Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | PAULO VALÉRIO | ||
Descritores: | ESCUSA JUIZ | ||
Data do Acordão: | 05/29/2013 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | JUÍZO DE INSTÂNCIA CRIMINAL DE ALBERGARIA-A-VELHA (COMARCA DO BAIXO VOUGA) | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | PEDIDO DE ESCUSA | ||
Decisão: | RECUSADA A ESCUSA DE JUIZ | ||
Legislação Nacional: | ARTIGO 43.º, N.ºS 1, 2 E 3, DO CPP | ||
Sumário: | O facto de o juiz ser “primo direito” da advogada dos arguidos, com a qual mantém uma relação de grande proximidade, confiança e afectividade, não constitui fundamento para a concessão de escusa de intervenção em processo que lhe foi distribuído. | ||
Decisão Texto Integral: | Em conferência na 2.ª secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra:
A Sra. juiz de direito do Juízo de Instância Criminal de Albergaria-a-Velha, Comarca do Baixo Vouga, vem requerer a sua dispensa de intervir em causa pendente (Processo Comum Singular, com o n.° 336/12.8GAALB) que corre os seus termos naquele tribunal:
2- Foram juntas aos autos cópias do processo em causa.
3- Colhidos os vistos legais, teve lugar a conferência.
4- O requerimento de escusa tem o seguinte teor, no essencial: O art 43.º do Cod Proc Penal determina «1. A intervenção de um juiz no processo pode ser recusada quando correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade; «2. Pode constituir fundamento de recusa, nos termos do n.º 1 a intervenção do juiz noutro processo ou em fases anteriores do mesmo processo fora dos casos do art. 40.º ( ... ); «4. O juiz não pode declarar-se voluntariamente suspeito, mas pode pedir ao tribunal competente que o escuse de intervir quando se verificarem as condições dos n.º 1 e 2.» O citado normativo , ao dispor sobre recusa e escusa do juiz, estabelece um regime que tem como primeira finalidade prevenir e excluir as situações em que possa ser colocada em dúvida a imparcialidade do juiz, importando fazer aqui a abordagem da questão suscitada na sua dimensão objectiva, porque é nessa perspectiva que se situa o requerimento de escusa, dir-se-á que nesta dimensão sobressai, afinal, aquilo que se poderá dizer ser o campo das aparências, que ganha expressão no adágio "justice must not only be done; it must also be seen to be done", ou seja, a consideração de factos ou situações que, de um ponto de vista do destinatário da decisão e do público em geral, possam fazer suscitar dúvidas, provocando o receio, objectivamente justificado, quanto ao risco da existência de algum pré-juízo ou preconceito da parte do julgador que possa ser negativamente considerado contra o tal destinatário. De outro modo: o pedido de escusa do juiz para intervir em determinado processo pressupõe que a tal intervenção possa correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo sério e grave adequado a gerar dúvidas sobre a sua imparcialidade, ou quando tenha tido intervenção anterior no processo fora dos casos do artigo 40º do Cód. Proc. Penal (art 43.º-1, 2 e 4). Dado um caso concreto, «a gravidade e a seriedade do motivo hão-de revelar-se, assim, por modo prospectivo e externo, e de tal sorte que um interessado - ou, mais rigorosamente, um homem médio colocado na posição do destinatário da decisão - possa razoavelmente pensar que a massa crítica das posições relativas do magistrado e da conformação concreta da situação, vistas pelo lado do processo (intervenções anteriores), ou pelo lado dos sujeitos (relação de proximidade, quer de estreita confiança com interessados na decisão), seja de molde a suscitar dúvidas ou apreensões quanto à existência de algum prejuízo ou preconceito do juiz sobre a matéria da causa ou sobre a posição do destinatário da decisão » ( Ac STJ, de 13-4-2005, proc. 05P1138, www.dgsi.pt ; no mesmo sentido os Acs do STJ de 19/05/2005 e de 6/10/2005, http://www.dgsi.pt ) . No presente caso, o facto de a mandatária ser prima e íntima da Sra. magistrada não é impedimento a que esta deva saber manter a sua neutralidade, como não tem necessariamente de suscitar, nas pessoas directamente envolvidas ou no público em geral, suspeitas em relação à sua isenção. Salvo relações pessoais ou familiares muito próximas, o que não é o caso ( não falando de outras situações de conflito ou de interesse do julgador ), deve ter-se como natural que o juiz possa ter uma relação de amizade ou familiar com um mandatário forense ou qualquer profissional do foro e que se possa salvaguardar o essencial das funções de cada um e a independência do julgamento. Ou seja, no que tange à suspeita sobre a imparcialidade do juiz, os motivos invocados têm de ser de molde a considerar-se que a intervenção do ou dos juízes corra o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade. No caso concreto dos autos, a procederem os fundamentos invocados pela ilustre requerente, bem podíamos ver a requerente afastada de todos os processos em que intervém a familiar em causa, com os inconvenientes que isso pode trazer par o funcionamento do tribunal em causa. - Decisão: Pelos fundamentos expostos : Não se defere ao pedido de escusa. - - - (Paulo Valério - Relator)
(Frederico Cebola) |