Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
817/11.0T2AVR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARVALHO MARTINS
Descritores: INSOLVÊNCIA
ÓNUS DA ALEGAÇÃO
PEDIDO
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Data do Acordão: 05/15/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: CBV AVEIRO J. COMÉRCIO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS.17, 20, 22, 35 CIRE, 456, 457 CPC
Sumário: 1.- Como o incumprimento de só alguma ou algumas obrigações apenas constitui facto-índice da situação de insolvência, quando, pelas suas circunstâncias, evidencia a impossibilidade de pagar, deve o requerente, juntamente com a alegação de incumprimento, trazer ao processo essas circunstâncias das quais, uma vez demonstradas, é razoável deduzir a penúria generalizada. (art. 20º CIRE).

2.- O reconhecimento de uma litigância de má-fé tem de identificar-se com situações de clamoroso, chocante ou grosseiro uso dos meios processuais, por tal forma que se sinta que com a mesma conduta se ofendeu ou pôs em causa a imagem da justiça. Quando a parte se limita a litigar baseada na incerteza da lei, na dificuldade de apurar os factos e de os interpretar, apresentando tese jurídica que está longe de se poder considerar manifestamente infundada, nada há a censurar ao respectivo comportamento processual.

3. - O art. 22º CIRE (dedução de pedido infundado) nada diz acerca do exercício da responsabilidade adveniente da conduta dolosa do requerente e consequente pedido de reparação dos prejuízos sofridos pelo lesado. Em face desta omissão, justifica-se o recurso ao regime geral da lei processual, tendo, além do mais, presente a estatuição do art.° 17, impondo-se atender ao disposto no art.456 nº1 CPC.

Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I - A Causa:

M. (…), LDA., sediada em Leiria, veio requerer a declaração de insolvência de O (…), LDA., com sede (…), freguesia do Olival, em Vila Nova de Gaia, e com escritórios na Rua (…) Parque Industrial de Estarreja, em Beduído, concelho de Estarreja.

Para tanto e em síntese, alegou:

a) No exercício da sua actividade comercial, forneceu à Requerida, a pedido desta, equipamentos do seu comércio, designadamente, painéis solares e componentes necessários para a respectiva instalação, procedendo, nos termos convencionados com a Requerida, à montagem e instalação dos sistemas solares térmicos em vários obras da requerida;

b) Tais bens e serviços foram titulados por facturas emitidas desde Junho de 2010, até Março de 2011, perfazendo o valor global de € 233.012,30, estando previsto o pagamento na data da emissão;

c) Já contactou com a Requerida por diversas vezes, verbalmente e por escrito, para proceder ao pagamento da quantia em dívida, mas aquela, embora reconhecendo a dívida, até à data nada pagou, protelando sucessivamente o pagamento;

d) A Requerida deve avultadas quantias a fornecedores;

e) É também devedora de elevadas quantias às Finanças e à Segurança Social;

f) É igualmente devedora a instituições bancárias;

g) A Requerida não tem quaisquer bens.

A petição inicial foi julgada conforme aos requisitos legais e, após determinação judicial, devidamente cumprida, acompanhada dos documentos necessários à instrução do pedido, nos termos dos arts. 23.º e 24.º do CIRE.

Citada a requerida, via postal, veio deduzir oposição, na qual, em síntese:

a) Excepcionando incumprimentos vários por parte da Requerente ao que havia sido convencionado entre as partes para o fornecimento dos bens e serviços em causa, bem assim, a entrega de material à consignação à Requerente, afirmou-se credora dela pelo montante de € 12.436,75;

b) Impugnou diversa factualidade alegada na petição inicial;

c) Afirmou a inexistência dos restantes factos em que se fundamentou o pedido de insolvência;

d) Alegou a sua solvência;

e) Pediu a condenação da Requerente como litigante de má fé, em multa e indemnização, esta por montante não inferior a € 100.000,00;

f) Pediu a condenação da Requerente no pagamento da indemnização de € 1.025.000,00 e no que for liquidado em execução de sentença, por responsabilidade civil decorrente da dedução infundada de pedido de insolvência, nos termos do art. 22.º do CIRE.

Atenta a matéria da oposição, contendo matéria de excepção susceptível de justificar decisão de mérito sem necessidade de realização da audiência, foi concedido prazo para a Requerente para se pronunciar.

Em tal resposta, a Requerente, em suma, pronunciou-se sobre a matéria da oposição e dos pedidos nesta formulados nos termos que constam do articulado de fls. 180ss, no qual pediu também a condenação da Requerida como litigante de má fé, em multa e indemnização a relegar para execução de sentença.

Na sequência da posição das partes, foi proferido o despacho de fls. 346, para obtenção de prova documental eventualmente suficiente para a prolação de decisão de mérito sem necessidade de realização da audiência, a qual consta a fls. 358ss.

Considerando-se que os elementos juntos não eram suficientes para aquele efeito, foi designada data para a realização da audiência.

Entretanto, foi junta a prova documental de fls. 475ss, 500ss e, previamente à audiência, de fls. 518ss.

Tentada a conciliação, foi dispensada a realização da audiência de julgamento, por se considerar suficiente a prova documental junta aos autos para proferir decisão de mérito, matérias sobre as quais se concedeu a palavra aos ils. mandatários para se pronunciar, em alegações.

Oportunamente, foi proferida decisão onde se consagrou que:

Pelo exposto, decide-se:

A) Julgar improcedente, indeferindo-o, o pedido de declaração de insolvência.

B) Não tomar conhecimento do pedido de indemnização formulado pela Requerida por dedução infundada de pedido de insolvência nos termos do art. 22.° do CIRE.

C) Condenar a Requerente, como litigante de má fé, na multa de 10 (dez) UC e no pagamento de indemnização à Requerida, a fixar ulteriormente, que compreenda o reembolso das despesas a que a má fé tenha obrigado a parte contrária, incluindo os honorários do mandatário, e na satisfação dos restantes prejuízos sofridos pela Requerida como consequência directa ou indirecta da má fé, nos termos do art. 457.°/1, ai. b), e 2, do CPC.

D) Absolver a Requerida do pedido de condenação como litigante de má fé.

*

Custas da acção pela Requerente, com taxa de justiça reduzida a metade, fixando-se o valor da acção no montante indicado na petição inicial (arts. 15.°, 301.°, 302.°/1, 304.° do CIRE e 315.°/2 do CPC).

Custas dos incidentes de litigância de má fé pela Requerente, fixando-se a taxa de justiça para cada um deles em 2 UCs (art. 7.°/3 do RCP).

Notifique e registe.

Fica ainda a Requerida notificada para se pronunciar e juntar prova documental para os efeitos previstos no art. 457.°/2 do CPC, concedendo-se para o efeito o prazo de sete dias, devendo notificar a parte contrária e sendo idêntico o prazo para que, depois de tal notificação, a Requerente se pronuncie para o mesmo efeito.

M (…) Lda., Requerente nos autos à margem referenciados vem, nos termos do disposto nos artigos 14.º e 45.º, ambos do Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa (doravante CIRE), e dos artigos 678.º e 691.º, ambos do Código de Processo Civil (doravante CPC), interpor Recurso de Apelação da sentença, alegando e concluindo que:

1. O Meritissimo Juiz do Tribunal a quo fez uma interpretação incorrecta das normas do CIRE, do CC, do CPC;

2. Ao não realizar a audiência de discussão e julgamento, o Meritíssimo Juiz do  tribunal a quo violou o disposto nos artigos 20.º e 35.º do CIRE, o princípio do contraditório  plasmado no artigo 3.º do CPC, bem como as regras gerais de produção de prova a que se alude nos artigos 341.º e ss. do Código Civil (doravante CC),impedindo a Apelante de fazer a prova que lhe cabia;

3. A Apelante ficou absolutamente impedida de provar factos-índice, previstos no artigo 20.º, n.º 1, alineas a) e b), do CIRE, que tinha alegado no seu requerimento inicial, os quais, salvo o devido respeito, não se podem considerar como não provados apenas, e só, com base nos documentos juntos aos autos;

4. Tais factos eram susceptíveis de ser provados através de prova testemunhal;

5. A Apelante foi impedida de fazer prova, designadamente testemunhal, sobre os factos supra mencionados;

6. A realização de audiência de discussão e julgamento, com a produção de prova testemunhal, perante a existência de Oposição e a posição assumida pelas partes, constituia obrigatoriedade, nos termos do disposto no artgo 35.º do CIRE.

7. Não está na disponibilidade do tribunal realizar ou não a audiência de discussão e julgamento, com a consequente produção de meios de prova, quando é deduzida Oposição;

8. Tendo a Apelada deduzido Oposição, negando e impugnando quer o crédito que a Apelante alega ter sobre si, quer os demais factos em que esta fundamenta aquele seu pedido de insolvência (negando que se encontre em tal situação), deveriam os autos ter prosseguido os seus posteriores trâmites, em obediência ao disposto no artigo 35.º do CIRE, com a marcação de audiência de discussão e julgamento, a fim de sobre os factos em questão ser produzida a prova arrolada;

9. Perante os documentos juntos aos autos, não podia o Meritissimo Juiz do Tribunal a quo dar como provados os factos 10), 11) e 15), cuja resposta se impugna expressamente;

10. Carece de fundamento a condenação da Apelante como litigante de má fé, por não se verificarem quaisquer factos susceptiveis de determinar tal condenação;

11. No que respeita à litigância de má fé em sede de processo de insolvência, cumpre referir que, quando o pedido é infundado, como é alegado (sem razão, diga-se) pela Apelada, tem apenas, e só, aplicação o regime sancionatório especial previsto no artigo 22.º do CIRE - menos lato, porque abrange só o dolo - e não também o regime sancionatório geral previsto para a litigância de má fé no artigo 456.º do CPC - mais

lato, por abranger tanto o dolo como a negligência grosseira;

12. A Apelante não agiu, nem com negligência, nem com dolo, porquanto actuou de boa fé, convicta de estar a exercer um direito que lhe assiste;

13. Não foi produzida qualquer prova no sentido “pretendido” pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, ou seja, que a Apelante litigou de má fé, pelo contrário.

14. Não se percebe o critério utilizado pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo para determinar a condenação da Apelante como litigante de má fé e o quantum de tal indemnização;

15. Perante os factos provados e face à ausência de prova de quaisquer outros – até porque a Apelante, repita-se, foi IMPEDIDA, de provar os factos que alegou - a decisão do Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo não faz qualquer sentido, sendo mesmo  incoerente e contraditória;

16. De todo o modo, nunca se verificariam os pressuspostos da indemnização por pedido infundado, porquanto tal indemnização é restringida aos casos de dolo. Sendo certo que não pode ser considerada como dolosa a conduta da requerente de insolvência, in casu da Apelante, desde logo porque foi impedida de provar a factualidade por si alegada no requerimento inicial, com vista a demonstrar a existência de um dos factos-índice previstos no art. 20°, n.° 1, do CIRE;

17. Ao decidir nos termos expostos, o Meritissimo Juiz do Tribunal a quo violou ainda o artigo 20.º do CIRE e 456.º do CPC.

Não foram proferidas contra alegações.

II. Os Fundamentos:

Colhidos os Vistos legais, cumpre decidir:

São ocorrências materiais, com interesse para a decisão da causa, as decorrentes da matéria de facto assente na 1ª instância:

1)

A Requerente é uma sociedade comercial que se dedica, entre outras actividades, a instalações eléctricas e de canalização, a instalação e comercialização de produtos destinados a aquecimento central, sistemas térmicos solares e manutenção de edifícios (fls. 16ss).

2)

A Requerida é uma sociedade comercial que se dedica à actividade de fabrico de aparelhos não eléctricos para uso doméstico, indústria de produção de equipamentos para utilização de energias alternativas, painéis solares e componentes, caldeiras de biomassa e acessórios e ainda ao comércio, importação, exportação e representação de materiais inerentes às actividades desenvolvidas (fls. 56ss).

3)

A Requerida, apesar de ter a sua sede social em Vila Nova de Gaia, tem os seus escritórios, onde administra os seus principais interesses, de forma habitual e cognoscível para terceiros, em Beduído, Estarreja (PI/3-4).

4)

No exercício da sua actividade comercial, a Requerente forneceu à Requerida, a pedido desta, equipamentos do seu comércio, designadamente, painéis solares térmicos, bem como todos os componentes necessários à instalação dos mesmos, entre os quais tubagens, rolamentos e forras térmicas, procedendo ainda à montagem e instalação dos sistemas solares térmicos em várias obras da Requerida, a pedido desta (PI/6-7).

5)

Na sequência dessa actividade, elaborou e enviou à Requerida as dezassete facturas com cópias a fls. 22 e segs., com datas de vencimento desde 25/7/2010 a 31/3/2011 (dando-se por reproduzido o restante conteúdo), no valor global de € 233.012,30 (PI/8).

6)

Em tais facturas consta, nas condições de pagamento, pronto pagamento, coincidindo a data de vencimento com a data de emissão (fls. 22ss).

7)

A Requerida entregou à Requerente, à consignação, o material descrito nas guias de transporte de fls. 155ss (cujo teor restante se dá por reproduzido), no valor global não superior a € 18.349,19 (O/68-R/65-6).

8)

A Requerida não tem quaisquer dívidas perante a Fazenda Nacional e a Segurança Social (fls. 165-7, 444, 475ss)

9)

Desde Maio de 2008, a Requerida tem pago integralmente as contribuições devidas à Segurança Social, nos termos da conta corrente junta a fls. 502 e segs. (cujo teor restante se dá por reproduzido).

10)

No final de Abril de 2011, a Requerida detinha no M... a quantia de € 592.013,14, nos termos da conta corrente constante a fls. 169-170 (cujo teor restante se dá por reproduzido).

11)

Segundo comunicação do Banco de Portugal de 30/4/2011, não há informação de incumprimentos da Requerida perante instituições bancárias (fls. 171).

12)

A Requerida pagou à Requerente o valor das facturas que esta emitiu desde Maio de 2009 a Maio de 2010 e cujas cópias constam a fls. 201 e segs., cujo teor restante se dá por reproduzido (R/34).

13)

Em Março de 2011, a Requerente solicitou à Requerida, por duas vezes, o pagamento da quantia global de € 76.135,67, nos termos que constam das cópias juntas a fls. 308 e 309 (cujo teor restante se dá por reproduzido).

14)

As instalações onde labora a Requerida estão inscritas em nome de .G.., SA, cuja administração é exercida pelo sócio gerente da Requerida (fls. 364ss).

15)

Foram facturadas à Requerida as máquinas descritas nos documentos traduzidos a fls. 485ss, no valor global de € 545.000,00 (dando-se por reproduzido o restante de tais documentos).

16)

A Requerida procedeu a pagamentos a fornecedores, em 2010 e Janeiro de 2011,

de valor não inferior a € 500.000,00 (fls. 379ss).

17)

No Relatório e Contas da Requerida referente a 2010 consta, para além do mais, o activo fixo tangível de € 1.573.553,42, depreciações acumuladas de € 427.536,18, e o saldo de actividade de € 979.513,00, nos termos que constam do documento junto a fls. 416ss (cujo teor restante se dá por reproduzido).

18)

A IES da Requerida respeitante a 2010 dá conta, para além do mais, do resultado líquido do período de € 558.757,78, de um activo de € 5.395.490,13 e de um passivo de € 1.397.799,10 (fls. 518ss).

*

Nos termos do art. 684°, n°3, e 690°,n°1, do CPC, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do disposto na última parte do n°2, do art. 660°, do mesmo Código.

Das conclusões, ressaltam a seguintes questões, na sua formulação originária, de parte, a considerar na sua própria matriz:

I.

2. Ao não realizar a audiência de discussão e julgamento, o Meritíssimo Juiz do  tribunal a quo violou o disposto nos artigos 20.º e 35.º do CIRE, o princípio do contraditório  plasmado no artigo 3.º do CPC, bem como as regras gerais de produção de prova a que se alude nos artigos 341.º e ss. do Código Civil (doravante CC),impedindo a Apelante de fazer a prova que lhe cabia;

Apreciando, diga-se que, tendo o credor, requerente da insolvência, alegado factos integradores da impossibilidade de cumprimento pelo devedor das suas obrigações vencidas, sendo este citado, impende sobre ele o ónus de alegar e de provar factos integradores da sua solvência.

Se é certo que a insuficiência patrimonial para solver as suas obrigações pode ser demonstrada através de acções executivas (art. 20º n° 1 e) do CIRE), não é menos verdade que a requerente não invocou esse facto, mas antes, basicamente, a falta de cumprimento de obrigações reveladoras da impossibilidade de satisfação pontual das obrigações (art. 20° n° 1, b) do CIRE).

E a requerida, devedora, chamada a pronunciar-se sobre tal alegação, contraditou, deduzindo oposição com fundamento na inexistência da situação de insolvência, seja pela impugnação dos fundamentos invocados, seja pela excepção de factos - pretendidamente - impeditivos, modificativos ou extintivos dos fundamentos invocados ou da sua eficácia jurídica (art. 30º n° 3); estando, para além disso, onerados com a alegação e prova a sua solvência, como se depreende do n°4 do art. 30° do diploma citado.

De tal postulação decorre não ser o credor que está onerado com a prova da insolvência, facto constitutivo do direito que invoca, como, em tese geral, decorreria do n° 1 do art. 342° do CC. Ao invés, a lei resolveu expressamente a dúvida sobre o tratamento como constitutivos do direito dos factos alegados na petição inicial e sobre a consequente oneração do requerente com a respectiva prova (art. 342° n° 3 CC); assim, em vez de impor ao requerente o ónus da prova da insolvência, carregou sobre os ombros do devedor o ónus da prova da sua solvência, operando, assim, uma verdadeira inversão do ónus de prova (art. 344º nº 1 CC); logo, provando o requerente a sua dívida, passa a competir ao requerido provar a possibilidade de a solver, isto é, cabe ao devedor ilidir a presunção que emana do facto-índice, trazendo ao processo factos e circunstâncias probatórias dos quais se conclua que não está insolvente.

A insuficiência do património penhorável como indício da impotência económica determinativa da insolvência isto é, da situação de impossibilidade de cumprir as obrigações vencidas (art. 3º n° 1 do CIRE), pode ser demonstrada por outros meios que não só através de acções executivas (art. nº 1, e) do CIRE), (Ac. RE de 25 de Outubro de 2007, CJ, Tomo IV/2007, p.261).

Em qualquer caso, como a letra do preceito inequivocamente revela, o devedor pode fazer uso da faculdade conferida no n.° 3 do art.° 3.

Tal qual sucede com o requerente, o devedor oponente deve, com o articulado de oposição, oferecer os meios de prova de que disponha, seja qual for a sua natureza. A falta de cumprimento desta injunção determina a impossibilidade de produção da prova não indicada.

Por razões que, decerto, se prendem com o princípio geral da igualdade das partes, as regras aplicáveis à produção de prova pelo requerente são extensíveis ao devedor. É este o significado abrangente da parte final do n.° 1 do art. 30º CIRE.

Não pode, porém, esquecer-se o regime actualmente fixado no art.° 11.º, que permite ao juiz fundamentar a decisão sobre o pedido de declaração da insolvência, e seja qual for o sentido dela, em factos não alegados pelas partes, n.° 2.

Em todo o caso, o juiz deve verificar se os factos alegados são de molde a consubstanciar alguma das hipóteses configuradas nas alíneas do n.° 1 do art.° 20.° é só nesse caso é que declarará a insolvência. Neste sentido, cfr. acs. da Rel.Lx., de 12/OUT/ 2006, in CJ, 2006, IV, pág. 73, e da Rel. Pto., de 291N0V/ 2006, in CJ, 2006, V, pág. 185.

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Na emergência dos Autos, no referencial dos factos assentes, resulta incontroverso - e sem dependência de qualquer outro tipo de prova a produzir -, como estatuído,  que

“(…) nenhuma circunstância do incumprimento foi alegada ou demonstrada para justificar o enquadramento pretendido pela A..

Para além disso, o montante da dívida é pouco relevante face aos valores que a Requerida movimenta anualmente (factos 16 e seguintes).

Acresce que, como se provou, a Requerida pagou à Requerente o valor das facturas que esta emitiu desde Maio de 2009 a Maio de 2010, sem que nenhuma mudança relativa à actividade da Requerida ou à sua situação financeira seja afirmada desde a referida data.

Assim, se algo releva a falta de pagamento (injustificado ou não) por parte da Requerida, desde Maio de 2010, é o surgimento de um acentuado conflito entre as partes, emergente da relação contratual que mantiveram e por motivos não exactamente apurados.

No entanto, mesmo a considerar que tal dívida, nos termos alegados na petição inicial, integrava a facti species do art. 20.°/1, al. b), do CIRE, a verdade é que o seu efeito é anulado por se entender, face aos documentos juntos, que a Requerida logrou provar a sua solvência.

Seja porque, face ao facto provado em 10, o seu activo (provado) é superior ao passivo (invocado), nos termos do art. 3.°/3 do CIRE. Seja porque, nos termos do art. 30.°/4 do CIRE, a escrituração da Requerida demonstra igualmente a superioridade (manifesta) do activo sobre o passivo”.

E sem que daí derive violação do art. 35º CIRE (audiência de discussão e julgamento) uma vez que todo o processamento que se consagra neste artigo é inspirado pela preocupação de celeridade que atravessa, de modo coerente, o instituto da insolvência.

Como sucede, porém, com relação a outras injunções deste tipo, estamos em presença de normas cujo eventual incumprimento não comporta qualquer sequela no que respeita ao devir processual, conquanto possa constituir os infractores em responsabilidade disciplinar (LUÍS A. CARVALHO FERNANDES, JOÃO LABAREDA, CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS ANOTADO - REIMPRESSÃO, 2009, p. 187).

-

Daí que, como deve, o juiz haja conhecido de qualquer questão - como as suscitadas - que envolva o afastamento de uma ou mais causas de pedir na acção, de modo a evitar ter de especificar ou quesitar factos que de antemão se revelaram indiferentes à solução jurídica do pleito. Só quando em determinado caso o juiz tiver dúvidas sobre se certo facto interessa ou não à solução do pleito, se impõe que quesite esse facto (Cf. Ac. RL, de 12.1.1973: BMJ, 223.°-273).

Naturalmente que o conhecimento do pedido, nestas circunstâncias, pressupõe um estudo profundo do processo por forma a conhecer-se que é esse o único caminho a seguir (Ac. RC, de 25.10.1983: Col. Jur., 1983, 4.°-64). E isso aconteceu, como indicado, com adequação. Já que, para conhecer, assim, do mérito da causa, é necessário que os autos contenham já todos os elementos suficientes para uma decisão segura (Ac. RE, de 3.11.1988: BMJ, 381.°-771). Como circunstancialmente acontece. Uma vez que, em função da única prova relevante produzida (documental), não sobreleva qualquer necessidade de averiguar - ainda - outros factos, dispensando, por irrelevante, essa pleonástica indagação, a pretexto de os Autos já disporem da suficiente matéria de facto apurada (Cf. Ac. RC, de 19.4.1989: BMJ, 386.°-519).

Tanto mais que a questão de saber se o processo continha ou não os elementos suficientes para a decisão da causa no despacho saneador, nos termos consentidos pelo art.° 35º CIRE é, também, matéria de facto da exclusiva competência das instâncias, como tal, até, de todo estranha ao Supremo Tribunal de Justiça (Ac. STJ, de 15.6.89, Rec. n.° 2170: AJ, 1 .°/0-18).

Quer isto dizer que podia conhecer-se do pedido, nestas circunstância, por o processo já proporcionar, com segurança, e em termos objectivos, todos os elementos que possibilitam a decisão segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito (que não apenas segundo a solução a que adere o juiz do processo) (Ac. RC, de 20.6.1989: BMJ, 388.°-610).

Para o efeito, pois, o julgamento, com produção de prova suficiente, consumou-se com adequação processual, sem necessidade de qualquer outra sem virtualidade diferenciada.

O que responde negativamente à questão em I.

II.

3. A Apelante ficou absolutamente impedida de provar factos-índice, previstos no artigo 20.º, n.º 1, alineas a) e b), do CIRE, que tinha alegado no seu requerimento inicial, os quais, salvo o devido respeito, não se podem considerar como não provados apenas, e só, com base nos documentos juntos aos autos;

4. Tais factos eram susceptíveis de ser provados através de prova testemunhal;

5. A Apelante foi impedida de fazer prova, designadamente testemunhal, sobre os factos supra mencionados;

6. A realização de audiência de discussão e julgamento, com a produção de prova testemunhal, perante a existência de Oposição e a posição assumida pelas partes, constituía obrigatoriedade, nos termos do disposto no artigo 35.º do CIRE.

7. Não está na disponibilidade do tribunal realizar ou não a audiência de discussão e julgamento, com a consequente produção de meios de prova, quando é deduzida Oposição;

Declaradamente, não! Diga-se, por acrescento, a tal respeito, e na sequência do que se deixou expresso, que, mesmo para fundamentar o pedido de insolvência baseado na insuficiência do activo do devedor em relação ao seu passivo, bastará ao requerente evidenciá-lo por recurso aos elementos da escrituração do devedor. A este cabe, todavia, a possibilidade de demonstrar a superioridade do activo resultante da sua revalorização. Estamos, igualmente, em crer que esta conclusão está hoje devidamente suportada pelo próprio texto legal. Desde logo, no proémio do n.° 3, na assunção da ideia de que o recurso ao critério alternativo de avaliação reveste natureza de excepção, o que se traduz na utilização do verbo cessar; e, além disso, no art.° 20.°, n.° 1, al. h), ao acolher como fundamento do requerimento de insolvência a «manifesta superioridade do passivo sobre o activo segundo o último balanço aprovado». Mas também à vista do que dispõe o n.° 4 do art.° 30º.

Sempre na abrangência de que o estabelecimento de factos presuntivos da insolvência tem por principal objectivo permitir aos legitimados o desencadeamento do processo, fundados na ocorrência de alguns deles, sem haver necessidade, a partir daí, de fazer a demonstração efectiva da situação de penúria traduzida na insusceptibilidade de cumprimento das obrigações vencidas, nos termos em que ela é assumida como característica nuclear da situação de insolvência (vd. art.° 3º, n.° 1). Caberá então ao devedor, se nisso estiver interessado e, naturalmente, o puder fazer, trazer ao processo factos e circunstâncias probatórias de que não está insolvente, pese embora a ocorrência do facto que corporiza a causa de pedir. Por outras palavras, cabe-lhe ilidir a presunção emergente do facto-índice (cfr. Ac. da RE., de 25/OUT/2007, in CJ, 2007, IV, pág. 259). O que foi, plenamente, logrado. Esta solução está, de resto, hoje claramente consagrada no n.° 3 do art.° 30°.

Tanto assim que o incumprimento de só alguma ou algumas obrigações apenas constitui facto-índice quando, pelas suas circunstâncias, evidencia a impossibilidade de pagar, o requerente deve então, juntamente com a alegação de incumprimento, trazer ao processo essas circunstâncias das quais, uma vez demonstradas, é razoável deduzir a penúria generalizada (LUÍS A. CARVALHO FERNANDES, JOÃO LABAREDA, CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS ANOTADO - REIMPRESSÃO, 2009, p. 135). O que, por sua vez, não foi logrado, através de produção de prova adrede (documental) adequada e suficiente, como condição da sua própria (in)sustentabilidade.

O que responde negativamente às questões em II.

III.

8. Tendo a Apelada deduzido Oposição, negando e impugnando quer o crédito que a Apelante alega ter sobre si, quer os demais factos em que esta fundamenta aquele seu pedido de insolvência (negando que se encontre em tal situação), deveriam os autos ter prosseguido os seus posteriores trâmites, em obediência ao disposto no artigo 35.º do CIRE, com a marcação de audiência de discussão e julgamento, a fim de sobre os factos em questão ser produzida a prova arrolada;

A tal propósito, diga-se - no renovo do anteriormente expresso - ser no decurso da própria audiência que, devendo proceder-se ao julgamento, por não haver confissão nem desistência, o juiz procede ao saneamento do processo, separando a factualidade que considere já assente, mesmo antes da produção de outra prova, e aquela que, sendo controvertida, constitui a base instrutória, objecto fundamental da prova a produzir.

Esta actividade do tribunal obedece aos cânones comuns vigentes em processo civil, devendo o juiz ter em conta, designadamente, os factos que hajam de se considerar assentes em razão do ónus da impugnação especificada (cfr. art.° 490.° do C.P.Civ.). De resto, são aqui subsidiariamente aplicáveis as disposições dos art.ºs 508.°-A, n.° 1, al. e), e 511.° do C.P.Civ.  (LUÍS A. CARVALHO FERNANDES, JOÃO LABAREDA, CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS ANOTADO - REIMPRESSÃO, 2009, p. 187).

Mas tal com a prova documental - única com virtualidade circunstancial para, sobre o ponto, influenciar decisão - a revelar-se suficiente (na expressão inultrapassável dos documentos de fls.475 ss. e 500 ss., entretanto juntos).

Daí a resposta ser também negativa para a questão em III.

IV.

9. Perante os documentos juntos aos autos, não podia o Meritissimo Juiz do Tribunal a quo dar como provados os factos 10), 11) e 15), cuja resposta se impugna expressamente;

No cotejo de tal enunciado -

10)

No final de Abril de 2011, a Requerida detinha no M... a quantia de € 592.013,14, nos termos da conta corrente constante a fls. 169-170 (cujo teor restante se dá por reproduzido).

11)

Segundo comunicação do Banco de Portugal de 30/4/2011, não há informação de incumprimentos da Requerida perante instituições bancárias (fls. 171).

15)

Foram facturadas à Requerida as máquinas descritas nos documentos traduzidos a fls. 485ss, no valor global de € 545.000,00 (dando-se por reproduzido o restante de tais documentos)

-, perante tal esquisso responsório, a Relação apenas pode manter a resposta dada pela 1ª instância a determinado quesito, ou em específica afirmação contextualizada, por assente, quando puder entender que a mesma resultou da convicção do julgador, formada exclusivamente com base em documentos de sustentação, em termos revelados insusceptíveis de alteração conceitual ou interpretativa abrangente, não obstante impugnação pelo recorrente. Por isso com relevo de força probatória de circunstância, insusceptível de alteração pela contribuição, v.g., de eventuais declarações de representantes das partes e/ou do depoimento de testemunhas, eventual e pretendidamente a produzir (Cf. Ac. STJ. 4-12-1986: BMJ, 362-501).

O que, no presente contexto, perfila como negativa a resposta para a questão em IV.

V.

10. Carece de fundamento a condenação da Apelante como litigante de má fé, por não se verificarem quaisquer factos susceptíveis de determinar tal condenação;

11. No que respeita à litigância de má fé em sede de processo de insolvência, cumpre referir que, quando o pedido é infundado, como é alegado (sem razão, diga-se) pela Apelada, tem apenas, e só, aplicação o regime sancionatório especial previsto no artigo 22.º do CIRE - menos lato, porque abrange só o dolo - e não também o regime sancionatório geral previsto para a litigância de má fé no artigo 456.º do CPC - mais lato, por abranger tanto o dolo como a negligência grosseira;

12. A Apelante não agiu, nem com negligência, nem com dolo, porquanto actuou de boa fé, convicta de estar a exercer um direito que lhe assiste;

13. Não foi produzida qualquer prova no sentido “pretendido” pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, ou seja, que a Apelante litigou de má fé, pelo contrário.

14. Não se percebe o critério utilizado pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo para determinar a condenação da Apelante como litigante de má fé e o quantum de tal indemnização;

16. De todo o modo, nunca se verificariam os pressuspostos da indemnização por pedido infundado, porquanto tal indemnização é restringida aos casos de dolo. Sendo certo que não pode ser considerada como dolosa a conduta da requerente de insolvência, in casu da Apelante, desde logo porque foi impedida de provar a factualidade por si alegada no requerimento inicial, com vista a demonstrar a existência de um dos factos-índice previstos no art. 20°, n.° 1, do CIRE;

Neste particular, assim é! Para o efeito, aprecie-se, em regime de insistência, que um dos princípios fundamentais do nosso processo civil é o do contraditório, segundo o qual o tribunal não pode decidir, em particular, da questão da litigância de má fé sem ter sido dada à parte em causa a oportunidade de se pronunciar sobre tal questão - cfr. art. 3.°, n.°s 1 e 3, do C.P.Civil e Acórdão do Tribunal Constitucional de 12.5.1998 (Ac. RG, de 19.5.2004: Proc. 856/04-2.dgsi.Net. O que, no esquisso configurado, não obstante, não deixou de acontecer.

Com este alcance, pois, uma das condutas em que se exprime a litigância de má-fé consiste na alegação, voluntária, culposa, e consciente, de factos relevantes para a decisão da causa, sabendo a parte que, ao alegar como alega, desvirtua a realidade por si conhecida, visando um objectivo censurável - alteração da verdade dos factos; tal actuação violando os deveres de probidade e cooperação, traduzindo actuação gravemente negligente, senão dolosa, deve ser sancionada como litigância de má-fé (Ac. RP, de 30.5.2005: JTRP00038125.dgsi.Net). Em todo o caso, o reconhecimento de uma litigância de má-fé tem de identificar-se com situações de clamoroso, chocante ou grosseiro uso dos meios processuais, por tal forma que se sinta que com a mesma conduta se ofendeu ou pôs em causa a imagem da justiça. Quando a parte se limita a litigar baseada na incerteza da lei, na dificuldade de apurar os factos e de os interpretar, apresentando tese jurídica que está longe de se poder considerar manifestamente infundada, nada há a censurar ao respectivo comportamento processual (Ac. RL, de 8.7.2004: Proc. 357 1/2004--4.dgsi.Net). Como nos Autos, não obstante, acontece.

Ou seja, a sanção por litigância de má fé apenas pode e deve ser aplicada aos casos em que se demonstre, pela conduta da parte, que ela quis, conscientemente, litigar de modo desconforme ao respeito devido não só ao tribunal, como também ao seu antagonista no processo. Para tal, exige-se que o julgador seja prudente e cuidadoso, só devendo proferir decisão condenatória por litigância de má-fé apenas no caso de se estar perante uma situação donde não possam surgir dúvidas sobre a actuação dolosa ou gravemente negligente da parte. Na fundamentação da condenação, pode e deve o julgador não só ater-se aos factos alegados e não provados, como também àqueles documentos não impugnados e que denunciam estar-se perante um facto ou uma situação completa e totalmente contrária ao constante do articulado do litigante em causa. Não se pode coarctar o legítimo direito de as partes discutirem e interpretarem livremente os factos e o regime jurídico que os enquadram, por mais minoritárias (em termos) jurisprudenciais ou pouco consistentes que se apresentem as teses defendidas. (Ac. RP, de 6.10.2005: JTRP0003837 1 .dgsi.Net).

Termos que também dirimem, com perfil de impossibilidade decorrente, a questão da indemnização.

Como quer que seja - e em vertente conexa -, o próprio art. 22º CIRE (dedução de pedido infundado) nada diz acerca do exercício da responsabilidade adveniente da conduta dolosa do requerente e consequente pedido de reparação dos prejuízos sofridos pelo lesado. Em face desta omissão, justifica-se o recurso ao regime geral da lei processual, tendo, além do mais, presente a estatuição do art.° 17.°. Importando, então - como feito - atender ao disposto no já mencionado art.° 456.°, n.° 1 CPC.

Segundo o entendimento que também temos por melhor, qualquer credor pode exercer o direito à indemnização por prejuízos sofridos com a dedução infundada do pedido de insolvência, quer nos casos em que há apresentação do devedor, quer ainda naqueles em que a instância é promovida por iniciativa de outro legitimado. Não obstante, para que a responsabilidade possa ser exercida é necessário que concorram os seus pressupostos comuns, com a especialidade que decorre da exigência da actuação dolosa do lesante. Como também acontece em geral, e à falta de qualquer estatuição especial sobre a matéria, o ónus da prova dos factos que consubstanciam os pressupostos da responsabilidade impende sobre o lesado, visto que eles são constitutivos do direito à indemnização (LUÍS A. CARVALHO FERNANDES, JOÃO LABAREDA, CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS ANOTADO - REIMPRESSÃO, 2009, p. 146; vd., igualmente, M. Carneiro da Frada, A Responsabilidade dos Administradores da Insolvência, in ROA, ano 66, II, 2006, págs. 656-668).

Configurando-se, por isso, neste particular, como afirmativa a resposta às questões em V; exclusão feita àquela em

15. -  Perante os factos provados e face à ausência de prova de quaisquer outros -até porque a Apelante, repita-se, foi IMPEDIDA, de provar os factos que alegou - a decisão do Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo não faz qualquer sentido, sendo mesmo  incoerente e contraditória;

que não logra sustentação e, assim, sai contrariada. Permanecendo o alcance firmado, segundo o qual

“os autos contém todos os elementos documentais para, sem necessidade de mais provas, julgar improcedente e infundado o pedido de insolvência, sendo justificado ainda destacar que, a nosso ver, esse pedido não é forma adequada para a cobrança de créditos ou para a discussão judicial de litigios relativos ao cumprimento e incumprimento das obrigações contratuais perante empresas sem sinais de dificuldades financeiras. Para o efeito é que existem os meios comuns”.

Em decorrência, tal acarreta - ao contrário do em VI. enunciado - que, (VI. 17.) ao decidir-se nos termos expostos, não saem violados os artigos 20.º do CIRE e 456.º do CPC.

Podendo assim concluir-se, sumariando, que:

1.

O incumprimento de só alguma ou algumas obrigações apenas constitui facto-índice quando, pelas suas circunstâncias, evidencia a impossibilidade de pagar; o requerente deve então, juntamente com a alegação de incumprimento, trazer ao processo essas circunstâncias das quais, uma vez demonstradas, é razoável deduzir a penúria generalizada. (art. 20º CIRE), circunstancialmente não verificada em função indiscutível da prova suficiente produzida.

2.

É no decurso da própria audiência que, devendo proceder-se ao julgamento, por não haver confissão nem desistência, o juiz procede ao saneamento do processo, separando a factualidade que considere já assente, mesmo antes da produção de outra prova, e aquela que, sendo controvertida, constitui a base instrutória, objecto fundamental da prova a produzir. Esta actividade do tribunal obedece aos cânones comuns vigentes em processo civil, devendo o juiz ter em conta, designadamente, os factos que hajam de se considerar confessados em razão do ónus da impugnação especificada (cfr. art.° 490.° do C.P.Civ.). De resto, são aqui subsidiariamente aplicáveis as disposições dos art.ºs 508.°-A, n.° 1, al. e), e 511.° do C.P.Civ..

3.

A Relação apenas pode manter a resposta dada pela 1ª instância a determinado quesito, ou em específica afirmação contextualizada, por assente, quando puder entender que a mesma resultou da convicção do julgador, formada exclusivamente com base em documentos de sustentação, em termos revelados insusceptíveis de alteração conceitual ou interpretativa abrangente, não obstante impugnação pelo recorrente. Por isso com relevo de força probatória de circunstância, insusceptível de alteração pela contribuição de eventuais declarações de representantes das partes e/ou do depoimento de testemunhas, eventual e pretendidamente a produzir.

4.

O reconhecimento de uma litigância de má-fé tem de identificar-se com situações de clamoroso, chocante ou grosseiro uso dos meios processuais, por tal forma que se sinta que com a mesma conduta se ofendeu ou pôs em causa a imagem da justiça. Quando a parte se limita a litigar baseada na incerteza da lei, na dificuldade de apurar os factos e de os interpretar, apresentando tese jurídica que está longe de se poder considerar manifestamente infundada, nada há a censurar ao respectivo comportamento processual.

5.

O art. 22º CIRE (dedução de pedido infundado) nada diz acerca do exercício da responsabilidade adveniente da conduta dolosa do requerente e consequente pedido de reparação dos prejuízos sofridos pelo lesado. Em face desta omissão, justifica-se o recurso ao regime geral da lei processual, tendo, além do mais, presente a estatuição do art.° 17.°. Importando, então, atender, como empreendido, ao disposto no art.° 456.°, n.° 1 CPC.

III. A Decisão:

Pelas razões expostas, concede-se parcial provimento ao recurso interposto, não se reconhecendo a existência de litigância de má-fé arguida, mantendo-se, no demais, a sentença sob análise, sem necessidade de os Autos prosseguirem com a realização de audiência de discussão e julgamento para  produção de prova testemunhal, dispensável em função da explícita prova documental produzida.

Custas em proporção.

António Carvalho Martins ( Relator )

Carlos Moreira

Moreira do Carmo