Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | BARATEIRO MARTINS | ||
Descritores: | RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATO DE INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA VALORES MOBILIÁRIOS DEVER DE INFORMAÇÃO ILICITUDE NEXO DE CAUSALIDADE ADEQUADA ÓNUS DA PROVA | ||
Data do Acordão: | 12/03/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - LEIRIA - JC CÍVEL - JUIZ 3 | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTS. 227, 342, 563, 762, 799 CC, 7, 304, 312, 314 CVM | ||
Sumário: | 1 - Na intermediação de valores mobiliários, tem o banco/intermediário financeiro o dever acessório de conduta de informar o cliente sobre os elementos necessários à compreensão do produto financeiro em causa (à tomada duma decisão esclarecida e fundamentada), quer em função da boa-fé plasmada, em termos gerais, no art. 227.º do C. Civil, quer em função dos específicos deveres de informação consagrados no CVM, decorrentes dos arts. 7.º, 304.º e 312.º do CVM; devendo a informação ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita, devendo observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência, e devendo a extensão e a profundidade da informação ser inversamente proporcional aos conhecimentos e experiência do cliente. 2 - Dizer a um cliente ignorante em matéria financeira – que não sabe sequer o que é uma obrigação e que privilegia (como é do conhecimento do banco) segurança e liquidez – que a obrigação subordinada que lhe está a ser “vendida” é um produto financeiro que dá uma taxa de juro superior à de um DP, mas que mantém a liquidez, o reembolso e garantia dos DP não é descrever, em termos adequados e com fidelidade, a realidade que é relevante para tal cliente; não é informação totalmente completa, verdadeira e clara – no confronto entre a constituição dum DP e a subscrição duma obrigação corporativa – não observando, em face da iliteracia financeira do A., os ditames da boa fé e da lealdade, que mandam considerar devidamente os interesses do cliente; razão pela qual, não tendo sido dada toda a informação sobre as características da obrigação que acabou por subscrever, violou o banco/intermediário financeiro os deveres de informação a que estava adstrito, sendo por isso, nos termos do art. 314.º/1 e 2 do CVM, responsável por tal incumprimento. 3 - Responsabilidade essa que é contratual, uma vez que os deveres de informação, como deveres acessórios de conduta que são, integram o conteúdo da chamada relação obrigacional complexa, aplicando-se assim a presunção de culpa do art. 799.º do C. Civil; sendo que, no caso, face ao disposto no art. 314.º/2 do CVM, sempre a culpa seria de presumir. 4 – Não recebendo o cliente a restituição da quantia investida/emprestada, por o emitente da obrigação haver ficado insolvente, e entendendo-se que é ao cliente que cabe provar o nexo causal entre o incumprimento dos deveres de informação e tal dano (decorrente da insolvência do emitente), não pode tal requisito – nexo causal – dar-se como verificado, uma vez que os deveres de informação incumpridos não tinham como finalidade proteger o A./investidor da insolvência da entidade emitente. 5 – Efectivamente, para se dar o nexo causal como verificado, caberia ao cliente provar que não teria actuado da mesma forma sem o incumprimento, ou seja, que não teria realizado a subscrição da obrigação caso lhe tivesse sido prestada a informação devida. 6 – Em todo o caso, caso estiver provado que o emitente tinha, no momento da emissão obrigacionista, uma situação económico-financeira débil – que as suas contas eram fictícias e que não reflectiam com fidelidade a substância da sua situação patrimonial, razão pelo qual os seus reais ratios de solvabilidade nada tinham a ver com os que as sua contas espelhavam – e que o banco/intermediário financeiro sabia disto mesmo, faria parte dos deveres de informação – da boa fé e lealdade – informar o cliente de tal risco que a entidade emitente representava; pelo que, tendo entretanto ocorrido a insolvência da emitente, não estaríamos perante uma circunstância extraordinária e estranha ao especto de protecção do dever de informação violado (não informar/advertir do risco que o emitente representava). 7 – Um banqueiro/intermediário financeiro está obrigado a veicular/informar o seu cliente de toda a “verdade que conheça”, sendo que também no juízo abstracto de adequação se devem tomar em consideração e incluir, além das circunstâncias reconhecíveis à data do facto por um observador experiente, todas as circunstâncias efectivamente conhecidas do lesante na mesma data, posto que ignoradas de outras pessoas; pelo que se um banqueiro/intermediário financeiro “vende”, sabendo disso, um mau produto financeiro tem que ser responsabilizado. 8 – Um cliente tem que ser informado, de forma completa e clara, sobre as características – maturidade, remuneração, liquidez, garantias – do produto financeiro, porém, mais do que tudo isto, para “uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada”, conta/releva que implicitamente lhe está a ser dito/informado que o “subjacente” do produto financeiro – entendendo-se por “subjacente” duma obrigação a situação económico-financeira do emitente – não tem uma qualquer especial fragilidade (ou, no mínimo, que o intermediário não tem conhecimento duma sua qualquer fragilidade). 9 – Colocar todo o encargo da prova do nexo causal a cargo do cliente conduz, na prática, à invariável desresponsabilização do Banco/Intermediário Financeiro, o que, face à importância fundamental que as obrigações de informação e de adequação assumem na superação das assimetrias existentes no mercado de valores mobiliários, é pouco equilibrado. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório A (…) residente (…), (...) , intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra o Banco B (…) com sede na (…). (...) , pedindo que se: a) Declare que a aquisição do produto financeiro traduzido na compra de três obrigações S (…) Rendimento Mais 2006 ao B(…)(actual Banco (…)), na agência de (...) foi levada a efeito no pressuposto de que o produto financeiro em causa se mostrava a coberto da garantia dada pelo Banco R., de reembolso do capital de 100%. b) Declare que é da responsabilidade do Banco B (…) o reembolso do capital reportado à aquisição por parte do A. de três obrigações S (…) Rendimento Mais 2006, no valor de € 50.000,00, porquanto com a transmissão do nacionalizado banco B (…) para a esfera jurídica do banco B (…) transmitiram-se de igual modo na sua totalidade todas as obrigações emergentes dos contratos que obrigavam o B (…) independentemente de todo e qualquer acordo que o banco B (…)tenha estabelecido com o Estado Português no acto de compra ou em momento anterior, o que só lhe concede o direito de regresso a discutir entre as partes em causa, sendo tal acordo marginal ao aqui A.. c) Condene o R. Banco B (…) a proceder ao imediato reembolso do capital de € 50.000,00, acrescidos dos juros vencidos desde 10 de maio de 2015 sobre a obrigação S(…) 2006, à taxa legal, até integral reembolso do capital, condenando ainda o R. Banco B (…) a pagar ao A. quantia indemnizatória a fixar em liquidação de sentença, mas nunca inferior a € 10.000,00, por danos morais sofridos pelo A. e sua esposa, com o comportamento imputável ao R. Banco B (…) traduzido na informação falsa prestada pelo gerente de conta na Agência de (...) que conduziu à presente situação. E, no entendimento de que o contrato é nulo, se. d) Julgue nulo o contrato de intermediação financeira celebrado entre o A. e o R. que deu origem à ordem de subscrição de 10-10-2016 de uma obrigação S(…)Rendimento Mais 2006, no valor de € 50.000,00. E e) Condene o R. Banco B (…) a restituir ao A. o valor de € 50.000,00, acrescido de juros, à taxa legal, desde 10-10-2015 e até efectivo e intergral pagamento. Alegou para tal, muito em síntese, que, em Abril de 2006, era detentor dum DP no montante de € 50.000,00 na Agência/Balcão do B (…) de (...) ; e que, estando tal DP a vencer-se, a sua gerente de conta lhe propôs que, em vez de renovar o DP, adquirisse uma obrigação S (…) Rendimento Mais 2006, produto financeiro que, segundo a referida gerente de conta, “tinha as mesmas garantias e segurança dum depósito a prazo”[1], podendo assim obter “um melhor rendimento, sendo que tinha os juros remuneratórios e o reembolso de capital 100% garantido pelo B (…)”[2]. Assim, perante o que lhe estava a ser proposto, o A. anuiu e, em Abril de 2006, adquiriu uma obrigação[3] do produto designado como S (…) Rendimento Mais 2006, no valor de € 50.000,00, sendo certo que “desconhecia e ainda desconhece de todo em todo o que são obrigações, apenas sabendo que estava a comprar e que comprou um produto que lhe havia sido e foi apresentado como sendo tão seguro como um DP e que lhe dava mais juros, tendo a garantia do B(…) do reembolso integral do capital que estava a investir”[4]; e sendo certo que a referida gerente de conta lhe disse “que tal aplicação seria feita pelo prazo de dez anos, mas que poderia eventualmente proceder ao seu resgate antecipado ao fim de cinco anos e que se porventura tivesse necessidade de levantar o dinheiro mais cedo, em qualquer altura o poderia fazer, bastando que a avisasse com dois ou três dias de antecedência”[5]. Adquirido tal produto/obrigação (em Abril de 2006), sempre até Maio de 2015 lhe foram pagos os juros do capital investido, não lhe sendo assim pagos os 2 últimos cupões e sendo-lhe dito pelo R. B (…) – tendo entretanto, como é do domínio público, o Estado Português nacionalizado, em 11/11/2008, o B(…) e depois procedido, em 30/03/2012, à sua reprivatização/venda ao R. Banco B (…) (que, depois, em 07/12/2012, se fundiu, por incorporação, com o B (…) assumindo então o B(…) a personalidade jurídica do B (…)) – que, sendo a aplicação uma obrigação da S(…) e estando esta insolvente (o que entretanto foi declarado), o reembolso do capital devia ser reclamado no processo de insolvência; isto, ainda segundo o que lhe foi dito pelo R. B(…), “por o B(…), ao vender a referida obrigação, apenas ter funcionado enquanto intermediário financeiro, não sendo tal obrigação do B(…), mas apenas e só vendida ao balcão do B(…) por conta e risco da dita S(…)”[6]. Ora, segundo o A., o R. B (…) ao adquirir o B (…) ao Estado Português, assumiu todas as responsabilidades emergentes da gestão do B(…) e nessas responsabilidades incluem-se as verbas devidas e reclamadas pelos clientes (sem prejuízo de, depois, o Banco B(…) poder pedir o seu reembolso ao Estado Português, nos termos do acordo entre ambos celebrado), como é o caso do reembolso do capital das obrigações S(…) Rendimento Mais 2006, vendidas “com a informação de ter capital garantido, envolvendo tal garantia, não a da entidade dele emitente, mas sim ou também do intermediário financeiro”[7]; razão pela qual o Banco B(…), segundo o A., deve ser condenado a restituir-lhe os € 50.000,00 investidos, acrescidos de juros (sendo que, ainda segundo o A., o contrato de intermediação financeira celebrado com o B(…) é nulo por não ter obedecido à exigida forma escrita, o que, mais uma vez segundo o A., é fundamento para, como efeito da nulidade declarada, lhe serem restituídos os € 50.000,00 investidos, acrescidos de juros). Ademais, confrontado com a ideia de perder o dinheiro investido, passou “noites e noites sem dormir, dias e dias de conflitualidade familiar com a sua esposa”, factos que criaram desestabilização no seio do seu agregado familiar, razão pela qual, ainda hoje, ele e a esposa sofrem de depressão e angústia, o que, tudo junto, pela sua gravidade, justifica que sejam indemnizados os danos não patrimoniais por ambos sofridos.
O R. contestou. Alegou, em apertada síntese, que na intermediação financeira efectuada com o A., a respeito da Obrigação S(…) Rendimento Mais 2006, não houve qualquer violação do dever legal de informação, tendo sido prestada ao A. informação completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita; que nunca o banco ou os seus colaboradores transmitiram ao A. que o banco “garantia a emissão”; que, à época, “nada havia que desabonasse sobre o investimento efectuado”, sendo uma obrigação “um produto conservador”, com um risco reduzido, “indexado à solidez financeira da sociedade emitente”, sendo que a entidade emitente era a “mãe” do banco e um “componente da solvabilidade daquela, por ser um dos principais activos do seu património, pelo que, segundo o R., “dificilmente haveria um produto financeiro tão seguro como a subscrição daquelas obrigações”; e que ao longo dos anos sempre o A. foi recebendo toda a documentação respeitante ao investimento efectuado e recebendo os juros sem ter suscitado qualquer reclamação. Invocou que, se porventura fosse verdade (o que não concede) que não prestou a informação a que estava adstrito, o certo é que o A. sabe há muito o negócio/investimento que fez, pelo que, não tendo o R. agido com dolo ou culpa grave, já há muito estaria prescrito, nos termos do art. 324.º/2 do CVM; o direito indemnizatório do A.. E concluiu pela total improcedência da acção e pela sua total absolvição do pedido.
O A. replicou, respondendo e opondo-se à excepção da prescrição e mantendo o antes alegado na PI.
Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, em que foi declarada a total regularidade da instância, estado em que se mantém – relegando-se para final o conhecimento da prescrição invocada – tendo-se identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova. Instruído o processo e realizada a audiência, o Exmo. Juiz proferiu sentença, em que julgou a acção totalmente improcedente e em que, em consequência, absolveu o banco R. de todos os pedidos formulados.
Inconformado com tal decisão, interpõe o A. o presente recurso de apelação, visando a sua revogação e a sua substituição por decisão que, invertendo o decidido, julgue a acção procedente e “condene o banco R. nos termos peticionados”. Terminou a sua alegação com conclusões em que, ao arrepio da forma sintética constante do art. 639.º/1 do CPC, se espraia por 20 páginas, motivo pelo qual aqui não se reproduzem.
O banco R. respondeu, terminando as suas contra-alegações sustentando, em síntese, que a sentença recorrida não violou qualquer norma processual ou substantiva, designadamente, as referidas pelo recorrente, pelo que deve ser mantida nos seus precisos termos.
Obtidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir. * II – “Reapreciação” da decisão de facto Como “questão prévia” à enunciação dos factos provados, importa, atento o âmbito do recurso do A., analisar as questões a propósito da decisão de facto colocadas a este Tribunal. São inúmeros os factos que A. quer ver aditados como provados; muitos deles repetidos (e diversas vezes) e outros nem sequer alegados e/ou discutidos, motivo pelo qual, desde já se antecipa, é necessariamente limitada a sua razão. Mas, vejamos: (…) * III - Fundamentação de Facto III – A Factos Provados 1. O Autor, em Abril de 2006, detinha um depósito a prazo no montante de € 50.000,00 (Cinquenta Mil Euros). 2. A gerente do Balcão de (...) da época sugeriu ao Autor que este poderia adquirir um produto financeiro que lhe traria um melhor rendimento com taxa de juro superior à de um depósito a prazo, boa liquidez e que tinha os juros remuneratórios e o reembolso do capital garantido. 3. Perante essas condições, o Autor anuiu a tal proposta, e aceitou adquirir tal produto e em Abril de 2006, o Autor adquiriu o produto designado como S(…) Rendimento Mais, 2006. 4. É assim o Autor titular de uma obrigação S(…) 2006, no valor de € 50.000,00. 5. O Autor desconhecia com precisão o que são obrigações, mas sabia que estava a comprar e que comprou um produto diferente de um depósito a prazo, que lhe foi apresentado nas condições acima referidas. 6. Tal desconhecimento preciso do A. sobre o que são obrigações não era do desconhecimento da gerente do banco, atenta a relação de confiança existente com o A., o seu conhecido perfil e a sua baixa formação literária. 7. As orientações e comunicações internas existentes no B(…) e que este transmitia aos seus comerciais nos respectivos balcões consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez e boa rentabilidade com um risco semelhante a um depósito a prazo junto do próprio banco. 8 Não foi referido ao A. que a entidade emitente era a S(…) e não o próprio banco Banco K (...) . 9 Assim como o A. não foi informado sobre o que são obrigações. 10. A referida gerente de conta, na agência de (...) , disse ainda ao aqui Autor, que tal aplicação seria feita pelo prazo de dez anos, mas que poderia eventualmente proceder ao seu resgate antecipado ao fim de cinco anos, e que se porventura tivesse necessidade de levantar o dinheiro mais cedo, em qualquer altura o poderia fazer, bastando que a avisasse com dois ou três dias de antecedência. 11. No mês seguinte ao das referidas operações o subscritor recebeu por correio um aviso de débito correspondente à subscrição efectuada. 12. Como também foi recebendo, desde então, um extracto periódico onde lhe apareciam essas obrigações como integrando a sua carteira de títulos, separadas dos depósitos, com menção expressa ao facto de se tratar de obrigações depositadas na sua carteira de títulos. 14. Da mesma forma, foram-lhe sendo creditados em conta os juros relativos aos cupões das obrigações, o que originava igualmente o competente registo no seu extracto e até a emissão de avisos de lançamento que lhes eram enviados para a sua morada. 15. Tudo isto nunca suscitou da sua parte qualquer reclamação. 16. Até Maio de 2015, sempre foram pagos ao Autor os juros do capital investido nas aplicações financeiras. 17. Esses pagamentos foram feitos ao Autor pelo B(…) até Outubro de 2012 e pelo Réu B(…), a partir dessa data e até Maio de 2015. 18. Verificado que se mostra vencido o prazo de dez anos, contratualmente estabelecido, é o aqui Autor informado de que a aplicação financeira em causa, não tem cobertura de garantia de capital, que é uma subscrição de obrigações da S(…) (…), S.A., e que, uma vez que a referida sociedade se mostra insolvente, tal resgate não lhe será concedido, podendo e devendo reclamar o montante a que se julga com direito no processo de Insolvência. 19. O subscritor sempre foi pessoa preocupada com o investimento do seu património. 20. E aplicava o seu dinheiro, por sugestão da sua gerente de conta, em produtos diferentes do simples depósito a prazo. 21. Em 9 de Dezembro de 2011, o Estado Português, então accionista único do B(…)e no âmbito do processo de reprivatização daquela Instituição, celebrou um Acordo Quadro com o Banco B (…) SA, no qual foram estabelecidos os procedimentos e as acções necessárias a desenvolver por cada uma das partes, passo intermédio considerado essencial para a celebração do contrato de compra e venda das acções do B(…). 22. No dia 30 de Março de 2012, foi assinado o contrato de compra e venda do Banco K (...) , entre o Estado Português e o Banco B(…), sendo que nos termos do disposto na cláusula 15.ª do Acordo Quadro celebrado entre o Estado Português e o Banco B (…), relativo à reprivatização do B (…) neste se mostram incluídas todas as entidades do espectro do antigo Banco B (…) (actual banco B (…)., réu na presente acção), sendo estas a (…) 23. A atual Instituição resultou assim da fusão ocorrida em 7 de Dezembro de 2012, por incorporação do Banco B (…). no Banco (…)., assumindo a designação social do primeiro e a personalidade jurídica do segundo. 24. À data de 2006, o Conselho de Administração do B (…) e da S (…) tinha como Presidente a mesma pessoa, J (…). * III – B – Factos Não Provados Não se provou: a) Que o Autor detinha um depósito a prazo que se estava a vencer e cujo prazo pretendia renovar. b) Que sabendo disso, a gerente de conta do B (…) na Agência de (...) , ao inteirar-se das intenções do Autor, logo lhe propôs, que adquirisse um produto financeiro que tinha as mesmas garantias e segurança de um depósito a prazo, mas que lhe daria um maior rendimento. c) Que a aplicação em causa era absolutamente segura, que não comportava qualquer risco. d) Que o próprio banco garantia o reembolso. e) Que a identificada gerente de conta na data da venda de tal obrigação, exibiu um documento onde constava de entre outras condições a do capital garantido a 100% (cem por cento). f) Que, no momento da subscrição, não havia qualquer indicação de que a emissão pudesse vir a não ser paga. g) Ou qualquer ideia sobre o risco de insolvência do emitente. h) Que o Autor confrontado com a ideia de perder todo o dinheiro que tinha investido na aplicação financeira cujas garantias de retorno total lhe foram dadas, passou noites e noites sem dormir, dias e dias de conflitualidade familiar com a sua esposa, factos estes que criaram uma tal desestabilização no seio do seu agregado familiar e que ainda hoje, quer o aqui Autor, quer a sua esposa, sofrem de depressão e angústia decorrente dos factos expostos. i) Que o Autor tenha visto agravada a sua situação de saúde, o que requer especiais cuidados de apoio médico e familiar por parte da sua esposa e filha. * IV – Fundamentação de Direito Emerge o presente litígio duma situação da vida que à partida era susceptível de poder ser juridicamente configurada/apresentada de diferentes maneiras, porém, em função da delimitação que a causa de pedir exposta e o pedido formulado conferem ao objecto dos presentes autos/recurso, somos “tão só” colocados perante uma questão de indemnização civil por danos causados pela violação do dever de informação, no âmbito duma relação bancária e mais específica e concretamente dum contrato de intermediação financeira[8]. Trata-se de questão já colocada em inúmeros processos entrados nos tribunais e sobre a qual os tribunais superiores, designadamente o STJ, já se debruçaram diversas vezes[9], estando o raciocínio/percurso jurídico sobre tal questão relativamente sedimentado e situando-se/circunscrevendo-se a polémica em dois pontos: no cumprimento (ou não) do dever de informação e na verificação (ou não) do nexo causal. Como foi alegado e resulta dos factos provados, ao A., enquanto cliente que era do B (…), foi sugerida, pelo sua gerente de conta, a aquisição/subscrição de obrigações subordinadas S (…) 2006, sugestão que o A. aceitou, adquirindo/subscrevendo, em 10/04/2006, uma obrigação subordinada S (…) 2006, no valor de € 50.000,00; entretanto, foi-lhe sendo paga, semestralmente, a remuneração dos cupões respeitante aos primeiros 9 anos, sendo que, face à insolvência da S (…) não foi reembolsado da quantia emprestada/investida, pretendendo, aqui e agora, receber do Banco R. (“sucessor” do B (…)) a quantia investida, acrescida de juros, enquanto dano decorrente do comportamento ilícito – consistente na violação de deveres de informação – do B (…) Temos pois – é um ponto pacífico nas decisões já proferidas – que o B(…)tinha o dever de informar o A. sobre os elementos necessários à compreensão do produto obrigacionista sugerido e subscrito; quer em função do dever de informar decorrente da boa-fé plasmada, em termos gerais, no art. 227.º do C. Civil, quer em função dos específicos deveres de informação consagrados no CVM, como resulta e no que aqui interessa dos arts. 7.º, 304.º e 312.º do CVM. O A. tinha com o B (…) uma relação bancária contínua e duradoura, relação que é por natureza uma relação de permanente e recíproca informação, estando o banqueiro obrigado a prestar as informações que, ex bona fide, tenham a ver com qualquer relação em curso, pelo que os deveres de informação extraíveis do art. 227.º do C. Civil – quer por força de tal relação bancária, quer por força da relação pré-contratual (boa fé in contrahendo) ao contrato de recepção e transmissão de ordens sugerido – impunham ao B (…) o dever de informar o A. sobre os elementos necessários à compreensão do produto obrigacionista sugerido e subscrito. Ademais e principalmente, para além do dever de informar resultante da cláusula geral constante do art. 227.º do C. Civil, estava o Banco B (…), tendo sido sugerido e celebrado, fora de qualquer dúvida, um contrato de recepção e transmissão duma ordem sobre um valor mobiliário[10] (art. 290.º/1/a) do CVM), adstrito aos específicos deveres de informação constantes dos já referidos arts. 7.º, 304.º e 312.º do CVM (todos na redacção e vigor à data da subscrição da obrigação[11]). Deveres de informação estes – quer os extraíveis do art. 227.º do C. Civil, quer os explicitamente previstos no CVM – que, não constituindo o objecto duma prestação principal ou secundária dum contrato celebrado entre o A. e o B(…), configuram naturalmente um dever acessório de conduta no âmbito da referida relação bancária contínua e duradoura e, principalmente, no âmbito do concreto e em curso contrato de recepção e transmissão duma ordem sobre um valor mobiliário (obrigação). Tinha pois, repete-se, o B(…), enquanto intermediário financeiro, que prestar ao A. “todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada” (art. 312.º do CVM), nomeadamente as informações respeitantes aos “riscos especiais envolvidos pela operação a realizar” (art. 312.º/1/a) do CVM); devendo a extensão e a profundidade da informação ser inversamente proporcional aos conhecimentos e experiência do cliente (art. 312.º/2 do CVM). Além disto, como traço comum a toda a realidade dos valores mobiliários regulados pelo CVM, tinha o B(…), como resulta do art. 7º/1 do CVM, que fornecer informação “completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita”; e que agir de acordo com os princípios orientadores da actividade de intermediação financeira enunciados no art. 304º do CVM, ou seja, tinha “de orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado” (304.º/1) e de “observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência” (304.º/2)[12]. Em síntese, o B(…), no cumprimento dos seus deveres de intermediário financeiro, devia ter em consideração a protecção dos interesses legítimos do A., indagando sobre a sua situação financeira e experiência no que respeita ao tipo específico de instrumento financeiro ou serviço oferecido ou procurado, com observância dos ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência[13]. Isto dito, em tese, somos chegados ao primeiro ponto que tem suscitado polémica: cumpriu (ou não) no caso o B(…) os deveres de informação a que, fora de qualquer dúvida, estava a adstrito em relação ao A.? Tendo presente o que no caso se provou, entendemos, com todo o respeito por opinião diversa, que o B(…) não cumpriu devida e totalmente os deveres de informação a que estava adstrito. Alinhemos os factos: O Autor desconhecia com precisão o que são obrigações, desconhecimento este que era do conhecimento da sua gestora de conta, atenta a relação de confiança existente, o seu conhecido perfil e a sua baixa formação literária. Não obstante, sabendo que ela tinha valores depositados (num DP) que lhe permitiam subscrever uma obrigação S(…) Rendimento Mais 2006 (que exigia o montante de € 50.000,00), sugeriu-lhe a sua gestora de conta a aquisição/subscrição de tal produto financeiro: obrigação. Disse-lhe então que tal produto financeiro lhe traria um melhor rendimento com taxa de juro superior à de um depósito a prazo, boa liquidez e que tinha os juros remuneratórios e o reembolso do capital garantido; disse-lhe ainda que tal aplicação seria feita pelo prazo de dez anos, mas que poderia eventualmente proceder ao seu resgate antecipado ao fim de cinco anos, e que se porventura tivesse necessidade de levantar o dinheiro mais cedo, em qualquer altura o poderia fazer, bastando que a avisasse com dois ou três dias de antecedência. Não foi referido ao A. que a entidade emitente era a S(…) e não o próprio B(…), assim como não foi o A. informado sobre o que são obrigações (e, muito menos, sobre o que são obrigações subordinadas, porém, o A. percebeu que estava a comprar um produto diferente de um depósito a prazo. As orientações e comunicações internas existentes no B(…) e que este transmitia aos seus comerciais nos respectivos balcões consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez e boa rentabilidade com um risco semelhante a um depósito a prazo junto do próprio banco. O Autor anuiu à proposta e adquirir/subscreveu uma obrigação S(…) 2006, no valor de € 50.000,00. E a primeira conclusão a retirar de tais factos é a de que o A. era um investidor não qualificado (art. 30.º do CVM), porventura até muito pouco qualificado: uma obrigação – enquanto aplicação financeira e valor mobiliário – é de complexidade bastante baixa, pelo que não saber exactamente o que é uma obrigação revela uma clara ignorância financeira. Mas, sendo uma obrigação um valor mobiliário de complexidade bastante baixa, é relativamente fácil explicar, mesmo a um néscio em matéria financeira, o que é uma obrigação. E a primeira explicação – que de imediato vem à ideia – que a um “ignorante” deve ser dada sobre o que é uma obrigação é a de que subscrever/comprar uma obrigação, corporativa como é o caso, é estar a emprestar dinheiro à empresa que emite a obrigação. Pelo que, sendo tão simples – é por isso que uma obrigação é um valor mobiliário de complexidade bastante baixa – explicar/informar o que é uma obrigação, mal se percebe que o “argumentário” (as orientações e comunicações internas existentes) do B(…) não começasse exactamente por aqui e que a gestora de conta não haja dado tal explicação/informação tão singela ao A.. Não associamos, claro está, a tal ausência de explicação/informação um carácter decisivo em termos de investir ou não por parte do A.[14], porém, devendo a informação ser completa, não podemos deixar de entender que a identidade da entidade emitente é a primeira coisa que um intermediário financeiro, leal e de boa fé, deve esclarecer junto do cliente. Os deveres de informação têm, naturalmente, uma geometria variável; para além de dependerem do “grau de conhecimentos e experiência do cliente”, podem ter, conforme o que está em causa, um conteúdo indeterminado ou preciso, havendo deveres de informações formais e deveres de informação substanciais, sendo que, quanto a estes, o banco/intermediário financeiro está obrigado a descrever toda a realidade relevante para o cliente, procurando termos adequados para o fazer com fidelidade e, estando ainda, como é evidente, sempre obrigado a veicular toda a verdade que conheça. E se, quanto à identidade da entidade emitente da obrigação, o B(…) podia/devia ser preciso (e não foi), quanto às características do produto financeiro em causa relevava que ao A. fosse transmitida informação que lhe possibilitasse a assimilação das características fundamentais do produto financeiro. E, a nosso ver, tal também não aconteceu totalmente. Não será estultícia concluir que a venda das obrigações subordinadas S(…) 2006 aos balcões do B(…) se dirigia a clientes com pouca literacia financeira[15] e que não iam muito além dos DP na aplicação das suas poupanças: as referidas orientações e comunicações internas e o que a gestora de conta disse ao A. são um argumentário para superar, à luz de olhos um pouco “turvos”, os DP, uma vez que é dito que é um produto financeiro que dá uma taxa de juro superior à de um DP, mas que mantém a liquidez (é dito que a aplicação é por 10 anos, mas que se pode eventualmente proceder ao seu resgate antecipado ao fim de cinco anos e que se se tiver necessidade de levantar o dinheiro mais cedo pode tal ser feito, em qualquer altura, bastando que se avise com dois ou três dias de antecedência), o reembolso e garantia dos DP. Ora, com todo o respeito por opinião diversa, isto não é informação totalmente completa, verdadeira e clara – no confronto entre a constituição dum DP e a subscrição duma obrigação corporativa – não observando, em face da iliteracia financeira do A., os ditames da boa fé e da lealdade; e também não pode dizer-se que, se o cliente tivesse usado da diligência mediana exigível, teria obtido os elementos necessários à completa e clara compreensão do produto que lhe foi proposto e que subscreveu. A gerente de conta conhecia, insiste-se, a iliteracia financeira do A., o seu perfil e sabia que ele tinha confiança nela, pelo que, manda a boa fé – não ignorando ela, em face de tal iliteracia/confiança, que o A. era sensível às suas sugestões – que ela considerasse devidamente os interesses do A. e lhe apresentasse devida e completamente as aparentes desvantagens que aos olhos dele/A. a subscrição duma tal obrigação poderia ter (para que o A., na posse de todas as informações, pudesse fazer o seu próprio balanço e tomar uma decisão esclarecida e fundamentada)[16]. Dito doutro modo, o B(…) e os seus funcionários quando procediam à venda de obrigações subordinadas S(…) a clientes com baixa literacia financeira e que, consabidamente, valoravam segurança e liquidez, não podiam deixar de mencionar, para informar completa e claramente sobre tal produto financeiro, a clara diferença de liquidez entre uma obrigação a 10 anos e um DP; e tinham que tomar a iniciativa de mencionar tal diferença e não apenas referi-la caso fossem questionados pelos clientes. Dizer ao cliente que “pode eventualmente proceder ao seu resgate antecipado ao fim de cinco anos e que se tiver necessidade de levantar o dinheiro mais cedo basta avisar com dois ou três dias de antecedência”, são “meias verdades” para ocultar a verdade verdadeira, uma vez que se transmite a ideia do cliente/subscritor poder pedir a liquidação do investimento ao fim de 5 anos (quando a obrigação tinha, não uma “call option”, mas sim, bem ao invés, uma “put option”) ou mesmo, em qualquer altura, em 2/3 dias (quando isto aconteceria num mercado secundário de balcão, que, sendo restrito aos balcões do Banco K (...) e envolvendo títulos com um valor de € 50.000, tinha necessariamente uma liquidez bastante aleatória, ao contrário do que se transmitia)[17]. É certo que o A. percebeu que estava a comprar um produto diferente de um DP – sendo que decorre da própria essência do investimento financeiro a inevitável existência de risco, que o intermediário financeiro não tem que ser o “tutor” do cliente/investidor e que este deve ser auto-responsabilizado – porém, o que foi dito ao A., em termos de características do produto que lhe foi sugerido, foi pouco (e até incorrecto) para se concluir que lhe foi dada e pôde assimilar toda a informação sobre as características da obrigação que acabou por subscrever. Também não retiramos daqui, como que “automaticamente”, que tal insuficiência e imprecisão de explicações/informações tenha tido um carácter decisivo em termos de investir ou não por parte do A., porém, devendo a informação ser completa, clara e verdadeira, entendemos que o Banco K (...) violou, também aqui, os deveres de informação a que, enquanto intermediário financeiro, estava adstrito. Da globalidade dos factos fica a clara convicção, com todo o respeito por opinião diversa, que a gerente de conta disse ao A., com “economia de meios” e “sagacidade”[18], o que de antemão sabia que ele gostava de ouvir – melhor rentabilidade que um DP, capital garantido como num DP e liquidez sensivelmente idêntica à dum DP – e ele não pensou duas vezes e acolheu a sugestão dela. Não parece, porém, que seja caso para citar a sabedoria popular e dizer que o A. se esqueceu que “quando a esmola é grande deve o pobre desconfiar”: é que nem a esmola era assim tão grande[19], nem à época certas práticas da actividade bancária e de intermediação financeira levadas a cabo pelos bancos estavam devidamente identificadas, suscitando/impondo especiais cautelas e desconfianças. O instrumento financeiro em causa era, é certo, de baixa de complexidade, porém, isso não dispensava o B(…), enquanto intermediário financeiro, sabendo da baixa literacia financeira do A., de dar todas as informações que um destinatário concreto médio – no que toca às capacidades, conhecimentos e experiência do A. – pudesse compreender e assimilar: teria que lhe explicar que, ao subscrever a obrigação, estava a emprestar dinheiro à empresa que era dona do Banco e que o risco não era por isso diferente de ter o dinheiro depositado no Banco; que receberia periodicamente de tal empresa, que não o Banco, os juros; que referir o período de maturidade da aplicação e as taxas de juro aplicáveis; e teria que mencionar que o capital investido ficava “preso” 10 anos, havendo a possibilidade, aparecendo interessados, da obrigação poder ser cedida a terceiros. Ou seja – concorda-se com o banco R. – entre “os riscos especiais envolvidos pela operação a realizar” não tinha, em princípio[20], o Banco K (...) que chamar a atenção para o risco geral de incumprimento da emitente e/ou da sua insolvência, por tal não ser um risco específico do produto em causa; aliás, explicando-se que, ao subscrever a obrigação, estava a emprestar dinheiro a uma empresa, também não seria necessário explicar que deixava de beneficiar do Fundo de Garantia de Depósitos (que, à época, assegurava a devolução do valor máximo de € 25.000,00), uma vez que também tal benefício pressupõe uma situação (insolvência/colapso financeiro) que não é suposto um cliente colocar em relação ao Banco onde mantém depositadas as suas poupanças. Refere o Prof. Pinto Monteiro (no parecer junto aos autos pelo Banco R.) que, “quando um banco, enquanto intermediário financeiro, apresenta uma operação de subscrição de uma obrigação, emitida por uma outra entidade, a um seu cliente, completamente ignorante em matéria financeira, tem de o informar adequadamente acerca do modo de funcionamento deste instrumento financeiro, bem como dos riscos que comporta”. Ora – é o ponto – como resulta dos factos, não foi exactamente isto que aconteceu, pelo que, em síntese, como começámos por antecipar, entendemos que o B(…) não cumpriu, em relação ao A., no âmbito da relação bancária que tinha com ele e do concreto contrato de recepção e transmissão de ordens celebrado, os seus deveres de informação, sendo por isso, nos termos do art. 314.º/1 e 2 do CVM, responsável por tal incumprimento. É claro, como também resulta dos factos (não provados), que não garantiu, ele B(…), o reembolso da aplicação financeira, porém, não é por não se haver provado ter isto acontecido que deixa de haver violação dos deveres de informação; aliás, uma tal garantia – a interpretação do sentido duma tal “garantia” – constituiria mais um conforto sobre a segurança e robustez da aplicação financeira (era como um DP) e não a concessão duma garantia especial (uma cláusula de garantia) dada pelo B(…)aos seus clientes/subscritores, que o obrigasse, a par da S (…) a reembolsar o montante investido. Prosseguindo pois na análise dos requisitos da responsabilidade civil, temos que, face à insolvência da S (…) não foi o A. (após lhe serem pagos cupões remuneratórios durante 9 anos) reembolsado da quantia emprestada/investida, não se antevendo, face ao carácter subordinado do seu crédito (e ao lugar da sua graduação – cfr. art. 48.º/c) do CIRE), que alguma verba ele venha a receber na Massa Insolvente da S(…); razão pela qual, como também já se referiu, pretende receber (do Banco R., “sucessor” do B(…)) a quantia investida no produto financeiro (obrigações subordinadas S (…) 2006), enquanto dano decorrente do comportamento ilícito – consistente na violação/incumprimento dos deveres de informação – do B (…) ou seja, no fundo pretende que o R. responda pelos danos resultantes do incumprimento do dever de restituir (o capital investido) a cargo da S(…) (mas não do B(…)). E cumpre começar por referir que, embora os deveres de informação (cuja violação é imputada ao B(…)) configurem deveres acessórios de conduta e tenham por fonte a lei (os art. 227.º e 762.º/2 do C. Civil e, no caso, 312.º do CVM) – e não residam na relação obrigacional simples de que emerge o dever de prestar/restituir a quantia investida/mutuada à S(…) – o seu incumprimento dá lugar a responsabilidade contratual. Efectivamente, apesar dos deveres de informação terem origem legal, fazem parte da chamada relação obrigacional complexa, integrando o seu conteúdo, razão pela qual se entende que o seu incumprimento desencadeia responsabilidade contratual, aplicando-se-lhe assim a presunção de culpa do art. 799.º do C. Civil; sendo que, no caso, face ao disposto no art. 314.º/2 do CVM – em que se estabelece idêntica presunção para o incumprimento dos deveres de informação: “a culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação” – ainda que se considerasse estar perante responsabilidade extra-contratual, sempre a culpa seria de presumir. Temos pois presumida a culpa do B(…) na provada ilicitude consistente na violação dos deveres de informação, ficando a faltar a prova da existência de um nexo de causalidade entre tal violação dos deveres de informação e o dano sofrido. Com o que somos chegados ao outro (e segundo) ponto que tem suscitado polémica: a verificação (ou não) do nexo causal. Ponto em que – a propósito de quem tem que provar o requisito do nexo causal – a posição que maioritariamente começa a ser seguida no STJ coloca tal ónus a cargo do cliente (cfr., a título de exemplo, os acórdãos do STJ de 13 de Setembro de 2018, www.dsgi.pt, poc. nº 13809/16.4T8LSB.L1.S1, de 6 de Novembro de 2018,www.dsgi.pt. proc. nº 2468/16.4T8LSB.l1.S1, de 8 de Novembro de 2018, proc. nº 6164/09.TVLSB.L1.S1, de 15 de Janeiro de 2019, proc. nº 433/11.7TVPRT.P1.S2, de 19 de Dezembro de 2018, proc. nº 2382/17.6T8VNG,P1.S1, ou de 24 de Janeiro de 2019, proc. nº 2406/16.4T8LRA.C1.S1), posição que aqui observaremos. Em todo o caso, impõe-se observar e reconhecer, uma tal distribuição do ónus da prova conduzirá, na prática, à invariável desresponsabilização do Banco/Intermediário Financeiro; o que, em casos como o presente, em que as assimetrias informativas tornam grave e intensa a violação dos deveres de esclarecimento e de informação, aparenta ser uma solução que não prima pelo equilíbrio. Como refere Sinde Monteiro[21], “é, com frequência, difícil averiguar se a recomendação ou conselho foram efectivamente tomadas como base para a disposição patrimonial vantajosa”, pelo que seremos invariavelmente colocado perante um “non liquet”, que a referida distribuição do ónus da prova resolverá contra o credor do dever de informação. Ficará pois tão só a declaração de que o Banco/Intermediário Financeiro teve um comportamento ilícito, que não cumpriu devidamente os deveres acessórios de informação; declaração pouco mais do que “retórica”, uma vez que nenhuma consequência prática se extrairá da mesma. Nesta linha de raciocínio, comprovada a violação de deveres de esclarecimento e de informação, algum caminho que facilite a prova da causalidade terá que ser, com todo o respeito, juridicamente excogitado. A inversão do ónus da prova poderá ser excessiva – uma vez que traz como consequência o risco contrário, do intermediário financeiro suportar danos não causados pelo seu comportamento – porém, a importância fundamental que as obrigações de informação e de adequação assumem na superação das assimetrias existentes no mercado de valores mobiliários, justificam que as violações de tais obrigações não devam ficar sem uma efectiva censura. Como refere Margarida Azevedo de Almeida[22], “(…) a responsabilidade civil dos intermediários financeiros representa um importante instrumento na reparação dos investidores lesados e, por esta via, da confiança no mercado. Por outro lado, também constitui uma importante via de prevenção de comportamentos violadores dessas obrigações que assumem importância fundamental na superação das assimetrias informativas, fundamentais no eficiente funcionamento do mercado, quer sob o ponto de vista institucional, quer sob o ponto de vista alocativo”. Seja como for, seguindo a referida posição do STJ: É habitualmente referido que a nossa lei (art. 563.º do C. Civil) consagra a chamada teoria da causalidade adequada. Segundo o pensamento fundamental de tal teoria, para impor a alguém a obrigação de reparar o dano sofrido por outrem, não basta que o facto ilícito praticado tenha sido, no caso concreto, condição (s.q.n.) do dano; é ainda necessário que, em abstracto ou em geral, o facto ilícito seja uma causa adequada do dano sofrido; ou seja, é requisito necessário que o facto ilícito seja condição do dano, porém, tal não é requisito suficiente para poder ser considerado verificado o nexo causal. Tudo se reconduz pois à questão de saber se e quando um concreto facto ilícito pode, abstractamente considerado, ser apontado como causa adequada do dano sofrido. Ou seja, revertendo ao caso dos autos, tudo estará em saber se o referido incumprimento/violação dos deveres de informação pode, abstractamente considerado, ser apontado como causa adequada do dano sofrido pelo A.: não restituição, por parte da S(…), da quantia emprestada (através da obrigação). Se for correcto afirmar/concluir que, caso fossem cumpridos os deveres de informação (isto é, sem o referido incumprimento dos deveres de informação), o A. não teria subscrito/investido naquela obrigação, temos estabelecido o nexo causal, uma vez que, em tal hipótese, não subscrevendo/investindo na obrigação, não teria sofrido o dano que o incumprimento do dever de restituir a cargo da S(…) lhe causou. Sucede que não há nos autos factos/elementos que permitam efectuar tal afirmação/conclusão[23]; entendendo-se que é ao A./cliente, repete-se, que cabe provar que não teria actuado da mesma forma sem o incumprimento, ou seja, que não teria realizado a subscrição da obrigação caso lhe tivesse sido prestada a informação devida. Efectivamente, uma coisa é dizer-se que o intermediário financeiro não forneceu informação completa, clara e verdadeira, outra, diversa, afirmar-se/concluir-se que aquela concreta incompletude ou imprecisão deu lugar a que se diga que, sem ela, o A. não teria subscrito/investido naquela obrigação. Importa de facto não perder de vista que, no “espectro” do que, em termos de deveres de informação, foi incumprido, não estava, como finalidade, proteger o A./investidor da insolvência da entidade emitente[24]; estava apenas informá-lo, correcta e cabalmente, de todas as características e riscos especiais do produto financeiro em causa, não se podendo dizer, como já se referiu, que a insolvência da entidade emitente configurava um risco especial envolvido pela operação de que o A. tinha que ser informado/advertido. Dito doutra forma, das referidas/analisadas violações dos deveres de informação por parte do B(…) não se segue, como curso adequado e normal, o dano sofrido pelo A.. Mas, sublinha-se, apenas das referidas/analisadas violações dos deveres de informação, uma vez que, sendo outras as provadas violações dos deveres de informação, outra podia/devia ser, a nosso ver, a solução. Vem isto a propósito, como é evidente, da densa nuvem de suspeita que paira (desde 2008) sobre tudo o que se relaciona com o Grupo (…);de serem fortes as suspeitas e rumores sobre a “verdade” económico-financeira da S(…) em 2006; e, naturalmente, de serem igualmente fortes as suspeitas de tal “verdade” ser já então bem conhecida do B (…). É incontestável (e elementar) que não se pode/deve trazer para a apreciação do que aconteceu em Abril de 2006, em termos de cumprimento dos deveres de informação e de verificação do nexo causal, tudo o que entretanto se tornou público e que hoje sabemos, porém, não podemos deixar de afirmar que temos como certo que, se “um banqueiro dá informações inexactas a um cliente que, assim, adquire um mau produto e tem prejuízos”[25] deve ser responsabilizado[26]. É que o banqueiro/intermediário financeiro está obrigado, como já referimos, a veicular/informar o seu cliente de toda a “verdade que conheça”, sendo que também no juízo abstracto de adequação se devem tomar em consideração e incluir, além das circunstâncias reconhecíveis à data do facto por um observador experiente, “todas as circunstâncias efectivamente conhecidas do lesante na mesma data, posto que ignoradas de outras pessoas”[27]. Significa isto que, estando provado (ou melhor, caso estivesse provado) que, em Abril de 2006, a S(…) tinha uma situação económico-financeira débil – que as suas contas eram fictícias e que não reflectiam com fidelidade a substância da sua situação patrimonial, razão pelo qual os seus reais ratios de solvabilidade nada tinham a ver com os que as sua contas espelhavam[28] – e que o B(…) sabia disso mesmo, faria parte dos deveres de informação – da boa fé e lealdade – informar os clientes de tal risco que a S(…) representava; pelo que, tendo entretanto ocorrido a sua insolvência, não estaríamos perante uma circunstância extraordinária e estranha ao especto de protecção do dever de informação violado (não informar/advertir do risco que a SLN representava) [29]. Quando a obrigação de indemnização pressupõe um facto ilícito culposo (quer se trate de responsabilidade contratual, quer se trate de responsabilidade extra-contratual), só quando tenham ocorrido circunstâncias extraordinárias, fortuitas ou excepcionais o facto ilícito não será considerado causa adequada do dano; sendo que para que um dano seja considerado como efeito adequado de certo facto não é necessário que ele seja previsível para o autor desse facto: essencial é apenas que o facto constitua – considerando todo o processo factual que, em concreto, conduziu ao dano – uma causa objectivamente adequada. Ou seja, a insolvência da S(…) – geradora do incumprimento do dever primário de restituição da quantia mutuada – não seria então uma circunstância extraordinária em relação ao facto ilício do B (…) violação/incumprimento do dever de informar o A/clientes do risco que a frágil situação económico-financeira da S(…) representava. Efectivamente, com todo o respeito por opinião diversa, a questão da solidez (ou melhor, da falta dela) económico-financeira da S(…) e do seu conhecimento por parte do B(…), tudo reportado a Abril de 2006, é (devia ser) o aspecto central do litígio sub-judice (e porventura de todos aqueles que se lhe assemelham[30]). Como já referimos, o A., até pela sua iliteracia financeira, tinha que ser informado, de forma completa e clara, sobre as características – maturidade, remuneração, liquidez, garantias – do produto financeiro que lhe estava a ser proposto, porém, mais do que tudo isto, para “uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada”, contou/relevou que implicitamente lhe estava a ser dito/informado que o “subjacente” do produto financeiro – entendendo-se por “subjacente” a situação económico-financeira da S(…) – não tinha uma qualquer especial fragilidade (ou, no mínimo, que o B(…) não tinha conhecimento duma sua qualquer fragilidade)[31]. Um banqueiro/intermediário financeiro não pode, sabendo-o, promover a venda e vender um mau produto financeiro; e, no caso, antes do B(…) proceder à venda/intermediação das obrigações, até foi uma instituição do Grupo B (…) (o banco E (…) como consta na Nota Informativa das obrigações, junta com a contestação), a “organizar/montar” toda a emissão obrigacionista das Obrigações subordinadas S(…) 2006. Seja como for, nesta linha de raciocínio, a questão central está/aria em saber se, em Abril de 2006, com a informação de que o B (…) dispunha e conhecia à data, as obrigações subordinadas S (…) 2006 eram uma “mau produto financeiro” (em face da frágil, em substância, situação económico-financeira da S(…), das suas contas serem fictícias, de não reflectirem com fidelidade a substância da sua situação patrimonial, dos seus reais ratios de solvabilidade nada terem a ver com os que as sua contas espelhavam). Começava pois por ser (e acima de tudo era/seria) uma questão de facto, sucedendo – é o ponto – que nada foi alegado e/ou ficou provado que consubstancie a conclusão das obrigações subordinadas S(…) 2006 serem, à partida, um “mau produto financeiro” e que tal era do conhecimento do B(…). A nacionalização do B(…) no início de Novembro de 2008 (e o sucessivo avolumar do seu buraco financeiro, a ponto de, segundo o Tribunal de Contas, a falência já ter custado ao erário público, em termos líquidos, até ao final de 2016, a quantia de 3,7 mil milhões de euros[32]) e a posterior insolvência da S(…) fazem, claro está, suspeitar que o valor mobiliário subscrito pelo A. poderia ser uma espécie de “gato por lebre”[33]; por outro lado, os “alvos” escolhidos para escoar tal produto financeiro e a “economia de meios” utilizada no cumprimento dos deveres de informação não infirmam tal suspeita. Só que, como também é incontestável (e elementar), suspeitas e rumores não configuram factos que sirvam de alicerce a um qualquer silogismo judiciário. O A/apelante, como consta das conclusões 10.ª e 11.ª, pediu que fosse aditado aos factos provados, “por ser do domínio público” (ou seja, por não carecerem de alegação e prova – cfr. art. 412.º do C. Civil), que: “Os administradores do B(…) à data dos factos tinham perfeito e total conhecimento da situação em que quer o banco quer a S(…) se encontravam, ou seja, em manifesta insolvência, e que, ao aliciarem os clientes para a aquisição daquele produto com a alegação de garantia de reembolso de capital, estavam a prestar uma falsa informação aos clientes e ponham em perigo como puseram as poupanças dos mesmos.” “Os relatórios e contas apresentados quer pelo banco, quer pela S (…) mostravam-se falseados e os resultados apresentados não correspondiam à realidade e escondiam a verdadeira situação do banco e da S(…)” Só que – como se referiu em sede de reapreciação da decisão de facto – tais factos, na sua precisão e descrição (e reportados a 2006), não são do domínio público: o que é do domínio público, hoje e pelo menos desde 2008, são as suspeitas e rumores sobre tudo isto. Ou seja, a nosso ver, tinha o A. que ter previamente alegado tais factos e que carrear, para os provar, meios de prova com os conhecimentos especiais que a prova dos mesmos inquestionavelmente exige[34]; e não fez nem uma coisa nem outra[35]. Pelo que, em termos de nexo causal, resta e subsiste o que se começou por referir: que os deveres de informação incumpridos não tinham como como finalidade proteger o A. da insolvência da entidade emitente e que das referidas/analisadas violações dos deveres de informação por parte do B(…) não se segue, como curso adequado e normal, o dano sofrido pelo A.. Enfim, perante os factos (e mesmo não olvidando as suspeitas e rumores públicos) não se pode dizer que hajam sido as referidas/analisadas violações dos deveres de informação a dar causa ao dano sofrido pelo A.; não se podendo estabelecer e dar como verificado o nexo causal entre as referidas/analisadas violações/incumprimentos dos deveres de informação (por parte do BPB (…) no âmbito da relação bancária com o A. e do concreto contrato de recepção e transmissão de ordens) e o dano que o A. sofreu, em virtude do incumprimento do dever primário de prestação no contrato de mútuo (empréstimo obrigacionista) celebrado com a S(…) (emitente da obrigação). * Improcede pois tudo o que o apelante invocou e concluiu em contrário na sua alegação recursiva[36], o que determina o naufrágio do recurso e a confirmação do decidido na 1ª instância. *
V - Decisão Nos termos expostos, decide-se julgar improcedente a apelação e confirma-se a decisão recorrida. Custas pelo apelante.
Coimbra, 03/12/2019
Barateiro Martins ( Relator ) Arlindo Oliveira Emídio Santos
[8] Este é – embora o A termine a sua alegação a pedir que se “condene o banco R. nos termos peticionados” – claramente o único objecto da apelação. Quanto à nulidade do contrato de intermediação financeira celebrado entre o A. e o R. (tema cuja apreciação não vemos efectuada na sentença recorrida), nada é dito na alegação recursiva; em todo o caso, refere-se que, à data, não era exigida forma escrita para a validade de um contrato de intermediação financeira como o dos autos, que só passou a estar prevista após a alteração introduzida no CVM pelo DL 357-A/2007, de 31-10, no respectivo artigo 321º; à data, estávamos pois perante um contrato consensual, não podendo por isso proceder a nulidade por falta de forma escrita suscitada pelo A. e o respectivo pedido subsidiário formulado. Quanto à indemnização por danos não patrimoniais (em que, certamente por lapso, o A. também pede os sofridos pela esposa), também não faz verdadeiramente parte do objecto da apelação, uma vez que, tendo ficado factualmente não provados, o A. não impugna tal parte da decisão de facto. [9] Em sentido não totalmente coincidente, reconhece-se, embora parte da desarmonia de julgados seja mais aparente que real; uma vez que as situações são sempre algo diferentes e, em função disso, o que está alegado e fica provado, em cada concreto processo, quase nunca é o mesmo, sendo assim identificáveis, em sentido diverso dos juntos pelo A., idêntico número de Arestos proferidos pelo STJ. [10] Que é o que uma obrigação é – cfr. art. 1.º/b) do CVM. [11] As alterações legais introduzidas em 2007 (DL 357-A/2007, de 31-10) vieram reforçar o dever de informação nos termos que passaram a constar do aditado art. 312º-A (qualidade da informação) ou das modificações introduzidas nos arts. 312º (deveres de informação) e 314º (princípio geral acerca da adequação da operação ao perfil do cliente), tornando mais exigente a actividade dos intermediários financeiros, tendo em vista proteger ou esclarecer os clientes. Porém, o legislador inovou na concretização dos deveres que decorriam da enunciação dos princípios genéricos que constavam do art. 304º (protecção dos legítimos interesses dos clientes, boa fé, elevados padrões de diligência, lealdade e transparência), de modo que, nessa medida, as alterações introduzidas não devem ser consideradas para o caso, a não ser que tenham natureza meramente interpretativa (arts. 12º e 13º do CC) – cfr. neste sentido, a título de exemplo, os Acórdãos do STJ de 12 de Janeiro de 2017, www.dgsi.pt, proc. nº 428/12.3TCFUNC.L1.S1, de 10 de Novembro de 2018, www.dgsi.pt, proc. nº 2339/16.4T8LRA.C2.S1 ou de 9 de Janeiro de 2019, proc. nº 1479/16.4T8LRA.C2.S1. [12] Mais, sendo o B(…) uma instituição financeira – e decorrendo também o dever de informação da relação bancária duradoura – também o art. 77.º/1 do RGICSF, aprovado pelo DL nº 298/92, de 31-12, na vertente da intermediação financeira, dispunha que “devem informar com clareza os clientes sobre (…) os elementos caracterizadores dos produtos oferecidos” [13] Como refere Castilho dos Santos, in a Responsabilidade Civil do Intermediário Financeiro Perante o Cliente, p. 76. [14] Estamos no requisito da “ilicitude” e não no “nexo causal”. [15] O que não exclui que outros, não profanos, também fossem abrangidos. [16] Ao não fazê-lo totalmente, podemos dizer que abusou da confiança que o A. nela depositava. [17] Não se lhe explicou – e seria por certo uma explicação que o A. não assimilaria facilmente – que num mercado secundário de obrigações (de balcão ou não) também se forma um preço, que não tem que coincidir com o valor nominal do título; aliás, sem pretender confundir os planos e os momentos processuais, refere-se que a testemunha (…) disse que era explicado que havia uma “call option” (sic), o que, se era mesma assim que era dito/explicado aos clientes, estamos mesmo a ver que clientes como o A. não percebiam. [18] Não foi diligente, objectar-se-á, a confirmar as informações que a sua gerente de conta lhe dava, mas, face à sua (conhecida) iliteracia financeira e à confiança que tinha nela, não pode, a nosso ver, ser censurado por o não ter feito; aliás, com todo o respeito por opinião diversa, sugerir uma obrigação subordinada a 10 anos a alguém que privilegia segurança e liquidez exige a “economia de meios” de não dar muitos esclarecimentos e a “sagacidade” de saber que ele não vai fazer as perguntas certas (e de que não vai conseguir ser diligente a confirmar o que quer que se lhe diga). [19] A melhor remuneração decorreria, em parte, de se tratar de obrigações subordinadas; e aqui, se considerarmos que é do senso comum que rentabilidades mais elevadas correspondem a maiores riscos – e que por isso o A. podia desconfiar – também temos de considerar que, antes disso, a informação dada pelo B(…) sobre a garantia/risco da obrigação seria até falsa (pelo menos, à luz do actual e posterior art. 7.º do DL 57/2008, de 26/03). [22] In A responsabilidade civil de intermediários financeiros por informação deficitária e falta de adequação dos instrumentos financeiros”, in O novo direito dos valores mobiliários. I Congresso sobre valores mobiliários e mercados financeiros, Livraria Almedina, Coimbra, 2017, pág. 422. [23] Sendo que também não há nos autos factos/elementos que permitam efectuar a afirmação/conclusão oposta, “non liquet” que, como referimos, a distribuição do ónus probatório resolve contra o A/cliente. [25] Menezes Cordeiro, Manual de Direito Bancário, pág. 328. [26] Sabe-se hoje que o B(…) não tinha solvabilidade, pelo que, à partida, um crédito indemnizatório do A. sobre o B(…) nada acrescentaria, em termos efectivos, à garantia patrimonial do A.. Entretanto, como é do domínio público, o B (…) em Nov. de 2008, foi “salvo/nacionalizado” pelo Estado e todas as responsabilidades creditórias do B(…) passaram, através da “socialização de prejuízos” que tal medida do Estado representou, da inconsistência à total consistência. Tomada tal medida – cujo mérito não nos compete analisar – são identicamente beneficiários da mesma quer os credores dos montantes depositados no banco quer os credores de indemnizações por incumprimentos e violações levadas a cabo pelo B(…) no âmbito da sua actividade, uma vez que foi toda esta, na sua globalidade, que foi salva. [27] Antunes Varela, Obrigações em Geral, Vol 1.º, pág. 892, [28] O que porventura terá permitido o registo prévio da emissão obrigacionista junto da CMVM, nos termos do art. 114.º e ss do CVM. [29] Estando tudo isto provado, estaríamos até, certamente, perante um comportamento doloso do B (…) [31] É este, claramente, o sentido implícito da expressão sobre ser dada a “garantia do B(…)”; aliás, neste ponto, concordamos inteiramente com os raciocínios que o R. expôs no arts. 19.º e ss. da contestação (e que repete na contra-alegação); como refere o R., uma obrigação é “um produto conservador”, com um risco reduzido, “indexado à solidez financeira da sociedade emitente”, porém, a conclusão a que chega – “dificilmente haver um produto financeiro tão seguro como a subscrição daquelas obrigações – pressupõe algo que não está demonstrado (embora também não esteja demonstrado o contrário): a solidez financeira da S (…) e do B(…), em 2006. [32] E continuará a custar, sendo o desfecho da presente acção um exemplo duma contingência que, na venda feita ao aqui R., por 40 milhões, está a cargo do Estado. [33] Só mesmo nos processos e nos tribunais, espaços máximos de liberdade, é que, hoje, em 2019, se pode afirmar, como foros de seriedade, como faz o banco R., que “dificilmente haveria um produto financeiro tão seguro como a subscrição das obrigações S(…) 2006.” [34] Podendo estar aqui – no atenuar da exigência probatória sobre tais factos – um caminho facilitador da prova da causalidade. [35] E entendemos que não é caso para, aqui e agora, considerar que foi omitido um convite ao aperfeiçoamento, uma vez que o quadro de facto em questão é inexistente (e não apenas incompleto) na PI, surgindo apenas na alegação recursiva. [36] Mostrando-se prejudicado apreciar a excepção de prescrição suscitada pelo banco R.; e explicar – na análise do montante do dano – que a indemnização que o A. pudesse eventualmente vir a ter direito teria que ser calculada tendo como critério o seu interesse contratual negativo, devendo assim os € 50.000,00 ser reduzidos dos montantes que o A. foi recebendo de juros, nos 9 anos que estes lhe foram pagos (não se podia concluir, a nosso ver, que, devidamente informado, o A. não tinha investido e, depois, colocá-lo na situação em que estaria se, tendo investido, não tivesse ocorrido um qualquer “sinistro”). |