Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
139/14.5SBGRD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: INÁCIO MONTEIRO
Descritores: DETENÇÃO DE ARMA PROIBIDA
BASTÃO
MOCA
Data do Acordão: 04/15/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: GUARDA (INSTÂNCIA CENTRAL - SECÇÃO CÍVEL E CRIMINAL – JUIZ 1)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS. 2.º; 3.º; 86, N.º 1, AL. D), DA LEI 5/06, DE 23-02
Sumário: I - Não é pelo nome dado ao objecto, “bastão” ou “moca”, que o mesmo é ou deixa de ser classificado como arma.

São as características específicas de tal objecto, sem aplicação definida, sem que o arguido justifique a sua posse e a sua potencialidade para ser utilizado como arma de agressão, independentemente de o arguido o destinar a esse fim, que nos ajudam a apurar os elementos tipificadores do crime de detenção de arma perigosa.

II - No caso dos autos estamos perante um objecto com aplicação definida, pois as suas características, pelo contrário, apontam que tem uma aplicação definida: a sua utilização como objecto ou arma de agressão.

O referido instrumento foi construído exclusivamente com o propósito de ser utilizado como arma de agressão e esse uso lhe foi dado, com ela intimando a vítima, ao ameaçar agredi-la com ela.

III - A posse do referido objecto ou instrumento visa a utilização como arma de agressão, não sendo necessário que o tenha usado, para ser cometido o crime.

Decisão Texto Integral:

Processo comum com intervenção do tribunal colectivo, da Comarca da GUARDA - Instância Central - Secção Cível e Criminal – Juiz 1.


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Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra

No processo supra identificado, foi julgado o arguido A... , filho de (...) e de (...) , natural da (...) -Guarda, nascido a 09/02/1973, divorciado, auxiliar da acção médica, residente na Rua (...) , Guarda e actualmente detido no EPR da Guarda, ao qual vinham imputados:

-Um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º, n.º 1, al. b) e n.ºs 4 e 5 do Código Penal (CP), na pessoa da sua ex-companheira B... .

- Um crime de injúria agravada, p. e p. pelo art. 181.º, n.º 1 e 184.º, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, al. l), todos do CP (na pessoa do agente da PSP F... );

- Um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1, al. d), da Lei n.º 5/2006 de 23 de Fevereiro (relativamente a bastão com 62 cm de comprimento).


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A demandante Unidade Local de Saúde da Guarda, EPE, deduziu pedido de reembolso contra o arguido no montante de € 85,91, acrescido de juros desde a citação até integral pagamento, pelos cuidados de saúde que prestou a B..., no montante de € 85,91, em consequência dos factos praticados pelo arguido.

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O tribunal colectivo julgou a acusação parcialmente, e, em consequência decidiu:

- Absolver o arguido A... da prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. no art. 86.º, n.º 1, d), da Lei 5/2006 de 23 de Fevereiro.

- Condenar o arguido:

. Pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º, n.ºs 1 e 2 do CP, na pena de 3 (três) anos de prisão.

. Pela prática de um crime de injúria agravada, p. e p. pelo art. 181.º, n.º 1 e 184.º, por referência ao art. 132.º, n.º 2, al. l), todos do CP, na pena de 2 (dois) meses e 15 (quinze) dias de prisão.

. Em cúmulo jurídico foi condenado o arguido na pena única de 3 (três) anos e 1 (um) mês de prisão.

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Julgando o pedido de reembolso deduzido pela ULS da Guarda, procedente, condenou o arguido no pagamento do montante de € 85, 91 (oitenta e cinco euros e noventa e um cêntimos) e não cento e cinco euros e noventa e um cêntimos, como por lapso consta em extenso do dispositivo e se conclui da fundamentação jurídica do pedido cível a fls. 374, acrescido de juros à taxa legal em vigor desde a citação ate integral pagamento

Mais decidiu condenar o arguido A... a pagar à ofendida B... a quantia de € 1 500 (mil e quinhentos euros), acrescida de juros desde o presente acórdão até integral pagamento, ao abrigo do disposto no art. 82.º-A, do CPP.


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Do acórdão interpôs recurso o Ministério Público, no sentido de que o arguido deve ser condenado também pela prática do crime de arma proibida p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1, al. d), da Lei n.º 5/2006 de 23 de Fevereiro, relativamente à detenção do bastão com 62 cm de comprimento, formulando as seguintes conclusões:

«1 - O arguido vinha acusado, além do mais, da prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. na alínea d), do n.º 1, do art. 86.º, do RJAM.

2 - Do texto da acusação consta que "o arguido tem vindo a infligir maus tratos físicos e psíquicos na pessoa da sua companheira, nomeadamente com murros, pontapés, pauladas com um bastão de madeira (moca) com 62 cm de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade e 3,3 cm de diâmetro na extremidade oposta - tendo aqui um cordão".

"No mesmo dia 24 de maio de 2014, o arguido na habitação onde residia com a sua companheira, para além do martelo e do bastão em madeira já referidos, detinha uma navalha - faca e garfo - em madeira... " e

"Agiu sempre de forma deliberada, livre e conscientemente...querendo e sabendo, ainda, que não devia adquirir, possuir ou utilizar na agressão à sua companheira, aqui vítima, o bastão em questão, cuja natureza conhecia, pois que não era titular da licença exigida pela lei, assim o detendo fora das condições legais".

3- O tribunal considerou provado que "desde essa altura (finais de 2013), maioritariamente no interior da residência conjugal, o arguido tem vindo a infligir maus tratos físicos e psíquicos na pessoa da sua companheira, nomeadamente murros e pontapés, bem como tem-na vindo a ameaçar com o uso de navalhas e ainda com um objeto de madeira com 62 cm. de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade e 3,3 cm de diâmetro na extremidade oposta - tendo aqui um cordão".

"No mesmo dia 25 de maio de 2014, o arguido, na habitação onde residia com a sua companheira, para além do martelo e do objeto em madeira já referidos, detinha uma navalha-faca e garfo, em madeira...".

"O arguido agiu sempre de forma deliberada, livre e consciente...".

4 - Por sua vez, o tribunal considerou ainda que da matéria da acusação não se provou que "o arguido detinha o objeto referido em 2. dos factos provados querendo e sabendo, ainda, que não devia adquirir ou utilizar na agressão à sua companheira aqui vítima, o bastão em questão, cuja natureza conhecia, pois que não era titular de licença exigida por lei, assim o detendo fora das condições legais".

5 - O objeto em causa nestes autos encontra-se examinado, no auto de fls. 130 e 150, do qual resulta que: "trata-se de um pau, originário de uma árvore que pelas suas características afigura-se que seja giesta negral, a qual foi arrancada pela raiz aproveitando a mesma, para lhe dar a forma mais volumosa da extremidade inferior que possui (moca) foi concebida e aperfeiçoada artesanalmente".

"O pau tem cerca de 62 cm de comprimento, com diâmetro da extremidade inferior (moca) cerca de 5,5 e 3,3 cm de diâmetro na extremidade superior (empunhadura), nesta extremidade a 5 cm da mesma, está furado, onde passa um cordel de cor preta, para o mesmo ser envolto no pulso e, assim, ter mais segurança na sua empunhadura".

"No caso em apreço, e atendendo às características do mesmo ter um comprimento adequado ao manuseamento rápido de uma só mão, a extremidade inferior (moca) bastante acentuada, afigura-se que o mesmo não tem qualquer aplicação definida, pois depreende-se que foi construído exclusivamente com o fim de ser utilizado como arma de agressão."

6 - Este objeto constitui um engenho ou instrumento construído exclusivamente com o fim de ser utilizado como arma de agressão, sendo considerado uma arma da classe A, nos termos do disposto na alínea g), do n.º 2, do art. 3.º, do RJAM.

7 - A detenção deste objeto integra a prática do crime de detenção de arma proibida, previsto no art. 86.°, n.º 1, al. d), do RJAM, integrando-se no segmento da norma que refere "quaisquer engenhos ou instrumentos construídos exclusivamente com o fim de serem utilizados como arma de agressão".

8 - Para o preenchimento do tipo legal de crime em análise, a detenção de qualquer engenho ou instrumento construído exclusivamente com o fim de ser utilizado como arma de agressão não exige o requisito da não justificação da posse.

9- O tipo legal de crime previsto no art. 86.º, n.º 1, al. d), do RJAM, apenas exige, como elemento do tipo, a não justificação da posse para a detenção de "outras armas brancas ou engenhos ou instrumentos sem aplicação definida que possam ser utilizados como arma de agressão".

10 - Ainda que se entenda que o requisito da não justificação da posse é exigido no caso em apreço, em nosso entender, não pode deixar de se considerar que, no caso concreto, a acusação contém esse elemento, na medida em que descreve que o arguido utilizou o objeto como "arma de agressão", o que constitui a não justificação (legitimadora) da detenção do instrumento.

11 - O douto acórdão recorrido, ao absolver o arguido da prática do crime de detenção de arma proibida, não interpretou corretamente o dispostos na alínea g), do n.º 2, do art. 3.º e na alínea d), do n.º 1, do art. 86.°, ambos do RJAM.

12 - Assim, o douto acórdão recorrido deverá ser parcialmente revogado e substituído por outro que condene o arguido pela prática do crime de detenção de arma proibida e proceda à reformulação da pena única resultando do cúmulo jurídico desta pena com as penas parcelares em que foi já condenado - de violência doméstica e de injúria agravada.


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Notificado o arguido afectado pela interposição do recurso, nos termos do art. 411.º, n.º 6 e para os efeitos do art. 413.º, n.º 1, do CPP, não apresentou resposta.

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Nesta instância, os autos tiveram vista da Ex. ma Senhora  Procuradora-geral Adjunta, para os feitos do art. 416.º, n.º 1, do CPP, emitindo douto parecer no sentido de que o tribunal a quo não interpretou correctamente o disposto no art. 3.º, n.º 2, al. g) e art. 86.º, n.º 1, do RJAM, ao absolver o arguido da prática do crime de detenção de arma proibida, e, acompanhando os mesmos trilhos do Ministério Público na 1.ª instância, conclui pela procedência do recurso e consequente condenação também por este crime.

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Cumprido que foi o disposto no art. 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, foram colhidos os vistos legais, pelo que cumpre decidir.

Vejamos a factualidade, com interesse para a apreciação das questões suscitadas.

Factos provados:

«1. O arguido residiu, desde finais do ano de 2013, em união de facto, com a ofendida B... , na residência desta, sita na Rua (...) -Guarda.

2. Desde essa altura, maioritariamente no interior da residência conjugal, o arguido tem vindo a infligir maus tratos físicos e psíquicos na pessoa da sua companheira, nomeadamente com murros e pontapés, bem como tem-na vindo a ameaçar com o uso de navalhas e ainda com o objecto de madeira com 62 cm de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade e 3.3 cm de diâmetro na extremidade oposta - aqui tendo um cordão.

3. Desde finais de 2013, até ao dia 24 de Maio de 2014, em várias ocasiões, quando a ofendida não pretendia manter relações sexuais, o arguido “apalpava-a” com muita força na zona genital e nos seios, o que lhe causou fortes dores, tendo o arguido por hábito masturbar-se para cima da mesma, tudo sem consentimento e contra a vontade da vítima.

4. Durante todo esse período de tempo, o arguido tem vindo a arremessar beatas de cigarro acesas para cima da vítima, queimando-a.

5. Durante esse mesmo período de tempo, a vítima acordava frequentes vezes molhada porque o arguido lhe urinava para cima, com o intuito de humilhá-la.

6. Frequentemente, o arguido dirigiu à vítima expressões como “és uma puta…vaca…andas a dar-lhe a cona”.

7. Nesse período de tempo, o arguido, em diversas ocasiões, fazendo uso de um martelo de orelhas com o cabo em madeira envernizada, a fim de atormentar a vítima, partiu diverso recheio da residência comum do casal.

8. A vítima B... nunca denunciou tais factos às autoridades policiais competentes, com receio de que o arguido concretizasse as ameaças de morte que, frequentemente, lhe dirigia.

9. No dia 19 de Fevereiro de 2014, elementos da PSP deslocaram-se à residência onde viviam o arguido e a ofendida.

10. No entanto, porque o arguido havia ameaçado a ofendida com uma navalha, de que lhe cortaria o pescoço caso contasse alguma coisa, a ofendida nessa altura por temer que o arguido pudesse concretizar o mal que anunciou, nada contou à PSP.

11. Nesse dia, depois da Polícia se ter ido embora, o arguido agrediu a ofendida B... com bofetadas e pontapés por todo o corpo.

12. No dia 21 de Maio de 2014, no interior da residência do casal, o arguido, na sequência dos habituais actos de agressões físicas e verbais, desferiu um golpe no braço esquerdo da ofendida, com uma navalha de marca “Sovi Cisac”, com 5,7 cm de lâmina e comprimento total de 14 cm.

13. No dia 24 de Maio de 2014, pelas 19 horas e 10 minutos, na via pública, junto do estabelecimento de restauração e bebidas “Padaria Pastelaria (...) ” sito na Rua (...) , nesta cidade, após uma discussão entre a vítima B... e o arguido, este ameaçou matá-la, tendo-a, de seguida, agredido à bofetada, o que originou a sua queda ao solo e aí o arguido pontapeou-a em várias partes do corpo, ao mesmo tempo que lhe dizia “eu mato-te”.

14.A ofendida conseguiu levantar-se e tentou fugir para um café sito nas proximidades.

15. Chegados os agentes da PSP ao local, o arguido, logo se dirigiu para a vítima, dizendo-lhe “chamaste a bófia, que linda merda” e, dirigindo-se ao agente da PSP presente no local, F... , devidamente fardado, no exercício das suas funções e por causa delas, disse-lhe por várias vezes: “olha um garoto”, tendo chegado a dirigir-se de novo para junto da vítima, a fim de a agredir, não o tendo conseguido por ter sido agarrado por este agente da autoridade.

16. Então, o arguido, dirigindo-se de novo, ao mesmo agente da autoridade, disse-lhe: “mas que grande palhaço, puta que te partiu, daqui para fora, quem manda na minha mulher sou eu, garoto, se estivesses sozinho, as coisas não ficavam assim, garoto”, altura em que foi, através da força física dos agentes da autoridade, manietado, tendo-se, ainda, dirigido à vítima B... , no seguintes termos “depois falamos, estás fodida”.

17. Nesse momento, o arguido foi detido, sendo que, sujeito a uma revista, foi-lhe apreendida uma navalha de marca “Sovi Cisac” com 5,7 cm de lâmina e comprimento total de 14 cm, a mesma que o arguido havia usado para desferir um golpe na vítima no dia 21 de maio de 2014.

18. No mesmo dia 25 de Maio de 2014, o arguido, na habitação onde residia com a sua companheira, para além do martelo e do objecto em madeira já referidos, detinha uma navalha-faca e garfo- em madeira, com uma lâmina de 5 cm das extremidades e um garfo de 5 cm na outra extremidade, com a qual costumava ameaçar a vítima.

19. Como consequência directa e necessária da conduta do arguido, sofreu a ofendida B... , as lesões sofridas a fls. 20 e 21, bem como fenómenos dolorosos generalizados, especialmente no braço direito, região lombar, região pública e pé direito, zona ruborizadas nos antebraços, abdómen e traumatismo a nível de todas as partes, cicatriz com 8 cm de comprimento no antebraço esquerdo, equimose arroxeada com 5 cm por 8 cm no membro superior direito, que determinaram 4 dias para a cura, com 2 dias de afectação da capacidade de trabalho geral e profissional.     

20. Os episódios descritos são o culminar de uma série de episódios semelhantes, que vinham correndo, até ao dia 24 de Maio de 2014, em grau crescente de frequência e de intensidade.

21.O arguido agiu sempre de forma livre deliberada e consciente, atentando contra a saúde física e psíquica da sua ex-companheira e contra a dignidade da mesma enquanto mulher, de forma reiterada, no interior da residência conjugal - o que faz aumentar o sentimento de insegurança da vítima e o sentimento de impunidade do arguido, bem sabendo ser a sua conduta que assumiu proibida e punível por lei penal.

 22.Agiu sempre o arguido de forma deliberada, livre e conscientemente, querendo e sabendo que infligia, de forma reiterada, à ofendida B... , sua companheira, maus tratos físicos e psíquicos, abusos sexuais, bofetadas e pontapés atingindo-a na sua integridade física e psíquica, assim lhe provocando dores e mau estar físico e psíquico, tudo acontecendo no interior da residência comum.

23. Querendo e sabendo que dirigindo-se à ofendida sua mulher daquela foram, a atingia na sua honra e consideração

24. Querendo e sabendo que anunciava à mesma a prática de um mal qualificado na lei como crime contra a vida e que, dessa forma, lhe provocava medo e inquietação de que ele viesse efectivamente a realizar o mal anunciado, prejudicando-a na sua liberdade e determinação.

25. Querendo e sabendo, ainda, que da forma supra descrita, atingia a honra e consideração do agente da PSP desta cidade, F... , no exercício das suas funções e por causa delas e, não obstante, não se inibiu de proferir as referidas expressões nas circunstâncias supra descritas.

26. Sabendo que as suas descritas condutas eram proibidas e punidas por lei.

27. O arguido é oriundo de uma família de modesta condição sócio-económica, composta pelos pais e cinco irmãos, crescendo num ambiente familiar pouco harmonioso devido aos problemas de álcool do seu progenitor.

28. Completou o 9.º ano de escolaridade, posteriormente emigrou e regressou ao país com cerca de 20 anos, passando a trabalhar no Hospital (...) , mas rescindiu o contrato no início do corrente ano tendo recebido uma indemnização de cerca de € 17 000,00.

 29. Com 19 anos casou-se com C... de quem teve dois filhos, tendo a separação ocorrido há cerca de sete anos, não tendo contacto com os filhos há cerca de um ano e meio.

30. Posteriormente encetou uma união de facto com D... , tendo ocorrido a separação em 2009.

31. Em 2011, encetou nova relação com E... , tendo a separação ocorrido em Abril de 2013.

32. Em finais do ano de 2013 encetou nova união de facto com a queixosa nestes autos.

33. O arguido tinha problemas de alcoolismo, associados a alterações de comportamento, que sempre desvalorizou, dado que sempre assumiu que não intervinha no seu dia-a-dia.

34. Fez dois tratamentos ao alcoolismo em regime de internamento, no Hospital (...) e um em ambulatório, mas todos eles sem sucesso.

35. Também frequentou o Programa de Prevenção de Violência Doméstica no Gabinete de Apoio à Vitima de Violência Doméstica.

 36. Teve anteriores contactos com o sistema de Justiça, sempre pela prática de crimes de violência doméstica.

37. Aquando dos factos em causa neste processo vivia com a vítima em casa arrendada com razoáveis condições habitacionais, com situação económica precária, estando ambos desempregados e a subsistir do valor da indemnização.

38. Os familiares, nomeadamente a sua progenitora, mostra-se esgotada com o percurso de vida do arguido, que não reconhecia os seus problemas de alcoolismo.

39. Desde a entrada no EP, tem mantido um adequado comportamento, mas desocupado.

40. O arguido assumiu sempre uma atitude desculpabilizante, não se mostrando capaz de analisar criticamente o desvalor da sua acção, com ausência de sentimentos de culpa, sem qualquer projecto estruturado.

41. O seu apoio familiar resume-se, no essencial, à sua mãe, que é uma pessoa frágil, e sem condições para se constituir como elemento de controlo ou facilitador da sua reinserção social.

42. O arguido sofreu as seguintes condenações:

- por sentença de 13/03/2013, transitada em 17/04/2013 e factos praticados em Agosto de 2011, no processo comum singular n.º 461/12.5TAGRD do 1.º juízo do Tribunal Judicial da Guarda, foi condenado pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. no artigo 152.º, n.º 1, a), do CP, na pena de 3 anos e 2 meses de prisão, suspensa por igual período de tempo, com regime de prova, com incidência pela problemática alcoólica a executado pela DGRS.

- por sentença de 05/11/2013, transitada em 05/12/2013 e factos praticados em  05/12/2011 no processo comum singular n.º 516/12.6 SAGRD do 1.º juízo do Tribunal Judicial da Guarda, foi condenado pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. no artigo 152.º n.º1 a) do CP na pena de 4 anos de prisão, suspensa por igual período de tempo, com regime de prova, com plano de reinserção social a executar pela DGRS, tendo como objectivo real e decisivo o tratamento do arguido à sua dependência alcoólica.

43. Na sequência dos factos praticados pelo arguido a LS da Guarda prestou cuidados de saúde a B... , que ascenderam à quantia de € 85,91».


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Factos não provados:

«1. O arguido nas circunstâncias referidas em 2. dos factos provados, deu pauladas à ofendida com um bastão de madeira (moca) com 62 cm de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade de 3.3 cm de diâmetro. 

2. Com frequência diária, o arguido tem vindo a abusar sexualmente da sua companheira, consumando o acto sexual de forma não consentida pela vítima.

3. No dia 19 de Fevereiro de 2014, depois de ter sido agredida com bofetadas e pontapés por todo o corpo, a ofendida accionou o número de emergência 112, a fim de denunciar os maus tratos que, por acção do arguido, vinha sofrendo.

  4. Nas circunstâncias referidas em 12. dos factos provados, o arguido esfaqueou a sua companheira.

 5. O arguido detinha o objecto identificado em 2. dos factos provados querendo e sabendo, ainda, que não devia adquirir, possuir ou utilizar na agressão à sua companheira aqui vítima, o bastão em questão, cuja natureza conhecia, pois não era titular de licença exigida por lei, assim a detendo fora das condições legais.

Convicção do tribunal (apenas quanto ao crime de arma proibida):

«Reportando-nos, pois, ao caso dos autos, e desde logo no que respeita à prova já junta aos autos, valorou o Tribunal:

- autos de apreensão de fls. 12 e 13, relativos à apreensão da navalha de cor preta com 14 cm de comprimento, martelo de orelhas com cabo em madeira envernizada; navalha tipo faca e garfo com uma lâmina e 5 cm de comprimento e o objecto em madeira envernizada com cerca de 62,5 cm.  

- auto de exame e avaliação de fls. 14-17, relativo aos objectos supra referidos.

- relatório fotográfico de fls. 20-23,  mostrando-se fotografadas as lesões da ofendida, evidenciando-se um golpe de navalha, o que como foi confirmado por aquela em audiência de julgamento.

- auto de exame directo de fls. 127-130, relativo às navalhas, martelo e  objecto em madeira apreendido nos autos.

(…)

- Auto de exame à navalha, martelo, navalha com garfo e pau com moca na extremidade, constante de fls. 147-150.

(…)

Referiu que alguns dias depois aprenderam os objectos, que se recorda serem duas navalhas, um martelo e uma moca, que a ofendida disse que serviam para agredir e para partir os móveis.

(…)

Explicou que, em relação aos outros objectos apreendidos, foram entregues na polícia pela ofendida, tendo logo referido que serviram para a agredir e para partir os móveis lá em casa.  

Finalmente (no que respeita à prova da acusação), foi inquirida a ofendida B... …

(…)

O ser depoimento foi, como não poderia deixar de ser nestas situações, essencial e, diríamos mesmo, decisivo, e a única prova no que respeita à maior parte dos factos que ao arguido vinham imputados.

Todavia, tal não impediu, pelo contrário, que os mesmos fossem dados como provados, atenta a forma sentida (é certo), mas ao mesmo tempo, totalmente credível, sincero, objectivo e rigoroso.

Foi evidente que, não obstante a mágoa sentida, natural, em virtude de tudo o que o arguido lhe fez, em nenhum momento o seu objectivo foi prejudicar o arguido, ou exagerar o modo como correram os factos, mas antes relatá-los de um modo tão isento, tão lógico e credível, que o Tribunal não teve quaisquer dúvidas em dar como provados os factos, tal e qual a ofendida os relatou.

(…)

Referiu que foram cerca de 6 meses de uma enorme violência física, mas, sobretudo, psíquica, ameaçando-a com navalhas e facas de cozinha, tendo mesmo chegado a esconder as facas, acrescentado que ele tinha umas navalhas pequenas com que a ameaçava e chegou mesmo a agredi-la com uma navalha num braço, tendo-lhe também batido e tentado agredir com uma moca que estava em casa, mas ela ainda conseguiu fugir.

(…)

Tendo-lhe sido perguntado, esclareceu que o objecto de madeira  também chegou a ser usado para a ameaçar, mas normalmente era para partir  várias coisas em, casa, como mesas e cadeira televisões,  bem com utilizava também o martelo».


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O Direito

As conclusões formuladas pelo recorrente delimitam o âmbito do recurso.

São apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar, conforme Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335 e Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, as quais deve conhecer e decidir sempre que os autos reúnam os elementos necessários para tal.

Questão a decidir:

Apreciar se um objecto de madeira com 62 cm de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade e 3, 3 cm de diâmetro na extremidade oposta, esta furada por onde entra um cordel atado com um nó, cuja argola assim formada, suficiente para entrar a mão, serve de empunhadura, pode ser considerado arma proibida, enquadrável na previsão de crime dos art. 3.º, n.º 2, al. g) e 86.º, n.º 1, al. d), da Lei n.º 5/2006, de 23/2, pelo qual deve ser condenado.

Apreciar se houve erro notório na apreciação da prova quanto à caracterização do instrumento e apreciação dos elementos constitutivos do crime de detenção de arma proibida.

 

Apreciando:

Para além dos crimes de violência doméstica e injúria agravada pelos quais foi condenado, vinha o arguido acusado também por um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1, al. d), da Lei nº 5/2006 de 23 de Fevereiro (relativamente a um objecto classificado na acusação como “bastão” com 62 cm de comprimento), do qual foi absolvido.

É deste segmento absolutório do acórdão que o Ministério Público interpõe recurso.

A questão é simples, isso é, saber se “o objecto de madeira com 62 cm de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade e 3.3 cm de diâmetro na extremidade oposta - aqui tendo um cordão” cabe no conceito de arma proibida, com o enquadramento legal constante da acusação.

Diremos que a questão é simples, mas é preciso algumas cautelas e rigor na caracterização e definição das características do objecto em análise.

Estamos perante uma das questões mais debatidas na jurisprudência relativamente ao crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1, al. d), da Lei n.º 5/2006 de 23 de Fevereiro, uma vez que não se tratando de arma especificadamente tipificada na lei, tem o tribunal de apurar as características e elementos definidores, para se poder concluir que estamos perante uma arma enquadrável naquele preceito legal.

A acusação classifica o objecto em causa nos autos como “bastão”.

Para utilizar a linguagem que melhor define a situação e mais se aproxima dos objectos deste tipo vulgarmente utilizados como objectos de agressão nós diríamos que se trata de uma “moca”.

Ora, não é pela classificação do objecto que é ou deixa de ser classificada como arma.

São as características específicas do objecto, sem aplicação definida, sem que o arguido justifique a sua posse e a sua potencialidade para ser utilizado como arma de agressão, independentemente do arguido o destinar a esse fim, que nos ajudam a apurar os elementos tipificadores do crime de detenção de arma perigosa.

No caso dos autos parece-nos que estamos perante um objecto com aplicação definida, pois as suas características, pelo contrário, apontam que tem uma aplicação definida: a sua utilização como objecto ou arma de agressão.

Mas expliquemos o nosso entendimento.  

O crime de detenção de arma proibida é um crime de perigo comum e de perigo abstracto, isto é, as condutas descritas por este tipo legal não lesam de forma directa e imediata, qualquer bem jurídico, apenas implicam a probabilidade de um dano contra um objecto indeterminado.

É neste sentido que o Prof. Figueiredo Dias, in Sumários 1975, p. 146, considera que os crimes de perigo abstracto são todos aqueles em que o perigo não constitui ele próprio elemento do tipo mas “motivo da proibição”

 O bem jurídico que aqui se pretende proteger é a segurança da comunidade face aos riscos da livre circulação e detenção de determinado tipo de armas ou, mesmo que sejam permitidas, sem que as mesmas se encontrem registadas e manifestadas e sem que pessoas que as têm na sua posse tenham a respectiva licença de uso e porte de arma.

No que tange ao elemento subjectivo do tipo, é necessário o dolo do agente em relação a todos os elementos do tipo objectivo do ilícito.

O dolo é genérico, consistindo na consciência e vontade de deter armas ilegalmente.

Então vejamos qual a proibição.

A Lei 5/2006, de 23/2, que estabelece o regime jurídico das armas e munições (RJAM), começa por referir, no art. 1.º, n.º 1, o objecto e âmbito de aplicação alargados a variadíssimas situações.

Designadamente quanto ao que importa considerar relativamente ao instrumento que nos cabe enquadrar ou não na classificação de arma proibia, a lei estabelece também o regime jurídico relativo à sua detenção, uso e porte, bem como o enquadramento legal das operações especiais de prevenção criminal, uma vez feita a classificação como arma.

Por sua vez o art. 2.º procede às definições legais dos diferentes tipos de armas e de vários conceitos correlacionados com as mesmas para efeitos do disposto na naquela lei e sua regulamentação e com vista a uma uniformização conceptual (tipos de armas, partes das armas de fogo, munições das armas de fogo e seus componentes, funcionamento das armas de fogo e outras).

Depois o art. 3.º procede à classificação das armas, munições e outros acessórios, de acordo com o grau de perigosidade, o fim a que se destinam e a sua utilização.

Vejamos os elementos constantes dos autos para classificarmos o objecto e vermos se é susceptível de se enquadrar na previsão do crime de detenção de arma proibida.

O Ministério Público acusa o por detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1, al. d), da Lei n.º 5/2006 de 23/2 (relativamente a bastão com 62 cm de comprimento).

Consta da acusação:

«- O arguido tem vindo a infligir maus tratos físicos e psíquicos na pessoa da sua companheira, nomeadamente com murros, pontapés, pauladas com um bastão de madeira (moca) com 62 cm de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade e 3,3 cm de diâmetro na extremidade oposta - tendo aqui um cordão.

- No mesmo dia 24 de maio de 2014, o arguido na habitação onde residia com a sua companheira, para além do martelo e do bastão em madeira já referidos, detinha uma navalha - faca e garfo - em madeira ... ".

- Agiu sempre de forma deliberada, livre e conscientemente...querendo e sabendo, ainda, que não devia adquirir, possuir ou utilizar na agressão à sua companheira, aqui vítima, o bastão em questão, cuja natureza conhecia, pois que não era titular da licença exigida pela lei, assim o detendo fora das condições legais».

Vejamos o que a lei diz expressamente a este respeito:

«Artigo 86.º
1. Quem, sem se encontrar autorizado, …detiver, … guardar, … usar ou trouxer consigo:

(…)

d)instrumentos sem aplicação definida que possam ser usados como arma de agressão e o seu portador não justifique a sua posse, bastão, … quaisquer engenhos ou instrumentos construídos exclusivamente com o fim de serem utilizados como arma de agressão, …é punido com pena de prisão até 4 anos ou com pena de multa até 480 dias».

Obviamente que a acusação continha todos os elementos descritivos do tipo legal de crime.

O que não se confunde com a prova que se fez dos factos imputados ao arguido.

Porém, o tribunal colectivo relativamente ao crime de detenção de arma proibida (instrumento definido na acusação como bastão) considerou a seguinte factualidade:

Factos provados:

«(…)

2. Desde essa altura, maioritariamente no interior da residência conjugal, o arguido tem vindo a infligir maus tratos físicos e psíquicos na pessoa da sua companheira, nomeadamente com murros e pontapés, bem como tem-na vindo a ameaçar com o uso de navalhas e ainda com o objecto de madeira com 62 cm de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade e 3.3 cm de diâmetro na extremidade oposta - aqui tendo um cordão.

(…)

18. No mesmo dia 25 de Maio de 2014, o arguido, na habitação onde residia com a sua companheira, para além do martelo e do objecto em madeira já referidos, detinha uma navalha-faca e garfo- em madeira, com uma lâmina de 5 cm das extremidades e um garfo de 5 cm na outra extremidade, com a qual costumava ameaçar a vítima.

Factos não provados:

1. O arguido nas circunstâncias referidas em 2. dos factos provados, deu pauladas à ofendida com um bastão de madeira (moca) com 62 cm de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade de 3.3 cm de diâmetro.

(…)

5. O arguido detinha o objecto identificado em 2. dos factos provados querendo e sabendo, ainda, que não devia adquirir, possuir ou utilizar na agressão à sua companheira aqui vítima, o bastão em questão, cuja natureza conhecia, pois não era titular de licença exigida por lei, assim a detendo fora das condições legais».

Ora, o tribunal a quo caracterizou o objecto no facto 2, que o arguido detinha na sua posse.

Mesmo face à descrição que ali faz do instrumento, ainda que deficiente, como aliás consta da acusação, podia e devia caracterizá-lo melhor na sua descrição face aos elementos probatórios abundantes nos autos, para os quais se reme te a acusação e o próprio acórdão na convicção do tribunal, sem que disso estivesse impedido, devendo ter concluído que não só se trata de instrumento sem aplicação definida que podia ser usado como arma de agressão, com o qual chegou a ameaçar a vítima (ponto 2 dos factos provados) e o seu portador não justifique a sua posse, como ainda se trata de instrumentos construídos exclusivamente com o fim de serem utilizados como arma de agressão.

É o que resulta dos elementos probatórios.

Se não vejamos.

Independentemente do tribunal a quo não perfilhar da classificação dada ao objecto na acusação como “bastão”, provadas as características objectivas do instrumento, não podia ter concluído que apenas resultou provado que se trata de um objecto em madeira com 62 cm de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade e 3.3 cm de diâmetro na extremidade oposta - aqui tendo um cordão.

Na acusação deduzida pelo Ministério Público, considerou-se ser o objecto em causa enquadrável no conceito de bastão (embora também se lhe refira como “moca”), entendendo-se, consequentemente, mencionado na alínea d) do n.º 1 do art. 86 da Lei 5/2006 de 23-2, e, como tal, como arma proibida.

 Aquele preceito não pode ficar preso à tipicidade dos instrumentos, cujas característica estão legalmente definidas, para daí concluir se estamos perante arma proibida.

A lei começa por definir os tipos de arma e classificação, em função das suas características, funcionamento e perigosidade (art. 2.º e 3.º) e depois reserva a classificação a determinados instrumentos não previamente tipificados como armas propriamente ditas, deixando ao tribunal a descrição do instrumento e que em função das características pode ser classificado como arma proibida.

Sustenta o tribunal a quo que dos factos imputados ao arguido na acusação não é feita referência, da não justificação da posse, apenas se referindo que servia para agredir a ofendida (o que não resultou provado), apenas se tendo provado que servia, para além dos outros objectos também apreendidos, para a ameaçar.

Depois justifica-se ainda no acórdão recorrido que em nenhum momento da acusação se refere que se tratava de um objecto sem aplicação definida ou que a posse não tivesse sido justificada. 

Conclui depois que existe a mera alegação, em termos conclusivos que o arguido detinha o instrumento para agressão à ofendida (o que não se provou) e que não era titular da licença exigida por lei, assim o detendo fora das condições legais.

Este foi o entendimento do tribunal colectivo de que esta alegação não é suficiente para que se possa entender que o objecto em causa se subsume à previsão do art. 86.º, n.º 1, al. d), da 5/2006.

Vejamos primeiro as características do instrumento, face aos elementos probatórios considerados pelo acórdão, para o tribunal formar a sua convicção:

- autos de apreensão de fls. 12 e 13, relativos à apreensão da navalha de cor preta com 14 cm de comprimento, martelo de orelhas com cabo em madeira envernizada; navalha tipo faca e garfo com uma lâmina e 5 cm de comprimento e o objecto em madeira envernizada com cerca de 62,5 cm.  

- auto de exame e avaliação de fls. 14-17, relativo aos objectos supra referidos.

- relatório fotográfico de fls. 20-23,  mostrando-se fotografadas as lesões da ofendida, evidenciando-se um golpe de navalha, o que como foi confirmado por aquela em audiência de julgamento.

- auto de exame directo de fls. 127-130, relativo às navalhas, martelo e  objecto em madeira apreendido nos autos.

(…)

- Auto de exame à navalha, martelo, navalha com garfo e pau com moca na extremidade, constante de fls. 147-150.

(…)

Referiu que alguns dias depois aprenderam os objectos, que se recorda serem duas navalhas, um martelo e uma moca, que a ofendida disse que serviam para agredir e para partir os móveis.

(…)

Explicou que, em relação aos outros objectos apreendidos, foram entregues na polícia pela ofendida, tendo logo referido que serviram para a agredir e para partir os móveis lá em casa.  

Finalmente (no que respeita à prova da acusação),foi inquirida a ofendida B...

(…)

O ser depoimento foi, como não poderia deixar de ser nestas situações, essencial e, diríamos mesmo, decisivo, e a única prova no que respeita à maior parte dos factos que ao arguido vinham imputados.

Todavia, tal não impediu, pelo contrário, que os mesmos fossem dados como provados, atenta a forma sentida (é certo), mas ao mesmo tempo, totalmente credível, sincero, objectivo e rigoroso.

Foi evidente que, não obstante a mágoa sentida, natural, em virtude de tudo o que o arguido lhe fez, em nenhum momento o seu objectivo foi prejudicar o arguido, ou exagerar o modo como correram os factos, mas antes relatá-los de um modo tão isento, tão lógico e credível, que o Tribunal não teve quaisquer dúvidas em dar como provados os factos, tal e qual a ofendida os relatou.

(…)

Referiu que foram cerca de 6 meses de uma enorme violência física, mas, sobretudo, psíquica, ameaçando-a com navalhas e facas de cozinha, tendo mesmo chegado a esconder as facas, acrescentado que ele tinha umas navalhas pequenas com que a ameaçava e chegou mesmo a agredi-la com uma navalha num braço, tendo-lhe também batido e tentado agredir com uma moca que estava em casa, mas ela ainda conseguiu fugir.

(…)

Tendo-lhe sido perguntado, esclareceu que o objecto de madeira também chegou a ser usado para a ameaçar, mas normalmente era para partir várias coisas em, casa, como mesas e cadeira televisões, bem com utilizava também o martelo».

Dos elementos probatórios tidos em conta para a convicção do tribunal relativamente ao instrumento susceptível de ser considerado como arma proibida:

1. Auto de apreensão de fls. 13:

«Instrumento ou engenho sem aplicação definida. Bastão em madeira envernizado com cerca de 62,5 cm, com aplicação em cordão numa extremidade».

2. Auto de exame e avaliação de fls. 17:

«01 Designação – Bastão artesanal.

02 Tipo – Bastão.

04 Modelo – Tipo “moca”.

08 Dimensão – cabo: total 62,5 cm.

09 Designação geral: Trata-se de um instrumento contundente, sendo o corpo totalmente em madeira, com uma das extremidades furada (com braço) e outra mais grossa».

3. Relatório fotográfico de fls. 20-23:

Fotografia n.º 4 e 7 – Das quais consta o instrumento apelidado de “bastão” em madeira artesanal envernizada e com comprimento total de 62 cm.

4. Auto de exame directo de fls. 130, realizado pelo Núcleo de Armas e Explosivos da PSP:

Material recebido para exame: «1 pau com moca na extremidade».

Foto 1 - «Vista da extremidade inferior – moca».

Foto 2 - «Vista da extremidade superior – empunhadura».

Do relatório relativamente às “características/enquadramento legal”, consta ao seguinte:

«- Trata-se de um pau, originário de uma árvore que pelas suas características afigura-se que seja (giesta negral), a qual foi arrancado pela raiz aproveitando a mesma, para lhe dar a forma mais volumosa da extremidade inferior que possui (moca), foi concebida e aperfeiçoada artesanalmente;

- O pau tem cerca de 62 cm de comprimento, com diâmetro da extremidade inferior (moca), cerca de 5,5 cm (foto 1) e 3,3 cm de diâmetro da extremidade superior (empunhadura), nesta extremidade a 5 cm da mesma, está furado onde passa um cordel de cor preta (foto 2) para o mesmo ser envolto no pulso, e assim ter mais segurança na sua empunhadura;

- No caso em apreço, e atendendo às características do mesmo ter um cumprimento adequado ao manuseamento rápido de uma só mão, e a extremidade inferior (moca) bastante acentuada, afigura-se que o mesmo não tem qualquer aplicação definida, pois depreende-se que foi construído exclusivamente com o fim de ser utilizado como arma de agressão;

- E assim sendo o mesmo é classificado na classe A, conforme alínea g), n.º 2, art. 3.º, da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro, com as alterações da Lei n.º 17/2009 de 6 de Maio e da lei n.º 12/2011 de 27 de Abril.

(…)».     

5. Auto de exame directo de fls. 150, realizado pelo Núcleo de Armas e Explosivos da PSP:

Reproduz o exame directo de fls. 130.

*

A acusação limitou-se a referir na acusação que o arguido “…tem vindo a infligir maus tratos físicos e psíquicos na pessoa da sua companheira, nomeadamente com murros e pontapés, bem como tem-na vindo a ameaçar com o uso de navalhas e ainda com o objecto de madeira com 62 cm de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade e 3.3 cm de diâmetro na extremidade oposta -aqui tendo um cordão”.

Esta a caracterização que faz do instrumento em discussão nos autos e ainda assim cremos que suficiente para se enquadrar na previsão de arma proibida.

Pois, como resulta dos elementos probatórios caracterizadores daquele objecto ou instrumento, aos quais faz referência a acusação, o aperfeiçoamento da sua descrição não implicava qualquer alteração substancial dos factos.

E se por ventura, houvesse alteração, que não cremos, seria não substancial, sem relevo para a decisão da causa, pelo que o tribunal nem estaria, por isso obrigado a dar cumprimento ao art. 358.º, do CPP.

A descrição e características do objecto embora não com o mesmo rigor da acusação já constavam dos elementos probatórios constantes da acusação, a que atrás acabámos de fazer referência e aos quais o tribunal colectivo deu acolhimento sem reservas, conforme consta da convicção e que não podemos ignorar.

Assim como se depreende daqueles elementos probatórios referidos no acórdão estamos perante um instrumento com as seguintes características:

«Instrumento de madeira, com cerca de 62 cm de comprimento, concebido e aperfeiçoado artesanalmente, originário de uma árvore arrancado pela raiz, aproveitando esta para dar forma mais volumosa à extremidade inferior, com diâmetro de cerca de 5,5 cm (moca) e com 3,3 cm de diâmetro na extremidade superior (empunhadura), a qual apresenta um furo onde passa um cordel atado pro um nó, suficiente para entrar a mão e para o mesmo ser envolto no pulso, e assim ter mais segurança na sua empunhadura».

No caso em apreço, o objecto em causa foi propositadamente concebido para servir como instrumento ou arma de agressão.

Não serve para outro fim que não este como arma de agressão.

A parte inferior com que se atinge a vítima termina em moca.

A parte superior com que é manejado por uma das mãos, tem um furo por onde passa um cordel atado com um nó, de modo a poder envolver o punho.

O cumprimento é adequado ao manuseamento rápido com uma só mão.

São características que concorrem para dar mais segurança, agilidade e eficácia ao utilizador e potenciar a gravidade das agressões.

Não podemos dizer que o referido instrumento não tem aplicação definida.

Está definida e outra não tem que não seja a utilização como arma de agressão.

Aliás, constava da acusação que o arguido, utilizava, entre outros objectos, como seja navalha, o referido instrumento para infligir agressões à ofendida.

O tribunal não deu como provado que tal acontecesse.

Mas mesmo assim está patente o fim com que foi concebido e o fim a que o arguido o destinava, pois como consta do ponto 2 dos factos provados:

«…o arguido tem vindo a infligir maus tratos físicos e psíquicos na pessoa da sua companheira, nomeadamente com murros e pontapés, bem como tem-na vindo a ameaçar com o uso de navalhas e ainda com o objecto de madeira com 62 cm de comprimento por 5,5 cm de diâmetro numa extremidade e 3.3 cm de diâmetro na extremidade oposta - aqui tendo um cordão».

Embora tal não seja decisivo, mas ajuda-nos a compreender o fim para que foi concebido o instrumento.

E nestes termos não estamos perante instrumento sem aplicação definida que possa ser usado como arma de agressão e o seu portador não justifique a sua posse, para tipificarmos a conduta como rime.

Basta estarmos perante engenho ou instrumento construído exclusivamente com o fim de serem utilizados como arma de agressão.

Nos termos do art. 3.º, n.º 1, da Lei 5/2006, de 23/2, as armas e as munições são classificadas nas classes A, B, B1, C, D, E, F e G), de acordo com o grau de perigosidade, o fim a que se destinam e a sua utilização.

Segundo o n.º 2, al. g) são armas da classe A:

«Quaisquer engenhos ou instrumentos construídos exclusivamente com o fim de serem utilizados como arma de agressão».

O referido instrumento foi construído exclusivamente com o propósito de ser utilizado como arma de agressão e esse uso lhe foi dado, com ela intimando a vítima, ao ameaçar agredi-la com ela.

A posse do referido objecto ou instrumento visa a utilização como arma de agressão, não sendo necessários que a tenha usado.

A própria acusação nos elementos objectivos da definição do crime classificou a arma como instrumento concebido exclusivamente para ser utilizado como arma de agressão, embora a tenha classificado como “bastão”.

Depois os elementos subjectivos constantes da acusação, embora sem muito rigor, mas suficientemente explícitos, apontam no mesmo sentido, quando refere que o arguido detinha o objecto querendo e sabendo, ainda, que não devia adquirir, possuir ou utilizar na agressão à sua companheira, o bastão em questão, cuja natureza conhecia, pois não era titular de licença exigida por lei, assim a detendo fora das condições legais (facto 5 dado como não provado pelo tribunal colectivo).

A posse nestas circunstâncias constitui por si o dito crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1, al. d), da Lei n.º 5/2006 de 23/2.

Salvo o devido respeito, não partilhamos o entendimento do tribunal a quo de que o objecto aqui em causa não se subsume, sequer, ao conceito de arma, para efeitos da citada previsão legal.

O acórdão recorrido, ao absolver o arguido da prática do crime de detenção de arma proibida, não interpretou correctamente o disposto nos art. 3.º, n.º 2, al. g) e art. 86.°, n.º 1, al. d), do n.º 1, do art. 86.°, daquele diploma legal.

Tinha elementos nos autos suficientes para dar como provado as características do instrumento com mais rigor e concluir que fora concebido exclusivamente para servir como arma de agressão, sendo para esse fim que o destinava, embora apenas tivesse com o mesmo ameaçado a vítima.

Por outro lado, agiu voluntária, livre e conscientemente, bem sabendo que tinha e queria ter na posse o instrumento com aqueles características, sem para tal estar autorizado, e, não obstante, não só o detinha como até fez uso do mesmo para “ameaçar” e intimidar a companheira, contribuindo assim para a perpretação do crime de violência doméstica e para a criação do ambiente de inferno em que a vítima vivia, rodeada de instrumentos com que a agrediu, designadamente golpeando-a com navalhas.

Ao não definir o tribunal a quo devidamente o instrumento em questão, e classifica-lo como instrumento concebido exclusivamente para ser usado como arma de agressão, face aos elementos probatórios a que faz referência na motivação e ao não dar como provados os factos relacionados com os elementos subjectivos do crime interpretou de forma incorrecta a prova.

Nesta conformidade padece o acórdão recorrido de vício de erro notório na apreciação da prova, nos termos do art. 410.º, n.º 2, al. c), do CPP.

De acordo com o disposto no art. 127.º, do CPP, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador.

A apreciação da prova pelo julgador embora sendo livre, a discricionariedade na apreciação pelo julgador tem como limite as regras da experiência comum, utilizando como método de avaliação e aquisição do conhecimento critérios objectivos, genericamente susceptíveis de motivação e de controlo.

Há erro notório na apreciação da prova quando se dão factos como provados que, face às regras da experiência comum e a lógica normal da vida, não se poderiam ter verificado ou são contraditados por documentos que fazem prova plena e que não tenham sido arguidos de falsidade: trata-se de um vício de raciocínio na apreciação das provas, evidenciada pela simples leitura do texto da decisão, erro tão evidente que salta aos olhos do leitor médio, pois as provas revelam um sentido e a decisão recorrida extrai ilação contrária, incluindo quanto à matéria de facto provada.

Os contornos da figura jurídica do vício de erro notório na apreciação da prova que apontamos no caso dos autos, não escapa à observação do homem de formação média, mas que se deve extrair, como extraímos, da observação do texto da decisão recorrida (factos provados, factos não provados e respectiva motivação da convicção do tribunal, sem esquecer os elementos probatórios documentais e prova pericial, para os quais remete o acórdão).
Ora, sendo o vício de erro notório na apreciação da prova, constante do art. 410.º, n.º 2, al. a), do CPP, de conhecimento oficioso, entendemos não haver razões para o reenvio dos autos, antes se impondo o suprimento nesta instância, por estarem reunidos os elementos necessários para decidir da causa, conforme aconselha o disposto no art. 426.º, n.º 1, do mesmo diploma legal.
Nesta conformidade devem ser alteradas a redacção do ponto 2 da matéria de facto dado como provado, quanto à definição das características do instrumento, nos termos atrás mencionados, e serem dados como provados os elementos subjectivos do crime de detenção de arma proibida, considerados não provados no facto 5, dos factos não provados. 

Assim, fixada definitivamente a matéria de facto, em consequência da alteração constituiu-se o arguido como autor da prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos art. 3.º, n.º 2, al. g) e art. 86.°, n.º 1, al. d), do n.º 1, do art. 86.°, da Lei n.º 5/2006 de 23 de Fevereiro, cuja moldura penal abstracta é pena de prisão até 4 anos ou com pena de multa até 480 dias.

Importa agora determinar a escolha e medida da pena.

A aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração social do agente; em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa (art. 40.º, n.º 1 e 2 do CP).

A defesa da ordem jurídico-penal, tal como é interiorizada pela consciência colectiva (prevenção geral positiva ou de integração) é a finalidade primeira que se prossegue, no quadro da moldura penal abstracta, entre o mínimo, em concreto, imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada e o máximo que a culpa do agente consente; entre esses limites, satisfazem-se quanto possível, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização.

Ou seja, devendo ter um sentido eminentemente pedagógico e ressocializador, as penas são aplicadas com a finalidade primordial de restabelecer a confiança colectiva na validade da norma violada, abalada pela prática do crime e em última análise, na eficácia do próprio sistema jurídico-penal. - Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As consequências Jurídicas do Crime, pág. 55 e seguintes e Ac. STJ 29.4.98 CJ, T. II, pág. 194.

Ora, como consta do facto 42 dado como provado o arguido sofreu duas condenações, por sentenças de 13/03/2013 e 05/11/2013, por factos praticados em Agosto de 2011 e em 05/12/2011, respectivamente nas penas de 3 anos e 2 meses de prisão e 4 anos de prisão, ambas suspensas na sua execução mediante regime de prova, em ambos os casos com incidência no tratamento do arguido à sua dependência alcoólica.

Não obstante o fim pedagógico que se teve vista suspendendo as penas anteriores impondo obrigações ao arguido, de forma a interiorizar a necessidade de se abster do consumo de bebidas alcoólicas, circunstância que contribui para a agressividade revelada, como adianta ofendida, tal não surtiu os efeitos pretendidos.
Fundamentou sobejamente o tribunal a quo a opção pela escolha da pena de prisão, por necessidades de prevenção geral serem consideravelmente elevadas em relação aos dois crimes, por que foi condenado, não se justificando pena diferente relativamente ao crime de detenção de arma proibida.
Concluímos deste modo que a aplicação de pena de multa, não realiza de forma adequada e suficiente as necessidades de prevenção geral e especial positivas, pelo que se impõe que também optemos pela aplicação de uma pena de prisão, de acordo com as disposições dos art. 70.º e 40.º, n.º 1, do CP.

Na determinação da medida da pena, nos termos do art. 71.º, n.º 1 e 2, do Cód. Penal, deve atender-se a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo legal de crime, deponham a favor ou contra o arguido, tendo em conta a culpa do agente e as exigências de prevenção.

Atendendo a factualidade dada como prova no acórdão condenatório é elevada a culpa do arguido e de acentuada gravidade a sua conduta inserida num contexto de elevada agressividade.

Razões de prevenção geral e especial são prementes na aplicação da pena concreta a aplicar.

Importa realçar que relativamente à sua inserção social e profissional o arguido, vem revelando problemas com o consumo excessivo de álcool, apesar de não reconhecer os seus problemas de alcoolismo.

A sua atitude desculpabilizante, ao não assumir uma atitude crítica não contribui para um mudar de rumo.

Feita a opção pela pena de prisão, em face das considerações acima expostas, considerando a moldura penal abstracta (prisão até 4 anos), mostra-se justa e adequada a pena de 9 (nove) meses de prisão, pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos art. 3.º, n.º 2, al. g) e art. 86.°, n.º 1, al. d), do n.º 1, do art. 86.°, da Lei n.º 5/2006 de 23/2.

O arguido havia sido condenado:

. Pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º, n.ºs 1 e 2 do CP, na pena de 3 (três) anos de prisão.

. Pela prática de um crime de injúria agravada, p. e p. pelo art. 181.º, n.º 1 e 184.º, por referência ao art. 132.º, n.º 2, al. l), todos do CP, na pena de 2 (dois) meses e 15 (quinze) dias de prisão.

. Em cúmulo jurídico foi condenado o arguido na pena única de 3 (três) anos e 1 (um) mês de prisão.

Importa agora reformular o cúmulo jurídico, nele incluindo a pena em que acaba de ser condenado.
Tendo em conta as penas parcelares aplicadas para cada um dos crimes, importa aferir agora a aplicação da pena unitária, conforme dispõe o art. 77.º, nº 1 do CP.
Nos termos do art. 77.º, n.º 2 do CP, a pena única aplicável em cúmulo jurídico tem como limite mínimo a pena mais elevada concretamente aplicada (3 (três) anos de prisão) e limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas (3 anos, 11 meses e 15 dias de prisão).

A pena concreta do concurso, deve tomar em consideração, em conjunto, os factos e a personalidade do agente já sobejamente debatidos no acórdão condenatório que aqui reproduzimos relativamente à aplicação do cúmulo jurídico que agora reformulamos, para inclusão da nova pena parcelar em que o arguido acaba de ser condenado (art. 77.º, n.º 1 do CP.

Assim, nos termos dos art. 77.º, n.º 1 e 2 e 71.º, n.º 1 e 2, al. a), b), c), d), e) e f), do CP mostra-se justa e adequada e adequada a pena única de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão.

*

Decisão:

Pelos fundamentos expostos, decidem os juízes da Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra:

a) Julgar verificado o vício de erro notório na apreciação da prova, constante do art. 410.º, n.º 2, al. a), do CPP, o qual se supre oficiosamente, alterando a matéria de facto nos seguintes termos:

1. O facto 2, provado, passa a ter a seguinte redacção:

«Desde essa altura, maioritariamente no interior da residência conjugal, o arguido tem vindo a infligir maus tratos físicos e psíquicos na pessoa da sua companheira, nomeadamente com murros e pontapés, bem como tem-na vindo a ameaçar com o uso de navalhas e ainda com o objecto de madeira, com cerca de 62 cm de comprimento, concebido e aperfeiçoado artesanalmente, originário de uma árvore arrancado pela raiz, aproveitando esta para dar forma mais volumosa à extremidade inferior, com diâmetro de cerca de 5,5 cm (moca) e com 3,3 cm de diâmetro na extremidade superior (empunhadura), a qual apresenta um furo onde passa um cordel atado pro um nó, suficiente para entrar a mão e para o mesmo ser envolto no pulso, e assim ter mais segurança na sua empunhadura».


*

2. O facto 5 não provado, passa a ser dado como provado, com a seguinte redacção:

«O arguido detinha o objecto identificado em 2. querendo e sabendo, ainda, que não devia adquirir, possuir ou utilizar ameaçando com ele agredir a sua companheira aqui vítima, o instrumento em questão, construído para ser usado exclusivamente como objecto de agressão, cuja natureza conhecia, pois não era titular de licença exigida por lei, assim a detendo fora das condições legais».


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b) Julgar procedente o recurso interposto pelo Ministério Público, e, em consequência se revoga o acórdão do tribunal colectivo na parte em que absolveu o arguido A... , da prática de um crime de detenção de arma proibida, o qual se substitui nesta parte pela condenação do arguido, pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos art. 3.º, n.º 2, al. g) e 86.°, n.º 1, al. d), da Lei 5/2006 de 23 de Fevereiro, na pena de 9 (nove) meses de prisão.

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c) Reformulando o cúmulo jurídico englobando nele a pena de 9 (nove) meses de prisão, agora aplicada, pelo crime de detenção de arma proibida, com a pena de 3 (três) anos de prisão, pelo crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º, n.ºs 1 e 2 do CP e com a pena de 2 (dois) meses e 15 (quinze) dias de prisão, pelo crime de injúria agravada, p. e p. pelo art. 181.º, n.º 1 e 184.º, condena-se o arguido A... , na pena única de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão.

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Sem custas

NB: Certifica-se que o acórdão foi elaborado pelo relator e revisto pelos seus signatários, nos termos do art. 94.º, n.º 2 do CPP. 

Coimbra, 15 de Abril de 2015



(Inácio Monteiro - relator)


(Alice Santos - adjunta)