Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | ALICE SANTOS | ||
Descritores: | AMEAÇA | ||
Data do Acordão: | 07/03/2013 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DE FIGUEIRA CASTELO RODRIGO | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO CRIMINAL | ||
Decisão: | ALTERADA | ||
Legislação Nacional: | ARTIGO 153º CP | ||
Sumário: | 1.- Para que ocorra o crime de ameaça não se exige que o agente cause ao ofendido receio, medo ou inquietação, exigindo-se apenas que a ameaça seja adequada a provocar medo, mesmo que no caso concreto o não venha a provocar. 2.- Pratica o crime de ameaça aquele que dirigindo-se ao assistente lhe diz ” tem cuidado que se te apanho sozinho ainda te pode acontecer algum mal”, anunciando assim a possibilidade de lhe poder acontecer qualquer mal que pode indicar morte ou ofensas à integridade física. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal. *** No processo comum singular, supra identificado, após a realização de audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que:
A) Absolveu a arguida A... , pela prática, em co-autoria e na forma consumada, de um crime de injúrias, previsto e punido pelo art. 181º e 182º, ambos do Código Penal. B) Absolveu o arguido B... , pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça, previsto e punido pelo art. 153º, n.º 1, do Código Penal. C) Condenou a arguida A..., pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelos art. 143º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz a quantia total de € 385,00 (trezentos e oitenta e cinco euros); D) Condenou o arguido C..., pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de injúrias, p. e p. pelo art. 181º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz a quantia total de € 330,00 (trezentos e trinta euros); E) Condenou o arguido D... , pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça, p. e p. pelo art. 153º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros), o que perfaz a quantia total de € 360,00 (trezentos e sessenta euros); F) Condenou os arguidos A..., C... e D... no pagamento de 2 UC´s de taxa de justiça e nas custas do processo (art. 8º e tabela III do Regulamento Custas Processuais). G) Julgou parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado pela assistente F... contra a arguida A... e, consequentemente, condenar a demandada no pagamento à demandante de uma indemnização no valor de € 450,00 (quatrocentos e cinquenta euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos calculados às sucessivas taxas de juros civis legalmente aplicáveis, desde a sentença até integral pagamento; H) Julgou parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado pela assistente F...contra o arguido C... e, consequentemente, condenar o demandado no pagamento à demandante de uma indemnização no valor de € 400,00 (quatrocentos euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos calculados às sucessivas taxas de juros civis legalmente aplicáveis, desde a sentença até integral pagamento; I) Condenou os demandados A... e C... e a demandante F...nas custas da instância cível, na proporção do decaimento (art. 446º, n.º 1 e 2, do C.P.C., ex vi do art. 523º do C.P.C.), sem prejuízo da isenção prevista no art. 4º, n.º 1, al. m), do Regulamento das Custas Processuais. J) Julgou totalmente improcedente o pedido de indemnização civil formulado pelo assistente C... contra o arguido B... e, consequentemente, absolver o demandado do pedido. K) Julgou parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado pelo assistente C... contra o arguido D... e, consequentemente, condenar o demandado no pagamento ao demandante de uma indemnização no valor de € 400,00 (quatrocentos euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos calculados às sucessivas taxas de juros civis legalmente aplicáveis, desde a sentença até integral pagamento; L) Mais se condenou o demandado D... e o demandante C... nas custas da instância cível, na proporção do decaimento (art. 446º, n.º 1 e 2, do C.P.C., ex vi do art. 523º do C.P.C.), sem prejuízo da isenção prevista no art. 4º, n.º 1, al. m), do Regulamento das Custas Processuais.
1) Em 08 de Maio de 2011, entre as 16h00 e as 17h00, a arguida A..., na companhia de C..., dirigiu-se ao Lar (...), sito na Rua (...), em (...), para aí visitar os seus avós. 2) Na hora e local mencionados em 1., encontrava-se F..., na qualidade de representante legal da sociedade (...), Lda., proprietária do referido lar. 3) No átrio de entrada do lar referido em 1., a arguida A... solicitou à assistente F..., que desejava visitar os seus avós, a Sra. G... e o Sr. H.... 4) Em virtude dos seus avós de encontrarem a lanchar, foi solicitado pela assistente F... aos arguidos A... e C... que aguardassem no átrio da entrada, tal como as outras visitas que aí se encontravam, que o lanche dos seus familiares terminasse. 5) Nesse átrio, encontravam-se várias pessoas, inclusive idosos, que já se tinham reunido, previamente, com as suas famílias. 6) De seguida, a assistente F... entrou para um gabinete vidrado, contíguo ao referido átrio, que funciona como escritório, e notou que os arguidos A... e C..., se começavam a dirigir para o refeitório, que se situava ao fundo do corredor. 7) Na sequência, a assistente F... encaminhou-se de novo para o átrio e chamou a atenção dos arguidos A... e C... que não podiam ir, nesse momento, para o refeitório e que teriam de continuar a aguardar no átrio, pois mais tarde os avós da arguida viriam ter com eles. 8) Nesse instante, a arguida A... perguntou à assistente F...: “Como é que a senhora sabe, se ainda não lhe foi dizer nada?”. 9) Em resposta, a assistente F... asseverou à arguida A... que não se preocupasse, pois que quando os seus avós terminassem o lanche, estariam disponíveis para a visita. 10) Neste momento, a assistente F... foi circundada pelo arguido C... que lhe disse, em tom de voz alto: “É melhor estares calada, pois isto não te pertence”. 11) Perante a atitude do arguido C..., a assistente F... pediu a este e à arguida A... para saírem do lar, pois estavam a perturbar o ambiente do mesmo. 12) Ao que o arguido C... respondeu: “Daqui não saímos”. 13) Em virtude da resposta do arguido C..., a assistente F... levantou o braço esquerdo e apontou para a porta de saída, reiterando aos arguidos A... e C... o seu desejo de que saíssem. 14) Em acto contínuo, a arguida A... desferiu uma palmada no braço esquerdo da assistente F..., forçando-a a baixá-lo. 15) Entretanto, o arguido C... aproximou-se de frente da assistente F..., e encostando o seu peito ao dela foi forçando-a a recuar no sentido da porta do gabinete referido em 6., enquanto lhe dizia, num tom de voz alto: “Daqui não saímos, tu não és ninguém, és uma merda, vai para o caralho”. 16) A assistente F..., nervosa e ao ver que não conseguia convencer os arguidos a se retirarem do lar, dirigiu-se ao escritório referido em 6., e solicitou auxilio da GNR. 17) Os arguidos A... e C... apenas saíram do lar quando a GNR chegou. 18) Na sequência da acção da arguida A..., a assistente F... necessitou de assistência hospitalar, cerca das 17h30, em concreto no Hospital de (...). 19) Como consequência directa da conduta dos arguidos A... e C..., a assistente F... sofreu um aumento súbito de tensão arterial para 20/11 e como consequência directa apenas da conduta da arguida A... sofreu a assistente dores no braço esquerdo. 20) Ao agir da forma descrita, quis a arguida A... ofender o corpo e a saúde da assistente F..., o que conseguiu, provocando-lhe – o que sabia ser consequência directa da sua conduta – mal-estar físico e psíquico. 21) O arguido C..., ao proferir as expressões mencionadas, visava atingir a assistente F... na respectiva honra e consideração, o que conseguiu, bem sabendo que tais expressões eram ofensivas. 22) Na sequência de tais factos, A... e o assistente C..., entre as 17h00 e as 18h00, dirigiram-se ao posto da GNR de (...), a fim de aí apresentarem queixa pelos factos ocorridos. 23) Já no exterior do posto da GNR de (...), apareceu o arguido E..., a conduzir um veículo de marca Opel, modelo Corsa e cor branca, de matrícula não concretamente apurada, abrandou a velocidade e dirigindo-se ao assistente C... proferiu a seguinte expressão: “Nunca andes sozinho, pode-te acontecer alguma coisa”. 24) O arguido E... é filho da assistente F..., com quem tem uma relação próxima. 25) Ao proferir a expressão referida em 23) e dirigindo-se ao assistente C..., o arguido E... pretendia provocar-lhe medo e inquietação, o que conseguiu. 26) De seguida, o assistente C... dirigiu-se para o seu veículo, juntamente com A..., I...e J..., entrou no mesmo e após circular uns metros mais à frente do local referido em 22., entre o edifício do Tribunal Judicial de Figueira de Castelo Rodrigo e o Hospital da mesma localidade, chegou a pé o arguido D... e dirigindo-se ao assistente C... proferiu a seguinte expressão: “Não sabes quem eu sou, hei-de te partir os dentes”. 27) O arguido D... é genro da assistente F..., com quem tem uma relação próxima. 28) Ao proferir a expressão referida em 26. e dirigindo-se ao assistente C..., o arguido D... pretendia provocar-lhe medo e inquietação, o que conseguiu. 29) Agiu o arguido D... de forma livre, voluntária e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei e mesmo assim quis praticá-la. * Do pedido de indemnização civil da assistente F...: 30) Em consequência do comportamento dos arguidos A... e C..., a assistente sentiu-se profundamente vexada, nervosa e inquieta, bem como dores por vários dias. 31) A assistente é uma pessoa sensível e considerada por todos no meio em que vive e bem quista quer pelos familiares, quer pelos utentes do Lar referido em 1. 32) Os factos descritos de 3. a 17., ocorreram na presença de alguns utentes do Lar, bem como dos familiares destes, que se encontravam no átrio. 33) Por várias semanas, a assistente andou nervosa e sempre que alguém lhe tocava no que tinha sucedido com os arguidos A... e C..., entrava em crises de choro ao recordar. * Do pedido de indemnização civil do assistente C...: 34) Em consequência das expressões referidas em 23. e em 26., o assistente temeu e ainda hoje teme pela concretização das mesmas, procurando desde essa altura andar sempre acompanhado. 35) O assistente desde a data referida em 1., nunca mais se dirigiu ao lar aí referido com a sua namorada. 36) O assistente resolveu imigrar para França, de molde a fugir da possibilidade de concretização, por parte dos arguidos E... e D..., das expressões por estes proferidas. 37) Pese embora não tenha tido logo trabalho em França, o assistente sabia que era um local onde podia estar sossegado, arranjar emprego como aconteceu e onde não seria incomodado pelos arguidos E... e D.... * Mais se provou: 38) Os arguidos A... e C... são pessoas pacatas, trabalhadoras e educadas. 39) A arguida A... encontra-se actualmente desempregada, não auferindo qualquer rendimento. 40) Vive com o companheiro C..., aqui arguido, em Bègles, França. 41) Não tem filhos. 42) Tem o 12º ano de escolaridade. 43) A arguida A... não averba qualquer condenação no seu Certificado de Registo Criminal. 44) O arguido E... trabalha como assistente numa parafarmácia, auferindo um vencimento mensal de € 485,00. 45) Vive com os pais, em casa destes, não contribuindo para as despesas domésticas. 46) Despende cerca de € 100,00 mensais para pagamento de um empréstimo bancário para aquisição de um motociclo e cerca de € 20,00 mensais para pagamento de seguro do mesmo veículo. 47) O arguido não tem filhos. 48) Tem o 12º ano de escolaridade. 49) O arguido E... não averba qualquer condenação no seu Certificado de Registo Criminal. 50) O arguido D... é assistente administrativo num escritório, auferindo um vencimento mensal de € 650,00. 51) Vive com a esposa e dois filhos de 4 anos e de 6 meses, em casa própria, pela qual paga ao banco uma prestação de € 400,00. 52) A esposa do arguido trabalha como assistente administrativa e aufere um vencimento mensal de € 650,00. 53) Despende cerca de € 200,00 mensais para pagamento de um empréstimo bancário para aquisição de automóvel. 54) Despende entre € 300/400,00 mensais em despesas domésticas. 55) Tem o 12º ano de escolaridade. 56) O arguido D... não averba qualquer condenação no seu Certificado de Registo Criminal. 57) O arguido C... encontra-se, actualmente, desempregado, fazendo trabalhos esporádicos de carpinteiro. 58) Recebe um subsídio de desemprego de € 900,00. 59) Vive com a companheira A..., aqui arguida, em casa arrendada, pela qual pagam uma renda de € 660,00. 60) Despende cerca de € 300,00 em alimentação e € 40,00 para pagamento de um seguro. 61) Não tem filhos. 62) Tem o 9º ano de escolaridade. 63) O arguido C... não averba qualquer condenação no seu Certificado de Registo Criminal. * Factos não provados: Não resultaram provados os seguintes factos com relevância para a decisão da causa: a) Que a arguida A... tivesse desferido mais do que uma palmada no braço esquerdo da assistente F.... b) Que a arguida A..., aparentemente insatisfeita com a explicação da assistente F..., em voz alta e na presença das várias pessoas presentes no átrio, quer visitas, quer idosos, se tenha dirigido à mesma e dito: “Tu não és a proprietária do local, por isso cala-te. Tu aqui não mandas nada, nem tens nada a ver com isto, tu aqui não és ninguém”. c) Que a arguida tenha começado a falar ainda mais alto e tenha dito à assistente o seguinte: “Tu aqui não mandas nada, nem tens nada a ver com isto”. e) Que como resposta ao pedido da assistente para sair do lar, a arguida A... tenha dito: “Cala-te”. f) Que a arguida A..., no momento em que desferiu a pancada no braço da assistente, lhe tenha dito: “Cala-te, eu daqui não saio enquanto não vir os meus avós”. g) Que os arguidos tenham, também, começado a discutir com outra visita e com um idoso, que aí se encontrava. h) Que uma idosa, que assistiu ao sucedido, tivesse ficado num estado de grande perturbação pelos factos sucedidos, tendo sido medicada por essa razão. i) Que a crise de hipertensão sofrida pela assistente F... em consequência do comportamento dos arguidos, se tivesse prolongado por alguns dias. j) Que a arguida A... nunca mais tenha visitado os seus avós no lar referido em 1. k) Que o arguido E... tivesse agido de forma livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei e mesmo assim tivesse querido praticá-la. * Motivação Para formar a sua convicção relativamente aos factos provados, o tribunal observando os critérios a que alude o artigo 127º e 355º, ambos do Código de Processo Penal, baseou-se no correlacionamento de toda a prova produzida e apreciada em audiência de julgamento, segundo a regra da livre apreciação, a espaços doseada com o recurso às regras da experiência comum. Nas suas declarações, os arguidos A... e C... confirmaram, na generalidade, o episódio ocorrido no Lar (...), negando, no entanto, a prática por parte da arguida A... dos factos relativos à pancada no braço esquerdo da assistente, bem como a autoria das expressões ofensivas da honra da assistente proferidas a estas e que lhes são imputadas. Assim, tanto pela arguida A..., como pelo arguido C..., foi confirmado que no dia 08.05.2011, por volta das 16h00, se dirigiram ao Lar (...), sito em (...), para aí visitarem os avós da primeira. Que aí chegados, foram recebidos por uma funcionária que, antes de se retirar, lhes pediu para aguardarem. Por ambos foi dito que, momentos depois, apareceu a assistente que, se apercebendo da presença destes, lhes perguntou, com um ar arrogante: “O que quereis?”, tendo o arguido C... respondido, que queriam ver os avós da sua namorada. Referiram que, a esta resposta, retorquiu a assistente insistindo para que esperassem, embora não explicasse porque razão o teriam que fazer. Referem ambos os arguidos que, ao cabo de 15 minutos e cansados de esperar, decidiram sentar-se numas cadeiras livres ali existentes e para as quais se encaminharam. Que na sequência desse gesto, a assistente surgiu do corredor e disse-lhes: “O que estais aí a fazer? Porque ides para aí? Não vos disse para aguardarem na entrada, seus garotos de merda?”. Relatam que, em face desta abordagem, o arguido C... respondeu à assistente: “Só nos íamos a sentar!”, ao que esta retorquiu: “O que vocês queriam eram bisbilhotar! Não tendes educação!”. Que sentindo-se provocado, foi pelo arguido C... dito o seguinte: “Tenho mais educação que a senhora!”. Referiram ambos os arguidos que esta troca de palavras originou uma discussão entre os três, tendo em consequência a assistente agarrado os braços da arguida A.... Que surpreendido com esta atitude, o arguido C... decidiu intervir, pegando no braço de cada uma delas e separando-as. Acrescentam que, histérica e completamente desorientada, a assistente acabou por se dirigir ao seu escritório, pegou numa chave, trancou a porta da entrada e disse aos arguidos: “Estais lixados, vou chamar a GNR”. Ora, esta versão dos factos, embora coincidente, em alguns aspectos, com o que foi relatado pelas testemunhas, não foi corroborada por nenhuma delas, em particular nos seus pontos principais, nomeadamente quanto aos facto da assistente ter chamado os arguidos de “garotos de merda”, ter agarrado a arguida A... pelos braços, ter dito que aqueles estavam “lixados” ou ter ido ao escritório buscar uma chave e fechado a porta da entrada. Por outro lado, tal versão dos factos não logrou convencer o Tribunal, não só por não ter sido corroborada por nenhuma testemunha, mas também por apresentar incoerências, para as quais os arguidos não conseguiram apresentar explicações razoáveis e coincidentes com as regras da normalidade e experiência comum. Em primeiro lugar, não conseguiram os arguidos explicar porque razão a assistente havia reagido tão mal à decisão de ambos em sentar-se nas cadeiras livres existentes no átrio, junto da escadaria. Pois se pela mesma lhes foi solicitado, minutos antes, que esperassem ali até que os avós da arguida A... terminassem o lanche e se, ao decidirem sentar-se, os mesmos se encontravam a cumprir rigorosamente o ordenado, porque razão a assistente havia de surgir, tão nervosa e indignada com a atitude dos arguidos? E mais inexplicável ainda se torna a escolha das palavras por esta usadas para exprimir essa indignação: “O que estais aí a fazer? Porque ides para aí? Não vos disse para aguardarem na entrada, garotos de merda?”, “O que vocês queriam eram bisbilhotar!”. Não faz, pois, qualquer sentido que tendo os arguido permanecido sempre no átrio da entrada – local onde lhes foi ordenado que esperassem e local onde se encontravam as cadeiras onde os mesmos se decidiram sentar – a assistente tivesse interrompido o que se encontrava a fazer para os vir repreender, utilizando frases que por si só são indicativas de uma atitude de desobediência. Atente-se, por exemplo, à expressão “porque ides para aí?”, “não vos disse para aguardar na entrada”. Por outro lado, qual o sentido da palavra “bisbilhotar” (ou “coscuvilhar” referida pelo arguido C...), no contexto da versão apresentada pelos arguidos? Não faz qualquer sentido, alguém pensar que duas pessoas que se dirigiam em direcção a duas cadeiras pretendiam bisbilhotar? A única explicação razoável para tal expressão está no facto dos arguidos terem desobedecido à ordem que lhes havia sido dada no sentido de aguardarem ali no átrio e avançado para zona cujo acesso lhes estava vedado. A segunda incoerência apresentada pela versão dos arguidos, prende-se com a total ausência de reacção por parte do arguido C... em face dos acontecimentos por si presenciados. Não é razoável que em virtude de uma abordagem inicial tão “arrogante” e “agressiva” por parte da assistente, a qual os apelida de “garotos de merda” e que perante o facto desta ter decido agarrar a sua namorada pelos braços, deixando-a a chorar, o arguido C... nada diga e nada faça, assumindo uma atitude de total passividade. E menos sentido faz tal postura – a qual até seria aceitável se esse tivesse sido sempre o seu comportamento – se atentarmos nas reacções iniciais do arguido C... às abordagens da assistente, o qual assumiu sempre uma postura de defesa da sua namorada, de líder do casal, respondendo em primeiro lugar ao que lhes era perguntado – “Queremos ver os avós da minha namorada”, “Só nos íamos a sentar”, “Tenho mais educação que a senhora”. Por fim, não apresentam os arguidos qualquer explicação plausível para o facto da assistente, no meio da discussão, ter decido ir buscar uma chave ao escritório e trancado a porta da entrada. Não se compreende que, a responsável de um lar de idosos, no qual se desenvolvia uma cena de discussão, a qual já havia captado a atenção dos idosos, encontrando-se alguns até a reagir mal, decida trancar o “foco” dessa discórdia dentro do seu estabelecimento, correndo o risco de prolongar o conflito e dessa forma desestabilizar o ambiente mais do que já estava, podendo assim causar prejuízos mais sérios ao bem estar e saúde dos seus utentes. Ainda que se aceite como verdadeira a explicação do arguido C..., quando diz saber que entre a família da A... (mais propriamente a mãe desta) e a assistente já havia problemas antigos por resolver – já que tal facto foi confirmado pela testemunha Q... , tia materna da arguida A... – não é crível que esses problemas pudessem suplantar o dever e a responsabilidade que um responsável de um lar de idosos tem para com o bem estar dos seus utentes e para com as famílias destes, já para não falar que se trata de um ramo empresarial que funciona muito á base da publicidade e da qualidade dos serviços prestados aos seus utentes. Não é, pois, razoável que a assistente, por causa de um problema antigo, que nem sequer envolvia directamente os arguidos, tudo fizesse para aumentar o risco de piorar a situação já criada, pondo em risco a imagem do seu estabelecimento. Desta forma, para formar a sua convicção quanto aos factos dados como provados e relativos ao episódio ocorrido dentro do Lar (...), tomou o Tribunal em consideração as declarações da assistente F..., e o depoimento das testemunhas L..., funcionária do Lar (...), M..., N...e O..., todos familiares de utentes do Lar (...). Pese embora ao Tribunal não tenha sido indiferente ao facto do depoimento destas testemunhas não ter sido absolutamente coincidente em todos os pormenores, foi-o nos aspectos mais importantes. Isto para dizer que não esperava o tribunal, e se assim acontecesse é que nos mereceria muita reserva, que as testemunhas dissessem todas o mesmo, que os seus depoimentos fossem todos iguais e concertados, porque em situações como a descrita não é verosímil que isso aconteça. Tantas vezes, em situações comuns do dia a dia, sem qualquer conflito, as pessoas descrevem de forma diferente a mesma situação da vida, recordando-se uns de uns pormenores e outros de outra. Por outro lado, com o decorrer do tempo, nem sempre aquilo que as pessoas guardam na memória foi o que efectivamente sucedeu, porque há momentos que falham e a memória de cada um constrói um quadro lógico, dentro da lógica de cada um, sobre o que aconteceu. Com efeito, no caso, houve algumas discrepâncias nos vários depoimentos destas testemunhas, mas todas elas focaram apenas pormenores e não aspectos essenciais. Enfim, toda uma séria de pormenores que, dado o tempo decorrido e dadas as circunstâncias supra referidas é normal que assim aconteça. Assim, tanto a assistente, como as testemunhas referidas (e já os arguidos A... e C... o haviam feito), confirmaram todo o circunstancialismo de tempo e lugar descrito nas acusações pública e particulares. Pela assistente foi também confirmada a sua qualidade de representante legal da sociedade (...), Lda., a qual detém a propriedade do Lar (...), também da sua responsabilidade. Quer pela testemunha M..., que havia entrado no lar um minuto antes dos arguidos para visitar a sua mãe, quer pela testemunha N..., que já se encontrava dentro do Lar, sentado nas cadeiras junto da sua irmã, quer ainda pela testemunha O..., que se dirigia para o escritório com a assistente a fim de proceder ao pagamento da mensalidade relativa à sua mãe, foi confirmado terem visto os arguidos entrar no lar e já no átrio da entrada solicitado à assistente que queriam ver os avós da arguida. Pelas mesmas testemunhas foi dito que em resposta, a assistente lhes pediu para aguardarem ali, uma vez que os avós da arguida se encontravam a lanchar. Todas estas testemunhas e inclusive a assistente, foram unânimes em afirmar que, num primeiro momento, se encontravam no átrio os arguidos, a testemunha N... e a irmã deste, a testemunha O..., que depois acaba por entrar no escritório do lar com a assistente para lhe efectuar o pagamento e a testemunha M.... Confirmou a assistente, bem como as testemunhas M... e O..., que já dentro do escritório, se apercebeu, através de um vidro escuro encastrado na parede, que os arguidos avançavam para dentro do corredor, em direcção ao refeitório, onde se encontravam os avós da arguida a lanchar. Esclareceu bem este ponto a testemunha O..., quando refere que, enquanto procedia ao pagamento, reparou que a assistente, na posição de frente para o referido vidro escuro, viu os arguidos passar e disse para a mesma: “Espere aqui um bocadinho” e saiu de seguida. Pela assistente foi referido – e confirmado pelas testemunhas M..., N... e L..., que passava nesse momento no corredor com o objectivo de ir buscar um idoso com mobilidade reduzida – que apercebendo-se que os arguidos se dirigiam para o refeitório, decidiu encaminhar-se para junto deles e chamá-los à atenção quanto à proibição de estranhos entrarem pelo corredor, devendo aguardar pelos seus avós ali no átrio, até que terminassem o lanche. Esta proibição de entrar no corredor, decorre, antes de mais, das regras de funcionamento do próprio lar, constantes do regulamento interno do mesmo, junto aos autos a fls. 232 a 239, que também se encontra afixado no placard da entrada do referido estabelecimento. Todas as testemunhas referidas, bem como a assistente, foram peremptórias aos afirmar que o procedimento habitual das pessoas que pretendem visitar os seus familiares, passa sempre por se fazer anunciar na recepção a um funcionários, para a partir daí serem devidamente acompanhados até junto do seu familiar para a biblioteca ou para a sala de convívio, onde decorrem as visitas. Relatou a assistente que desagradada, a arguida A... lhe perguntou como é que ela sabia que os seus avós viriam ter com eles, se ainda ninguém lhes havia dito que tinham chegado, tendo a primeira lhe asseverado que logo que eles terminassem o lanche viriam ter com eles. Pelas testemunhas M... e L..., corroborando as declarações da assistente, foi referido que nessa sequência o arguido C... se exaltou e num tom de voz alto, mandou calar a assistente, dizendo que “aquilo não lhe pertencia”, que “ela ali não mandava nada”. Em consequência da atitude dos arguidos, referiu a assistente, o que foi confirmado pela testemunha M... e L..., que pediu àqueles para saírem do lar, o que foi recusado pelo arguido C.... Para prova do que a seguir se seguiu, relativamente à agressão no braço da assistente, tomou o Tribunal em consideração as declarações da mesma, corroboradas pela testemunha M..., que foram consentâneos em descrever os factos da seguinte forma: perante o comportamento dos arguidos e já exaltada, a assistente levantou o braço esquerdo em direcção da rua, esticou o dedo indicador para a porta da entrada e mandou os arguidos saírem dali, tendo a arguida A..., em acto continuo, dado uma palmada e apenas uma, na zona desse braço localizada entre a mão e o cotovelo, forçando-a a baixá-lo. Contribuiu o depoimento da testemunha L... para dar como provado que a pancada ocorreu no braço esquerdo, uma vez que foi peremptória ao afirmar que foi nesse braço que viu, nesse mesmo dia à noite, o vermelhão característico de uma pancada, facto também referido pela testemunha S..., Directora técnica do Lar (...), a quem a assistente mostrou o braço na manhã do dia seguinte. Relativamente às expressões descritas na acusação particular apresentada pela assistente, provou-se que as mesmas foram proferidas apenas pelo arguido C... e já não pela arguida A.... Assim, foram as testemunhas M..., L... e O... unânimes ao garantir terem ouvido apenas o arguido C... dizer à assistente, no decurso da discussão, as expressões dadas como provadas. Apenas a assistente imputou a co-autoria destas expressões também à arguida A.... Mas porque o fez de uma forma genérica – “começaram a tratar-me mal” – sem discriminar que expressões foram ditas por qual dos arguidos, dando mesmo a entender que foram ditas por ambos e ao mesmo tempo, em estilo de coro, o qual não faz qualquer sentido naquele contexto, para além de tal versão não ter sido corroborada por nenhuma testemunha arrolada e atento o interesse directo da mesma na causa, não pôde o Tribunal considerar as suas declarações nesta parte. Não considerou também o Tribunal as declarações da testemunha N..., no que às expressões imputadas ao arguido C... diz respeito. Primeiramente, em virtude de se encontrar de relações cortadas com o mesmo à data dos factos, facto que foi por este revelado no decurso da inquirição e que coloca em causa a imparcialidade do seu depoimento, nesta parte, já que foi evidente, ao longo do seu depoimento, a inimizade que os desune. Por outro lado, teve o Tribunal dúvidas em apurar se esta testemunha ouviu efectivamente as referidas expressões, já que na data dos factos (tal como à data do julgamento) a sua audição já se encontrava bastante afectada e ainda não usava aparelho, e pese embora ouvisse bem os sons, não os distinguia, o que coloca em causa a veracidade do seu depoimento nesta parte. Um pequeno reparo quanto à questão do “empurrão” referido na acusação particular. Da conjugação das declarações da assistente com as da testemunha M..., não teve dúvidas o Tribunal em dar como provado que o arguido C..., não empurrou de facto a assistente, mas através de uma conjugação de comportamentos corporais, forçou a mesma a recuar para trás. Ou seja, pegando nas palavras da testemunha M..., o arguido C... “vai-se aproximando dela (assistente) com o peito e andando para a frente, forçando-a a recuar até à porta do escritório. Nunca a empurrou com as mãos.”. A decisão da assistente em chamar a GNR foi confirmada pelas testemunhas M... e L... e corroborada pela testemunha O..., que se encontrava dentro do escritório e garantiu ter ouvido a mesma dizer que ia chamar a GNR. Todas as testemunhas acima referidas, para além da assistente, foram unânimes em afirmar que os arguidos só saíram do Lar (...) quando chegou a GNR. De referir, ainda, que os factos provados relativos às lesões apresentadas pela assistente resultam do cotejo do depoimento desta, com o teor da documentação clínica de fls. 230 a 231 dos autos, dos quais resulta que a assistente foi assistida nas Urgências do Hospital de (...), no dia dos factos e na sequência destes, sendo-lhe ali diagnosticada uma situação clínica compatível com uma reacção aguda ao stress, causador de um aumento de tensão arterial e medicada para o efeito, o que conjugado com as regras da experiência comum, permite que, para além de qualquer dúvida razoável, o tribunal não hesite em julgar provada esta a factualidade. No que diz respeito à prova da matéria descrita no pedido de indemnização civil deduzido pela assistente, considerou-se as declarações da mesma, que referiu ter ficado muito nervosa e ofendida com tudo o que se passou no lar. Referiu, ainda, ter sentido dores durante alguns dias, tendo tomado anti-inflamatórios para o alívio das mesmas. Também as testemunhas M..., L..., O..., R..., concordaram que os acontecimentos passados no lar com os arguidos, vexaram e ofenderam a assistente, tendo sido unânimes quanto à alteração de comportamentos desta nos dias seguintes, a qual passou a isolar-se mais, a andar triste e agitada. Contribuiu a última testemunha, não só na qualidade de amiga mas principalmente na qualidade de licenciada em psicologia, para esclarecer de que modo se deu essa alteração de comportamento. Referiu esta testemunha que a assistente é uma pessoa muito activa e que gosta de estar sempre dentro dos assuntos do lar. Descreveu-a como uma pessoa sensível e sempre preocupada com todos no lar. Frisou que na manhã do dia seguinte aos factos, em virtude de a assistente ainda não se ter dirigido a ela para a cumprimentar, procurou saber dela, tendo-a encontrado no escritório, muito nervosa, e de choro fácil. Apresentava-se agitada, levantando-se e andando de forma constante de um lado para o outro do gabinete. Recordou que esse comportamento durou algumas semanas. Alertou que sempre que se tocava no assunto, a assistente não controlava o choro. E que tal afastamento foi, também, notado pelos utentes do lar, entre os quais a assistente é muito apreciada. Quanto a esta matéria, não foi considerado depoimento da testemunha P..., amiga dos arguidos A... e C... e antiga funcionária do Lar (...), que descreveu a assistente como uma pessoa de temperamento explosivo e desadequado para estar à frente de um lar. Tal prendeu-se com o facto do depoimento desta testemunha ter sido, quanto a esta parte, influenciado pelo sentimento de ressentimento e inimizade, confirmado pela mesma aliás, para com a assistente e relacionado com o facto desta ter dispensado os seus serviços no lar e alegadamente a ter humilhado como funcionária no passado. Contudo, quando confrontada com o acervo fotográfico e a planta do lar, muito contribuiu esta testemunha para compreender as várias divisões do mesmo em que se desenrolaram os factos dos autos. Para prova do episódio ocorrido no Lar (...) tomou-se, também, em consideração o teor do auto de notícia de fls. 62 e seguintes, da certidão de registo comercial de fls. 303 e 307, da certidão de registo predial de fls. 310 a 315, do acervo fotográfico do lar de fls. 567 a 570 e da planta do lar junta na última sessão de audiência de julgamento. * Quanto aos factos não provados, estes resultaram da ausência de prova sobre os mesmos e da prova do contrário. Assim, não resultou provado que a arguida A... tenha dado mais do que uma palmada no braço esquerdo da assistente. Tanto por esta como pela testemunha M... só apenas referida a ocorrência de uma palmada e não mais do que uma, razão porque o Tribunal não pode dar como provado que a arguida tivesse desferido duas palmadas no braço da assistente. Quanto à matéria vertida nas alíneas b) a f), relativa a expressões alegadamente proferidas pela arguida A..., não deu o Tribunal a mesma como provada porquanto a mesma não foi confirmada por nenhuma testemunhas. Tanto a testemunha M..., como L..., N... e O..., foram claros ao relatar que apenas ouviram o arguido C... proferir essas expressões à assistente e já não a arguida A.... Apenas a assistente o referiu, mas atenta a sua qualidade no processo, o facto de ter interesse na causa e ainda o facto de não ter sido corroborado por mais ninguém, contribuiu para que o Tribunal não pudesse dar como provado que a arguida A... tivesse efectivamente proferido tais expressões. Também nenhuma prova consistente foi produzida quanto aos factos descritos em g) e h). Apenas pela testemunha N... foi dito que a determinada altura o arguido C... lhe terá dito que “eu contigo acerto contas lá fora”. No entanto, tal expressão isolada e dirigida à testemunha, não representa por si só uma discussão. Por outro lado, não envolve a arguida A.... E por fim, desconhece o Tribunal se a testemunha N... é efectivamente a “visita” ou o “idoso” vertido no facto alegado pela assistente. Assim, perante estes elementos e perante tal dúvida, entendeu o Tribunal dar como não provado tal facto. Já quanto à idosa que passou mal, nenhuma prova concreta se fez quanto a essa matéria. Não resultou provado que a crise de hipertensão sofrida pela assistente se tivesse prolongado por vários dias. Da documentação clínica resultou provado que a assistente sofreu um aumento súbito de tensão arterial e que foi medicada nesse dia. Pela mesma e pela testemunha R...foi confirmada essa crise de hipertensão, mas nem pela prova documental, nem pela testemunhal resultou provado que a mesma tivesse durado mais do que o dia dos factos, razão porque não pode o Tribunal dar tal facto como assente. Por fim, porque se fez prova do contrário, não resultou provado que a arguida A... nunca mais tenha visitado os seus avós no Lar (...). Pela assistente foi referido que recentemente, no dia 29.11.2012, a arguida A... esteve no lar para visitar os seus avós, tendo tudo corrido bem.
* O que os recorrentes fazem é impugnar a convicção adquirida pelo tribunal a quo sobre determinados factos em contraposição com a que sobre os mesmos eles adquiriram em julgamento, esquecendo a regra da livre apreciação da prova inserta no art 127. Cabe ao tribunal a administração e valoração da prova. É o tribunal que apreciará e decidirá sobre a matéria de facto segundo o princípio da livre apreciação da prova – salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente (art 127 do CPP). O tribunal deve apreciar e valorar os meios de prova de acordo com a experiência comum, com “o distanciamento, a ponderação e a capacidade crítica, na “liberdade para a objectividade” (cfr Teresa Beleza, Revista do Mº Pº, Ano 19, pg 40). O importante é a convicção que o tribunal formou sobre as provas produzidas sendo irrelevante a convicção que o recorrente formou sobre os factos. Tal como vem referido no Ac do STJ de 2/9/2005 para avaliar da racionalidade e da não arbitrariedade da convicção sobre os factos, há que apreciar, de um lado, a fundamentação da decisão quanto á matéria de facto (os fundamentos da convicção) e de outro, a natureza das provas produzidas e dos meios, modos ou processos intelectuais, utilizados e inferidos das regras da experiência comum para a obtenção de determinada conclusão. “Relevantes neste ponto, para além dos meios de prova directos, são os procedimentos lógicos para prova indirecta, de conhecimento ou dedução de um facto desconhecido a partir de uma facto conhecido: as presunções” (Ac cit.). As presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido – art 349 do CCivil. Aqui, há a considerar as presunções naturais ou hominis, que permitem ao julgador retirar de um facto conhecido ilações para adquirir um facto desconhecido. As presunções naturais mais não são de que o produto das regras de experiência. O julgador a partir de um certo facto e socorrendo-se das regras da experiência, conclui que esse facto denuncia a existência de outro facto. “Ao procurar formar a sua convicção acerca dos factos releventes para a decisão, pode o juiz utilizar a experiência da vida, da qual resulta que um facto é a consequência típica de outro; procede então mediante uma presunção ou regra da experiência (...) ou de uma prova de primeira aparência” (cfr, Vaz Serra, Direito Probatório Material, BMJ nº 112, pg 190). A presunção permite que de um facto conhecido e fazendo apelo ás regras de experiência e através de um processo lógico se admita a realidade de um facto desconhecido na medida em que um é a consequência do outro. Debruçando-nos sobre o caso vertente temos que o Tribunal condenou os arguidos e, para tal, formou a sua convicção no conjunto da prova produzida em audiência, nomeadamente, nas declarações da assistente, dos arguidos, depoimentos prestados pelas testemunhas e documentos junto aos autos. Os recorrentes limitam-se a criticar as declarações e depoimento prestados, fazendo o seu julgamento de acordo com a sua convicção. No que respeita à arguida A... sustenta a mesma que analisando a prova testemunhal verifica-se que a matéria dada como provada nos pontos 13 e 14 apenas se sustenta na versão relatada e pouco equilibrada da assistente F.... Ora o Tribunal ao dar como provado tais factos teve, efectivamente, em consideração as declarações prestadas pela assistente F... cujas declarações foram confirmadas pelo depoimento das testemunhas L..., M... e N..., que tiveram conhecimento directo dos factos pois, encontravam-se no local. Estas testemunhas foram unânimes ao referirem que a arguida A... deu uma palmada no braço da ofendida. É verdade que existem algumas contradições nos depoimentos prestados, nomeadamente, se foi no braço direito ou esquerdo. No entanto, no essencial os depoimentos coincidem e não sofrem contradições. As contradições não afectam o essencial são apenas em pormenores que atento o tempo decorrido e até as circunstâncias em que tudo ocorreu, passam um pouco despercebidos e só perante as perguntas em concreto dos operadores da Justiça é que as testemunhas começam a visualizar, novamente os factos levantando-se então as dúvidas sobre pequenos detalhes que não põem em causa o essencial. No entanto as testemunhas acabam por referir que a palmada foi no braço esquerdo, depoimentos corroborados pelos depoimentos das testemunhas L... e P.... Sendo que a primeira refere que foi no braço esquerdo que viu nesse dia à noite, o vermelho característico de uma pancada. A segunda refere que viu o braço da assistente na manhã seguinte à agressão. Ao contrário do sustentado pela recorrente é óbvio que se a pancada foi desferida com alguma força e de forma violenta e atenta até o tipo de pele da ofendida esta poderá apresentar marcas durante algum tempo. Já o recorrente C... refere que da prova produzida não resulta que tenha proferido a expressão “Daqui não saímos, tu não és ninguém, és uma merda, vai para o caralho”. Mais uma vez o recorrente faz a sua interpretação dos factos e pretende impor ao Tribunal a sua convicção. Do depoimento das testemunhas M..., L... e O..., resulta que a expressão em causa foi proferida pelo arguido. Na verdade, da conjugação de todos os elementos acima referenciados –factos provados, fundamentação, exame critico - em termos de experiência comum e seguindo um processo intelectual e lógico a única explicação razoável é a de que o arguido praticou o crime que lhe é imputado.
23) Já no exterior do posto da GNR de (...), apareceu o arguido E..., a conduzir um veículo de marca Opel, modelo Corsa e cor branca, de matrícula não concretamente apurada, abrandou a velocidade e dirigindo-se ao assistente C... proferiu a seguinte expressão: “Nunca andes sozinho, pode-te acontecer alguma coisa”. 24) O arguido E... é filho da assistente F..., com quem tem uma relação próxima. 25) Ao proferir a expressão referida em 23) e dirigindo-se ao assistente C..., o arguido E... pretendia provocar-lhe medo e inquietação, o que conseguiu.
k) Que o arguido E... tivesse agido de forma livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei e mesmo assim tivesse querido praticá-la. Belmiro Andrade |