Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | LUÍS CRAVO | ||
Descritores: | REDUÇÃO DA CLÁUSULA PENAL EXCESSIVA ONEROSIDADE CUMPRIMENTO PARCIAL DA OBRIGAÇÃO | ||
Data do Acordão: | 06/04/2024 | ||
Votação: | MAIORIA COM * VOT VENC | ||
Tribunal Recurso: | JUÍZO LOCAL CÍVEL DA FIGUEIRA DA FOZ | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA EM PARTE, COM VOTO DE VENCIDO | ||
Legislação Nacional: | ARTIGO 812.º, 1 E 2, DO CÓDIGO CIVIL | ||
Sumário: | I – A “excessiva onerosidade” que permite a redução da cláusula penal no quadro do art. 812º, nº1 do C.Civil não é de conhecimento oficioso, tendo de ser expressamente articulada e provada pelo devedor que pretenda essa redução, nomeadamente demonstrando que a outra parte não sofreu qualquer prejuízo. II – Mas havendo cumprimento parcial da obrigação (cf. nº2 do mesmo normativo), pode e deve recorrer-se a um critério de proporcionalidade para determinar se e em que medida deve o montante da cláusula penal ser reduzido, porque esta cláusula é, por via de regra, estabelecida em vista de um incumprimento integral. | ||
Decisão Texto Integral: | Apelações em processo comum e especial (2013)
* Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 – RELATÓRIO AA e marido BB, residentes na Rua ... A, lugar..., ... ..., instauraram ação com processo comum contra a sociedade “A..., LDA. ”, com sede na Rua ..., ... B..., pessoa coletiva n.º ...09, com sede na Rua ..., ... ..., formulando o seguinte pedido: «A) Condenada a ré a pagar aos autores a quantia de 28.644,06 €, pelos prejuízos sofridos e penalidades acordadas com o incumprimento do acordo complementar à escritura de compra e venda celebrada no dia 18 de agosto de 2020 no Cartório Notarial a cargo da Dra. CC, que constitui o doc. nº 3 da petição inicial. B) Condenada a ré a entregar aos autores e colocar no local o cilindro de 300 litros que foi atribuído a todos os apartamentos; a colocar a segunda janela Velux e a mudar o painel solar para um local de exposição solar, fora do alcance da sombra da chaminé e colocando o segundo painel em falta; C) Condenada a ré a proceder à reparação da abertura em baixo do local da instalação do cilindro e à devida reparação do chão no local de onde fez a primeira colocação do cilindro, no interior do quarto do casal, eliminando os cheiros desagradáveis e o mofo; tudo com as legais consequências.» Para tanto alegaram, em síntese, que compraram à Ré um apartamento e celebraram um acordo complementar em que fixaram os trabalhos por realizar, sendo que nesse acordo estipularam o prazo de 60 dias para a realização desses trabalhos e uma penalidade de 50 euros por cada dia de atraso até à conclusão de todos os trabalhos, sucedendo que a Ré não fez todos os trabalhos no prazo inicial nem nos sucessivos que foram sendo concedidos pelos AA., pelo que estes remeteram carta a fixar um último prazo até ao dia 14 de Abril de 2022, sob pena de considerarem definitivamente incumprida a obrigação. Como a Ré não realizou um dos trabalhos, os AA. solicitaram orçamento para a sua realização por terceiro, acrescendo que o imóvel apresenta defeitos que a Ré se recusa a eliminar. * Contestando, a Ré defendeu-se por impugnação e por exceção, invocando factualidade com vista a afastar a sua responsabilidade pelos atrasos imputados e desconformidades invocadas. Os AA. responderam à matéria de exceção nos termos constantes da Ref. 20.04.2023. * Foi elaborado despacho saneador e proferido o despacho a que alude o art. 596º do n.C.P.Civil. Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, com observância do formalismo legal, como se alcança da respectiva Ata, com discussão nela da prova documental e testemunhal apresentada pelas partes. Veio, na sequência, a ser proferida sentença, na qual após identificação em “Relatório”, das partes e do litígio, se alinharam os factos provados e não provados, relativamente aos quais se apresentou a correspondente “Motivação”, após o que se considerou, em suma, que da factualidade provada resulta que na data que foi acordada [“18 de Novembro de 2021”], os trabalhos não estavam concluídos, mas na medida em que «(…) fizeram uma reunião em 08 de Novembro de 2021, na qual fixaram os trabalhos que se encontravam por concluir e estabeleceram novo prazo de 90 dias, ou seja, até dia 06 de Fevereiro de 2022, alterando assim o acordo que haviam fixado (…)»], é este “novo acordo” que deve ser considerado, sendo que face ao incumprimento temporal que ainda assim se verificou, «(…) a ré incorreu em mora de dia 7 a dia 23 de Fevereiro, pelo que se constituiu na obrigação de efetuar o pagamento da quantia de 800 € a título de cláusula penal estipulada pelas partes (16 dias x 50 €)»; que quanto à indemnização no valor de € 1.494,06 [correspondente ao valor de aquisição de uma nova porta-sacada oscilo-batente], houve acordo posterior extintivo dessa obrigação da ré; e que se verifica a existência de uma única desconformidade relativamente ao contrato de compra e venda [a instalação de uma janela Velux quando o projeto de arquitetura aprovado previa duas], mas nessa parte importava concluir que na data do contrato de compra e venda os autores já a conheciam ou não podiam ignorar a falta dessa dita janela Velux, pelo que, à luz do disposto no art. 2º, nº3 do DL nº 67/2003 de 08 Abril, não é de responsabilizar o vendedor por esse defeito. Nestes termos, o seguinte concreto “Dispositivo”: «V) DECISÃO Pelo exposto, decido julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência, decido: - Condenar a ré a pagar aos autores a quantia de 800,00 € (oitocentos euros) a título de penalidade acordada na cláusula terceira do “acordo complementar”; - Absolver a ré do demais peticionado. Custas da acção a cargo de ambas as partes na proporção do decaimento que se fixa em 80% para os autores e 20 % para a ré (art. 527º do Código de Processo Civil). Registe e notifique.» * Inconformados, apresentaram os AA. recurso de apelação contra a mesma, cuja alegação finalizaram com as seguintes conclusões: «1. Encontram-se incorretamente julgados os factos provados em U ), V) e CC) na sua conjugação dos factos não provados em ponto 1, considerando a sentença na sua decisão (inserida no item IV) que as partes em 8 de Novembro de 2021 celebraram um novo acordo que haviam fixado em 18 de agosto de 2020 e assim absolvendo a recorrida do pagamento do valor da cláusula penal estabelecida neste dia 16 de agosto, apenas vindo a considerar a mora entre o dia 7 a 23 de fevereiro de 2022.. 2. Resulta dos factos provados em H) que recorrentes e recorrida consignaram na Clausula Segunda que os referidos trabalhos deverão ser realizados pela Primeira Outorgante (a recorrida) a suas expensas e no prazo máximo de 60 dias. 3. Dos factos não provados no ponto 1, o Tribunal a quo entendeu que não se provou que os trabalhos seriam executados até ao prazo máximo de 60 dias, que terminava no dia 18 de outubro de 2020. 4. Sucede que o Tribunal a quo, com notório erro de apreciação da prova e de julgamento, atenta a prova objetiva que é constituída pelo Acordo firmado e aceite pelas partes na data de 18 de agosto de 2020 jogou os 90 dias para 18 de novembro de 2021, ou seja, para passados 15 meses, e não 3 meses. 5.E resulta claro que este erro inquinou a decisão que veio a ser proferida. 6.Isto porque decidiu o Tribunal a quo que “as partes, ao abrigo da sua liberdade contratual, fizeram uma reunião em 8 de novembro de 2021, na qual fixaram os trabalhos que se encontravam por concluir e estabeleceram novo prazo de 90 dias, ou seja, até dia 6 de fevereiro de 2022, alterando assim o acordo que haviam fixado (é que, se as partes visassem tão só concretizar os trabalhos em falta e manter o prazo inicial, não haveria necessidade de fixar novo prazo). Verifica-se, contudo, que no final desse novo prazo, os trabalhos não estavam ainda todos concluídos (cf. pontos DD) a HH)) e que, apenas, no dia 23 de fevereiro de 2022 foram efetuados, com exceção da substituição da caixilharia da porta de sacada/janela do quarto do meio, que apresenta mazelas (cf. pontos MM) e NN)). 7. Sucede que no dia 8 de novembro de 2021 o prazo que fora inicialmente fixado há quase um ano que tinha ultrapassado a data de 18-11-2020; e não estava como o Tribunal entendeu ainda por completar. 8. Resulta assim, atenta a prova objetiva do documento outorgado pelas partes, e que ambas reconheceram como tendo sido celebrado e assinado, que deve ser aditado aos factos dados como provados , no contexto da decisão , que “as partes acordaram que os trabalhos seriam executados até ao dia 18 de novembro de 2020”. 9. Por sua vez, não se verificou a existência de outro acordo a 8-11-2021 , a derrogar o anterior, do que resulta um erro na apreciação das provas , pois o que houve foi o reconhecimento dos trabalhos que ainda se encontravam por fazer. 10.Resulta dos factos provados em K) que a 15 de setembro de 2021 os recorrentes enviaram à recorrida uma carta registada, recebida no dia seguinte, que constitui o documento nº 4 da petição inicial, e discriminados nas alíneas N) e O) dos factos provados. 11. Mais resulta da alínea R) que a 6 do mês de outubro de 2021 a recorrida enviou uma carta aos recorrentes, por intermédio da sua mandatária, onde invocava que o Acordo foi assinado e cumprido. 12. Foi consignado nos factos provados - alínea T) – que no que respeita aos trabalhos em falta dos pontos 4, 6, 10 e 11 lhe havia sido confirmado que estavam finalizados pelo empreiteiro, pelo que solicitava se agendasse uma vistoria ao local na presença do Eng. responsável pela obra. 13. E – alínea U) – para verificar de que lado estava a razão, atentas as versões antagónicas dos autores e da informação transmitida pela ré à sua ilustre mandatária, foi agendada uma reunião para o dia 8 de novembro seguinte. 14 Nessa reunião (alínea V) dos factos provados) a recorrida, na pessoa do seu legal representante, reconheceu a reclamação dos autores, e foi estabelecido o Acordo de reconhecimento dos trabalhos do que de facto ainda estava por fazer. 15 Esse Acordo de reconhecimento dos trabalhos ocorreu na reunião que teve lugar no dia 8 de novembro de 2021 - alínea W). 16. Resultou desta reunião que, ao invés do que a recorrida invocou na carta que constitui o doc. nº 7 da petição inicial, os trabalhos não estavam finalizados pelo empreiteiro, e o Acordo não estava cumprido. 17. Por esse motivo foi acordado que a recorrida iria proceder aos trabalhos reclamados e não feitos, e que constam das alíneas X), N), Z), AA). 18. Como resulta da alínea CC) dos factos provados o prazo estabelecido para a realização foi de 90 dias. 19. Correspondeu este a um prazo para o cumprimento e cessação da mora que se verificava desde 18 de novembro de 2020, e não a um novo prazo estabelecido antes de cessar a mora, que o Tribunal a quo estabeleceu em 18 de novembro de 2021. 20. Não existe nos autos qualquer prova objetiva da invocação de impossibilidade de incumprimento. 21.No dia 18 de novembro de 2020 a recorrida teria de ter TIDO JÁ desencadeado os trabalhos no sentido de dar por terminados os trabalhos que assumiu fazer no apartamento dos recorrentes, e o que não fez, caindo na mora e na penalização que acordou. 22. As partes, quando se deslocaram ao apartamento para ver qual delas tinha razão, não estabeleceram uma nova obrigação, pois a obrigação manteve-se na íntegra, e assumindo a recorrida que a ia concluir (estava em curso desde 18-08-2020) no prazo de 90 dias. 23 Não foi assim foi contraída pela recorrida uma nova obrigação em substituição da antiga, o que está consignado no artigo 857º do Código Civil. 24. Não era possível no dia 8 de novembro de 2021 manter o prazo inicial, como o Tribunal decidiu (por erro), e em que acaba por considerar que o novo prazo elimina a mora, por ainda não se estar a verificar. 25. No caso dos autos a obrigação que estava em mora de cumprimento não se extingue pelo Acordo de reconhecimento dos trabalhos do que de facto ainda estava por fazer (alínea W) dos factos provados). 26. Não houve lugar a qualquer alteração do objeto da prestação, que se manteve, e não ocorreu qualquer mudança da causa de incumprimento, apenas e tão só se tendo designado nova data para cessar de uma vez por todas o incumprimento que se vinha verificando desde 18-11-2020. 27. Resulta, assim, que desde 18 de novembro de 2020 a 8 de novembro de 2021 a recorrida incorre na penalização que foi acordada e estabelecida na cláusula terceira do Acordo (alínea I) dos factos provados). 28. No caso concreto estamos perante uma cláusula penal moratória, e não cláusula penal compulsória, como entendido na sentença em apreciação e que visasse compelir a cumprir até ao dia 18 de novembro de 2021. 29. O valor acordado da cláusula penal moratória foi de 50,00 € por cada dia de incumprimento, valor que nenhuma das partes deixou de aceitar. 30. Sucede que é ao penalizado que confere o ónus de provar que a cláusula penal é manifestamente excessiva – cf. Acórdão da Relação de Évora de 26-9-1995: BMJ, 449º-459. 31. Resulta deste modo que ao dar por provados os factos das alíneas L); V; e com a consideração do facto que tem de ser aditado, que as partes acordaram que os trabalhos seriam executados até ao dia 18 de novembro de 2020, deve de igual modo ser aditado e dado como provado que “no acordo que foi outorgado em 18 de novembro de 2021 não estava o prazo de cumprimento da obrigação ainda em curso, e não houve lugar a qualquer alteração do objeto da prestação, que se manteve igual ao acordado a 18 de agosto de 2020. Ao decidir como decidiu houve errada interpretação do direito, com a violação dos artigos 406; 762; e 857 do Código Civil. 32. Neste contexto, o valor da cláusula penal a arbitrar aos recorrentes entre o dia 18 de novembro de 2020 e 8 de novembro de 2021, no total de 355 dias, é de 17.750,00 euros Acresce que, 33. Foi decidido pelo Tribunal a quo que no dia 6 de fevereiro de 2022 os trabalhos ainda não estavam todos concluídos e que apenas a 23 de fevereiro de 2022 foram efetuados, com exceção da substituição da caixilharia da porta-sacada/janela do quarto do meio, que apresenta mazelas. Mais considerou que provou a ré que acordou com os autores que a caixilharia existente se manteria, face ao risco de ficar pior com a substituição, e que tal acordo extinguiu a obrigação da ré substituir a caixilharia do quarto, pelo que é de concluir que o dia 23 de fevereiro de 2022 se encontravam finalizados todos os trabalhos que estava a ré obrigada a efetuar, tendo assim incorrido a ré em mora de 7 a 23 de fevereiro. E, nesse contexto, condenou a ré a pagar aos autores a quantia de 800,00 e a título de penalidade acordada na cláusula terceira do Acordo Complementar. 34. Existe desde logo aqui, em continuação do supra exposto a enorme contradição e erro de julgamento do Tribunal a quo, pois se considera um novo acordo, e ele apenas estipula um prazo de 90 dias, não poderia aplicar a penalidade acordada na cláusula terceira do Acordo Complementar. 35. Ao considerar a referida cláusula terceira como válida e em vigor, reconhece de igual modo o documento em que mesma foi consignada, pelo que teria de considerar todos os dias de mora estabelecidos na mesma, dado que não foi constituída uma nova obrigação, como acima assinalado. 36. Neste contexto, o valor da cláusula penal a arbitrar aos recorrentes entre o dia 9 de novembro de 2021 e 8 de novembro de 2021, no total de 91 dias, é de 4.550,00 euros 37. Encontram-se incorretamente julgados os factos provados em TT), existindo meios probatórios constantes do processo e dos testemunhos que impunham decisão diversa da recorrida. 38. Toda a factualidade descrita consta dos documentos nº 9, 10, 12 e 15 da p.i ; de que não houve qualquer impugnação, e sendo assim uma prova objetiva. 39. E, por não se encontrar concluído o serviço da janela, solicitaram um orçamento para a sua substituição. 40. E mais foi considerado em MM) dos factos provados que a ré não realizou mais trabalhos e não foi lavrado Auto de receção dos trabalhos assinado por ambas as partes, tal como estipulado na cláusula quarta do Acordo de 18 de agosto de 2020. 41. Na motivação foi considerado que: “O acordo descrito no ponto TT) resulta dos depoimentos das testemunhas DD e EE. 42. Resulta do depoimento do EE que o mesmo não assistiu a qualquer diálogo do acordo que tenha existido entre o DD e os recorrentes, pelo que a questão essencial não pode ser apreciada no contexto do seu depoimento, que é o de ouvir dizer. 43. Relativamente ao depoimento do DD, temos que o mesmo invoca que se deslocou a casa dos autores apenas para retificar, pois não lhe tinham dito que era para substituir, o que correspondia à violação do que fora acordado no Acordo de 8 de novembro de 2021, e assim ao seu incumprimento. 44. A 7 de fevereiro de 2022, na carta que constitui o documento nº 10 da petição inicial, os recorrentes invocaram que no que respeitava ao trocar da caixilharia da janela do segundo quarto, com a devida substituição, nada fora feito. 45. Assim, e colocado a 15 seguinte a invocação pela recorrida de que iriam fazer o retoque na pintura no perfil de alumínio, conforme o acordo com o técnico dos alumínios que esteve na casa em janeiro, não é uma situação aceite pelos recorrentes, bem expressa na carta de 7 desse mês de fevereiro, em que reclamaram a substituição acordada. 46. As relações entre autores e ré apenas por estas partes podiam ser estabelecidas e alteradas, e na carta de fevereiro são bem claros os autores quando se expressam de que exigem a substituição. 47. A testemunha DD invocou que se deslocou ao local, ao serviço da firma C..., Lda., que chegou a acordo com os recorrentes para que ficasse assim sem reparação, “ que não valia a pena então mexer, aquilo então passava assim “ e que referiu ao Sr. FF que lhe disse que estava tudo bem, e quanto ao auto de receção invocou que não fazia a menor ideia do que isso é. 48. Mas o que é contrariado pelos recorrentes na sua carta de 7-4-2022, e resulta contrariado pela peritagem, que verificou as duas mazelas de igual modo. 49. A testemunha fala que celebrou um acordo, ao qual o encarregado da ré, EE, diz que não assistiu, mas tendo lá estado a acompanhar, no testemunho do DD, o que deixa todas as dúvidas sobre a veracidade das afirmações. 50. No confronto dos testemunhos do DD e EE, com o doc. nº 15 da p.i. resulta evidente que não houve , em momento algum, qualquer acordo entre os autores e a ré quanto à questão da substituição da caixilharia da janela do quarto, e que tenham acordado que estava tratado, pois ao trocarem poderia ficar pior, sendo a testemunha DD funcionário de outra firma, e tendo-se deslocado ao serviço da mesma. 51. Pelo que, essas duas provas existentes nos autos impunham decisão diversa da recorrida, e resulta que o facto provado em TT) devendo ser proferida decisão a considerar como não provado esse facto. 52. E considerado provado que até ao dia 14 de abril de 2022 (doc. nº 15 da p.i.) não foi cumprido pela ré o acordado no dia 8 de novembro de 2021 no que respeita ao item final do Acordo, ou seja: A ré não procedeu à substituição ou reparação do perfil de alumínio na janela do quarto do meio, com uma peça interior lacada a branco e exterior lacada a cor cinzento, por terem ambas uma mazela cada uma. 53. A corroborar esta prova temos o relatório pericial de 24 de julho de 2023, junto nos autos. 54. E, neste contexto, não pode deixar de se decidir que a mora do incumprimento apenas cessou a 14 de abril, data que os recorrentes invocaram na carta do dia 7 como a que que consideravam da cessação da mora, e penalidade que foi estabelecida contratualmente; e deste modo, o valor da cláusula penal a arbitrar aos recorrentes entre o dia 23 de fevereiro a 14 de abril de 2022, no total de 50 dias, é de 2.550,00 euros 55. E, no contexto dos factos provados em OO), ser proferida decisão a condenar a recorrida a pagar o valor para a colocação de uma nova porta-sacada oscilobatente, cujo valor de aquisição ascende a um preço não inferior a 1.494,06 €. 56. Encontram-se incorretamente julgados os factos provados em RR) , existindo meios probatórios constantes do processo que impunham decisão diversa da recorrida. 57. Dos factos não provados resulta que não se provou (ponto 7) que os autores preferiram e optaram pela colocação de um túnel de luz (em vez de uma janela “velux”). 58. No relatório pericial foi consignado que no projeto de arquitetura aprovado e licenciado pela Câmara Municipal ... a 18/07/2020, o espaço relativo ao Duplex, encontram-se previstas duas janelas “Velux” na cobertura para o sótão da fração “K” (o projeto prevê 2 janelas de dimensões semelhantes colocadas paralelas uma à outra). 59. Verifica-se, assim, que tendo os recorrentes adquirido a fração de acordo com os projetos existentes, e constando do projeto de arquitetura que estavam previstas duas janelas velux na cobertura, se está perante uma situação de uma obra contendo um vício material e que afeta a substância do contrato. 60. Deste modo, existindo uma obra que se apresenta na veste de obra ilegal, pelo desrespeito do projeto de arquitetura, aprovado e licenciado pela Câmara Municipal ... a 18/07/2020, estamos na presença de uma situação que carece de respeito a essa legalização, e que só é possível com a colocação da janela que os recorrentes reclamam, não se estando aqui numa situação de defeitos, atento o incumprimento ininterrupto do referido projecto. 61. A ilicitude da conduta da recorrida pela violação das regras urbanísticas, ao desrespeitar o Projeto de Arquitetura, viola os interesses dos recorrentes, causando dano ao verem-se privados da inexistência de uma janela Velux na fração que adquiriram, a qual foi substituída por um simples túnel de luz, e fixo. 62. A ilicitude da conduta viola o direito de propriedade dos recorrentes, estabelecido no artigo 1305 do CC, e o disposto no artigo 58º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas 63. No contexto dos factos provados em RR), deve ser proferida decisão a condenar a recorrida a colocar a segunda janela Velux, de acordo com o projeto de arquitetura, aprovado e licenciado pela Câmara Municipal ... a 18/07/2020, e por violação do artigo 1305 do Código Civil e artigo 58º do Decreto-lei nº 38382/51. Termos em que deve ser revogada a sentença proferida nos termos acima peticionados, dando-se provimento ao presente recurso, assim se fazendo BOA JUSTIÇA! » * Não foram apresentadas quaisquer contra-alegações a este recurso. * Colhidos os vistos e nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir. * 2 – QUESTÕES A DECIDIR, tendo em conta o objecto do recurso delimitado pelos Recorrentes nas conclusões das suas alegações (arts. 635º, nº4 e 639º, ambos do n.C.P.Civil), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608º, nº2, “in fine” do mesmo n.C.P.Civil), face ao que é possível detectar o seguinte: - incorreto julgamento da matéria de facto, pois que, «(…) deve ser aditado aos factos dados como provados, no contexto da decisão , que “as partes acordaram que os trabalhos seriam executados até ao dia 18 de novembro de 2020”»; que «(…) deve de igual modo ser aditado e dado como provado que “no acordo que foi outorgado em 18 de novembro de 2021 não estava o prazo de cumprimento da obrigação ainda em curso, e não houve lugar a qualquer alteração do objeto da prestação, que se manteve igual ao acordado a 18 de agosto de 2020”»; que o facto “provado” em TT) deve ser considerado como “não provado”; - incorreto julgamento da matéria de direito [a começar pelo aspeto do montante devido a título de cláusula penal [porque se julgam com direito a € 17.750,00 (pelo total de 355 dias de mora iniciais) + € 2.550,00 (por mais 50 dias de mora); acresce que devia ter sido proferida condenação da Ré/recorrida a pagar o valor para a colocação de uma nova porta-sacada oscilo-batente (€ 1.496,06); que também devia ter sido proferida condenação da Ré/recorrida a colocar a segunda janela Velux (de acordo com o projeto de arquitetura aprovado e licenciado)]. * 3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO 3.1 – Como ponto de partida, e tendo em vista o conhecimento dos factos, cumpre começar desde logo por enunciar o elenco factual que foi considerado/fixado como “provado” pelo tribunal a quo, ao que se seguirá o elenco dos factos que o mesmo tribunal considerou/decidiu que “não se provou”, sem olvidar que tal enunciação poderá ter um carácter “provisório”, na medida em que um dos recursos tem em vista a alteração parcial dessa factualidade. Tendo presente esta circunstância, são os seguintes os factos que se consideraram provados no tribunal a quo: «A) Os autores são os legítimos e exclusivos donos e proprietários de uma fração autónoma (apartamento) localizado no nº ... da Rua .... B) Foi o mesmo adquirido por Escritura Pública de Compra e Venda de 18 de agosto de 2020, que consta de fls. 109 a 111 do livro de notas para Escrituras Diversas nº ...19-A do Cartório Notarial da Lic. GG, sito na .... C) Sendo composto pela fração autónoma “K” – terceiro andar A, destinado a habitação, implantado do lado nascente do prédio, e sótão em duplex destinado a arrumos, com a área de 68 metros quadrados, e garagem na cave, lado norte, a quarta a contar do nascente, com a área de 27 metros quadrados. D) Foi parte vendedora deste imóvel, a favor dos autores, a sociedade ré. E) No mesmo dia 18 de agosto de 2020, foi celebrado um contrato designado por acordo complementar entre os autores e a ré, que constitui o documento nº 3, e que aqui se dá por integralmente reproduzido. F) Constituíram pressupostos da outorga desse acordo complementar os seguintes itens: a) Considerando que é do interesse de ambas as partes formalizar de imediato o contrato de compra e venda referente à fração K correspondente ao terceiro andar A do prédio em regime de propriedade horizontal sito na Rua ... em ... na .... b) Considerando que ainda se encontram por realizar diversos trabalhos cuja responsabilidade de execução é exclusivamente da promitente vendedora. c) Que o preço de aquisição do imóvel foi totalmente pago nesta data e na pressuposição que os trabalhos em falta serão executados pelo vendedor sem qualquer encargo adicional para os compradores. G) No contexto das cláusulas do acordo celebrado foi estabelecido na CLÁUSULA PRIMEIRA que: “Os outorgantes reconhecem que se encontram ainda por realizar na fração objeto da escritura supra identificada os seguintes trabalhos: 1 – Mudar o cilindro de água quente instalado atualmente dentro da área do apartamento para um local de áreas técnicas respeitante ao condomínio do prédio. 2 – Após a retirada do cilindro a primeira outorgante procederá à abertura de nichos na parede que escondia o cilindro para efeitos decorativos. 3 – Mudar o corrimão exterior da varanda e sala de forma a que o mesmo fique uniforme e igual aos restantes. 4 – Na escada interior é necessário trocar dois degraus e arranjar a parte lateral da escada que foi cortada 5 - Colocar iluminação encastrada nas escadas 6 – Trocar o vidro Velux 7 – Trocar o forno a vapor e o rodapé da cozinha 8 Trocar a placa ao fundo do armário na suite 9 – Fazer o lacado da porta da suite 10 – Mudar a caixilharia da porta da entrada no terceiro andar 11 – Trocar a caixilharia da janela do segundo quarto que está amolado” H) Consignaram na CLÁUSULA SEGUNDA que “Os referidos trabalhos deverão ser realizados pela PRIMEIRA OUTORGANTE a suas expensas e no prazo máximo de 60 dias”. I) Consignaram na CLÁUSULA TERCEIRA que “Após o decurso do referido prazo de 90 dias se os trabalhos não tiverem sido executados, a PRIMEIRA OUTORGANTE constitui-se em mora e a título de penalidade deverá pagar aos SEGUNDOS OUTORGANTES uma quantia de cinquenta euros por cada dia de atraso até conclusão de todos os trabalhos elencados na cláusula primeira”. J) E estabeleceram na CLÁUSULA QUARTA que “Aquando da conclusão dos trabalhos referidos no presente documento será lavrado um auto de receção dos mesmos assinado por ambos os outorgantes”. K) No dia 15 de setembro de 2021 os autores enviaram uma carta registada com aviso de receção à ré, recebida no dia 20 seguinte, que constitui o documento 4 junto com a petição que aqui se dá por reproduzido, onde, além do mais, invocaram que da análise dos pontos 1 a 11 da cláusula primeira do acordo a que corresponde o doc. nº 3, se verificava que os trabalhos dos pontos 3, 5, 7, 8 e 9 estavam concluídos. L) Mas que no respeitava aos pontos 1 e 2 resultava que “o cilindro foi colocado no terraço, em zona e local absolutamente inapropriado, que impede o acesso ao terraço adjacente, a sul. Esta situação não respeita os projetos que foram aprovados pelas Entidades competentes”. M) Dito ainda que “Por outro lado, não tem esta colocação inapropriada a concordância dos restantes condóminos do prédio, que estão insatisfeitos. Resulta ainda que tínhamos o direito a um cilindro de 300 litros e foi-nos colocado um de 200 litros. Neste contexto, exigimos uma solução que seja adequada, com a sua colocação no local onde se encontram os restantes, e que não coloque em causa os acessos que foram eliminados e bem assim a troca do cilindro. Além de que no quarto de cima deveriam estar colocadas duas janelas (Velux), e no contexto das obras em causa apenas ficou uma, o que não se aceita”. N) Foi invocado que quanto ao ponto 4 se verificava que “um degrau está por trocar, existindo dele que está envernizado apenas de um dos lados”. O) E que “quanto aos pontos 4, 6, 10 e 11, os trabalhos ainda estão por fazer”. P) Foi nessa carta de 15 de Setembro de 2021 solicitado “que até ao fim do presente mês procedam em conformidade, e devida atuação no cumprimento da obrigação, cessando com o incumprimento e a mora que vem desde 19 de novembro de 2020 – o que invocaram e consigna para os devidos e legais efeitos. Q) Mais foi invocado que, “caso tal não se verifique, consideramos que continuam em mora, sem causa justificativa, e invocamos o disposto na cláusula terceira, considerando a mora ininterrupta, e a título de penalidade terão de nos pagar a quantia de cinquenta euros diários por cada dia de atraso até à conclusão de todos os trabalhos elencados na cláusula primeira”. R) A 6 de outubro seguinte os autores receberam uma carta da mandatária da ré, onde invocava que o acordo foi assinado e cumprido. S) Invocando que no que respeitava ao ponto 1 e 2 – Cilindro “O Cilindro foi colocado exatamente no local acordado, na presença de testemunhas, pelo que, se após a colocação do mesmo no local que foi por vós exigido, os restantes condóminos não concordam, o problema não será do empreiteiro, pois ele estava colocado num determinado local e os senhores exigiram a mudança. No que respeita ao fato de ser um cilindro de 200 litros em vez de 300 litros… O cilindro de 200 litros que foi colocado inicialmente, e só mudou de local a vosso pedido, pelo que não vai ser mudado o cilindro novamente”. T) E no que respeita aos trabalhos em falta dos pontos 4, 6, 10 e 11 lhe havia sido confirmado que estavam finalizados pelo empreiteiro, pelo que solicitava se agendasse uma vistoria ao local na presença do Eng. responsável pela obra. U) Para verificar de que lado estava a razão, atentas as versões antagónicas dos autores e da informação transmitida pela ré à sua ilustre mandatária, foi agendada uma reunião para o dia 8 de novembro seguinte. V) Nessa reunião, a ré, na pessoa do seu legal representante, reconheceu a reclamação dos autores, e foi estabelecido o Acordo de reconhecimento dos trabalhos do que de facto ainda estava por fazer. W) As partes realizaram uma reunião no dia 8 de novembro seguinte, onde a ré e autores, estabeleceram o Acordo de reconhecimento dos trabalhos do que de facto ainda estava por fazer e que constitui o documento nº 9 junto à petição que aqui se dá por reproduzido. X) Foi acordado que a ré teria de “colocar o termossifão no espaço que medeia entre a atual porta de acesso ao exterior, onde existe um terraço, e o términus do beiral mais próximo. O termossifão será colocado no lado esquerdo sentido norte-sul, encostado à parede, e a porta de acesso ao referido espaço exterior será colocada por debaixo do términus do beiral, com a sua mudança. Obra a fazer no prazo de 90 dias”; Y) Foi acordado que a ré teria de trocar o vidro de Velux do duplex. Z) Foi acordado que a ré teria de resolver o problema da caixilharia da porta de acesso da entrada principal, com o aperfeiçoamento da pintura de forma a ficar uma pintura uniforme. AA) Foi acordado que quanto aos “degraus da escada interior falta trazer e aplicar o degrau que foi para pintar”. BB) Foi acordado que quanto ao “perfil de alumínio na porta do quarto do meio com uma peça interior lacada a branco e exterior lacada a cor cinzenta – proceder à sua substituição por terem ambas uma mazela cada uma”. CC) O prazo estabelecido para a realização foi de 90 dias. DD) No dia 9 de fevereiro de 2022, os autores enviaram uma carta registada à ré que constituiu o documento nº 10 junto à petição e que aqui se dá por reproduzido, na qual invocaram que “o prazo de 90 dias para proceder às obras acordadas, reclamadas, e nunca concretizadas, tinha em vista fazer cessar a mora que se verificava desde a data de 11 de outubro de 2020, pois decorridos 60 dias para a sua realização que são referidos na cláusula SEGUNDA não foram os mesmos executados, sendo impossível nessa data lavrar o auto de receção dos mesmos, como foi consignado na cláusula Quarta do referido documento”. EE) E mais invocaram que “o incumprimento reiterado desde esse dia 18 de outubro de 2020 não cessara até esse dia 9, nem parecia dar mostras de cessar, com os consequentes incómodos e prejuízos que têm sofrido, e continuam a sofrer”. FF) E que, “não obstante terem assinado o Acordo de concretização das obras, com o reconhecimento da sua não execução e cumprimento devido das obrigações associadas, verifica-se que: • No que respeitava às obras da colocação do termossifão no espaço consignado, nada disso foi feito, permanecendo o mesmo ainda no mesmo local, em que não foi colocado o cilindro dos 300 litros que nos pertence, à semelhança dos outros condóminos que adquiram duplex e dos que têm 3 quartos, tendo-se limitado a retirar a porta do local onde se encontrava, e com a mudança para o local assumido, o que foi feito a meados de janeiro. • No que respeita ao vidro de Velux do duplex (ponto 6) a caixilharia da porta de acesso da entrada principal (ponto 10) nada foi feito. • No que respeita ao ponto 4, no início de janeiro passado próximo o Sr. EE compareceu na nossa habitação com o Engenheiro que fez a escada, e verificou que tinham de fazer de novo o degrau, pois a medida ainda não estava boa, sendo necessário cortar mais um pouco. • No decurso da última semana desse mês o Sr. EE regressou com o degrau e, ao ser colocado, viram que continuava torto, pelo que uma vez mais a medida não correspondia. • O Sr. EE levou o degrau, e cerca de 15 minutos depois regressou com o Sr. FF e, colocado de novo o degrau, verificou-se o mesmo, tendo o Sr. FF concordado que tínhamos razão na reclamação, e tirou medidas, levando de novo o degrau. Até hoje não mais regressou com o degrau. • No que respeita ao ponto 11 – trocar a caixilharia da janela do segundo quarto, com a devida substituição, também nada foi feito. GG) “Atenta a reiterada situação de incumprimento das obrigações assumidas, somos a reclamar e exigir: • A concretização devida de todas as obras/trabalhos que foram assumidos a 18 de agosto de 2020, e reconhecidos como não feitos na data de 8 de novembro de 2021; • Que tal tenha lugar até ao dia 21 desse mês, sob pena de os ora signatários se substituírem à V/ Sociedade, contratando a sua realização com terceira Entidade, e reclamado o devido ressarcimento; • O pagamento do valor assumido na Cláusula Terceira do documento complementar à Escritura, outorgado no dia 18 de agosto de 2020, a título de penalidade, que foi livremente assumido pela V/ Sociedade, estipulado no valor de 50,00 € por cada dia em atraso, até ao dia em que se considere a conclusão de todos os trabalhos elencados na cláusula Primeira desse documento, com a assinatura do auto de receção dos trabalhos, e que no presente se cifram em 23.950,00 €, cujo pagamento se aguarda seja feito no prazo de 30 dias, e servindo esta missiva como interpelação ao pagamento desse valor, e do que se vencer após esta data”. HH) A 15 desse mês os autores receberam uma comunicação da ré, por intermédio da sua mandatária, na qual invoca razão do incumprimento, e que estão em condições de agendar os trabalhos que especificaram como segue: “1- Colocação da laje do degrau das escadas; 2- Aperfeiçoamento da pintura do caixilho da porta principal; 3- Troca do vidro da Velux (só agora tivemos a confirmação que já existe o material proveniente do estrangeiro) 4- Retoque na pintura no perfil em alumínio do quarto (mazelas), conforme v/acordo com o técnico dos alumínios que esteve na vossa casa no mês de janeiro; 5- Recolocação do termossifão, o no lado esquerdo sentido norte-sul, encostado à grade e a porta de acesso ao referido espaço, a ser colocada por baixo de términus do beiral. Relativamente a este último item, convém salientar que para a sua recolocação teremos de agendar um outro dia e hora, porquanto, o técnico terá de desligar o termossifão, e refazer a tubagem, tendo para isso que ter acesso ao vosso apartamento, conforme acordado também com o Sr. FF, assim sugerimos a seguinte data e hora: - 23 de fevereiro, pelas 8.30horas Pontos 1, 2, 3 e 4 Relativamente ao ponto 5 (recolocação do termossifão), se puder ser no mesmo dia também será efetuado o trabalho, contudo depende confirmação pelo técnico. Assim sendo, queiram confirmar com o meu constituinte, se no dia 23 do corrente mês pelas 8.30h, estão em casa, porquanto estes trabalhos exigem coordenação de agendas com várias pessoas. II) No dia 21 seguinte os autores enviaram um email à ré a manifestar a recetividade para o referido dia 23 proposto, e invocando que esperava que o dia 23 fosse finalmente o dia da devida concretização de todas as obras/trabalhos que foram assumidos no dia 18 de agosto de 2020. JJ) No dia 7 de abril de 2022 os autores enviaram uma carta registada com aviso de receção à ré (recebida a 11 seguinte), na qual invocaram que no dia 23 houve lugar a intervenção em que mudaram o cilindro – e que aconteceu - mas não colocaram o devido de 300 litros. KK) Invocaram que “foi trocado o degrau que está com o tamanho adequado; o vidro do Velux e o aperfeiçoamento da pintura do caixilho da porta principal estavam executados”; LL) “em relação ao ponto 4, que tinha previsto o retoque na pintura em alumínio do quarto, eliminando mazelas, compareceu um Sr. que fez uma simples pintura, não tendo colocado qualquer massa, e do que lhe foi logo dito que o serviço não estava bem, e que tinha até piorado a situação, tendo o mesmo dito que voltaria então outro dia para fazer devidamente o trabalho de reparação. O mesmo não comparecera nos dias seguintes, e até hoje. Demos entretanto conhecimento pessoal ao Sr. HH, que nos disse que o Sr. voltaria para fazer o trabalho. Temos aguardado, em vão, e daí agora a nossa última reclamação, no sentido de que fossem terminadas as obras acordadas no referido dia 18 de agosto de 2020, e que exigimos sejam até ao dia 14 deste mês. Se tal não acontecer consideramos definitivamente incumprida a obrigação, e teriam de contratar um profissional para efetuar a devida reparação, com o devido pedido de ressarcimento das despesas que tiveram de suportar, e sendo, em todo o caso, que consideravam esse dia como o da cessação do incumprimento, no contexto do acordado, considerando esse o dia da conclusão dos trabalhos, e o da cessação da mora e penalidade que foi estabelecida contratualmente”. MM) A ré não realizou mais trabalhos e não foi lavrado auto de recepção dos trabalhos assinado por ambas as partes, tal como foi estipulado na cláusula QUARTA do acordo de 18 de agosto de 2020. NN) Na caixilharia da porta de sacada/janela do quarto do meio, verificam-se duas mazelas na caixilharia, a saber: a) Na parte exterior da caixilharia, à cor cinzenta, verifica-se uma mazela com dimensão de, aproximadamente 1 mm x 4 mm. b) Na parte interior da caixilharia, em alumínio lacado à cor branca, verifica-se uma mazela com dimensão de, aproximadamente, 3 mm x 4 mm. OO) Os autores solicitaram um orçamento para a colocação de uma nova porta-sacada oscilobatente, cujo valor de aquisição ascende a um preço não inferior a 1.494,06 €. PP) Na divisão do sótão de onde foi retirado o cilindro, com a área de cerca de 3,65 m2, esconsa, e pé direito variável entre 1,26m e 2 m, aproximadamente, e direcção longitudinal, existe um ligeiro cheiro a mofo. QQ) O coletor (painel solar) afecto à fracção “K”, dos autores, localiza-se junto a uma chaminé, encontrando-se esta a sul do painel a uma distância de, aproximadamente, 1 m. RR) No projeto de arquitetura aprovado e licenciado pela Câmara Municipal ... a 18/07/2020, o espaço relativo ao Duplex, encontram-se previstas duas janelas “Velux” na cobertura para o sótão da fracção “K” (o projeto prevê 2 janelas de dimensões semelhantes colocadas paralelas uma à outra). O espaço do Duplex encontra-se com 1 (uma) janela velux instalada, e 1 (um) túnel de luz. SS) Consta do certificado energético do apartamento o cilindro de 200 litros e não de 300litros. TT) Quanto à questão substituição da caixilharia do quarto, acordaram AA e Ré, que estava tratado, pois ao trocarem o caixilho poderia ficar pior. UU) À data da escritura os autores já usavam e habitavam o imóvel. VV) No dia 18 de março de 2020 foi decretado o estado de emergência em Portugal, através do Decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020, de 18 de março, devido à situação excecional que se vivia e a proliferação de casos registados de contágio de COVID-19 e que se prolongou até ao dia 02 de Maio de 2020. WW) A 13 de Janeiro de 2021 foi declarado estado de emergência, associado a um conjunto de novas medidas restritivas, situação que perdurou até dia 30 de Abril de 2021.» * Sendo consignado o seguinte em termos de factos “não provados” pelo tribunal a quo: «1. A partes acordaram que os trabalhos seriam executados até ao prazo máximo de 60 dias, que terminava no dia 17 de outubro de 2020. 2. O local do sótão onde a ré instalou o cilindro não tinha espaço para um de 300 litros, e por essa razão instalou um de 200 litros. 3. Na mudança de cilindro a ré deixou ficar uma abertura em baixo, e quando chove a água entra lá dentro. 4. Outrossim, aquando da primeira mudança do cilindro, com a sua retirada do interior do quarto do casal, a ré ficou de refazer o chão e pintar, mas não procedeu realização dos trabalhos, e existe no lugar um cheiro desagradável, que se propaga ao calçado. 5. Devido a estar na zona de sombra da chaminé, o painel solar dos autores não atinge as temperaturas dos painéis solares dos restantes condóminos. 6. Logo após a assinatura do Acordo e da escritura publica, o cilindro foi colocado exatamente no local sugerido pelos AA., isto é, no terraço, que no entender dos AA., fazia parte integrante da sua fração, onde foi construído um “contentor” pela Ré, em material térmico para o efeito. 7. Os autores preferiram e optaram pela colocação de um túnel de luz (em vez de uma janela “Velux”) ». * 3.2 – A primeira ordem de questões que com precedência lógica importa solucionar é a que se traduz no alegado incorreto julgamento da matéria de facto, pois que, «(…) deve ser aditado aos factos dados como provados, no contexto da decisão , que “as partes acordaram que os trabalhos seriam executados até ao dia 18 de novembro de 2020”»; que «(…) deve de igual modo ser aditado e dado como provado que “no acordo que foi outorgado em 18 de novembro de 2021 não estava o prazo de cumprimento da obrigação ainda em curso, e não houve lugar a qualquer alteração do objeto da prestação, que se manteve igual ao acordado a 18 de agosto de 2020”»; que o facto “provado” em TT) deve ser considerado como “não provado”. Apreciemos com o necessário pormenor e detalhe cada um dos pontos de facto questionados. Sem prejuízo de esta apreciação ser feita conjuntamente, quando justificada in casu. Começaremos então pela apreciação relativamente aos dois pontos de facto que os AA./recorrentes pugnam por que sejam aditados, sendo que a apreciação correspondente vai ser feita conjuntamente dada a similitude da argumentação que sobre tal vai ser expendida. Vejamos então. O 1º dos ditos pontos de facto seria que “as partes acordaram que os trabalhos seriam executados até ao dia 18 de novembro de 2020”. E o segundo seria que “no acordo que foi outorgado em 18 de novembro de 2021 não estava o prazo de cumprimento da obrigação ainda em curso, e não houve lugar a qualquer alteração do objeto da prestação, que se manteve igual ao acordado a 18 de agosto de 2020”. Salvo o devido respeito, pelo simples confronto com o teor literal em causa, é simples e insofismável a conclusão de que uma tal pretensão claramente improcede. Isto pela concludente e decisiva razão de que está em causa materialidade simplesmente argumentativa e com pendor conclusivo, nem sequer correspondendo a materialidade que tenha sido alegada qua tale, antes a materialidade que os AA./recorrentes ora perspetivam como importante e decisiva para ganho de causa na sua pretensão quanto ao meritis da causa. Na verdade, o 1º dos ditos pontos de facto reporta-se ao “acordo complementar” celebrado pelas partes aquando da outorga da Escritura Pública de Compra e Venda de 18 de agosto de 2020 relativa ao imóvel, através do qual fixaram os trabalhos por realizar, sendo que nesse acordo estipularam igualmente o prazo para a realização desses trabalhos pela Ré vendedora. Sucede que, como aliás os próprios AA. logo aduziram na p.i., foi consignado, contraditoriamente, nas cláusulas segunda e terceira desse “acordo complementar” que os trabalhos em causa deveriam ser realizados pela ora Ré nos prazos máximos de “60 dias” e de “90 dias”, respetivamente, sendo que tinha havido um “lapso de escrita” na redação da cláusula terceira em referência, donde, «sendo o prazo de 60 dias, o que se deve considerar como o estabelecido para a conclusão, e aquele a partir do qual passava a considerar-se a mora». Ora, ser o prazo em causa de “60 dias” foi dado como “não provado” na sentença recorrida – cf. ponto de facto “não provado” sob “1.”. Neste contexto, pugnar-se no sentido de que “as partes acordaram que os trabalhos seriam executados até ao dia 18 de novembro de 2020”, significaria o acolhimento da versão de que o prazo em causa era de “90 dias”. Mas isso nem sequer foi o sustentado pelos AA., sendo-o sim pela Ré [cf. art. 6º da contestação]… Em todo o caso, não tendo os AA. logrado provar a versão que sustentaram [ser o prazo de “60 dias”!] e competindo como competia a eles o ónus da prova correspondente, considerar que o prazo em causa é o de “90 dias”, será uma questão de interpretação e de eventual conclusão a que o julgador pode ou não chegar face à factualidade apurada (e não apurada) após a produção de prova. O que tudo serve para dizer que não pode nem deve “aditar-se” essa materialidade aos pontos de factos “provados”. O que idem se diga relativamente ao pretendido aditamento de que “no acordo que foi outorgado em 18 de novembro de 2021 não estava o prazo de cumprimento da obrigação ainda em curso, e não houve lugar a qualquer alteração do objeto da prestação, que se manteve igual ao acordado a 18 de agosto de 2020”. Com efeito, se bem compulsarmos a p.i., tal não foi alegado nesses moldes pelos AA.. Aliás, quanto ao “objeto da prestação” ter-se mantido igual no acordo de 18 de Novembro de 2021 (com referência ao acordo de 18 de Agosto de 2020), na p.i. os AA. até apontaram para entendimento distinto, pois que reconheceram logo por carta pelos mesmos subscrita em 15 de Setembro de 2021 [cf. art. 16º da p.i.], que «(…) os trabalhos dos pontos 3, 5, 7, 8 e 9 estavam concluídos»... Sem embargo do vindo de dizer, trata-se de materialidade argumentativa e de sentido conclusivo a que o julgador pode ou não chegar, mas apenas em sede de enquadramento dos factos no direito, isto é, na “FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO” da sentença. Razão pela qual não pode nem deve aditar-se a factualidade em apreciação aos factos “provados”. ¨¨ Vejamos para finalizar esta parte da impugnação à decisão sobre a matéria de facto, a pretensão de que o facto “provado” em TT) seja considerado como “não provado”. Rememoremos, antes de mais, o teor literal do mesmo, a saber: «TT) Quanto à questão substituição da caixilharia do quarto, acordaram AA e Ré, que estava tratado, pois ao trocarem o caixilho poderia ficar pior.» Alegam os AA./recorrentes que os elementos objetivos constantes dos autos, mormente as missivas escritas trocadas entre as partes, não “confirmam” o acordo consignado na redação deste ponto de facto, acrescendo que a prova testemunhal produzida nos autos também não o autoriza, na medida em que a testemunha DD até admite o incumprimento da obrigação de “substituir” (por dizer que se deslocou com o objetivo de “retificar”) e que a testemunha EE apenas invocou um conhecimento de “ouvir dizer” relativamente ao acordo em causa. Na sentença recorrida foi apresentada a seguinte “motivação” quanto a este particular: «O acordo descrito no ponto TT) resulta dos depoimentos das testemunhas DD (serralheiro civil que forneceu as caixilharias e procedeu a trabalhos com vista à reparação, confirmou o acordo) e EE (pintor da construção civil que trabalha para a ré, fez reparações e acompanhou outros trabalhos na casa dos autores, corroborou o depoimento da testemunha DD quanto ao acordo), conjugado com a natureza dos defeitos em causa. Com efeito, dada a reduzida dimensão das “mazelas” em causa e a respectiva localização (local pouco visível) – cfr. relatório pericial resposta ao quesito 2º indicados pelos autores -, não compensava o risco de ocorrerem danos inerentes à substituição da caixilharia.» Que dizer? Quanto a nós, tendo-se procedido à audição integral da gravação áudio dos depoimentos das duas testemunhas em referência, no devido confronto com o teor literal das cartas subscritas pelas partes, resulta suficientemente adquirido que existiu efetivamente, em Janeiro de 2022, uma anuência dos AA. em que não tivesse lugar qualquer “substituição da caixilharia do quarto”, dada a inevitável produção de muito “lixo” e o risco de ocorrerem danos superiores, nomeadamente ao nível da pintura da divisão – esta foi a versão efetivamente relatada pela testemunha DD [o técnico de serralharia civil a quem foi solicitado pela Ré proceder à “reparação”], efetuando então tal testemunha nessa deslocação ao imóvel dos AA. uns “retoques” de pintura nos perfis em alumínio que apresentavam as “mazelas”. É certo que a testemunha EE [pintor da construção civil que trabalha para a Ré, tendo a razão de ciência de se encontrar no imóvel dos AA. na ocasião dessa deslocação em Janeiro de 2022 por parte da anterior testemunha], apenas logrou confirmar que a testemunha DD lhe relatou que os AA. tinham “acordado” em que não fossem retiradas as sacadas/perfis de alumínio da caixilharia daquela porta-sacada, limitando-se aquele técnico a fazer uma intervenção a nível de retoques de pintura, isto é, trata-se de uma testemunha de “ouvir-dizer”. Não obstante, afigura-se-nos credível a versão de que os AA. anuíram nesses precisos termos. Note-se que a Ré, nesse particular, aquando da missiva de 15 de Fevereiro [cf. facto “provado” sob “HH)”, item “4-”], invocou tal situação/”acordo”, e aprestou-se a uma nova intervenção de retoques de pintura, sendo que os AA., nem no e-mail imediatamente subsequente de 21 de Fevereiro [cf. facto “provado” sob “II)”], nem na missiva de 7 de Abril de 20022 [cf. facto “provado” sob “LL)”] contestaram a dita anuência em não ser substituída a caixilharia daquela porta-sacada… Aliás, nesta última missiva muito expressa e literalmente apenas aludiram a que os retoques em pintura prometidos pela Ré não haviam ainda sido feitos, por o técnico não ter mais comparecido em violação daquilo com que se havia comprometido! Sendo certo que já está positivamente adquirido nos autos que a Ré não procedeu a mais qualquer outro trabalho [cf. facto “provado” sob “MM)”] – o que torna perfeitamente despicienda a pretensão também manifestada pelos AA./recorrentes no sentido de que fosse considerado complementarmente como “provado” que «A ré não procedeu à substituição ou reparação do perfil de alumínio na janela do quarto do meio, com uma peça interior lacada a branco e exterior lacada a cor cinzento, por terem ambas uma mazela cada uma»! Não obstante o vindo de dizer, entende-se que a redação dada a esse ponto de facto “provado” sob “TT)” não traduz com fidelidade o sentido da prova feita, mormente por não se divisar qualquer “acordo entre AA. e Ré”, antes e apenas a uma posição/manifestação de vontade dos AA. perante um técnico/reparador enviado pela Ré, donde, operando a reapreciação dos meios de prova produzidos quanto a este particular, impõe-se alterar a redação de tal ponto de facto no segmento em que extravasa a realidade objetiva e efetivamente apurada, pelo que se determina que o mesmo passe a figurar doravante com a seguinte concreta redação: «TT) Quanto à questão substituição da caixilharia do quarto, desistiram os AA. de tal ser efetivado perante o técnico enviado pela Ré para a correspondente reparação.» * 4 - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Questão do incorreto julgamento da matéria de direito [a começar pelo aspeto do montante devido a título de cláusula penal [porque se julgam com direito a € 17.750,00 (pelo total de 355 dias de mora iniciais) + € 2.550,00 (por mais 50 dias de mora); acresce que devia ter sido proferida condenação da Ré/recorrida a pagar o valor para a colocação de uma nova porta-sacada oscilo-batente (€ 1.496,06); que também devia ter sido proferida condenação da Ré/recorrida a colocar a segunda janela Velux (de acordo com o projeto de arquitetura aprovado e licenciado)]. Começando pelo aspeto do montante devido a título de cláusula penal. Será que a matéria apurada permite sustentar que os AA./recorrentes têm direito a € 17.750,00 (pelo total de 355 dias de mora iniciais) + € 2.550,00 (por mais 50 dias de mora)? A nossa resposta é inequivocamente de sentido negativo. Sem embargo de que tal não significa sancionar a decisão recorrida quanto a este particular. Vejamos então. Recorde-se que na decisão recorrida se perfilhou o entendimento de que da factualidade provada resultava que na data que foi acordada [“18 de Novembro de 2021”], os trabalhos não estavam concluídos, mas na medida em que «(…) fizeram uma reunião em 08 de Novembro de 2021, na qual fixaram os trabalhos que se encontravam por concluir e estabeleceram novo prazo de 90 dias, ou seja, até dia 06 de Fevereiro de 2022, alterando assim o acordo que haviam fixado (…)»], é este “novo acordo” que deve ser considerado, sendo que face ao incumprimento temporal que ainda assim se verificou, «(…) a ré incorreu em mora de dia 7 a dia 23 de Fevereiro, pelo que se constituiu na obrigação de efetuar o pagamento da quantia de 800 € a título de cláusula penal estipulada pelas partes (16 dias x 50 €)». Ora, desde logo se reconhece razão aos AA./recorrentes quando sustentam que o Tribunal a quo, «(…) com notório erro de apreciação da prova e de julgamento, atenta a prova objetiva que é constituída pelo Acordo firmado e aceite pelas partes na data de 18 de agosto de 2020 jogou os 90 dias para 18 de novembro de 2021, ou seja, para passados 15 meses, e não 3 meses.» Com efeito, sendo efetivamente de considerar como estipulado pelas partes – através do “acordo complementar” a que alude o facto “provado” sob “E)”! –, em 18 de Agosto de 2020, o prazo de 90 dias para a efetivação dos trabalhos por realizar, tal significava que o prazo se prolongava até 18 de Novembro de 2020. Assim sendo, tendo em conta o estipulado na CLÁUSULA TERCEIRA desse dito “acordo complementar”, isto é, que “Após o decurso do referido prazo de 90 dias se os trabalhos não tiverem sido executados, a PRIMEIRA OUTORGANTE constitui-se em mora e a título de penalidade deverá pagar aos SEGUNDOS OUTORGANTES uma quantia de cinquenta euros por cada dia de atraso até conclusão de todos os trabalhos elencados na cláusula primeira”, a partir de 19 de Novembro de 2020, caso os trabalhos não estivessem efetivamente executados é, à partida, legítimo falar de mora por parte da Ré e do correspondente dever de pagar a cláusula penal acordada. Acontece que resulta da prova produzida e dos factos “provados” que a Ré, no período temporal subsequente, cumpriu parcialmente os trabalhos. Os factos “provados” não permitem concluir quando teve lugar o cumprimento parcial – em 15 de Setembro de 2021 os AA. invocavam um incumprimento parcial até essa data [cf. facto “provado” sob “K)”], que a Ré não denegou, antes sustentou estar tudo cumprido em 6 de Outubro subsequente [cf. facto “provado” sob “R)”], o que não se pode considerar verídico, pois que em reunião conjunta de 8 de Novembro de 2021, as partes “estabeleceram o Acordo de reconhecimento dos trabalhos do que de facto ainda estava por fazer” [cf. facto “provado” sob “W)”]. À luz desta sequência factual, cremos ser efetivamente legítimo sustentar que a Ré se encontrou em mora entre o dia 19 de novembro de 2020 e 8 de novembro de 2021, no total de 354 dias. Mas será que tal confere aos AA. o direito a receber o valor da cláusula penal acordada, mais concretamente no valor de € 17.700,00 [= € 50 x 354] relativamente a este primeiro período temporal? Antes de respondermos, consideramos que importa assentar qual seja o período temporal total de mora da Ré. Recorde-se que em 8 de Novembro de 2021 as partes fixaram os trabalhos que se encontravam por concluir e estabeleceram novo prazo de 90 dias para sua realização [cf. factos “provados” sob “W)” e “CC)”], ou seja, até ao dia 6 de Fevereiro de 2022. Sustentam os AA./recorrentes que em 8 de Novembro de 2021 as partes não estabeleceram uma nova obrigação, nem houve lugar a qualquer alteração do objeto da prestação (que se manteve), sendo certo não poder deixar de se concluir «(…) que a mora do incumprimento apenas cessou a 14 de abril, data que os recorrentes invocaram na carta do dia 7 como a que que consideravam da cessação da mora, e penalidade que foi estabelecida contratualmente; e deste modo, o valor da cláusula penal a arbitrar aos recorrentes entre o dia 23 de fevereiro a 14 de abril de 2022, no total de 50 dias, é de 2.550,00 euros». Que dizer? Salvo o devido respeito, mesmo na lógica dos AA./recorrentes, não se compreende a argumentação destes em sustentar que a mora decorreu agora apenas a partir de 23 de Fevereiro, quando os 90 dias do novo prazo acordado haviam terminado em 6 de Fevereiro. Por outro lado, não nos merece acolhimento o entendimento de que esta nova mora cessou em 14 de Abril (por ser a data que os recorrentes invocaram na carta do dia 7 como a que que consideravam da cessação da mora). Com efeito, em nosso entender, deve prevalecer o seguinte entendimento: com o acordo de 8 de Novembro de 2021 e a concessão de um novo prazo de 90 dias para realização dos trabalhos em falta, as partes suspenderam a mora pelo período de tempo correspondente, sendo então legítimo falar de mora por parte da Ré apenas depois do terminus desse prazo de 90 dias, donde mora entre o dia 7 de Fevereiro e o dia 23 de Fevereiro [correspondendo a 16 dias, como nesta parte consignado na sentença recorrida], sendo certo que se considera o terminus da mora nesta data de 23 de Fevereiro, porque foi esse o dia da realização dos últimos trabalhos por parte da Ré [cf. factos “provados” sob “HH)” a “MM)”], entendendo a mesma que os havia finalizado, pelo que se efetivamente falhou no cumprimento, a partir daí não existe mora, mas sim ocorreu um incumprimento definitivo, que apenas confere ao credor (leia-se, aos aqui AA./recorrentes) «(…) o direito a ser indemnizado pelos prejuízos causados por esse incumprimento (art.º 798.º do C.C.), o que, neste caso, corresponde ao custo das obras de eliminação dos defeitos ou de reconstrução, entretanto efetuadas ou a realizar pelo dono da obra, ou por terceiro contratado por este.»[2] Será então de conferir aos AA./recorrentes o pagamento da quantia de € 800,00 a título de cláusula penal estipulada pelas partes [= € 50 x 16] quanto a este particular, que o mesmo é dizer, o valor total de € 18.500,00 [= € 17.700,00 + € 800,00]? Entendemos que não pelo seguinte. Consabidamente, no tocante à cláusula penal, a redução equitativa desta depende de ser ela considerada manifestamente excessiva ou de a obrigação ter sido parcialmente cumprida (cf. art. 812º, nos 1 e 2, respetivamente, do C.Civil). Temos presente que «A cláusula penal stricto sensu ou, propriamente dita, visa compelir o devedor ao cumprimento e, simultaneamente, conduzir à satisfação do interesse do credor, mesmo que se demonstre que do seu incumprimento ou mora não adveio qualquer dano».[3] E bem assim nos merece acolhimento o sustentado enfaticamente pelos AA./recorrentes, louvando-se em arestos jurisprudenciais que cita, nomeadamente que «“1. A faculdade de redução da cláusula penal, concedida pelo art. 812.º CC (redução equitativa da cláusula penal), não é de conhecimento oficioso do tribunal, antes dependendo de pedido do devedor da indemnização nesse sentido. 2. Por conseguinte, para que o tribunal possa proceder à redução equitativa da cláusula penal, o devedor tem de alegar e provar factos integradores da sua manifesta excessividade, situação a analisar casuisticamente e de acordo com o tipo de cláusula estabelecida, sob pena de inutilização da sua própria função e da razão da sua existência.”»[4] Sendo certo que a Ré ora recorrida não deduziu um tal pedido nos autos, designadamente por via de exceção no seu articulado de contestação, nem tão pouco alegou factos integradores de tal. O que nos impede de proceder oficiosamente a uma redução. Contudo, aquele valor afigura-se-nos como excessivo em demasia. Tenha-se em conta que houve logo um cumprimento parcial ab initio, intentando a Ré na sequência, embora com dilação inegável, proceder ao cumprimento total, o que senão totalmente, pelo menos no essencial e mais relevante, efetivamente logrou fazer. Sendo certo que a cláusula penal é, por via de regra, estabelecida em vista de um incumprimento integral. Assim sendo, s.m.j., é curial e legítimo, através de um critério de proporcionalidade, reduzir substancialmente o valor da cláusula penal, donde, também por recurso à equidade, entendemos fazê-lo através de um fator de 10%, o que nos aponta para o valor de € 1.850,00.[5] Procedendo nesta exata medida o recurso dos AA./recorrentes quanto a este particular. ¨¨ Vejamos, de seguida, o recurso dos AA./recorrentes quanto à peticionada condenação da Ré/recorrida a pagar o valor para a colocação de uma nova porta-sacada oscilo-batente (€ 1.496,06). Quanto a este aspeto do recurso dos AA./recorrentes, logo avulta, quanto a nós, que não foi alegado nem resulta provada a necessidade de “colocação” de uma “nova” porta-sacada oscilo-batente. Na verdade, os trabalhos a que a Ré se comprometeu ab initio – e que se justificavam, tanto quanto é dado perceber! – respeitavam apenas a “trocar a caixilharia” [cf. item “11-” do facto “provado” sob “G)”], sendo que estava em causa, mais concretamente, como ulteriormente objeto de acordo entre as partes, «(…) quanto ao “perfil de alumínio na porta do quarto do meio com uma peça interior lacada a branco e exterior lacada a cor cinzenta – proceder à sua substituição por terem ambas uma mazela cada uma”» [cf. facto “provado” sob “BB)”]. Isto é, do que se tratava era de substituir os dois perfis de alumínio da dita caixilharia. Ora, é certo que essa substituição nunca foi feita pela Ré, mas resulta do facto “provado” sob “TT)” – que supra foi objeto de reformulação na sua redação na decisão sobre a impugnação à decisão sobre a matéria de facto! – que «Quanto à questão substituição da caixilharia do quarto, desistiram os AA. de tal ser efetivado perante o técnico enviado pela Ré para a correspondente reparação.» Temos presente que tal não significou nem pode significar um acordo com a própria Ré quanto a tal questão, mas também não se pode olvidar que tal nunca pode autorizar a transmutação numa “colocação” de uma “nova” porta-sacada oscilo-batente. Mormente e decisivamente porque não está adquirido nos autos que existe essa necessidade! Ademais, estando como se estava no domínio dos direitos do dono de obra consumidor, como foi aduzido na sentença recorrida, e com aplicação do regime previsto no DL nº 67/2003, de 8 de Abril, se, por um lado, o seu exercício não está sujeito às várias relações de precedência e subsidiariedade vigentes na empreitada comum, nunca dispensa ainda assim as exigências de boa fé, dos bons costumes e a finalidade económico-social[6], pelo que, salvo o devido respeito, face à postura “ziguezagueante” dos AA./recorrentes a este propósito, e ao que estava verdadeiramente em causa, designadamente tratar-se de duas pequenas “mazelas na caixilharia” [cf. facto “provado” sob “NN)”], nunca poderia ser acolhida esta pretensão dos AA./recorrentes. Termos em que improcede inapelavelmente o recurso nessa parte. ¨¨ Vejamos, para finalizar, a questão de que também devia ter sido proferida condenação da Ré/recorrida a colocar a segunda janela Velux (de acordo com o projeto de arquitetura aprovado e licenciado). Quanto a este aspeto, foi a seguinte a fundamentação e decisão da sentença recorrida: «(…) Atenta a factualidade provada, verifica-se a existência de uma única desconformidade relativamente ao contrato de compra e venda – a instalação de uma janela Velux quando o projecto de arquitectura aprovado previa duas -, subsumível na al. a) do nº 2 do art. 2º do DL nº 67/2002 de 8 de Abril. Com efeito, tendo resultado provado que consta do certificado energético do apartamento o cilindro de 200 litros, e não de 300 litros, e face à não demonstração de que a localização do painel solar diminui o seu desempenho e que o ligeiro cheiro a mofo existente decorra de posterior intervenção da ré e impeça a utilização daquela divisão (cfr. ponto 3., 4. e 5. dos factos não provados) não se considera verificada qualquer outra desconformidade para além falta da janela Velux). Contudo, extrai-se da matéria provada que na data do contrato de compra e venda os autores já a conheciam ou não podiam ignorar a falta de uma janela Velux, tanto mais que elaboraram o acordo complementar onde incluem nos trabalhos por concluir a “troca o vidro Velux” (cfr. pontos FF), GG) e UU). E nos termos do art. 2º, nº3 do DL. nº 67/2003 de 08 Abril “se na conclusão do contrato o comprador conhece ou não pode razoavelmente ignorar a não conformidade – defeitos aparentes, visíveis, ictu oculi -, no circunstancialismo do caso, do que se trata é da não responsabilização do vendedor por esse defeito. Em última instância, porque o comprador aceita o produto tal qual é, a sua entrega será conforme ao contrato (coincidência de Istbeschaffenheit e Sollbeshaffenheit), pelo que o comprador não poderá prevalecer-se dos direitos resultantes da falta de conformidade” – João Calvão da Silva, Venda de Bens de Consumo, 2ª ed., Almedina, pág 69. Assim, e face ao exposto, conclui-se que a ré não está obrigada a colocar a segunda janela Velux, improcedendo os pedidos B) e C) formulados pelos autores.» Compulsando as alegações recursivas dos AA./recorrentes quanto a esta parte, no essencial centradas em que «(…) tendo os recorrentes adquirido a fração de acordo com os projetos existentes, e constando do projeto de arquitetura que estavam previstas duas janelas velux na cobertura, se está perante uma situação de uma obra contendo um vício material e que afeta a substância do contrato. Deste modo, existindo uma obra que se apresenta na veste de obra ilegal, pelo desrespeito do projeto de arquitetura, aprovado e licenciado pela Câmara Municipal ... a 18/07/2020, estamos na presença de uma situação que carece de respeito a essa legalização (…)», salvo o devido respeito, não se apresentam aí argumentos consistentes e concludentes que permitam contrariar o entendimento constante da sentença recorrida. Tanto mais que a própria Câmara Municipal ... não estará eximida de responsabilidade no ocorrido, designadamente na desatenção/incúria na vistoria em vista do licenciamento final, se é que não é mesmo caso para se falar de ter havido como que um deferimento tácito à alteração do projeto de arquitetura… Ora se assim é, parece legítimo dizer-se que falece o direito aos AA./recorrentes para reivindicar/pugnar face à Ré/recorrida por situações que lhes adviriam do que constava do projeto inicial. Improcede assim esta questão recursiva. * (…) * 6 - DISPOSITIVO Pelo exposto, acordam a final em dar apenas parcial procedência à apelação dos AA./recorrentes e, em consequência, em aumentar o montante compensatório a título de penalidade acordada na cláusula terceira do “acordo complementar” para € 1.850,00 (mil oitocentos e cinquenta euros), mantendo-se, no demais, a sentença recorrida. Custas da ação e do recurso, a cargo de Recorrentes e Recorrida na exata proporção do decaimento, sendo aplicável a secção B, da tabela I, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, à taxa de justiça do recurso. * Coimbra, 4 de Junho de 2024 Luís Filipe Cravo Fonte Ramos João Moreira do Carmo (vencido)
Voto parcial de vencido No acórdão, na parte do direito, solucionam-se três questões de direito. Quanto à 1ª, a da redução da cláusula penal, diverge-se do entendido e decidido. Efectivamente, se a “excessiva onerosidade” que permite a redução equitativa da cláusula penal no quadro do art. 812º, nº 1 do C. Civil não é de conhecimento oficioso, tendo de ser expressamente articulada e provada pelo devedor que pretenda essa redução - como se postula e merece a nossa adesão -, afigura-se-nos que o mesmo princípio terá de ser aplicado à situação do nº 2 do referido normativo, onde se determina, para o incumprimento parcial, ser admitida a redução “nas mesmas circunstâncias”, ou seja excessiva onerosidade e equidade, sob pena de patente desarmonia do sistema jurídico do preceito. Quanto à diferença de tratamento que se dá ao nº 1 e 2 tenho-a o Ac. do STJ citado, de 20.11.2003, não é convincente. Nem sequer cita jurisprudência ou doutrina. Não passa de afirmação de autoridade por ser proferido pela última instância. Claro que em incumprimento parcial a cláusula penal não deve, por via de regra, funcionar integralmente. A questão é se pode ser reduzida oficiosamente, em incumprimento parcial quando em incumprimento total não pode ! E entendemos que não sob pena da apontada desarmonia. Um exemplo: cláusula penal de 10.000 € para incumprimento total; não pedida pela parte o tribunal não pode reduzi-la oficiosamente, mesmo que manifestamente excessiva. Em incumprimento parcial de 90% já pode ser reduzida oficiosamente, se manifestamente excessiva ! Claro que se pode argumentar com o valor reduzido de incumprimento parcial de 10%, para mostrar uma provável injustiça na atribuição da cláusula penal por inteiro. Há, então, que relembrar o princípio da autonomia privada, o correspectivo princípio processual da autorresponsabilidade das partes e o argumento sistémico retirado dos regimes dos negócios usurários e da resolução ou modificação do contrato (vide neste sentido, com desenvolvimentos de doutrina importante e jurisprudência, o Ac. da Rel. Lisboa, de 4.11.2021, relatado pelo Sr. actual Conselheiro Luís Correia de Mendonça, em www.dgsi.pt). 4.6.2024 Moreira do Carmo
|