Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | FERNANDO MONTEIRO | ||
Descritores: | APOIO JUDICIÁRIO JUNÇÃO AOS AUTOS DE DOCUMENTO COMPROVATIVO DA APRESENTAÇÃO DO REQUERIMENTO A PETICIONAR A RESPECTIVA CONCESSÃO PEDIDO DE NOMEAÇÃO DE PATRONO | ||
Data do Acordão: | 11/12/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | JUÍZO DE FAMÍLIA E MENORES DE VISEU | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 1.º; 6.º, 16.º E 24.º, DA LEI 34/2004, DE 29/7 ARTIGOS 612.º; 615.º, 1, D) E 665.º, 1, DO CPC | ||
Sumário: | No âmbito do art.º 24º, nº 4, da Lei 34/2004 (apoio judiciário), mostra-se suficiente a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo e seja claro que o requerente pretende a nomeação de patrono. | ||
Decisão Texto Integral: | *
Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: Está em causa a decisão de 16.4.2024, que considerou tempestivo o articulado de 5.9.2023, tendo o Tribunal entendido que o prazo de 15 dias foi interrompido a 30.6.2023 e só reiniciou após férias judiciais. * Inconformada, a interessada AA recorreu e apresenta as seguintes conclusões: 1. O despacho recorrido viola o disposto no artigo 24.º, nºs 4 e 5, da Lei nº 34/2004, de 29/07. 2. O recorrido foi notificado para no prazo de 15 dias apresentar alegações ou arrolar até 10 testemunhas e juntar documentos. 3. Esse prazo terminou a 30.06.2023. 4. Nesse dia o recorrido juntou ao processo um requerimento acompanhado do comprovativo de apresentação de pedido de protecção jurídica, mas não comprovou ter formulado o pedido na modalidade de nomeação de patrono. 5. A interrupção do prazo que estiver em curso depende de o pedido de apoio judiciário incluir o pedido de nomeação de patrono. 6. E pressupõe que tal seja comprovado nos autos antes de esgotar o prazo que se encontrar em curso. 7. O recorrido não demostrou ter recorrido a nomeação de patrono antes do termo do prazo para apresentar as alegações. 8. Aquando do oficio da S. Social de 04.09.2023 que demonstra ter sido requerida a nomeação de patrono (que mesmo assim se não descortina se já havia sido formulado inicialmente ou na pendencia do pedido e por conseguinte após o termo do prazo das alegações) já se encontrava ultrapassado há muito o prazo para apresentação das alegações. 9. Como tal, a junção ao processo pelo recorrido do comprovativo de entrega do requerimento de protecção jurídica, não é susceptível de interromper o prazo que se encontrava em curso e que terminou em 30.06.2023. 10. Ainda que tal ofício pudesse suprir a omissão em causa seria necessário que tal informação chegasse aos autos a tempo de interromper o prazo em curso, ou seja, antes de o mesmo terminar. 11. Em 04.09.2023 o prazo para apresentar as alegações já havia decorrido na totalidade, não se encontrando, por conseguinte, em curso qualquer prazo que pudesse ser interrompido. 12. As alegações apresentadas pelo recorrido são extemporâneas, devendo ser desentranhadas e devolvidas ao seu apresentante, anulado o julgamento e, ouvido o MP, proferida sentença tal como previsto no artigo 39.º, n.º 6 do RJPTC. 13. No seu de 11.09.2023 a recorrente levantou também questão relacionada com o comportamento processual de recorrido que considerou evidenciar que o mesmo adotou comportamento processual que constitui fraude à lei e que violou os princípios da boa-fé e da cooperação processual plasmados nos artigos 7.º e 8.º do Código de Processo Civil. 14. Tal questão não foi apreciada pelo tribunal recorrido e deveria sê-lo. 15. Ao não apreciar essa questão o d. tribunal recorrido violou o disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, sendo nulo o despacho recorrido. * O Requerido e o Ministério Público contra-alegaram, defendendo a correção do decidido. * As questões a decidir são as seguintes: As alegações de 5.9.2023 são tempestivas? Ocorre omissão de pronúncia? Ocorre fraude à lei? * Os factos a considerar são os seguintes, provados pela tramitação dos autos: Em 15/06/2023, aquando da conferência de pais, na falta de acordo entre eles, os mesmos foram notificados para apresentarem alegações, juntarem documentos ou arrolarem testemunhas, nos termos do disposto no art.º 39, n.º 4, do RGPTC; A 30/06/2023, o progenitor juntou requerimento e recibo, a confirmar que apresentou documentos na Segurança Social para proteção jurídica; nesse requerimento, alegando razões de saúde, e juntando documento, disse que precisava de “ajuda de um profissional de direito” para se defender; A 08/08/2023, o progenitor juntou Procuração, tendo constituído Mandatário; A 04/09/2023, foi junta informação da Segurança Social de que o pedido de proteção jurídica, por parte do progenitor, foi indeferido a 28/08/2023, constando dessa informação documento em que consta que o pedido era relativo a dispensa de taxa de justiça e encargos e nomeação de patrono; O indeferimento baseou-se na falta de prova da insuficiência económica; A 05/09/2023, o Mandatário do progenitor juntou as alegações previstas no art.º 39, n.º 4 do RGPTC; A 16/04/2024, o Tribunal profere despacho, no inicio da audiência de discussão e julgamento, concluindo que considera que foram juntos elementos suficientes de que a comunicação que a Lei do Apoio Judiciário exige e foram interrompidos os prazos em curso, sendo que a decisão da Segurança Social ocorreu em período de férias judiciais, pelo que as alegações apresentadas pelo requerido progenitor são tempestivas. * Dispõe o artigo 24.º da Lei 34/2004: Autonomia do procedimento 1 - O procedimento de protecção jurídica na modalidade de apoio judiciário é autónomo relativamente à causa a que respeite, não tendo qualquer repercussão sobre o andamento desta, com excepção do previsto nos números seguintes. 2 - Nos casos previstos no n.º 4 do artigo 467.º do Código de Processo Civil e, bem assim, naqueles em que, independentemente das circunstâncias aí referidas, esteja pendente impugnação da decisão relativa à concessão de apoio judiciário, o autor que pretenda beneficiar deste para dispensa ou pagamento faseado da taxa de justiça deve juntar à petição inicial documento comprovativo da apresentação do respectivo pedido. 3 - Nos casos previstos no número anterior, o autor deve efetuar o pagamento da taxa de justiça ou da primeira prestação, quando lhe seja concedido apoio judiciário na modalidade de pagamento faseado de taxa de justiça, no prazo de 10 dias a contar da data da notificação da decisão que indefira, em definitivo, o seu pedido, sob a cominação prevista no n.º 5 do artigo 467.º do Código de Processo Civil. 4 - Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo. 5 - O prazo interrompido por aplicação do disposto no número anterior inicia-se, conforme os casos: a) A partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação; b) A partir da notificação ao requerente da decisão de indeferimento do pedido de nomeação de patrono. Conforme o citado nº 4, a interrupção do prazo ocorre com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo (que é autónomo, da competência da Segurança Social), sendo caso do requerente pretender a nomeação de patrono. Ao contrário do defendido pela Recorrente, o Requerido comprovou a apresentação do pedido de proteção jurídica e deixou claro que “precisava de ajuda de um profissional de direito”. Além disso, ficou também claro que o procedimento de proteção jurídica era relativo a dispensa de taxa de justiça e encargos e nomeação de patrono. Neste contexto, não é admissível concluir, como faz a Recorrente, que o progenitor não pediu ou não certificou o pedido de nomeação de patrono, só porque no recibo entregue a 30/06/2023 apenas constava que o mesmo apresentou documentos na Segurança Social para proteção jurídica. A Lei em questão estipula que a proteção jurídica abrangerá também a nomeação de patrono (cfr. seus arts. 1, 6 e 16). A falta de especificação, no recibo entregue pela Segurança Social ao Requerido progenitor, (diferente da expressa vontade do mesmo, no requerimento de 30.6.2023, em pretender o apoio de um profissional), de qual é a modalidade da proteção jurídica solicitada, não pode ser imputada contra o interessado progenitor, pois trata-se de um ato que não é dele. Como a outorga da procuração ou o indeferimento do apoio judiciário ocorrem em férias judiciais (mês de agosto), em processo que não é urgente, o reinício do prazo interrompido ocorre, na pior das hipóteses, no dia 1.9.2023. E, assim, o ato de 5.9.2023 é tempestivo. No seu requerimento de 11.9.2023, a Recorrente levantou também a questão do comportamento do Recorrido evidenciar uma fraude à lei, questão não foi apreciada pelo Tribunal Recorrido e deveria sê-lo, pois esta tem autonomia relativamente à questão da interrupção do prazo. Ao não apreciar essa autónoma questão, o Tribunal Recorrido cometeu a nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, al. d) do Código de Processo Civil (CPC). Apesar da nulidade, esta Relação pode conhecer desde já da questão (art.665, nº 1, do CPC). A respeito, a Recorrente entende: “Ora, tendo o requerido apresentado requerimento de apoio jurídico no último dia do prazo de que dispunha para apresentar as suas alegações, sem contudo juntar os documentos necessários à apreciação da sua condição económica, mesmo depois de expressamente notificado para tal, e tendo constituído mandatário muito antes da decisão de indeferimento do apoio jurídico requerido, não pode deixar de entender-se que o requerido não pretendia verdadeiramente ser dispensado do pagamento das custas do processo, nem tão-pouco que lhe fosse nomeado patrono, mas unicamente e numa atitude de total fraude à lei a interrupção e consequente aumento do prazo para apresentação de alegações.” Apesar da suspeição, não nos parece pudermos concluir assim, na falta de factos. É legítimo que, em determinado momento, o interessado possa vir a optar pelo mandato forense, “desistindo” do patrocínio judiciário e, com isso, deixar de se esforçar por provar a sua insuficiência económica. Poderá até acontecer que o apoio profissional escolhido o tenha convencido de que não tem direito, afinal, a qualquer apoio judiciário. No momento do requerimento, nos termos em que o faz (referência 6022426), a solicitação apresenta-se legítima, próxima até da invocação do “justo impedimento”, por razões de saúde. O art. 612 do CPC exige uma convicção segura da fraude à lei, o que o caso não permite. Sendo tempestivas as alegações e admitido o articulado, não se mostra necessário discutir a pretendida anulação do julgamento, ficando prejudicadas as razões invocadas pelo Recorrido para o caso de se entender serem aquelas intempestivas. * Decisão. Julga-se o recurso improcedente e confirma-se a decisão recorrida. Custas pela Recorrente, vencida. Notifique. 2024-11-12 (Fernando Monteiro) (Fonte Ramos) (Vítor Amaral) |