecimentos e nem experiência suficientes para compreenderem o tipo de investimento que fizeram e ninguém lho explicou corretamente.

Resumindo, temos assim o seguinte circunstancialismo de facto:
- os autores não possuíam conhecimentos e nem experiência suficientes para compreenderem o tipo de investimento que fizeram;
- foi-lhes transmitido que o reembolso do capital aplicado era “garantido” (porquanto não era produto de risco), que tinha uma rentabilidade assegurada, com juros semestrais e que poderia dispor do capital investido quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de alguns dias e que seria possível obter, a qualquer momento, num prazo de alguns dias, por via de endosso.
Tais informações – que a Ré insiste em dar como boas, inclusivamente nos articulados e alegações da presente ação, são, contudo, falsas ou, pelo menos, enganosas.

Vejamos, assim e antes de mais, de que tipo de “produto” ou “aplicação financeira” estamos a falar.

No canto superior direito do “Boletim de Subscrição SLN 2006”, consta como título “Emissão de Obrigações Subordinadas”, sem que em tal documento conste a referência ao regime a que se acham submetidas as “obrigações”, enquanto bens mobiliários e, muito menos, o facto de serem consideradas “subordinadas”.

As “obrigações”, constituindo um dos valores mobiliários previstos no artigo 1º do CVM, constituem um modo de financiamento facultado a determinadas entidades com recurso a capitais alheios, representando um direito de crédito sobre a entidade emitente (artigo 348º do Código das Sociedades Comerciais).

O credor obrigacionista, após subscrição do instrumento financeiro, tem o dever de entregar fundos à entidade emitente e esta fica vinculada à obrigação sinalagmática de restituir o montante mutuado e, sendo convencionado, os respetivos juros.

Segundo Paulo Câmara “Manual de Direito dos Valores Mobiliários”, Almedina 2009, p.141. , o titular da obrigação é fundamentalmente um credor perante a entidade emitente e com relação jurídica subjacente na base deste valor mobiliário existe tipicamente um contrato de mútuo Constituindo a emissão de obrigações um dos modos de financiamento de pessoas coletivas, a par de outros como as ações, distinguem-se destas porque, o obrigacionista é, desde logo, um credor da sociedade, ao passo que o acionista é sócio da mesma – Carlos Osório de Castro, “Valores Mobiliários, Conceito e Espécies”, Porto 1998, p.139-146..

A emissão de obrigações, ao significar o recurso a capitais alheios, implica um endividamento da entidade emitente Paulo Câmara, Manual (…), p. 145..

Dentro do conceito de obrigações supra referido, podem-se distinguir diversas modalidades de obrigações (artigo 360º do CSC), sendo que, em função do tipo de crédito contrapõem-se as obrigações que titulam créditos privilegiados e as obrigações representativas de dívida subordinada.

As obrigações que titulam créditos privilegiados asseguram uma posição preferencial na graduação de créditos em caso de liquidação da sociedade emitente,

As obrigações representativas de dívida subordinada são aquelas em que o titular da obrigação, havendo insolvência do emitente, apenas se pode pagar sobre o património depois de satisfeitos todos os credores comuns.

Ora, aqui chegados, desde logo, nos deparamos com a primeira diferença substancial entre o regime das obrigações subscritas pelos autores e um vulgar depósito a prazo: as obrigações em questão, por se tratar de obrigações “subordinadas”, em caso de insolvência do emitente, para além de não beneficiarem do Fundo de Garantia de Depósitos (ao contrário dos depósitos Como é salientado na sentença recorrida, o Fundo de Garantia de Depósitos foi criado pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo DL nº298/92, de 31 de Dezembro, tendo por principal missão garantir o reembolso de depósitos constituídos junto das instituições de crédito nele participantes, na eventualidade de estes se tornarem indisponíveis (artigo 155º). O Fundo garante o reembolso global do saldo em dinheiro de cada depositante, em determinadas condições, cujo limite, em 2006 se situava em 25.000,00 € (nº1 do art. 166º do RGICSF e da Portaria 1340/98, de 12.12) e atualmente se cifra em 100.000,00 € por depositante e por instituição.), representam para os seus titulares meros créditos subordinados, a serem pagos sobre o património do comitente unicamente depois dos credores comuns.

Quanto à segunda diferença, também esta de relevo, relaciona-se com a sua falta de liquidez – tratando-se de obrigações a 10 anos, o reembolso do capital só seria possível ao fim de 10 anos, a efetuar em maio de 2016 – o reembolso antecipado só seria possível a partir do 5º ano, e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal.

No caso em apreço, a Ré desvalorizou por completo tal informação, ao afirmar-lhe que “poderia dispor do capital investido quando assim o entendesse”, o que não é, de todo, verdade.
Enquanto nos depósitos a prazo, o dinheiro poderia ser resgatado, em qualquer altura, por mera manifestação de vontade perante o banco. Com efeito, ainda que não totalmente disponíveis, qualquer banco admite a sua mobilização antecipada ou resgate sendo a contrapartida da perda de juros Vasco da Gama Lobo Xavier e Maria Ângela Coelho, “Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de março de 1987 – Depósito Bancário a prazo, levantamento antecipado – Anotação, RDE nº14, 1988, pp.281-315.. Nestas “Obrigações SLN 2016”, a disponibilização do capital estaria sempre dependente do seu “endosso” a terceiros o que pressupunha a existência de interessados na respetiva aquisição, endosso este que poderá até ter ocorrido com alguma facilidade durante algum tempo, até a situação financeira da emitente ser tornada pública.

De qualquer modo, o potencial investidor teria sempre o direito a conhecer todos os dados da questão para que pudesse ele próprio “avaliar” o risco envolvido na operação e decidir se estava, de facto, por mínimo que fosse (e não era), disposto a corrê-lo.

Como salienta Sofia Nascimento Rodrigues, o risco existirá sempre. “A proteção a conferir aos investidores não pode, naturalmente eliminar os riscos próprios de cada mercado nem garantir o resultado económico do investimento. Mas pode e deve permitir aos investidores identificarem esses riscos e valoriza-los na sua concreta configuração “A Protecção dos Investidores em Valores Mobiliários”, CMVM, Almedina, p. 34.”. Desde que o investidor esteja defendido contra vícios de informação posta ao seu dispor, é sobre ele que recai o ónus da decisão.

A decisão do investidor pode ser errada, mas tem de ser uma decisão esclarecida. A lei e o mercado devem assegurar ao investidor a informação necessária para o habilitar dos conhecimentos necessários que lhe permitam tomar, por si próprio, uma decisão de investimento esclarecida Sofia Nascimento Sofia Nascimento Rodrigues, obra citada, pp. 33-34. .

E quanto maior for a complexidade do negócio, mais completa deve ser a informação a disponibilizar ao investidor. De igual modo, quanto maior for o risco envolvido no negócio em causa, maior deve ser o rol de elementos informativos a disponibilizar ao investidor. Gonçalo André Castilho dos Santos apela à distinção entre os riscos especiais e os riscos gerais, sendo que, no primeiro grupo poderão estar em causa caraterísticas específicas ligadas à utilização de determinante indexante compósito ou à própria estrutura do instrumento financeiro; e, para o segundo grupo, riscos de variação natural dos mercados de valores mobiliários, risco de insolvência ou impacto da gestão empresarial sobre cotação de ações de determinado emitente.

Ora, no caso concreto, ainda que, à data, pudesse não ser previsível que viesse a ocorrer a insolvência da sociedade emitente (risco especial) O que não será líquido, uma vez que, como é expressamente reconhecido no depoimento escrito prestado pela testemunha Jorge António Bessa Pessoa, “esta emissão surge num momento extremamente difícil do Grupo SLN em geral, e do BPN em particular, porquanto (…) e a referida emissão de papel comercial (julgo que de 300 milhões de euros) destinar-se-ia no todo ou em parte (era o que constava) a capitalizar o BPN. Não veio a ser suficiente porquanto o Banco acabou por ser nacionalizado nesse mesmo ano”. , a Ré tinha a obrigação de alertar os autores para o risco (geral) da insolvência da emitente, sobretudo face à posição extremamente desfavorável atribuída aos credores obrigacionistas em tal situação. E até lhe podia transmitir que, face aos dados de que dispunha, e em sua opinião pessoal, se trataria de um investimento seguro. O que não poderia era ter-se limitado a prestar este tipo de informação, meramente conclusiva e inverídica, quando desacompanhada dos restantes elementos caraterizadores do produto em causa (isto para não falar de uma eventual desadequação do produto ao perfil do cliente em causa Como sustenta Manuel A. Carneiro da Frada, a falta de adequação de um certo produto às necessidades de um cliente pode ser interpretada como expressão ou sinal de violação de um dever de informação, a saber, a falta de elucidação sobre a desadequação de certo instrumento financeiro: entendendo-se então tal dever de adequação como dever de índole informativa destinado a proporcionar a aptidão do contrato a celebrar para a satisfação das necessidades do sujeito – A Responsabilidade Civil dos Intermediários Financeiros por Informação Deficitária ou Falta de Adequação dos Instrumentos Financeiros” – “O Novo Direito dos valores Mobiliários – I Congresso Sobre Valores Mobiliários e Mercados Financeiros”, Coleção Governace Lab, Almedina, pp-405.).

Na distinção de que se socorre Agostinho Cardoso Guedes “A responsabilidade do banco por informações à luz do artigo 485º do Código Civil”, in Revista de Direito e Economia, Ano XIV, 1988, p.140. – entre: a) informações puramente descritivas de factos (existência de provisão na conta, historial de pagamentos em falta, etc.); b) informações que contêm um juízo ou valoração (solvabilidade de outrem, grau de confiança para a concessão de crédito); c) recomendações ou conselhos sobre determinada operação negocial (consultoria em relação a decisões de investimento, intermediação em operações sobre valores mobiliários) –, o grau de exatidão exigido em relação às informações será variável, sendo que, relativamente à primeira situação, deveria exigir-se uma exatidão absoluta, uma vez que esta se encontra ao alcance do banco, através de operações internas como a consulta dos seus registos.
Ora, no caso em apreço, a omissão de informação surgiu logo ao nível do primeiro tipo e relativamente a características essenciais da aplicação financeira em causa – liquidez e garantias de solvabilidade – omitindo informações que eram necessariamente do seu conhecimento por constarem do prospeto do produto.

Temos, assim, que a Ré, na qualidade de intermediária financeira incumpriu os deveres de informação que lhe são impostos pelo artigo 312º do CVM, nomeadamente os previstos nas alíneas a) e c) do seu nº1:
- quanto aos riscos especiais envolvidos na operação a realizar;
- quanto à existência ou inexistência de qualquer fundo de garantia ou de proteção ou equivalente que abranja os serviços a prestar.

Dando por assente que o BPN incumpriu os deveres de informação que sobre ele recaíam enquanto intermediário financeiro no negócio de subscrição das obrigações “SLN 2016”, vejamos de modo pode a Ré ser responsabilizada pelos danos sofridos pelos autores.

O regime da responsabilidade civil do intermediário financeiro, encontra-se, então, prevista no artigo 314º do CVM, sob a epígrafe:

“Responsabilidade civil
1 - Os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação de deveres respeitantes ao exercício da sua atividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública.
2 - A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação.

O nº1 do artigo 314º prevê uma cláusula geral de responsabilidade civil a cargo do intermediário financeiro pela violação dos deveres que sobre ele impendem no exercício da sua atividade – ou princípio geral de ressarcibilidade dos danos –, abarcando quer a responsabilidade delitual quer a responsabilidade contratual.

A relação do intermediário financeiro com o cliente terá natureza obrigacional, sendo o facto indutor da responsabilidade o incumprimento do direito de crédito correlativo à relação pré-existente entre ambos.

A responsabilidade civil do intermediário financeiro perante o cliente funda-se na não realização da prestação a que estava obrigado perante o cliente, resultando a ilicitude da desconformidade entre a conduta devida e o comportamento observado pelo intermediário financeiro: a conduta do intermediário financeiro negligentemente inadimplente revestirá, necessariamente, a violação de um dever específico de conduta profissional devida Gonçalo André Castilho dos Santos, “A Responsabilidade Civil (…)”, pp.200-202..

Quanto à culpa do intermediário financeiro, que se poderá materializar no dolo ou na negligência (o que relevará, nomeadamente, para efeitos do prazo de prescrição – art. 324º, nº2), o nº2 do art. 304º introduziu um novo padrão de aferição da culpa que transcende, na sua exigência, o do bom pai de família constante do artigo 487º, nº2 do Código Civil, consagrando um padrão de conduta profissional diligentíssima Gonçalo André Castilho dos Santos, obra citada, pp.209-212.: “Nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência”.

Por outro lado, o nº2 do artigo 314º presume a culpa do intermediário financeiro quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, “em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação”.

“Relativamente à culpa, a presunção compreende-se bem. Na verdade, o facto de o intermediário financeiro ter violado uma disposição legal ou regulamentar justifica logo a admissibilidade de uma presunção de que não colocou na sua conduta profissional a diligência adequada Gonçalo André Castilho dos Santos, obra citada, p.213.”.

E no caso em apreço, o Banco Réu não logrou afastar a presunção de culpa que sobre ele impendia.
Antes pelo contrário. Os factos dados dados como provados apontam para a ocorrência de culpa grave da sua parte nas informações que prestou à autora mulher. Com efeito, desde logo se constata que, tratando-se de promover a subscrição de um produto emitido pela sociedade detentora da totalidade do capital do BPN – agindo num quadro de conflito de interesses Como se afirma no acórdão do TRE de 11-01-2018, ao contrário do que propugna a sociedade Ré, “i) não ocorreu uma situação de protecção dos legítimos interesses dos clientes; ii) verifica-se um quadro de conflito de interesses – a relação de domínio da SLN relativamente ao intermediário financeiro motivou que os interesses económicos do investidor não fossem valorizados, como se compreende através da leitura do email (…) e da posição assumida por diversos funcionários do BPN quanto à questão da emissão das obrigações (…); iii) os deveres de informação e publicidade foram instrumentalizados face à necessidade de aumentar o capital social da SLN e de assim salvar o grupo económico em causa que já se encontrava em crise e isso explica que a real dimensão da operação fosse camuflada e que o anuncio do lançamento da operação e os dados informativos do prospeto fossem secundarizados em nome desse interesse societário comum” – Acórdão relatado por Tomé de Carvalho, disponível in www.dgsi.pt. Chama-se aqui a atenção de que nos presentes autos não foi junta a “Nota Informativa” emitida pela entidade emitente (SLN) respeitante às “Obrigações 2006” (nota essa, apresentada em vários outros processos, nomeadamente no proc. 4042/16.6T8LSB, no qual foi proferido Acórdão do TRL de 10-10-2017, relatado por Carlos Oliveira, disponível in www.dgsi.pp.), da qual, aí sim, constavam as advertências que, no caso em apreço, foram deliberadamente omitidas aos autores: a) que, em caso de falência ou liquidação da emitente, o reembolso das obrigações ficava subordinado de todos os demais credores não subordinados da emitente; b) não era permitido o reembolso antecipado de emissão por iniciativa dos obrigacionistas. –, este terá montando uma campanha agressiva de promoção de tais obrigações “SLN 2016” junto dos seus clientes.

Não foram os autores que, pretendendo dar uma diferente utilização ao seu aforro, contactaram o Banco Réu, de quem eram clientes, pedindo-lhes sugestões ou conselhos relativamente ao modo de rentabilizem tal aforro.

Terá sido o Banco réu que, através dos seus funcionários, promoveu uma campanha agressiva de “angariação” de investidores, no âmbito da qual os funcionários do banco tinham instruções precisas para contactar com os clientes e quanto ao modo de apresentação do produto, propondo-lhes a respetiva subscrição Como é salientado no Acórdão do STJ de 17-03-2016, também respeitante à subscrição de Obrigações SLN 2006, “encontramo-nos perante o recurso a técnicas de venda agressivas, mediante a utilização de informação enganosa ou ocultando informação, com o intuito de obter a anuência do cliente a determinados produtos de risco que nunca subscreveria se tivesse conhecimento de todas as caraterísticas do produto, nomeadamente se soubesse que nem sequer o capital investido era garantido” – Acórdão relatado por Clara Sottomayor, disponível in www.dgsi.pt. , como ressalta dos seguintes factos dados como provados na sentença recorrida Assim como é notória a existência de tal campanha, do email cuja cópia se encontra junta fls. 7, enviado às direções da Zona Centro e confirmado pelo seu autor, a testemunha Jorge António Bessa Pessoa. :

“7. As orientações e comunicações internas existentes no BPN e que este transmitia aos seus comerciais nos respetivos balcões consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade e assegurar que tinha um risco semelhante ao de um depósito a prazo junto do próprio Banco. Para tanto, era argumentado que a SLN Valor era a maior acionista da SLN SGPS, sendo que esta detinha 100% do BPN, pelo que não era vista qualquer diferença entre o risco BPN e o risco daquelas aplicações SLN.

8. A ré pretendia, à data, que os seus funcionários tivessem especial empenho na colocação destes produtos e passassem a ideia de que aos mesmos não estavam associados quaisquer riscos quanto ao reembolso do capital e juros.

9. Foi transmitido à autora, por funcionário da ré que lhes sugeriu esse produto, a informação de que o reembolso do capital aplicado era garantido (porquanto não era produto de risco), que tinha uma rentabilidade assegurada, com juros semestrais e que poderia dispor do capital investido quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de alguns dias e foram-lhe apresentadas as condições do produto, concretamente, a sua remuneração, vantajosa relativamente aos depósitos a prazo, o seu prazo, de 10 anos, as condições de reembolso e de obtenção de liquidez ao longo do prazo de 10 anos, que seria possível obter, a qualquer momento, num prazo de alguns dias, por via de endosso.

E, como já referimos, estas informações, não só, são insuficientes omitindo informação relevantíssima quanto às caraterísticas do “produto financeiro” onde iam ser investidas as suas poupanças – quer do que são obrigações enquanto valores mobiliários, quer das implicações de se tratar de obrigações subordinadas –, nomeadamente tendo em consideração o tipo de investidores em causa (notoriamente não qualificados), como são dadas de modo a induzir em erro os potenciais investidores, ao insistirem na equiparação das “SLN 2006” a simples depósitos a prazo, sem os alertarem para as respetivas diferenças.

As implicações de tais diferenças estão à vista de todos. Que se saiba, os depósitos a prazo efetuados no BPN não foram minimamente afetados, quando foi negado o reembolso aos titulares das Obrigações SLN 2006, e vindo a ser declarada a insolvência da SLN.

Mais uma vez, sublinhamos que a censura sobre o comportamento do Banco Réu não recai sobre o facto de aquele não ter sabido prever a ocorrência da insolvência da SLN. O que é censurável foi a omissão perante os investidores dos aspetos desvantajosos destes valores mobiliários – quer ao nível da liquidez quer dos riscos relativos seu reembolso – e a ligeireza com que comunicavam aos potenciais investidores que se tratava de um produto “equivalente a um depósito a prazo”, “Não vejo as diferenças.

E não era exigível aos autores que, por sua própria iniciativa, tratassem de procurar por outra via informações que pudessem confirmar as caraterísticas que lhe estavam a ser apontadas ao produto pela ré.
“No domínio do direito bancário, a relação entre o Banco e o cliente é uma relação particular, em que as partes são levadas a confiar uma na outra. Sobretudo, o sujeito que se encontra na posição de cliente não profissional, e que não tem formação nem experiência na área financeira, baixa as suas defesas naturais por conferir à instituição bancária uma total competência para cuidar dos seus investimentos, depositando nela uma especial confiança, tornando-se, por isso, mais vulnerável, sobretudo, se as primeiras aplicações produziram rendimentos e ele é assim induzido a confiar ainda mais no produto. Gera-se assim uma situação em que os envolvidos descuram a preocupação de obter informações pelos seus próprios meios. Esta realidade humana deve ser tutelada pelo Direito e, por isso, se cria uma situação que dá azo a obrigações específicas de informar a cargo do Banco, fruto de responsabilidade obrigacional, no caso de inobservância. António de Menezes Cordeiro, Direito Bancário, 5ª ed., Almedina, p. 433.

Quanto ao dano indemnizável na responsabilidade bancária por informações, não haverá dúvidas de que abrangerá sempre o interesse contratual negativo, ou seja, aos danos que o lesado não teria sofrido se não lhe fosse prestada a informação deficiente.

Quanto ao nexo de causalidade para efeito de imputação dos danos, a doutrina vem entendendo que o nº2 do artigo 304º contém igualmente uma presunção de causalidade Menezes Cordeiro estende tal presunção não só ao nexo de causalidade mas igualmente à ilicitude –“Manual de Direito Bancário, 3ª ed., Coimbra 2006, pp.395-397. No sentido de confirmar a presunção quanto ao nexo de causalidade se pronunciou igualmente o Acórdão do TRL de 06-12-2017, relatado por Luís Correia de Mendonça, disponível in www.dgsi.pt. com a consequente inversão do ónus da prova.

Quanto ao interesse que subjaz à consagração de tal presunção, afirma tal Margarida Azevedo Almeida:
“O estabelecimento da relação de causalidade supõe a determinação da vontade do investidor pelo comportamento do intermediário financeiro. Por outras palavras, a escolha do investidor poderá ter sido causada pela conduta do intermediário financeiro, de tal modo que, se este houvesse cumprido as suas obrigações informativas, a escolha do investidor teria sido inversa. Com efeito, para que se estabeleça o nexo causal é necessário que, caso tivesse formado a sua vontade de modo esclarecido o investidor ter-se-ia abstido de celebrar qualquer negócio ou teria optado por outro investimento.
Tendo em conta que entre o comportamento do intermediário financeiro e os danos sofridos pelo investidor medeia um facto do seu foro interno, isto é, a sua vontade, facilmente nos apercebemos da especial dificuldade de prova nesta matéria.

A aplicação das regras gerais de ónus da prova em matéria de nexo de causalidade poderia colocar em causa a eficácia da proteção ressarcitória do investidor pela violação das obrigações de informação e de adequação. Ao mesmo tempo, prejudicaria a eficácia preventiva que de alguma forma também está ligada à responsabilidade civil. A Responsabilidade Civil de Intermediários Financeiros por Informação Deficitária ou Falta de Adequação dos Instrumentos Financeiros”, in “O Novo Direito dos Valores Mobiliários – I Congresso Sobre Valores Mobiliários e Mercados Financeiros”, Coleção Governance Lab, Almedina, pp.421-422.

O modelo de lei visa acautelar a posição enfraquecida do cliente na demonstração da “culpa técnica” do intermediário financeiro ou de nexos de causalidade com complexas e sofisticadas rotinas operacionais, como “leis de mercado” habitualmente desconhecidas do leigo, à partida, de um investidor não qualificado, por sinal Gonçalo André Castilho dos Santos, A Responsabilidade Civil (…), pp.215-216..

No caso em apreço, a Ré não logrou ilidir a presunção de causalidade entre a violação dos deveres de informação e os danos sofridos pelos autores. Antes pelo contrário, os factos dados como provados confirmam que a vontade da autora mulher foi determinada pelas informações enganosas que lhe foram prestadas pela Ré:
11. A autora subscreveu as mencionadas obrigações no convencimento de que o dinheiro tinha sido investido numa aplicação segura (no sentido de ser de baixo risco), cujo reembolso do capital era garantido e que lhe seriam pagos os juros.
12. A autora não pretendia aplicar o seu dinheiro em produtos de risco, como era do conhecimento dos funcionários da ré que com ela contactavam, sendo por eles percetível que não possuía qualificação específica ou formação técnica que lhe permitisse, à data, conhecer cabalmente os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente e que, por isso, tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro.

Os autores foram desapossados da quantia de 100.000,00 € em troca de um produto financeiro que nunca teriam adquirido, não fossem as informações enganosas prestadas pelo Banco Réu, enquanto intermediário financeiro.

Concluímos, assim pela responsabilização da Ré pela violação dos deveres de informação previstos no art. 312º CVM, como aliás tem vindo a ser decidido maioritariamente pelos nossos tribunais No sentido da responsabilização do BPN, enquanto intermediária financeira das “Obrigações SLN 2006”, se pronunciaram o Acórdão do TRC de 12-09-2017, relatado por Luís Cravo, o Acórdão do TRE de 11-01-2018, relatado por Tomé de Carvalho, Acórdão do TRL de 22-02-2018, relatado por António Santos, Acórdão do TRG de 27-04-2017, relatado por Alexandra Rolim Mendes, .

Os autores terão direito a receber o capital investido, bem como os respetivos juros de mora desde a data da citação, como vem sendo entendido na jurisprudência Entre outros, Acórdão do TRG de 27-04-2017, relatado por Alexandra Rolim Mendes, e Acórdão do STJ de 17-03-2016, relatado por Maria Clara Sottomayor, disponíveis in www.dgsi.pt. .

Quantos aos juros remuneratórios acordados, não fez sentido tal pretensão por parte dos autores quando o direito à devolução do capital se fundamenta na circunstância de que não fora a violação do dever de informação não teriam adquirido o produto em causa.

Quanto à indemnização por um eventual dano não patrimonial, os factos dados como não provados não permitem fundamentar tal tipo de indemnização. Com efeito, dos factos por si alegados a tal respeito – artigos 31º a 35º, da p.i., apenas o constante do art. 32º foi dado como provado (os autores têm estado impedidos de usar o seu dinheiro como bem entendessem).

Quanto aos pareceres juntos pela Apelada/Banco BIC, já em sede de recurso, dispensamo-nos de qualquer análise mais aprofundada dos mesmos, porquanto, o primeiro, da autoria de António Pinto Monteiro, chegando a referir “que não há qualquer dever geral por parte do banqueiro de prestar informações”, nega a violação dos deveres de informação por parte do BPN, e o segundo, da autoria António Menezes Cordeiro, nem sequer se reporta à responsabilidade do intermediário financeiro, sendo que, ambos os pareceres são emitidos à margem das especificidades do caso em apreço, tendo sido emitidos para serem juntos a todos os processos respeitantes à responsabilidade do B (…) pelo não reembolso dos credores obrigacionistas SLN 2006.

Por fim, cumpre apreciar a exceção de prescrição invocada pela Ré e cujo conhecimento ficara prejudicado com a improcedência dos pedidos formulados pelos autores.
Encontrando-se em causa uma violação grosseira dos deveres de informação – não somente pela ocultação de informação relevante, mas ainda mediante prestação de informação falsa, como aqui já foi referido –, excluída fica a aplicação do curto prazo de prescrição de dois anos previsto no artigo 324, nº2 do CVM, ficando sujeita ao prazo geral de prescrição de 20 anos nos termos do artigo 309º do CC Neste sentido, entre outros, cfr., Acórdãos do STJ de 17-03-2016, relatado por Clara Sottomayor, do TRG de 24-07-20017, relatado por Alexandra Rolim Mendes, do TRL de 22-02-2018, relatado por António Santos, disponíveis in www.dgsi.pt. .

A apelação é de proceder na sua quase totalidade, sem outras considerações.

IV – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes deste tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida, condenando-se a Ré a pagar aos autores o capital de 100.000,00 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento.

As custas da ação e da apelação serão suportadas por Autores e Ré, na proporção do decaimento.

Coimbra, 15 de maio de 2018